internacional privado Pro f a . Dra . G e r m a n a Tr in d ade 1. Conceito
No mundo inteiro existem mais de 190 Estados (193
Estados são membros da ONU). Cada vez mais são frequentes as relações jurídicas com conexão internacional a transcender as fronteiras nacionais. A regra geral é a de que o Direito interno do Estado regule as relações que têm lugar dentro de seu território, e que as autoridades competentes de um ente estatal apreciem os conflitos ocorridos dentro de sua jurisdição. 1. Conceito Porém, os Estados estabelecem regras peculiares, concernentes às relações jurídicas de direito privado com conexão internacional. Tais normas, não resolvem a questão jurídica propriamente dita, indicando, tão somente, qual o direito, dentre aqueles que têm conexão com a lide sub judice, deverá ser aplicado pelo juiz ao caso concreto, se o nacional ou um determinado direito estrangeiro. Assim, o Direito Internacional Privado é uma exceção ao princípio da territorialidade, vez que o próprio legislador pátrio admite a aplicação do Direito estrangeiro em território nacional. 1. Conceito Só deverá ser aplicado o direito estrangeiro quando permitido pela legislação interna. A razão pela qual a lei pátria entende que deve ser aplicado determinado direito estrangeiro em um caso concreto, é por entender está tal direito mais vinculado a relação jurídica com conexão internacional, pois é princípio geral do Direito Internacional Privado o de que a norma nacional a ser aplicada deve ser oriunda da ordem jurídica do Estado com a qual a relação com conexão internacional esteja mais estreitamente ligada. 1. Conceito
Ocorre que a determinação da norma mais
estritamente ligada a relação com conexão internacional, será definida por cada Estado, e por isso dependendo da ordem jurídica do país em que se decide a lide, o direito aplicável à causa com conexão internacional poderá variar. Cada Estado estabelece, individualmente, mediante a escolha do elemento de conexão (parte da norma do dipri designativa do direito aplicável) a relação mais estreita com uma determinada ordem jurídica. 1. Conceito
“Os Estados apresentam soluções distintas para um
mesmo fato ou relação jurídica no trânsito internacional a partir de suas leis internas, idealizadas de acordo com necessidades momentâneas e orientadas por valores e fundamentos próprios de determinada sociedade.” (BASSO) 1. Conceito Quanto à natureza, a norma do Direito Internacional Privado é geralmente conflitual, indireta não solucionadora da questão jurídica em si, mas indicadora do direito aplicável, se nacional ou estrangeiro, daí ser classificada como sobredireito. Por essa razão, tais normas são denominadas indicativas ou indiretas. Mas existem ainda as normas qualificadoras, que se restringem a definir determinados institutos para efeito do Dipri, ou seja, determinam, basicamente, como uma norma indicativa de DIPRI deve ser interpretada e aplicada ao caso concreto (ex. às referentes à ordem pública e fraude à lei, qualificação, elementos de conexão, adaptação, reenvio, etc); e as normas diretas, substanciais que dão solução à questio juris. 1. Conceito Direito Internacional Privado: 1. stricto sensu - composto pelas normas resolutivas, cujos preceitos designam apenas o Direito aplicável a um conflito de leis no espaço. 2. latu sensu - inclui além das normas resolutivas, também, princípios e regras de caráter processual, pois o Direito Processual Civil Internacional é o conjunto de preceitos que visam a regular a aplicação das normas de Direito Internacional Privado (ex. normas sobre a competência internacional dos tribunais domésticos, sobre o reconhecimento de sentenças estrangeiras, são exclusivamente normas diretas, e a elas é aplicável o princípio da lei do foro, lex fori) (RECHSTEINER). 2. Objeto O principal objeto do Dipri é resolver conflitos de leis no espaço referentes ao direito privado, ou seja, determinar o direito aplicável a uma relação jurídica de direito privado com conexão internacional (direito internacional privado stricto sensu).
Outros objetos: nacionalidade, condição jurídica do
estrangeiro, conflito de jurisdições, o reconhecimento das sentenças estrangeiras, o reconhecimento de direitos adquiridos no exterior.(DOLINGER). Paulo Henrique Portela inclui tb a execução de cartas rogatórias.
O Dipri é, em sua essência, direito interno conforme a sua
origem. 2. Objeto Como a aplicação do direito internacional privado stricto senso depende de normas processuais específicas, considera-se que o DIPRI abrange também normas processuais respectivas na sua disciplina. Não é pacífico entre os doutrinadores se os conflitos de leis de que versa o Direito Internacional Privado abrangem todas as categorias de leis, tanto de direito privado como de direito público ou só as daquele ramo. 1. Jacob Dolinger e Haroldo Valladão defendem que sim. 2. Pontes de Miranda, Clóvis Beviláqua, Beat Walter Rechsteiner, Maristela Basso defendem que não, ou seja, o Dipri refere-se somente às relações jurídicas com conexão internacional de direito privado e não àquelas do direito público. 2. Objeto Normas de Direito Público - aquelas referentes às relações entre governantes e governados, relações que ocorrem no plano vertical, ou seja, que estabelecem uma relação de hierarquia. Normas de Direito Privado - são aquelas que regulam as relações entre governados, ou entre governantes e governados quando os primeiros apresentam-se, naquela relação jurídica, desprovidos do sus imperii, ou seja, em pé de igualdade com os particulares/ governados. São relações, portanto que se dão no plano horizontal. No entanto dentro dos ramos do direito classificados como Direito Privado, tem-se normas de natureza pública e normas de natureza privada. O DIPRI pertence ao ramo do Direito Público, mas o direito material indicado a ser aplicado pertence ao ramo do direito privado. 2. Objeto Registra-se, que a controvérsia, limita-se, ao fato da relação jurídica com conexão internacional se restringe, necessariamente, ao direito privado, ou se as regras do DIPRI são aplicáveis, também, a conflitos de leis no espaço, quando decorrentes do direito público (ex. direito penal, direito da previdência social, direito tributário, etc). As normas conflituais designativas do direito aplicável não servem e não são adaptáveis à estrutura do direito público, por isso o DIPRI refere-se somente às relações jurídicas com conexão internacional de direito privado, vez que somente o DIPRI admite a aplicação do direito estrangeiro de forma generalizada (RECHSTEINER). E apesar de existirem, por exemplo, normas tributárias no contexto internacional que também resolvem conflitos de lei no espaço, tais normas não pertencem ao DIPRI, sendo evidente que as normas e princípios gerais do DIPRI são inadequadas para resolver esse tipo de conflito de leis no espaço 2. Objeto
Conflitos interpessoais (quando existem leis aplicáveis
em razão das etnias, grupos, tribos, castas, e religiões, como por exemplo em Israel onde o direito matrimonial é de competência legislativa e jurisdicional das respectivas religiões) tem-se o Direito privado interpessoal e nos conflitos interlocais (abrangem conflitos interprovinciais, interestaduais, intercantonais, inter-regionais, metropolitano-coloniais) aplica-se o direito privado interlocal. Segundo Rechsteiner e Basso os conflitos interpessoais e interlocais também não são objeto do Dipri, já Dolinger defende o contrário. 3. Objetivos
A conexão internacional da causa sub judice é
pressuposto de fato necessário para a aplicação, pelo juiz, de uma norma de direito internacional privado da lex fori.
O Estado deverá através do elemento de conexão eleger o direito
internacional que considera com vínculo mais significativo para uma relação jurídica privada com conexão internacional. Mas, nem sempre o elemento de conexão será o mesmo entre os Estados para uma mesma relação jurídica.
Se o direito aplicável for o estrangeiro, este será o indicado, não
se levando em consideração, em princípio, o seu conteúdo. 3.1. Ordem Pública Pode acontecer do direito estrangeiro indicado in casu violar princípios fundamentais do direito interno, ou seja, a ordem pública, e por isso não será tal direito estrangeiro aplicado. Ordem pública - são concepções básicas do foro, que estabelece normas absolutamente incompatíveis com os princípios essenciais da ordem jurídica do foro, fundados nos conceitos de justiça, de moral, de religião, de economia e mesmo de política, que ali orientam a respectiva legislação. O conceito de Ordem Pública abrange a soberania nacional e os bons costumes. Deve-se levar em consideração, também, os princípios básicos do direito internacional, consubstanciados em tratados internacionais, no direito costumeiro internacional, em princípios gerais de direito e em outras fontes supranacionais que vinculam juridicamente um Estado (Ordem Pública Internacional - não concordo). 3.1. Ordem Pública
O princípio de ordem pública deve ser entendido
como reflexo da filosofia sócio-político-jurídica de toda legislação, compreendendo assim os planos político, jurídico, econômico e moral de todo Estado; ou seja, emana da mens populi (mentalidade e sensibilidade médias de uma sociedade em determinada época). 3.1. Ordem Pública
São características da ordem pública a relatividade e a
instabilidade. Assim, a ordem pública varia no tempo e no espaço (DOLINGER). Para Rechsteiner o conceito de ordem pública é relativo, porque o que fere os princípios básicos da ordem jurídica de um Estado pode ser juridicamente válido em outro.
Contemporaneidade - a instabilidade do que possa ofender a
ordem pública obriga o aplicador da lei a atentar para o estado da situação à época em que vai julgar a questão, sem considerar a mentalidade prevalente à época da ocorrência do fato ou ato jurídico. (DOLINGER) 3.1. Ordem Pública
A contemporaneidade age em ambos os sentidos,
pois também se manifesta na situação inversa, ou seja, se o ato realizado no exterior era admissível no foro homologatório à época em que se deu, mas tornou-se ofensivo à ordem pública local, não deverá ser reconhecido. (DOLINGER) 3.1. Ordem Pública
A ordem pública não é um fator imanente
à norma jurídica, pois determinada norma jurídica do foro será aplicada em substituição à norma do país A, indicada como competente por uma regra de conexão, por ser a lei deste país A chocante à ordem pública do foro, mas não será aplicada a mesma lei do foro quando invocada norma correspondente do país B.(DOLINGER) 3.1. Ordem Pública
A ordem pública é um fator exógeno, pois
ela é uma característica externa, exógena a qualquer norma jurídica específica. “As leis não são de ordem pública, isto é, a ordem pública não é um fator imanente à norma jurídica. Esta pode ser imperativa, proibitiva, ter caráter obrigatório, ius cogens, mas a característica da ordem pública é exógena” (DOLINGER).
Ordem Pública não se confunde com Direito
Público 3.1. Ordem Pública
A doutrina costuma distinguir a ordem pública em: ordem
pública interna (princípio que limita e neutraliza a vontade das partes quando estas agem contra leis internas cogentes. Assim, a liberdade das partes não é admitida em determinados aspectos de sua vida privada, e consequentemente serão inválidos os atos jurídicos praticados violando tais leis) e ordem pública internacional (que impede a aplicação de leis de outros Estados ou reconhecimento de atos praticados e declarações de vontade ocorridos no exterior, bem como o reconhecimento ou a execução sentenças estrangeiras - ou laudos arbitrais - quando atentatórias à ordem jurídica, moral ou econômica do foro) (BASSO; DOLINGER). 3.1. Ordem Pública
Para Rechsteiner somente se aplica a ordem pública internacional
no DIPRI no caso concreto. As regras de ordem pública interna não se aplicam a relações jurídicas de direito privado com conexão internacional e se restringem às normas substantivas ou materiais do direito interno. O que pode contradizer a ordem pública interna, aliás, não fere necessariamente a ordem pública no plano internacional. 3.1. Ordem Pública
Apesar de encontrarmos na doutrina a dicotomia de ordem
pública interna e ordem pública internacional, concordo com Dolinger, no tocante a existência de somente uma ordem pública em cada país, que tem por finalidade, em última análise, proteger a segurança, a conservação do Estado e que tem seus efeitos refletidos no campo do direito interno e no das relações privadas internacionais. 3.1. Ordem Pública
A fonte de que promana a ordem pública é
sempre nacional, podendo haver duplicidade de efeitos, pois apesar de una e indivisível a ordem pública pode ser agredida de dois modos, por ataques provenientes de situações diversas (atos praticados interna ou externamente). 3.1. Ordem Pública Níveis de aplicação do princípio da ordem pública: a) Primeiro nível - a ordem pública funciona no plano do direito interno para garantir o império de determinadas regras jurídicas, impedindo que sua observância seja derrogada pela vontade das partes. b) Segundo nível - trata do impedimento à aplicação de leis estrangeiras indicadas pelas regras de conexão do Dipri. c) Terceiro nível - se situa no reconhecimento de direitos adquiridos no exterior. Ordem Pública: reservas gerais (intervêm sempre que é aplicável o direito estrangeiro) e reservas especiais de ordem pública (refere-se a determinada matéria de direito, ex. art. 7º, §6º da LINDB. 3.1. Ordem Pública
Reservas negativas (impede a aplicação do direito estrangeiro
aplicável conforme as normas do DIPRI da lex fori no caso concreto) e reservas positivas de ordem pública (leis de aplicação imediata - conteúdo imperativo e cogente). 3. Objetivos no DIPRI, também, é possível, até certo limite, favorecer e proteger a parte economicamente mais fraca, quando a lei (lex fori), proíbe a escolha do direito aplicável.
Nádia de Araújo defende que a primeira finalidade do Dipri
seja a proteção da pessoa humana, devendo os limites em relação à solução de conflitos de lei ser traçados pelos direitos humanos.
Hierarquia dos tratados no ordenamento jurídico brasileiro x efetivo
reconhecimento dos direitos humanos.
Aplicação do “melhor” direito - Better law approach - dificuldade da
execução na prática desta Teoria. Ademais, a indicação de critérios claros indicadores do direito aplicável favorece a segurança jurídica. 3. Objetivos
Os tribunais de alguns Estados, na prática e
frequentemente, quando julgam uma causa de direito privado com conexão internacional, favorecem a aplicação da lex fori, pois: a) as vezes a legislação do Estado não obriga o juiz a aplicar as normas do Dipri ou pelo menos aquelas do direito estrangeiro de ofício; b) o fato dos juízes, muitas vezes, não estarem familiarizados com o conteúdo do direito estrangeiro aplicável, interpretam a ordem pública de forma extensiva, de modo que resta pouco espaço para a aplicação do direito estrangeiro. Essa jurisprudência não é louvável, pois contradiz o ideal do Dipri, que determina a aplicação do direito com que a relação jurídica de direito privado está mais ligada. 3. Objetivos
Outro objetivo do direito internacional privado é a
harmonização das decisões judiciais - pois apesar das sentenças proferidas por juízes de diferentes países poderem divergir, já que as regras do DIPRI podem variar entre Estados, de modo geral se reconhecem as sentenças estrangeiras, salvo quando há violação da ordem pública no caso concreto. 4. Direito Internacional Privado e Direito Público
Leis de aplicação imediata/Ordem Pública Positiva - são
normas de direito público que reivindicam a sua aplicação imediata, por força de seu conteúdo imperativo e cogente, independentemente do direito aplicável a uma relação jurídica de direito privado com conexão internacional. Por tal motivo, estando o aplicador do direito diante de uma Lei de aplicação imediata sequer irá aplicar o Dipri. A preocupação maior é com a preservação da coerência do ordenamento jurídico interno, ou seja, não lhes interessa dar soluções distintas às situações internacionais, mas garantir o cumprimento integral da norma interna. 4. Direito Internacional Privado e Direito Público Ao juiz é facultado aplicar normas públicas, editadas por um Estado estrangeiro, quando este entenda que suas normas têm caráter cogente e imperativo também no plano internacional? “o caráter público atribuído a uma disposição legal de direito estrangeiro, designada como direito aplicável pela regra de conflito de leis, não representa obstáculos a sua aplicação, sob reserva de respeito ao princípio da ordem pública”. (Resolução do Instituto de Direito Internacional). Assim, se o direito estrangeiro for o aplicável segundo o Dipri, o juiz pode aplicar uma norma pública emanada de tal Estado estrangeiro, mas não pode aplicar as sanções administrativas ou penais caso existam. 4. Direito Internacional Privado e Direito Público Mas se o dipri indicasse a aplicação da lei brasileira, poderia o juiz aplicar a norma de ordem pública estrangeira? R- Rechsteiner entende que sim, que neste caso caberia ao juiz brasileiro decidir pela aplicação ou não do direito estrangeiro (no exemplo dado por esse autor, estar-se diante de um contrato de empréstimo onde uma norma pública estrangeira impede a transferência de recursos em moeda nacional para exterior). Neste caso, a aplicação da norma brasileira indicada pelo DIPRI não tornará possível a execução do contrato. 5. Denominação Direito Internacional Privado - denominação utilizada pela primeira vez por Joseph Story em 1834, em sua obra “Comentários sobre os Conflitos de Leis”. Críticas ao termo: 1. INTERNACIONAL - as normas do DIPRI são predominantemente internas, porém existem as de caráter internacional (ex. tratados). 2. PRIVADO - tais normas revertem-se de evidente interesse público, pois visam solucionar conflitos de leis que poderiam gerar uma instabilidade prejudicial às relações sociais em geral. As normas de direito internacional privado são de natureza pública, porque se dirigem ao Estado (ao juiz), indicando a solução para o conflito de leis no espaço. 3. DIREITO - por serem em sua maioria normas indicativas, tratar-se-ia de “sobredireito”. Internacional - referem-se a relações jurídicas com conexão internacional (RECHSTEINER).