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EM ECONOMIA DA SAÚDE
PARA OS NÚCLEOS
ESTADUAIS/REGIONAIS
Marcia Bassit
Secretária Executiva/MS
Fabiola Vieira
Coordenadora – Nunes/A ESD/SE/MS
Responsáveis Técnicos
Emerson Ricciardi
Andréa Mendes
Instrutores/Facilitadores
Andréa Mendes
Elias Jorge
Emerson Ricciardi
Fabiola Vieira
Ricardo Vidal
Ronaldo Falasque Junior
Contato
Núcleo Nacional de Economia da Saúde – Nunes
Área de Economia da Saúde e Desenvolvimento – A ESD/SE/MS
SEPN 510 - Bloco "A" - Sala 301 - Edifício INAN - Unidade II
Asa Norte - Brasília / DF - CEP. 70.750-521
Fones: (61) 3274-1751 ou 3340-4333
emerson.ricciardi@saude.gov.br e andrea.mendes@saude.gov.br
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Este Curso faz parte do Projeto de estruturação dos núcleos estaduais/regionais de economia da saúde.
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S U MÁ RIO
I – Ementa.....................................................................................................4
II – Introdução...............................................................................................4
III – Objetivos Gerais............................................................................ ..........6
IV – Resultados Esperados........................................................................... ...6
V – Método de Ensino-Aprendizagem...............................................................7
V.1 – Exposição dialogada......................................................................8
V.2 – Relato de experiência....................................................................9
V.3 – Estudo de casos...................................................... ......................9
V.4 – Estudo Dirigido............................................................................10
VI – Sistema de avaliação..............................................................................11
VII – Programação........................................................................................11
VIII – Casos Práticos.....................................................................................13
IX – Textos para Estudo Dirigido........................ ............................................28
1 – Economia da Saúde........................................................................29
2 – Justiça na Alocação de Recursos.....................................................50
3 – Avaliação Econômica......................................................................71
X – Bibliografia.............................................................................................93
XI – Anexos – Textos de apoio.......................................................................94
§ Sobre a Economia da Saúde: Campos de avanço e sua contribuição para
a Gestão da Saúde Pública no Brasil.
§ Seguridade Social e o Financiamento do SUS no Brasil.
§ Financiamento e gasto das políticas sociais: o caso MS, 1995 a 2005.
§ Texto para Discussão IPEA nº 1216 - Indicador Municipal de Saúde:
Uma Análise dos Sistemas Municipais de Saúde Brasileiros
§ Instrumentos p/ Avaliação Econômica dos Serviços de Saúde (CASTRO)
§ Instrumentos de Avaliação Econômica dos Serviços de Saúde (UGÁ)
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I – E me nt a
II – Intr od uçã o
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Salienta-se que, como área de conhecimento, a Economia da Saúde está
consolidada em muitos países desenvolvidos. E dada a sua importância para o
Setor Saúde, a Organização Mundial da Saúde (OMS) tem promovido o seu uso e
estimulado a sua adoção para orientar as políticas e a gestão em saúde nos
países em desenvolvimento e naqueles ainda subdesenvolvidos.
5
III – Ob jet i vo s ger ai s
IV – Re s ul tad o s E s pe ra do s
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10. Estabelecer uma análise comparativa entre os métodos de avaliação
econômica em saúde que podem orientar a tomada de decisão.
11. Enumerar os principais passos ou etapas no desenho de um estudo
de avaliação econômica.
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V.1 – Exposição dialogada
8
♦ Fundamentos de Avaliação Econômica em Saúde
Objetivo: estabelecer uma análise comparativa entre os métodos de avaliação
econômica em saúde que podem orientar a tomada de decisão. Enumerar os
principais passos/etapas no desenho de um estudo de avaliação econômica.
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V.4 – Estudo Dirigido
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VI – Sis tema de a vali a ção
Auditório
08:00-09:30 Abertura do curso
10:00-10:15 Intervalo
16:30-16:45 Intervalo
Grupos
16:45-18:00 Estudo de Caso 1: O SUS legal vs real
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08:00-10:00 Estudo Dirigido 1: Economia da Saúde Grupos
10:00-10:15 Intervalo
12:30-14:00 ALMOÇO
2º dia
14:00-16:00 Relato de Experiências: Ferramentas da Economia da Auditório
Saúde para Gestão do SUS
16:00-16:15 Intervalo
10:00-10:15 Intervalo
16:00-16:15 Intervalo
12:30-14:00 ALMOÇO
16:00-16:15 Intervalo
NOTA: Este cronograma está sujeito a alterações, caso seja necessária a inclusão de outras
atividades importantes para o aprendizado dos participantes.
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VIII – Cas o s P ráti cos
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CASO PRÁTICO nº 1
Reflita a situação
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CASO PRÁTICO nº 2
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CASO PRÁTICO nº 3
Agora o governo tem que decidir como gastar os 100 milhões de u.m.. Para
ajudá-lo a resolver o problema, fazemos a seguinte pergunta: que objetivo
pretende alcançar com a alocação dos recursos? Suponhamos que a resposta
seja: "quero melhorar ainda mais a saúde da população".
Assim, responda:
1. O que necessita saber, agora, o governo para tomar tal decisão?
2. Supondo que os efeitos dos seis programas podem ser medidos em anos de
vida ganhos, que tipo de análise deve-se utilizar?
3. Entre parênteses indicamos os anos de vida ganhos para cada um deles: A
(30); B (20); C (70); D (40); E (50); e F (75). Qual é o programa de melhor
relação custo-efetividade? Coloque em ordem de prioridade.
4. Supõe-se que temos dois pacientes, um cego e outro numa cadeira de rodas.
O governo tem que decidir qual dos casos deve priorizar (suponha que o
tratamento elimina o problema). Demonstre soluções para esse fato.
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CASO PRÁTICO nº 4
O município de Caixa Grande possui um hospital público com 100 leitos no qual
oferece seus serviços médicos. A demanda desse hospital é forte e se manifesta
estável, graças à qualidade no atendimento de sua clientela.
Pede-se:
1) Classifique cada um dos custos como fixo e variável
2) Calcule o valor total dos custos fixos e variáveis
3) Calcule o custo total
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CASO PRÁTICO nº 5
R$ 1,00
Nº pacientes CF CV CT CMed CMg
atendidos
0
1 100
2 290
3 132 111
4 220
5 26
6 414
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CASO PRÁTICO nº 6
Dada a limitação dos recursos (1.000 u.m.) existem três possíveis soluções:
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CASO PRÁTICO nº 7
Quadro 1 – Custos e Benefícios de projetos elaborados dos Programas Sociais do Município de Caixa
Grande.
Saúde Educado Estradas
Projeto Custos Bº êC/êB Projeto Custos Bº êC/êB Projeto Custos Bº êC/êB
A 100 10 F 200 12 K 100 5
B 200 14 G 400 16 L 200 8
C 300 16 H 550 18 M 300 12
D 400 19
E 500 20
Assim, dentre esses onze projetos, escolha qual (is) devam ser priorizados, se
você conta com um orçamento de:
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CASO PRÁTICO nº 8
- Qual o fármaco seria eleito pela equipe em um contexto onde não exista
limitação de recursos? Por quê?
- Qual o fármaco seria eleito pela equipe em um contexto onde exista limitação
de recursos? Por exemplo, dois milhões de unidades monetárias (u.m.).
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CASO PRÁTICO nº 09
Roberto: Olha, Paulo eu não sei muito bem como entender essa tal de avaliação
econômica, muito embora tenho algumas suspeitas, mas posso garantir que em meus
40 anos de prática clínica isso nunca me fez falta.
Paulo: Caro Roberto, os tempos mudam! Hoje existem vários fatores que ajudam a
determinar o tratamento de um paciente.
Roberto: Creio que a medicina deva ser determinada pelo valor que proporciona e não
pelo que custa. Na realidade o que disse é algo que quase todo mundo já sabe: que não
me parece ético que os aspectos econômicos possam condicionar a tomada de decisões
clínicas. A razão é muito simples: em alguns casos a tomada de decisões clínicas
baseada nos resultados de avaliações econômicas poderiam orientar a prescrição de um
tratamento menos eficaz que outros ou simplesmente o não tratamento! Creio Paulo,
que vai te custar bastante trabalho me convencer da necessidade da avaliação
econômica, ou seja, da necessidade de "contar" na hora de tomar decisões que afetam
a saúde dos meus pacientes! Assim, como utilizo a mesma lógica da avaliação
econômica na minha prática clínica diária?
Paulo: (Responde a indagação) Roberto, então vejamos: você encaminha todos os teus
pacientes para uma Unidade de Cuidados Intensivos (UCI) quando os mesmos deixam a
sala de cirurgia?
2
Adaptado dos diálogos figurados do professor David M. Eddy (Duke University, Durham) com seu pai apud Puig--
Junoy J. (2003).
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Paulo: O que você quer dizer com a expressão “não é necessário”? Não há alguma
probabilidade de que algum paciente tenha um infarto de miocárdio, um embolismo ou
necessite de alguma outra urgência e, estando na UCI, suas vidas poderiam ser salvas?
Paulo: Então, você concorda que haveria algum beneficio! Portanto, por que não
encaminha todos os pacientes submetidos a uma intervenção cirúrgica para a UCI?
Roberto: Bom, além do fato de que não é um lugar muito agradável para permanecer,
não encaminharia todos meus pacientes porque a magnitude do benefício seria
demasiadamente pequena par a justificar tal decisão.
Paulo: Para justificar o quê? O custo? Ocupar uma cama que poderia ser utilizada por
outro paciente com maior risco e que então poderia obter maior benefício?
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CASO PRÁ TICO nº 10
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apenas um estudo nacional que compara a utilização dos testes de citologia em
meio líquido e de captura híbrida para papilomavírus ao teste de Papanicolaou
(Caetano R, Vianna CMM, Thuler LCS, Girianelli VR. Custo-efetividade no
diagnóstico precoce do câncer de colo de útero no Brasil. Rev. Saúde Coletiva
2006;16(1):99-118.).
Agora, leia o artigo e responda às questões que se seguem. Depois, emita
parecer conclusivo sobre a incorporação ou não das novas tecnologias de
rastreamento do câncer cérvico-uterino.
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6. Como foram apurados os custos e que tipo de custos foram utilizados?
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7. Como foram medidas as eficiências comparativas entre as tecnologias?
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8. A análise de sensibilidade demonstrou algum resultado importante em relação
aos preços dos itens de custo agregados ao uso de cada tecnologia?
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9. Quais são as limitações do estudo?
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PARECER__________________________________________________________
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Ficha de A nálise de Resumo
Estudos de Avaliação Econômica em Saúde
Título:
ETAPAS DA AVALIAÇÃO
APLICAÇÃO AO CASO ESTUDADO
ECONÔMICA
Definição do problema e ou
pergunta a ser respondida
Perspectiva do Estudo
Alternativas
Comparadas
Horizonte
Tem poral
Medida de efeito
Custos
Técnica de Avaliação
Taxa de Desconto
Análise de sensibilidade
Observações
Outros aspectos:
_______________________________________________________________________
_______________________________________________________________________
_______________________________________________________________________
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IX – Te xto s pa ra E stud o Di ri gi do
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ESTUDO DIRIGIDO nº 01 – Economia da Saúde
Autor: SILVA, M. G. C.
I – CONSIDERAÇÕES GERAIS
Introdução
3
Adaptado por Mota, D. M. para o Curso de Iniciação em Economia da Saúde para Tomada de Decisão.
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A utilidade da Economia da Saúde pode ser refletida nos seguintes tópicos:
§ Permite aos planificadores da saúde defender seu critério nas reuniões com
outros planejadores, com as comissões de planejamento e com certos
setores importantes do Estado, como o Mi nistério da Fazenda;
§ Permite aos encarregados do setor responder mais facilmente aos
governos, aos órgãos legislativos e à opinião pública, que cada vez exigem
mais explicações sobre o aumento dos gastos "per capita" nos serviços de
saúde e sobre a subida em espiral que esses gastos provocam;
§ Permite oferecer ao usuário serviços que correspondem à inversão
efetuada e, paralelamente, impedir que os que prestam a assistência e a
indústria farmacêutica internacional se preocupem exclusivamente com
seus próprios interesses;
§ O planejamento em saúde e o sócio-econômico seriam mais fáceis de
vincular se os planejadores da saúde conhecessem melhor as repercussões
econômicas dos serviços e demais atividades de promoção à saúde;
§ A economia pode levar ao planejamento em saúde técnicas especializadas,
tais como as de análise, análise de custos e benefícios e análise de
sistemas.
Abrangência
30
§ Os serviços não correspondem às necessidades da população;
§ A distribuição geográfica dos recursos é extremamente desigual;
§ Em algumas áreas existe excessivo uso de alta tecnologia médico-
hospitalar para tratar os efeitos de moléstias preveníveis;
§ O uso excessivo e a venda liberal de medicamentos;
§ Internações desnecessárias, referências a outros níveis e exames
supérfulos;
§ Competição do setor privado com o setor público por exames auxiliares
lucrativos e cirurgias eletivas; e
§ Distribuição do financiamento proveniente da seguridade social sem
mecanismos apropriados de controle.
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§ O que significa atribuir prioridade?
§ Quando e onde deve ser construído um novo hospital?
§ É preferível prevenir a curar em que condições?
§ Quais as implicações da introdução das taxas moderadoras sobre a
utilização de serviços?
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II – SAÚDE E DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO
"Na primeira metade do século XX, a alta mortalidade por tuberculose no Brasil exercia
um papel de seleção natural dos mais aptos ao mercado de trabalho"
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A melhoria da saúde é um dos objetivos do desenvolvimento sócio-
econômico, da mesma forma que o são: a melhora do nível material de vida, o
aumento das oportunidades de trabalho e de educação, e o acesso mais
generalizado aos benefícios das inovações científicas e tecnológicas. Em sentido
restrito, o desenvolvimento econômico exige, entre outros aspectos, melhoras em
saúde, educação e outros setores sociais.
Os serviços de saúde aportam benefícios diretos ao desenvolvimento
econômico gerando mercado de trabalho para população desempregada ou
subempregada, dado que o setor saúde tem notável capacidade de absorção de
mão-de-obra por ser geralmente intensivo no fator trabalho; utilizando material
local na construção de instalações, o que contribui para liber ar divisas escassas
para outros fins relacionados com o desenvolvimento; melhoria qualitativa e
quantitativa no suprimento de água, incrementando o nível de vida local; os
serviços de planejamento familiar, por frenar o crescimento demográfico, podem
propiciar que a renda nacional "per capita" avance com mais rapidez do que seria
possível com um crescimento demográfico liberado de quaisquer restrições.
Griffith e cols. (1971), estudando o problema da contribuição da saúde
para o desenvolvimento, acharam que a questão envolve três aspectos
fundamentais: primeiro, a demonstração do papel da saúde na promoção do
crescimento econômico; em segundo lugar, a demonstração dos efeitos
negativos da doença sobre a produtividade e, finalmente, a quantificação dos
benefícios econômicos resultantes da melhoria no nível de saúde (Duarte de:
Araújo, 1975c)
Molina & Adriasola conceberam o círculo vicioso da pobreza e doença, o
qual mostra que doenças geram a pobreza, que diminui a energia e capacidade
produtiva, o que leva à baixa produção e, como conseqüência disso, aos salários
baixos, os quais proporcionam alimentação, educação e habitação inadequadas,
fatores que por sua vez favorecem o surgimento de doenças; a presença de
doenças está associada à baixa inversão em saneamento e prevenção, suscitando
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o aparecimento de mais doenças que conduzem à incapacidade e menor
sobrevída do indivíduo que se traduz em produção baixa (Tinôco & Campos,
1984).
Em oposição à proposição de Molina & Adriasola, Tinôco & Campos (1984)
propuseram o círculo da saúde do bem-estar (figura 1), o qual revela que saúde
gera a riqueza, que aumenta a energia e capacidade produtiva, o que conduz à
alta produção de bens e serviços e, como decorrência disso, aos salários altos,
que patrocinam alimentação abundante, educação suficiente e habitação
adequada, fatores que por seu turno propiciam à saúde; a condição de maior
nível de saúde está associada a grandes investimentos em saúde pública e
medicina preventiva, proporcionando mais saúde, que leva à menor incapacidade
e à maior sobrevída do indivíduo, que se consubstancia em produção alta (Tinôco
& Campos, 1984).
Os gastos em saúde e em educação não são meras despesas de consumo,
devendo ser reconhecidos como formas de investimento voltado ao capital
humano. O rendimento de investimentos efetuados em programas educacionais
é, sobretudo majorado, quando é realizado de maneira conjunta com programas
de saúde; exemplo disso é a combinação de programas de nutrição com os de
educação, induzindo um valor ou resul tado final superior ao efeito esperado da
soma de cada programa, se aplicado isoladamente. A qualidade dos recursos é
de vital importância para o desenvolvimento econômico, pois a destinação ou
concentração de recursos no fator capital não produzirá o desenvolvimento
almejado, caso não existam recursos humanos em quantidade e qualidade
suficientes para otimização do capital envolvido.
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FIGURA 1 - Círculo da Saúde e do "Bem-Estar"
ALTA PRODUÇÃO DE
BENS E SERVIÇOS
MENOR INCAPACIDADE
MAIOR SOBREVIDA SALÁRIOS ALTOS
MAIOR ENERGIA E
CAPACIDADE HUMANA
MAIS SAÚDE ALIMENTAÇÃO ABUNDANTE
EDUCAÇÃO SUFICIENTE
HABITAÇÃO ADEQUADA
GRANDES INVESTIMENTOS EM
MEDICINA PREVENTIVA E
SAÚDE
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mercado de trabalho. A crueza desse entendimento de alguns configurava a
estreiteza de visão e a incapacidade de compreender que a saúde exerce o
intangível papel de reduzir a morbidade e a mortalidade e de suprir o mercado
com mão-de-obra mais saudável, devendo competir a outros setores da
sociedade a responsabilidade de gerar alternativas de trabalho e renda às
sucessivas coortes de trabalhadores. Afinal, o desenvolvimento econômico só tem
sentido se for voltado para a melhoria da qualidade de vida do homem.
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para abrir e assegurar novos mercados; (g) as mudanças nos costumes sociais e
na organização familiar; (h) o aumento na renda per capita.
Custo é o valor de todos os recursos utilizados na produção e distribuição
de bens e serviços. Os custos em saúde podem ser classificados em: diretos e
indiretos; fixos e variáveis, visíveis e invisíveis etc.
Os custos fixos são aqueles não passíveis de alteração a curto prazo, pelo
fato de serem independentes do volume de produção, enquanto os custos
variáveis são custos cuja dimensão depende do volume de produção (Pereira,
1995).
Para Griffiths (1981), custos diretos são aqueles diretamente incorridos na
provisão de relevantes serviços de saúde (screening, diagnóstico e tratamento
etc.) e os atribuíveis de alguns serviços sociais. Os custos diretos visíveis são tais
custos incorridos e “visíveis” nos orçamentos de serviços formais de saúde. Os
custos diretos invisíveis são os custos correspondentes de serviços de saúde
fornecidos sem pagamento ou pagos informalmente por familiares dos pacientes,
organizações voluntárias, etc.
Para Griffiths (1981), custos indiretos são aqueles oriundos indiretamente
das conseqüências de condições particulares, doenças e suas seqüelas, morte,
morbidade, função reduzida, etc. Os custos indiretos visíveis são principalmente
medidos em termos de perdas da produção econômica (ou possibilidade de
consumo) e normalmente incluem valores imputados a produtos não
comercializáveis (fora do mercado), como os serviços domésticos ou agricultura
de subsistência. Os custos indiretos invisíveis são largamente subjetivos –
“intangíveis”, tais como os custos de reações psíquicas, como dor, desconforto,
ansiedade, estigma, etc., os quais são difíceis de calcular, mas não obstante,
podem ter valores implícitos e, em algumas situações, pode ser possível deduzir
esses valores das decisões reais.
O conceito de custo de oportunidade ou custo social reflete a escassez ou a
limitação dos recursos. Relaciona-se a benefícios derivados da utilização de
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recursos em sua melhor alternativa de uso. É, portanto, uma medida do sacrifício
feito pelo uso de recursos em um dado programa. Em geral, quando os
economistas usam o termo "custos", este significa custo -oportunidade. Isto, no
entanto, pode não ter o mesmo significado como despesas com cuidados da
saúde (Griffiths, 198 1; Mills & Drummond, 1985).
Outras definições de tipos de custos, como custo marginal, custo médio
podem ser encontradas em Pereira (2002).
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deseconomia ao se prestar atendimento aos carentes etc (Duarte de Araújo,
1977a).
O conceito de demanda é estritamente econômico, significando o "volume
de bens e serviços que a comunidade está disposta a adquirir a determinados
preços”. Nesse sentido, a demanda por serviços de saúde é função da renda
pessoal, do preço dos serviços e da importância que os indivíduos atribuem aos
mesmos (Duarte de Araújo, 1977a).
Mecanismos considerados normais no mercado de bens e serviços, tais
como a propaganda e a competição de preços são, no caso da saúde, mal vistos
e até mesmo expressamente condenados pelo Código de Ética Médica (Duarte de
Araújo, 1977a).
Ortún (1992) reafirma que constituem características intrínsecas peculiares
dos serviços de saúde e originadoras de falhas de mercado: a existência de bens
públicos, as externalidades, a incerteza da eficácia dos tratamentos e da
incidência de doença e a informação assimétrica; o ingresso de produtores de
serviços de saúde no mercado não é livre, pois está sujeito a mecanismos
controladores, tanto públicos como de classes ou categorias profissionais.
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A efetividade refere-se à probabilidade de um indivíduo ou um conjunto
deles se beneficiar da aplicação de uma atenção ou técnica sanitária em
circunstâncias reais ou habituais da prática de saúde (Rubio Cebrian, 1995). O
nível de efetividade pode depender do espaço e do tempo; sua determinação não
tem caráter universal, nem está fundamentada em conclusões sólidas e que são
conseguidas em todos os casos de forma empírica (Rubio Cebrian, 1995).
A eficiência é um princípio normativo da economia da saúde referente à
produção de bens e serviços que a sociedade mais valoriza, ao menor custo
possível. É um conceito estritamente econômico e relativo, derivado da escassez
dos recursos e vinculado à fase de produção dos bens/serviços (Rubio Cebrian,
1995).
A eqüidade equivale à retidão ou sentido de justiça natural e cujo objetivo,
no âmbito sanitário, é a provisão igualitária de serviços para toda a população.
Para Pereira (1995), eqüidade é a distribuição justa de determinado atributo
populacional.
Para Pereira (2002), a eqüidade é a distribuição justa de determinado
atributo populacional; junto com a eficiência, a liberdade de escolha pelo
consumidor e a maximização da saúde, a eqüidade é dos objetivos mais
importantes a ser seguido pelos sistemas de saúde modernos.
"Quem deveria fazer o quê, para quem, com que recursos de atenção da saúde e com
que relação com outros serviços de saúde?”
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A Figura 2 esquematiza os componentes básicos da avaliação econômica
em saúde, onde recursos consumidos, aferidos sob as formas de custos (C), por
intermédio de um programa de atenção à saúde, cujo impacto (I) será refletido
na melhoria da saúde, expressa, em utilidades (U) e benefícios (B).
Fonte: Drummond el tal. Métodos para la evaluación econômica de los programas de atención de la salud.
p. 3
As duas características da análise econômica (custos e benefícios) podem
servir para categorizar diversas situações freqüentes na literatura sobre avaliação
da atenção sanitária. O Quadro 1 toma essa classificação bastante compreensiva,
considerando a resposta a duas perguntas: (1) Há comparações entre duas ou
mais alternativas? E (2) São examinados tanto os custos (fatores produtivos)
como os benefícios (produtos) das alternativas?
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Em 1A, 1B e 2 não existe comparação entre as alternativas (está se
avaliando um único serviço ou programa), ou seja, o programa ou serviço está
sendo apenas descrito, já que a avaliação requer uma comparação. Os tipos 3A e
3B retratam situações em que são comparadas duas ou mais alternativas;
contudo, custos e resultados não são estudados de forma simultânea. Em geral,
tais estudos (avaliação econômica parcial) não implicam dizer que sejam inúteis,
já que eles podem significar estágios intermediários vitais para o entendimento
dos custos e dos resultados; o rótulo de avaliação parcial indica somente que não
responde perguntas sobre a eficiência (Drummond et al., 1991).
A avaliação econômica completa preenche os dois requisitos da avaliação
econômica ao considerar simultaneamente custos e resultados de duas ou mais
alternativas de programas ou serviços sanitários, compondo uma família de
técnicas (4): análise de custominimização, custo-efetividade, custo -utilidade e
custo-benefício.
Em suma, respondendo a questão posta ao início deste tema, pode-se
dizer que a avaliação econômica é importante simplesmente porque os recursos -
pessoas, tempo, instrução, imóveis e equipamentos - são escassos (Drummond
et al., 1991).
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econômicos. Tais bases dão origem aos chamados impostos diretos, como o
imposto de renda, o imposto sobre heranças etc. Em geral, costumam assegurar
vantagens: tendem a ser menos regressivas e não são inflacionárias, dada a
dificuldade de repassá-las aos preços. Com respeito à eqüidade, as bases diretas
são perfeitas para o financiamento da saúde, tendo em consideração que se
complementam do ponto de vista da simetria social (Medici, 1995).
Utilizar uma base direta para financiar despesas vinculadas à saúde não
tem sido uma solução convencional, ao nível das receitas públicas, e é vero
expressar que poucos governos têm usado impostos diretos para financiar
exclusiva ou vinculadamente políticas de saúde, pois pr eferem manter tal fonte
para fazer frente a sua liberdade e flexibilidade alocativa (Medici,1995).
As bases indiretas de tributação e os seus impostos decorrentes (impostos
indiretos) são aqueles que incidem sobre a produção, circulação e consumo de
mercadorias. Tais bases são mais regressivas. É também mais fácil repassar as
bases indiretas de tributação aos preços, notadamente em economias em que o
grau de monopólio é elevado (Medici, 1995).
Financiamento é o processo de obtenção de recursos ou fundos
necessários para a execução de um gasto (ou a realização de um investimento),
que está orientado para a obtenção de um objetivo determinado. No âmbito
sanitário, aplica-se ao conjunto de fluxos monetários que, procedentes das
famílias ou empresas, são canal izados direta ou indiretamente aos provedores de
recursos, como conseqüência da prestação de serviços sanitários.
O financiamento da saúde pode ser público ou privado: o público
caracteriza-se por ser coercitivo (principalmente impostos e cotizações
obrigatórias à seguridade social); e o privado, por permitir ao usuário exercer sua
soberania (pagamentos diretos a provedores de serviços) (Rubio Cebrian, 1995).
44
Expansão e Racionalização dos Gastos em Saúde
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Por conta da proposta de saúde para toda a população inserida na
Constituição Brasileira de 1988, o gasto com saúde cresceu no período de 1987 a
1995, com algumas exceções intermitentes, de 136%, passando de 3,3 para 14,5
bilhões de reais (valores em R$ de dezembro de 1995), sendo esse incremento
resultado, em sua maior parte, dos gastos crescentes do SUS (Sistema Único de
Saúde) (Galper, 1996).
De acordo com Medici (1994), entre 1990 e 1993, os gastos federais com
saúde como percentagem do PIB oscilaram de 1,5% (1992) a 2,55% (1989);
esses valores, aliás, estão bem aquém do recomendado pela OMS (de 5% do PIB
ou PNB) como parâmetro a ser alcançado na estratégia da "Saúde para Todos no
Ano 2000".
O estudo de Fernandes Júnior (1996) observa que o governo federal
aplicou no Setor Saúde, no período 1987 -94, recursos que corresponderam a um
gasto per capita máximo de US$ 80.37 (1987) e mínimo de US$ 44.30 (1992) -
faixa que se situa bem abaixo do patamar de US$ 500 indicado pela OMS, com
vistas à Atenção Primária de Saúde.
Os gastos estimad os com saúde, segundo níveis, ficaram em bilhões de
reais em 1990 e 1995, respectivamente em: federal (4,1 e 14,5), estadual (0,7 e
2,0) e municipal (0,6 e 3,2), indicando que no correr de apenas um lustro
reduziram-se as participações relativas da União (de 75,93% para 72,86%) e dos
estados (de 12,96% para 10,05%), enquanto a contribuição municipal avançou
de 11,11% para 16,O8% dos montantes globais de 4,1 e 14,5 bilhões de reais
despendidos naqueles anos (Galper, 1996).
Para Buss (1993), houve uma importante expansão da assistência
hospitalar no âmbito do SUS, nos últimos anos. De fato, de 1984 a 1991, o
número de internações pagas pelo SUS cresceu 51,8%, enquanto o crescimento
estimado da população foi de apenas 3,9%, produzindo um crescimento de
285,3% nas despesas, de maneira que os gastos do sistema cresceram de US$
745.6 milhões em 1984 para US$ 2.87 bilhões em 1991.
46
Os gastos totais, os gastos médios por internação, bem como o custo -dia
variaram enormemente de região para região do país. O Sudeste e o Sul do país
tiveram as gastos por internação superiores ao valor nacional médio, enquanto as
regiões Norte e Nordeste lograram quantias mais baixas da que a média nacional
(Buss, 1993).
O SUS efetua os reembolsos às unidades hospitalares públicas e
filantrópicas e privadas contratadas pela prestação de serviços, de forma
prospectiva, a partir de tabelas de procedimentos da SAI/SUS e das AIHs. Essa
modalidade de desembolso significou um avanço em relação ao modelo
retrospectivo - usado, por exemplo, na época da Guia de Internamento
Hospitalar, que funcionava como um cheque em branco a favor do provedor.
É bem verdade que os valores pagos pela SUS para muitos procedimentos
são irrisórios, e, portanto aviltantes para o exercício profissional médico, não
reparando devidamente os custos correntes incorridos e obviamente não
remunerando o capital instalado. Essa situação pode até, talvez, funcionar coma
um indutor de fraude ao SUS, visto que os níveis ínfimos de retribuição percebida
podem levar as instituições contratadas à insolvência financeira.
VIII – REFERÊNCIAS
-Del Nero CR. O que é economia da saúde. In: Piola SF & Vianna SM. (orgs.) -
Economia da saúde: conceito e contribuição para a gestão da saúde. 3.ed.
Brasília: IPEA, 2002. 298p. p.5-21.
47
-Drummond MF, Studart GL, Torrance GW. Métodos para la evaluación
económica de los programas de atención de la salud. Madrid: Diaz de Santos,
1991. 231p.
-Griffiths DAT. Economic evaluation of health services. Rev Epidém et Santé Publ,
29: 85-101, 1981.
48
-Médici AC. Economia e financiamento do setor saúde no Brasil: balanço e
perspectivas do processo de descentralização. São Paulo: Faculdade de Saúde
Pública/USP, 1994. 216p.
-Pereira J. Glossário de economia da saúde. In: Piola SF & Vianna SM. (orgs.).
Economia da saúde: conceito e contribuição para a gestão da saúde. 3.ed.
Brasília: lPEA, 2002. 298p. p.271- 93.
-Silva MGC da. Mortalidade por causas evitáveis em Fortaleza de 1978 a 1995.
Fortaleza: UECE/ESP-CE; Expressão, 1998. 300p. (Tese de concurso para
Professor Titular da UECE).
49
ESTUDO DIRIGIDO nº 02 – Justiça na Aloca ção de Recursos
RESUMO
O artigo discute dois dos principais princípios dos paradigmas de justiça vigentes
no debate sobre a alocação de recursos públicos em saúde: o princípio da
igualdade e o da eqüidade. Considerando que nas democracias representativas
as decisões alocativas não são tomadas diretamente pelos interessados,
argumenta-se que é essencial a clareza em relação às diretrizes das políticas
públicas e que essa clareza depende da explicitação dos paradigmas de justiça
subjacentes à formulação de tais políticas. Mostra-se que igualdade e eqüidade
fundamentam, respectivamente, estratégias de universalização e focalização nas
políticas sociais, ressaltando algumas implicações da adoção dessas estratégias,
tanto no caso geral quanto no caso dos bens públicos, para concluir que, sob a
perspectiva da epidemiologia, a produção do benefício generalizado à saúde da
população pode ser conseguida com base ora na focalização, ora na
universalização.
4
Da Diretoria de Estudos Sociais do IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada)
50
I – INTRODUÇÃO
51
O artigo discute dois dos mais importantes princípios dos paradigmas de
justiça vigentes no debate sobre alocação de recursos públicos em saúde: o
princípio da igualdade e o da eqüidade. Apesar da existência de inúmeros outros
princípios aplicáveis, igualdade e eqüidade estão sempre presentes no debate
quando se trata de recursos públicos. Ao contrário do que possa parecer à
primeira vista, não se trata de distinguir direitos entre indivíduos. Sob a
perspectiva de ambos os princípios, indivíduos têm igualdade de direitos. A
separação se dá, como se pretende demonstrar, na forma como esses direitos
são atendidos, o que resulta em perspectivas diferenciadas em relação a regras
distributivas.
Levando em consideração o fato de que nos sistemas políticos
representativos as decisões alocativas não são tomadas diretamente pelos
interessados e sim pelos seus representantes, sejam eles eleitos ou não,
argumenta-se que, ao menos nas democracias, é essencial para a avaliação da
justiça das decisões, em primeiro lugar, a existência de diretrizes que ordenem as
políticas, evitando assim decisões discricionárias e, em segundo lugar, clareza em
relação às diretrizes que orientam as políticas públicas. Essa clareza depende da
explicitação dos paradigmas de justiça subjacentes à formulação das políticas,
mesmo sabendo que em uma mesma política os princípios são utilizados
alternadamente, às vezes de forma contraditória.
Igualdade e eqüidade fundamentam, respectivamente, estratégias de
universalização e focalização nas políticas sociais. A adoção dessas estratégias
possui diversas implicações diretas, por exemplo, na estrutura de desigualdades
de uma sociedade, nos custos das políticas e nas dimensões da máquina
administrativa necessária para implementação e controle. Há, também,
implicações indiretas, em especial aquelas que se referem ao processo político
que decide a manutenção ou não das diversas políticas. Tanto as estratégias de
universalização quanto as de focalização podem provocar, a longo prazo, reações
políticas cujas conseqüências são absolutamente opostas a seus objetivos.
52
No caso das políticas de saúde é especialmente importante atentar para o
fato de que muitas vezes a boa saúde de um indivíduo depende da boa saúde
dos demais. As implicações da saúde de um indivíduo extrapolam esse indivíduo,
gerando o que em economia se denomina externalidades. A existência de
externalidades destaca a necessidade da abordag em do ponto de vista coletivo e,
por isso, torna relevantes critérios epidemiológicos de decisão para a alocação de
recursos públicos em saúde. Argumenta-se que, devido a esse efeito de
externalidades, tanto estratégias de focalização são capazes de produzir impactos
universais como estratégias de universalização podem ser a forma mais eficiente
de beneficiar grupos populacionais específicos.
II – IGUALDADE E EQÜIDADE
53
diretrizes não existirem, tais decisões serão discricionárias, ou seja, ficarão a
critério de quem detém o poder de decidir caso a caso.
Quando se discute o uso de recursos públicos em um regime democrático,
especialmente em casos de escassez, é inaceitável que o princípio ético da
distribuição dos bens norteie-se por valores que não são reconhecidos como
legítimos pela maioria das pessoas, o que pode ocorrer mais facilmente quando
as decisões são tomadas individualmente. Por isso, na gestão de recursos
públicos, é fundamental que as diretrizes éticas referentes aos princípios de
alocação sejam claras e, ao máximo possível, elaboradas com a participação
coletiva. Se essas diretrizes não parecerem adequadas à sociedade, os regimes
democráticos possuem diversos mecanismos (como as leis e as eleições) que
permitem que elas sejam alteradas.
Não é fácil estabelecer diretrizes sempre “justas”, uma vez que os
princípios norteadores são quase sempre muito gerais e derivam de valores nem
sempre bem definidos. Assim, devido a uma certa generalização característica
das normatizações visando à justiça social, uma diretriz pode tentar impor
princípios a situações em que eles não se aplicariam. Há casos complexos que
não são contemplados plenamente pel os princípios. As diretrizes de política
pública devem, além de tratar a regra geral, permitir o tratamento das exceções.
É esse tratamento das exceções, por exemplo, que garante que os interesses das
minorias não sejam esmagados pela vontade da maioria. A grande tarefa na
construção de diretrizes de política pública nos regimes democráticos é, portanto,
estabelecer com clareza os princípios que devem ser seguidos e construir
mecanismos que sejam aceitos como legítimos para a sociedade para o
tratamento das exceções.
As democracias modernas, todavia, são sistemas políticos representativos.
Como as decisões não são tomadas coletivamente e sim por representantes da
sociedade, a alocação de recursos públicos depende dos interesses que essas
pessoas estão representando. Esses interesses não estão determinados no dia da
54
eleição. Durante todo o mandato, representantes podem ser substituídos,
influenciados e corrompidos. Sabe-se disso e aqueles que têm capacidade de
mobilização e organização suficientes tentam orientar a alocação de recursos a
interesses próprios e de seus grupos, constituindo grupos de interesse, tais como
entidades de classe e movimentos sociais, entre outros. A mobilização demanda
tempo e uma série de recursos, o que faz com que os indivíduos mar ginalizados
na sociedade raramente constituam entidades organizadas para defender seus
interesses. Assim, nas democracias em que o poder de influência dos grupos de
interesse é grande, as demandas dos marginalizados tendem a ser atendidas
apenas quando coincidem com as demandas daqueles com maior poder de
influência nas decisões de Estado.
Vários grupos de interesse agem nas decisões alocativas de recursos em
saúde no Brasil, organizando lobbies e tentando influenciar a opinião pública. Há,
por exemplo, lobbies dos prestadores privados de serviços de saúde, como o de
donos de hospitais e clínicas, que buscam influenciar a legislação sobre o
funcionamento de instituições de saúde, como ocorreu recentemente no caso da
nova legislação para a reforma psiquiátrica; lobbies de indústrias farmacêuticas
atuando na liberação de novos medicamentos para o consumo; ou lobbies de
movimentos sociais, buscando destacar as necessidades de determinados grupos
da sociedade, como os portadores do vírus HIV, as gestantes ou as crianças.
A ação dos grupos de interesse não é intrinsecamente boa ou má. É
normal que na democracia um determinado conjunto de pessoas se organize
para buscar aquilo que considera importante para si ou para os outros. O que
permite julgar quais ações são razoáveis ou não são os princípios que devem
nortear a alocação de recursos. Apesar da existência de outros princípios
aplicáveis, na saúde, o debate sobre a justiça alocativa gira predominantemente
sobre dois paradigmas de justiça: o princípio da igualdade e o princípio da
eqüidade.
55
Pelo princípio da igualdade, todos os indivíduos devem receber tratamento
igual. Implícita nessa noção está a idéia de que os indivíduos são todos iguais,
têm os mesmos direitos e, portanto, merecem os mesmos recursos. Por esse
princípio, uma pessoa rica deve ter absolutamente o mesmo tratamento e,
portanto, merece a mesma fração dos recursos públicos que uma pessoa pobre.
Trata-se de um princípio baseado em uma moralidade de direitos, diferente,
porém, das moralidades fundadas em direitos de trabalho ou de propriedade, que
julgam justa a distribuição dos recursos de acordo com a contribuição dos
indivíduos para sua obtenção. A igualdade é, pois, baseada em direitos
adquiridos pela participação na coletividade, os direitos de cidadania.
O princípio da eqüidade reconhece que os indivíduos são diferentes entre si
e, portanto, merecem tratamento diferenciado que elimine (ou reduza) a
desigualdade. Neste caso, os indivíduos pobres, por exemplo, necessitam de mais
recursos público s que os indivíduos ricos. Rawls (1995, p. 68) desenvolve um
critério para a justiça na desigualdade que é o assumido pela eqüidade: o
tratamento desigual é justo quando é benéfico ao indivíduo mais carente.
Esse critério, conhecido como axioma de Maximin, opõe-se à noção
utilitarista de que a justiça de uma alocação é determinada por suas
conseqüências sobre a soma das utilidades (que, grosseiramente falando, seria o
bem -estar) dos indivíduos envolvidos. Enquanto no utilitarismo, dentre as
diversas alocações possíveis, é preferível aquela que resulta em maior total na
soma das utilidades individuais, no maximin o axioma da soma das utilidades
individuais é substituído por uma regra baseada na hierarquia de condições dos
indivíduos. Assim, a alocação justa é aquela que possui maior capacidade de
aumentar o nível de utilidade do indivíduo em piores condições. Para evitar o
problema moral de alocar recursos a indivíduos cujo baixo nível de utilidade se
deve a padrões extravagantes (como indivíduos que desejam consumos
supérfluos), Rawls enfatiza a consideração da disponibilidade de “bens primários”
ou “essenciais” para efeitos de comparação.
56
Adaptações posteriores do maximin que consideram a hipótese de dois
indivíduos ocuparem a mesma posição na hierarquia de utilidades individuais
resultaram no axioma de Leximin, de Sen (1981, p. 278), para o qual, no caso de
haver dois indivíduos ocupando a pior posição na hierarquia das utilidades
individuais (dois “últimos”), esses indivíduos podem ser classificados pelo nível de
utilidade do indivíduo seguinte (um “penúltimo”). Havendo empate, comparando-
os aos “antepenúltimos”, e assim sucessivamente, até o desempate.
Complementando a ênfase de Rawls nas condições diferenciadas, Sen destaca a
importância da consideração das necessidades diferenciadas (no léxico de
utilidades consideradas) em decisões alocativas.
Enquanto o utilitarismo considera a soma das utilidades individuais, e tanto
o maximin quanto o leximin destacam a estrutura de distribuição interpessoal da
utilidade dos indivíduos, alguns critérios de eqüidade tentam alcançar o equilíbrio
entre essas duas posições. O axioma Fraco da Eqüidade, por exemplo, requer
que, sendo a pessoa 1 inferior na hierarquia de bem -estar à pessoa 2, quando
ambas possuem o mesmo nível de recursos (como, por exemplo, rendas), a
divisão de recursos de um grupo que inclui 1 e 2 será justa se distribuir mais
para 1 do que para 2 [Sen (1984, p. 281)].
Utilidade, no entanto, é uma medida subjetiva, o que a torna difícil de ser
utilizada em decisões distributivas. Todas as teorias de bem-estar de base
paretiana rejeitam a possibilidade de mensuração da utilidade, sendo estas
teorias as predominantes hoje em dia na Economia do Bem -Estar [Doel e
Velthoven (1993, p. 24)]. Uma tentativa de se resolver o problema é assumir
uma certa homogeneidade entre as preferências dos indivíduos, associando
utilidade a consumo. Isso permite, por exemplo, trabalhar com a idéia de que um
nível de satisfação semelhante ao de um indivíduo 1 com o consumo de um bem
ou serviço será obtido pelo indivíduo 2 caso ele tenha o mesmo consumo.
Evidentemente, a associação de utilidade a consumo de serviços e bens já é, em
si, arbitrária. Todavia, essa homogeneidade assumida é que permite a criação de
57
pautas (ou léxicos) de consumo comumente utilizadas pelos formuladores de
políticas como critério de alocação de recursos. Neste caso, para comparar
indivíduos não é necessário conhecer suas utilidades mas sim sua capacidade de
consumo.
Tradicionalmente, essa capacidade era considerada a renda dos indivíduos.
Recentemente, no entanto, a preferência vem sendo dada a uma combinação de
duas noções: riqueza e acesso a bens públicos. A riqueza inclui, além de
rendimentos (fluxos), diversos ativos (estoques) dos indivíduos e suas famílias
que podem ser utilizados no mercado para adquirir bens e serviços. O acesso a
bens públicos, por sua vez, tenta incorporar a capacidade de consumir bens que
não podem ser obtidos individualmente no mercado como, por exemplo, uma
comunidade livre de epidemias.
Há vários pontos de debate na discussão de paradigmas de justiça
aplicáveis aos problemas de justiça alocativa de recursos públicos. O princípio da
igualdade, por exemplo, pode reproduzir a estrutura de desigualdades de uma
sociedade. Um programa internacional de distribuição de alimentos norteado pela
igualdade forneceria a mesma quantidade de comida a países pobres e ricos. O
princípio da eqüidade, por sua vez, tem como um de seus obstáculos a
dificuldade de se medir o grau de “desvantagem” dos indivíduos para assim
realizar a distribuição dos benefícios. Como decidir, por exemplo, entre uma
criança pobre e um idoso pobre? Como decidir entre dois municípios com
problemas semelhantes?
58
III – UNIVERSALIZAÇÃO E FOCALIZAÇÃO
59
evitar a armadilha das utilidades diferenciadas entre indivíduos. É possível
considerar, por exemplo, que há algumas necessidades básicas para a existência
humana, como a alimentação. É assim que se define metodologicamente
“indigência”: famílias cujo rendimento não for suficiente para adquirir uma
quantidade mínima de alimentos capaz de satisfazer as necessidades calóricas de
seus membros são consideradas “indigentes”. Ou seja, o conceito de indigência é
a tentativa de expressar socialmente o fenômeno biológico da desnutrição. O que
vale ser destacado é que se reconhece uma igualdade entre indivíduos nessas
necessidades ditas naturais e comuns a todos os seres humanos. Uma
necessidade biológica básica é aquela que todos os indivíduos precisam ter
satisfeita para assegurar a vida “normal”. Ora, se todos precisam satisfazê-la, há,
nesse aspecto, igualdade entre os indivíduos. Se não há diferenciação das
necessidades, os princípios de eqüidade e igualdade considerariam justa a
distribuição universal de uma cesta básica ou uma renda mínima? Não, pois o
relevante não é a existência da necessidade (nisso todos são iguais), mas sua
satisfação (nisso há diferença).
As necessidades insatisfeitas são o objeto da atenção pública quando se
considera que a limitação de alguns indivíduos para obter aquilo que lhes é
necessário deve ser complementada pela ação coletiva. Porém, há diversos tipos
de necessidades insatisfeitas e é necessário definir quais serão contempladas.
Esse não é um grande problema no caso das necessidades biológicas básicas de
indivíduos “saudáveis”. Exceto por posições muito radicais, são raras objeções de
auxílio público a, por exemplo, pessoas subnutridas. No entanto, quando se vai
além dessas necessidades, a questão torna-se mais complexa. Um indivíduo
assintomático portador do vírus HIV que solicita a distribuição gratuita do
coquetel de controle de progresso da doença e um indivíduo em fase final de
desenvolvimento da doença que necessita de um amplo socorro de
medicamentos e tratamentos têm, ambos, suas necessidades insatisfeitas, mas é
difícil compará-las. A solução pragmática para esse problema geralmente passa
60
por arbitrar quais serão as necessidades contempláveis (sem que isso implique,
como no exemplo das necessidades básicas, considerar a igualdade entre os
indivíduos).
Definidas quais as necessidades que, insatisfeitas, são objeto da atenção
coletiva, cabe estabelecer quais os indivíduos que merecem o auxílio público.
Aqui aparece outro elemento importante no debate sobre paradigmas de justiça:
a distribuição dos recursos próprios. Para a universalização, a distribuição de
recursos dos beneficiários é irrelevante, já que certos direitos são aplicáveis a
todos, independente de suas características. Para a focalização, no entanto, a
distribuição dos recursos próprios entre os indivíduos é fundamental. Supondo a
mesma necessidade insatisfeita entre dois indivíduos, tem prioridade para
receber o auxílio público aquele que possui menos recursos para tentar satisfazê-
la. Pela eqüidade, têm prioridade nos programas de transferência de renda as
famílias mais pobres ou, por exemplo, têm primazia de acesso aos serviços de
saúde os mais doentes. Mas é importante frisar que, em saúde, é uma posição
ingênua acreditar que recursos próprios são o mesmo que riqueza. A situação
hipotética de um acidente automobilístico entre um motorista muito rico e um
muito pobre que são ambos levados inconscientes à emergência de um hospital
público mostra que, nessas circunstâncias, a riqueza não pode ser usada como
recurso e, portanto, não pode entrar no cômputo da decisão pelo princípio da
eqüidade.
A combinação de necessidades contempláveis (ou elegíveis) insatisfeitas e
a distribuição de recursos dos indivíduos são os dois pontos gerais fundamentais
nas decisões de alocação de recursos públicos. Entretanto, fora das situações
“necessidades iguais e recursos diferentes” e “necessidades diferentes e recursos
iguais”, essa combinação é complexa, tornando-a delicada de ser realizada. Essa
é uma das razões pelas quais, nas decisões alocativas, os princípios de igualdade
e eqüidade nem sempre são mantidos coerentemente (isto é, sustentados como
absolutos) pois, como argumenta Rorty (1991), a adoção de princípios éticos é
61
processual, podendo ser alterada ao longo do tempo. O fato é que, na vida real,
um mesmo formulador de políticas combina, circunstancialmente, universalização
e focalização nas estratégias de política pública. Apesar de importante, a opção
pelo princípio de eqüidade ou igualdade não esgota a decisão sobre universalizar
ou focalizar, como se pretende mostrar adiante.
O maior obstáculo à universalização é a escassez de recursos. O público-
alvo dos programas universais geralmente é muito extenso, o que pode
representar uma sobrecarga para os orçamentos dos programas sociais. Quando
não é possível aumentar esses orçamentos, uma das medidas para evitar essa
sobrecarga é reduzir os custos dos serviços prestados, o que pode se traduzir em
redução de sua qualidade. A opção pela focalização, por sua vez, aparentemente
permitira garantir serviços de boa qualidade aos indivíduos mais vulneráveis da
sociedade. Porém, quando se introduzem o tempo e as variáveis políticas na
análise, a opção pela focalização pode, a longo prazo, ser desvantajosa para os
mais fracos. A maior parte da literatura sobre políticas sociais mostra que a
consolidação dos programas sociais em diversos países do mundo dependeu de
coalizões políticas entre diversos grupos da sociedade e que a ruptura dessas
coalizões leva ao desmoronamento dos programas [Esping-Andersen (1996)]. A
focalização dos programas nos grupos mais pobres da sociedade implica, por
exemplo, perdas para as classes médias. Estas tendem a ser bastante influentes
nos processos políticos e na máquina burocrática, reagindo às perdas com a
retirada de seu apoio aos programas sociais. Os grupos pobres, com pequena
capacidade de mobilização, são incapazes de substituir esse apoio realizando
novas coalizões e, portanto, os programas começam a se extinguir, fazendo com
que um instrumento desenhado inicialmente para benefício dos mais pobres (a
focalização) torne-se um mecanismo prejudicial a seus interesses.
62
IV – BENS PÚBLICOS E ALOCAÇÃO POR CRITÉRIOS EPIDEMIOLÓGICOS
63
advindos da produção do bem. Como no caso do bem público puro todos são
beneficiados por sua existência, há uma boa razão para que sua produção seja
coletiva. No entanto, existe uma limitação para a produção coletiva conhecida
como o problema do free rider. Como todos têm interesse na produção do bem e
essa produção tem custos, um indivíduo isolado que aja egoisticamente pensará
em não contribuir nos custos, pois espera que mesmo assim os demais indivíduos
insistam na produção do bem. Esse indivíduo não “pagaria” (em dinheiro ou
outro tipo de esforço) para a produção do bem, mas se beneficiaria dele, “de
carona”, já que o bem é público e seus benefícios não podem ser limitados
àqueles que contribuíram para sua produção.
O problema do free rider é parte da construção do que se chama Paradoxo
de Olson. O argumento do paradoxo é o de que não há motivo “natural” para a
produção de um bem público em uma coletividade grande (como uma nação),
mesmo quando esse bem é do interesse de cada um dos membros da
coletividade, pois os indivíduos sempre tenderão a agir como free riders no
momento de contribuir para a produção do bem. Considerando que o paradoxo é
resultado da dedução de um conjunto de postulados sobre a racionalidade
humana, diversas teorias propõem explicações alternativas para a produção dos
bens públicos nas sociedades democráticas [Doel e Velthoven (1993, p. 68-79)].
Os indivíduos que se comportassem de acordo com os postulados de Olson
agiriam coletivamente quando encontrassem incentivos seletivos para a
contribuição. Um tipo de incentivo seletivo positivo é a limitação do direito de
consumo do bem àqueles que contribuíram. Todavia, isso por um lado explica a
produção coletiva de bens privados, mas não a de bens públicos e, por outro,
coloca o problema da origem do benefício positivo (quem o produz?). Um
incentivo seletivo negativo seria algum tipo de punição para aqueles que não
contribuem. Indivíduos cooperariam não porque encontram benefícios, mas
porque evitam a punição. Esse tipo de incentivo seletivo só pode existir quando
64
imposto de forma autoritária, isto é, quando o indivíduo não tem a opção de
evitar a alternativa de aderir sem que seja punido por isso.
Um dos agentes dessa imposição é o Estado. A democracia, no entanto,
“coloca os cidadãos na posição de coagir o coator e torna-se provável que usarão
seus direitos desse modo se forem levados a crer que um número
suficientemente grande de outros cidadãos aderirá a essa estratégia para obrigar
as autoridades do Estado a abster-se de forçar os cidadãos a contribuir” [Offe
(1994, p. 294)]. Em outras palavras, os cidadãos podem, por exemplo, votar
contra os representantes que propõem a contribuição compulsória para os bens
públicos, como de fato ocorreu diversas vezes na história, quando foram eleitos
representantes favoráveis à redução de impostos (que, como o nome diz, são
contribuições obtidas por imposição ). “A alternativa parece ser supor que os
agentes produzem bens coletivos não devido à capacidade racional de maximizar
a utilidade e evitar punições, mas em virtude de sua disposição normativa para
fazê-lo, ou da relação de confiança, reciprocidade, simpatia e justiça que
sentiram existir entre si próprios e as demais pessoas que contribuem” [Offe
1994, p. 296)].
Por produção coletiva não se deve entender que a coletividade deve
participar diretamente do processo de produção. Essa participação pode ser
indireta, na forma de pagamento, por exemplo. Toda produção coletiva de um
bem público é uma forma de alocação de recursos e seu conteúdo de justiça
pode, pelos paradigmas da igualdade e da eqüidade, ser analisado a partir das
necessidades insatisfeitas e dos recursos disponíveis. Como se trata de uma ação
coletiva, essa análise será mais precisa se considerar necessidades e recursos
coletivos.
Necessidades e recursos coletivos podem ser considerados como a simples
soma das necessidades e dos recursos individuais existentes. Esse procedimento,
no entanto, parte da idéia de que a justiça deve ser feita tão-somente às pessoas
existentes. Trata-se de uma idéia relativamente estática no tempo. Pode parecer
65
estranho pensar em justiça para indivíduos não-existentes. Essa idéia, porém, é
uma tentativa de englobar, por exemplo, as gerações futuras nas considerações
sobre alocação de recursos. A disponibilidade do bem “saúde” no futuro é, em
parte, determinada historicamente, ou seja, pelas ações em saúde no passado e
no presente. Logo, como as alocações de recursos realizadas hoje afetarão
gerações futuras, parece razoável incluí -las nas considerações sobre justiça, de
uma forma muito semelhante ao que se faz nas discussões sobre o uso do meio
ambiente. Porém, se as pessoas ainda não existem, é difícil ponderar com
segurança suas necessidades e recursos individuais e, por isso, lança-se mão do
conceito de “coletivo”. As decisões em nome da “coletividade” (neste caso) são
tomadas levando em conta um ideal normativo de sociedade que possui várias
funções, dentre elas a de tentar controlar a incerteza decorrente da falta de
parâmetros objetivos para as alocações de recursos.
A solução de Offe para a produção de bens públicos é compatível com a
idéia de “coletividade” que acaba de ser exposta. Ela explica que a produção dos
bens públicos pode ser orientada normativamente ou por regras de
reciprocidade. O conceito reciprocidade refere-se a um modo de integração social
em que indivíduos “dão” algo, semelhante ao que ocorre na troca, em que os
indivíduos comparam os valores do que está sendo trocado e definem suas
condições (os termos de troca, como, por exemplo, os preços) no momento em
que a relação ocorre. Do ponto de vista analítico, a troca só garante a relação
entre os indivíduos no momento em que é realizada. Na reciprocidade, indivíduos
não comparam valores para definir suas condições para doar algo, mas fazem a
doação em função da manutenção de uma coletividade que pode ou não vir a
retribuir sua doação em termos equivalentes. O exemplo mais clássico de
reciprocidade é o do mutirão, em que indivíduos ajudam uns aos outros sem que
se defina a priori quando e em quanto serão reciprocamente ajudados. Tanto a
orientação normativa quanto a reciprocidade perduram no tempo e, portanto,
são coerentes com a idéia de “coletividade”.
66
A decisão de alocar recursos por critérios epidemiológicos possui um alto
grau de orientação à “coletividade”. Ela utiliza o grau de necessidade dos
indivíduos em um determinado instante como critério de alocação, mas apenas
como medida de aumento da eficiência na produção de um bem público que visa
suprir as necessidades da coletividade nos momentos seguintes à distribuição dos
recursos em saúde. Neste sentido, critérios epidemiológicos podem indicar tanto
a universalização como o melhor meio de produzir o benefício focalizado, quanto
indicar a focalização como o melhor meio de produzir o benefício universal tendo,
indiferentemente, como pano de fundo, tanto o princípio da eqüidade como o da
igualdade.
V – CONCLUSÕES
67
capacidades de mudança do sistema e no orçamento da saúde. Há algumas
alternativas de solução para esse problema, das quais três podem ser
destacadas. A primeira consiste em uma redução da demanda por tratamento
como resultado de, por exemplo, medidas de medicina preventiva. A segunda, na
redução dos custos do sistema e a terceira na ampliação do orçamento, o que,
em última instância, é uma transferência do problema de alocação de recursos na
saúde para uma alocação geral de recursos públicos na sociedade. Mesmo assim,
apesar de uma provável diminuição da pressão sobre as decisões alocativas, o
problema de como distribuir recursos na forma de bens e serviços de saúde
persistiria. O eixo central desse problema é como distribuir com justiça. A
resposta, evidentemente, depende da referência usada para estabelecer o que
vem a ser “justo”.
No debate sobre recursos da saúde, dois paradigmas de justiça
freqüentemente estão presentes nas discussões, baseados nos princípios de
igualdade e de eqüidade. O primeiro admite que os indivíduos têm direito a
quantidades iguais de bens e serviços públicos, independentemente de suas
características particulares. O acesso aos serviços públicos de saúde, neste caso,
se dá de acordo com as necessidades dos indivíduos e independe de seus
recursos para a obtenção desses serviços em outra instância. É um caso comum
nas regulamentações jurídicas orientadas pelas máximas de igualdade perante a
lei que, no Brasil, reflete-se, por exemplo, na elegibilidade dos beneficiários do
Sistema Único de Saúde (SUS). O segundo reconhece a diferença entre os
indivíduos e propõe que a distribuição de bens e serviços seja feita de forma a
reduzir as desigualdades entre eles. Nas decisões alocativas baseadas no
princípio da eqüidade são consideradas não só as necessidades dos indivíduos
como também sua disponibilidade de recursos para satisfazê-las. Essa
comparação de necessidades e recursos é uma forma de contornar os problemas
existentes na comparação de utilidades subjetivas.
68
Decisões alocativas baseadas no princípio da igualdade muitas vezes
implicam estratégias de universalização de políticas, enquanto decisões baseadas
na eqüidade geralmente implicam focalização. A universalização garante os
serviços indiscriminadamente, mas é mais cara, e, a depender do regime de
contribuição para o sistema, tem um efeito menor de redução da estrutura de
desigualdades da sociedade. O público-alvo dos programas universais geralmente
é muito extenso e, em paí ses como o Brasil, onde a utilização dos serviços é
grande, isso pode representar uma sobrecarga no orçamento dos programas
sociais. A focalização pode favorecer aqueles em maior desvantagem por meio de
programas de menor extensão - tendendo, portanto, a menor custo total - e mais
fáceis de administrar. Porém, dada a dificuldade de mensuração da desvantagem
para efeitos de comparação, a focalização depende de uma série de
arbitrariedades que podem desvirtuar seus objetivos. Além disso, alguns
exemplos internacionais mostram que a adoção de estratégias de focalização dos
serviços públicos na população pobre pode implicar perdas para alguns setores
da sociedade, como por exemplo a classe média, que reage com a retirada de
seu apoio a essas políticas. Nesse caso, a adoção de estratégias de focalização
pode resultar, a longo prazo, em desvantagens para a população pobre.
Devido às suas características peculiares, a saúde pode ser tratada como
um bem público. Uma das conseqüências da existência de externalidades
positivas é que, em muitos casos, a boa saúde de um indivíduo contribui para a
boa saúde dos demais. Esse tipo de tratamento destaca a necessidade de
critérios epidemiológicos nas decisões alocativas. Devido às externalidades, tanto
as estratégias de focalização são capazes de produzir impactos universais à
medida que controlam a propagação de enfermidades, quanto as estratégias de
universalização, ao reduzirem a prevalência de enfermidades que afetam de
maneira mais grave certos indivíduos, podem ser a forma mais eficiente de
beneficiar grupos populacionais específicos.
69
VI – REFERÊNCIAS
-DOEL, H. van den, VELTHOVEN, B. van. Democracy and welfare economics. 2nd
ed. Cambridge University Press, 1993.
70
ESTUDO DIRIGIDO nº 03 – Avaliação Economica
RESUMO
71
INTRODUÇÃO
72
Adicionalmente, existe uma baixa cobertura nacional das ações de
rastreamento dessa neoplasia: embora o Inquérito Domiciliar realizado pelo
Ministério da Saúde tenha mostrado que, para as 16 localidades analisadas, a
cobertura estimada do exame Papanicolaou variou entre 74% e 93%, o
percentual desses exames realizado pelo Sistema Único de Saúde (SUS) variou
entre 33% e 64% do total. Isso explica, em parte, o diagnóstico tardio e a
manutenção das taxas de mortalidade, bem como as altas taxas de incidência
observadas no Brasil (BRASIL, 2003a)
Além do teste de Papanicolaou, tradicionalmente usado há mais de 30
anos, novas tecnologias têm-se juntado ao arsenal diagnóstico disponível para a
detecção precoce desse tipo de neoplasia, entre as quais se incluem a citologia
em meio líquido e os testes para detecção do HPV por captura híbrida. A citologia
em meio líquido é um método segundo o qual as células cervicais são imersas em
líquido conservante antes da fixação da lâmina, o que evita o ressecamento do
material e reduz a quantidade de artefatos, produzindo menor taxa de exames
insatisfatórios.
A melhor qualidade dos resultados resultaria em uma sensibilidade
potencialmente maior que a do teste de Papanicolaou, permitindo, ainda, que o
material residual seja utilizado para o diagnóstico, por meio de métodos
biomoleculares, de infecções sexualmente transmissíveis (como clamídia e
gonococcia) e também para o HPV (SHERMAN et al., 1997; BOLICK; HELLMAN,
1998; ALVES et al., 2004).
Os testes para detecção do HPV têm sido propostos como estratégia
complementar ou substitutiva da citologia oncótica na detecção precoce do
câncer cérvico-uterino e de suas lesões precursoras, na triagem mais imediata de
pacientes com células escamosas atípicas de significado indeterminado ou em
mulheres de mais de 35 anos com neoplasia intra-epitelial escamosa de baixo
grau. O teste de captura de híbridos (CH II) identifica 13 tipos de vírus
considerados de alto risco oncogênico (subtipos 16, 18, 31, 33, 35, 39, 45, 51,
73
52, 56, 58, 59 e 68) e 5 tipos de vírus de baixo risco oncogênico (6, 11, 42, 43 e
44), com uma sensibilidade superior à do exame cito patológico convencional na
identificação do câncer do colo do útero ou suas lesões precursoras (FLORES et
al., 2003; MSAC, 2003). Ademais, o teste CH II também oferece a possibilidade
de autocoleta, uma alternativa que permite aumentar a cobertura do exame em
regiões de difícil acesso ou com características culturais que levem à resistência
ao exame ginecológico (FLORES et al., 2003; WRIGHT et al., 2000).
74
MÉTODOS
75
Figura 1 — Árvore de decisão de condutas clínicas relacionadas com citologia convencional
(Papanicolaou) ou citologia líquida
76
Figura 2 — Árvore de decisão de condutas clínicas relacionadas com o teste de captura híbrida
para Papilomavirus (CH-HPV) por autocoleta ou coleta por profissional de saúde
Legenda: 1 - Baixo risco oncológico (tipos virais 6, 11, 42, 43 e 44). 2 - Alto risco oncológico
(tipos virais de número 16, 18, 31, 33, 35, 39, 45, 51, 52, 56, 58, 59 e 68); 3 - Normal, ASCUS
de origem possivelmente não-neoplásica, NIC I e HPV; 4 - NIC II, III, e carcinoma escamoso ou
adenocarcinoma invasor.
77
Figura 3 — Árvore de decisão de condutas clínicas relacionadas com as associações da citologia
(convencional ou citologia líquida) e do teste de captura híbrida para Papilomavirus (CH-HPV).
Legenda: 1 – Citologia negativa - lesão intra-epitelial de baixo grau (efeito citopático pelo HPV e
neoplasia intra-epitelial cervical grau I - NIC I) e células escamosas atípicas de significado
indeterminado (ASCUS) de origem possivelmente não-neoplásica e CH-HPV negativo (normal ou
positividade para tipos virais de baixo risco oncogênicos); 2 – Espécimes que se mostraram
inadequados à avaliação oncótica devido a material acelular ou hipocelular (< 10% do
esfregaço) ou leitura prejudicada (> 75% do esfregaço) por presença de sangue, piócitos,
artefatos de dessecamento, contaminantes externos, intensa superposição celular ou outros. 3 -
Citologia positiva - células escamosas atípicas de significado indeterminado (ASCUS) onde não
se pode afastar lesão intra-epitelial de alto grau, células glandulares atípicas de significado
indeterminado (AGUS), lesão intra-epitelial de alto grau (neoplasias intra -epiteliais cervicais
graus II e III - NIC II e NIC III), carcinoma epidermóide invasor e adenocarcinoma ou CH-HPV
positivo (positividade para tipos virais de alto risco oncogênico); 4 - Normal, ASCUS de origem
possivelmente não-neoplásica, NIC I e HPV; 5 - NIC II, III, e carcinoma escamoso ou
adenocarcinoma invasor.
78
TESTES DE RASTREAMENTO E MEDIDAS DE EFETIVIDADE
79
Tabela 1: Medidas de acurácia das estratégias de rastreamento do câncer Cérvico-Uterino.
80
HPV; citologia em meio líquido; colposcopia; biópsia de colo uterino e
anatomopatologia.
A citologia em meio líquido e captura híbrida para HPV não se encontram
dentro dos procedimentos aprovados para reembolso no SUS, impedindo que as
várias estratégias de rastreamento sejam comparadas sob a perspectiva do
sistema público de saúde brasileiro. Procedeu-se a uma estimativa de qual
deveria ser o preço máximo desses testes de rastreamento para o SUS, de modo
a garantir a equivalência em custo -efetividade ao teste de Papanicolaou. Para
esse cálculo foram utilizados os valores dos itens de custo presentes na tabela de
reembolso do SUS (BRASIL, 2004a).
RESULTADOS
81
Tabela 2: Custo-efetividade das estratégias usadas no rastreamento do câncer cérvico-uterino.
ANALISE DE SENSIBILIDADE
82
estudo; (e) redução na taxa de exames insatisfatórios relacionados com a
citologia em meio líquido para um valor de 1,6%.
As simulações não mostraram influência significativa sobre o resultado
inicial de alterações na sensibilidade dos testes de Papanicolaou ou de citologia
em meio líquido, bem como nas taxas de exames insatisfatórios. Os preços dos
itens de custo agregados a cada estratégia, contudo, se revelaram uma variável
com impacto nos resultados iniciais. A estratégia de CH-HPV, com a redução em
20% dos valores dos itens de custo e uma elevação em igual proporção dos
valores praticados para o teste de Papanicolaou, assume a posição de melhor
razão custo-efetividade incremental, conforme se evidencia na tabela 3.
Tabela 3: Redução em 20% nos valores dos itens de custo relacionados às outras estratégias
de rastreamento, com o valor da estratégia do Papanicolaou elevado em 20%
Legenda: CEI = êCusto / êcaso; CH-HPV – teste de captura híbrida para papilomavírus; AC -
autocoleta.
83
ESTIMATIVA DE PREÇOS PARA AS NOVAS TECNOLOGIAS DE
RASTREAMENT O
Onde:
A partir dos valores pagos pelo SUS pelos diversos itens de custo
relacionados com as intervenções de rastreamento e confirmação diagnóstica, e
levando em consideração as probabilidades de transição correspondentes a cada
uma das estratégias, estimou-se o custo da estratégia de Papanicolaou para o
sistema público: R$ 245.762,79.
Tomando por base uma efetividade de 175 casos detectados em 10.000
mulheres, a razão de custo foi de R$ 1.404,36 por caso detectado de câncer ou
lesão precursora de alto grau. Para essa razão, os custos estimados das
estratégias foram os seguintes: CH-HPV, R$ 252.784,58; citologia em meio
líquido, R$ 227.506,12; e associação da CH-HPV com teste de Papanicolaou,
84
R$269.636,89. Calculou -se, então, o preço que cada uma das outras tecnologias
precisaria atingir para igualar a razão de custo-efetividade do teste de
Papanicolaou no reembolso público, obtendo-se os valores constantes da tabela4.
DISCUSSÃO
85
as mulheres precisam ser retestadas um a três anos após um exame normal para
reduzir a chance de se perder anormalidades existentes e não devido ao rápido
desenvolvimento da doença.
De forma bastante consistente, estudos de análises econômicas dos
programas de rastreamento cervical têm mostrado que a relação de custo-
efetividade do rastreamento, independentemente da tecnologia utilizada,
aumenta exponencialmente à medida que os intervalos entre os exames de
rastreamento diminuem, efeito que é ampliado pelo aumento da sensibilidade do
teste (MANDELBLATT et al., 2002). Testes de rastreamento mais sensíveis,
porque garantem que uma maior proporção de indivíduos com doença sejam
captados no rastreamento, podem permitir um espaçamento dos intervalos sem
prejuízo da segurança e com implicações importantes para os custos e a
eficiência comparativa entre os métodos.
A avaliação das novas tecnologias propostas precisa também considerar os
custos associados com a obtenção, processamento e interpretação dos exames,
bem como aqueles referentes ao reexame decorrente de amostras inadequadas.
Além disso, melhorias na acurácia envolvem a identificação de um número
aumentado de pacientes com lesões intra-epiteliais de baixo grau, e os custos de
investigar e tratar mulheres com testes falso -positivos ou anormais devem
também ser avaliados.
Os novos métodos introduzidos para o rastreamento do câncer cérvico-
uterino têm sido objeto de diversos estudos de custo-efetividade (FLORES et al.,
2003; AHCPR, 1999; ICSI, 2003; CUZICK, 1999) em particular por agências
internacionais de avaliação tecnológica (MSAC, 2003; MSAC 2002a; MSAC,
2002b), responsáveis, em seus países, por auxiliar nas decisões relativas à
cobertura e ao reembolso desses procedimentos pelos sistemas de saúde, público
e privados. Em geral, os estudos e revisões parecem apontar que, embora esses
testes mostrem melhor acurácia diagnóstica, com sensibilidade igual ou maior
que a do teste de Papanicolaou, as incertezas presentes nos modelos
86
empregados ainda não permitem concluir por maior custo -efetividade, tanto da
citologia em meio líquido quanto dos testes de captura para HPV.
Neste estudo, o teste de Papanicolaou apresentou a melhor razão
incremental de custo-efetividade entre todas as estratégias de rastreamento
analisadas. Entretanto, as análises de sensibilidade demonstraram que o
resultado depende dos custos das estratégias empregadas. Tanto é assim que a
estratégia de CH-HPV, com a redução em 20% dos valores dos itens de custo e
uma elevação em igual proporção dos valores praticados para o teste de
Papanicolaou, assume a posição de melhor razão de custo -efetividade
incremental. Nem a redução na sensibilidade do teste de Papanicolaou, nem o
aumento da sensibilidade da citologia em meio líquido alteram os resultados
acima relatados, exceto quando se alteram os custos das estratégias de
rastreamento.
As estimativas realizadas buscaram identificar os preços que as novas
tecnologias precisariam assumir no sistema público, de modo a atingirem razão
de custo-efetividade equivalente a do teste de Papanicolaou. Tomando por base
o valor de reembolso atualmente praticado para o teste de Papanicolaou, de
R$5,37, os valores reembolsados pelo SUS para os testes de CH-HPV, da citologia
em meio líquido e da combinação do CH-HPV com a citologia convencional,
deveriam ser, no máximo, R$ 19,12, R$ 8,22, e R$ 11,82, respectivamente.
Vale ser ressaltado, entretanto, que nos valores de reembolso estimados
não estão incluídos os custos relacionados à adoção de uma nova tecnologia pelo
sistema de saúde. Usualmente, a modificação de rotinas já estabelecidas implica,
entre outros, em custos não previstos, perda de produtividade transitória e
necessidade de treinamento e capacitação de recursos humanos para a
reorganização da assistência nos novos moldes. Outrossim, deve-se observar
também que os cálculos efetuados expressam um exercício preliminar, que não
deve ser tomado como valor proposto de reembolso para o SUS, para o qual
87
seriam necessários estudos de custos mais detalhados, que não estiveram
presentes no escopo deste projeto.
Algumas limitações do estudo merecem ser mencionadas. Primeiro, como a
perspectiva adotada foi a do sistema de saúde, não foram incluídos os custos
indiretos. Por sua vez, em função da medida de efetividade escolhida, também
não foram considerados nas estimativas realizadas os custos dos tratamentos dos
casos detectados. Como os valores referentes à investigação adicional e ao
tratamento são muito mais elevados que aqueles relacionados ao diagnóstico
precoce, sua inclusão poderia modificar os resultados aqui encontrados.
Outra limitação foi a utilização de valores de reembolso e não o
levantamento dos custos atribuíveis a cada uma das opções de rastreamento. No
Brasil, a maioria das unidades de saúde não tem sistemas de custeio operante e
desconhece o consumo preciso de recursos vinculados à prestação de cada
intervenção ou serviço. Os valores pagos por um dado procedimento pelo SUS
dizem respeito aos gastos contabilizados pelo sistema e não ao consumo dos
recursos empregados em uma função de produção relativa àquele procedimento.
Embora o uso dos fatores envolvidos na função de pr odução de cada intervenção
seja um custo na perspectiva do Estado brasileiro, na medida em que o valor da
tabela de reembolso de procedimento do SUS não venha a cobri-los, esse uso
não corresponde ao que é custo para SUS, que se restringe ao valor
efetivam ente pago por este sistema.
CONCLUSÕES
88
melhor razão de custo-efetividade na dependência dos preços praticados no setor
de saúde. Dadas as incertezas existentes em vários parâmetros-chave, faz-se
necessário realizar estudos mais completos que contemplem os vários estágios
da evolução natural do câncer de colo de útero em nosso meio e os efeitos das
transições entre esses estados, a serem explorados por meio de modelos de
universo temporal mais longo.
REFERÊNCIAS
89
-CUZICK, J. et al. A systematic review of the role the human papillomavirus
testing with a cervical screening program. Health Technology Assessment, v. 3,
n. 14, p. 1-214, 1999.
-HUTCHISON, M. L.; BERGER, B. M.; FARBER, F.L. Clinical and cost implications
of new technologies for cervical cancer screening: the impact of test sensitivity.
Am. J. Manag. Care, n. 6, p. 766-780, 2000.
90
-INSTITUTO NACIONAL DO CÂNCER (BRASIL). Estimativa 2006: incidência de
câncer no Brasil. Rio de Janeiro: INCA, 2005.
-SALOW, D. et al. American Cancer Society guideline for the early detection of
cervical neoplasia and cancer. Cancer Journal for Clinicans,v.52,p.342-362, 2002.
91
-WRIGHT JR, T. C et al. HPV DNA testing of self collect vaginal samples
compared with cytological screening to detect cervical cancer. JAMA, v. 283, p.
81-86, 2000.
-______. Interim guidance for the use of human papillomavirus DNA testing as
an adjunct to cervical citology for screening.Obstet.Gynecol.v. 103, p. 304-309,
2004.
-______. 2001 Consensus guidelines for the management of human with cervical
citological abnormalities. JAMA, v. 287, n. 16, p. 2120-2129, 2002
NOTAS
1
A pesquisa foi subvencionada pela Fundação Ary Frauzino de Pesquisa e
Controle do Câncer e pela Digene do Brasil.
2
O teste para HPV pode ser colhido tanto por profissional de saúde como por
auto-coleta, pela própria paciente. Exceto quando discriminado como auto-coleta
(AC), o exame para HPV foi sempre colhido por profissional.
92
X – Bi bl iog rafia
MATOS, A. J. Gestão de Custos Hospitalares. São Paulo: Editora STS, 2002. 280p.
93
XI – A nexo s – T ex tos d e a poi o
94