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«Age sempre de tal modo que o teu comportamento possa vir a ser

princípio de uma lei universal.»


Immanuel Kant
(1724-1804)
A Ética Deontológica de Kant
● A teoria ética de Kant inscreve-se numa ética deontológica.
O objectivo de Kant foi o de encontrar os princípios
fundamentais (fundadores) da moral.

● A palavra deontologia tem a sua origem no prefixo grego


δέον (deon) que significa dever ou obrigação; mais o sufixo
grego λόγος (logos) que significa razão, palavra ou discurso.
Moral e Razão
1. Kant pensava que só somos realmente livres se formos nós
próprios a definir as leis a que o nosso comportamento deverá
obedecer;

2. As obrigações morais não são impostas por Deus nem


resultam dos nossos desejos ou inclinações;

3. Os deveres morais são leis que a razão estabelece de modo


idêntico para todos os seres racionais;

4. A moral baseia-se puramente na razão e nessa medida não


necessita da experiência para ser conhecida.
A ética de Kant
1. As regras morais são máximas que a razão estabelece para
todos os seres racionais;

2. A ética é um sistema de regras absolutas;

3. O valor moral das acções provém das intenções com que


são praticadas e não das consequências que promovem;

4. As regras morais devem ser respeitadas independentemente


das consequências;

5. É uma ética formal e a priori;


Regras absolutas
- As obrigações morais são absolutas porque não estão
sujeitas a excepções, mesmo se aplicá-las tiver consequências
negativas;

- Esta é uma característica das morais deontológicas: agir


moralmente consiste em respeitar direitos. Agir de forma a
promover as melhores consequências não é permitido se
implicar a violação de um direito;

- Por exemplo, a obrigação de não mentir não varia consoante


as circunstâncias, devendo nuns casos ser respeitada e não ser
noutros.
Acções e intenções
- A mesma acção pode ser praticada com diferentes intenções:
posso ajudar um amigo para obter um benefício ou por sentir
que tenho esse dever;

- Para determinar o valor moral de uma acção é preciso saber


a intenção com que foi praticada;

- Segundo Kant, ajudar um amigo só tem valor moral se isso


tiver sido feito em nome do dever.
Obrigações morais
Serão as nossas obrigações morais apenas hipotéticas?

- Se a moral fosse seguir regras hipotéticas, só teríamos, por


exemplo, a obrigação de cumprir uma promessa em certas
condições, não em todas;

- Mas de acordo com a nossa razão, temos a obrigação de


cumprir as nossas promessas em todas as circunstâncias.
Moral e inclinações ou desejos
1. As obrigações morais não dependem de condições, logo,
apenas têm valor moral as acções praticadas em nome do
dever.

2. Uma acção praticada por medo, pagar impostos por


exemplo, não tem valor moral porque a sua máxima seria
apenas hipotética – só praticaríamos porque tememos a
punição;

3. Não se trata de uma acção com conteúdo moral porque


apenas a praticámos sob uma condição - a de não ser punido.
Universalidade e moralidade
1. Agir moralmente é agir com base em máximas
universalizáveis, ou seja, máximas que qualquer pessoa nas
nossas circunstâncias poderia também seguir.

2. Esta obrigação moral é o fundamento de todas as nossas


obrigações morais – trata-se do imperativo categórico.
Tipos de Acções
Do ponto vista ético, Kant estabelece que é possível distinguir
três tipos de acções:

Acções Acções por Acções contra


conforme o dever o dever
dever
Acções conforme o dever
● Uma acção está conforme o dever quando é praticada de
acordo com a lei (máxima imposta pela razão) mas a sua
intenção não é boa mas sim interessada. Ou seja, o agente
age de acordo com a lei mas apenas porque lhe convém:

Ex:

“Parar no sinal vermelho, não porque é esse o seu


dever, mas porque tem medo de ser multado ou de
embater num outro carro”.
Acções por dever
● A acção por dever é segundo Kant a acção moral por
excelência. Segundo o autor, uma acção por dever caracteriza-
se por estar de acordo com o imperativo categórico mas o que
a leva a praticar é o simples respeito pelo dever e nada mais.
Ou seja, é uma acção que está de acordo com a lei e foi
praticada com boa vontade, não havendo qualquer interesse
ou contrapartida para o agente que a pratica.

Ex:

“Não mentir simplesmente porque é o seu dever


enquanto ser humano.”
Acções contra o dever
● A acção contra o dever caracteriza-se por ser realizada por
motivação interesseira ou inclinada. Neste caso, a vontade não
age autonomamente mas sim ao serviço de outrem. Trata-se
de uma acção cuja máxima é oposta ao dever. Segundo Kant,
este tipo de acção nunca deve ser praticado uma vez que viola
o imperativo categórico imposto pela razão, e dessa forma,
inverte a natureza racional e livre do ser humano.

Ex: “Fazer uma promessa que sabemos à partida que


não podemos cumprir.”
Máximas e imperativos
Para concluir a apresentação da terminologia kantiana, resta-
nos analisar os seguintes conceitos:

Máxima

Imperativo Imperativo
Categórico Hipotético
Máxima
● Uma máxima é uma espécie de regra geral que seguimos
quando agimos. Exemplos:

«Devo mentir sempre que isso me beneficiar.»

«Devo cumprir todas as promessas que fizer aos meus


amigos.»

«Devo defender sempre os meus familiares.»


Imperativo
● Um imperativo é uma ordem ou um pedido. Exemplos:

«Vai fazer os trabalhos de casa.»

«Não sujes o sofá.»

«Desliga a Playstation.»

«Dá um beijinho à avó.»


Imperativo Hipotético
● Um imperativo hipotético é uma ordem que tem como
fim atingir um objectivo. Um imperativo hipotético é um meio
para chegar a um fim. Exemplos:

«Se queres ter bons resultados tens de trabalhar muito


para os alcançar.»

«Se queres ter sucesso na política deves mentir sempre


que for preciso.»

«Se queres ter sucesso nos negócios deves ter um bom


poder de persuasão.»
Imperativo Categórico
● Um imperativo categórico tem validade universal e
ordena-nos a fazer algo independentemente da nossa
inclinação para o fazer. Segundo Kant, o imperativo categórico
deriva directamente da razão e exprime-se de dois modos:

«Age sempre segundo uma máxima, tal que possas


querer que se torne uma lei universal.»

«Trata os outros como fins em si mesmo e não apenas


como um meio para os teus fins.»
A boa acção
Em jeito de conclusão,
podemos afirmar que agir
eticamente é agir por dever,
ou seja, é agir no estrito
cumprimento da lei que a
razão impõe de forma
universal a todos os seres
humanos. Tal lei expressa-se
através do imperativo
categórico:
“Age sempre de tal modo que o
teu comportamento possa vir a
ser princípio de uma lei
universal.”
Objeções à ética kantiana
A situação de conflito de deveres
Kant defende que para agirmos moralmente temos de
respeitar de forma incondicional um conjunto de deveres
ditados pela nossa razão. Para Kant, essas deveres ou regras
morais são absolutos, são para serem respeitados de forma
incondicional, sem excepções, em todas as situações do
nosso quotidiano.
Objeções à ética kantiana
Uma dessas regras é o nosso “dever de não mentir”. Para
Kant, não devemos mentir em toda e qualquer situação. Mas
quererei eu que este princípio de acção se aplique
universalmente a todos os casos possíveis de acção?
Objeções à ética kantiana
Vejamos a seguinte situação:
“Durante a Segunda Guerra Mundial, os pescadores holandeses
transportavam, secretamente nos seus barcos, refugiados judeus
para Inglaterra e os barcos de pesca com refugiados a bordo eram
por vezes interceptados por barcos patrulha nazis. O capitão nazi
perguntava então ao capitão holandês qual o seu destino, quem
estava a bordo, e assim por diante. Os pescadores mentiam e
obtinham permissão de passagem. Ora, é claro que os pescadores
tinham apenas duas alternativas, mentir ou permitir que os seus
passageiros (e eles mesmos) fossem apanhados e executados. Não
havia terceira alternativa.”
Objeções à ética kantiana
Os pescadores holandeses encontravam-se então na
seguinte situação: ou “mentimos” ou “permitimos o homicídio
de pessoas inocentes”. Os pescadores teriam de escolher
uma dessas opções. De acordo com Kant, qualquer uma
delas é errada, na medida em que as regras morais “não
devemos mentir” e “não devemos matar” (ou permitir o
assassínio de inocentes) são absolutas. O que fazer então?
Objeções à ética kantiana
Verificamos que a teoria ética de Kant não saberia responder
perante uma situação de conflito de deveres, porque proíbe
ambas as possibilidades de acção por estas se revelarem
moralmente incorrectas. Mas a verdade é que, perante uma
situação destas, a qual por acaso se passou na realidade,
teríamos de optar por uma dessas duas possibilidades.
Objeções à ética kantiana
Se a teoria ética de Kant nos proíbe de optar por uma delas
(uma vez que os deveres são absolutos e categóricos), mas
na realidade somos forçados a optar por uma, a teoria ética
de Kant revela-se incoerente. Sendo o principal objetivo da
ética, a procura de uma resposta para a questão: “o que
fazer?”, a teoria mostra-se incoerente, uma vez que é
incapaz de apresentar uma resposta satisfatória perante uma
situação de conflito de deveres.

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