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DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO

Regência: Prof. Dário Moura Vicente


Ano Letivo: 2021/2022

Nome: Constança Maia de Andrade Castela


Nº de Aluno: 61389
Turma: A
Noção de DIP

Situações Transnacionais e a sua Regulação Jurídica


Sendo que há vários Estados soberanos, é de calcular que, a cada um, corresponde um
sistema jurídico, que se desenvolve autonomamente e que comporta soluções variadas
para os problemas jurídicos (ex.: um sistema atribui um direito que outro nega);
Procura determinar-se qual o ordenamento jurídico a aplicar para solucionar os problemas
transnacionais (problema da determinação do Direito aplicável), assim como quais os
tribunais estaduais competentes para o dirimir - problema da competência internacional;
Problema do reconhecimento das decisões estrangeiras - coloca-se quando o litígio é
decidido por um tribunal estrangeiro e se pretende que a decisão produza efeitos na
ordem jurídica local e, em caso afirmativo, sob que condições.

Situações Transnacionais e Privadas - Imunidades de Jurisdição e Pretensões de Estados


Estrangeiros
O DIP preocupa-se principalmente, de situações privadas, onde se incluem aquelas em
que, estando implicado um Estado/entidade pública, tal não age enquanto sujeito público
mas, segundo LP, é preferível dizer que o DIP rege situações transnacionais;
Situações Transnacionais (LP) - todas aquelas em que se coloque um problema de
determinação do Direito aplicável que deva ser resolvido pelo DIP;
Método de DIP:
● Orientação Jurisdicionalista - estatutos de aplicação estritamente territoriais
(estatutos locais) - suprada;
➔ Mais antiga, remontando à Idade Média;
➔ Passou-se a admitir, em certas situações, leis estrangeiras;
➔ Século XX - recuperada pelos EUA (em muitos casos em que os tribunais
têm de aplicar lei estrangeira, estes podem declinar);
➔ MC (concorda) - os juízes só são formados para o Direito do seu próprio
país (se aplicar Direito estrangeiro pode aplicá-lo mal);
❖ DMV (discorda) - a tutela da DPH, a autonomia privada e a tutela
da confiança contrariam esta posição, não concordando com esta
orientação.
● Orientação Substancialista - Direito próprio para as situações privadas
internacionais - suprada (radical);
➔ Já foi advogada na UE (projeto de um CC europeu);
❖ DMV - CC europeu não é necessário;
➔ Inconveniente disto seria maior do que qualquer vantagem (violência para
com os cidadãos europeus);
➔ A possibilidade desta unificação pode ser questionada porque os direitos
nacionais variam em aspetos fundamentais (ex.: princípio da boa fé);

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➔ Há alguma unificação através de convenções internacionais (unificação
pontual);
➔ Lex Mercatoria - usos, costumes do comércio internacional, etc.;
❖ DMV - está longe de se demonstrar que isto é uma verdadeira
ordem jurídica.
➔ DMV - embora tenha alguma razão, está longe de ser concretizada (só há
núcleos normativos com caráter substantivo).
● Método Conflitual/de Conexão - regras de conflitos da lei do espaço, que têm
elementos de conexão, indicando a lei que se aplica - aplicado (quase todos os
países aderiram).
➔ Fundado no século XIX, na Alemanha, por Savigny (ideia da comunidade
do Direito);
➔ CC Alemão de 1900 - lei de introdução, que tem regras de conflitos
unilaterais, passando a ter caráter bilateral;
➔ Ex.: o art. 46º, CC não diz qual é o regime, mas sim a lei que se deve ir
buscar (lugar onde as coisas se encontram);
➔ Regras que dão a regulação indireta porque não dão a solução material,
mas remetem para o elemento de conexão, acautelando-se a tutela dos
valores fundamentais e não se lesando as expectativas legítimas;
➔ DMV - permite solução para as situações privadas internacionais sem
termos de unificar os sistemas jurídicos internacionais;
➔ Arts. 14º a 24º, CC;
➔ Estas regras até permitem excluir a aplicação da lei estrangeira (ex.: art.
22º, CC - limitação deste método) - é sempre a lei de foro que decide.

Caráter Transnacional das Situações Reguladas


Caráter Internacional (LP) - existência de contactos relevantes com mais de um(a) Estado
soberano/sociedade estadual (usa-se o termo “transnacional” para não se confundir com o
termo “internacional” de DIPúblico);
Fatores Relevantes para o Caráter Transnacional - nacionalidade,
domicílio/residência habitual, lugar do estabelecimento, lugar da sede de ente coletivo,
lugar onde se produzem certos factos, lugar onde está situada uma coisa;
Elementos de Estraneidade - laços que ligam uma situação sem regulação jurídica a
outros Estados (laços existentes além dos com o seu Estado);
● Ex.: um português casa-se com uma espanhola, em Itália, onde ambos residem.
❖ Elementos de estraneidade - nacionalidade espanhola de um dos nubentes
e a localização em Itália do lugar da residência e da celebração do
casamento.

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Processo Conflitual
Normas de Conflitos (LP) - proposições que, perante uma situação em contacto com
uma pluralidade de sociedades estaduais, determinam o Direito aplicável (ex.: art. 50º,
CC);
Conflito Positivo de Sistemas - A é nacional do Estado X, o qual submete o seu estatuto
pessoal à nacionalidade, mas está domiciliado no Estado Y, o qual submete o seu estatuto
pessoal ao domicílio, o que significa que ambos os Estados consideram aplicável a sua
própria lei;
Conflito Negativo de Sistemas - A é nacional do Estado X, o qual submete o seu
estatuto pessoal ao domicílio, mas está domiciliado no Estado Y, o qual submete o seu
estatuto pessoal à nacionalidade, o que significa que nenhum dos Estados se considera,
diretamente, competente;
Processo Conflitual/Indireto - processo de regulação através do reconhecimento
autónomo de efeitos de decisões estrangeiras, sendo que as normas que determinam este
reconhecimento não disciplinam materialmente a situação - são os efeitos jurídicos que
advêm do ato segundo o Direito do Estado de origem;
● LP - as normas de reconhecimento não são simples normas de remissão1, são
uma categoria especial destas.

Características Fundamentais das Normas de Conflitos de Leis no Espaço

Normas de Regulação Indireta


≠ de normas materiais, porque estas desencadeiam efeitos jurídicos que modelam as
situações jurídicas das pessoas (ex.: art. 875º, CC), determinando o regime aplicável à
situação descrita na sua previsão;
Normas de Regulação Indireta - mandam aplicar à situação descrita na sua previsão
outras normas ou complexos normativos (norma de conduta), exprimindo valorações
autónomas - ex.: arts. 25º, 31º/1 e 32º, CC;
● Visão Judiciária do DIP (LP discorda) - as normas de conflitos são meras
normas de decisão porque, em princípio, os seus destinatários são os órgãos de
aplicação do Direito.
LP - esta é a caraterística essencial das normas de conflitos.

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Normas de Reconhecimento - certo resultado material/efeitos jurídicos de certa categoria, produzem-se na ordem
jurídica do foro caso sejam desencadeados por um Direito estrangeiro. Assim, é uma norma de remissão porque
determina a aplicação do Direito estrangeiro à produção do efeito, mas condiciona esta aplicação à produção do
mesmo.

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Normas de Conexão
Definição - normas bilaterais2 que conectam uma situação/aspeto da vida com o Direito
aplicável, através de um elemento de conexão (laços que o DIP considera juridicamente
relevantes), mediante um conteúdo valorativo (justiça da conexão);
Elementos de Conexão - nacionalidade (arts. 25º e 31º/1, CC), residência habitual (art.
32º/1, CC) e lugar da situação de uma coisa (art. 46º/1, CC);
● Em que podem consistir?
➔ Vínculos Jurídicos - estabelecem-se diretamente entre elementos da
situação e um Direito (ex.: nacionalidade);
➔ Laços Fáticos - entre a situação e a esfera social de um Estado (ex.:
residência habitual);
➔ Consequências Jurídicas - projetam-se num certo lugar num território de
um Estado (ex.: lugar do efeito lesivo);
➔ Factos Jurídicos - ex.: designação, pelos interessados, do Direito aplicável.
Art. 4º/4, Reg. Roma I - norma de conflitos com o conceito designativo do elemento de
conexão indeterminado, cabendo ao intérprete averiguar qual o laço/combinação de laços
que exprime a conexão mais estreita (justiça da conexão no caso concreto) - normas de
conexão num sentido amplo.

Norma Formal
Definição - quando, na designação do Direito, não atendem ao resultado material a que
conduz a aplicação de cada uma das leis em presença (conteúdo valorativo);
Art. 49º, CC - submete a capacidade para contrair casamento à lei pessoal de cada
nubente (lei da nacionalidade - art. 31º/1, CC), independentemente do conteúdo e
impedimentos que possam existir;
Limitações:
● É apenas fundamentalmente formal, porque não se desinteressa, completamente,
do resultado da aplicação do Direito competente (cláusula de ordem pública
internacional - art. 22º, CC);
● Normas de conflito materialmente orientadas (ex.: arts. 36º e 65º, CC -
favorecem a validade formal) - atendem ao resultado material, mantendo-se
normas de conexão mas, estão formuladas de modo a que de entre as leis
designadas, será aplicada a que salvaguarde a validade do negócio (combina
elementos de justiça de conexão e material);
● Função modeladora na disciplina das situações transnacionais - comanda a
resolução de vários problemas advindos dos elementos de conexão e conjugação
das ordens jurídicas, que apresentam diferentes soluções, e também se interessa
2
Também podem ser unilaterais (apenas desencadeiam o Direito do foro) ou ad hoc (normas/conjuntos de normas
materiais individualizadas).

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pela solução material, tendo em conta a especificidade do caráter internacional da
situação.

Planos, Processos e Técnicas de Regulação das Situações Transnacionais

Processos Materiais/Diretos (aplicação direta de Direito material, sem valoração


conflitual):
Aplicação Direta do Direito Material Comum - aplica-se o Direito material comum do
foro a quaisquer situações, independentemente dos elementos de estraneidade (ex.:
tribunais do Estado X aplicam a todas as situações transnacionais o Direito material
comum aplicável às situações internas, incluindo as que não tenham ligação específica
com o Estado X);
Criação de Direito Material Especial de Fonte Interna - aplica-se a situações com
certos elementos de estraneidade, independentemente dos laços com o Estado local (ex.:
órgãos legislativos do Estado X criam um Direito material especial para regular situações
contratuais internacionais);
Unificação Internacional do Direito Material - aplica-se a situações transnacionais,
independentemente de uma conexão entre as mesmas e um dos Estados em que vigora
esse Direito (ex.: convenções internacionais que estabelecem um Direito material
unificado aplicável a certo tipo de contrato internacional na ordem jurídica dos Estados
contratantes, mesmo que o contrato não tenha nenhuma ligação específica com nenhum
Estado contratante).

Plano da Regulação Indireta


Ótica Tradicional - plano da ordem jurídica estadual (partes devem orientar-se,
exclusivamente, pelas normas e princípios vigentes nas ordens jurídicas estaduais
conectadas com a situação, especialmente pelas normas e princípios aplicáveis pelos
tribunais estaduais internacionalmente competentes);
● Dimensão Normativa - as situações transnacionais são reguladas pela ordem
jurídica estadual quando as normas e princípios imediatamente aplicáveis são os
que vigoram nessa ordem jurídica;
● Dimensão Institucional - as situações transnacionais são reguladas pela ordem
jurídica estadual quando os órgãos competentes para a aplicação do Direito são os
desse Estado.

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Direito dos Conflitos

Órgãos de Aplicação
Órgãos Nacionais/Estaduais - na ordem jurídica portuguesa, são jurisdicionais
(tribunais estaduais e tribunais arbitrais regulados pela LAV fora da arbitragem
internacional) e administrativos (conservadores dos diferentes registos, notários, agentes
diplomáticos e consulares no exercício de funções de conservadores e notários,
comandantes de unidades militares, navios e aeronaves no exercício de funções de
conservadores e notários);
Órgãos Transnacionais - tribunais de arbitragem transnacional (em sentido
estrito)/arbitragem comercial internacional (litígios relativos a contratos administrativos,
responsabilidade civil extracontratual por prejuízos decorrentes de atos de gestão pública,
atos administrativos que possam ser revogados sem fundamento na sua invalidade,
litígios emergentes de relações jurídicas de emprego público, quando não estejam em
causa direitos indisponíveis e não resultem de acidente de trabalho/doença profissional);
● Arbitragem Ad Hoc - procedimento arbitral inteiramente estabelecido para o
caso concreto;
● Arbitragem Institucionalizada - organizada por centros permanentes (ex.:
centros de arbitragem que funcionam junto das associações comerciais);
● Art. 209º, CRP - os tribunais arbitrais fazem parte do sistema jurisdicional,
estando sujeitos a competências de regulação e controlo concorrentes de uma
pluralidade de Estados;
● Porque é que a arbitragem transnacional tem autonomia (auto-regulação
negocial e regras e princípios jurídicos autónomos)?
I. As competências estaduais concorrentes podem levar a soluções
diferentes, sendo necessária uma margem de apreciação dos árbitros;
II. Os Estados usam moderadamente as suas competências, limitando-se a um
enquadramento do estatuto da arbitragem e delegando nas partes e árbitros
a maior parte das regras do estatuto.
Órgãos Supraestaduais - jurisdições internacionais, quási-internacionais, da UE e de
direitos fundamentais.
● Quando podem atuar?
I. Quando na aplicação de normas de Direito Internacional e DUE se
suscitem questões prévias não reguladas na esfera da ordem jurídica
internacional/UE;
II. Quando esses órgãos tenham competência para apreciar, a título principal,
questões relativas a situações que, por não serem necessariamente
conformadas pelo DIP/DUE colocam um problema de determinação do
Direito aplicável.

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● Jurisdições Internacionais - TIJ (órgão de contencioso interestadual; só os Estados
podem ser partes; a questão principal respeita à violação de uma norma de DIP);
● Jurisdições Quási-Internacionais - os tratados que as organizam contêm as normas
de conflito aplicáveis, devido ao problema de determinação do Direito aplicável
(ex.: Tribunal Permanente de Arbitragem - ocupa-se tanto do contencioso
interestadual, como de conflitos entre um Estado e um particular);
● Jurisdições da UE - TJUE (composto pelo TJ e TG; Funções: assegura o respeita
pelo DUE na interpretação e aplicação dos tratados constituintes; controla a
legalidade dos órgãos da UE para a ação que verifica a violação dos Tratados
pelos EM; decide a título prejudicial sobre a interpretação dos tratados, a validade
e interpretação dos atos dos órgãos da UE; conhece dos litígios entre a UE e os
seus agentes; pode ter de apreciar situações que relevam da ordem jurídica
estadual quanto a questões que coloquem em causa a aplicação do DUE; pode ter
de apreciar situações transnacionais a título principal);
● Jurisdições de Direitos Fundamentais - TEDH (particulares têm acesso; Funções:
aprecia o facto ilícito de que o Estado réu é responsável quanto a situações
internas ou transnacionais, aplicando o Direito Internacional - CEDH; pode
formular e aplicar normas de conflitos para determinar o Direito estadual
aplicável - segundo Lima Pinheiro, tal ainda não se concretizou).

Fontes do Direito dos Conflitos


Fontes Internacionais - pode atuar tanto no plano da ordem jurídica internacional como
no plano da ordem jurídica estadual, operando ao nível da ordem jurídica internacional e
unificando as normas de conflitos que vigoram na ordem jurídica dos EM;
● Isabel de Magalhães Collaço - as normas de conflitos criadas e aplicadas por
jurisdições internacionais são necessariamente normas internacionais;
● Art. 8º, CRP - concretiza a ideia das fontes supraestaduais (sistema de receção
automática);
● Convenções Internacionais - as suas normas vigoram na ordem jurídica interna,
como normas internacionais, após a sua publicação e enquanto vincularem
internacionalmente o Estado português (art. 8º/2, CRP);
➔ Multilaterais - há as que unificam o Direito dos Conflitos (Convenções de
Genebra Destinadas a Regular Certos Conflitos de Leis em matéria de
Letras e Livranças e Cheques; Convenções emendas da Conferência da
Haia desde 1902);
➔ Bilaterais - principalmente fonte de Direito dos Estrangeiros (tratados de
promoção e proteção recíproca de investimentos).
● Regulamentos Europeus (art. 8º/4, CRP) - as suas normas de conflitos vigoram na
esfera interna como normas de DUE;

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● Fonte mais importante - tratados que instituem/enquadram jurisdições
internacionais ou quási-internacionais;
● Costume Internacional (Lima Pinheiro) - este é fonte de alcance limitado, sendo
que o DIPrivado funda-se no Direito das Gentes e no reconhecimento da
coexistência de várias ordens jurídicas nacionais, sendo que algumas
regras/princípios de conexão já são acompanhados por uma convicção de
vinculatividade (ex.: lex rei sitae em matéria de direitos reais imobiliários);
● Jurisprudência Internacional - é fonte, mas as suas soluções dirigem-se,
primeiramente, aos órgãos internacionais sendo que, apenas indiretamente, pode
operar na ordem interna;
● Princípios Comuns aos Sistemas Nacionais - podem ser fonte, desempenhando
um papel de arbitragem transnacional.
Fontes da UE - tratados instituintes, Direito derivado emanado dos órgãos da UE,
Convenção de Roma sobre a Lei Aplicável às Obrigações Contratuais (1980);
● Pode operar ao nível da ordem jurídica da UE ou dos EM (Direito dos Conflitos
do TFUE);
● O TUE conhece dos litígios relativos à responsabilidade extracontratual da UE
por danos causados pelas suas instituições/agentes (art. 268º, TFUE);
● Aprecia as questões prévias relativas ao estado das pessoas e a relaçõees de
família nos litígios entre a UE e os seus agentes.
Fontes Transnacionais - fundamentalmente, o costume jurisprudencial arbitral e os
regulamentos dos centros de arbitragem;
● Papel significativo na criação de normas e princípios de DIP (ex.:
desenvolvimento do princípio da autonomia da vontade na determinação do
Direito aplicável ao mérito da causa).
Fontes Internas:
● Lei - CRP, CC, CCom., CSC, outras leis avulsas;
● Costume - tem relevo limitado, tratando-se hoje de um costume jurisprudencial,
com base numa jurisprudência uniforme e constante;
● Jurisprudência - fonte importante e, talvez, até a principal, sendo que, na falta de
norma legal/de conflitos, os tribunais, frequentemente, aplicam ideias
orientadoras/princípios gerais e consolidam soluções numa jurisprudência
constante;
● Ciência Jurídica - contributo importante, permitindo a aproximação dos sistemas
baseados em fontes não escritas dos sistemas codificados (caráter internacional e
universalista).

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Regras de Conflitos

Elementos da Norma de Conflitos


I. Previsão/Conceito-Quadro
Define os pressupostos de cuja verificação depende a aplicação da norma de
conflitos, delimitando-se o seu objeto e o alcance material da remissão operada
pela norma (Lima Pinheiro - dupla função), podendo delimitar situações da vida
através de conceitos técnico-jurídicos;
Exs.: art. 25º, CC (estado, capacidade, relações de família e sucessões por
morte); art. 46º, CC (posse, propriedade e direitos reais); RRI (obrigações
contratuais); RRII (obrigações extracontratuais);
Extensão dos Conceitos (Lima Pinheiro) - deve ser a que convenha à sua
estatuição, sendo que o legislador, ao eleger os diferentes elementos de conexão,
tem em vista os mais adequados para designar qual o Direito aplicável, devendo
atender ao Direito Comparado (harmonia internacional de soluções);
Dépeçage - por vezes, as normas de conflitos apenas se reportam a questões
parciais (ex.: art. 36º, CC), podendo ser aplicável uma pluralidade de Direitos,
estando a norma de conflitos submissa a várias leis. Assim, o dépeçage é o
fracionamento das situações transnacionais pelo Direito dos Conflitos, implicando
o risco de contradições normativas/valorativas, o qual pode ser diminuído se o
alcance da previsão da norma de conflitos for mais amplo.
II. Estatuição
Consequência jurídica desencadeada pela norma de conflitos, sendo,
tradicionalmente, identificada com a conexão3, visto que necessita da
concretização do elemento de conexão;
Dupla Consequência Jurídica da Norma:
1) A norma de conflitos remete para um Direito, sendo a remissão feita
através de uma conexão e, quando a mesma é feita para uma ordem
jurídica estrangeira, suscita-se o problema do alcance conflitual da
remissão (saber se está abrangido pelo DIP);
2) Quando a remissão é feita, tanto para o Direito estrangeiro, como para o
do foro, suscita-se a questão do alcance material da remissão (saber se
quais as proposições jurídico-materiais4 chamadas por esta norma).
Modalidades de Estatuição:
● Regras de Conflitos Unilaterais - apenas determinam o âmbito de
aplicação do Direito do foro, sendo que, em Portugal, apenas temos regras
de conflitos unilaterais especiais (ex.: art. 28º/1, CC);

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Chamamento de 1/+ Direitos a regulagem a questão.
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O conjunto destas proposições é denominado estatuto.

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● Regras de Conflitos Bilaterais - tanto remetem para o Direito do foro
como para o estrangeiro (ex.: arts. 25º e 31º/1, CC).
➔ Bilateralização das Normas Unilaterais (Lima Pinheiro) -
primeiro, tem de se saber se existe uma lacuna, cabendo distinguir
os diferentes tipos de normas unilaterais, havendo uma lacuna
sempre que não se aplique o Direito do foro. De seguida, cabe,
então, a integração da lacuna, devendo a mesma, em princípio, ser
preenchida por uma bilateralização (formulação de regras de
remissão condicionada). No entanto, se as normas unilaterais não
forem suscetíveis de bilateralização, denominam-se normas de
delimitação;
➔ Normas Bilaterais Imperfeitas - normas que remetem, tanto para o
Direito do foro, como para o Direito estrangeiro, mas limitam o
seu objeto a certos casos com especial ligação à lei do foro, não
fornecendo, diretamente, a solução para as situações do mesmo
tipo abstrato (ex.: art. 51º, CC).
Modalidades de Conexão:
● Conexão Singular - apenas se aplica um Direito;
➔ Simples - a norma de conflitos designa direta e imediatamente um
único Direito aplicável (ex.: art. 46º/1, CC);
➔ Subsidiária - a norma de conflitos tem vários elementos de
conexão, que atuam sucessivamente, para que o elemento de
conexão seguinte dependa da falta de conteúdo do anterior (ex.:
arts. 25º + 31º/1, CC);
➔ Alternativa - a norma de conflitos tem 2/+ elementos de conexão,
que podem designar 2/+ Direitos, aplicando-se o mais favorável à
produção de certo efeito jurídico (ex.: art. 11º/1, RRI);
➔ Optativa - a norma de conflitos tem 2/+ elementos de conexão que
podem designar 2/+ Direitos, aplicando-se o Direito segundo a
vontade dos interessados (pouco frequente em Portugal; ex.: art.
7º, RRII)
● Conexão Plural - aplica-se mais do que um Direito.
Cumulativa Simples - a norma de conflitos exige a concorrência de 2/+ Direitos
para se produzir certo efeito jurídico (ex.: art. 33º/3, CC), sendo simétrica à
conexão singular alternativa;
Condicionante/Limitativa - a norma de conflitos chama um Direito primariamente
competente, mas atribui a outro Direito uma função limitativa/condicionante
quanto à produção de certo efeito (ex.: art. 60º, CC).
III. Elemento de Conexão
Em que pode consistir? (Lima Pinheiro):

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1. Lugar de Situação da Coisa (laço fático entre um dos elementos da
situação da vida e um certo lugar no espaço, que permita individualizar o
Direito vigente - ex.: art. 46º/1, CC);
2. Nacionalidade e Domicílio (vínculo/qualidade jurídica que permita
individualizar o Direito que o estabelece - ex.: arts. 31º/1 e 32º, CC);
3. Lugar do Dano (consequência jurídica, que se projeta num certo lugar no
espaço, permitindo individualizar o Direito);
4. Designação pelas Partes (facto jurídico - ex.: art. 41º, CC).
Função - individualiza o Direito a ser aplicado;
1ª Classificação:
● Pessoais - referem-se às pessoas/sujeitos (nacionalidade, domicílio,
residência habitual e sede da pessoa coletiva);
● Reais - referem-se ao objeto/factos materiais (lugar da prática do facto,
lugar da celebração do ato, lugar onde se desenrola o processo, lugar da
situação da coisa).
2ª Classificação (quanto ao modo como designam o Direito aplicável):
● Por Via Direta - o elemento de conexão aponta, diretamente, qual o
Direito aplicável (ex.: nacionalidade);
● Por Via Indireta - o elemento de conexão aponta para um certo lugar no
espaço indicando, indiretamente, qual o Direito aplicável (ex.: lugar da
situação da coisa).
3ª Classificação (quanto à estrutura):
● Conceitos Descritivos/de Facto - baseia-se na experiência social do
intérprete e nos usos linguísticos gerais (ex.: residência habitual e lugar da
situação da coisa);
● Conceitos Técnico-Jurídicos/Normativos - exige o recurso a outras
normas (ex.: nacionalidade).
4ª Classificação (quanto à alteração temporal do conteúdo concreto):
● Móveis - conteúdo concreto pode variar no tempo (ex.: residência
habitual, nacionalidade, lugar da situação da coisa móvel);
● Imóveis - conteúdo concreto não pode variar no tempo (ex.: lugar do dano,
lugar da celebração do negócio).

Interpretação e Integração de Lacunas da Norma de Conflitos

Interpretação
Normas de Fonte Interna - arts. 8º e 9º, CC e metodologia da ciência jurídica;
Normas de Fonte Internacional - art. 31º, CVDT;

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Normas de Fonte Europeia - critérios de interpretação reconhecidos pela jurisprudência e
doutrina europeias;
A que podem dizer respeito os problemas de interpretação?
● A qualquer dos elementos da norma de conflitos (ex.: capacidade, forma,
obrigação contratual, casamento, etc.);
● Quanto aos conceitos que exprimem o elemento de conexão (ex.: nacionalidade e
lugar do dano, etc.);
● Quanto à determinação das normas materiais que irão ser, efetivamente, aplicadas.
Normas de Conflitos de Fonte Interna:
● Lima Pinheiro - têm de ser interpretadas como parte do sistema jurídico
português, mas a interpretação não está subordinada ao Direito interno, sendo
uma interpretação autónoma quanto ao Direito material interno.
Normas de Conflitos de Fonte Supraestadual:
● Convenções internacionais de unificação de Direito de Conflitos - a
interpretação é autónoma quanto às ordens jurídicas nacionais individualmente
consideradas, assentando numa comparação de Direitos (art. 18º, Reg. Roma I);
● Regulamentos europeus - a interpretação é autónoma, tendo em conta o contexto
da disposição e o objetivo prosseguido pelas normas em causa, assim como a
conformidade com os direitos fundamentais protegidos pela ordem jurídica
comunitária ou com outros princípios gerais do direito comunitário;
● Se forem relacionados com a UE, faz-se uma comparação quanto aos princípios
gerais que resultam do conjunto de ordens dos EM.

Integração de Lacunas
Tipos de Lacunas:
● Lacuna da Lei - quando não há uma norma de conflitos de fonte legal que indique
a lei reguladora de certa situação transnacional que, segundo o sentido regulador
do sistema, deve estar submetida ao regime do Direito dos Conflitos;
● Lacuna Oculta - descobre-se através da interpretação restritiva/redução
teleológica de uma norma de conflitos existente;
● Lima Pinheiro - o Direito material de um Estado não tem, em princípio, uma
vocação de aplicação universal que justifique a sua aplicação direta a situações
transnacionais e que a função reguladora do Direito dos Conflitos abrange,
potencialmente, todas as situações transnacionais. Assim, na falta de normas de
conflitos que resolvam o problema, há uma lacuna que deve ser integrada por uma
solução conflitual.
Ordem de Integração (critérios do art. 10º, CC):
1. Recorre-se à norma aplicável ao caso análogo (analogia legis);

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● Lima Pinheiro - a fronteira entre interpretação e aplicação analógica
traça-se em função do sentido literal possível da proposição jurídica.
2. Caso o “Ponto 1” não dê, deve haver uma concretização dos princípios gerais e
ideias orientadoras do Direito dos Conflitos (analogia iuris);
● Lima Pinheiro - tem grande afinidade com a metodologia para aplicar as
normas com critérios gerais de conexão.
3. Se nenhum dos dois Pontos se aplicar, cabe ao intérprete criar um critério de
decisão de acordo com o espírito do sistema.
● Lima Pinheiro - o intérprete tem de respeitar os princípios e valores do
DIP, formulando o critério de decisão sob a forma de uma proposição
geral e abstrata.

Aplicação no Tempo
Problema - perante a sucessão no tempo de normas de conflitos, cabe delimitar o âmbito
de aplicação da norma antiga e da nova;
Qual a solução?
● Isabel de Magalhães Collaço - na omissão do legislador, deve recorrer-se ao
Direito Intertemporal da ordem jurídica em que estão integradas as normas de
conflitos em causa;
● Lima Pinheiro - aplicam-se os arts. 12º e 13º, CC, sendo que a valoração
jurídica dos factos ocorridos na vigência da lei antiga não é, em princípio,
prejudicada pela lei nova, sendo que, em princípio, também se aplicam as regras
especiais de Direito Transitório.

Aplicação no Espaço
Problema - saber qual o Direito de Conflitos que regula situações que só relevam na
ordem jurídica estadual;
Conceções Tradicionais:
● Tese do Alcance Universal do DIP - toda e qualquer designação da lei
competente para regular uma situação transnacional passa, exclusivamente, pelo
Direito de Conflitos do foro;
● Tese da Limitação do Direito de Conflitos pelo Princípio dos Direitos
Adquiridos - segundo Ferrer Correia, há uma lacuna no sistema jurídico do foro,
a qual se deve preencher com a formulação de uma norma específica que
determine a aplicação da lei estrangeira, da qual aquela relação dependa.
Lima Pinheiro - à luz da tutela da confiança, devem desenvolver-se regras de
reconhecimento de situações que se constituíram/consolidaram com o DIP de um Estado
que apresenta uma estreita conexão com elas, enquanto não tenham sido validamente

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constituídas segundo a lei chamada pelo Direito do foro, podendo podendo tal ser mais
justificável;
DMV - as regras de conflito em vigor em Portugal são sempre aplicáveis.
● Exceções:
➔ Casos em que podemos ter de aplicar regras de conflito estrangeiras –
casos de reenvio/devolução (arts.º 18º e 19º, CC);
➔ Situações em que os nossos tribunais têm de ter apenas consideração (ex.:
art. 31º/2, CC).

Qualificação
I. Interpretação do Conceito-Quadro/Previsão
É a interpretação da proposição jurídica para determinar a previsão normativa
(premissa maior);
4 teorias:
● Teoria da Interpretação Lege Fori - os conceitos das normas de conflitos
de um Estado, têm exatamente o mesmo significado dos que são
homólogos desse mesmo Estado, ou seja, o conceito de casamento do art.
49º, CC é o mesmo do Direito português;
➔ Hoje em dia, não é aceite em Portugal, porque significa negar a
missão de coordenação que compete ao DIP e às normas de
conflitos (nunca poderíamos usar um Direito estrangeiro que
consignaria um instituto jurídico desconhecido);
➔ Segundo esta doutrina, não se aplicaria o art. 49º, CC;
● Teoria da Interpretação Lege Causae - os conceitos utilizados pelas
normas de conflitos do foro correspondem aos do Direito competente, ou
seja, no conceito-quadro da norma de conflitos cabe tudo aquilo que
existir no Direito em que se concretiza o elemento de conexão. Assim,
coincide-se o significado dos conceitos usados pelas normas de conflitos,
com os dados pela norma competente;
➔ Tal não é aceite em Portugal porque, assim, as normas de conflitos
seriam normas em branco (não teriam previsão definida, sendo que
tudo dependeria do Direito competente);
● Interpretação de acordo com o Direito Comparado (Prof. Helena Brito) -
aqui, a interpretação dos conceitos utilizados nas normas de conflitos deve
ser feita por abstração, através de um estudo comparado do Direito
envolvido na situação;
➔ Tal não é aceite em Portugal;
● Interpretação Autónoma - interpretação que parte do Direito do foro, pois
é nestes conceitos que se encontram as notas essenciais do conceito, ou

14
seja, aquilo de que o Direito do foro não prescinde para a caraterização
daquele instituto, e autonomiza-se por forma a assegurar um maior
conteúdo das normas de conflitos, para poderem ser reconduzidos a
núcleos jurídicos estrangeiros, respeitando o Direito do foro.
➔ Aceite em Portugal.
II. Caraterização do Objeto
Incide sobre a situação da vida em causa e consiste na determinação da relevância
jurídica desta situação;
Possíveis Formas de Caraterização:
● Lege Fori - contrária à ideia de paridade de tratamento entre a lei do foro
e a estrangeira, podendo levar à aplicação de normas materiais
estrangeiras que não correspondem à categoria normativa utilizada na
previsão da norma de conflitos;
● Lege Causae (Lima Pinheiro) - raciocínio hipotético, que atende à
relevância jurídica dos factos perante cada uma das ordens jurídicas
potencialmente aplicáveis5 (ex.: se há uma relação contratual de utilização
de um imóvel sito em Portugal, entre indivíduos do Reino Unido, que
escolheram a lei inglesa como lei reguladora do contrato, devemos
caraterizar a situação face às leis inglesa e portuguesa, sendo que, depois
de completada a qualificação, saberemos qual o Direito aplicável).
III. Subsunção
Decidir se as normas, dado o seu conteúdo e função, são reconduzíveis ao
conceito-quadro da regra de conflitos, sendo o Direito do foro o ponto de partida;
Vertentes:
● Positiva - a recondução da matéria ao conceito utilizado na previsão da
norma de conflitos, que desencadeia a aplicação desta norma;
● Negativa - a não recondução da matéria aos conceitos utilizados na
previsão de outras normas de conflitos, determina o seu afastamento.
Presunção que pode e deve ser ilidida sempre que, à luz do conteúdo e função do
instituto jurídico estrangeiro, se imponha uma qualificação diferente perante o
Direito de Conflitos português;
Lima Pinheiro - quando há um negócio com efeitos reais e obrigacionais, ou
outra correlação íntima entre ambos, a formação e validade destes negócios é
regulada pelo RRI, sendo que o art. 46º, CC apenas controla a produção de
efeitos reais;
Quando se aplicam regras de conflitos de fonte supraestadual (UE), o ponto de
partida não é a lei do foro, mas a interpretação da norma à luz das suas
finalidades, na medida em que os conceitos utilizados pelos Regulamentos são
5
São as de todos os Estados com as quais a situação concreta tenha alguma das conexões relevantes para o Direito
de Conflitos português.

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autónomos face aos direitos nacionais, caso contrário, toda a harmonização se
perderia, porque cada tribunal aplicava a lei de conflitos à sua maneira.

Interpretação e Concretização do Elemento de Conexão

Interpretação

Conceitos Técnico-Jurídicos - é difícil determinar, nos diferentes sistemas nacionais,


quais as regras e princípios jurídicos a que se deve recorrer;
Os conceitos designativos dos elementos de conexão, presentes nas Convenções
internacionais e Regulamentos Europeus devem ser interpretados autonomamente face
às ordens jurídicas nacionais;
Tem de se partir das regras e princípios do Direito material interno para obter as notas dos
conceitos designativos técnico-jurídicos, sendo que, se o sentido e alcance for diferente,
há uma maior indeterminação dos conceitos designativos, levando a uma maior abertura
de realidades jurídicas estrangeiras;

Concretização
Problemas:
I. Aspetos Gerais da Determinação do Conteúdo Concreto do Elemento de
Conexão - se se tratarem de laços fácticos (ex.: lugar da situação da coisa) não há
especiais dificuldades mas, se se reportar a um vínculo jurídico (ex.:
nacionalidade), consequências jurídicas (ex.: lugar onde ocorre o dano) ou factos
jurídicos (ex.: designação do Direito aplicável, pelos interessados), já se suscitam
questões;
● Vínculo Jurídico - questão de saber se o elemento de conexão se
concretiza lege fori (de acordo com a lei do foro) ou lege causae (de
acordo com a lei da ordem jurídica em causa);
● Consequência Jurídica - necessário determinar se a consequência se
estabelece lege fori ou lege causae, sendo que, segundo Lima Pinheiro, o
conceito de “lugar onde ocorre o dano” interpreta-se de acordo com o
Direito de Conflitos em causa, mas tem de se apreciar, perante a lei
potencialmente aplicável, se ocorre no território do respetivo Estado a
lesão de um bem jurídico;
● Facto Jurídico - como, geralmente, a designação da lei aplicável é objeto
de acordo das partes, cabe saber sob que Direito (foro ou escolhido) a
formação e validade do consentimento são apreciadas, sendo que, segundo

16
Lima Pinheiro, devem ser nos termos da lei escolhida, por força dos arts.
3º/5, Reg. Roma I e 6º/1, Reg. Roma II).
II. Conteúdo Múltiplo e Falta de Conteúdo - o problema de conteúdo múltiplo
surge, quando no caso concreto, surgem vários laços estabelecidos com diferentes
Estados, reconduzíveis ao mesmo conceito designativo (ex.: pessoa com dupla
nacionalidade). Por outro lado, o problema da falta de conteúdo surge quando,
no caso concreto, não existe laço designado (ex.: pessoa apátrida);
● Como resolver estes problemas?
➔ Conteúdo Múltiplo - resolve-se com uma norma especial, como é
o caso dos arts. 27º e 28º, da Lei da Nacionalidade (critérios de
resolução dos concursos de nacionalidades), na medida em que,
nos termos do art. 27º, LN, se uma das nacionalidades for
portuguesa, a mesma prevalece;
❖ Marques dos Santos - não concorda com esta solução,
indicando que a nacionalidade estrangeira deve prevalecer
caso seja inquestionável que o binacional tenha uma
conexão manifestamente mais estreita com a sua
nacionalidade estrangeira. (Lima Pinheiro - não concorda,
devido ao imperativo constitucional do art. 27º, LN);
❖ Art. 28º, LN - no concurso de 2/+ nacionalidades
estrangeiras releva apenas a nacionalidade do Estado em
cujo território o plurinacional tenha a sua residência
habitual, sendo que, se não tiver residência habitual num
dos Estados de que é nacional, releva a nacionalidade do
Estado com que tenha uma ligação mais estreita (princípio
da nacionalidade efetiva).
➢ Determinação da ligação mais estreita - deve
atender-se a todos os laços que exprimam ligação a
uma sociedade estadual, dando especial importância
aos laços que exprimam a identidade cultural do
plurinacional (ex.: língua);
➢ Também se aplica se uma das nacionalidades
estrangeiras for a de um EM da UE?
★ Marques dos Santos (Lima Pinheiro
concorda) - a nacionalidade relevante é
sempre a do EM, sendo que, na falta de
norma especial, o problema deve resolver-se
com a interpretação da norma de conflitos.
➔ Falta de Conteúdo - primeiro, deve atender-se à norma especial
que resolva o problema, sendo que, segundo o art. 12º/1, da

17
Convenção de Nova Iorque Relativa ao Estatuto do Apátrida, a
lei pessoal do apátrida é a do país do domicílio (residência
habitual) e, se não tiver residência habitual releva a lei do país da
residência ocasional (art. 12º/1, in fine).
❖ Lima Pinheiro - não concorda, sendo que seria preferível
que, na falta de residência habitual, relevasse a lei do país
com o qual o apátrida tem uma conexão mais estreita;
❖ Arts. 32º/1, 1ª parte e 82º/2, CC - a lei pessoal do apátrida
é a do lugar onde o mesmo tenha residência habitual e, se
não a tiver, releva a residência ocasional e, se não a tiver, o
simples paradeiro;
❖ O que fazer se não há normas especial que resolva o
problema?
★ Art. 23º/2, 2ª parte, CC - recorre-se à lei
subsidiariamente competente e, se tal não for
possível, ao Direito material do foro, por aplicação
analógica do art. 348º/3, CC.
❖ O que fazer se o conteúdo concreto do elemento de
conexão for incerto (ex.: não se consegue apurar a
nacionalidade do sujeito)?
★ Lima Pinheiro - se for possível que o sujeito tenha
a nacionalidade de outro Estado, deve aplicar-se a
lei desse Estado.
III. Concretização no Tempo - surge devido aos elementos de conexão móveis
(aqueles que podem sofrer alteração no tempo - ex.: nacionalidade, residência
habitual, lugar da situação da coisa móvel), havendo uma sucessão de estatutos ou
conflito móvel.
● Teses da Sucessão de Estatutos:
➔ Baptista Machado - analogia entre a sucessão de estatutos e o
conflito de leis no tempo, sendo aplicáveis, analogicamente, as
regras gerais do Direito Intertemporal;
➔ Ferrer Correia - deve recorrer-se a uma interpretação da norma de
conflitos que suscita o problema.
❖ Lima Pinheiro - esta tese oferece uma base metodológica
mais segura, na medida que a determinação do momento
relevante para a concretização do elemento de conexão é
uma questão de interpretação, devendo então depender dos
fins da norma de conflitos em causa e do sistema de DIP
que a integra.

18
● ≠ Sucessão de Leis no Tempo - nesta, substitui-se uma lei por outra
dentro da mesma ordem jurídica e, na sucessão de estatutos, há duas
ordens jurídicas vigentes. No entanto, há uma certa analogia entre os
critérios valorativos que presidem à escolha do momento relevante de
conexão e os que fundamentam o Direito Intertemporal e, à salvaguarda da
continuidade das situações jurídicas constituídas;
● Que aspetos têm de se ter em conta para resolver o problema da sucessão
de estatutos?
➔ Determinação do Momento Relevante da Conexão - em certos
casos, fixa o legislador (ex.: art. 53º71 e 2, 2ª parte, CC) mas,
caso o legislador não fixe, a determinação do momento é um
problema da interpretação da norma de conflitos e, se outra coisa
não resultar desta interpretação aplica-se, analogicamente, as
regras gerais de Direito Intertemporal (ex.: se estiver em causa a
aquisição de um direito sobre uma coisa móvel que foi deslocada
de um Estado para outro, aplica-se a lei do Estado em que a coisa
estava situada no momento da verificação do facto aquisitivo);
➔ Conjugação dos Estatutos em Presença - alguma doutrina, tem
admitido um princípio de continuidade das situações jurídicas
preexistentes (segurança jurídica e confiança dos sujeitos), ou seja,
a situação validamente constituída sob o império do estatuto
anterior, deve persistir em caso de mudança de estatuto, salvo
razões preponderantes.

Nacionalidade, Residência Habitual e Designação pelo Interessado(s)


Nacionalidade (art. 31º/1, CC) - tem relevância na determinação do estatuto pessoal do
indivíduo, enquanto elemento de conexão, e, enquanto nacionalidade comum nas relações
de família [arts. 52º e 53º, CC e 8º, c), Reg. Roma III] mas, fora do estatuto pessoal,
também releva para a responsabilidade extracontratual (art. 45º/3, CC) - nem sempre é
lei pessoal;
● Interpretação - partir da noção geral da nacionalidade como vínculo
jurídico-político que une uma pessoa a um Estado;
➔ O vínculo pode assumir significados diferentes?
❖ Sim - pode também significar vínculos entre indivíduos e entidades
supraestaduais que não são Estados, mas tal não significa
“nacionalidade europeia” porque esta não existe, apenas existe a
cidadania europeia (arts. 9º e 11º/4, TUE e arts. 19º e ss., TFUE).
● Concretização - pode ser concretizada lege fori (aplicação do Direito do foro) ou
lege causae (aplicação do Direito do Estado cuja nacionalidade está em causa -

19
esta é sempre aplicável devido ao princípio da liberdade dos Estados na
determinação dos seus nacionais);
➔ Arts. 4º e 26º, CRP - perda da nacionalidade.
● Questão prévia de DIP suscitada na determinação da nacionalidade:
➔ Apreciação de uma situação transnacional para determinar a aquisição ou
perda de uma nacionalidade estrangeira, a qual se resolve através da
aplicação do DIP do Estado cuja nacionalidade está em causa, pois apenas
se assegura o princípio da liberdade de cada Estado na determinação dos
seus nacionais.
Residência Habitual (art. 32º/1, CC) - tradicionalmente, tem o papel de elemento de
conexão subsidiário geral em matéria de estatuto pessoal, sendo que releva na falta de
nacionalidade comum (arts. 52º/2, 53º/2, 54º, 56º/2, 57º/1 e 60º/3, CC);
● Residência Habitual Comum - residência habitual no mesmo Estado soberano;
➔ Habitual - elevado grau de estabilidade e permanência (considerável lapso
de tempo).
● Para as fontes internacional e europeia, é o elemento de conexão mais importante;
● “Primeira residência conjugal” (art. 53º/2, in fine, CC) - segundo Lima
Pinheiro, tem de ser a residência habitual, não pode ser ocasional;
● Residência dos Indivíduos - o seu centro de vida pessoal, independentemente de
uma autorização de residência;
● Residência Habitual do Indivíduo - centro efetivo e estável da sua vida pessoal;
● Múltiplas Residências - atende-se à residência habitual do Estado a que o
indivíduo esteja mais estreitamente ligado;
● Falta de Residência Habitual - no caso dos apátridas e refugiados políticos,
aplica-se a residência simples (art. 32º/2, CC) mas, segundo Lima Pinheiro,
seria mais adequado recorrer à lei do Estado com que o apátrida tenha uma
conexão mais estreita;
● Pessoas Coletivas (art. 19º, Reg. Roma I e art. 23º, Reg. Roma II) - há vários
conceitos de residência habitual, tendo natureza técnico-jurídica (local onde se
situa a administração central ou, no caso de o contrato, o facto danoso ou o dano
dizer respeito a um estabelecimento situado noutro país, será o local onde se situa
este estabelecimento).
Designação pelo Interessado(s) - elemento de conexão primário em matéria de negócios
obrigacionais (art. 3º, Reg. Roma I e 41º, CC) e de pessoas coletivas (art. 34º, CC),
tendo um âmbito de aplicação vasto;
Outros Elementos de Conexão:
● Domicílio - vínculo jurídico entre uma pessoa e um lugar situado num certo
espaço territorial, tendo um papel muito limitado no Direito dos Conflitos, tendo,
por outro lado, um papel residual (art. 39º/3, CC);

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➔ Interpretação - relevam os critérios aplicáveis às fontes das normas de
conflitos em causa, devendo incluir uma nota objetiva de permanência
num certo lugar e uma nota subjetiva de intenção de aí permanecer. De
resto, o conceito deve ser aberto a vínculos de domicílio diferentes dos
estabelecidos pela ordem jurídica do foro;
➔ Concretização - há alternativa entre concretização lege fori e lege causae,
sendo a primeira a que evita o surgimento de problemas de conteúdos
múltiplos e falta de conteúdo;
❖ Lima Pinheiro - prefere-se a concretização lege causae quando
utilizado em normas de fonte interna, nomeadamente em matérias
de estatuto pessoal;
❖ Domicílio Profissional (art. 39º/3, CC) - concretização lege fori.
● Sede da Pessoa Coletiva (art. 33º, CC) - relevante para determinar a lei pessoal
das pessoas coletivas;
● Lugar da Celebração - utiliza-se mais para a matéria do negócio jurídico (arts.
36º, 50º e 51º, CC) e também para as obrigações voluntárias (art. 42º/2, CC);
● Lugar da Situação da Coisa - principal elemento de conexão para matéria da
posse e direitos reais (art. 46º/1 e 2, CC), sendo também relevante para a matéria
de capacidade (art. 47º, CC);
● Lugar da Produção do Efeito Lesivo - releva em matéria de responsabilidade
extracontratual (art. 4º/1, Reg. Roma II).

Conexão Mais Estreita


Arts. 4º/4 RRI, 52º/2, 2.ª parte, CC, 60º/2, in fine, CC, 52º/2 LAV;
Valoração conflitual, que atende aos laços existentes entre a situação em causa e a esfera
social dos Estados, a qual não se destina, necessariamente, a determinar qual o laço mais
significativo, podendo resultar de uma combinação de diferentes laços;
Cláusula de Exceção - regras que permitem ao julgador afastar a aplicação da lei em
princípio competente, sempre que haja uma conexão mais estreita com outra lei, diferente
da designada pela norma de conflitos (≠ da conexão mais estreita, visto que o fim da
conexão mais estreita é subsidiário e não para afastar a aplicação de uma lei, em princípio
competente).
● Podem ser de âmbito geral (arts. 4º/3, RRI, 4º/3, RRIV), ou de âmbito setorial;
● Quando não aplicar esta cláusula?
1. Quando as partes tenham designado a lei a aplicar;
2. Quando a regra de conflitos determina a aplicabilidade de uma certa lei
com um determinado objetivo de justiça material.
● O tribunal pode proceder a este método se o país em causa não tiver a cláusula
de exceção (como é o caso de Portugal)?

21
➔ DMV - supostamente, violaria o art. 8º/2 ,CC, na medida em que o
julgador não pode deixar de aplicar a norma competente por a achar
injusto mas o juiz deve mais obediência aos princípios e valores jurídicos,
como é o caso da tutela de confiança.
● Modalidades:
➔ Cláusula Geral de Exceção – aplica-se na generalidade das categorias de
situações transnacionais, que não sejam dela excluídas (não há no Direito
de Conflitos português);
➔ Cláusulas Especiais de Exceção – privativas de matérias específicas
(vigoram no Direito de Conflitos português).
❖ Art. 4º/5, Convenção Roma - a doutrina dominante considera-o
uma cláusula de exceção, mas Lima Pinheiro não concorda,
porque resulta da conjugação do art. 4º/1 e 5 que a lei da conexão
mais estreita é, na falta de escolha pelas partes, a conexão primária
em matéria de contratos obrigacionais.
❖ DMV - defende a introdução de uma cláusula geral de exceção no
ordenamento jurídico português, por tal ser exigível pela justiça da
conexão, a qual é posta em causa quando a norma de conflitos
remete para o Direito de um Estado e a situação apresenta uma
ligação manifestamente mais estreita com outro Estado. No
entanto, esta deve ser excecional, sendo apenas aplicada quando o
laço com a lei primariamente aplicável é ostensivamente fraco e o
laço com a outra lei é manifestamente mais forte.

Devolução/Reenvio
Problema - devemos aplicar a lei designada, mesmo que esta não se considere
competente, ou devemos ter em conta o DIP da lei designada?
● Quais os pressupostos do problema?
1. A norma de conflitos do foro tem de remeter para lei estrangeira;
2. A remissão não pode ser entendida como uma referência material;
3. A lei estrangeira designada não se pode considerar competente (utiliza
elemento de conexão diferente da norma de conflitos do foro, ou, apesar
de utilizar o mesmo elemento, interpreta-o de forma diferente).

Tipos de Reenvio

Retorno de Competência/Reenvio de 1º
Grau - o Direito de Conflitos estrangeiro
(L2) remete a solução da questão para o

22
Direito do foro (L1)

Retorno Indireto

Transmissão de Competência(Reenvio
de 2º Grau - o Direito de Conflitos
estrangeiro remete a solução da questão
para outro ordenamento estrangeiro

Transmissão em Cadeia

Transmissão com Retorno

Critérios Gerais de Solução


Teoria da Referência Material - a referência feita pela norma de conflitos é sempre
material, ou seja, uma remissão direta e imediata para o Direito material da lei designada,
não interessando o Direito de Conflitos da lei designada;
● Está ligado ao reenvio mas, na realidade, traduz-se na exclusão/rejeição do
reenvio;
● Ex.: no Direito do foro (L1) aplica-se a referência material, sendo que, se houver
uma L2 e o Direito português remeter para essa L2, aplica-se a L2;
● Desvantagens - se L1 fizer referência material remetendo para L2 e, se o caso
estiver a ser resolvido em L2 e, se L2 remetesse para L1, contraria a harmonia
jurídica internacional. Se tivermos uma situação de transmissão de competência
também há um conflito, como seria o caso de L1, L2 e L3 fizerem referência
material - não há harmonia jurídica internacional quando todos os países
envolvidos praticam referência material.
Teoria da Referência Global - a remissão da norma de conflitos para uma ordem
jurídica estrangeira é sempre feita através do seu Direito de Conflitos;
● Fundamentos:
➔ Princípio da harmonia jurídica internacional;
➔ Indissociabilidade das normas de conflitos face às materiais (Lima
Pinheiro discorda);
➔ Crítica (DMV) - há situações em que a referência global a uma lei
estrangeira pode conduzir a hipóteses de ciclo vicioso, basta que frente a
frente estejam duas leis que aceitam o reenvio.
● Pouco relevo na prática.

23
Teoria da Devolução Simples - a remissão da norma de conflitos do foro abrange as
normas de conflitos da ordem estrangeira, mas a remissão feita pela norma de conflitos
estrangeiras, entende-se como referência material;
● Vantagem - relativamente fácil de aplicar e evita situações de pingue-pongue
perpétuo;
● Apenas casualmente leva à harmonia internacional de soluções;
● O que aceita?
➔ O retorno direto, mesmo que L2 não aplique L1;
➔ A transmissão de competência para L3, mesmo que esta não seja aplicada
por L2 nem se considere competente.
Teoria da Dupla Devolução - o tribunal do foro decide a questão tal como ela seria
decidida pelo tribunal do país da ordem jurídica designada, assegurando que o tribunal de
L1 aplique a mesma lei e solução que o tribunal de L2 (harmonia entre L1 e L2);
● Problema - se estiverem face a face dois sistemas que pratiquem dupla devolução
ambos querem decidir segundo o outro;
● Ex.: L1 remete para L2. A L2 é a lei inglesa, que aceita a tese da dupla
devolução. Assim sendo, o que acontece é que a L2, que remete para a L3, vai
tentar perceber como é que a L3 resolveria o caso, imitando-a. A L2 manda ver a
L3, que resolve remetendo para a L2. A L2, então, vai aplicar a sua própria lei.
Regime Vigente em Portugal:
I. Regra Geral da Referência Material
● Art. 16º, CC - a referência material é a regra geral mas, como se admite
“preceito em contrário”, não se adota, na totalidade, a teoria da referência
material, ou seja, aceita-se a devolução nos casos em que a lei o determina
(arts. 17º, 18º, 36º/2, 65º/1, in fine, CC);
➔ Baptista Machado - este artigo não é um princípio geral, mas sim
uma “regra pragmática”, que admite desvios.
II. Transmissão de Competência
● Art. 17º, CC - permite, sob certas condições, a transmissão de
competências, através dos seguintes pressupostos:
1) O Direito estrangeiro designado pela norma de conflitos
portuguesa tem de aplicar outra ordem jurídica estrangeira (L2
remete para L3);
2) Esta outra ordem jurídica estrangeira tem de aceitar a competência.
● Art. 17º/1, CC - também permite o caso em que L2 remete para L4 e esta
considera-se competente;
● Art. 17º/2, CC - aplica-se em matéria de estatuto pessoal, sendo que, não
há transmissão de competência se o interessado tiver residência habitual
em Portugal, ou se o interessado tiver residência habitual noutro Estado
que aplica o Direito material do Estado da nacionalidade;

24
➔ Quais as dificuldades de interpretação deste artigo?
❖ Quando a lei pessoal não é a lei da nacionalidade (em
princípio, L2 tem de ser a lei da nacionalidade chamada a
reger em matéria de estatuto pessoal);
❖ Determinação do interessado (o interessado é quem
desencadeou o funcionamento do elemento de conexão que
designou L2 - ex.: na sucessão, o interessado é o de cuius);
❖ Concretização no tempo do elemento de conexão residência
habitual (a residência habitual relevante é a residência ao
tempo da situação).
● Art. 17º/2, 2ª parte, CC - a lei da nacionalidade remete para um Estado
que não é o da residência habitual, sendo que cria desarmonia com o DIP
desta lei, mas harmonia com o DIP da residência habitual;
➔ Quais as reservas desta fundamentação?
❖ Faz cessar a devolução quando L3 for a lei do domicílio, se
este não coincidir com a residência habitual, e a lei da
residência habitual aplicar a lei da nacionalidade;
❖ Em princípio, é mais importante a harmonia com a lei da
nacionalidade do que com a residência habitual.
● Art. 17º/3, CC - em certos casos, repõe a transmissão de competências,
sendo que só se aplica quando quando se tenham verificado as previsões
das normas contidas nos nºs 1 e 2, permitindo abandonar o critério de
conexão , para assegurar a efetividade das decisões dos seus tribunais,
quando o Direito da nacionalidade estiver de acordo na aplicação da lei do
lugar da situação da coisa.
➔ Pressupostos de Aplicação:
❖ Tem de se tratar de uma matéria nele indicadas;
❖ A lei da nacionalidade tem de aplicar a lei do lugar da
situação da coisa;
❖ A lei do lugar da situação da coisa tem de se considerar
competente;
❖ Tem de se verificar um dos casos de cessação da
transmissão de competências do nº 2.
III. Retorno
● Art. 18º, CC - admite, sob certas condições, o retorno de competências;
● Art. 18º/1, CC - o único pressuposto de aplicação é que L2 remeta para o
Direito material português, porque só neste caso o retorno é condição
necessária para assegurar harmonia com L2;
➔ Se L2 remete para o Direito português, mas não se aplica a lei
portuguesa, não se aceita o retorno, aplicando-se L2 pelo art. 16º,

25
CC (não se aceita o retorno direto operado por um sistema que
pratica devolução simples);
➔ Se L2 aplica L3 e L3 aplica L1, então, L2 aplica L1.
● O que acontece no caso em que o retorno direto feito por L2 não opera
direta e imediatamente para L1, mas antes condiciona a resposta ao
sistema de devolução português?
➔ Baptista Machado - se L2 fizer dupla devolução, tem de se aceitar
o retorno, porque se L1 aceitar o retorno, L2 aplica L1, facilitando
a administração da justiça;
➔ Lima Pinheiro - se se aplicar L2, L2 considera-se competente, não
havendo necessidade de sacrificar o critério de conexão, ou seja, o
retorno não é necessário para haver harmonia.
● Art. 18º/2, CC - só se aplica quando há retorno nos termos do nº 1, sendo
que, em matéria de estatuto pessoal, o retorno só é aceite quando o
interessado tem residência habitual em Portugal, ou quando o interessado
tem residência habitual num Estado que aplique o Direito material
português.
IV. Favor Negotii como Limite ao Reenvio
● Art. 19º/1, CC - sempre que haja reenvio nos termos dos arts. 17º e 18º,
CC, o mesmo fica paralisado sempre que L2 seja mais favorável à
validade/eficácia do negócio, ou à legitimidade de um estado que a lei
aplica com a devolução;
➔ Baptista Machado e Ferrer Correia - defendem uma
“interpretação restritiva” deste artigo, devido à tutela da confiança,
ou seja, este artigo só se aplicaria às situações já constituídas e
desde que a situação esteja em contacto com a ordem jurídica
portuguesa ao tempo da sua constituição (Lima Pinheiro
discorda).
V. Casos em que Não é Admitida a Devolução
● Arts. 19º/2, 34º e 41º, CC - quando a remissão é feita pelo elemento de
conexão designação pelos interessados;
● Arts. 20º, RRI, 24º, RRII, 11º, RRIII;
● Art. 34º/1, RRV - tem dois casos diferentes de reenvio, mas tem um
requisito comum a cada um desses casos, que é o da aplicação da lei de
um Estado terceiro, ou seja, para se aplicar este artigo, L2 tem de ser a lei
de um Estado terceiro, sendo este todo aquele Estado que não seja um EM
vinculado por este Regulamento.
❖ Al. b) próxima com o art. 17º/1 CC, aditando-se um requisito
adicional – L2 e Ln têm de ser de Estados terceiros;
❖ Al. a) parecido com o art. 18º/1, CC.

26
Remissão para Ordenamentos Jurídicos Complexos

Que problemas suscitam?

I. Quando é que a norma de conflitos remete para o ordenamento jurídico complexo?


II. Se a norma de conflitos remete para o ordenamento jurídico complexo, como sabemos
qual o aplicável?

Quais os artigos a ter em conta?

Art. 20º, CC;


Art. 22º/1, RRI;
Art. 25º/1, RRII.

Quando é que a norma de conflitos remete para o ordenamento jurídico complexo?

Art. 20º, CC - apenas há remissão pelo elemento de conexão nacionalidade;


O que fazer se o elemento de conexão for a residência habitual, domicílio, lugar da
celebração, lugar do dano, lugar da situação da coisa, etc.?
● Ferrer Correia - se o elemento de conexão apontar, diretamente, para certo lugar
no espaço, aplica-se a lei vigente nesse mesmo espaço;
● Isabel de Magalhães Collaço (DMV concorda) - a remissão é feita para o
Direito do Estado soberano.
➔ DMV - em princípio, quando a norma de conflitos de DIP remete para o
Direito estadual, fá-lo para o Direito de um Estado soberano.
Art. 22º/1, RRI e art. 25º/1, RRII - a remissão é uma referência direta a um dos Direitos
locais.
● Partes designam a ordem jurídica complexa - a remissão é feita para o
ordenamento jurídico do Estado soberano, procedendo à determinação do sistema
aplicável.
Arts. 14º, a), b) e c) e 15º, RRIII - em princípio, a remissão é entendida como como
referência direta a um dos sistemas locais mas, a referência à lei da nacionalidade e no
caso de ordem jurídica complexa de base pessoal são referências feitas à ordem jurídica
complexa no seu conjunto.

Como determinar qual o ordenamento jurídico complexo a aplicar?

27
Princípios Orientadores:
● O ordenamento jurídico complexo tem de resolver os conflitos de leis internas,
determinando qual o sistema interno aplicável (base territorial);
❖ Quando a remissão é feita pelo elemento de conexão nacionalidade:
➢ Art. 20º/1, CC (arts. 36º/1 e 37º, RRIII) - cabe ao ordenamento
jurídico complexo fixar o sistema interno aplicável;
➢ Na falta de concordância entre todos os ordenamentos locais, basta
o acordo dos ordenamentos em contacto com a situação sobre a
competência de um deles;
➢ Art. 20º/2, CC - quando não dá para resolver a situação com o
Direito Interlocal vigente, presume-se analogia com o DIP,
recorrendo-se ao DIP desse mesmo Estado. Mas, se não houver
esse DIP, atende-se à lei da residência habitual.
★ In fine - segundo Isabel Magalhães Collaço (DMV
concorda), apenas releva a residência habitual dentro do
Estado da nacionalidade (interpretação restritiva - a função
do artigo é indicar o sistema aplicável de entre os que
integram o ordenamento jurídico complexo), sendo que,
quando a residência habitual está fora do Estado da
nacionalidade, há uma lacuna, recorrendo-se ao princípio
da conexão mais estreita6 (DMV - também se pode invocar
a analogia com o art. 28º, LN). Por outro lado, segundo a
Escola de Coimbra aplica-se a lei da residência habitual
mesmo que não esteja dentro do Estado da nacionalidade.
❖ Quando a remissão é feita por um elemento de conexão que não seja o da
nacionalidade:
➢ DMV - aplica-se, analogicamente, o art. 20º/3, CC às normas de
Direito Interpessoal da ordem jurídica designada e, se tais normas
não houverem, aplica-se o sistema com o qual a situação tem uma
conexão mais estreita.
● Se o ordenamento jurídico complexo não conseguir resolver o problema, será de
aplicar o ordenamento que tem uma conexão mais estreita com a situação (base
pessoal).
➔ Art. 20º/3, CC - o ordenamento complexo tem de determinar qual o
sistema pessoal competente, aplicando-se as normas de Direito
Interpessoal da ordem jurídica designada, incluindo as normas de conflitos
interpessoais e as de Direito material especial;
6
A conexão mais estreita determina-se através de todos os laços objetivos e subjetivos que exprimam uma ligação
entre a pessoa em causa e um dos sistemas vigentes no ordenamento jurídico complexo, e do vínculo de
subnacionalidade que, nos Estados federais, se estabeleça com os Estados federados, do vínculo de domicílio, e na
sua falta, da última residência habitual ou último domicílio dentro do Estado da nacionalidade.

28
➔ Se o ordenamento jurídico complexo de base pessoal não resolver o
problema, aplica-se o sistema com a qual a situação tem uma conexão
mais estreita;
➔ Quando a remissão é feita por um elemento de conexão que não seja o da
nacionalidade:
❖ Isabel Magalhães Collaço - há uma lacuna, que deve ser integrada
por aplicação analógica do art. 20º, CC, devendo sempre
atender-se ao Direito Interlocal e DIP unificados de que o
ordenamento complexo disponha.
➔ O que fazer quando não há Direito Interlocal nem DIP unificados?
❖ Se a remissão feita pela norma de conflitos apontar para um
certo lugar no espaço, ou diretamente para certo sistema local, a
remissão é feita para o sistema local;
❖ Quando os elementos de conexão apontam para um certo lugar
no espaço, consideram-se os sistemas locais como se fossem
autónomos, sendo que a norma de conflitos remete indiretamente
para o sistema do dito lugar;
❖ Quando os elementos de conexão não indiquem um lugar no
espaço atende-se ao sistema local para que os elementos remetam
diretamente.
➢ Designação pelas partes - atende-se ao sistema local com a
conexão mais estreita com a situação.

Fraude à Lei

Este problema, em DIP, surge quando se visa alcançar o resultado que a norma proibitiva
evita, mas a fraude consiste no afastamento da lei que contém essa norma proibitiva,
utilizando outra ordem jurídica;
Doutrina Atual - na fraude à lei, está em causa o afastamento da lei normalmente
competente e o desrespeito pela norma imperativa nela contida, ainda que o Direito do
foro não tenha uma norma equivalente;
RR - omissos sobre a relevância da fraude.

Tipos:

Manipulação do Elemento de Conexão (atividade fraudatória) - para afastar a lei


normalmente competente, o agente da fraude modela o conteúdo do elemento de
conexão;

29
● Ex.: como a lei de França não permite o divórcio, dois franceses adquirem
nacionalidade portuguesa para se poderem divorciar cá;
● Para que esta tenha êxito, tem de haver, primeiramente, algo contra a lei
normalmente aplicável (não sucede quando as partes escolhem o Direito
aplicável);
Internacionalização Fictícia de uma Situação Interna - para afastar o Direito material
vigente na ordem jurídica interna, que é o exclusivamente aplicável a uma situação
interna, estabelece-se uma conexão com um Estado estrangeiro para desencadear a
aplicação do seu Direito.
● Ex.: dois portugueses, para fugir à imposição da taxa legal de juros da lei
portuguesa, celebram um contrato em Madrid, escolhendo a aplicação da lei
espanhola.

Elementos Objetivos:

1º Requisito - na lei normalmente aplicável, tem de haver, efetivamente, uma norma


imperativa objeto de fraude;
● Objeto da Fraude - a norma de conflitos é objeto de fraude porque há uma
atuação sobre esta norma que leva à frustração das suas finalidades.
2º Requisito - a manipulação tem de ter êxito, ou seja, desencadear o chamamento de uma
lei diferente.
● Ferrer Correia - não há fraude quando a conduta consiste na mudança de
nacionalidade e o naturalizado se integra, seriamente, na sua nova comunidade
nacional (inicialmente há fraude, mas é sanada pela integração efetiva na nova
comunidade).

Elemento Subjetivo

Intenção Fraudatória - vontade de afastar a aplicação de uma norma imperativa que


seria normalmente aplicável;
O dolo também incide sobre a manipulação do elemento de conexão e a
internacionalização fictícia de uma situação interna;
Tem, geralmente, de ser retirado dos factos, com base em juízos de probabilidade
fundados em regras de experiência.

Medidas Preventivas:

Art. 33º/1, CC - o legislador manda atender à sede principal e efetiva da administração


da pessoa coletiva, evitando-se uma possível “sede fictícia”;

30
Art. 55º/2, CC - quando se determinava que, em caso de mudança de lei competente na
constância do matrimónio, só pode haver separação/divórcio com um facto relevante
perante a lei competente ao tempo da sua verificação.

Sanção:

Fernando Olavo - todos os atos fraudulentos, incluindo a naturalização do indivíduo são


nulos ou, para todos os efeitos, inoperantes;
Outra Doutrina - o Estado do foro não pode declarar inválida a aquisição de uma
nacionalidade estrangeira, podendo apenas recusar qualquer efeito na aplicação da norma
de conflitos a essa naturalização;
● Art. 21º, CC (DMV) - a sanção remete para o que se aplica nas normas de
conflitos, aplicando-se a lei normalmente competente, tendo em conta que a
fraude viola a boa fé.
❖ Estatuição - a sanção é a irrelevância da situação jurídica criada pelas
partes, situando-se no plano de Direito dos conflitos.
Sanção da Fraude à Lei Estrangeira - também deve ser sancionada;
No tratamento da fraude à lei estrangeira deve ter-se em conta a posição da lei
defraudada?
● Ferrer Correia e Baptista Machado - não diferenciam entre a sanção da fraude
à lei do foro e da fraude à lei estrangeira;
● Isabel Magalhães Collaço - a fraude à lei do foro é sempre sancionada e a fraude
à lei estrangeira só é sancionada se a lei estrangeira defraudada também sancionar
a frase, ou se, embora a lei estrangeira defraudada não sancione a fraude, está em
causa, de acordo com o DIP do foro, um princípio do mínimo ético nas relações
internacionais - harmonia internacional.
DUE (DMV) - ao estabelecer a liberdade dos interessados usufruir das diferenças de
regimes de vários sistemas jurídicos, limita o âmbito de aplicação da fraude à lei.

Normas de Aplicação Imediata

Normas “Autolimitadas”

Definição - norma material que, apesar de incidir sobre situações reguladas pelo DIP, tem
uma esfera de aplicação no espaço diferente da que resultaria da atuação do sistema de
Direito de Conflitos, reclamando a sua aplicação mesmo em situações que não estariam
submetidas segundo a norma de conflitos geral a esse ordenamento jurídico onde estão
previstas;

31
Normas de Aplicação Imediata - normas que, em certos casos, reclamam a sua
aplicação, apesar de ser competente uma lei estrangeira (critério formal);
● Há lugar à determinação da aplicabilidade da norma através de um critério
material (conteúdo/fim da norma?
❖ Alguma Doutrina - a aplicabilidade define-se com fins de alguma
natureza/intensidade valorativa;
❖ Lima Pinheiro - a aplicabilidade define-se com múltiplos fins, não sendo
possível caraterizá-la pelo seu conteúdo/fim. Assim, aplicam-se as normas
de aplicação imediata de forma excecional, havendo uma contenção do
legislador estadual na atribuição de uma esfera de aplicação no espaço
mais ampla do que a que resultaria do Direito de Conflitos geral, a normas
ou leis imperativas internas e, também uma formulação de exigências
metodológicas muito estritas, podendo o intérprete determinar a aplicação
imediata de certa norma/lei imperativa, em caso de omissão do legislador -
art. 9º/1, RRI.
● Tipos de Normas de Aplicação Imediata:
❖ Normas internacionalmente imperativas do foro (art. 9º/2, RRI) - não
afastam completamente as normas definidas pela lei geral, apenas as
incompatíveis;
❖ Normas internacionalmente imperativas de outros Estados (art. 9º/3,
RRI) - têm um âmbito de aplicação bastante restrito (“pode”).
● Quando é que o intérprete sabe que certa norma é “autolimitada”?
❖ Alguma Doutrina - sabe com a interpretação, nomeadamente um critério
teleológico que atenda ao fim político-jurídico da norma material;
➢ Lima Pinheiro - tal não parece conclusivo.
❖ Vias Possíveis (Lima Pinheiro):
1. Inferência de uma norma de conflitos ad hoc implícita (norma de
conflitos implícita deve inferir-se das proposições legais ou de
práticas com convicção de vinculatividade);
2. Criação de uma solução conflitual ad hoc, com a teoria das lacunas
da lei (na falta de norma de conflitos implícita, tem de haver uma
integração de lacuna por parte do intérprete, sendo, na maioria dos
casos, uma lacuna oculta. A integração de lacuna pressupõe uma
interpretação restritiva ou redução teleológica da norma de
conflitos geral, as quais podem ser justificadas pelo facto desta
norma não tutelar o valor subjacente à norma ou lei material em
causa);
3. Vigência de uma cláusula geral que permita colocar o problema da
aplicabilidade da norma material em função das circunstâncias do

32
caso concreto (em Portugal, não há fundamento para a aplicação
desta cláusula).
❖ Outra Doutrina - em caso de omissão do legislador, o intérprete não pode
qualificar uma norma como sendo de aplicação imediata.
● Como apreciar a eficácia de uma norma de aplicação imediata? (DMV)7
❖ Verificar o objeto e o fim da norma;
❖ Verificar se há conexão entre a situação a regular e a ordem jurídica a que
pertence;
❖ Verificar se há conformidade com os valores e interesses prosseguidos
pelo DIP (tutela da confiança e harmonia internacional).

O Problema da Relevância das Normas Imperativas Estrangeiras

Problema - as normas imperativas estrangeiras só podem ser aplicadas na ordem jurídica


local por força da possibilidade de aplicação de uma norma desta ordem, cabendo saber
em que termos podem as normas “autolimitadas” de ordenamentos estrangeiros ser
chamadas pelo Direito de Conflitos a regular a questão em causa (terceiros
ordenamentos) - relevante em matéria de obrigações contratuais;
Distinção:
● Normas Imperativas da Lex Causae (lei designada pelo sistema de Direito dos
Conflitos) - em princípio, são aplicáveis no quadro do título de aplicação que lhes
é conferido pelas normas de conflitos gerais. No entanto, como as normas de
conflitos especiais limitam a aplicação de normas de conflitos gerais, as normas
imperativas da lex causae, reconduzíveis à categoria normativa prevista na norma
de conflitos especial, não terão aplicabilidade;
➔ O que fazer quando estas normas são “autolimitadas”, excluindo a sua
aplicação à situação que são chamadas a disciplinar?
❖ Se a negação de aplicabilidade da norma não põe em causa a
competência da ordem jurídica a que pertence, deve respeitar-se a
“autolimitação”, no caso contrário, a “autolimitação” apenas
releva para efeitos de devolução.
● Normas Imperativas de Terceiros Ordenamentos - cabe saber se a ordem
jurídica local lhes dá âmbito de aplicação através de proposições jurídicas
especiais ou se permite a sua tomada em consideração.
➔ Art. 9º/3, RRI - as normas têm de ser de aplicação necessária (Lima
Pinheiro não acha isto justificado).
Teses:
● Teoria do Estatuto Obrigacional - as normas imperativas estrangeiras só se
aplicam quando se integram na lex causae (promove a harmonia internacional

7
A eficácia não depende apenas da sua vontade de aplicação.

33
entre a ordem jurídica do foro e a lei primariamente aplicável, que é a que tem a
conexão mais estreita com a situação considerada no seu conjunto);
➔ Crítica (Lima Pinheiro) - não tem em conta o bem comum universal (dá
relevância a normas imperativas de terceiros ordenamentos com fins
relevantes para a ordem jurídica do foro), nem a harmonia internacional
com outros ordenamentos jurídicos, que podem ter uma conexão
significativa com o caso, nem as exigências que podem decorrer entre EM
da UE. também veda o desenvolvimento de normas de conflitos especiais
ou de cláusulas gerais bilaterais
● Teoria da Conexão Especial (Marques dos Santos) - tem de haver uma regra de
reconhecimento, para legitimar, no Estado do foro, a aplicação de normas de
aplicação imediata estrangeiras, de acordo com as condições e dentro dos limites
fixados pelo Estado do foro. Este considera como limites ao reconhecimento a
exclusão de pretensões de aplicação exorbitante e das normas que colidam com
interesses do Estado do foro ou afins aos deste Estado. Assim, esta tem conta a
harmonia internacional com terceiros ordenamentos que tenham uma conexão
significativa com o caso, o bem comum universal e as es exigências da
cooperação regional.
➔ Críticas (Lima Pinheiro) - não tem suficientemente em conta a
importância da harmonia com a lei primariamente aplicável à situação;
recorre à técnica da cláusula geral (grande margem de apreciação ao
intérprete); aumenta o risco do cúmulo de normas imperativas de
diferentes Estados (desigualdade no tratamento de situações
transnacionais);
Posições Adotadas (Lima Pinheiro):
● De Iure Condendo - prefere a criação de normas de remissão, condicionada a
certas categorias de normas imperativas de Estados com conexão com a situação
com base nas finalidades de política legislativa de normas e regimes materiais
individualizados e no conjunto de princípios e ideias orientadoras de DIP;
➔ Contratos - remissão condicionada ao Direito do lugar onde o contrato
deve ser executado.
● De Iure Constituto - não há, na ordem jurídica portuguesa, nenhuma regra geral
sobre relevância das normas imperativas de terceiros ordenamentos, apenas o
DIP consagra.
➔ Art. 9º/3, RRI - converge com a posição de iure condendo, mas é mais
restritivo (apenas normas de aplicação imediata). No entanto, as normas de
aplicação imediata são as relativas à execução do contrato, mas também à
validade;

34
➔ Arts. 16º e 17º, RRII - o primeiro permite a aplicação de normas de
aplicação imediata do Estado do foro mas, o segundo releva normas do
lugar onde ocorre a conduta lesiva;
➔ Art. 30º, RRV - a aplicação de normas imperativas de terceiros
ordenamentos deve depender de normas de conexão especiais.

Relevância de Normas Imperativas de Terceiros Estados com a Lex Causae

Quando a ordem jurídica local não permite a aplicação de normas imperativas de


terceiros Estados, estas normas podem ter relevância no Direito material da lex causae,
ou seja, quando a norma é um pressuposto do facto da aplicação de uma norma material
lex causae;
Lima Pinheiro - pode invocar-se a contrariedade aos bons costumes do objeto/fim do
contrato, havendo, também, uma margem de apreciação para tal.

Estatuto do Direito Estrangeiro

Problema - quando a ordem jurídica do foro remete para a ordem jurídica estrangeira, como
sabemos qual a interpretação, conhecimento e prova do Direito?

Direito Estrangeiro Aplicável

Aplica-se o Direito estrangeiro vigente na ordem jurídica designada pelo Direito de


Conflitos, não tendo de ser normas que emanam, diretamente, de fonte estadual (normas
de Convenções de Direito material unificado e normas de organizações regionais que
vigorem na ordem jurídica interna;
Como saber quais as normas juridicamente vigentes?
● Sistema de fontes da ordem jurídica em causa;
● Ex.: se na ordem jurídica inglesa, as decisões dos tribunais superiores
estabelecem um precedente que deve ser respeitado em decisões futuras, o órgão
de aplicação do Direito português tem de respeitar.
❖ O órgão jurídico português tem de respeitar esta situação se, na ordem
jurídica em causa, o sistema de precedente não é vinculativo?
➢ Lima Pinheiro - há que respeitar a hierarquia de fontes da ordem
jurídica estrangeira.
Quando é que o tribunal português pode exercer o controlo de constitucionalidade das
normas materiais estrangeiras à face da Constituição estrangeira?

35
● Lima Pinheiro - se a inconstitucionalidade foi declarada com força obrigatória
geral na ordem jurídica estrangeira; se, e nos termos em que, os tribunais
estrangeiros possam exercer esse controlo (controlo difuso de
constitucionalidade).
Cararterísticas:
● Não tem de ser emanado de órgãos estaduais legítimos/reconhecidos pelo Estado
português, podendo ser normas postas em vigor por autoridades de ocupação,
desde que em conformidade com o DIP;
● Qualificação - o facto do Direito estrangeiro competente conter um instituto
jurídico desconhecido, não impede o seu chamamento pelo Direito de Conflitos
português.
Em que casos é que o Direito português não pode aplicar o Direito estrangeiro?
● Quando o Direito estrangeiro exige a intervenção de uma autoridade pública e não
haja, no Estado local, nenhuma autoridade com competência para tal;
● Quando a aplicação do Direito estrangeiro requer procedimentos especiais
incompatíveis com o Direito processual do foro.

Interpretação do Direito Estrangeiro

Art. 23º/1, CC - interpretado em conformidade com os critérios de interpretação do país


de origem e com a jurisprudência e doutrina dominantes.

Conhecimento e Prova do Direito Estrangeiro

Para decidir, o tribunal tem de conhecer os factos (alegados e provados pelas partes) e o
Direito (art. 664º, CPC);
Pode exigir-se conhecimento oficioso do Direito estrangeiro?
● Art. 348º/1 e 2, CC - dever de colaboração de quem invoca o Direito estrangeiro
na determinação do seu conteúdo (não há ónus) - é de conhecimento oficioso
(justiça do DIP);
● Lima Pinheiro - o Direito dos Conflitos seria sempre de conhecimento oficioso e,
quanto às matérias disponíveis, o tribunal convida as partes a alegarem e
provarem o conteúdo dessa lei, caso nenhuma das partes o invoque, sob pena da
aplicação da lei do foro.
Meios de averiguação do conteúdo do Direito estrangeiro:
● Colaboração das partes;
● Mecanismos estabelecidos em Convenções internacionais.
O que fazer em caso de dificuldade?
● Lima Pinheiro - o tribunal português não pode recorrer a presunções para fixar o
conteúdo do Direito estrangeiro (soluções muito diferentes);

36
● Art. 23º/2, CC - passa-se à conexão subsidiária, sendo que, só se a mesma não
der é que se aplica o Direito português segundo o art. 348º/3, CC (apenas quanto
a Direito material estrangeiro8);
● Impossibilidade Parcial - quando o tribunal só conhece de certos princípios gerais
ou algumas regras que não permitem resolver inteiramente o caso.
➔ Lima Pinheiro - tribunal deve aplicar as regras do Direito competente que
conhece, sendo que o Direito subsidiariamente aplicável/do foro só devem
ser aplicado às partes que o tribunal desconhece.

Ordem Pública Internacional

Ex.: Um cidadão marroquino casado pretende casar de novamente em Portugal. A lei pessoal
deste marroquino aplicável à sua capacidade pessoal – por força do art.º 49.º CC - permite o
casamento nestas circunstâncias. Os homens islâmicos podem casar até quatro vezes, casamento
poligâmico. Pode o conservador do registo civil português registar esse casamento?

Definição (art. 22º, CC) - limite à aplicação do Direito estrangeiro competente segundo o
Direito de Conflitos, ou ao reconhecimento de uma decisão estrangeira, porque essa aplicação
pode ser incompatível com princípios e normas fundamentais da ordem jurídica portuguesa.

É “internacional” porque é específica do DIP;


É “nacional” porque veicula princípios e normas fundamentais da ordem jurídica do
foro;
Art. 22º/2, CC - só em último caso é que se recorre ao Direito material do foro.

OPI e OP de Direito Material

Semelhanças:
● Alguns princípios e regras não podem ser afastados na solução de um caso.
Diferenças:

OPI OP de Direito Material

Princípios e regras imperativas são Amplo - enquanto conceito científico,


mais restritos (princípios e normas do inclui regras e princípios gerais
ordenamento do foro). imperativos.

Limite excecional à aplicação do Limite à autonomia privada no


Direito estrangeiro. contexto do Direito material.

8
Se se tratar de devolução, a remissão é para a ordem estrangeira designada (art. 16º CC).

37
Reserva de OPI enquanto Limite à Aplicação do Direito Estrangeiro

Problema - depois da LP chamar o Direito estrangeiro a regular a questão, é de apreciar a


compatibilidade da solução do Direito estrangeiro designado com a OPI, intervindo
quando a solução é intolerável face a certos princípios e normas da ordem jurídica
portuguesa;
Normas de aplicação necessária - segundo Lima Pinheiro, estas não fazem parte da OPI,
devido aos seus fins ético-jurídicos;
Cláusulas Especiais de OP - segundo Lima Pinheiro, são normas “autolimitadas” que,
por força de normas de conflitos unilaterais ad hoc, são aplicáveis independentemente do
conteúdo da lei estrangeira competente.

Caraterísticas

Imprecisão - ninguém consegue enunciar, de forma taxativa, todos os princípios que


integram a OPI;
Excepcionalidade - reserva da OP é uma exceção, ou seja, um limite à aplicação do
Direito estrangeiro e, também quer dizer que, além disto, funciona excecionalmente, ou
seja, não se pode afastar a aplicação do Direito estrangeiro só porque contém uma
disposição diferente da lei portuguesa, nem basta que haja diferença de opiniões;
Relatividade - para que a OPI possa valer, é preciso que haja uma conexão intensa com a
ordem jurídica portuguesa;
Atualidade - hoje, a OPI não é a mesma de há 20/30 anos.

Requisitos de Aplicação da OPI

1. A
­ situação a regular tem que ter uma conexão suficiente com o Direito português;­
2. Juízo de Incompatibilidade – o Direito estrangeiro tem de ser incompatível com o
português.

Consequências da Intervenção da OPI

Afastamento do resultado a que conduz a aplicação do Direito estrangeiro;


● Se daqui não resultar uma lacuna, continua a aplicar-se o Direito estrangeiro
(atuação contrária resulta de norma especial);
● Se daqui surgir uma lacuna, deve recorrer-se à analogia ou princípios jurídicos,
visando obter-se a solução de acordo com o Direito estrangeiro
Não reconhecimento de uma decisão estrangeira.

38
Lei Pessoal das Pessoas Singulares (arts. 25º e ss., CC)

Noção, Âmbito e Determinação

Art. 25º, CC - matérias do estatuto pessoal9, o qual é o conjunto das proposições


jurídico-materiais chamadas a título de lei pessoal, pelas normas de conflitos relevantes;
Art. 31º/1, CC - em princípio, é a nacionalidade do indivíduo;
● Art. 52º/2, 1ª parte, CC - em certos casos, é a lei da residência habitual.
Princípios Essenciais:
● Princípio da Conexão Mais Estreita - aplicação da lei com que a pessoa(s) em
causa está mais intimamente ligada/familiarizada;
● Princípio da Personalidade dos Indivíduos - importância e tutela da personalidade
dos sujeitos, sendo que certas qualidades e situações jurídicas devem ser
reconhecidas por toda a ordem jurídica.
Apátrida (art. 32º, CC) - aqui, não se aplica o princípio da nacionalidade, mas sim a lei
da residência habitual;
● Art. 31º/1, CC + art. 32º, CC - conexão subsidiária, sendo que, na falta de
nacionalidade, recorre-se à lei da residência habitual e, na falta desta, à lei da
residência ocasional;
● Art. 32º/1 e 2, CC (Lima Pinheiro) - a coexistência de 2 elementos de conexão
(residência habitual e domicílio legal) pode gerar dificuldades quando o apátrida
é maior segundo a LRH e um Estado considera-o menor e legalmente domiciliado
no seu território, ou quando o apátrida é menor segundo a LRH e nenhum Estado
o considera menor e legalmente domiciliado;
➔ Solução - a RH representa um laço mais significativo do que o domicílio
legal e, não faz sentido, no nosso sistema, tratar como menor um apátrida
que é maior segundo a LRH.
Refugiado Político - mesmo que o refugiado não tenha perdido a nacionalidade do
Estado contra o qual busca proteção no estrangeiro, o vínculo de nacionalidade perde
significado (art. 12º, Convenção de Genebra Relativa ao Estatuto dos Refugiados),
sendo a lei pessoal definida pela lei do domicílio e, na sua falta, pela lei da residência;
Art. 31º/2, CC - desvio ao princípio da nacionalidade;
● Pressupostos de aplicação:
➔ Negócio jurídico inválido segundo a lei pessoal;
➔ Negócio jurídico celebrado no país estrangeiro da RH do declarante;
➔ Negócio jurídico válido perante a LRH;
➔ LRH considera-se competente.

9
Estados, qualidades ou situações que, por afetarem a pessoa na sua esfera jurídica, o legislador de conflitos definiu
uma legislação em função dos sujeitos.

39
● Lima Pinheiro - preocupação de acautelar a continuidade das situações
constituídas no país da RH com base nas suas leis (proteção da confiança),
podendo haver uma aplicação analógica deste artigo, desde que respeite o art.
17º, CC.
➔ Em que casos se pode aplicar, analogicamente, este artigo?
❖ Quando a situação se constitui no país da RH segundo outro
Direito, que se considera competente e que é o aplicável segundo o
Direito de Conflitos da RH;
❖ Quando a situação se constitui num 3º Estado com base na LRH
que se considere competente ou com base na lei de um 3º
ordenamento que se considere competente e seja considerada
válida à face do DIP da RH.

A Personalidade

Art. 26º/1, CC - o início e termo da personalidade são fixados pela lei pessoal, sendo que
a nacionalidade pressupõe a personalidade jurídica;
Art. 26º/2, CC + art. 68º/2, CC - presunção de comoriência;
Art. 32º, RRV - presunção de comoriência quando as leis em presença conduzam a
resultados inconciliáveis ou não regulem a questão, no caso concreto;
Direitos de Personalidade (art. 27º, CC) - a atribuição dos direitos, o seu conteúdo e as
restrições impostas ao seu exercício são regidos pela lei pessoal;
● Art. 27º/2, CC - a lei pessoal estrangeira decide quais as pretensões que o
interessado pode atuar e, por outro lado, a lei portuguesa decide sobre quais os
meios processuais que podem ser utilizados (aplicação distributiva);
● Formas de Autotutela - têm de ser concedidas pela lei pessoal estrangeira e,
quando envolvam a utilização de meios coercivos, também têm de ser autorizadas
pela lei portuguesa.

O Estado e a Capacidade (art. 25º, CC)

Estado - qualidade que afeta a esfera jurídica do indivíduo, condicionando a atribuição


de poderes e deveres a essa pessoa, podendo resultar de uma relação jurídica (ex.:
familiar), ou de circunstâncias individuais (ex.: maioridade);
Capacidade (art. 25º, CC) - abrange a capacidade genérica de gozo e a genérica de
exercício;
● Não abrange a capacidade específica de gozo e exercício, figuras afins;
● Falta de solução autónoma - estas capacidades não abrangidas estão submetidas à
lei reguladora das relações/situações jurídicas a que respeitam, podendo ou não se
a lei pessoa.

40
O que fazer quando uma pessoa maior, à luz da sua lei pessoal, mude de lei pessoal a
qual o considera menor?
● Lima Pinheiro - a pessoa devia continuar a ser tratada como maior (art. 29º,
CC).
Incapazes (art. 30º, CC) - divide-se em proteção de menores e proteção de maiores
acompanhados;

Limites à Competência da Lei Pessoal

Surgem quando matérias do estatuto pessoal são submetidas a uma lei que não é
designada em função da pessoa(s) em causa;
Art. 13º, RRI - conexão especial com a lei do lugar da celebração em matéria de
capacidade (proteção da confiança da contraparte e segurança do comércio jurídico
local), sendo paralelo ao art. 28º, CC;
Art. 28º/1, CC - anulação do negócio com fundamento em incapacidade, mas engloba
qualquer invalidade (norma unilateral porque determina sempre a aplicação da lei
portuguesa);;
Art. 28º/2, CC - negócios celebrados em Portugal por um estrangeiro/apátrida, incapaz
segundo a sua lei pessoal, mas capaz segundo a lei portuguesa (exceção ao nº 1);
Art. 28º/3, CC - bilateralização do nº 1, através de uma norma de remissão condicionada
(caso em que a pessoa é incapaz perante a sua lei pessoal, mas capaz segundo a lei do
lugar da celebração - aplica-se a lei do lugar da celebração);
Art. 47º, CC - remissão condicionada ao Direito estrangeiro, sendo a lei da situação da
coisa aplicável à capacidade quando o determina (ex.: capacidade para dispor de um
imóvel sito em Inglaterra).

Estatuto das Pessoas Coletivas

Generalidades

Quais os interesses em jogo?


● Da própria pessoa coletiva – interesse da própria pessoa coletiva na sua
conformação, de atribuição do objeto que convier, organizando-a da forma mais
adequada aos seus fins, devendo ser os fundadores da própria pessoa coletiva a
escolher a lei a regulá-la;
● Dos credores da pessoa coletiva – regida por uma lei com a qual possam contar,
sendo, primariamente a do país onde a pessoa coletiva exerce a sua atividade
(onde terá contraído as duas dívidas);

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● Do Estado – regular a atividade das pessoas coletivas que exercem a atividade no
respetivo território;
● Dos trabalhadores da pessoa coletiva – exercer a sua atividade pela lei do lugar
onde exercem a atividade em prol da pessoa coletiva;
● Interesses ligados à integração europeia – mercado interno pressupõe liberdade de
circulação e de estabelecimento, sendo que as sociedades constituídas de acordo
com uma lei de um EM possam livremente exercer num EM da UE.

Principais Soluções na Vida das Pessoas Coletivas

Teoria da incorporação – uma sociedade é regulada pela lei do Estado de acordo com o
qual foi incorporada/constituída e posta a funcionar (ex.: sistemas de Common Law,
Suíça e Holanda), havendo liberdade de escolha da lei aplicável, no fundo.
● Crítica (DMV) - pode levar à aplicação de uma lei com a qual a pessoa coletiva
não tem uma ligação efetiva, podendo colocar em causa os interesses dos credores
e do próprio poder de regulação do Estado.
Aplicação da lei da sede estatutária - da sede indicada nos estatutos da pessoa coletiva
em questão, permitindo a liberdade de exercício dos fundadores e, também, para quem
contrata com a pessoa coletiva é uma solução que leva a uma identificação fácil da lei
aplicável;
● A lei da sede estatutária pode não coincidir com a sede real (uma pessoa coletiva
pode ter uma sede num determinado país e não ter qualquer atividade e, por isso,
os interesses dos Estados e dos credores são colocados em causa);
● Crítica (DMV) - propicia a fraude à lei.
Aplicação da lei da sede real (aplica-se em Portugal) – a sede real é o lugar onde é
exercida a direção da pessoa coletiva e onde se decide a gestão da empresa, não
implicando, não valendo o lugar onde foram tomadas as decisões de gestão.
● Dificuldades - o período entre a constituição da sociedade e o momento em que os
órgãos sociais começam a funcionar, porque ainda não há atos de gestão. Não
obstante, do ponto de vista dos interesses da integração europeia uma sociedade
constituída num EM, que quer agora constituir-se noutro, mas os fundadores
prefeririam a lei do primeiro lugar, pode implicar uma limitação às liberdades
comunitárias. Também esta terceira solução acaba por não ser perfeita.

Regime Português

Art. 33º/1, CC – lei do lugar da sede efetiva;


● Não se aplica às sociedades comerciais - vale o art. 3º/1 CSC (preceitua o mesmo
que o CC, mas tem uma segunda parte relevante, visto que há uma restrição que
determina a aplicabilidade, pelo menos quando invocada por terceiros, da lei da
sede estatutária, desde que esta se encontra em Portugal.

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➔ Problema (DMV) - esta confiança só é tutelada quando se aplica a lei
portuguesa, porque, se a sede estatutária estiver no estrangeiro e a sede
real em Portugal, não se pode invocar a sede estatutária estrangeira (certo
unilateralismo). No entanto, este preceito pode ser bilateralizado, podendo
aplicar-se a lei da sede estatutária quando esta se situe em país estrangeiro,
desde que se considere competente para regular o caso.
Art. 33º/2, CC - matérias reguladas pela lei das pessoas coletivas, acrescendo o art. 38º,
CC, evidenciando-se um paralelismo com a situação das pessoas singulares, sendo que,
nas pessoas coletivas, a conexão primordial é uma criação da ordem jurídica, não
havendo relevância da nacionalidade.

DUE

Não é possível ter um mercado europeu sem regras, havendo uma ligação muito forte
entre o DUE e o DIP sobre esta matéria;
DMV - a nossa regra mantém-se em vigor, mas não funcionará sempre que implique uma
limitação à liberdade de estabelecimento.

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