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A normativa anti-drogas (lei 11.343/06) prevê tipos penais complexos em seu corpo normativo, dentre
eles a previsão da conduta típica do tráfico ilícito de entorpecentes, insculpido no Art.33, o qual prevê mais de 10
(dez) verbos nucleares que descrevem ações instantâneas ou permanentes que caracterizam a mercância ilícita de
entorpecentes.
Neste sentido, nota-se a complexidade pretendida pelo legislador quando da tratativa do “problema das
drogas” no direito pátrio, além da expansividade das condutas caracterizadoras do crime.
Cogita-se que teria o legislador pretendido uma “ampla punitividade” das condutas relacionadas à
circulação de materiais entorpecentes, fator que se amolda a lógica apresentada a partir do momento que verifica-
se a equiparação da conduta de “oferecer drogas”, ainda que a título gratuito, ao tráfico de drogas, ainda que com
menor repressividade.
Estendendo-se na política de repressão às drogas, previu o legislador o tipo de “portar drogas para uso
próprio”, previsto no art.28 da lei em comento,in verbis:
Nota-se, ab initio, que a norma anti-drogas, apesar de possuir dispositivos demasiadamente repressivos,
com penas desproporcionalmente altas, noutros momentos vale-se de tratamento mais brando, como é o caso do
dispositivo colacionado.
Pretendeu o legislador, assim, dar tratamento mais humanitário ao agente que pratica a conduta prevista
no art.28, considerando que este encontra-se, em realidade, não na situação de agente social estigmatizador, que
detém o domínio da criminalidade e perversidade inerentes a criminalidade de colarinho azul, mas sim ao sujeito
que, comumente por ser dependente químico, necessita de tratamento adequado e reprimendas penais mais
brandas.
Portanto, concluiu, de forma razoável, pela não previsão de pena privativa de liberdade para a conduta
típica em apreço.
Este foi o tema apreciado no HC nº 521.181/SP, decidido pelo Supremo Tribunal Federal em 30/10/19,
sob relatoria da Ministra Laurita Vaz, o qual segue ementado:
Apreciado o tema com louváveis e cristalinos apontamentos pela Corte Suprema, decidiu-se
que, por motivos de proporcionalidade “sistêmica”, não se mostraria razoável aplicar a reincidência no
caso em espécie em virtude de prévia condenação por crime que não prevê pena privativa de liberdade.
Salientou-se o paralelo entre o delito do Art.28 e as contravenções penais, ao passo que ambas
espécies criminosas não preveem penas privativas de liberdade de detenção ou reclusão, mas tão
somente, no caso do segundo, pena de prisão simples.
Neste sentido, por ambos não possuírem previsão de penas privativas de liberdade strictu sensu,
assim como as contravenções penais não geram reincidência, o delito de porte de drogas para uso
próprio também não manteria em seu arcabouço o ônus de gerar os efeitos deletérios deste instituto.
Logo, entende-se que a supressão dos efeitos da reincidência nas condenações por contravenção
penal dever-se-ia sobremaneira a própria definição de crime, exposto no art.1º da Lei de Introdução ao
Código Penal, fato este que se estende também, pelas mesmas lógicas aduzidas, ao delito de porte de
drogas para uso próprio.
Art.1º do decreto-lei 3.914/41:
A luz do exposto nos surge a provocação que indaga acerca da possibilidade da extensão
desta mesma interpretação as hipóteses de substituição na pena privativa de liberdade pela pena
restritiva de direitos, com fulcro no Art.44 do Código Penal.
Seguindo esta linha, mostra-se razoável concluir que o fundamento da pena privativa de
liberdade é, portanto, a lesividade da conduta, resultando numa hierarquia de cumprimento da
pena, reservando-se as penas mais graves para as condutas mais gravosas.
Referências:
[1] BRASIL. Congresso Nacional. Decreto-lei nº 9.914 de 9 de Dezembro de 1941. Lei de introdução
ao Código Penal. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del3914.htm.
Acesso em: 7 de nov. 2019.
[2] BRASIL. Congresso Nacional. Lei nº 11.343 de 23 de Agosto de 2006. Institui o Sistema Nacional
de Políticas Públicas sobre Drogas - Sisnad; prescreve medidas para prevenção do uso indevido, atenção
e reinserção social de usuários e dependentes de drogas; estabelece normas para repressão à produção
não autorizada e ao tráfico ilícito de drogas; define crimes e dá outras providências. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/lei/l11343.htm . Acesso em: 7 de nov.
2019.