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RESUMO: Um dos grandes desafios colocados para a intervenção em saúde mental encontra-se na dificuldade de acesso dos usuários à
vida produtiva. Aponta-se, a despeito de todos os progressos, mudanças de paradigma e práticas implementadas voltadas à reabilitação
psicossocial, que a inclusão no mundo do trabalho ainda é uma importante barreira a ser transposta, objetivando alcançar melhores
níveis de qualidade de vida e condições mais concretas de inclusão social. O presente estudo teve como objetivo identificar as princi-
pais demandas, desafios, dificuldades e oportunidades consideradas por profissionais que realizam práticas de oficinas de geração de
renda e/ou cooperativas. A partir da localização e mapeamento de práticas existentes no Estado de São Paulo, foram escolhidas cinco
experiências. A coleta de dados ocorreu por meio de visitas e entrevistas realizadas com os profissionais responsáveis pelas oficinas. Os
resultados permitiram a elaboração de um diagnóstico, caracterizando as experiências desenvolvidas com a análise contextualizada.
Discute-se que, ainda que experiências estejam viabilizando realidades de inserção, é preciso ter a crítica sobre o quanto ainda devem
ser desenvolvidas na direção da autonomia e do desenvolvimento da cidadania dos envolvidos.
Palavras-chave: Saúde Mental. Trabalho. Reabilitação.
ABSTRACT: One of the great challenges for the intervention in mental health is the difficulty of access of users to a productive life. In
spite of all the progresses, changes of paradigm and practices implemented destined to the psycho-social rehabilitation, inclusion in the
world of work is still an important barrier to be challenged for reaching better levels of quality of life and more concrete conditions for
social inclusion. This study aimed to identify the main exigencies, challenges, difficulties and opportunities considered by professionals
who organize income generation workshops and/or cooperatives. From the location and mapping of existing practices in the State of
Sao Paulo, we chose five experiences. Data collection used visits and interviews realized with professionals responsible by the workshops.
The results have allowed the elaboration of a diagnosis that characterizes the experiences developed with the contextualized analysis.
Discussion: although some experiences are making viable insertion realities, it is necessary to evaluate how much they must still be
developed for promoting the autonomy and the development of citizenship of people involved.
Keywords: Mental Health. Work. Rehabilitation.
RESUMEN: Uno de los grandes retos para la intervención en salud mental se halla en la dificultad de acceso de los usuarios a la vida
productiva. Indicánse, a pesar de todos los progresos, cambios de paradigma y prácticas implementadas destinadas a la rehabilitación
psicosocial, que la inclusión en el mundo del trabajo es todavía una importante barrera a ser rebasada con el objetivo de alcanzar mejores
niveles de calidad de vida y condiciones más concretas de inclusión social. Este estudio tuvo como objetivo identificar las principales
exigencias, retos, dificultades y oportunidades consideradas por profesionales que realizan prácticas de oficinas de generación de renta
y/o cooperativas. Desde la ubicación y identificación de prácticas existentes en el Estado de São Paulo, han sido escogidas cinco expe-
riencias. La colecta de datos ocurrió por medio de visitas y entrevistas realizadas con los profesionales responsables por las oficinas. Los
resultados han permitido la elaboración de un diagnóstico que caracteriza las experiencias desarrolladas con el análisis contextualizado.
Es la siguiente la discusión: aunque algunas experiencias estén viabilizando realidades de inserción, es necesario valorar cuánto ellas
deben todavía ser desarrolladas en la dirección de la autonomía y del desarrollo de la ciudadanía de los involucrados.
Palabras-llave: Salud Mental. Trabajo. Rehabilitación.
a. Este trabalho é fruto do Projeto de Extensão Capacitação de Profissionais e Caracterização de Demandas de Usuários de Centros Comunitários e de Técnicos Envolvidos em Ativi-
dades de Geração de Renda: Viabilizando a Estruturação de Cooperativas Sociais Integradas, realizado com apoio do PROEXT 2006 – MEC/SESu/DEPEM.Trabalho apresentado
como pôster no X Encontro de Pesquisadores em Saúde Mental e Especialistas em Enfermagem Psiquiátrica: A Saúde Mental em Tempos de Reformas Curriculares –
I Simpósio Latino Americano de Saúde Mental, realizado em Ribeirão Preto – SP, no período de 09 a 12 de junho de 2008.
* Terapeuta Ocupacional. Doutora em Ciências pelo Programa de Enfermagem Psiquiátrica / Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto – USP. Professora Adjunta do
Departamento de Terapia Ocupacional da Universidade Federal de São Carlos. E-mail: bellussi@ufscar.br
** Terapeuta Ocupacional. Doutora em Saúde Mental pela USP – FMRP. Professora Associada do Departamento de Terapia Ocupacional da Universidade Federal
de São Carlos.
*** Terapeuta Ocupacional. Doutora em Ciências Médicas pela UNICAMP. Professora Voluntária Aposentada do Departamento de Terapia Ocupacional da Universidade
Federal de São Carlos.
Tempo Número e
Vínculo Atividades
Experi- Financiamento de Fun- Objetivos da Recursos Humanos Características
Institu- Desenvol-
ências da Proposta ciona- Proposta Envolvidos de Usuários
cional vidas
mento Envolvidos
Gráfica
Ateliê
Em torno de
Ovinocultura
Acolhimento, 80 pessoas.
Horta
Público estimular vín- 20 monitores e 01 Moradores das
1 Verba estadual 08 anos Tecelagem
Estadual culo e relações psicólogo residências tera-
Marcenaria
interpessoais pêuticas (adultos
Esporte, cul-
e idosos)
tura e lazer
Reciclagem
Em torno de Produção
Convênio SUS
50 pessoas. de horta
(financiamento
Adultos jovens, a orgânica,
de oficinas tera- Reinserção
partir de 18 anos jardinagem
pêuticas), social, inclusão
que apresentam (instalação e
Secretaria de social e geração
quadros psicóti- manutenção
Assistência de renda. Ofe-
06 monitores, 02 cos ou neuróti- de jardins),
Social e uma recer espaço
Filantró- terapeutas ocupa- cos, dependência plantio de
2 Fundação que 16 anos de trabalho,
pico cionais e 01 auxiliar de substâncias ervas medici-
apoia Entidades treinamento,
administrativo psicoativas e qua- nais, instala-
Assitenciais no capacitação e
dros de comorbi- ção de cercas,
município por que também
dade, provenien- limpeza am-
meio de parceria gere renda
tes de serviços biental, com-
com uma ONG
de saúde mental postagem e
vinculada ao
e outros serviços produção de
Projeto
públicos frutas
Convênio SUS 18 pessoas.
(financiamento Adultos jovens, a
de oficinas tera- partir de 18 anos
Reinserção
pêuticas), que apresentam Estoque e
social, inclusão
Secretaria de quadros psicóti- produção de
social e geração
Assistência cos ou neuróti- alimentos,
de renda. Ofe-
Social e uma cos, dependência preparação
Filantró- recer espaço 03 monitores e 01
3 Fundação que 16 anos de substâncias de salgados,
pico de trabalho, nutricionista
apoia Entidades psicoativas e qua- montagem
treinamento,
Assitenciais no dros de comorbi- de marmitex
capacitação e
município por dade, provenien- e limpeza do
que também
meio de parceria tes de serviços restaurante
gere renda
com uma ONG de saúde mental
vinculada ao e outros serviços
Projeto públicos
Inicialmente foi 01 monitor, 04
financiada com terapeutas ocupacio-
verba da UNES- nais, 04 assitentes
79 pessoas.
CO e do Progra- sociais, 01 psicólogo,
Reabilitação Adultos com-
ma DST/AIDS 01 artista plástico,
psicossocial, preendidos na
do Ministério da 01 diretor de teatro
qualificação faixa etária de Mosaico
Saúde. Atual- e 02 pessoal de
para o mercado 18 a 60 anos que Encader-
mente, existe apoio, sendo que 01
de trabalho apresentam qua- nação
4 ONG parceria com 13 anos terapeuta ocupacio-
formal e infor- dros psicóticos, Costura
uma Fundação nal e 01 assistente
mal, espaço de provenientes de Grupo de
vinculada à uma social pertencem
convívio e de serviços de saúde teatro
Universidade ao quadro de outras
lazer e geração mental e também
Pública, com as instituições e têm
de renda procura espon-
Secretarias de uma carga horária
tânea
Assistência So- semanal de presta-
cial, da Cultura e ção de serviços na
da Educação experiência
Continua…
… continuação
Tempo Número e
Vínculo Atividades
Experi- Financiamento de Fun- Objetivos da Recursos Humanos Características
Institu- Desenvol-
ências da Proposta ciona- Proposta Envolvidos de Usuários
cional vidas
mento Envolvidos
Em torno de
50 pessoas.
Inicialmente
Adultos compre- Marcenaria/
foi financiada
endidos na faixa Marchetaria
com verba do Inclusão social
03 monitores, 02 etária entre 30 Produção
Programa DST/ por meio do
psicólogas, e 35 anos, que orgânica de
AIDS do Minis- trabalho,
Público 01 terapeuta ocupa- apresentam qua- vegetais
tério da Saúde. favorecendo
5 Munici- 07 anos cional, 02 auxiliares dros psicóticos e Inclusão
Atualmente, o processo de
pal administrativos e 01 de dependência digital
conta com verba aprendizagem
pessoal de apoio de substâncias Oficina de
Municipal e par- e geração de
psicoativas, vídeo
ceria com uma renda
provenientes de Costura
Organização
serviços de saúde
Social
mental e outros
serviços públicos
implantação das Políticas Públicas Quanto aos oficineiros, os nú- ria, pelos serviços de saúde mental
de Saúde Mental de atenção extra- meros variam de acordo com cada (CAPS, NAPS, HD e Ambulatórios)
-hospitalar. realidade, sendo que uma das insti- e demais serviços públicos. Um de-
Os principais objetivos das prá- tuições conta com apenas 01 técni- les recebe também uma demanda
ticas apontados estiveram relacio- co de nível superior e 20 monitores; espontânea, e outro recebe apenas
nados à reabilitação psicossocial e a outra conta com 10 técnicos de moradores de residências terapêu-
a geração de renda. Observou-se nível superior e só 01 professor. ticas. O número de participantes
também objetivos, como propiciar Uma pesquisa10 sobre a história envolvidos nas experiências varia
o “acolhimento, vínculo e relações” e a função das oficinas em saúde entre 50 e 250 usuários. Existe
e “espaço de convívio e lazer”. O mental desenvolvida no Estado fila de espera em 03 das 04 expe-
objetivo de estimular a “geração de de Minas Gerais também identifi- riências.
renda” está atrelado a outros obje- cou a presença de profissionais de A entrada dos usuários nas ofi-
tivos, como criar espaço de traba- formação diversificada atuando cinas depende da característica de
lho, treinamento, aprendizagem, em práticas de oficinas, como, por cada experiência. Foi observada a
capacitação e qualificação para o exemplo, terapeutas ocupacionais, existência de triagem semanal, com
mercado de trabalho formal e in- psicólogos, assistentes sociais, en- realização de entrevista para identi-
formal. fermeiros, artistas plásticos, educa- ficar demandas, habilidades e perfil
Os recursos humanos envol- dores, estilistas e músicos, e atribui do usuário. Em outra experiência,
vidos variam, de acordo com o essa diversidade à superação das os interessados passam por um
tamanho e a complexidade das práticas antigas de oficinas, pelo ateliê e, a partir dessa vivência, são
atividades desenvolvidas e com modo de intervenção psicossocial encaminhados para a oficina mais
os objetivos e tempo de funciona- característico nas práticas atuais e adequada de acordo com a avalia-
mento. Duas instituições contam que exige muito mais de uma única ção do técnico e/ou oficineiro. De
com grande número de técnicos de especialidade para operá-lo. modo geral, observou-se que o in-
nível superior, e duas têm um qua- Observou-se que todas as expe- teresse e habilidade do usuário são
dro reduzido de técnicos. Em rela- riências são direcionadas a adultos, bastante considerados e, sempre
ção aos técnicos de nível superior, com idade variando entre 18 e 60 que possível, respeitado no enca-
observou-se a existência de psicó- anos. São frequentadas por pessoas minhamento para as oficinas.
logos em todas as experiências, te- portadoras de transtorno mental, Não foram identificados cri-
rapeutas ocupacionais em 03 das em geral com quadros psicóticos, térios de desligamento ou para a
04 experiências e assistentes sociais e dependentes químicos. Os usuá- saída de usuários. Os relatos de des-
em 02. Além disso, existem 01 ar- rios participantes das oficinas são ligamento estão vinculados a que-
tista plástico e 01 psiquiatra. encaminhados, na grande maio- bra de regras de funcionamento,
como, por exemplo, trazer drogas informática/comunicação (rádio), Todos os entrevistados reconhe-
e faltas excessivas sem justificati- serviços de secretaria, artesanato e cem que as experiências, ainda que
vas, ou a mudanças na realidade serviços de limpeza5. busquem a autonomia, geração de
dos usuários (mudança de cidade, Nesses dois exemplos, percebe- renda ou capacitação dos usuários,
abandono, etc.). Há poucos relatos -se a prevalência na oferta de pres- são caracterizadas como um “traba-
de saída do usuário para a entrada tação de serviços em detrimento da lho protegido”. Além disso, a con-
no mercado de trabalho. oferta de produtos, situação exata- cepção terapêutica está atrelada às
Algumas das atividades desen- mente contrária à das experiências experiências em maior ou menor
volvidas nas diferentes experiên- investigadas no presente estudo. A grau. Nessa direção, observou-se a
cias são comuns, como marcenaria, despeito da diferença de realidade presença de prontuários, PTIs, etc.
mosaico, costura, gráfica e horta. socioeconômica e cultural entre A vertente terapêutica das ofi-
Já outras são bem diversificadas, os dois países, considerando o su- cinas em saúde mental aparece de
como serralheria, culinária e nu- cesso das experiências triestinas maneira ainda mais marcante na
trição, vitral e vitral plano, velas, em relação à inserção das pessoas pesquisa realizada por Lappann-
ovinocultura, construção civil, in- portadoras de transtorno mental -Botti10. Por meio da análise de do-
clusão digital e oficina de vídeo. Em no mercado de trabalho e os rela- cumentos referentes a oficinas em
02 locais, encontraram-se relatos tos da maioria dos entrevistados quatro diferentes serviços de saúde
de atividades oferecidas aos usuá- do presente estudo quanto à difi- mental, a autora identificou que a
rios que respondem mais pela inte- culdade de colocação dos produtos representação das oficinas apare-
gração social, como, por exemplo, no mercado, argumenta-se sobre a ce como um espaço terapêutico
atividades de convívio (grupo de possibilidade de que esteja faltando e um dispositivo de reintegração
teatro, passeios) e oficina de espor- uma maior adequação da oferta das sociocultural, utilizando a expres-
são, produção, recreação e convi-
te, cultura e lazer. Percebe-se a ten- oficinas de geração de renda às ne-
vência para atingir sua finalidade.
dência pela escolha de atividades cessidades do mercado local.
Na opinião dos entrevistados
artesanais e pela oferta de produtos Em relação à participação dos
do presente estudo, a maioria dos
em detrimento a oferta de presta- usuários em processos de deci-
usuários não tem condições de rea-
ção de serviços. são sobre as atividades realizadas,
lizar trabalho autônomo, porém
Em contraposição a essa ten- observou-se que na maioria dos
ressaltaram que alguns possuem
dência observada, aponta-se a locais há pouca ou nenhuma par-
habilidade e capacidade (sabem
experiência de Trieste com o coo- ticipação dos usuários na escolha
realizar a função/tarefa), mas apre-
perativismo social e com o processo das atividades que são realizadas sentam insegurança, riscos de recair
de inserção de pessoas portadoras nas oficinas, porém, observou-se (beber ou usar outro tipo de dro-
de transtorno mental em atividade também experiências nas quais os ga), medo de entrar em crise, etc.
de trabalho. Os setores de ativida- usuários participantes são estimu- Em relação à colocação dos pro-
des prevalentes nas cooperativas lados a contribuir com ideias, opi- dutos no mercado, observou-se que
sociais triestinas, nos anos de 2004 niões, etc. Entretanto, essa prática todas as experiências contam com
e 2005, que se propõem a realizar a foi construída ao longo do tempo e uma “lojinha” ou algum ponto de
inserção de pessoas em situação de os entrevistados ressaltaram, ainda, venda, todas participam de feiras,
desvantagem social no mercado de que a tomada de decisões coletivas sejam locais ou de maior porte. Há,
trabalho, são: gestão de áreas verdes em todas as situações seria inviável. também, relatos de venda de “porta
e ambiente, serviços de limpeza e Sobre os processos decisórios em porta”, de vendas “em consig-
serviços de relação com o público9. presentes em práticas de oficinas nação” e vendas dentro da própria
Em uma pesquisa realizada pe- em saúde mental, Lappann-Botti10 instituição. Em experiências mais
lo Escritório para a Formação e a identificou que algumas oficinas desenvolvidas, observou-se con-
Inserção no Trabalho do Departa- ainda operam de forma asilar, ou tratos de prestação de serviços,
mento de Saúde Mental de Trieste, seja, os processos decisórios são ver- cadastro de clientes, entre outros.
com pessoas provenientes de servi- ticais e hierarquizados. Porém, na Todos os entrevistados relataram a
ços de saúde mental que usufruiam maioria das experiências de oficinas importância da qualidade e estética
de uma bolsa-trabalho com o obje- que analisou, os processos decisó- do produto final para a entrada no
tivo de formação e inserção no tra- rios ocorriam de forma horizontal, mercado e sua comercialização.
balho, verificou-se que os setores sendo o próprio local da oficina Para a distribuição da renda ar-
de atividades que mais contavam utilizado como fórum de decisões recadada entre os usuários, existem
com bolsistas em formação eram: com a participação dos usuários. formas diferenciadas de discussão
e de critérios. A mais comum é a tiva social; (7) as políticas públicas renda estudadas não desenvolvem
discussão conjunta entre os usuá- são deficitárias; existe sempre lista Oficina Integrada, ou seja, trabalho
rios, monitores e coordenadores a de espera, ou seja, faltam serviços e destinado a pessoas provenientes
respeito da avaliação do trabalho recursos; (8) as leis que regulamen- de serviços de saúde mental con-
realizado (qualidade, envolvimen- tam as cooperativas sociais preci- juntamente com outras pessoas
to, etc.) e frequência/horas traba- sam ser mais inclusivas; a legislação da comunidade que se encontram
lhadas, o que gera um índice para de cooperativismo é limitada e aca- fora do mercado de trabalho. Al-
a divisão dos recursos entre os par- ba inviabilizando sua implantação; guns autores brasileiros argumen-
ticipantes. Observou-se práticas de (9) o desemprego é também uma tam que a cooperativa ou a oficina
pagamento e autonomia dos usuá- questão do mundo do trabalho e de geração de renda não deve ser
rios que vão desde pagamento em não apenas da saúde mental, por- composta somente por pessoas que
cheque até a tutela do gasto reali- tanto há necessidade de criação de apresentam um transtorno ou uma
zado pelo usuário. outros espaços, não só de oficinas, deficiência, pois essa homogenei-
Quanto às principais dificul- mas de novas formas de trabalho, dade poderia levar tais projetos ao
dades encontradas nessas práti- como, por exemplo, as orientadas fracasso11,12.
cas, os entrevistados relataram as pela economia solidária.
seguintes: (1) existe uma política De modo geral, os entrevistados Considerações finais
pública que aponta a importância assinalaram, como medidas para o Com base nas experiências es-
da reabilitação psicossocial, mas sucesso das experiências: a neces- tudadas, identificou-se um grande
não há mecanismos administra- sidade de ações que envolvam a potencial na realidade brasileira, o
tivos/burocráticos para viabilizar intersetorialidade trabalho/saúde/ que reforça ainda mais o compro-
os processos de trabalho e geração educação; a reforma da legislação misso de continuidade e investi-
de renda; (2) os serviços de saúde brasileira sobre o cooperativismo mento em ações que viabilizem as
não estão preparados, em termos social; um embasamento na expe- práticas de inserção no trabalho,
legais, administrativos e burocrá- riência do cooperativismo social geração de renda e inclusão social.
ticos, para lidar com trabalho e italiano; a integração entre as políti- Porém, aponta-se a necessidade
geração de renda; (3) faltam con- cas de saúde mental e de economia de avançar e avaliar ações de for-
dições materiais e recursos huma- solidária; um maior contato com ma crítica, no sentido de perseguir
nos; (4) faltam recursos (fomento) a realidade de oficinas integradas, a melhoria e alcance dos objetivos.
e financiamentos; (5) existe uma no sentido de compreender como Dessa forma, ainda que experiên-
incompatibilidade legislativa entre trabalhar com os diferentes níveis cias já possam estar viabilizando
previdência social e geração de ren- de habilidades e problemáticas; e a boa parte de realidades de inserção,
da (pessoas que têm qualquer tipo troca de experiências entre os pro- é preciso sempre ter a crítica sobre
de benefício da previdência, não fissionais envolvidos com a prática o quanto ainda devem ser desen-
podem ter nenhum tipo de contra- de cooperativas e oficinas de gera- volvidas na direção da autonomia
to trabalhista); (6) a legislação não ção de renda. e do desenvolvimento da cidadania
responde à interface existente entre Foi possível verificar que as cin- real dos envolvidos, de seu proces-
intervenção terapêutica e coopera- co práticas de oficinas de geração de so de emancipação.
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