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AS CRIPTOMOEDAS FRUTO DE CRIME PODEM SER BLOQUEADAS?

Pode-se afirmar que as criptomoedas são uma consequência natural do


avanço das tecnologias utilizadas para aperfeiçoar as operações financeiras e,
portanto, são representantes do progresso necessário para que haja o
fortalecimento dos meios digitais de negociação monetária, a fim de se
esquivar dos obstáculos contidos no mercado financeiro comum, tais como a
inflação da e as elevadas taxas bancárias.
Entretanto, neste mesmo contexto otimista que se apresenta, também
surgem diversos incômodos para as empresas e pessoas que utilizam
criptoativos rotineiramente.
Dentre eles está, exatamente, a impossibilidade de se rastrear
eficazmente os ativos negociados pois, apesar das negociações estarem
disponíveis em um grande bloco público (block-chain), não é possível verificar
os destinatários e remetentes dos montantes.
E isto leva a outro problema que precisa ser enfrentado: caso os valores
negociados via block-chain com criptoativos – ou até mesmo NFTs, outra
espécie de ativos negociados por meio desta tecnologia – sejam produto de
crime, como o Estado poderá alcançar esse capital para garantir eventual
ressarcimento, ou até mesmo para resguardar a própria integridade do sistema
financeiro nacional haja vista que, em algum momento, estes ativos sujos irão
voltar à circulação no mercado formal.
Na sistemática do Código de Processo Penal Brasileiro, o sequestro de
valores – ou bloqueio, na linguagem popular – pode ser determinado pelo Juiz
competente, após requerimento do Ministério Público ou da autoridade policial,
devendo recair sobre os ativos que sejam (alegadamente) fruto de infração
penal.
É a situação, por exemplo, dos valores auferidos por um agente que
praticou o crime de estelionato e obteve certa quantia a qual é, portanto,
maculada, por ser lucro de uma prática criminosa.
Nesta linha, esta quantia poderia sofrer restrições mediante bloqueio
judicial, no qual o magistrado envia ofícios à instituições bancárias ordenando
que estas indisponibilizem os valores custodiados em seus cofres.
Todavia, este tramite é ineficiente quando os valores que são
decorrentes de atividades ilícitas estão convertidos em criptomoedas. Seria o
caso, à guisa de exemplo, de esquema de pirâmide financeira com o uso de
criptoativos em que as moedas digitais foram adquiridas com dinheiro fruto do
esquema fraudulento e, deste modo, são também maculadas.
Neste cenário, a autoridade judiciária encontraria dificuldades para
efetivar o bloqueio das criptomoedas, pois uma de suas características é a de
que estão afastadas da tutela estatal, visto que não são custodiadas em
instituições financeiras como bancos ou corretoras.
A única exceção em que seria possível aplicar o trâmite legal para o
efetivo bloqueio dos valores seria a situação em que os ativos digitais estão
custodiados nas contas de uma exchange – espécie de instituição que faz a
intermediação das operações via block-chain – que se subordine à ordem da
autoridade judicial, dando cumprimento ao bloqueio.
Todavia, para isto, é preciso que as moedas estejam em poder da
exchange, bem como as chaves privadas para a sua negociação, o que não é
uma realidade na maioria das vezes.
Ademais, é importante que se diga que grande parte das
movimentações criminosas com criptomoedas não utilizam empresas
intermediárias para que se efetivem, sendo realizadas por operações peer-to-
peer (par-a-par, do inglês) diretamente de um usuário a outro e, desta maneira,
estão absolutamente distantes de qualquer ordem judicial de bloqueio.
Em conclusão, é certo que os problemas atinentes ao procedimento de
bloqueio de criptomoedas precisam ser enfrentados, sendo certo também que
a ausência quase absoluta de regulamentação do uso destes ativos financeiros
digitais também influencia, em muito, para estas e outras dificuldades rotineiras
na utilização das moedas digitais.
Apesar disto, há que se admitir que as tecnologias estabelecidas para a
operacionalização de criptoativos não admitem a efetivação de medidas
judiciais restritivas, de forma que é necessário que se busque outros meios de
combate às práticas criminosas perpetradas neste contexto digital.

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