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INOVAÇÃO E PRODUÇÃO: ANÁLISE CONCEITUAL E

EMPÍRICA DO CASO PAVIMENTAÇÃO COM ASFALTO


Antônio Ricardo Pimentel de Oliveira1; Peter Rudolf Seidl2; Waldimir Pirró e Longo3

Resumo: O trabalho visa verificar a existência de um sistema setorial de inovação e


produção em pavimentação no Brasil, identificar disfunções ou lacunas neste sistema, e
propor soluções para sua adequada estruturação. A pavimentação de rodovias é chave para
o crescimento e competitividade do Brasil. A análise tem por suporte o conceito de
sistemas de inovação, e por método, o estudo de caso, segundo a abordagem do Projeto
ESSY europeu, específica aos casos setoriais. São relatados resultados referentes aos
seguintes aspectos do setor: [1] conhecimento e processo de aprendizado; [2] suas
empresas (firmas), organizações não-empresariais, redes e instituições; [3] dinâmica
setorial de longo prazo e coevolução; [4] políticas públicas; [5] fronteiras geográficas; e [6]
desempenho internacional. A pesquisa indicou desafios, tanto para engenheiros
rodoviários, quanto para gestores deste modal: o percentual de pavimentação atingido na
malha rodoviária brasileira é modesto; ela apresenta excesso de tráfego e sobrecarga sobre
seus pavimentos; e evidências apontam para práticas de dimensionamento defasadas do
nível de solicitação aplicado nas rodovias. Verificou-se coexistirem: efeitos positivos
decorrentes das políticas e ações no campo científico, tecnológico e da educação, gerando
aprendizado e inovações, assim como introdução de inovações pelas firmas; e as
conseqüências ainda vigentes do enfraquecimento ocorrido nos órgãos rodoviários, que
limitam o aproveitamento pleno das oportunidades de inovação.

Palavras-chave: asfalto, pavimentação, inovação, produção.

Abstract: The paper aims to verify the existence of a sectoral system of innovation and
production in road building in Brazil, identifying dysfunctions or gaps, and proposing
solutions for its appropriate structuring. The road building paving is a key activity for the
growth and competitiveness of Brazil. The analysis is supported by the concept of
innovation systems. The “case study” was the main way of researching here used,
complemented by the European ESSY-Project method, suitable for sectoral studies. The
results related to the following aspects are presented: [1] knowledge and learning process;
[2] its companies (firms), no-business organizations, networks and institutions; [3] long
term sectoral dynamics and (co)evolution; [4] public policies; [5] geographical frontiers;
[6] and international performance. The research indicated a set of challenges for the road
engineers as for the managers ahead the road system: the paving roads share reached by the
Country is very modest; there is excessive traffic and overloading on the pavements; and
evidences of standards that induce to calculate the pavements below the necessary
resistance to support the applied level of charges in the Brazilian roads. It was also verified
that coexist: the current positive effects of the policies and actions applied in the scientific,
technological and education areas, generating learning and innovations, as well as
introduction of innovations by the firms; and the weakness effects on the public
departments ahead the roads, limiting to take advantage from the innovation opportunities.

Keywords: asphalt, paving, innovation, production.

1
Doutorando, Escola de Química, UFRJ; M.Sc.Eng, UFF; B.Sc.Eng, IME; Engenheiro de Petróleo da
Gerência de Engenharia de Produtos da Petrobras. (arpimentelo@)petrobras.com.br).
2
D.Sc, Universty of California, LA); Professor e Pesquisador da UFRJ, Escola de Química.
(pseidl@eq.ufrj.br).
3
D.Sc, University of Florida; Professor e Pesquisador da UFF, do Núcleo de Estudos Estratégicos.
(wlongo@hotmail.com).
Artigo publicado na revista ENGEVISTA, vol. 14, n. 1, p. 42-57, Niterói, RJ (2012).
1
1. INTRODUÇÃO urbanas e vicinais. A durabilidade deste
modal tão utilizado no País depende do
seu dimensionamento estrutural, dos
Nos países que apresentam plenos materiais utilizados e da forma de
desenvolvimentos econômicos e sociais, combiná-los, do controle tecnológico
a questão da logística configura-se como realizado nas diversas fases do processo
um dos fatores mais estratégicos. de construção e pavimentação das vias,
Comparações internacionais apontam que etc. Como as condições referentes às
o Brasil, nesse particular, apresenta demandas logísticas dos segmentos
excessivo viés na utilização de um tipo usuários não são estáticas, faz-se
específico de modal – o rodoviário – que necessário também constante promoção
apresenta histórico de desenvolvimento de inovações seja para enfrentar questões
insuficiente, assim como pouca expansão. inéditas, seja para adequar as vias às
Sua malha de rodovias embora extensa, condições funcionais que são cambiantes
ainda é pouco pavimentada se comparada ou para adotar soluções que foram
com outros países mais desenvolvidos. eficazes em países ou em regiões
Há também percepções no meio consideradas como sendo referenciais
rodoviário que sugerem estar essa malha tecnológicos válidos e confiáveis.
exposta a um regime de utilização e de O presente trabalho tem por
desgaste talvez mais severo que as objetivo verificar a existência de um
malhas européias e norte-americanas sistema setorial de inovação e produção
(Schroeder, 1996). Esse conjunto de em pavimentação com asfalto no Brasil, e
fatores traz significativos efeitos que identificar eventuais disfunções ou
acabam por influir negativamente sobre o lacunas neste sistema, assim como propor
processo do desenvolvimento econômico. soluções para sua adequada estruturação.
Há muitos municípios no País com A justificativa dessa investigação é o fato
insuficiente, e inadequada, infraestrutura do modal rodoviário ser fator estratégico
de transporte, o que dificulta o ao crescimento e competitividade das
escoamento da produção rural assim diversas regiões do Brasil. O referencial
como o acesso das respectivas teórico utilizado na pesquisa é a
populações às facilidades urbanas conceituação econômica sobre sistemas
existentes em suas regiões ou em regiões de inovação. O estudo foi desenvolvido
vizinhas. segundo a abordagem preconizada no
A pavimentação de rodovias e sua Projeto ESSY europeu, que analisou os
manutenção requerem investimentos sistemas de inovação e produção dos
contínuos e elevados. Esses gastos são seguintes setores: setor de serviços, o de
realizados, essencialmente, pelo governo software, o de equipamentos e serviços
federal e pelos estaduais, e em menor de telecomunicações, o de biotecnologia
porte, pelos governos municipais. Os e fármacos, o de máquinas ferramentas, e
investimentos municipais em geral de produtos químicos. (Malerba, 2002b).
dependem dos níveis de arrecadação, O referido Projeto será adiante detalhado.
sendo eles mais elevados naqueles
municípios que são capitais dos Estados
ou que sejam pólos de forte influência 2. INOVAÇÃO E A
econômica regional, e por isso ABORDAGEM
possuidores de maior grau de urbanização SETORIAL
e infraestrutura de transporte.
Muito se tem questionado o
desempenho da malha rodoviária O conceito econômico da
nacional. Alguns aspectos, entretanto, inovação abrange cinco possíveis tipos de
condicionam o comportamento funcional inovação: (1) a fabricação de novos bens;
dos pavimentos, tanto das rodovias (2) novos métodos de produção; (3) a
federais e estaduais, quanto das rodovias abertura de um novo mercado; (4) a
utilização de novas matérias-prima
2
(novas em si mesmas, ou que sejam econômica de temas estreitamente
oriundas de novas fontes de suprimento); vinculados à inovação, como: o
e (5) nova forma de organização fenômeno da mudança técnica, a
industrial, como por exemplo, a criação “arquitetura” dos sistemas científicos, e a
de um monopólio, ou inversamente, a gênese da inovação tecnológica.
“quebra” de um monopólio existente. (Amable, 2001). Dentre as diversas
(Schumpeter, 1934). abordagens há as que buscam também
Inovações tecnológicas em analisar as conseqüências da inovação no
produtos e processos, por outro lado, desempenho econômico das nações no
especificamente significam: (a) a efetiva longo prazo. Estudos semelhantes ao da
introdução de produtos e processos presente investigação, envolvendo
tecnologicamente novos; ou (b) cadeias produtivas, e como torná-las
substanciais melhorias tecnológicas em eficazes e competitivas são feitos sob a
produtos e processos já existentes. Uma ótica dos Sistemas Setoriais de Inovação
inovação tecnológica em produto ou em e Produção (SSIPs). A abordagem por tais
processo só é considerada efetivamente sistemas setoriais é propícia para análise
implantada se tiver sido introduzida no de dois tipos de questões. Um deles é o
mercado, no caso da inovação de produto, que trata das ações empreendedoras
ou usada no processo de produção, caso predominantemente aderentes ao
seja uma inovação de processo. determinismo tecnológico (exemplos: as
Inovações tecnológicas, seja em produto definições de inovação da OCDE, acima,
ou em processo, envolvem uma série de contidas no Manual de Oslo, ou as
atividades científicas, tecnológicas, empregadas pelo Instituto Brasileiro de
organizacionais, financeiras e comerciais. Geografia e Estatística – IBGE, na sua
(OCDE; 1997). Pesquisa de Inovação Tecnológica –
A abordagem de sistemas de PINTEC). Outro tipo é aquele orientado à
inovação (SIs) surgiu a partir da segunda busca de como superar eventuais
metade da década de 1980 fundamentada obstáculos institucionais, assim como
nos trabalhos de Freeman (1987), superar certas condições históricas
Lundvall (1992), Nelson (1993) e Edquist vigentes nos setores industriais, os quais
(1997). Desde então o conceito se tornou obstruem o crescimento e
largamente utilizado no âmbito competitividade dos setores (exemplo
acadêmico e também intensamente principal: a definição de inovação acima,
empregado como diretriz na proposição segundo Schumpeter). Para isso, neles
de políticas de inovação. Tal aderência se são consideradas as especificidades
deve ao fato de que este conceito e setoriais, o que envolve entender também
abordagem auxiliam na identificação dos as diferenças entre nações, pois estas não
fatores determinantes que influenciam o necessariamente estão em estágios de
desenvolvimento, difusão e uso das industrialização semelhantes, nem
inovações. Inicialmente a principal ênfase apresentam níveis de desenvolvimento
desse desenvolvimento teórico eram os tecnológico próximos. As estruturas dos
sistemas nacionais de inovação (Freeman setores industriais diferem entre si e,
1987; Lundvall 1982; Nelson 1983). considerando um mesmo tipo de setor,
Posteriormente surgiram ramificações do elas podem, em certo grau, diferir de um
conceito, como os sistemas setoriais de país para outro. Existem também
inovação (Breschi e Malerba, 1997; especificidades que caracterizam o
Carlson, 1995; Nelson e Mowery, 1999), arcabouço institucional de cada país,
e os sistemas regionais de inovação influenciando de maneira própria seus
(Cooke, Gomez Uranga e Etxebarria, diversos setores industriais. Isso ocorre
1997; Braczyk, Cooke e Heidenreich, mesmo entre os países desenvolvidos, os
1998 ; e Cooke, 2000). quais embora estejam já intensamente
Os SIs representam a reunião de industrializados, não necessariamente
diferentes tentativas de inserir o conteúdo praticam o mesmo tipo de capitalismo.
da economia institucional na análise
3
Todas as vertentes de pesquisa através do estudo de caso, visto que a
que convergiriam no conceito dos SIs realidade setorial aqui examinada tende a
tiveram como ponto de partida comum ser construída socialmente. Na
saírem da concepção da inovação, como investigação se utilizou procedimentos
sendo ela algo de decisão relativamente distintos que se complementaram, como
individual, e independente do ambiente as pesquisas de natureza bibliográfica,
entorno em favor de outra concepção, que documental, a pesquisa-participante e a
é a da inovação como decorrente de pesquisa-ação, uma vez que um dos
atores inseridos em diferentes redes e autores é um profissional da área. Esta
vivenciando variadas práticas última, a pesquisa-ação, dá ao trabalho
institucionais. um caráter também experimental – não
Assim, dependendo da abordagem no sentido laboratorial propriamente dito,
usada nesse tipo de estudo, o ambiente a e sim num sentido de “pesquisa de
considerar pode ter extensão maior ou campo” sobre certos aspectos setoriais.
menor. Em geral se deve partir das A investigação possui as seguintes
interações mínimas, aquelas que características: o suporte conceitual
caracterizam o sistema segundo as ações através da noção de sistemas de inovação;
dos protagonistas mais diretamente a abordagem por “estudo de caso”;
envolvidos com as especificidades verificação da hipótese se existe, ou não,
técnicas do processo de inovação. A partir no Brasil, um sistema setorial de
daí, num segundo estágio, adentra-se as inovação e produção em pavimentação
considerações sobre a vasta gama de rodoviária com asfalto. Adicionalmente,
influências, atuando no processo da quanto à abordagem, coleta e análise das
inovação, e oriundas dos diversos agentes evidências, busca-se no trabalho adaptar e
econômicos. A abordagem dos SI-s tem o utilizar a metodologia desenvolvida pelo
mérito de permitir sair da exclusiva visão Projeto-ESSY, a seguir descrita: ESSY
da mudança técnica (technical change), Project – Sectoral Systems in Europe
manifesta de maneira quase que (innovation, competitiveness and
autônoma do resto da economia, em prol growth).
da reintegração do processo da inovação O método do Projeto-ESSY
dentro da economia e da sociedade. O analisa tanto as interações dos atores
conceito vivenciou certa notoriedade estreitamente vinculados às
junto às instâncias econômicas dos transformações técnicas do processo de
países, e junto aos organismos inovação quanto trata do espectro mais
internacionais, notadamente a OCDE e a amplo das influências exercidas pelos
Comissão Européia o utilizaram para demais agentes econômicos e sociais. O
orientar suas políticas de inovação. Ao Projeto envolveu dez grupos de pesquisa
longo da sua evolução o conceito de SIs em sete países europeus, e analisou, entre
cresceu sob influências variadas, de 1999 e 2001, o setor de serviços (entre
origem na economia e na sociologia: os eles especialmente o serviço
estudos da mudança técnica; a teoria do aeroportuário londrino), o de software, o
crescimento; a teoria das organizações; a de equipamentos e serviços de
análise comparativa dos capitalismos; etc. telecomunicações, o de biotecnologia e
(Amable, 2001). fármacos, o de máquinas ferramentas, e
também o setor de produtos químicos. As
3. METODOLOGIA pesquisas foram coordenadas pelo
pesquisador Franco Malerba, da
Universidade de Bocconi, situada em
Em termos gerais a investigação Milão, na Itália. Este projeto visou
em curso está sendo conduzida através do fornecer um conjunto amplo de
método fenomenológico, buscando-se a benefícios aos formuladores de políticas
descrição do setor examinado tal como públicas, às firmas, às organizações não
ele é empiricamente observado. A empresariais e aos pesquisadores
abordagem empregada é qualitativa, acadêmicos.
4
Os produtos visados foram: (a) industriais específicos. Por exemplo, as
entendimento profundo dos processos que firmas empreiteiras, as concessionárias,
são determinantes para obtenção e as projetistas e as firmas de consultoria,
sustentação da inovação, para a vantagem no setor de pavimentação rodoviária,
competitiva nacional e para a liderança também são partes do setor de construção
internacional – em relação à geração e civil; assim como as firmas fabricantes de
difusão de conhecimento e de novas usinas de asfalto e vibroacabadoras, estão
tecnologias no nível setorial; (b) melhor presentes como segmentos do setor de
conhecimento sobre as diferenças máquinas e equipamentos; e há no setor
setoriais, e o papel destas diferenças para de pavimentação um fornecedor de
o desenvolvimento econômico europeu; grande porte que, essencialmente, é uma
(c) profundo entendimento das interações empresa do setor de refino petrolífero, a
e da coevolução, em termos específicos Petrobras, detentora de várias refinarias
de cada setor, entre firmas e organizações produtoras de asfalto, e cujas instalações
não empresariais – tais como e dinâmica operacional aproximam-se do
universidades, mercado de trabalho e perfil da firmas do setor químico.
organizações financeiras; (d) comparação No caso da pavimentação
explícita dos setores europeus rodoviária, a investigação à semelhança
examinados com seus equivalentes do que foi realizado nas investigações
japoneses e americanos. européias do projeto ESSY, pretende
Esses produtos acima foram entender o papel das organizações não
considerados aqueles capazes de permitir empresarias (as “não-firmas”, como
aos formuladores de políticas realizarem: universidades, institutos de pesquisa,
(1) a definição de diferentes níveis de agências, autarquias, associações, etc.) e
intervenção (no escopo regional, no o papel das demandas brasileiras sobre o
nacional, ou no europeu); e (2) a setor, demandas essas com características
definição de ferramentas apropriadas e especificidades locais, e
(infraestruturas, treinamentos, conseqüentemente entender como esses
financiamentos de iniciativas de pesquisa fatores afetam o processo de coevolução
e desenvolvimento, direitos de entre a tecnologia da pavimentação
propriedade intelectual, proteção de brasileira, a organização e estratégia das
mercado, formas de cooperação, alianças firmas dos diversos segmentos setoriais, e
tecnológicas, etc.) para o crescimento e as práticas institucionais vigentes neste
competitividade dos diferentes sistemas setor, no Brasil.
setoriais. (Malerba, 2002b). O estudo, analogamente ao
preconizado no projeto ESSY, busca
4. PAVIMENTAÇÃO COM questionar as diversas características
setoriais relevantes à inovação. Foram
ASFALTO examinadas evidências sobre aspectos
ligados ao chamado “determinismo
Os setores analisados pelos tecnológico”, e ao perfil geral das
europeus foram setores relativamente práticas institucionais do setor, aspectos
mais intensivos em tecnologia que o caso esses considerados chaves para o
da pavimentação aqui estudado. crescimento e competitividade setorial.
Entretanto, não é prudente minimizar o Através de evidências (pesquisa
valor estratégico da questão rodoviária, bibliográfica e documental, pesquisa-
seja no contexto brasileiro em particular, ação, pesquisa participante),
ou seu valor geral para os países em vias preliminarmente foi levantado “o perfil
de desenvolvimento. No setor aqui da demanda setorial existente, e a
estudado foram identificados alguns qualidade do atendimento atual a esta
“subsetores” internos ao sistema de demanda”, e em seguida, foram
inovação e produção que podem ser investigados os seguintes tópicos: (i)
considerados estando simultaneamente Base de conhecimento e processo de
presentes como partes de outros setores aprendizado; (ii) Empresas (firmas),
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organizações não-empresariais, redes e governos estaduais ou do governo federal
instituições; (iii) Dinâmica setorial de para recuperar e conservar trechos de
longo prazo e processos coevolutivos; rodovias. O segundo sub-bloco (3B) é o
(iv) Políticas públicas; (v) Fronteiras composto por empresas projetistas e por
geográficas; (vi) Desempenho empresas de consultoria. Aparentemente
internacional. trata-se de um grupo estratégico para o
processo de inovação setorial. As firmas
5. REPRESENTAÇÃO de projeto em geral atuam nas diversas
regiões do País, e às vezes também no
SETORIAL NO BRASIL exterior (predominantemente na América
Latina e na África, em apoio aos seus
Para possibilitar interpretar as clientes construtores rodoviários atuando
funções dos diferentes agentes setoriais, nesses mercados). Elas possuem clientes
eles foram agrupados em seis grandes tanto na área pública quanto na privada,
“blocos”. O primeiro bloco (1º bloco) da pois atendem aos departamentos
representação setorial se refere aos atores estaduais, e ao departamento nacional,
responsáveis pelo fornecimento do asfalto responsáveis pelas estradas de rodagem,
propriamente dito. A concentração assim como às empresas concessionárias
empresarial e a pulverização produtiva de rodovias. De forma similar, as
regional desse bloco é bem característica. empresas de consultoria, embora sendo
Nele há uma empresa atuante, a empresas de menor porte comparadas às
Petrobras, com unidades produtoras de “projetistas”, também atendem ao mesmo
asfalto – “um conjunto de refinarias de conjunto de clientes. O terceiro sub-bloco
petróleo pertencentes a essa única (3C) é o das firmas que se dedicam à
empresa”. A Petrobras atua desde a construção e recuperação rodoviária.
exploração do petróleo, até o seu refino Estas empresas também estão fortemente
final – etapa última esta na qual se produz enviesadas para o atendimento aos
o produto utilizado na pavimentação empreendimentos públicos: elas são em
rodoviária, o asfalto. O segundo bloco (2º geral contratadas pelos órgãos públicos
bloco) da representação são os agentes responsáveis pelas estradas de rodagem,
que compram o asfalto da empresa visando à execução das atividades
produtora, e o vendem no mercado operacionais de construção e preservação
consumidor. Essas diversas empresas são de vias. Eventualmente elas atendem
as chamadas “distribuidoras”. As também demandas, da mesma natureza,
distribuidoras de asfalto gradativamente das empresas concessionárias. Neste
ocuparam alguns nichos de produção, terceiro bloco, o quarto sub-bloco (3D)
como a produção e a venda de emulsões identificado é o referente às firmas
de asfalto e, também, a produção e fabricantes de máquinas e equipamentos
comercialização de asfaltos modificados para pavimentação rodoviária com
por polímeros ou por elastômeros. asfalto, especialmente os fabricantes das
O terceiro bloco (3º bloco) usinas de asfalto, vibroacabadoras, rolos
considerado no estudo é o que agrupa as de compactação, e máquinas de fresa que
diferentes firmas que estão mais são usadas na reciclagem de asfalto.
diretamente ligadas às operações de O quarto bloco (4º bloco) de
pavimentação. Devido seu grau de atores do setor é o composto pelas
heterogeneidade, este terceiro bloco foi universidades. Este conjunto de atores no
subdividido em quatro sub-blocos. O caso brasileiro aparentemente vem
primeiro sub-bloco (3A) é o das empresas apresentando um interessante potencial
concessionárias de rodovias. Elas em de contribuição para as transformações
geral estão também presentes no setor de setoriais necessárias, seja na formação de
engenharia civil, no segmento de recursos humanos para atuação na
construção “pesada”, realizando obras engenharia rodoviária nacional, ou pelas
rodoviárias. Tais empresas são aquelas atividades de pesquisa e
que conseguiram obter concessões dos desenvolvimento, ora em curso na área de
6
pavimentação. O quinto bloco (5º bloco) construção disponíveis para tais serviços.
é o dos institutos de pesquisa e Gradativamente tais funções operacionais
desenvolvimento tecnológico. No caso do foram sendo desativadas, estando hoje
Brasil dois atores ficam evidenciados: o praticamente extintas. Esses
Instituto de Pesquisas Rodoviárias – IPR, departamentos agora se dedicam à
do Departamento Nacional de contratação e fiscalização destes serviços,
Infraestrutura de Transportes – DNIT, e o e estabelecem os critérios técnicos a
Centro de Pesquisas da Petrobras – serem praticados pelas firmas de projeto,
CENPES. Podem ser citados também o e pelas firmas que realizam as obras.
Instituto de Pesquisas Tecnológicas – Há certos atores que não estão
IPT, do Estado de São Paulo, de atuação presentes em nenhum destes seis blocos
local, e o Centro de Tecnologia Mineral – descritos. Eles podem ser considerados
CETEM, este último no âmbito federal, e como sendo atores relativamente
com atuação junto aos produtores de externos, ao setor. No entanto, estes
agregados (britas usadas na produção do agentes externos podem exercer, em
concreto asfáltico). O sexto bloco (6º determinados períodos, relevante
bloco) é o das autarquias e órgãos da influência na dinâmica setorial,
administração direta. Essas organizações relativamente ao processo de geração de
apresentam algumas especificidades inovações. Essa influência pode ser no
importantes que as caracterizam. Uma sentido tanto de promover
dessas especificidades se refere à própria transformações, quanto de obstruí-las ou
função desses órgãos governamentais, retardá-las. Um destes atores “externos”
como responsáveis por gerir ou aplicar os pode ser o próprio governo federal, por
investimentos públicos na construção e exemplo, através dos investimentos do
na preservação geral das vias rodoviárias. PAC, o Programa de Aceleração do
Tal responsabilidade desdobra-se nos três Crescimento, coordenado pelo Ministério
níveis governamentais – o federal, o da Casa Civil. Outro exemplo seria o
estadual e o municipal. Tribunal de Contas da União – TCU, nas
Há um aspecto importante da suas auditorias e intervenções em obras
problemática em foco que está deste mesmo PAC; outro exemplo, o
estreitamente vinculado aos papéis dos Exército Brasileiro, auxiliando na
atores do sexto bloco (DNIT, DERs, construção de estradas estratégicas; ou a
Secretarias e/ou Empresas Municipais de Confederação Nacional dos Transportes –
Obras). O DNIT é a organização criada CNT, avaliando anualmente o estado das
após a extinção do Departamento rodovias; ainda pode-se apontar entre
Nacional de Estradas de Rodagem – estes agentes externos, a Mídia,
DNER, porém também com comunicando as expectativas da
responsabilidades sobre outros modais de sociedade em relação à malha rodoviária
transporte. Esses atores intermedeiam, (críticas, reportagens, etc.); outro ator é o
por um lado, a demanda da sociedade Banco Nacional de Desenvolvimento
pela infraestrutura rodoviária e, por outro, Econômico e Social – BNDES, com
a oferta de bens, insumos e serviços de eventuais programas de financiamento
diferentes ramos industriais que atuam na aos agentes do setor.
construção e preservação das rodovias.
Ou seja, os departamentos e secretarias 6. RESULTADOS
de governo (autarquias) afeitas a esta
atividade são os principais gestores dos
sistemas de vias rodoviárias distribuídas Abaixo são relatados os resultados
no território nacional. Quando os da presente pesquisa segundo os tópicos
departamentos estaduais de estradas de preconizados pelo Projeto ESSY,
rodagem foram criados, no passado, eles adaptado às condições locais.
atuavam diretamente nas operações de
construção e manutenção das rodovias, 6.1. PAVIMENTAÇÃO:
pois inicialmente não havia firmas de DEMANDA E PERFIL
7
Em 2010, a “velocidade devido ao
Qualquer setor industrial ou de pavimento” e o “pavimento do
serviços existe visando o atendimento a acostamento” resultaram favoráveis: 89%
determinada demanda. As demandas dos acostamentos da extensão total
sobre os setores tendem a variar com o pesquisada estavam pavimentados e
tempo, exigindo, por parte destes, perfeitos, e 97% da extensão pesquisada
adaptações. A principal percepção hoje não exigiam redução da velocidade em
existente sobre o nível de adequação do função do pavimento. Quanto à superfície
modal rodoviário no Brasil é a pesquisa do pavimento, evidenciou-se que 39.935
realizada anualmente pelo setor quilômetros (43,9% da extensão total)
transportador. A CNT desde 1995 vem estavam perfeitos. Isso significa que
realizando pesquisa qualitativa sobre a existia adequada regularidade superficial
situação rodoviária, contemplando as no pavimento e não se percebia nenhum
principais rodovias nas quais trafegam tipo de trepidação do veículo durante o
significativa parcela da produção agrícola deslocamento. Este exame da superfície
e industrial brasileira. do pavimento na metodologia de pesquisa
A evolução da situação dessa da CNT usa por referências: o “Manual
malha ao longo da década dos anos 2000 de Identificação de Defeitos” – MID para
sinaliza a dificuldade do setor em ofertar revestimentos asfálticos; e a Norma
seu produto no nível qualitativo que lhe é 009/2003 – PRO. São documentos
demandado. Em 2010, o resultado geral elaborados pelo DNIT, e estabelecem
da parcela pesquisada que apresentou critérios de avaliação subjetiva de
como situação a característica “boa” ou pavimentos, não pressupondo
“ótima”, foi de 41,2%, resultado inferior obrigatoriedade do uso de equipamentos
ao nível verificado entre 2003-2007. É de aferição, sendo, portanto, tal
necessário, no entanto, entender o critério identificação feita segundo a percepção
desta avaliação. A situação geral das do usuário ao trafegar pela via. Já 51.010
rodovias, a cada ano, é a composição das quilômetros (correspondendo a 56,1% da
situações dos seus “pavimentos”, extensão pesquisada) necessitavam de
“sinalizações” e “geometrias”. A situação algum tipo de intervenção na “superfície
dos pavimentos é de especial interesse ao do pavimento”. Havia 28.278 quilômetros
presente estudo. A pesquisa CNT (32,2% da extensão) com o pavimento
examina três variáveis dos pavimentos: apresentando sinais de desgaste,
(1ª) condição da superfície; (2ª) conseguia-se perceber irregularidades
velocidade possível de praticar devido o superficiais, mas ainda não havia
pavimento; e (3ª) estado do acostamento. buracos. Outros 18.026 quilômetros
A avaliação baseia-se na “ocorrência” ou (19,8% da extensão) apresentavam
“predominância” das evidências trincas em malha ou remendos no
encontradas. A “ocorrência” de uma pavimento, gerando trepidação no interior
variável significa a presença de uma do veículo, mas ainda não havia presença
situação pontual, enquanto sua de buracos. Evidenciou-se 18.026
“predominância” significa incidência de quilômetros (3,2% da extensão)
determinado aspecto em mais da metade apresentando afundamentos e (ou)
do trecho examinado (cada unidade de ondulações causadas pela infiltração de
pesquisa é, no máximo, de dez água, ou causadas pela deflexão gerada
quilômetros de rodovia). pelo tráfego de veículos e (ou) por
Os 90.945 quilômetros analisados buracos. E havia 788 quilômetros (0,9%
em 2010 corresponderam a 42% da malha da extensão) totalmente destruídos, ou
rodoviária brasileira pavimentada, se for seja, o pavimento apresentava elevada
considerado que esta malha, segundo o ocorrência de buracos ou ruína total,
Anuário Estatístico 2009 (referente aos podendo obrigar à redução de velocidade
dados do ano de 2008) era cerca de do veículo. (CNT, 2010).
218.000 quilômetros. O Brasil apresenta defasagem
negativa, entre 40 e 45%, na sua
8
pavimentação, ao compará-lo à média resistência necessários. Em termos locais,
mundial e ao percentual da malha o dimensionamento da espessura de
pavimentada dos EUA. Não significa isso reforço (Hr) em rodovias de tráfego
afirmar que ao pavimentar as regiões hoje pesado, nos casos que a espessura do
com malhas rodoviárias mal estruturadas, revestimento “hr” é tal que hr ≥ 10
os contrastes regionais serão centímetros, vem sendo preconizado
automaticamente revertidos. No entanto, usando como deflexão admissível (Dadm),
o exemplo próximo do estado de São aquela calculada por: log(Dadm)=3,148–
Paulo, pela sua trajetória histórica ao 0,188.log(Nf), (DNIT, 2006, p.159:
longo do Século XX, e pelo desempenho Manual de Restauração de Pavimentos
regional que hoje apresenta, indica que a Asfálticos, sendo Nf, a “vida de fadiga”).
opção de garantir porte e qualidade ao Em tais circunstâncias tal deflexão
referido modal, foi fator que deveria ser dimensionada por
significativamente contribuiu para o log(Dadm)=3,479–0,289.log(Nf). (Medina,
crescimento estadual. A malha rodoviária 2005: “Mecânica dos Pavimentos”;
paulista favoreceu o Estado interligar e UFRJ).
integrar suas regiões, produzir e crescer.
Existe, portanto, enorme potencial para 6.2. CONHECIMENTO E
promover investimentos na pavimentação
regional, em todo País. Há, aí, APRENDIZADO
especialmente ao computar as dimensões
territoriais envolvidas no caso brasileiro, Em termos acadêmicos, foi
a possibilidade de ganhos de escala. Isso observado que já estão disponíveis no
pode ser um facilitador para promover a País significativos recursos e
eficiência da cadeia produtiva do setor competências para pesquisas de campo e
brasileiro de pavimentação, como um laboratoriais, e há relevante literatura
todo. técnica brasileira, atualizada, em
Além da defasagem quantitativa, engenharia de pavimentação. São
acima apontada, no nível atual de resultados decorrentes da ação do Fundo
pavimentação brasileira em relação ao Nacional de Desenvolvimento Científico
contexto internacional de referência, faz- e Tecnológico – FNDCT, Conselho
se necessário, no caso local, especial Nacional de Pesquisa – CNPq,
atenção também ao aspecto qualitativo. Coordenação de Aperfeiçoamento de
Assim como ocorre no Exterior, Pessoal de Nível Superior – CAPES,
internamente no País está havendo a Financiadora de Estudos e Projetos –
passagem para configurações de tráfegos FINEP e Fundações Estaduais de Amparo
e cargas cada vez mais severos. As a Pesquisa, ao longo das últimas décadas.
rodovias, adicionalmente, ainda são Essas competências nacionais referentes
pouco fiscalizadas. A pesquisa identificou ao domínio científico e tecnológico do
evidências de níveis de solicitação, pelos conhecimento em pavimentação asfáltica
usuários brasileiros, mais intensos que os estão em processo de expansão regional
verificados na Europa e Estados Unidos. (ação da rede específica, da Petrobras, no
A tonelagem média anual, por quilômetro tema asfalto). Isso foi evidenciado no
de rodovia, no Brasil, de 2.248.(*), sendo exemplo dos ativos intelectuais existentes
(*) = (Toneladas . Km / Km . na USP (seus laboratórios de mecânica
pavimentado), é bem superior à mesma dos pavimentos e de tecnologia da
taxa de utilização nos Estados Unidos, pavimentação), no Departamento de
296.(*), Japão, 319.(*), Alemanha, 342. Engenharia de Transportes, e ativos
(*), Reino Unido, 385.(*), França, 195. similares existentes na Universidade
(*), Itália, 585.(*) e Espanha, 625.(*). Federal do Rio de Janeiro – UFRJ,
(Schroeder, 1996). Outras evidências Universidade Federal do Rio Grande do
ainda indicam padrões de projetos que Sul – UFRGS e Universidade Federal do
dimensionam as estruturas dos Ceará – UFC.
pavimentos aquém dos níveis de
9
Sob o outro aspecto do 6.3. EMPRESAS,
conhecimento, no domínio da inteligência
de campo, as firmas concessionárias vêm ORGANIZAÇÕES NÃO-
adotando e influenciando a adoção pelos EMPRESARIAIS, REDES E
demais agentes, dos asfaltos modificados “INSTITUIÇÕES”
por borracha ou por outros polímeros,
como o Estireno Butadieno Estireno –
SBS, e o Etileno Acetato de Vinila – Neste Setor, as firmas podem ter
EVA, que são classificados como diferentes funções: há uma petrolífera
elastômeros termoplásticos: em baixas (com suas refinarias produtoras de
temperaturas têm comportamento elástico asfaltos) e as distribuidoras (produção de
e nas altas seu comportamento é asfaltos modificados e emulsões
termoplástico, constituindo-se ambos em asfálticas) que exercem papéis
fontes de inovações. Esses tipos de estreitamente vinculados; e o outro
asfaltos apresentam maior resistência conjunto de firmas (concessionárias,
tanto à ocorrência de deformação projetistas/consultoras, empreiteiras e
permanente quanto à fadiga, sendo fabricantes de usinas e máquinas de
usados na Europa e nos EUA em pavimentação) que exerce papel central
intensidade maior que o consumo na construção e conservação dos
brasileiro. As distribuidoras prestam pavimentos rodoviários.
importante apoio na introdução dessas Este segundo grupo de firmas
inovações com os modificados, e noutras (citado anteriormente como “3º bloco”)
relativas às emulsões, através de representa as firmas com funções
acompanhamento e assistência técnica. complementares, desde a elaboração do
As condições cambiantes de utilização projeto até a execução final da
das vias, relativas aos esforços crescentes pavimentação, além da gestão e
sobre os pavimentos, pressionam pela conservação de rodovias concedidas, e a
seleção e produção de asfaltos mais fabricação e fornecimento de usinas,
apropriados, que sejam mais duros, e máquinas e equipamentos. São firmas,
obviamente pela adoção de projetos em maior ou menor grau, que absorvem
estruturais compatíveis com os presentes conhecimento para produzir e inovar
níveis de solicitação das cargas. Ao serviços e bens para o modal, conforme
utilizar misturas com esses asfaltos mais suas habilidades acumuladas no tempo.
resistentes, há necessidade também de As firmas empreiteiras sofreram os
adequar os equipamentos e os próprios efeitos nefastos das rupturas e
parâmetros operacionais empregados. descontinuidades da demanda, ocorridas
Faz-se necessário, entretanto, algumas nas décadas de 1980 e 1990. O
adaptações operacionais, seja nos fortalecimento e acúmulo de suas
procedimentos com equipamentos de competências foram obstruídos, em
pavimentação, seja nas usinas de asfalto. conseqüência das incertezas originadas a
No ponto de vista dos fabricantes das partir de períodos de inadimplência dos
usinas e equipamentos, há que se investir, órgãos públicos com as mesmas. Essas
sistematicamente, na capacitação de firmas conseqüentemente enfrentaram
pessoal, especializando operadores para dificuldades na capacitação e retenção de
usinas automatizadas, pois para estas, as pessoal qualificado, e por decorrência,
habilidades e conhecimentos necessários dificuldades no controle tecnológico das
à operação das usinas tradicionais não são suas operações nas usinas de asfalto e nas
suficientes. Mesmo nas usinas obras. Paralelamente, houve redução das
tradicionais em operação no Brasil, para suas iniciativas para renovação do
os fabricantes, há evidências de que é maquinário (usinas de asfalto e
preciso se estabelecer um maior nível de vibroacabadoras), além de se buscar
qualificação dos operadores. especificá-lo no sentido de reduzir o
custo final de aquisição, via
simplificações que gradativamente
10
afastaram o fornecimento local do padrão dessas especificações e métodos, no
praticado pelos fabricantes nos âmbito das obras e das atividades
fornecimentos voltados para a conduzidas pelos agentes públicos
exportação. Esse conjunto de federais, estaduais, municipais, e pelos
adversidades implicou em queda do agentes privados, as construtoras e
desempenho dos serviços e em redução concessionárias já descritas. Outra faceta
da sua capacidade de perceber e setorial a considerar é a ação
promover as inovações necessárias. investigatória do Tribunal de Contas da
Cabe observar que o papel das União referente às licitações e às obras
autarquias e dos órgãos da administração rodoviárias em andamento, e ações de
direta tem relevante influência no intervenção dele sobre as mesmas, com
processo de aprendizado destas firmas eventuais ou freqüentes paralisações de
(ou “daquilo” que elas efetivamente obras. No que tange ao balanço entre o
produzem, aprendem e inovam). Estes custo e o benefício, obviamente não há
“atores” (anteriormente citados como “6º que se questionar o mérito das
bloco”) definem, aprovam ou validam os investigações: cabe ao TCU
projetos e as práticas de execução, legitimamente investigar qualquer indício
através de contratos e posterior de irregularidade. Mas, também de forma
fiscalização. Daí resulta o tipo de legítima, há questionamentos em curso
pavimentação que é de fato realizada. Se por diversos agentes setoriais (firmas,
esses órgãos e autarquias são capacitados DNIT, e o próprio Governo Federal)
e fortalecidos em seus papéis, a sobre os métodos e critérios praticados, e
probabilidade de resultados satisfatórios, principalmente quanto aos efeitos
tais como produção com qualidade, prejudiciais dessas ações do TCU à
aprendizado acumulado e inovação, pelos sociedade, quando geram a
três conjuntos de firmas (1º, 2º e 3º descontinuidade de obras em
blocos) será maior, caso contrário, empreendimentos relevantes.
provavelmente menor. A situação Há também outros tipos
configurada, no entanto, é de relevantes de ações institucionais, como
enfraquecimento destes órgãos, com os programas de fomento à pesquisa
sinais recentes de reversão do quadro científica e tecnológica e à inovação: os
vigente a partir de 2005. programas da FINEP, como as redes
Há várias práticas institucionais – cooperativas no âmbito do fundo setorial
formais e informais – importantes na de financiamento de ciência e tecnologia
operação geral do Setor. Além dos para o setor petrolífero (CT-Petro),
aspectos acima mencionados (funções e operacionalizado pela FINEP com apoio
disfunções das autarquias), cabe apontar da ANP, e que utiliza metodologias
os agentes que formulam e aprovam: iniciadas pelo Programa de
especificações de asfalto (Instituto Desenvolvimento das Engenharias –
Brasileiro de Asfalto – IBP; Associação PRODENGE; e os instrumentos de
Brasileira de Normas Técnicas – ABNT; financiamento do BNDES, gerais ou
Agência do Petróleo, Gás e específicos, servindo ao setor de
Biocombustíveis – ANP); métodos de pavimentação rodoviária.
ensaio e especificações de serviços para Outros agentes são os próprios
obras rodoviárias (DNIT, coordenadas usuários das vias, com demandas
pelo seu Instituto de Pesquisas refletidas nas avaliações anuais sobre a
Rodoviárias, que preserva também o condição da malha rodoviária nacional,
acervo gerado pelo antigo DNER); os que feitas pela CNT, e os desdobramentos e
adaptam e adotam tais normas efeitos individuais e coletivos dessas
(Departamentos Estaduais de Estradas de avaliações. Alguns agentes setoriais
Rodagem, Secretarias Municipais de descritos nos agrupamentos (blocos)
Obras, ou as Empresas Municipais de anteriores adicionalmente se unem
Obras em alguns casos). Cabe observar através de coalizões, parcerias, etc. Estas
se são adequadas ou não, e o uso prático associações podem ocorrer entre agentes
11
similares, como a Associação Brasileira chamados Centros e Redes de Excelência
de Empresas Distribuidoras de Asfalto – buscava agregar empresas, órgãos
ABEDA, ou entre agentes heterogêneos, governamentais, universidades, institutos
como a Associação Brasileira de de pesquisa para ações empresarias,
Pavimentação – ABPv. A ABEDA, a institucionais, tecnológicas e científicas
Associação Brasileira de Concessionárias em torno de temas relevantes,
de Rodovias – ABCR, a Associação considerados como de interesse para o
Nacional de Empresas de Obras conjunto de atores envolvidos – o tema
Rodoviárias – ANEOR atuam de forma “asfalto” foi um dos temas desenvolvidos
similar, visando politicamente defender no Projeto), em aplicações de recursos do
os interesses das suas firmas. Algumas Fundo Setorial do Petróleo e Gás – CT-
iniciativas e articulações destas Petro, em aplicações dos recursos das
associações vêm influenciando na adoção “Participações Especiais” (parcela dos
gradativa de asfaltos mais resistentes no royaltes referentes aos campos
País. Associações entre agentes não petrolíferos de alta produção, usados para
similares, como a ABPV e a Comissão de a criação e desenvolvimento de redes
Asfalto do IBP, por outro lado, através de temáticas de pesquisa cooperativa, entre
cursos, eventos, grupos de trabalho, etc., elas a “Rede Temática de Asfalto”), no
vêm desempenhando função relevante na programa “Proasfalto” para capacitação
interação setorial. Há também de professores da graduação, para
convergências de atores: as reuniões da fortalecimento das disciplinas de
Associação Brasileira dos Departamentos pavimentação nas universidades
de Estradas de Rodagem – ABDER; e as brasileiras, financiado e apoiado pela
reuniões e workshops de avaliação anual Petrobras em parceria com a Associação
da produção de asfalto, promovidos pela Brasileira de Empresas Distribuidoras de
Petrobras, contando com a participação Asfalto, e elaborado pelos professores da
de representantes de autarquias federais, USP, UFRJ, UFRGS e UFC, e na criação
estaduais, municipais, associações, do “Instituto Pavimentar” (o Instituto
empresas e universidades. Pavimentar é um programa de
treinamento da Petrobras, também em
6.4. DINÂMICA SETORIAL parceria com a ABEDA, direcionado à
qualificação técnica do pessoal envolvido
E COEVOLUÇÃO com as operações das usinas de asfalto e
das máquinas e equipamentos de
Ao longo das décadas de 1990 e pavimentação).
2000, relativamente às pesquisas em O aspecto singular, nesse
pavimentação com asfalto, foi possível se particular, é que o apoio da Petrobras
estruturar, científica e tecnologicamente, embora importante, teve papel parcial,
significativo número de universidades não cobrindo importantes lacunas
brasileiras. Atualmente elas dispõem dos existentes no contexto institucional do
meios necessários às suas atividades Setor. Em países desenvolvidos, tal apoio
laboratoriais, e promovem pesquisas ao é predominantemente dado pelos próprios
nível do que está sendo realizado nos órgãos rodoviários governamentais, o que
países mais desenvolvidos. Isso em parte facilita incorporar conhecimento (difusão
foi reforçado pelo suporte financeiro e das inovações) em tais órgãos, e
empresarial da petrolífera estatal conseqüentemente nas firmas que lhes
brasileira – a Petrobras – iniciado nos fornecem bens e serviços.
anos 80 e 90, e especialmente na década O DNIT e os DERs, portanto,
dos anos 2000. Este apoio ao setor de seriam os principais clientes das citadas
pavimentação foi traduzido: em contratos pesquisas. Mas no contexto setorial atual,
tradicionais para pesquisas, na criação do eles não se equivalem, em termos do
CEASF, o Centro de Excelência em processo de inovação e nas interações
Asfalto (o projeto estratégico da científicas e tecnológicas com
Petrobras para desenvolvimento dos universidades locais, ao papel dos seus
12
congêneres internacionais. Agentes gaúcha foi adquirida por empresários
acadêmicos que atuam no setor alemães, tornando-se a CIBER
demonstram preocupações quanto à Equipamentos Rodoviários. Ainda nessa
manutenção e contínuo fortalecimento década de 1980 o mesmo empreendedor
dos grupos de pesquisa (Soares, 2009). criou uma nova empresa, denominada
Ou seja, diferentemente do que ocorre no CIFALI, que construiu, no País, as usinas
Brasil, nos países desenvolvidos tais do tipo “a tambor”, além de introduzir
grupos são suportados principalmente tecnologias então recentes, como as
com financiamentos oriundos de usinas de asfalto montadas sobre um
entidades que corresponderiam aos único chassi. Estas últimas permitiam
departamentos brasileiros, federais ou maior mobilidade, e eram dotadas de
estaduais, responsáveis pela infra- sistema de automação, além de processo
estrutura rodoviária: equivalentes aos de filtragem, por filtro de mangas. Em
DNIT e DERs. As várias iniciativas 2000 a então CIFALI foi adquirida por
conduzidas pela Petrobras outra multinacional, desta feita norte-
(financiamentos de P&D, Ceasf, americana, a TEREX. Na década de 2000
Proasfalto, Instituto Pavimentar, Rede surgiria um terceiro fabricante na região,
Temática, etc.) indubitavelmente a TICEL, liderada por antigos
auxiliaram a pavimentação rodoviária funcionários da CIFALI. Inicialmente
nacional, e amenizaram em parte os eles apenas reformavam antigas usinas de
efeitos adversos sofridos pelo setor nas asfalto, mas as oportunidades então
últimas décadas. O desmonte do setor disponíveis (encomendas e oferta de
público nos anos 80 induziu o que se capital pelos próprios clientes) fizeram
poderia chamar de “coevolução não que fundassem essa empresa e,
virtuosa” dos condicionantes produtivos: gradativamente, iniciassem seu processo
desatualização dos padrões técnicos, de crescimento e exportação de
desmobilização das firmas empreiteiras e equipamentos (fonte: relato direto do
seus profissionais, distanciamento destes empreendedor, a um dos autores, em
órgãos das atividades de cooperação visita às instalações da TICEL em 2008).
técnica com pesquisadores dos Foi possível constatar durante as reuniões
laboratórios das universidades. Entretanto com os fabricantes, em 2008, haver
o fato novo, de natureza intensamente significativa mobilidade de profissionais
transformadora, que ressalta entre essas três empresas, (CIBER,
setorialmente, é o advento do Programa TEREX e TICEL). A capacidade de criar
de Aceleração do Crescimento. Sob a e recriar empresas fabricantes de usinas
ótica petrolífera, a maior evidência do de asfalto e vibroacabadoras, no Rio
potencial e efetividade do PAC foi se Grande do Sul, indica que existe
elevar o consumo de asfalto no País, relevante capacidade de retenção dessas
próximo a 1,5 milhões em 2005, para competências no âmbito regional. Essas
cerca de 3,0 milhões de toneladas anuais, empresas, especialmente as duas mais
em 2010. antigas, estabeleceram uma vasta rede de
Na década de 1960 um distribuidores e de assistência técnica
empreendedor local, empreiteiro, no Rio (fornecimento de itens de reposição) nas
Grande do Sul, construiu a primeira usina várias regiões do País: a dinâmica
brasileira do tipo conhecido como industrial neste segmento, entre os
“gravimétrica”. Ele fundou então uma municípios gaúchos de Canoas e Caxias
firma para explorar esse mercado, e de Sul, inclusive já habituado a exportar
passou a concorrer com a empresa para a África e América Latina parte da
estadunidense Barber-Greene, que havia sua produção, gerou um verdadeiro
se instalado em São Paulo. Em parceria aglomerado de competências, traduzido
com a Mitsubishi Heavy Industries, na produção e inovação deste tipo de
parceria que duraria pouco tempo, a firma maquinário.
local iniciou a fabricar também
vibroacabadoras. Nos anos 80 a firma
13
6.5. POLÍTICAS R$ 174 milhões investimentos em
rodovias em SP”. [2] Site do BNDES,
PÚBLICAS postado em 13/10/2009 (acesso
eletrônico em 23/06/2010): “BNDES e
O caso da pavimentação aponta IFC apóiam expansão de rodovias
para inequívoca importância do papel das federais”. [3] Valor Online, postado em
políticas públicas, pois a despeito do 14/05/2009 (acesso eletrônico em
paulatino crescimento das concessões 26/06/2010): “OHL receberá R$ 756
rodoviárias, a orientação de milhões do BNDES para investir em
investimentos para esse modal, assim rodovias”. O Banco tem financiado
como para os demais modais de empresas concessionárias vencedoras de
transporte, mesmo nos países já licitações de importantes trechos
desenvolvidos, historicamente conta com rodoviários federais e estaduais. Ele
a função central exercida por tais abriu, por exemplo, no período acima
políticas. citado, uma linha de crédito para
É notório que no País, por fatores pequenos e médios municípios
institucionais e históricos, o setor adquirirem equipamentos de
rodoviário prepondera como principal pavimentação rodoviária. Este programa
modal no transporte de cargas. As é denominado de “PROVIAS”: [4] Site
questões centrais relativas às políticas do BNDES (www.bndespar.gov.br;
públicas, em transportes, hoje envolvem acesso eletrônico em 23/06/2010):
as seguintes vertentes: a recuperação e “Programa de Intervenções Viárias –
adequação da malha existente (ações ora PROVIAS, do BNDES”. Para as
em curso impulsionadas pelo PAC); a empresas de construção civil, grupo esse
expansão da malha (os investimentos no qual se enquadram as empreiteiras que
hoje necessários à recuperação inibem atendem ao DNIT, aos DERs e às
investir na rápida expansão das malhas Prefeituras, há agora todo um conjunto de
regionais); a mudança da matriz dos linhas de financiamento envolvendo: a
transportes (planejada no Plano Nacional aquisição de equipamentos usados
de Logística de Transporte – PNLT, fabricados no País (usinas de asfalto,
elaborado pelo Centro de Excelência em vibroacabadoras, veículos para operações
Transporte – CENTRAN, e já em curso de compactação de solos, etc.), o
inicial com a parcela dos recursos do tradicional financiamento de máquinas e
PAC hoje direcionada para os demais equipamentos novos, financiamento à
modais, especialmente para o ferroviário inovação, inclusive à estruturação de
e hidroviário) – sendo provável que o centros de pesquisa empresariais, e
estabelecimento de uma matriz mais financiamento à capacidade produtiva,
equilibrada corrija fenômenos (BNDES, 2009).
identificados na pesquisa, como No plano científico e tecnológico,
intensidade excessiva de utilização, e e da educação superior, o cenário é
sobrecarregas, nas principais rodovias. satisfatório comparativamente aos
Cumpre salientar que os órgãos públicos padrões internacionais. Entretanto, o
encarregados da execução das políticas pleno aproveitamento do conhecimento e
governamentais estão sujeitos às pressões potencial de inovação que emergem da
de interesses privados escusos. Cabe academia hoje é constrangido e
especial atenção no sentido de fortalecê- influenciado pelos efeitos negativos
los em suas atribuições, e resguardá-los decorrentes do enfraquecimento
de possíveis desvios. financeiro, operacional e técnico ocorrido
Evidências documentais recentes nos órgãos rodoviários públicos.
apontam diversos instrumentos do Portanto, torna-se necessário, para
BNDES para apoio à recuperação e coevolução de todo o setor, resgatar o
expansão da malha rodoviária, entre 2005 pleno papel institucional destes órgãos,
e 2010: [1] Revista Portuária, publicado além de fortalecer-lhes as capacitações, e
em 06/06/2008: “BNDES financia com
14
estimular que se integrem com as aglomeração, sendo que as variações
universidades. salariais entre regiões, determinadas pelas
ofertas e demandas de trabalho, pouco
6.6. FRONTEIRAS oscilam, e por isso os salários nominais
não preponderam na escolha que
GEOGRÁFICAS empreendedores fazem em onde vão
instalar suas novas fábricas,
O enfoque dado às fronteiras comparativamente às variações que
geográficas na investigação abordou, ocorrem na produtividade. (Azzoni e
inicialmente, as diferenças perceptíveis Ferreira; 1998).
entre regiões brasileiras, e as diferenças São Paulo entre todos os estados
especificamente estaduais, quanto ao brasileiros é detentor da maior extensão
desempenho da pavimentação. A pavimentada. São Paulo, Rio Grande do
comparação, com dados do DNIT, Sul, Rio de Janeiro, Minas Gerais e
mostrou vantagem logística no modal Paraná representam importantes
rodoviário para os Estados de São Paulo, referenciais para aos demais Estados. As
Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro, Minas interações cooperativas entre os setores
Gerais e Paraná. Isso evidencia haver regionais de pavimentação rodoviária –
neles maior potencial, atualmente, para de natureza comercial, operacional e
ampliação do desenvolvimento técnica – entre estas cinco unidades da
econômico regional. Por outro lado, federação, e as demais, podem favorecer
estudo referente às décadas de 1970 e a evolução das regiões hoje logística e
1980, e a primeira metade da década de economicamente defasadas.
1990, evidenciou a retomada da Em complemento aos aspectos
competitividade da área industrial regionais brasileiros, há outro, de cunho
tradicional, com São Paulo revertendo estratégico a considerar, que é o interesse
uma tendência declinante à concentração, brasileiro na integração econômica
observada até 1985, e também Minas sulamericana. Para tanto, avultam de
Gerais, destacando-se esses dois estados importância as ligações rodoviárias. Cabe
com os melhores níveis de ressaltar a iniciativa em curso, desde
competitividade para atração de 2000, para a Integração da Infraestrutura
empresas, entre as cinco regiões Regional Sulamericana – IIRSA,
analisadas. As regiões analisadas quanto envolvendo doze países do continente
ao nível de concentração industrial (Argentina, Bolívia, Brasil, Chile,
foram: Região Nordeste, Região Sul e os Colômbia, Equador, Guyana, Paraguay,
estados de Minas Gerais, São Paulo e Rio Peru, Suriname, Uruguay, Venezuela), na
de Janeiro. Os indicadores apontaram que qual importantes trechos rodoviários
a área industrial tradicional do país estava deverão ser disponibilizados.
recuperando sua qualificação regional Evidentemente, o Brasil tem um
para receber novos investimentos, tanto importante papel a desempenhar nessa
em novas unidades industriais quanto integração, pelo porte das suas principais
para o aumento da produção nas unidades empresas construtoras e pela sua
nela já existentes. Além da infraestrutura científica e tecnológica.
reconcentração identificada entre 1985 e
1995, esse estudo apontou para uma 6.7. DESEMPENHO
concentração ainda maior no futuro, em
favor desta mesma região. Isso se deve a INTERNACIONAL
que as empresas essencialmente buscam
locais em que o chamado “salário de A aplicação do método ESSY na
eficiência” é baixo, mesmo que os comparação do desempenho da
chamados “salários nominais” sejam altos pavimentação local com a internacional
– a produtividade compensará o maior visou identificar os fatores que
nível salarial. A produtividade varia entre permitiriam ou facilitariam o alcance,
regiões devido às economias de pelo Brasil, do nível de pavimentação
15
qualitativo e quantitativo já estabelecido Embora tal resultado
seja na Europa, seja nos EUA, e melhor indubitavelmente seja desconfortável, em
entender como as práticas locais hoje contrapartida ele valoriza a importância
impedem se alcançar tal nível. de estudos adicionais e detalhamentos
Adicionalmente, tendo por base o voltados às comparações técnicas,
crescente grau de atuação internacional econômicas e gerenciais, com estes
em rodovias por empresas brasileiras referenciais. Quais são os insumos lá
como Odebrecht, Queiroz Galvão, etc., as usados, e como são aplicados? Quais são
experiências por elas adquiridas nestes os critérios e os padrões de
mercados externos provavelmente dimensionamento lá praticados? Qual o
contribuirão no aprimoramento dessas nível lá existente de qualificação
práticas locais. Há firmas nacionais profissional? Como se realiza esta
construindo estradas em Angola qualificação? Qual é o padrão das usinas
(Odebrecht, Queiroz Galvão, etc.), e e maquinário lá usado? Referenciais
operando concessões rodoviárias em como a França, Suíça, Alemanha,
Portugal (Odebrecht). A Odebrecht, por Áustria, Dinamarca, Portugal, e Estados
exemplo, após cinco anos de obras Unidos podem fornecer valiosas
concluiu a pavimentação de todos 710 km informações para a evolução do setor
dos trechos nº-2 e nº-3 da Rodovia local. Há asfaltos, portanto, que são mais
Interoceânica Sul (IIRSA Sul), em resistentes que os tradicionais CAP.50/70
dezembro de 2010: a inovação foi que a e CAP.30/45 usados no Brasil, porém que
firma brasileira, líder do consórcio ainda não foram aqui adotados,
construtor, investiu com os parceiros US$ correspondentes às faixas de penetração
1 bilhão nesses trechos em troca de 25 10/20, 15/25, e 20/30. A adoção destes
anos de direito de concessão – estas obras asfaltos é parte necessária à evolução dos
são parte de um “corredor” de 1,5 mil padrões de projeto e insumos dos
quilômetros de rodovias que está sendo pavimentos, no sentido de elevada
criado entre a fronteira do Brasil e do resistência, a exemplo daqueles hoje
Peru (fonte: Valor Econômico, encontrados na França. A França, 2ª na
05/05/2009; e www.odebrecht.com, colocação acima, a partir do final da 2ª
acessado em, 15/06/2011). Grande Guerra promoveu uma série de
Os dados mais recentes apontam inovações na sua pavimentação. Já nos
que o Brasil em 2007 possuía 1.765.278 anos 80 o processo de aprimoramento das
Km de rodovias, com extensão misturas asfálticas francesas levou ao
pavimentada de 211.678 Km (cerca de desenvolvimento dos revestimentos de
12%, contra os 55% da média mundial e módulo elevado, a saber: a mistura
os 55% de pavimentação nos EUA). asfáltica de módulo elevado usada como
Identificou-se que a qualidade da malha camada de ligação ou como base; e o
rodoviária brasileira quando avaliada concreto betuminoso de módulo elevado,
comparativamente no conjunto dos 139 usado essencialmente como camada de
países escrutinados na pesquisa do rolamento.
Global Competitive Report, situa-se
muito aquém dos padrões técnicos 7. CONCLUSÕES
praticados na Europa e nos EUA. Entre
2009 e 2010, o posicionamento relativo
entre os países foi o seguinte: 1º, Evidências positivas apontam para
Singapura; 2º, França; 3º Suíça; 4º, Hong a existência de um sistema setorial de
Kong; 5º, Alemanha; 6º, Emirados inovação e produção em pavimentação
Árabes Unidos; 7º, Áustria; 8º, Portugal; com asfalto no Brasil, porém
9º, Dinamarca; 12º, Chile; 13º, Finlândia; apresentando algumas lacunas e
17º, Canadá; 18º, Suécia; 19º, Estados disfunções.
Unidos; tendo o Brasil ficado na 105ª Como evidências positivas
posição. (World Economic Fórum, 2011: destacam-se: (1) a disponibilidade e o
p.389). envolvimento de significativa
16
infraestrutura acadêmica; (2) a existência AZZONI, C. R.; 1998. Competitividade
de fabricantes de maquinário setorial que regional e reconcentração industrial: o
são inclusive exportadores; (3) as ações futuro das desigualdades regionais no
de inovação pelas concessionárias; (4) as Brasil. FEA/USP.
importantes ações por parte da Petrobras BARTHOLOMEU, D.B.; 2006.
nas articulações institucionais e nos Quantificação dos impactos econômicos e
aportes financeiros para P&D; (5) a ambientais decorrentes do estado de
presença de grandes construtoras locais conservação das rodovias brasileiras.
que são exportadoras de serviços, através Tese (Doutorado) – Universidade de São
de suas filiais na América do Sul, África Paulo, Escola Superior de Agricultura
e Europa; (6) significativas contribuições Luiz de Queiroz, Piracicaba, 2006. 159p.
por parte das agências públicas de BERNUCCI L.B., et al; 2008:
financiamento; (7) atuação das Pavimentação asfáltica.
associações empresariais e não BNDES, 2009. “Apoio à Construção
empresariais, intensificando a interação Civil”. Cartilha explicativa organizada
entre os diversos agentes, e atuando pelo Departamento de Programas e
politicamente junto aos órgãos públicos e Políticas do BNDES, publicada em
à Petrobras. setembro de 2009.
Evidências negativas que BRACZYK, H-J, P. COOKE & M.
impedem o pleno funcionamento do HEIDENREICH (eds.) (1998). Regional
sistema são: (1) desmonte dos órgãos innovation systems: the role of
rodoviários governamentais federais e governance in a globalized world.
estaduais; (2) reflexos da falta de London and Pennsylvania: UCL.
investimentos nos anos 80 e 90, com o BRESCHI, S. & F. Malerba (1997).
enfraquecimento dos demais atores; (3) Sectoral innovation systems:
falta de ação indutora por parte dos technological regimes, Schumpeterian
governos visando à inovação e o aumento dynamics, and spatial boundaries. In
de produtividade (lacuna parcialmente Edquist, C. (ed.) 1997 Systems of
ocupada pela Petrobras); e (4) não Innovation: Technologies, Institutions
exigência de padrões de and Organizations. London and
dimensionamento compatíveis com o Washington: Pinter/Cassell Academic.
estado da arte nos países desenvolvidos. CARLSSON, B. (ed.) (1995).
Em termos de recomendações Technological systems and economic
sugere-se: (A) preservação e o performance: the case of factory
fortalecimento dos órgãos rodoviários automation. Dordrecht: Kluwer.
governamentais; (B) intensificar a ação CNT, 2010. Pesquisa CNT (Confederação
destes órgãos rodoviários na promoção da Nacional dos Transportes) de Rodovias,
pesquisa científica e tecnológica visando 2010.
a inovação; (C) continuidade e COOKE, P. Forthcoming (2000).
intensificação dos investimentos Regional Innovation Systems, Clusters
governamentais, a exemplo do PAC e dos and the Knowledge Economy. Industrial
programas do BNDES associados; (D) & Corporate Change, forthcoming
aperfeiçoamento das ações do TCU no 2000.
sentido de evitar prejuízos desnecessários COOKE, P., Gomez Uranga, M. and
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