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DESAFIOS DAS CRIPTOMOEDAS

Trabalho realizado por Marco António Lopes Correia; nº 64552;


PA08, turma A, 3º ano a licenciatura de Direito

Cadeira: Economia Internacional Regente: Professor Pedro


Infante Mota Assistente: Professor Nuno Sálpico

Faculdade de direito da universidade de Lisboa


Ano Letivo 2022/2023

1
INDÍCE

Introdução: ………………………………… 2
Criptomoedas, o que são: …………………...3
Criptomoedas são moedas? …………………4
Consequências económicas da ascensão das
criptomoedas………………………………...5
Conjuntura regulatória das criptomoedas-
estado do problema: ………………………...7
Orçamento de estado 2023 ………………….8
Desafios à regulação: ……………………….9
Criptomoedas e o risco de violação de acordos
do OMC: ………………………………….. 11
Conclusão…………………………………..14
BIBLIOGRAFIA …………………………..15

2
Introdução

O presente trabalho tem como tema principal as Criptomoedas.


As criptomoedas surgiram após a crise financeira de 2008, onde uma desordem
monetária no sistema financeiro causou uma crise económica mundial. Umas das resposas
a esse colapso financeiro foi a criação de um novo tipo de dinheiro totalmente digital. as
chamadas criptomoedas. Desde esse momento, as criptomoedas têm sido cada vez mais
procuradas,e utilizadas em transações comerciais e em investimentos, havendo mesmo
quem tenha arrecadado verdadeiras fortunas em virtude da valorização da cotação de
certas criptomoedas, como o Bitcoin.
O fenómeno das criptomoedas tem suscitado, um crescente interesse tanto entre
potenciais investidores, como no meio académico e no plano politico. Neste trabalho não
vou apresentar a formula para enriquecer - essa se a descobrisse guardaria para mim - mas
irei abordar alguns pontos indissociáveis das criptomoedas, como alguns benefícios,
possíveis perigos e sobretudo questões questões relacionadas com a suposta (ou não)
necessidade de regulação, que tem sido um tema em cima da mesa, em qualquer debate
que se discuta criptomoedas.

3
Criptomoedas, o que são:

Em 2012, o Banco Central Europeu definiu moeda virtual como um tipo de dinheiro
digital, o qual é emitido e controlado por quem o desenvolve 1 e utilizado e aceite entre
um número de elementos de uma comunidade virtual específica. A criptomoeda é, um
tipo de moeda digital, gerada eletronicamente e de forma descentralizada, sem que haja
uma entidade intermediária. Ligado ao conceito de criptomeda surge o blockchain.
Blockchain é um protocolo de segurança, que tem como objetivo usar a a descentralização
como medida de segurança. Uma blockchain é constituída por blocos de informação,
interligados por elos, os quais não podem ser alterados, sob pena de alterar toda a cadeia
de blocos. No caso da Bitcoin2, a informação constante dos “blocos” será, por exemplo,
a identificação das carteiras de origem e de destino das transferências, bem como o valor
transacionado. Em suma, uma criptomoeda é uma moeda digital, descentralizada e que
não necessita de terceiros para funcionar. Quer isto dizer que quem utiliza criptomoeda,
não fica sujeito à dependência dos bancos, corporações ou governos para movimentar
dinheiro.

Criptomoedas são moedas?

Para que as criptomoedas sejam efetivamente consideradas moedas tem de estar


preenchidos as 3 funções básicas da moeda3, nomeadamente: meio de pagamento, reserva
de valor e unidade de conta.
i)meio de pagamento- O facto de as criptomoedas serem usadas essencialmente como
transferências realizadas entre investidores e não enquanto meio de pagamento, tem
levado a que as criptomoedas sejam mais identificadas como ativos de investimentos. Ora
a mim, parece-me que este argumento não é suficiente para que se conclua que as

1
A moeda digital não emitida ou garantida e consequentemente controada por um Banco Central
2
Bitcoin, é a criptomoeda mais usada e a mais celebre entre os utilizadores de moedas digitais.
3
Fernando Araújo, Introdução à economia, (p.824), (3ª edição. Reimpressão 2021)

4
criptomoedas não tenham a natureza de moeda. Efetivamente, uma vez que o
processamento das transações em criptomoedas poderá ser demorado e exige alguma
burocracia contribui para que estas se tornem menos atrativas para pagamentos
“imediatos”. Porém, tal realidade não implica que as criptomoedas não sejam aceites
como meios de pagamento. A verdade é que já são várias as plataformas que aceitam
pagamentos em criptomoedas, e como tal, reduzir as criptomoeadas a um ativo
especulativo, com base neste argumento, é descaracterizar a realidade- as criptomoedas
são usadas e aceites como meio de pagamento.
ii) Reserva de valor- Em relação à reserva de valor, a principal critica ás criptomoedas
é que sendo estas armazenadas em carteiras digitais, são bastantes vulneráveis a ameaças
cibernéticas, diminuíndo a sua segurança e, logo comprometendo a sua capacidade de
serem utilizadas enquanto reservas. Nos dias de hoje, este argumento carece de qualquer
sentido. Com a digitalização da moeda (as verdadeiras moedas) existe, igualmente,
vulnerabilidade associada ao “hacking”.
iii) unidade de valor: Sem prejuízo do referido anteriormente, a elevada volatilidade das
criptomoedas constitui um obstáculo a que esta seja considerada medida de valor, o que
constitui um desafio à sua função enquanto unidade de conta. Torna-se, portanto, bastante
difícil de justificar o enquandramento das criptomoedas no conceito económico de
moeda.

Consequências económicas da ascensão das criptomoedas

Embora não considere as criptomoedas, de acordo com a teoria da moeda atrás


referido, verdadeiras moedas em sentido técnico, é importante realçar que as
criptomoedas constituem um meio de troca e um sistema de pagamentos eletrónico. Fazer
transações através de meios técnicos para além de eliminar alguns custos consideráveis
relativo ás transaçoes, implica a eliminação do intermediário baseado na confiança,
evitando qualquer dependência do sistema bancário. Depender de um intermediário para
transações financeiras traz custos de ordem econômica e de privacidade – Pense-se por

5
exemplo que uma simples conta bancária para além de estar sujeitas a diversas taxas,
exigem a exposição de informações pessoais dos usuários a terceiros.
Fernando Ulrich4 divide os impactos sobre a economia, em algumas frentes, que são
gerados pelos menores custos de transação proporcionados pelo bitcoin 5.
Poderá viabilizar oportunidades para negócios que tenham margens pequenas de
lucro, procurando redução de custos de transação em relação às opções de pagamento
eletrônico, como cartões de crédito. Pequenos comerciantes que desejam oferecer aos
seus clientes a opção de pagamento com cartões de crédito, ficam sujeitos ao pagamento
de uma variedade de taxas de autorização, taxas de transação, taxas de extrato, entre
outras. Essas taxas rapidamente se poderão tornar encargos significativos nos custos do
negócio. A bitcoin, substituindo o pagamento em cartão de crédito, poderá desta forma
potenciar o aparecimento de pequenos negócios.
O bitcoin também tem um potencial de melhorar a qualidade de vida dos mais
pobres no mundo, localizados em países em desenvolvimento, uma vez que permite a
realização de operações bancárias seguras onde os modelos tradicionais de instituições
bancárias têm dificuldade de se estabelecer 6. No Quênia7 o sistema de pagamentos através
de telefonia móvel M-pesa processa 33,6 bilhões de dólares, correspondendo a 31% do
PIB do pais. A adoção do Bitcoin poderia ampliar a efetividade desse sistema. Apesar
desta ideia defendida por alguns economistas(neste caso, Fernando Ulrich) coloco
reticências ao impacto do bitcoin na melhoria da qualidade de vida das populações destas
áreas, visto estarem em causa países limitados no acesso à internet e pessoas sem
capacidade de adquirir o equipamento necessário
Em relação à estrututa política, o Bitcoin prescinde de quaisquer normas ou
convenções sociais. A sua arquitetura tem na base regras predeterminadas com
fundamentos matemáticos. A ausência da necessidade de intermediários poderá significar
por um lado, que o bitcoin pode ser um meio de contornar imposições de governos
opressores, mas também de encorajar atividades ilegais. A movimentação de valores de
forma discreta, com a garantia de quase anonimato absoluto, é um atrativo para o
crescimento de atividades criminosas como a lavagem de dinheiro ou compra e venda de

4
Fernando Ulrich, Bitcoin A moeda na era digital,(p.23 e seg.) (1ª Edição, 2014)
5
Partir da Bitcoin e generalizar para as restantes criptomoedas faz sentido visto que a Bitcoin é a
principal criptomoeda usada.
6
Esta carência das instituições financeiras tradicionais verifica-se provavelmente porque seja bastante
custoso servir estas áreas pobres e rurais
7
Informação retirada em: Jemuel Paulo Faé, A ascensão das criptomoedas:consequências para o regime
monetário internaciol (pagina 31)

6
produtos e serviços ilícitos. Um exemplo do uso das criptomoedas em atividades ilícitas
é o caso do site Silk Road 8, no qual se podia efetuar encomendas de estupefacientes.
A consciência das práticas criminosas associadas às criptomoedas, aliada à enorme
volatilidade da mesma9 e a diminuição da soberania do estado- resultante da ausência de
controlo sobre os volumes transacionados- tem levado ao incentivo à regulação das
criptomoedas que irei abordar a seguir.

Conjuntura regulatória das criptomoedas: estado do problema

Como já vinha mencionando anteriormente, o fenómeno das criptomoedas tem sido


perspetivado por parte de várias entidades, autoridade e autores. Estes pretendem
colmatar os perigos resultantes desta tecnologia.
Mesmo que exista quem defenda um espaço livre de regulação 10, a esmagadora
maioria dos autores sustenta o inverso. E como tal tem havido a tendência crescente de
preocupação sobre esta temática. Para compreendermos um pouco mais a fundo a
problemática, façamos agora uma breve referencia aos modelos regulatórios de alguns
diferentes ordenamentos jurídicos em apreço.
A União Europeia tem efetuado diversos enquadramentos legais quantos aos
instrumentos do sistema monetário. Porém, referente às criptomoedas não existe qualquer
entendimento quanto ao seu enquadramento legal. Os trabalhos realizados, até ao
momento, têm sido sobretudo de natureza preparatória, sendo emitidos comunicados e
orientações gerais pelas diversas entidades competentes de forma a enquadrar a questão.
Foi debatido a abrangência das criptomoedas à diretiva 2007/64/CE que diz respeito aos
sistemas de pagamentos, como também à segunda Diretiva 2015/2366 sobre os serviços
de pagamento, concluindo-se o não enquadramento no âmbito das mesmas. O banco
central europeu11 revelou as primeiras preocupações com” esquemas de moedas virtuais”,

8
As autoridade norte-americanas fecharam o site em 2013, mas a existência deste tipo desites que
permitem, através do Bitcoin, o acesso a produtos e serviços ilícitos é bastante recorrente.
9
Coloca preocupações quanto à tutela do investidor
10
Nikolei Kaplanov, Nerdy Money: Bitcoin, The Private Gigital Currency, and the case against its
regulations, (p.111-174)(2012)
11
No relatório “Virtual Currency Schemes” (2012)

7
considerando, contudo, que estas não repesentavam um risco à estabilidade de preços
desde que se mantivessem num nível baixo, embora pudessem constituir um desafio às
autoridades nacionais pela possibilidade de serem usadas em atividades ilícitas. A
autoridade Bancària Europeia, que acompanha e realiza trabalhos regulares sobre
produtos e serviços inovadores, em 2014 fez um apelo ao legislador europeu, no sentido
em que os participantes no mercado direto de trocas de moedas fiduciárias e moedas
virtuais fossem entidades ao abrigo da Diretiva (EU) 2015/849, cujo propósito
compreende o combate ao branqueamento de capitais. Todavia, na Diretiva 2018/843, de
30 de maio de 2018, o legislador europeu integrou de certa forma, as criptomoedas no seu
escopo, na utilização do sistema financeiro para efeitos de branqueamento de capitais ou
de financiamento do terrorismo, introduzindo alterações que contemplam esta nova
realidade, no enquadramento jurídico comunitário que era vigente (Diretiva 2015/849).
Em Portugal, o nosso ordenamento jurídico não comtempla nenhum preceito a
regular esta matéria. As entidades reguladoras e supervisoras do sistema monetário
financeiro têm realizado diversas comunicações com o intuito de alertar os consumidores
para o potencial de risco de compra e venda de criptomoedas. 12. Não obstante, embora
não exista no nosso ordenamento jurídico qualquer legislação da qual resulte a ilicitude
da aquisição, detenção e transação de criptomoedas, este segmento do setor financeiro
não cai num vazio legal, já que são aplicáveis, supletivamente, as leis europeias. Quando
falo que, em Portugal, existe um vazio legal, refiro-me ao presente. O Orçamento de
estado para 2023 prevê algumas inovações interessantes em relação às criptomoedas, e
que mencionarei a seguir.
O Japão é dos países mais evoluídos no que diz respeito às criptomoedas. Existe a
regulação das criptomoedas na Lei de Serviços de pagamento nº 59 de 2009, sendo
obrigatório o registo dos serviços de cambio de moeda virtual. 13 O ordenamento jurídico
japonês, prevê igualmente disposições penais 14 relativas a violações no âmbito das
criptomoedas.
Por sua vez a legislação chinesa é bastante rigorosa e proíbe as atividades em
criptomoedas. As criptmoedas são ilegais na china.

12
Será de mencionar a recomendação do Banco de Portugal, de 10 de março de 2015.
13
O registo deve ser efetuado no Financial Services Agency- agência responsável pela estabilidade do
mercado financeiro, oferencendo proteção aos investidores
14
Tais como, pena de prisão até 3 anos ou multa até ao valor de 3 milhões de Yens

8
Orçamento de estado 2023:

O governo, na proposta de orçamento de estado para 2023 dá atenção às


criptomoedas. Ora faz todo o sentido falar desta proposta, entretanto aprovada pela
assembleia da républica, pois 2023 será o ano em haverá pela primeira vez regulação
expressa das criptomoedas em Portugal.
O que o governo propõe é um novo regime tributário dos criptoativos15, que desde
logo, prevê alterações ao nível do IRS. Os portugueses quando forem fazer o IRS terão
de declarar as operações de venda de criptomoedas que tiveram ao logo de todo o ano.16
O sistema fiscal institui também uma taxa de 28% aplicada a todos os benefícios oriundos
de criptoativos. As operações relacionadas com a emissão de criptomoedas passam a ser
consideradas atividades comerciais e industriais. Por fim a proposta em causa prevê
também expressamente, a tributação das transmissões gratuitas de criptoativos, sujeita
estas transmissões ao imposto de selo com uma taxa de 10%, bem como a incidência de
imposto de Selo sobre as comissões cobradas na intermediação relativa as criptomoedas,
sujeitando estas a uma taxa de 4%.
A instabilidade da futura tributação da criptmoeda já se faz sentir, e inclusive já
levou pessoas que saír do nosso pais quando a possibilidade de regulação surgiu 17.

Desáfios à regulação:

Apesar de a regulação ser a principal resposta equacionada para atender aos desafios
impostos, é importanto referir que o facto de se tratar de uma temática transnacional exige
que sejam discutidas questões, como a capacidade de se conseguir dar uma resposta ao

15
A proposta vale-se do conceito de criptoativo que é mais abrangente que criptomoeda. A
criptomoeda é um tipo de criptoativo.
16
A perceção que tenho da proposta é que em 2023, aquando da feitura do IRS de 2022, terão de ser
declaradas as operações de 2022. A ser assim, parece-me que se irão levantar duvidas de
constitucionalidade em virtude da proibição retroativa de impostos- artigo 103 da CRP
17
Tal como já referiu o porta voz da da Federação Portuguesa das associações de criptoeconomia-
https://expresso.pt/economia/orcamento-do-estado/2022-10-12-Alteracoes-fiscais-as-criptomoedas-
agradam-ao-setor-mas-incerteza-ja-fez-estragos-Houve-ate-pessoas-que-ja-sairam-do-pais-7974d2a4

9
nível nacional, mas também questões relacionadas como a necessidade de cooperação ao
nível internacional, procurando a possibilidade de criação de uma regulação de forma
supranacional. O Banco De Pagamentos18 internacionais tem defendido, esta ideia de
regulação, tanto a nível nacional como internacional, propondo que sejam equacionadas
5 categorias nesse processo, nomeadamente: Persuasão moral e informação através da aos
utilizadores sensibilizando-os os riscos de utilizar as criptomoeda; Regulação de
entidades específicas, como exchanges e wallets; interpretação das regulações já
existentes, aferindo se existe necessidade de atualização face as novas tecnologias;
regulação mais ampla para aumentar o espetro de aplicação das disposições relativas aos
métodos tradicionais de pagamento e intermediários; proibição para vários Estados.
Mas mais importante do que este debate, (sobre se é mais eficiente a regulação interna ou
externa) penso que o problema chave da regulação das criptomoedas reside da própria
natureza das criptomoedas. Então fica a pergunta: Como regular o que foi projetado para
obedecer apenas às leis de mercado? De acordo com Ricado Sichel 19 não é possível
regular diretamente o comércio das criptomoedas sem cometer violações à liberdade de
expressão e privacidade, porque qualquer regulação irá afetar negativamente as
transações. O mesmo autor sublinha, que as regulações devem incidir em questões
secundárias, como por exemplo, incentivar a implementação de medidas de informação
e segurança para os consumidores, e estimulação da comunicação entre as corretoras de
criptomoedas e os clientes. O eventual, excesso de regulação inibe o desenvolvimento e
inovação das criptomoedas.
Poderá colocar-se a questão de saber se esta regulação proposta- limitada a questões
secundárias- será suficiente para controlar todos os efeitos nocivos das criptomoedas.
Mas a meu ver, para procurar responder a esta pergunta é preciso ter uma visão global do
problema. E a verdade é que muitos dos potenciais riscos das criptomoedas, são também
enfrentados pelo dinheiro real20. Veja-se como, por exemplo o dinheiro real tem sido,
historicamente, o meio escolhido por traficantes e lavadores de dinheiro. Mas não é por
isso que alguma vez algum politico considerou banir o dinheiro real. 21

18
Informação retirada de Inês paulino, As criptomoedas:desafios à regulação
19
“cryptocurrency: impacts in the global economy. Perspectives
20
O dinheiro emitido pelos entidades oficiais
21
Por sua vez, já vários países regularam as criptomoedas no sentido da sua proibição.

10
Embora não seja o foco principal deste trabalho averiguar qual o tratamento legal
adequado, o que é importante compreender e reforçar é que as autoridades devem manter
a mente aberta e trabalhar para o estabelecimento de uma estrutura regulatória imparcial
que minimize os riscos e, ao mesmo tempo, permita que o processo criativo das
criptomoedas renda frutos, pois tal como Lagarde referiu num artigo 22 “assim como
algumas tecnologias que surgiram na era da internet transformaram as nossas vidas, as
criptomoedas que vierem a sobreviver podem ter um impacto significativo na forma como
poupamo, investimos e pagamos as nossas contas.”

Criptomoedas e o risco de violação de acordos da OMC

Um outro problema que surge aliado ás criptomoedas e que pouco ou nada foi
debatido23, relaciona-se com o possível recurso ás criptomoedas, para contornar/violar
disposições de acordos comercias no seio da Organização Mundial de Comércio, como o
Acordo Geral das Tarifas Aduaneiras e do comercio (doravante GATT) e o Acordo Geral
sobre o comércio de serviços (doravante GATS). O GATT é um conjunto de regras e
concessões tarifárias, referente a mercadorias, que foi criado após a segunda guerra
mundial em 1947, com a finalidade de impulsionar a liberalização comercial e o
protecionismo, harmonizando a política entre os países. O GATS entrou em vigor em
1995 e vem preencher um vazio deixado pelo GATT, que é o comércio de serviços. O
controlo do comércio de serviços é muito mais difícil do que de mercadorias. Muitas das
vezes os serviços são efetuados via online e entram nos países de forma quase automática.
O desenvolvimento das tecnologias tem sido vertiginosa e permite cada vez mais formas
distintas de prestação de serviços, pelo que se torna difícil prever muitas situações.

22
Christine Lagarde,Uma abordagem imparcial para os criptoativos(2018)
23
Não encontrei nenhuma informação sobre este tema, mas pelo conhecimentos que tenho das aulas
do GATT e do que me informei do GATS penso que efetivamente é um problema e arrisco-me a dizer
que ouviremos falar mais do GATT e do GATS associado ás criptomoedas nos próximos anos. Penso que
o motivo de ainda não haver informação relaciona-se com o facto de as criptomoedas não existirem
assim há tantos anos e secalhar ainda não ser usada pelo comércio (transações comerciais) de forma
suficientemente significativa para que os países levantem o problema.

11
Todavia parece-me razoável considerar o acesso ás criptomoedas um serviço pelo que
considero que o âmbito do GATS, artigo I, se encontra preenchido.
Tanto o GATT como o GATS baseiam-se nos mesmos principios24. O principio
chave da ambos assenta no principio do tratamento da nação mais favorecida segundo o
qual, cada pais membro trata os negócios de qualquer outro membro de modo não menos
favorável do que trataria os de outro qualquer pais.
Embora exista este pilar comum a ambos os acordos, a verdade é que no toca ás
criptomoedas o fenómeno regulatório levado a cabo pelos países tem sido bastante
discriminatório no que diz respeito ás criptomoedas. Há uns capítulos atrás tinha referido
que a china tinha legislado no sentido de tornar as criptomoedas ilegais. O que não referi
foi que o próprio governo chinês investiu bastante na criação da sua própria moeda digital
a Yuan.25. A Yuan é a única criptomoeda ao qual os cidadãos chineses podem aceder sem
infringir a lei.
O caso chinês é um exemplo claro de discriminação de criptomoedas e de violação
expressa do artigo II do GATS. A Yuan pode ser usada para a china espalhar a sua
influência ao nível do globo uma vez que permite ao estado chinês monitorizar os hábitos
dos utilizadores/consumidores e potencialmente mudar as condições de concorrência de
vários produtos e com isso violar também as disposições do GATT. Repare-se que se
determinados produtos apenas podem ser importado por determinada criptomoeda, e essa
criptomoeda é ilegal em determinado pais (neste caso a china), e um produto similiar
produzido em território nacional for possível ser adquirido pela moeda legal (neste caso
a Yuan) poderá haver aqui uma discriminação no refere a produtos similares, uma vez
que poderá existir uma dificuldade acrescida de acesso aos produtos estrangeiros, que
poderá modificar as condições de concorrência no mercado relevante em detrimento dos
produtos importados e com isto violar também as disposições do GATT.
A china não é caso único de discriminação de criptomoedas. Sublinhe-se que
também os Estados Unidos da América, no governo de Trump proibiu a transação da
criptomoeda venezuelana em solo americano, o que levanta exatamente os mesmo
problemas que referi anteriormente.

24
Existem duas exceções, nomeadamente nos serviços prestados no exercício da autoridade
governamental e os serviços relacionados com o transporte aéreo.
25
https://mundoconectado.com.br/noticias/v/23537/china-torna-transacoes-de-criptomoedas-ilegais-
e-pena-pode-ser-de-ate-10-anos-de-prisao

12
Muito provavelmente, á medida que os países tomarão uma posição legislativa em relação
ás criptomoedas, mais situações parecidas como as que referi surgirão.

13
Conclusão

Este trabalho reflete a discussão e a reflexão, que desenvolvemos sobre as


criptomoedas, nomeadamente a influência que estas podem adquirir na modulação da
economia internacional nas próximas décadas.
As criptomoedas são um tema bastante transversal, com implicações diversas e que
deve ser discutido além-fronteiras para que se possa dar uma resposta acertada. Desta
forma, será extremamente necessário uma cooperação entre entidades internacionais e
governamentais para que se possa dar uma resposta eficaz e adequada. Numa era de
globalização onde a distância de tempo e lugar é praticamente inexistente e onde a
informação encontra-se acessível a milhões de pessoas, a conceção de Estado, concebido
num pensamento geopotilico, tendencialmente vai desaparecendo. A particularidade de
as criptomoedas utilizarem o ciberespaço, local onde são dotadas de valor e utilizadas,
impossibilita que um único estado crie uma lei que defina as suas normas de acesso e
utilização, sendo impossível o reconhecimento e prevalência de um único legislador26
Quer isto dizer que mais do que saber se as criptomoedas devem ou não ser reguladas,
taxadas, ou deixadas a deriva segundo as leis do comércio, deve-se encarar o problema
de forma universal e não é isso que tem acontecido pois como já mencionamos os países
têm evidenciado diferentes posturas neste âmbito, o que poderá abrir espaço ao uso
abusivo de criptomoedas (com a violação do GATT e do GATS).
Com certeza que esta nova moeda irá enfrentar obstáculos ao longo dos próximos
anos. Haverá incerteza, volatilidade, possíveis quedas, algumas corretoras fecharão,
outras surgirão. O mercado seguramente saberá contornar os percalços e progredir, pelo
que posso dizer que as criptomoedas vieram para ficar e quem sabe libertar, pela primeira
vez na história da humanidade dos poderes centrais que controlam o nosso dinheiro.

26
Pedro Pereira,O surgimento das criptomoedas- Alteraçao do Paradigma Económico

14
BIBLIOGRAFIA

ARÚJO, Fernando- Introdução a economia (3 edição)

FAÉ, Paulo Jamuel- A ascensão das criptomoedas: consequências para o regime


monetário internacional

ULRICH, Fernando- Bitcoin, a moeda na era digital (1ªedição)

KAPLANOY, Nikolei: Bitcoin, the private digital currency and the case against its
regulations

PAULINO, Inês- As criptomoedas: desafios à regulação

LAGARDE, Christine- Uma abordagem imparcial para os criptoativos

PEREIRA, Pedro- O surgimento das criptomoedas- Alteração do paradigma económico

15

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