Você está na página 1de 48

Indice

1.0 Introdução

2.0 Regra-Matriz da Norma Jurídica Tributária

3.0 Regra-Matriz do Imposto sobre Circulação de Mercadorias

3.1 Antecedente da Norma

3.1.1 Critério Material

3.1.2 Critério Temporal

3.1.3 Critério Espacial

3.2 Consequente da Norma

3.2.1 Sujeito Ativo

3.2.2 Sujeito Passivo

3.2.3 Alíquota

3.2.4 Base de Cálculo

4.0 Imposto Sobre Circulação de Mercadorias entre Estados

5.0 Comércio Eletrônico

6.0 Pacto Federativo e Guerra Fiscal

7.0 Protocolo ICMS 21 Confaz

8.0 Decreto

9.0 Conclusão
1 – INTRODUÇÃO

A República Federativa do Brasil, conforme a letra constitucional, é constituída


por união indissolúvel entre os estados, municípios e o Distrito Federal. Quando se fala em
repartição de competências entre os entes federativos, acrescente-se a este rol, a pessoa
política da União Federal.

Nesse escopo, a Carta Magna traz em seu corpo as competências legislativas e


administrativas, relativas à organização do estado em âmbitos federal, estadual e municipal,
de modo a permitir aos entes autonomia e equilíbrio entre si.

A previsão constitucional do ICMS, contida no art. 155, II da carta maior,


estabelece que é de competência dos estados e do Distrito Federal a instituição de impostos
sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de
transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as
prestações se iniciem no exterior.

A Constituição Federal estabelece as competências tributárias com o fim de


oferecer a cada ente receitas tributárias que lhes tragam meio de conquistar o próprio sustento
e desenvolvimento. Ademais, constitui objetivo fundamental da República Federativa do
Brasil, “erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais”
(CF, art. 3º, III).
O federalismo fiscal, enquanto aspecto do próprio sistema federativo, coloca
como diretrizes fiscais do estado, entre outras, a indicação de competências tributárias,
distribuídas entes os membros da federação, uma justa repartição de receitas tributárias, e a
criação de mecanismos de redução das desigualdades regionais.

O sistema tributário nacional, então, deve ser constituído com moldes que
extrapolem a simples visão fiscal da previsão de competências tributárias e sua respectiva
repartição de receitas, atentando-se para as nuances que envolvam a manutenção do pacto
federativo e a continuidade do desenvolvimento regional.

Ocupa fundamental papel na política fiscal de nosso país a figura do ICMS pelo
seu relevante volume de arrecadação, que constitui a principal fonte derivada de arrecadação
dos estados-membros.

Em relação a esse imposto, o art. 155, §2º, VII, “a” e “b” e VIII, estabelece a
forma como se dará a arrecadação do Imposto Sobre Circulação de Mercadorias quando tal
exação incidir sobre operações interestaduais. De acordo com a previsão constitucional,
quando a operação entre estados tiver como destinatário sujeito contribuinte do imposto,
aplicar-se-á ICMS sob a forma de alíquota interestadual, situação em que caberá ao estado de
destino da mercadoria ou serviço o tributo recolhido pelo complemento de alíquota. Quando
se tratar de adquirente que não seja contribuinte do tributo, entretanto, caberá recolhimento
pela alíquota interna, em favor do estado de origem.

O ultimo caso descrito corresponde ao comércio não presencial interestadual de


mercadorias, do qual são exemplos o comércio eletrônico, o telemarketing e o showroom,
além do comércio eletrônico móvel, realizado por meio de telefones celulares.

O grande crescimento das referidas modalidades de comércio nos últimos anos,


em especial no que se refere ao comércio eletrônico, em razão da popularização da internet e
das atrativas condições de pagamento, vem fazendo com que uma significante parte do ICMS
arrecadado nos estados menos desenvolvidos seja deslocada para os estados mais
industrializados.

Isso ocorre pela diferença no sistema de arrecadação previsto na constituição, que


determina que no comércio interestadual não presencial não haja nenhum recolhimento em
favor do estado onde se localiza o consumidor, existindo apenas o pagamento de alíquota
interna do estado que abriga a empresa contribuinte. Estima-se o Estado de Mato Grosso do
Sul deixe de arrecadar R$ 43 milhões ao ano, em decorrência da grande demanda pelo
comércio eletrônico.

Com o equilíbrio federativo em risco pela distorção na arrecadação do ICMS e


com a nítida ofensa à busca pela redução das desigualdades regionais, os estados
prejudicados, reunidos sob a égide do Conselho Nacional de Política Fazendária, o CONFAZ,
celebraram o protocolo ICMS nº 21, de primeiro de abril de 2011. Foram signatários do ato os
estados do Acre, Alagoas, Amapá, Bahia, Ceará, Espírito Santo, Goiás, Maranhão, Mato
Grosso, Mato Grosso do Sul, Pará, Paraíba, Pernambuco, Piauí, Rio Grande do Norte,
Roraima, Rondônia, Sergipe, Tocantins e o Distrito Federal.

O protocolo estipula que nos casos de vendas não presenciais que envolvam
comprador e vendedor situados em diferentes estados, deverá o estado remetente recolher, na
condição de substituto tributário, o imposto que cabe ao estado destinatário, parcela esta
correspondente ao valor da alíquota interna desta unidade, deduzida de 7% ou 12%, conforme
a origem do bem ou serviço.

Em Mato Grosso do Sul, o Protocolo ICMS nº 21, foi introduzido no ordenamento


estadual por meio do decreto nº 13.162, de 27 de abril de 2011, tornando exigível o imposto
previsto pelo CONFAZ. Veremos, entretanto, que tal medida ofende a condição de estado de
direito de nossa república, além de trazer severa ameaça ao federalismo nacional.

Explicaremos que, embora o contexto do ICMS sobre o comércio não presencial


enseje a tomada de uma medida que reequilibrasse a mecânica de recolhimento do imposto e
atenda ao anseio dos entes políticos, o ato celebrado pelo CONFAZ ofende ainda mais
gravemente os princípios constitucionais de nosso estado, uma vez que, detectada a inaptidão
da norma em atender à justiça fiscal, cabe ao legislativo tomar iniciativa de reorganizar a
previsão constitucional que lida com tal questão.

A questão referente ao Protocolo ICMS nº 21, do CONFAZ, permanece pendente,


muito embora possa ser resolvida de várias maneiras. Há diversas ações submetidas ao
judiciário que podem definir acerca da constitucionalidade da medida, além de uma Proposta
de Emenda Constitucional em tramitação, que almeja por um ponto final na contenda, sobre a
qual também se falará.
Antes de adentrarmos no objetivo central deste trabalho, entretanto, devemos
trabalhar os conceitos preliminares que envolvem o tema. Nesse escopo, é essencial a análise
da regra-matriz da norma jurídica tributária relativa ao ICMS, que nos permite dissecar o
imposto em todos os seus aspectos, indicando- nos todos os elementos da natureza jurídica do
ICMS e permitindo que uma futura análise do caso fático seja precisa e técnica do ponto de
vista jurídico.

Mais adiante, trataremos do comércio eletrônico e de seu crescimento vertiginoso


nos últimos anos, motivado pelo crescente uso da internet, o que, aliado à concentração
industrial em benefício das regiões sul e sudeste, fez surgir o problema sobre o qual gira este
estudo.

Outro aspecto importante a ser abordado é a relação entre o pacto federativo e


seus aspectos cooperativos e fiscais, e a contenda envolvendo os estados pelo ICMS incidente
sobre o comércio não presencial.

Por fim, abordaremos aquilo que é o foco central desta obra, o Protocolo ICMS nº
21, do CONFAZ, e suas implicações fáticas e jurídicas, bem como o Decreto MS nº 13.162 de
2011, com a finalidade de detectar a validade do ato praticado pelos estados e indicar os
possíveis vícios legais que possam revestir os dois institutos. Abriremos um breve adendo
com a finalidade de compreender o semelhante problema vivido nos Estados Unidos da
América envolvendo comércio não presencial e sua carga tributária em âmbito Estadual.
2. Regra-Matriz da Norma Jurídica Tributária

A regra-matriz da norma jurídica tributária consiste em um sistema hermenêutico


que permite a análise da estrutura de uma norma tributária do ponto de vista sistemático,
tornando possível a visualização de todos os seus momentos e elementos.

A norma jurídica tributária encontra-se inserida no gênero das normas jurídicas,


sendo entre elas uma distinta espécie, uma vez que se refere à incidência fiscal. Tal norma,
sob o ponto de vista da regra-matriz, é composta de um elemento antecedente, de natureza
descritiva e hipotética, e de um elemento consequente, de caráter prescritivo e vinculado.

O primeiro elemento, o antecedente normativo, trata-se de uma descrição


hipotética de determinada situação passível de ocorrência no mundo material e possui em sua
estrutura os critérios material, temporal e espacial.

O critério material do antecedente normativo se refere a uma ocorrência


representada por meio de um verbo e um complemento. Faz, portanto, alusão a uma situação
fática, passível de ocorrência e composta pela ação, omissão ou simples reunião de
circunstâncias, de que seja titular uma pessoa física ou jurídica.

O critério temporal, por sua vez, se refere ao momento indicado pelo legislador
para que seja considerado ocorrido o antecedente da norma. Quando o critério material se
refere a uma ação ou omissão, o critério temporal irá coincidir com a prática ou abstinência
daquele ato (como é o caso do ITBI), ou não (conforme ocorre em certos casos com o próprio
ICMS), como determinar o legislador, ou poderá definir o intervalo de tempo que deve ser
considerado para a verificação da ocorrência ou não do critério material (IRPF). Quando, por
outro lado, o critério material se referir a uma reunião de circunstâncias, a um estado
específico do indivíduo, o elemento temporal se tornará definidor da ocorrência do próprio
antecedente (IPVA).

Por fim, o critério espacial demarca o local a ser considerado para se verificar a
ocorrência da norma fiscal. Tal demarcação pode ocorrer quando há explícita disposição do
local onde será considerado como ocorrido determinado ato, quando há delimitação de
determinada área como local onde a ocorrência de tal ato é tributada ou quando o local
simplesmente coincide com a posição da ocorrência do evento material.
Quando verificadas as ocorrências das previsões materiais, temporais e espaciais,
em caráter imediato e infalível (CARVALHO, 2008, p. 374), incidirá o antecedente da norma,
por meio de um liame jurídico legal consistente no dever-ser neutro deôntico da norma
jurídica. Trata-se de uma relação entre antecedente e consequente, justificada pelo dever-ser e
conectadas objetivamente.

O consequente normativo consistirá em uma relação, um conectivo subjetivo,


formado entre os sujeitos da obrigação tributária e correspondente ao dever-ser modalizado da
norma. Tal liame que conecta sujeito ativo e passivo credencia cada um deles a uma específica
posição na relação jurídica tributária: a daquele que possui o direito de ver satisfeita uma
prestação e daquele que possui o dever de cumpri-la, respectivamente.

O sujeito passivo da relação será aquele a quem a norma imputa, diante da


ocorrência do antecedente, o dever de saciar a prestação disposta no consequente normativo.
O sujeito ativo, por sua vez, será a pessoa de direito público, ou aquele que lhe fizer as vezes,
e possuirá a prerrogativa de ver cumprido o objeto da relação. No mais das vezes, aquele que
possui a competência legislativa para instituir o imposto também será aquele que ocupará o
lugar de sujeito ativo, fiscalizando e cobrando o tributo. No entanto, existem exceções.

A já referida prestação da relação também é elemento fundamental do liame


subjetivo composto pelo dever-ser modalizado do consequente normativo. É o elemento
finalístico da relação jurídica tributária, o objeto sobre o qual recai a obrigação tributária, e
será composto por dois institutos, quais sejam, a base de cálculo e a alíquota.

O primeiro se refere ao montante que será tido como referência para liquidação da
obrigação. Ele deve ser capaz de expressar a grandeza proporcional do antecedente normativo
e deverá guardar estrita relação com a hipótese tributária, uma vez que são eles, a hipótese de
incidência e a base de cálculo, os elementos capazes de definir, em meio aos demais, um
tributo.

A base de cálculo da prestação tributária, portanto, possui três funções primordiais


(CARVALHO, 2008, p. 360): medir as reais proporções do fato, compor a especifica
determinação da divida, e confirmar, infirmar ou afirmar o verdadeiro critério material da
descrição contida no antecedente da norma. A natureza jurídica da base de cálculo é de
tamanha substância que, quando em conflito com o próprio critério material do antecedente da
norma, a princípio o núcleo da prescrição normativa, deverá ela prevalecer (CARVALHO,
2008, p. 364), devendo se retirar dela os indícios necessários para negar o critério material e
estabelecer o real objeto sobre o qual recai a prescrição da norma tributária.

A base de calculo, entretanto, não é capaz de medir sozinha o real volume da


prestação tributária, devendo-se aplicar a ela a alíquota, também prevista no consequente
tributário da norma. A base de calculo em conjunto com a alíquota estabelecerá o líquido
objeto sobre o qual recai a relação jurídica tributária.
3. Regra Matriz do Imposto sobre Circulação de Mercadorias.

O Imposto Sobre Circulação de Mercadorias possui tem sua estrutura completa


prevista na lei Kandir (Lei Complementar nº 87/96). Passaremos a trabalhar nos elementos de
sua Regra Matriz.

3.1 Antecedente da Norma

A norma jurídica tributária é composta de duas partes. A primeira delas, o


antecedente da norma, possui caráter descritivo, prevendo uma conduta que a norma julga ser
relevante para, a partir de sua ocorrência, fazer incidir uma específica consequência. A esse
fato descrito dá-se o nome hipótese de incidência e quando ocorre de um indivíduo praticar
fato que se enquadre nos precisos parâmetros previstos no tipo tributário ocorre a chamada
subsunção. Nesse sentido, Paulo de Barros Carvalho:

O Objeto sobre o qual converge o nosso interesse é a fenomenologia da


incidência da norma tributária. Nesse caso, diremos que houve a subsunção,
quando o fato (fato jurídico tributário constituído pela linguagem prescrita
pelo direito positivo) guardar absoluta identidade com o desenho normativo
da hipótese (hipótese tributária). Ao guardar concretude o fato, instala-se,
automática e infalivelmente, como diz Alfredo Augusto Becker, o laço
abstrato pelo qual o sujeito ativo torna-se titular do direito subjetivo
público de exigir prestação, ao passo que o sujeito passivo ficará na
contingência de cumpri-la. (Carvalho, 2008, p.277)

A identificação da ocorrência da subsunção do fato jurídico tributário à hipótese


legal prevista pelo legislador deve ser criteriosa a ponto de buscar a absoluta identidade entre
a conduta praticada e a descrita. Tal identidade será medida por meio de critérios de descrição
que compõem o antecedente da norma. O critério material, o espacial e o temporal.
3.1.1 Critério Material

Da descrição contida nos artigos 155 e seguintes da CF, depreende-se que o ICMS
na verdade constitui cinco diferentes impostos, abrigados por uma mesma sigla (CARRAZA,
2008, p. 36), uma vez que é possível separá-lo em, ao menos, cinco distintas hipóteses de
incidência e bases de cálculo. São eles: o imposto sobre operações mercantis, o imposto sobre
serviços de transporte interestadual e intermunicipal, o imposto sobre serviços de
comunicação, o imposto sobre produção, importação, circulação, distribuição ou consumo de
lubrificantes e combustíveis líquidos e gasosos e de energia elétrica e o imposto sobre a
extração circulação, distribuição ou consumo de minerais.

Dos diferentes impostos extraídos do ICMS, nos cabe análise apenas acerca do
primeiro, o qual, daqui em diante, denominaremos Imposto Sobre Circulação de Mercadorias.

É necessário esclarecer que o imposto se refere às operações relativas à circulação


de mercadorias, sendo esta circulação de caráter jurídico e não meramente física, sendo
exigida, portanto, efetiva mudança da posse ou propriedade da mercadoria. Neste mesmo
escopo, vale salientar que o imposto visa tributar não mercadorias, mas sim as operações
relativas à sua circulação. Desse modo, o ICMS só poderá incidir sobre operações que
componham a cadeia de práticas mercantis que conduzam uma mercadoria de sua fabricação
até ao consumidor final (CARRAZA, 2008, p. 45).

O conceito de mercadoria também constitui elemento fundamental para se


compreender a extensão e a precisa incidência do imposto ora estudado. Nesse sentido,
seguimos o entendimento de que aquilo que se compreende como mercadoria ultrapassa o seu
conceito físico. Por mercadoria deve-se entender o bem que exerce o papel de objeto em um
ato mercantil.

Um objeto qualquer se reveste da qualidade de mercadoria a partir do momento


que é destinado ao comércio com a finalidade lucrativa, e não possuirá essa qualidade quando
seu objetivo for voltado ao uso doméstico ou industrial. Assim, para definição de mercadoria,
deve-se atentar para a existência ou não da destinação comercial.
3.1.2 Critério Temporal

O instante do nascimento da obrigação tributária do ICMS será indicado por cada


unidade da federação, por meio de lei ordinária. A lei Kandir (Lei Complementar nº 87),
entretanto, prevê algumas diretrizes com relação ao critério temporal da ocorrência da
hipótese tributária do ICMS:

Art. 12. Considera-se ocorrido o fato gerador do imposto no momento:


I - da saída de mercadoria de estabelecimento de contribuinte, ainda que para
outro estabelecimento do mesmo titular;
II - do fornecimento de alimentação, bebidas e outras mercadorias por
qualquer estabelecimento;
III - da transmissão à terceiro de mercadoria depositada em armazém geral
ou em depósito fechado, no Estado do transmitente;
IV - da transmissão de propriedade de mercadoria, ou de título que a
represente, quando a mercadoria não tiver transitado pelo estabelecimento
transmitente;
V - do início da prestação de serviços de transporte interestadual e
intermunicipal, de qualquer natureza;
VI - do ato final do transporte iniciado no exterior;
VII - das prestações onerosas de serviços de comunicação, feita por qualquer
meio, inclusive a geração, a emissão, a recepção, a transmissão, a
retransmissão, a repetição e a ampliação de comunicação de qualquer
natureza;
VIII - do fornecimento de mercadoria com prestação de serviços:
a) não compreendidos na competência tributária dos Municípios;
b) compreendidos na competência tributária dos Municípios e com indicação
expressa de incidência do imposto de competência estadual, como definido
na lei complementar aplicável;
X – do desembaraço aduaneiro de mercadorias ou bens importados do
exterior;
X - do recebimento, pelo destinatário, de serviço prestado no exterior;
XI – da aquisição em licitação pública de mercadorias ou bens importados
do exterior e apreendidos ou abandonados;
XII – da entrada no território do Estado de lubrificantes e combustíveis
líquidos e gasosos derivados de petróleo e energia elétrica oriundos de outro
Estado, quando não destinados à comercialização ou à industrialização;
XIII - da utilização, por contribuinte, de serviço cuja prestação se tenha
iniciado em outro Estado e não esteja vinculada a operação ou prestação
subsequente.

Deve-se esclarecer, entretanto, que, muito embora a redação possa causar


confusão, os momentos indicados no art. 12 da lei não constituem hipótese de incidência
(elemento material) do ICMS, mas apenas seu aspecto temporal (CARRAZA, 2008, p. 46).
Assim, não se considerará como ocorrido qualquer fato gerador quando, mesmo havendo
ocorrência de qualquer das hipóteses legais, não houver uma efetiva circulação de mercadoria
à qual possa fazer referência o imposto.

A mera movimentação física de bens, que produza sua saída do estabelecimento


comercial, por exemplo, embora com aparente subsunção à norma, não a fará incidir, por não
corresponder a uma real operação mercantil.

Da mesma forma, não haverá incidência do imposto quando, celebrado o negocio


jurídico, esteja ele pendente de tradição, uma vez que não estará consolidada a operação.

Por fim, também não se considerará como ocorrido o antecedente normativo do


ICMS quando a mercadoria for deslocada entre dois estabelecimentos de uma mesma pessoa
jurídica, uma vez que não há, nessa hipótese, mais do que simples movimentação física. Tal
entendimento constitui opinião do próprio STJ, manifestada por meio da da Súmula nº 166:
"Não constitui fato gerador do ICMS o simples deslocamento de mercadorias de um para
outro estabelecimento do mesmo contribuinte.".

Cabe salientar, todavia, que as movimentações relativas a transporte entre


unidades de uma mesma empresa terão o condão de fazer incidir a norma do ICMS quando o
local de destino da mercadoria se situar em outro membro da federação.

A razão dessa exceção é a manutenção do equilíbrio federativo, uma vez que, se


considerada como mero transporte, essa remessa faria surgir o seguinte problema: o
estabelecimento “A” de uma determinada empresa, localizada no estado de São Paulo, produz
mercadoria que é remetida ao estabelecimento “B” da mesma empresa, localizado no estado
de Mato Grosso do Sul. O estabelecimento “B” realiza a circulação (venda) da mercadoria, o
que faz incidir ICMS. A venda praticada no estado de MS fará destinar aos seus cofres o
produto arrecadado com o imposto referente a essa operação, enquanto que o estado de
origem, no qual o produto foi produzido, nada irá auferir.

Com intuito de impedir o referido desequilíbrio é que se aceita a tributação sobre


o transporte de mercadoria entre sedes de uma mesma pessoa jurídica que se encontrem em
diferentes unidades federativas. Tal tributação ocorrerá sob a forma de alíquota interestadual,
prevista no art. 155, §2º, VII, “a” da Carta Constitucional.
É válido mencionar que, se o transporte pretender incorporar o produto ao ativo
permanente do estabelecimento de destino localizado em outra unidade da federação, não
incidirá essa exceção, haja vista que não há circulação de mercadoria no sentido que interessa
ao ICMS.

3.1.3 Critério Espacial

O ICMS tem como objeto operação que promova a circulação jurídica de


mercadorias. Com isso em mente, é de fácil compreensão a razão pela qual, no mais das
vezes, o local da pratica da operação será tido como referência espacial para fazer incidir o
ICMS. Desse modo, ocorrendo o fato (circulação) em determinado estado, incidirá ICMS
vigente naquela unidade federativa.

Quando se trata de operações interestaduais, por outro lado, a questão espacial se


torna mais relevante, uma vez que a hipótese se desdobra em duas possibilidades, segundo a
natureza do destinatário da operação. Caso seja ele, o adquirente da mercadoria, também
contribuinte de ICMS, ou seja, não se esgote ali a cadeia comercial referente àquele produto,
haverá um regime de recolhimento. Caso, por outro lado, a operação esgote a cadeia
comercial, ocupando o comprador do bem a posição de destinatário final, incidira ICMS sob
outro regime.

Neste caso, quando o destinatário não é considerado contribuinte de ICMS, o


critério espacial define que a operação se considera como ocorrida na unidade de origem do
bem, devendo ser recolhido ICMS segundo alíquota interna do estado onde se localiza do
remetente da mercadoria.

Naquele caso, entretanto, ocorre de forma diferente. Por não se esgotar a cadeia
comercial, o legislador constitucional previu método de arrecadação que contemple as duas
unidades envolvidas. Assim, o estado de origem será considerado como local de incidência,
segundo seu próprio critério material, e fara incidir, no tocante àquela operação, uma alíquota
interestadual, que jamais será superior à alíquota interna. Por sua vez, o estado de destino será
colocado como referência, também por meio de sua própria previsão legal, como local de
incidência de nova aplicação de ICMS, sob a forma de diferencial de alíquota.

Assim, nesta ultima hipótese, em uma só operação mercantil, aplica-se ICMS


segundo dois critérios espaciais.

3.2 Consequente da Norma

Se o antecedente da norma possui natureza objetiva e caráter descritivo de


conduta e desenha uma determinada pratica que considera relevante, o consequente, por sua
vez, é a prescrição legal que o legislador previu como cabível àquele fato descrito. Trata-se de
uma relação jurídica tributária - por isso possui caráter subjetivo - e possuí em seu corpo um
deôntico modalizado por meio de uma obrigação envolvendo específicos credor e devedor. O
primeiro incumbido do ônus de saldar a obrigação, e, o segundo, titular da prerrogativa de ver
cumprido seu crédito.

O objeto dessa relação, a obrigação tributária, considerando nosso contexto, se


tratará de obrigação principal, ou seja, consistirá em pagamento do imposto ICMS diante da
ocorrência de fato que se enquadre na hipótese de incidência prevista na legislação estadual
que trate do tributo.

Essa obrigação a que se refere a relação jurídica, portanto, será protagonizada por
dois sujeitos, os quais ocupam distintos polos em seu corpo, e será medida por meio de dois
aspectos, a base de cálculo e a alíquota.

3.2.1 Sujeito Ativo

O sujeito ativo é aquele sujeito, pessoa jurídica de direito público, integrante da


relação jurídica tributária a quem se imputa o direito subjetivo de exigir o cumprimento da
obrigação tributária. Via de regra, a competência tributária legislativa pressupõe a capacidade
tributária ativa. Ocorre, entretanto, de os entes políticos delegarem a função arrecadatória à
outra pessoa, incumbindo-a de perceber os tributos, revertendo em seu favor, ou não, o
produto da arrecadação. Quando ocorre, além da delegação da capacidade, a outorga da
disponibilidade da quantia arrecadada, ocorre a chamada parafiscalidade.

O art. 119 do Código Tributário Nacional estipula:

“Art. 119. Sujeito ativo da obrigação é a pessoa jurídica de direito público,


titular da competência para exigir o seu cumprimento.”

Muito embora o art. 119 do CTN seja claro em estipular que somente as pessoas
jurídicas de direito público é que podem ocupar o posto de sujeito ativo da obrigação
tributária, a doutrina diverge acerca da questão, com parte dos autores defendendo que a
delegação da capacidade tributária ativa pode alcançar pessoas de direito privado. Em
consonância com o CTN, Marcelo Alexandrino e Vicente Paulo:

As atribuições de arrecadar ou fiscalizar tributos, ou de executar leis,


serviços atos ou decisões administrativas em matéria tributária
(competências administrativas) podem ser delegadas a outras pessoas
jurídicas de direito público.
(...)
O §3º do art. 7º do CTN, ao afirmar que “não constitui delegação de
competência o cometimento, a pessoas de direito privado, do encargo ou da
função de arrecadar tributos” está se referindo ao papel que, hoje, é
desempenhado pelos bancos integrantes da denominada rede arrecadadora. A
redação, para variar, não é boa, mas é certo que nenhuma competência é
transferida às pessoas de direito privado que simplesmente recebem tributos
(arrecadar, nesse dispositivo, dignifica apenas “receber”). Essas pessoas (os
bancos) são meras prestadoras de serviços à pessoa política. Não têm poder
nenhum, nem a menor possibilidade de exigir tributo de quem quer que seja.
Simplesmente recebem o dinheiro e o repassam à pessoa política, em uma
típica prestação de serviço que nada tem a ver com o Direito Tributário.
(Alexandrino e Paulo, 2007, p. 150)

Em sentido contrário, outros autores defendem que é possível a ocorrência de


parafiscalidade em beneficio de pessoa de direito privado. Neste sentido, Paulo de Barros
Carvalho:
Poderão ser sujeitos ativos de tributos parafiscais as pessoas jurídicas de
direito publico, com ou sem personalidade política, e as entidades
paraestatais, que são pessoas jurídicas de direito privado, mas que
desenvolvem atividades de interesse público.
Inúmeros são os casos de tributação parafiscal no direito positivo brasileiro.
(...) o pedágio cobrado pelo DERSA (Desenvolvimento Rodoviário S.A.-
entidade paraestatal (...) e muitos outros. (Carvalho, 2008, p. 255)

No caso do ICMS, a rigor, a capacidade tributária ativa será dos estados ou do


Distrito Federal, em função da própria competência tributária que lhes outorga a Constituição
Federal.

3.2.2 Sujeito Passivo

Ao se determinar que haja incidência de ICMS sobre a circulação de mercadoria,


deve-se elucidar quem pode praticar essa circulação. Para tanto, devemos entender a
circulação de mercadorias como ato mercantil, regulado pelo direito comercial, somente
passível de ser praticado pelo estabelecimento comercial ou industrial. Aquele que aliena um
bem e não se reveste dessa qualidade não pratica o fato gerador do ICMS.

Ocorre, entretanto, que, muito embora determinados sujeitos não se enquadrem


nesse grupo (ente industrial ou comercial), poderão eles tornar-se contribuintes do imposto
com fundamento no disposto no art. 126 do Código Tributário Nacional, o qual prevê que “A
Capacidade passiva independe: (...) III - de estar a pessoa jurídica regularmente constituída,
bastando que configure uma unidade econômica ou profissional”.

Nesse sentido, serão aptos para figurar no posso passivo da relação jurídico-
tributária aqueles que, muito embora não se enquadrem no grupo já mencionado, lhes façam
às vezes, como o comerciante de fato e o comerciante irregular, desde que pratiquem ato de
mercancia ou produção com habitualidade (CARRAZZA, 2008, p. 40), elemento que irá
diferenciá-los dos que praticam o comércio de bens em caráter eventual e não contribuirão
pela circulação de mercadorias.
3.2.3 Base de Cálculo

A base de cálculo é elemento de fundamental importância, não só no que se refere


à composição da dívida, mas também no concernente à própria natureza do tributo. É
necessário que exista entre ela e a hipótese de incidência um liame lógico, uma identidade em
relação à natureza, uma vez que, caso lhes faltem coerência entre si, não será ela capaz de
medir adequadamente as dimensões do fato gerador praticado.

Quase sempre, a base de calculo consistirá em um valor em dinheiro (Carvalho,


2008, p. 361) e será estabelecida de modo a ser capaz de medir a proporção do fato imponível.
Ela deve ser a expressão pecuniária extraída do núcleo do fato tributário, a tradução de seu
valor econômico. O legislador a elegerá de acordo com aquilo que for capaz de expressar a
avaliação do objeto do tributo. Diante disso, temos que a base possui a fundamental
importância de medir o fato gerador.

A segunda função do instituto é a de compor, ao lado da alíquota, a liquidação da


obrigação. Adotada a grandeza correspondente ao tributo que servirá de base de cálculo, esta,
no caso real, adotará valor ao qual se aplicará a alíquota para que o efetivo montante do débito
seja conhecido.

Por fim, a Base de Calculo consiste no elemento da regra matriz que regula o
próprio elemento material da norma jurídica tributária. Desse modo, muito embora o texto
legal que preveja a hipótese de incidência afirme determinada conduta ou fato extraído do
mundo material, caso não se guarde relação de adequação entre tal conduta ou fato e a base de
cálculo, o tributo não será coerente.

Nesse escopo, a base de calculo terá a aptidão de, em conflito com o próprio
critério material, indicar ao aplicador se tal critério eleito deve ser mantido ou negado,
podendo, ainda, indicar o correto critério material a ser levado em consideração para fins de
verificação de incidência do tributo.
3.2.4 Alíquota

A Alíquota é a expressão percentual que se aplica à base de cálculo com a


finalidade de se obter a quantia devida a se pagar pelo tributo. Se por um lado a base de
cálculo terá seu valor variando conforme a grandeza do ato praticado, por outro lado a
alíquota será definida em lei. Em determinados tributos, ela será maior conforme for maior a
base de cálculo, é o que se chama progressividade. Em outros casos, ela será maior ou menor,
conforme o interesse social na prática tributada, caso em que temos extrafiscalidade, ou seja,
extrapolamento da função fiscal da exação.

Cabe à lei ordinária de autoria do ente competente para tratar do tributo fixar as
alíquotas aplicáveis aos fatos imponíveis, sempre se atentando aos princípios da capacidade
contributiva e do não confisco.

No que se refere ao ICMS, entretanto, não cabe ao ente competente,


exclusivamente, dispor acerca dos valores das alíquotas, uma vez que o art. 155, §2º, V, da
Constituição Federal assim dispõe:

V - é facultado ao Senado Federal:


a) estabelecer alíquotas mínimas nas operações internas, mediante resolução
de iniciativa de um terço e aprovada pela maioria absoluta de seus membros;
b) fixar alíquotas máximas nas mesmas operações para resolver conflito
específico que envolva interesse de Estados, mediante resolução de iniciativa
da maioria absoluta e aprovada por dois terços de seus membros;

Tal limitação, de prerrogativa do senado, por iniciativa de um terço dos membros,


não permite à casa eleger a alíquota do imposto, mas simplesmente estabelecer limites que
não permitam que o ente político institua alíquotas tão baixas a ponto de constituírem
incentivo abusivo ou alíquotas tão altas a ponto de exacerbar os limites razoáveis de exação
do imposto.

Neste escopo, Roque Antonio Carrazza:


Este é um nítido caso de resolução reguladora de “limitações constitucionais
ao poder de tributar”. Melhor explicitando, a Constitiução, no dispositivo em
exame, contém ma limitação à competência estadual e distrital para tributar,
por meio de ICMS, que a resolução do Senado pode regular.
É evidente que as alíquotas do ICMS são estabelecidas pelo legislador
ordinário de cada Estado-membro e do Distrito Federal. Apenas, a
Constituição deu à União, representada pelo Senado, a possibilidade de, para
evitar eventuais abusos, estabelecer parâmetros mínimos e máximos que a
legislação local deverá observar. Segundo nos parece, esta verdadeira
“válvula de escape” do sistema foi concebida para ser utilizada se houver
interesse nacional em evitar grandes disparidades entre os Estados-membros
(ou entre estes e o Distrito Federal), na tributação por via de ICMS.
Claro está que o Senado, ao desempenhar esta importantíssima tarefa, deverá
observar o princípio federativo e o princípio da autonomia distrital. Melhore
dizendo, terá que ser bastante criterioso no fixar quer as alíquotas mínimas,
quer as máximas, de modo a não anular a autonomia das pessoas que
tributam por meio de ICMS. Eventuais excessos poderão, por óbvio, ser
submetidos ao prudente crivo do STF (cf. art.102,I,”f”, da CF).(Carrazza,
2009, p. 89 e s.)

Da mesma forma, no relativo às operações estaduais, o constituinte impôs


limitações ao ente competente, desta vez estipuladas no próprio corpo constitucional, por
meio do art. 155, §2º, VI, VII e VIII, ao prever que as alíquotas aplicáveis às operações
internas não poderão ser inferiores às estabelecidas para operações interestaduais e ao impor
que se se aplicará alíquota interestadual quando o destinatário da operação for contribuinte de
ICMS, aplicando-se a alíquota interna quando não o for, cabendo, no primeiro caso, o
recolhimento do diferencial de alíquota no ente do destinatário, correspondente a diferença
entre a alíquota interestadual da origem e a alíquota interna do destino.
4 ICMS Entre Estados

Entre os tributos brasileiros, o ICMS é aquele que se reveste de maior


importância. Tal juízo se faz devido a dois relevantes fatores. O primeiro é o arrecadatório,
uma vez que o ICMS é o tributo que mais agrega aos cofres públicos no Brasil
(http://www.ibpt.com.br/img/_publicacao/13913/191.pdf, acesso em 10 de dezembro de
2012). O segundo consiste na extra fiscalidade
(http://www.direitopositivo.com.br/modules.php?name=Juridico&file=display&jid=170,
acesso em 10 de dezembro de 2012), que traz ao imposto caráter de instrumento social, como
meio de se regular o consumo do produto, extrapolando a simples função fiscal ou
arrecadatória. Por constituir um imposto de competência estadual, o ICMS possui, para os
entes federados, importância crucial em suas receitas.

Ocorre que, quando a operação que circula mercadoria o faz de modo a destinar a
outra unidade da federação o seu objeto, há uma mecânica de arrecadação distinta prevista
constitucionalmente no art. 155, VI a VIII:

VI - salvo deliberação em contrário dos Estados e do Distrito Federal, nos


termos do disposto no inciso XII, "g", as alíquotas internas, nas operações
relativas à circulação de mercadorias e nas prestações de serviços, não
poderão ser inferiores às previstas para as operações interestaduais;
VII - em relação às operações e prestações que destinem bens e serviços a
consumidor final localizado em outro Estado, adotar-se-á:
a) a alíquota interestadual, quando o destinatário for contribuinte do
imposto;
b) a alíquota interna, quando o destinatário não for contribuinte dele;
VIII - na hipótese da alínea "a" do inciso anterior, caberá ao Estado da
localização do destinatário o imposto correspondente à diferença entre a
alíquota interna e a interestadual;

De acordo com as disposições constitucionais, quando o fato gerador destina bem


ou serviço a estado distinto, caso seja o destinatário o contribuinte do imposto, deverá o
sujeito remetente recolher o imposto segundo a alíquota interestadual daquele estado. Já o
contribuinte destinatário, por sua vez, recolherá pela diferença entre a alíquota interna do
estado de destino e a alíquota interestadual do estado de origem. Segue tabela ilustrativa:
Alíquota interestadual na origem Alíquota interna no destino Diferencial de alíquota
7% 17% 10%
12% 17% 5%
7% 18% 11%

12% 25% 13%


Fonte: O Autor

O recolhimento previsto na constituição para as operações interestaduais que


sejam objetos de ICMS permite ao estado de destino do bem, onde ele completará a cadeia
comercial, arrecadar com a circulação do produto oriundo de outra unidade. Se, por um lado,
o estado fabricante deva ter recolhido em seus cofres o tributo pelo produto ali fabricado, por
outro lado, o estado de destino, onde o bem será consumido e onde se arcará com os custos e
lucros do bem, também deve receber.

Não fosse assim, caso apenas o estado fabricante fosse agraciado com
recolhimento do tributo em operação interestadual, estabelecer-se-ia um grande desequilíbrio
federativo, devido ao montante que os estados menos desenvolvidos deixariam de arrecadar
quando consumissem bens e serviços oriundos dos estados que concentram a maior parte do
investimento industrial no Brasil.

Nesse escopo, o Senado Federal, sensível às desigualdades regionais, estabeleceu,


por meio da Resolução nº 22, de 19 de maio de 1989, alíquotas interestaduais diferenciadas
para as operações que se iniciassem nas regiões sul e sudeste e destinassem bens ou serviços
às regiões Norte, Nordeste, Centro-Oeste e ao estado do Espirito Santo.

Art. 1º A alíquota do Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de


Mercadorias e sobre Prestação de Serviços de Transporte Interestadual e
Intermunicipal e de Comunicação, nas operações e prestações
interestaduais, será de doze por cento”.
Parágrafo único. Nas operações e prestações realizadas nas Regiões Sul e
Sudeste, destinadas às Regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste e ao Estado
do Espírito Santo, as alíquotas serão:
I - em 1989, oito por cento;
II - a partir de 1990, sete por cento.
Art. 2º A alíquota do imposto de que trata o art. 1º, nas operações de
exportação para o exterior, será de treze por cento.
Tal medida demonstra a necessidade de se oferecer aos estados dessas regiões
parcela significante da carga tributária dos produtos e serviços que a eles se destinam,
fundamentada na própria necessidade de custeio do orçamento estadual, que em muito
depende da arrecadação do ICMS. A participação no Produto Interno Bruto das regiões sul e
sudeste demonstra a discrepância do desenvolvimento existente entre elas e o restante do país.
As duas regiões representam 71,9% do PIB nacional, sendo que apenas os estados do Rio de
Janeiro e São Paulo concentram 46,2% do montante.
Fonte: IBGE

De acordo com o previsto na resolução, os estados menos desenvolvidos


arrecadarão uma parcela maior do tributo quando forem destinatários da circulação que tenha
origem no Sudeste ou Sul do país.

Exemplifico através das seguintes operações hipotéticas. Operação 1: circula


mercadoria do estado de São Paulo para o Estado do RJ. Aplica-se a alíquota interestadual de
12% na origem e o diferencial de 5% no destino. Operação 2: circula mercadoria do Mato
Grosso para o Acre. Igualmente, aplica-se a alíquota interestadual de 12% na origem e o
diferencial de 5% no destino. Operação 3: circula mercadoria do estado do Rio Grande do Sul
para o Estado do Matogrosso do Sul. Aplica-se a alíquota interestadual reduzida de 7% na
origem e o diferencial de 12% no destino. Operação 4: circula mercadoria do estado do Mato
Grosso do Sul para o estado do Rio Grande do Sul. Aplica-se a alíquota interestadual de 12%
na origem e o diferencial de 5% no destino.

Nota-se que, no que se refere a operações entre estados de semelhante


desenvolvimento, há privilégio para o estado que industrializa o bem, o qual receberá maior
parcela do imposto devido. Quando se trata de circulação entre unidades de distintos
patamares de industrialização, a mecânica sempre beneficiará o estado menos desenvolvido,
seja ele destinatário ou produtor da mercadoria.
5- Do Comércio Eletrônico

Ressalte-se que o recolhimento descrito acima apenas ocorre quando os sujeitos


envolvidos na circulação da mercadoria ou serviço são contribuintes do imposto. Quando a
operação tiver como adquirente da mercadoria sujeito que não seja contribuinte do ICMS,
neste caso o recolhimento será por meio de alíquota interna devida ao estado que pratica a
operação. É o caso das compras realizadas por meio de comércio eletrônico.

Ao comprar um determinado bem em loja virtual, o indivíduo domiciliado em


estado pouco desenvolvido e não contribuinte de ICMS cria uma situação distinta. Caso ele se
deslocasse até uma filial da loja em sua cidade e lá comprasse o bem, ele faria recolher em
benefício de seu estado o diferencial de alíquota referente àquela operação. Quando ele deixa
de fazê-lo e decide adquirir a mercadoria por meio do comércio eletrônico, ele exclui a filial
de seu estado do ciclo comercial e faz com que a unidade industrial que lhe vendeu o bem
tenha praticado operação diretamente com o consumidor final, não sendo aplicável a regra do
recolhimento pela alíquota interestadual, mas sim pelo recolhimento da alíquota interna cheia.

A razão disto está contida no contexto histórico em que foi promulgada a nossa
constituição, momento em que a internet ainda não havia se popularizado mundialmente,
razão pela qual é natural que o constituinte deixasse de contemplar com a atenção devida a
possibilidade da explosão do comércio eletrônico e suas consequências no campo tributário.

Ocorre que, ano após ano, o comércio eletrônico vem crescendo, gerando o
aumento da parcela do consumo brasileiro realizado através de tal prática, reduzindo, por
consequência, a parcela da prática costumeira, de comprar o produto em loja física. Diante
desta realidade, os estados que possuem menos indústrias e, por consequência, menor
estrutura em termos de comércio eletrônico, deixam de perceber imposto referente ao
diferencial de alíquota que receberiam, caso o produto tivesse sido vendido numa filial física
neles localizada.

As vantagens do comércio eletrônico para o consumidor e para a empresa são


várias, como a disponibilidade vinte e quatro horas por dia, sete dias por semana, a
possibilidade de maior desconto no produto, uma vez que não há intermediário, rapidez na
divulgação de novos produtos ou promoções, maior liquidez devido à celeridade na prática do
negocio, possibilidade de concorrência entre as lojas com um baixo custo, necessitando-se
apenas de um portal de comércio atrativo, entre outras.

Não é por acaso que a nova modalidade de comércio vem atingindo altos índices
de crescimento:

Ano Vendas em Bilhões % de crescimento


2001 0,54
2002 0,85 57,4%
2003 1,18 38,8%
2004 1,75 48,3%
2005 2,5 42,9%
2006 4,4 76,0%
2007 6,4 45,5%
2008 8,2 28,1%
2009 10,60 29,3%
2010 14,80 39,6%
2011 18,70 26,3%
2012(projeção 22,50 20,3%
) Fonte: Webshoppers

O aumento nos primeiro seis meses de 2012 foi de 21% em relação ao mesmo
período do ano anterior. Quando se colocam tais dados ao lado de uma redução de 26% da
geração de empregos e de 3,8% da produção industrial, nota-se quão grande tem sido o
crescimento do comércio eletrônico e o quanto é relevante a questão referente à receita
tributária resultante desta prática.
6 Pacto Federativo e Guerra fiscal

O objetivo de se estabelecer um estado como federação é a possibilidade de se


reunir sob um mesmo governo soberano administrações independentes que tratem com
autonomia as individualidades das diversas regiões que o compõem. Essa forma de estado
permite uma administração mais complexa e competente do estado, o que se mostra ainda
mais relevante quando se trata de um país de grandes proporções territoriais.

O estado federado tem sua origem ideológica nos movimentos de independência


dos Estados Unidos da América, que culminaram com a proclamação da independência das 13
colônias britânicas em 1776, as quais passaram a compor cada uma um distinto estado
soberano. Mais adiante, em 1777, formou-se entre os estados uma confederação, instituto que
se distingue da federação, uma vez que confere a cada ente soberania própria, mantendo-lhes
a prerrogativa de se dissociar da confederação quando lhes fosse conveniente. Enquanto que a
federação é forma de estado prevista em uma constituição, a confederação é instituída por
meio de aliança, o que não traz em seu escopo a mesma rigidez das diretrizes constitucionais.

Por fim, em 1788, surgiu o primeiro estado federado, com o fim da confederação
dos estados da América e sua reorganização sob uma mesma constituição, estabelecendo as
diretrizes federativas entre os entes integrantes.

A união de diversos estados para formar uma federação constitui movimento


centrípeto de formação do estado. A República Federativa do Brasil seguiu caminho oposto, o
movimento centrífugo, ao dividir as competências, antes concentradas, entre a União,
Estados, Distrito Federal e Municípios.

De acordo com Pedro Lenza, existem, entre todos estados federativos, alguns
pontos em comum que podem ser identificados, quais sejam:

Descentralização política: a própria constituição prevê núcleos de poder


político, concedendo autonomia para os referidos entes;
Constituição rígida como base jurídica: fundamental a existência de uma
constituição rígida no sentido de garantir a distribuição de competências
entre os entes autônomos, surgindo, então, uma verdadeira estabilidade
institucional;
Inexistência do direito de secessão: não se permite, uma vez criado o pacto
federativo, o direito de separação, de retirada. Tanto é que, só a título de
exemplo, a CF/88 estabeleceu em seu art.34,I, que a tentativa de retirada
ensejará a decretação de intervenção federal no Estado “rebelante”. Eis o
princípio da indissolubilidade do vinculo federativo, lembrando,
inclusive, que a forma federativa de Estado é um dos limites materiais ao
poder de emenda, na medida em que, de acordo com o art. 60, §4º, I, não
será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir a forma
federativa de Estado;
Soberania do Estado federal: a partir do momento que os Estados
ingressam na Federação perdem soberania, passando a ser autônomos. Os
entes federativos são, portanto, autônomos entre si, de acordo com as regras
constitucionalmente previstas, nos limites de sua competência; a soberania,
por seu turno, é característica do todo, do “país”, do Estado federal, no caso
do Brasil, a República Federativa do Brasil;
auto-organização dos Estados-membros: através da elaboração das
constituições estaduais (vide art. 25 da CF/88);
órgão representativo dos Estados-membros: no Brasil, de acordo com o
art. 46, a representação dá-se através do Senado Federal;
guardião da Constituição: no Brasil, o STF.

O sistema federativo foi adotado no Brasil em coincidência com a proclamação da


República, em 15 de novembro de 1889, sistema que foi mantido por todas as constituições
que sucederam a incorporação da nova forma de estado.

É possível retirar da Constituição Federal diversos dispositivos que expressam o


caráter cooperativo da federação que a carta prevê, oferecendo atenção à cooperação
federativa e à superação das desigualdades regionais

Partindo dessa premissa, de que se reveste o estado federado de caráter


cooperativo, deve-se buscar interpretar os dispositivos constitucionais como mecanismos de
garantia da existência de tal caráter, como o são, por exemplo, a previsão de competências
comuns e concorrentes dos art. 23 e 24 da Constituição e a distribuição das receitas oriundas
da arrecadação do imposto de renda, a ser realizada da seguinte maneira:

Art. 159. A União entregará:


I - do produto da arrecadação dos impostos sobre renda e proventos de
qualquer natureza e sobre produtos industrializados quarenta e oito por cento
na seguinte forma: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 55, de
2007)
a) vinte e um inteiros e cinco décimos por cento ao Fundo de Participação
dos Estados e do Distrito Federal;
b) vinte e dois inteiros e cinco décimos por cento ao Fundo de Participação
dos Municípios;
c) três por cento, para aplicação em programas de financiamento ao setor
produtivo das Regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, através de suas
instituições financeiras de caráter regional, de acordo com os planos
regionais de desenvolvimento, ficando assegurada ao semi-árido do Nordeste
a metade dos recursos destinados à Região, na forma que a lei estabelecer;
d) um por cento ao Fundo de Participação dos Municípios, que será entregue
no primeiro decêndio do mês de dezembro de cada ano; (Incluído pela
Emenda Constitucional nº 55, de 2007)

De tal divisão, podemos destacar a atenção dispendida aos fundos estaduais e


municipais e nos programas de financiamento ao setor produtivo das Regiões Norte, Nordeste
e Centro-Oeste, metade dos recursos destinados à região do semi-árido do Nordeste, que
reforçam a visão do federalismo como instrumento de cooperação em favor da redução das
desigualdades regionais

Não há duvidas que a Constituição buscou assegurar a saudável e cooperativa


relação entre os componentes da federação, tornando o federalismo cooperativo
desdobramento do próprio princípio constitucional do federalismo, garantindo às previsões
acerca da cooperação entre os entes estatais status de núcleo intangível da constituição,
impedindo a tramitação de emendas constitucionais propostas com conteúdo tendente à sua
abolição.

6.1 Federalismo Fiscal

O federalismo fiscal, enquanto faceta do sistema federativo, também é aspecto


fundamental de definição do estado. Além de caráter político, a organização fiscal do
federalismo faz parte do desenho do estado no que se refere à economia pública e
administração financeira. De acordo com Sérgio Prado, o federalismo fiscal pode ser assim
definido:

Nosso foco são as questões do federalismo fiscal, aqui entendido como o


conjunto de problemas, métodos e processos relativos à distribuição de
recursos fiscais em federações, de forma tal que viabilizem o bom
desempenho de cada nível de governo no cumprimento dos encargos a ele
atribuídos. Isto remete para as relações entre atribuição de impostos,
distribuição intergovernamental do gasto público e, principalmente,
transferências intergovernamentais. (Prado, 2007, p. 6)

O mesmo autor relaciona o federalismo fiscal com a esfera cooperativa do


federalismo:

A preservação, ao longo do tempo, da coesão de uma sociedade dividida em


jurisdições relativamente independentes implica, entre outros aspectos, a
constituição de instituições que incentivem e mantenham um grau elevado
de cooperação intergovernamental. Da mesma forma, é fundamental que os
sistemas fiscais e instituições vigentes garantam aos cidadãos algum grau de
equidade no acesso tanto a serviços públicos como a oportunidades de
desenvolvimento individual. Finalmente, é necessário que seja preservado
um determinado grau de autonomia dos governos subnacionais, grau este
determinado basicamente por aspectos históricos, políticos e culturais que
moldam a visão de cada sociedade sobre o papel que deve ter o governo
central em suas vidas e economia. (Prado, 2007, p. 6)

Segundo o especialista, o regime fiscal federativo pode ser resumido em alguns


conjuntos básicos de problemas técnicas e arranjos institucionais. O primeiro deles é a
estrutura de competências tributárias, ou seja, quem arrecada e legisla acerca dos tributos. O
segundo é o sistema de partilha dos recursos, a exemplo do art. 159, CF/88, e demais fontes
que tratem de repartição de receitas tributárias. Outro conjunto engloba os mecanismos de
equalização adotados pelo estado com a finalidade de reduzir as disparidades por meio do
dispêndio dos recursos fiscais. O quarto aspecto se refere aos programas de âmbito nacional e
as transferências vinculadas, protagonizadas pelo governo federal. E por fim, o ultimo
conjunto consiste nas normas e instituições que viabilizam a negociação e solução de conflitos
entre os entes federativos, em especial no relativo a recursos e encargos.

6.2 Guerra Fiscal

A realidade, entretanto, em muitos casos se apresenta totalmente oposta ao ideal


de cooperação que o constituinte almejava estabelecer entre os entes da federação. Os estados
constantemente se digladiam pela instalação de novos investimentos, mediante oferta de
incentivos fiscais em muitos casos envolvendo o ICMS, absolutamente em descompasso com
determinações legais, com o intuito de ver, mais adiante, desenvolvimento da região, geração
de empregos e aumento de arrecadação.

A lei complementar Nº 24/75 estabelece os parâmetros que deverão ser


observados quando da oferta dos chamados benefícios fiscais relativos ao ICMS:

Art. 1º - As isenções do imposto sobre operações relativas à circulação de


mercadorias serão concedidas ou revogadas nos termos de convênios
celebrados e ratificados pelos Estados e pelo Distrito Federal, segundo esta
Lei.
Parágrafo único - O disposto neste artigo também se aplica:
I - à redução da base de cálculo;
II - à devolução total ou parcial, direta ou indireta, condicionada ou não, do
tributo, ao contribuinte, a responsável ou a terceiros;
III - à concessão de créditos presumidos;
IV - à quaisquer outros incentivos ou favores fiscais ou financeiro-fiscais,
concedidos com base no Imposto de Circulação de Mercadorias, dos quais
resulte redução ou eliminação, direta ou indireta, do respectivo ônus;
V - às prorrogações e às extensões das isenções vigentes nesta data.
Art. 2º - Os convênios a que alude o art. 1º, serão celebrados em reuniões
para as quais tenham sido convocados representantes de todos os Estados e
do Distrito Federal, sob a presidência de representantes do Governo federal.
§ 1º - As reuniões se realizarão com a presença de representantes da maioria
das Unidades da Federação.
§ 2º - A concessão de benefícios dependerá sempre de decisão unânime dos
Estados representados; a sua revogação total ou parcial dependerá de
aprovação de quatro quintos, pelo menos, dos representantes presentes.

A finalidade dos estados ao conceder benefícios indiscriminados pode em alguns


casos parece legítima e até benéfica ao estado que promove o incentivo. No entanto, deve-se
lembrar que a desconcentração proporcional da produção industrial é vantajosa ao país sob o
ponto de vista do desenvolvimento de núcleos regionais, e a guerra fiscal comumente finda
em benefício dos estados mais desenvolvidos, que possuem estrutura para arcar com a
arrecadação que é dispensada, até mesmo por possuírem mais infraestrutura e em muitos
casos melhores condições de escoamento. Além do exposto, não se pode esquecer que o
prejuízo da arrecadação não deixará de produzir impacto nas políticas públicas que
repercutirão, por sua vez, na vida do cidadão.
Por esse motivo, deve-se considerar a guerra fiscal como prática, sob o ponto de
vista da política econômica nacional, prejudicial, uma vez que gera um severo desequilíbrio
no federalismo fiscal e ocorre em descompasso com as diretrizes de redução das
desigualdades regionais.
7- o CONFAZ e o Protocolo ICMS 21

A constituição estabelece por meio do art. 155, XII, “g”, que é de incumbência de
lei complementar regular a forma como as isenções, incentivos e benefícios fiscais relativos a
tributos estaduais serão concedidos e revogados mediante deliberação dos Estados e do
Distrito Federal. Disto decorre que, muito embora deva uma lei complementar estabelecer
como se dará a deliberação das unidades federadas, cabe a elas, em conjunto e por mera
discussão, como exceção ao princípio da legalidade, estabelecer e revogar isenções,
incentivos e benefícios fiscais dos impostos que lhes competem.

Muito embora tenha sido editada a Lei Complementar nº 87/96, regulando o


ICMS em território nacional, com o veto dos artigos 27 a 30 da lei, a matéria seguiu sendo
tratada pela Lei Complementar nº 24/75.

7.1 CONFAZ

De acordo com o instituto legal, as isenções relativas ao ICMS serão estabelecidas


por meio de convênios celebrados em reuniões, para as quais tenham sido convocados
representantes de todos os Estados e do Distrito Federal, sob a presidência de representantes
do governo federal. Tais reuniões são realizadas em âmbito do Conselho Nacional de Política
Fazendária, o CONFAZ.

Além do previsto na Lei Complementar nº24/75, cabe ao CONFAZ promover a


criação de Comissão Técnica Permanente (COTEPE), com a finalidade de realizar pesquisa e
tomada de decisões concernentes a algum aspecto técnico das atribuições do CONFAZ,
ressalvada a sua competência para concessão e revogação de isenções. Neste escopo foi criada
a Comissão técnica Permanente do Imposto sobre Operações Relativas à circulação de
Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de
Comunicação, a COTEPE/ICMS.
Muitas críticas têm sido tecidas em relação à atuação do CONFAZ. Nesse sentido,
o Instituto dos Auditores Fiscais da Bahia:

Três intensas décadas transformaram a vida social e econômica do nosso


País e já não se justifica a manutenção de equivocadas regras que ao final e
ao cabo pedem para ser desrespeitadas. E assim tem ocorrido ao longo da
história do Confaz. O que vem acontecendo: um Estado ou um grupo deles
pede que seja aprovado um benefício fiscal. Se apenas um Estado não
concorda, a proposta é rejeitada. O perdedor volta para seu Estado e concede
o benefício ao arrepio do Confaz. O Estado prejudicado ingressa com uma
ADI no Supremo Tribunal Federal que, de maneira uniforme, vem
declarando inconstitucional qualquer exoneração concedida sem aprovação
do Confaz. Ora, se nenhum Estado leva a questão ao Judiciário, o benefício
permanece mesmo sem a devida autorização convenial pois as sanções
previstas na LC 24/75 e a inconstitucional declaração de
inconstitucionalidade pelo Estado prejudicado, não são suficientes para
evitar estas isenções que , quase sempre, redundam em tratamento desigual
entre os contribuintes. Ocorre que sabendo da falta de efetividade dessas
decisões, todos os Estados concedem benefícios fiscais das mais variadas
formas dizem que até por ofício do Governador - preocupados apenas em
atender os seus interesses, independente do que digam ou façam outras
unidades da Federação. A dimensão destes benefícios irregulares traduz-se,
por exemplo, na salvação de alguns setores da economia que, por real
necessidade ou por lobby, são agraciados e que influenciam certos mercados.
Um dos exemplos mais recentes é a redução do ICMS na importação quando
feita pelos portos de Santa Catarina e Pernambuco. Este fato, conforme a
imprensa especializada, mudou o perfil das importações no Brasil. E apesar
do ingresso de várias ações junto ao STF para sustar aqueles paraísos fiscais,
até hoje nenhum deles foi suspenso. E mais, as empresas estão usando deste
benefício e despreocupadas quanto as decisões administrativas ou judiciais.

É necessária uma reestruturação urgente do modelo atual do Confaz. Não é


possível convivermos com um órgão que, pensado para evitar a guerra fiscal,
funcione como seu
combustível. (http://iaf.jusbrasil.com.br/noticias/2545714/confaz-o-fim-de-
um-modelo, acesso em 15 de janeiro de 2013)

Recentemente, uma nova questão foi colocada diante do CONFAZ, trata-se da


problemática envolvendo a comercialização interestadual não presencial de mercadorias. É o
caso das vendas realizadas por meio do comércio eletrônico, telemarketing ou showroom
praticadas por contribuintes residentes em estados distintos dos de produção da mercadoria.
7.2 ICMS Sobre Comércio Não Presencial

Quando um consumidor de Mato Grosso do Sul adquire mercadoria por meio de


um site que ofereça produtos de fabricação em São Paulo, pela prática comercial se encaixar
precisamente nos moldes que a constituição prevê no art. 155, §2º, VII, ”b”, aplica-se a
alíquota interna do ICMS relativa ao estado de origem, ou seja, São Paulo. Desse modo, o
estado de Mato Grosso do Sul, onde reside o adquirente do bem, nada terá recolhido.

À época da promulgação de nossa constituição, o legislador não poderia prever as


dimensões que as novas modalidades de comércio não presencial iriam adquirir, uma vez que
a internet, hoje o maior vetor deste tipo de compra, sequer era difundida. Desse modo, pela
clareza e rigidez de nossa constituição, jamais será possível que se adote uma distinta forma
de recolhimento para o caso exposto sem a aprovação de uma emenda constitucional.

O contexto que se consolidou nos últimos anos em relação ao comércio não


presencial trouxe aos estados de menor desenvolvimento industrial severo prejuízo em relação
à arrecadação do ICMS, na medida em que o contribuinte que compra um produto na internet
deixa de comprá-lo numa filial localizada em sua cidade, o que resultaria em recolhimento do
imposto em favor do estado de sua residência.

O sistema institucional do estado de direito sob o qual é regida a República


Federativa do Brasil presume o respeito ao direito que atinge, além do indivíduo, cada esfera
do poder público e exige a obediência das normas públicas e dos direitos fundamentais, razão
pela qual, ao constatar que a constituição deixa de contemplar situação que passa, com o
tempo, a se tornar relevante, os interessados (no caso do ICMS incidente sobre comércio não
presencial, os estados) devem levar ao legislativo a discussão acerca das mudanças do
ordenamento, necessárias para que se saciem as pretensões de cada ente federativo.

O Senado Federal, na condição de representante dos estados, e que em teoria atua


junto às suas bases aliadas, seria o responsável maior por se atentar à demanda a respeito da
qual os estados menos desenvolvidos vinham levantando questionamentos. Tal iniciativa não
ocorreu até que se instaurasse um contexto muito mais grave.
7.3 Protocolo ICMS 21

Diante desta nova realidade envolvendo a arrecadação do ICMS incidente sobre


bens e serviços adquiridos por meio de operações interestaduais praticadas em âmbito de
comércio eletrônico, telemarketing ou Showroom, as unidades federativas menos
desenvolvidas celebraram, no dia primeiro de abril de 2011, por ocasião da 141ª reunião do
CONFAZ, o Protocolo ICMS nº 21, que trata de políticas fiscais referentes ao contexto
explicitado.

Assinaram o Protocolo os Estados do Acre, Alagoas, Amapá, Bahia, Ceará,


Espírito Santo, Goiás, Maranhão, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Pará, Paraíba,
Pernambuco, Piauí, Rio Grande do Norte, Roraima, Rondônia, Sergipe e Tocantins, e o
Distrito Federal. As unidades fundamentaram o ato nos seguintes alicerces:

“Considerando que a sistemática atual do comércio mundial permite a


aquisição de mercadorias e bens de forma remota;
Considerando que o aumento dessa modalidade de comércio, de forma não
presencial, especialmente as compras por meio da internet, telemarketing e
showroom, deslocou as operações comerciais com consumidor final, não
contribuintes de ICMS, para vertente diferente daquela que ocorria
predominante quando da promulgação da Constituição Federal de 1988;
Considerando que o imposto incidente sobre as operações de que trata este
protocolo é imposto sobre o consumo, cuja repartição tributária deve
observar esta natureza do ICMS, que a Carta Magna na sua essência
assegurou às unidades federadas onde ocorre o consumo da mercadoria ou
bem;
Considerando a substancial e crescente mudança do comércio convencional
para essa modalidade de comércio, persistindo, todavia, a tributação
apenas na origem, o que não coaduna com a essência do principal imposto
estadual, não preservando a repartição do produto da arrecadação dessa
operação entre as unidades federadas de origem e de destino, resolve
celebrar o seguinte”.

O Protocolo estabelece que, quando houver circulação interestadual de mercadoria


adquirida por meio de comércio eletrônico, deverá o estado remetente recolher, na condição
de substituto tributário, o imposto que cabe ao estado destinatário, parcela esta correspondente
ao valor da alíquota interna desta unidade, deduzida de 7% ou 12%, conforme a origem do
bem ou serviço.
Nada mais fez o Confaz do que fazer aplicar a mecânica de recolhimento de
ICMS, referente a operações interestaduais praticadas entre contribuintes do ICMS, à pratica
do comércio eletrônico. O Protocolo afirma que as unidades federadas signatárias recolherão
como substitutas tributárias a parcela devida ao ente de destino, de modo idêntico à repartição
resultante da disposição constitucional relativa à alíquota interestadual e diferencial de
alíquota.

“Cláusula primeira. Acordam as unidades federadas signatárias deste


protocolo a exigir, nos termos nele previstos, a favor da unidade federada de
destino da mercadoria ou bem, a parcela do Imposto sobre Operações
Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de
Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação - ICMS -
devida na operação interestadual em que o consumidor final adquire
mercadoria ou bem de forma não presencial por meio de internet,
telemarketing ou showroom.
Parágrafo único. A exigência do imposto pela unidade federada destinatária
da mercadoria ou bem, aplica-se, inclusive, nas operações procedentes de
unidades da Federação não signatárias deste protocolo.
Cláusula segunda Nas operações interestaduais entre as unidades federadas
signatárias deste protocolo o estabelecimento remetente, na condição de
substituto tributário, será responsável pela retenção e recolhimento do
ICMS, em favor da unidade federada de destino, relativo à parcela de que
trata a cláusula primeira.
Cláusula terceira A parcela do imposto devido à unidade federada
destinatária será obtida pela aplicação da sua alíquota interna, sobre o
valor da respectiva operação, deduzindo-se o valor equivalente aos
seguintes percentuais aplicados sobre a base de cálculo utilizada para
cobrança do imposto devido na origem:
I - 7% (sete por cento) para as mercadorias ou bens oriundos das Regiões
Sul e Sudeste, exceto do Estado do Espírito Santo;
II - 12% (doze por cento) para as mercadorias ou bens procedentes das
Regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste e do Estado do Espírito Santo.
Parágrafo único. O ICMS devido à unidade federada de origem da
mercadoria ou bem, relativo à obrigação própria do remetente, é calculado
com a utilização da alíquota interestadual.”.

O Protocolo fundamenta a medida com base no art. 9º da Lei Complementar


nº87/96, que prevê o regime de substituição tributária. Os signatários, entretanto, demonstram
ignorar os próprios conceitos nos quais baseiam seu ato. Ocorre que a substituição tributária
consiste na transferência do ônus do cumprimento da obrigação tributária a um terceiro que
não o praticante do fato gerador, portanto, a ocorrência da substituição não modifica o Sujeito
Ativo da relação jurídica tributária.
Se o Estado de São Paulo é o sujeito ativo de direito no que se refere ao
recolhimento de ICMS incidente pela comercialização não presencial de qualquer mercadoria,
a ocorrência de substituição tributária não afastará daquele estado o direito de perceber o
tributo arrecadado. O protocolo utiliza o termo substituição para impor ao contribuinte
alienante da mercadoria o papel de substituto tributário afim de que ele recolha o imposto em
favor do estado de destino do bem.

Ademais, deve-se ressaltar que o Protocolo está em total incompatibilidade com a


previsão constitucional que, agrade aos estados ou não, é clara em determinar a aplicação de
alíquota interna quando do comércio interestadual praticado por indivíduo não contribuinte de
ICMS, como é o caso do comércio não presencial, que alavancou a feitura do Protocolo ICMS
nº 21, Confaz.

A questão se torna grave quando unidade não signatária do protocolo destina


mercadoria ou serviço a estado signatário. Por não se submeter ao contido no protocolo, o
estado de origem não irá exigir imposto em favor do estado de destino. Da mesma forma, os
estabelecimentos dos estados mais desenvolvidos não recolherão tributo como substitutos
tributários em favor do estado do consumidor, o que não constitui nada mais do que agir em
conformidade com o previsto na Constituição Federal. O Estado de adquirente, por outro lado,
por se sentir lesado com a parcela que deixar de recolher em função do comércio eletrônico, e
com fundamento no Protocolo ICMS 21 do Confaz, exige o diferencial de alíquota previsto
pelo conselho por ocasião da entrada da mercadoria no estado.

Como resultado disso, o consumidor, que sequer é contribuinte do ICMS, é


obrigado a recolher diferencial de alíquota, além da alíquota interna cheia já recolhida na
origem, para poder receber o bem, que muitas vezes fica retido pela autoridade fiscal, em total
descompasso com a recorrente jurisprudência que impede tal medida, entendimento esse já
expresso por meio da Sumula 323 do STF que afirma ser “inadmissível a apreensão de
mercadorias como meio coercitivo para pagamento de tributos”.

O imposto devido a tal operação passa de uma soma de alíquota interestadual


(7%) com diferencial de alíquota (10%) para alíquota interna na origem (17%) mais
diferencial de alíquota no destino (10%), recolhendo no total ao menos 27% do valor da
operação apenas a titulo de ICMS.
Por esta razão, e diante do fato de a maioria dos bens adquiridos via e-shop virem
dos estados que não se submeteram ao protocolo, a adoção da medida não só não contribuiu
para a solução das discrepâncias fiscais emergidas em função do crescimento do comércio
eletrônico, mas agravou a problemática, onerando o consumidor injustamente e criando
entraves para o consumo de bens por meio da internet. A medida do Confaz, tomada à
margem de qualquer formalidade constitucional, tem causado insegurança ao usuário do
comércio eletrônico, que, prejudicado, tem recorrido ao judiciário repetidamente.
8. “Sales Tax”

Os Estados Unidos enfrentam uma situação semelhante relacionada às vendas não


presenciais de mercadorias, que lá são submetidas ao tributo denominado Sales Tax,
resguardadas as diferenças entre o modelo federalista existete naquele país e no Brasil. O
Imposto é devido na comercialização de mercadorias e serviços e incide ao fim da cadeia
comercial sobre o valor da operação.

Diferentemente do que ocorre com o Value Added Tax, ou imposto sobre valor
agregado, o imposto incide apenas uma vez, e não em cada operação da cadeia comercial. A
responsabilidade referente ao recolhimento do tributo é atribuída, em alguns casos ao
estabelecimento, que é o contribuinte de direito, enquanto que em outros casos, é transferida a
responsabilidade ao consumidor, caso em que se atribui à exação o nome Use Tax, muito
embora sempre ocorra a repercussão do ônus tributário em prejuízo do adquirente, à exemplo
do que ocorre com o ICMS, no Brasil.

Quando ocorria a venda de mercadorias entre consumidor e comerciante


localizados em estados distintos, existia a obrigação de recolhimento de sales tax em favor do
estado onde habitava o comprador do bem ou serviço. O funcionamento da cobrança,
entretanto, foi questionada junto ao judiciário norte-americano, e não perdurou.

A Suprema Corte dos Estados Unidos, em 1992, decidiu que, no concernente às


vendas não presenciais, não existe a obrigação do recolhimento do tributo pelo
estabelecimento, em favor do estado de destino ou do estado de origem da mercadoria, caso
ele não possua uma filial com sede no estado de domicílio do consumidor. Assim, quando
alguém pratica comércio interestadual mediante qualquer recurso não presencial, caso o
estabelecimento possua sede na unidade do consumidor, deverá haver o recolhimento do
imposto em favor deste estado. Por outro lado, caso não possua, não incidirá qualquer imposto
sobre a mercadoria.

É o que se nota nos seguinte exemplo:

If an online retailer has a physical presence in a particular state, such as a


store, business office, or warehouse, it must collect sales tax from customers
in that state. If a business does not have a physical presence in a state, it is
not required to collect sales tax for sales into that state. This rule is derived
from a 1992 Supreme Court decision which held that mail-order merchants
did not need to collect sales taxes for sales into states where they did not
have a physical presence.
Example:
Margo is passionate about rare orchids but can't find them in Indiana, so she
orders her supplies online from an orchid supplier with headquarters in
Vermont. The supplier has all of its facilities in Vermont and collects
payment in Vermont. Margo does not have to pay Indiana sales tax (or
Vermont sales tax) on her orchids.
A few months later, the supplier opens a warehouse in Indiana to handle its
online orders for the entire country. Margo continues to order her orchids
from the headquarters in Vermont but she must now pay Indiana sales tax.
Her ride on the tax-free train is over.
For a while, some big retailers with local stores sold their products tax-free
over the Internet by creating separate legal subsidiaries to handle Internet
business. However, lawsuits by several states and pressure from the
Streamlined Sales Tax Project (a group created by states supporting the
Streamlined Sales & Use Tax Agreement, discussed below) has ended that
practice of avoiding sales taxes.
(http://www.nolo.com/legal-encyclopedia/sales-tax-internet-29919.html,
acesso em: 17/01/2013)

Diante dessa nova realidade, surgem vários desdobramentos, como, por exemplo,
a criação de pessoas jurídicas subsidiárias de grande empresas comerciantes, instauradas com
a finalidade de se efetuar vendas não presenciais destinadas a outros estados. Essa nova
empresa funciona como fachada daquela em relação a qual ela é subsidiária. Isso é feito para
que as vendas não sejam tributadas, pois essa nova empresa não possuirá sede nos demais
estados da Federação.

Além disso, ocorre clara situação de concorrência desleal, por ser mais econômico
ao consumidor adquirir a mercadoria pela internet, de uma empresa que não possua sede em
seu estado, do que comprá-la de uma loja em frente à sua casa, uma vez que neste caso,
pagaria imposto, enquanto que na venda não presencial, não.

Enquanto isso, existem alguns estados que possuem carga tributária diferente e
não implementaram o sales tax, como o Alaska, Delaware, Montana, New Hampshire e
Oregon, e por isso não são em nada influenciados pelo conflito na arrecadação do tributo.

O Congresso americano vem discutindo como resolver a situação, que desagrada


severamente os estados que possuem quantidade reduzida de grandes filiais comerciais. Em
2002, vários estados celebraram o Streamlined Sales & Use Tax Agreement, de adesão
opcional dos estados, estabelecendo entre eles o dever de recolhimento do Sales tax referente
à operações interestaduais não presenciais, mesmo quando não há sede da empresa no estado
do consumidor. Entretanto o ato não é de adesão unanime entre os estados, o que acarreta
insegurança jurídica e desequilíbrio federativo entre os entes do País.
9- Do Decreto 13.162/MS

No estado de Mato Grosso do Sul, que passou a ser signatário do Protocolo ICMS
nº 21, do CONFAZ, em 25 de abril de 2011, foi editado o decreto nº 13.162, de 27 de abril do
mesmo ano, com a finalidade de introduzir no ordenamento estadual as mudanças promovidas
pelo protocolo.

Merece citação o art. 2º, especialmente em relação ao §1º, do Decreto


mencionado:

Art. 2º A parcela do ICMS devido a este Estado nas operações de que trata o
art. 1º corresponderá ao valor resultante da aplicação da alíquota prevista
para as operações internas com a mesma mercadoria ou bem, sobre o valor
da operação de aquisição, deduzido do valor equivalente aos seguintes
percentuais, aplicados sobre a base de cálculo do ICMS devido na origem:
I - 7% (sete por cento), para as mercadorias ou bens oriundos das Regiões
Sul e Sudeste, exceto do Estado do Espírito Santo;
II - 12% (doze por cento), para as mercadorias ou bens oriundos das Regiões
Norte, Nordeste e Centro-Oeste e do Estado do Espírito Santo.
§ 1º Aplicam-se os percentuais de dedução estabelecidos neste artigo
inclusive nos casos em que o documento fiscal emitido pelo remetente da
mercadoria ou bem consignar destaque do ICMS pela alíquota aplicável às
operações internas na unidade da Federação de origem .

Preliminarmente, nos atentemos para as questões formais atinentes ao ato que


introduziu a cobrança de ICMS sobre operações não presenciais no estado. Trata-se de
Decreto, do tipo regulamentar, previsto no art.89, VII, da Constituição Estadual do Mato
Grosso do Sul, de atribuição do Governador do Estado, e com fundamento de validade, por
simetria, na própria Constituição Federal, por meio do art. 84, IV, da carta maior.

Por se tratar de decreto regulamentar, o ato legislativo se trata de ato normativo


secundário, que não possui aptidão para inovar o ordenamento jurídico. O ICMS, por previsão
constitucional, poderá ter teto e piso de suas alíquotas internas estabelecidas por resolução do
Senado Federal, e fixação das alíquotas em cada estado, obedecidas as disposições do Senado,
por meio de Lei Ordinária.
Jamais seria possível, portanto, o estabelecimento de alíquotas de ICMS por meio
de Decreto Regulamentar, uma vez que tal ato não constitui exceção ao Princípio da Estrita
legalidade. Acerca do assunto, Roque Antonio Carraza:

É evidente que as alíquotas do ICMS são estabelecidas pelo legislador


ordinário de cada Estado-membro e do Distrito Federal. Apenas, a
Constituição deu à União, representada pelo Senado, a possibilidade de, para
evitar eventuais abusos, estabelecer parâmetros mínimos e Máximos que a
legislação local deverá observar. (Carraza, 2009, p. 89)

Além da inconstitucionalidade formal pela impossibilidade de se tratar da matéria


por meio de mero Decreto Legislativo, tratemos novamente da inconstitucionalidade material
pela ofensa ao estipulado no art. 155, §2º, VII, “b”, da Constituição Federal:

VII - em relação às operações e prestações que destinem bens e


serviços a consumidor final localizado em outro Estado, adotar-se-á:

a) a alíquota interestadual, quando o destinatário for contribuinte do


imposto;

b) a alíquota interna, quando o destinatário não for contribuinte dele;

Se a constituição claramente prevê que se deve aplicar a alíquota interna devida ao


estado de origem nos casos de operações interestaduais protagonizadas por destinatários não
contribuintes de ICMS, não cabe ao Confaz e muito menos ao Governador de Estado dispor
em contrariedade.

É compreensível a inconformidade dos estados em relação à perda de arrecadação


que vinham enfrentando. Estipula-se que nos doze meses que antecederam à edição do
Decreto 13.162, o estado do Mato Grosso do Sul tenha deixado de arrecadar 43 milhões
referentes a vendas não presenciais realizadas com contribuintes de outros estados
(http://g1.globo.com/mato-grosso-do-sul/noticia/2011/08/procurador-de-ms-afirma-que-
venda-pela-internet-e-concorrencia-desleal.html, acesso em 17 de janeiro de 2013).
Entretanto, mesmo sob o argumento da ofensa às desigualdades regionais e desequilíbrio do
pacto federativo, não é permitido aos estados que se sintam ofendidos simplesmente editar
atos normativos e estabelecer exações à revelia da Constituição. Não gozam, os Estados, de
competência legislativa para dispor da questão, motivo pelo deveriam ter buscado os meios
legítimos de discutir a questão. A celebração do protocolo e a subsequente inserção de seu
conteúdo na legislação estadual fere os princípios da separação dos poderes, por estar o corpo
executivo assumindo papel de competência do órgão legislativo, e do pacto federativo, por
invadir questão relativa à esfera federal.

Acerca do §1º do art. 2º do Decreto, que afirma que o fisco deverá exigir
recolhimento relativo à diferença entre a alíquota interna do Mato Grosso do Sul e a
interestadual do estado de origem, note-se que o Governador formalizou expressa
bitributação, ao instituir a exação, no estado de Mato Grosso do Sul, de imposto já recolhido
na Unidade da Federação remetente.

O Tribunal de Justiça do Mato Grosso do Sul, de modo enfático, vem defendendo


a compatibilidade legal e constitucional do Decreto e do Protocolo ICMS nº 21, do Confaz,
nos seguintes termos:

Mandado de Segurança - N. 2011.013480-0/0000-00 - Capital.


Relator - Exmo. Sr. Des. Rubens Bergonzi Bossay.
Impetrante - Privalia Serviços de Informação Ltda.
Advogados - Renato Gomes Vigido e outro.
Impetrado - Governador do Estado de Mato Grosso do Sul e outro.
Proc.Est. - Fernando Cesar Caurim Zanele .
(...)
V O T O
O Sr. Des. Rubens Bergonzi Bossay (Relator)
Trata-se mandado de segurança com pedido liminar impetrado por Privalia
Serviços de Informação Ltda., contra ato do Secretário de Estado de Fazenda
de Mato Grosso do Sul e Governador do Estado de Mato Grosso do Sul,
alegando que as mercadorias vendidas aos consumidores finais, por meio
da internet foram apreendidas, sob o argumento de que o ICMS não foi
recolhido perante o Estado de Mato Grosso do Sul, requerendo que referido
imposto seja recolhido no prazo estabelecido nos termos da apreensão.
Aduz que o ato coator praticado pelas autoridades impetrantes está baseado
no Decreto Estadual n.º 13.162, de 27 de abril de 2011, elaborado com base
no Protocolo ICMS n.º 21, de 01 de abril de 2011, estabeleceu nova hipótese
de incidência tributária, fixou sistemática própria de cálculo e aplicação de
alíquota interestadual nas operações envolvendo bens destinados a
consumidor final não contribuinte de ICMS, em evidente bitributação.
Inicialmente analiso e decido a preliminar arguida pelos impetrados
Os impetrados arguem preliminar de carência da ação, porque a impetrante
não atacou atos concretos específicos, mas sim norma em tese.
Em que pesem os argumentos dos impetrados, referida preliminar deve ser
rejeitada, eis que o ato apontado como coator não é hipotético, mas sim real,
qual seja, a apreensão das mercadorias adquiridas através do comércio
eletrônico (internet), por consumidor final, até que seja efetuado o
recolhimento da diferença, conforme estabelecido no Decreto Estadual
n.º 13.162/2011.
Não se pode olvidar, outrossim, que o ato coator esteja baseado em ato
normativo, porém possui efeitos concretos. Tanto que as mercadorias foram
apreendidas até que sejam feitos os recolhimentos exigidos pelo Fisco
Estadual.
Portanto, a preliminar arguida deve ser rejeitada.
Quanto ao mérito, a ordem deve ser parcialmente concedida.
O ato apontado como coator está embasado no Decreto Estadual
n.º 13.162/2011, oriundo do Protocolo de ICMS/CONFAZ n.º 21/2011,
instituído com o fim de fomentar a arrecadação do ICMS no Estado de Mato
Grosso do Sul e nos demais Estados da Federação.
Embora o Protocolo n.º 21 do ICMS/CONFAZ não tenha sido feito pela
unanimidade dos representantes, tal circunstância não é capaz de invalidar a
decisão do Conselho, porquanto a unanimidade dos representantes presentes
somente se faz necessária quando a matéria tributária versar sobre concessão
de isenções, incentivos e benefícios fiscais.
No caso, então, a deliberação do Conselho do CONFAZ foi possível em
razão do disposto no inciso III, do artigo 30, do Convênio ICMS 133/97
(Regimento do Conselho Nacional de Política Fazendária – CONFAZ), que
prevê decisões do Conselho, por maioria dos representantes presentes, nas
demais deliberações.
Deste modo, diante da legalidade do Protocolo n.º 21 do ICMS/CONFAZ, o
Estado de Mato Grosso do Sul pode editar o Decreto Estadual
n.º 13.162/2011.
Por sua vez, ao analisar as obrigações tributárias definidas no Decreto
Estadual n.º 13.162/2011, vê-se que elas não contrariam a Constituição
Federal tampouco a Lei Complementar n.º 87/96, porquanto o Decreto
Estadual não cria tributo, não modifica alíquotas, nem base de cálculo e, nem
altera o sujeito passivo.
No caso, o fato gerador ocorre no local do Estado Consumidor, também
denominado de Estado de Destino, pois a circulação da mercadoria ocorre no
local onde foi feita a operação, mesmo que tenha sido de modo virtual, como
no caso vertente, onde foram feitas através de “e-comércio”.
Por sua vez, analisando a hipótese vertente, vê-se que o fato gerador para
efeitos da cobrança do imposto, bem como a definição do estabelecimento
responsável pelo recolhimento quando a mercadoria for adquirida através de
showroom, telemarketing e internet deve ser feita conforme o disposto no
artigo 11, § 3.º, I da Lei Complementar 87/96, ex vi:

“Art. 11. O local da operação ou da prestação, para efeitos da cobrança do


imposto e definição do estabelecimento responsável, é:
(...)
§ 3..º Para efeito desta Lei Complementar, estabelecimento é o local,
privado ou público, edificado ou não, próprio ou de terceiro, onde pessoas
físicas ou jurídicas exerçam suas atividades em caráter temporário ou
permanente, bem como onde se encontrem armazenadas mercadorias,
observado, ainda, o seguinte:
I – na impossibilidade de determinação do estabelecimento, considera-se
como tal o local em que tenha sido efetuada a operação ou prestação,
encontrada a mercadoria ou constatada a prestação.”

Logo, ao contrário do que afirma a impetrante, o sujeito passivo da


obrigação tributária é a empresa que vende ao consumidor final as
mercadorias por eles adquiridas através de showroom, internet e
telemarketing e, o local do fato gerador é o local em que tenha sido efetuada
a operação.
Deste modo, aplica-se o disposto no artigo 155, VII, “a” da CF/88, ou seja, a
arrecadação do ICMS deve ser dividida entre o Estado de Origem e o de
destino da mercadoria, sendo que o Estado de Destino recebe a diferença
entre a alíquota interestadual e a sua alíquota interna.
Aliás, assim dispõe o artigo 2.º e incisos do Decreto Estadual, ex vi:

“Art. 2º A parcela do ICMS devido a este Estado nas operações de que


trata o art. 1º corresponderá ao valor resultante da aplicação da alíquota
prevista para as operações internas com a mesma mercadoria ou bem, sobre
o valor da operação de aquisição, deduzido do valor equivalente aos
seguintes percentuais, aplicados sobre a base de cálculo do ICMS devido na
origem:I - 7% (sete por cento), para as mercadorias ou bens oriundos das
Regiões Sul e Sudeste, exceto do Estado do Espírito Santo;II - 12% (doze
por cento), para as mercadorias ou bens oriundos das Regiões Norte,
Nordeste e Centro-Oeste e do Estado do Espírito Santo.§ 1º Aplicam-se os
percentuais de dedução estabelecidos neste artigo inclusive nos casos em
que o documento fiscal emitido pelo remetente da mercadoria ou bem
consignar destaque do ICMS pela alíquota aplicável às operações internas
na unidade da Federação de origem.§ 2º Para efeito do disposto neste
artigo, quando verificado o subfaturamento ou a bonificação ou o desconto
injustificado, deve ser:I - observado, no caso de subfaturamento, o preço
corrente da mercadoria ou bem no mercado de Mato Grosso do Sul ou o
Valor Real Pesquisado, se houver, para apuração da parcela do imposto
devido a este Estado;II - desconsiderado o valor relativo à bonificação ou
ao desconto injustificado.
Portanto, a arrecadação do ICMS com fulcro no Decreto Estadual
n.º 13.162/2011 não inova o ordenamento jurídico, pois está em
conformidade com o disposto no artigo 155, VII, ‘a” da Constituição Federal
de 1988 e artigos 4.º, 11 e 13 da Lei Complementar n.º 87/96.
Assim, sendo a alíquota de caráter interestadual, há apenas um recolhimento
com divisão do imposto entre os Estados envolvidos na operação. Portanto,
não há se falar em bitributação.

Por todas as razões já expostas no capitulo, precisamos discordar das razões


apresentadas pelo Tributal de Justiça de MS.

Ainda em relação ao Decreto Regulamentar nº 13.162, o Conselho Federal da


Ordem dos Advogados do Brasil propôs em 25/08/2011 ADIN 4642 em face do Governador
do Estado de Mato Grosso do Sul, alegando a inconstitucionalidade do ato em relação a seu
inteiro teor. A Procuradoria Geral da República emitiu parecer favorável à
inconstitucionalidade e o processo encontra-se aguardando julgamento.

O STF também vem se envolvendo na questão, tendo, em 15 de novembro de


2012, reconhecido por unanimidade a repercussão geral da matéria relativa à cobrança de
ICMS sobre operações realizadas em âmbito de comercio eletrônico no recurso extraordinário
nº 680089 envolvendo o Estado de Sergipe.
Na tentativa de por fim à questão, o Senador Delcídio Amaral propôs a Emenda
Constitucional nº 103/2011, com o seguinte texto:

Art. 1º O § 2º do art. 155 da Constituição Federal passa a vigorar com o


acréscimo do seguinte inciso:
“Art.
155.......................................................................................
§2º................................................................................................
VIII-A – na hipótese da alínea “b” do inciso VII, quando a operação
interestadual ocorrer de forma não presencial, caberá ao Estado de
localização do destinatário parte do imposto a ser definida por resolução do
Senado Federal, de iniciativa do Presidente da República ou de um
terço dos Senadores, aprovada pela maioria absoluta de seus membros,
e na forma a ser estabelecida por deliberação dos Estados e do Distrito
Federal, nos termos do disposto no inciso XII,
“g”; ...................................................................................................”(NR)
Art. 2º Até que seja definida por resolução do Senado Federal, na
hipótese da alínea “b” do inciso VII do § 2º do art. 155, quando a operação
interestadual ocorrer de forma não presencial, caberá ao Estado de
localização do destinatário setenta por cento do imposto correspondente à
diferença entre a alíquota interna e a interestadual, na forma a ser
estabelecida por deliberação dos Estados e do Distrito Federal, nos termos
do disposto no inciso XII, “g”, do mesmo § 2º do art. 155 da Constituição
Federal. Art. 3º Esta Emenda Constitucional entra em vigor na data de sua
publicação.

A Proposta de Emenda Constitucional passou pela Comissão de Constituição e


justiça e foi aprovada em primeiro e segundo turnos no Senado, tendo sido encaminhada à
Câmara dos Deputados para apreciação.

Caso seja aprovada, a Emenda Constitucional resolveria a questão, incumbindo o


Senado Federal, mediante resolução, de definir quanto do ICMS recolhido na operação
interestadual não presencial será recolhido em favor do estado de destino. Até que seja
emitida a resolução, essa quantia corresponderia a 70% da diferença entre a alíquota
interestadual do estado de origem e a alíquota interna do estado de destino.
Bibliografia

ÁVILA, Humberto. Teoria dos princípios. 5 ed. São Paulo, Malheiros. 2006. 176 p.

E-Bit, Notícias, disponível em :http://www.ebitempresa.com.br/noticias-1.asp. acesso em 10 de dezembro de


2012.

Batista, Daiane Carvalho, A Guerra Fiscal Interestadual do ICMS no Comércio Eletrônico, Disponível em:
http://www.ambito-juridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=10993&revista_caderno=26.
acesso em 10 de dezembro de 2012.

CARRAZA, Roque Antonio. ICMS. 13 ed. São Paulo: Malheiros. 2008. 648 p.

CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 20 ed. São Paulo: Saraiva, 2008. 592 p.

CNM, A Carga Tributária Bruta Brasileira de 2010, Disponível em:


http://portal.cnm.org.br/sites/5700/5770/09052011_coletiva_CTBB.pdf. acesso em 10 de dezembro de 2012.

CREPALDI, Silvio Aparecido, Aspectos Doutrinários da Regra Matriz de incidência tributária: uma abordagem
analítica. Disponível em: http://www.jurisway.org.br/v2/dhall.asp?id_dh=1049. acesso em 10 de dezembro de
2012.

Galvan, Ana Kerlen, A Extrafiscalidade Tributária do ICMS no Incentivo à Proteção do Meio Ambiente,
Disponível em: http://www.direitopositivo.com.br/modules.php?name=Juridico&file=display&jid=170IBGE,
Região norte aumenta participação no PIB nacional. Disponível em:
http://www.ibge.gov.br/home/presidencia/noticias/noticia_visualiza.php?id_noticia=2265&id_pagina=1. acesso
em 10 de dezembro de 2012.

NETO, Ernesto Scardovelli. Regra Matriz de Incidência Tributária. Disponível em:


http://www.slideshare.net/netoscardovelli/aula-9-regra-matriz-de-incidncia-tributria-1464212. acesso em 10 de
dezembro de 2012.

Luna, André Henrique de Arruda, O comércio Eletrônico e a Guerra Fiscal, Disponível em:
http://jus.com.br/revista/texto/19010/o-comercio-eletronico-e-a-guerra-fiscal. acesso em 10 de dezembro de
2012.

SOUZA, Cecília Priscila de, Norma Jurídica Tributária - Análise pelo método Hermenêutico-Analítico.
Disponível em: http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?
n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=10704. acesso em 10 de dezembro de 2012.

Você também pode gostar