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LINGUAGEM E

FONOAUDIOLOGIA EM
PSICOPEDAGOGIA

Autoria: Christiane Regina Souza de Carvalho

UNIASSELVI-PÓS
Programa de Pós-Graduação EAD
CENTRO UNIVERSITÁRIO LEONARDO DA VINCI
Rodovia BR 470, Km 71, no 1.040, Bairro Benedito
Cx. P. 191 - 89.130-000 – INDAIAL/SC
Fone Fax: (47) 3281-9000/3281-9090

Reitor: Prof. Hermínio Kloch

Diretor UNIASSELVI-PÓS: Prof. Carlos Fabiano Fistarol

Coordenador da Pós-Graduação EAD: Prof.ª Cláudia Regina Pinto Michelli

Equipe Multidisciplinar da
Pós-Graduação EAD: Prof.ª Bárbara Pricila Franz
Prof.ª Cláudia Regina Pinto Michelli
Prof. Ivan Tesck

Revisão de Conteúdo: Prof.ª Carolina dos Santos Maiola


Revisão Gramatical: Profa.ª Marli Helena Faust

Diagramação e Capa:
Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI

Copyright © UNIASSELVI 2017


Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri
UNIASSELVI – Indaial.

414
C3311 Carvalho, Christiane Souza de

Linguagem e fonoaudiologia em psicopedagogia / Christiane


Souza de Carvalho. Indaial : UNIASSELVI, 2017.

126 p.: il.


ISBN 978-85-7830-186-6

1. Fonologia.
I. Centro Universitário Leonardo Da Vinci.

Impresso por:
Christiane Regina Souza de Carvalho

Possui graduação em Fonoaudiologia pela


Universidade do Vale do Itajaí (1996), Mestrado em
Distúrbios da Comunicação pela Universidade Tuiuti do
Paraná (2000), Especialização em Linguagem pelo Conselho
Federal de Fonoaudiologia (2002), e Aperfeiçoamento
em Fonoaudiologia Clínica e Hospitalar pelo Hospital
Beneficência Portuguesa (2003). Tem experiência como
fonoaudióloga clínica, hospitalar e em saúde pública,
docência na graduação e pós-graduação,
supervisora de estágio e orientadora de TCC.
Sumário

APRESENTAÇÃO.......................................................................7

CAPÍTULO 1
Linguagem e Fonoaudiologia..................................................9

CAPÍTULO 2
Desenvolvimento Normal de Linguagem.............................19

CAPÍTULO 3
Alterações de Linguagem.....................................................33

CAPÍTULO 4
Alterações de Fala e Voz......................................................65

CAPÍTULO 5
Alterações Auditivas.............................................................85

CAPÍTULO 6
Alterações das Funções Neurovegetativas
ou de Motricidade Oral.........................................................97

CAPÍTULO 7
Alterações de Aprendizagem..............................................113
APRESENTAÇÃO

Seja bem-vindo à disciplina Linguagem, Fonoaudiologia e Psicopedagogia!

Tenho certeza de que ela chamará sua atenção pela variedade de conteúdos.
Alguns até podem ser novidade para você, que talvez nunca tenha tido contato com
a Fonoaudiologia.

Você alguma vez já teve contato com um fonoaudiólogo? Ou talvez já tenha lido
um texto escrito por esse profissional? Ou até mesmo já precisou de acompanhamento
fonoaudiológico, para você, alguém da sua família ou um conhecido?

O fonoaudiólogo adquiriu fama nos últimos tempos por “ensinar as pessoas a


falar ou por fazer exames de audição”. Talvez seja esse conceito que você também
tenha formado.

Mas, a Fonoaudiologia é uma ciência muito mais abrangente, e utiliza diversas


áreas do conhecimento humano para embasar sua prática.

No primeiro capítulo deste caderno, você terá a oportunidade de conhecer um


pouquinho desta profissão e entender por que está tão ligada à Psicopedagogia, de
forma teórica e prática.

Você, que está fazendo esta especialização, provavelmente veio em busca de


novos conhecimentos que possam melhorar ou aperfeiçoar sua prática profissional.
Então vou lhe fazer o seguinte questionamento: Você já parou para pensar que, como
psicopedagogo, você utilizará o conhecimento de outras ciências?

E, neste momento, você já está se questionando: Uma dessas ciências é a


Fonoaudiologia? E por que eu preciso conhecer seus conceitos?

Nesta apresentação, brevemente discutiremos alguns motivos desse estudo,


que serão aprofundados ao longo dos capítulos.

O objeto de estudo do Fonoaudiologia é a linguagem, independente da forma


que se apresente, e você, como psicopedagogo, estará utilizando-se da linguagem
para fazer a mediação entre você e seu aluno ou cliente, e também para orientar as
pessoas com quem irá trabalhar em instituição. Este é o primeiro motivo para termos
uma disciplina que enfoque conteúdos de Fonoaudiologia e Linguagem.
Além disto, na Psicopedagogia você estará lidando com crianças com alterações
de linguagem, que você precisará reconhecer para orientar a família e a instituição. E
para reconhecer o alterado, terá também que conhecer a normalidade.

No segundo capítulo estaremos discutindo o desenvolvimento normal da


linguagem, para então, nos capítulos seguintes, falarmos sobre algumas patologias
fonoaudiológicas, com que você já teve ou terá contato na sua vida profissional.

No final de alguns capítulos, estaremos estudando maneiras de orientar seu


cliente ou seu aluno, e descobrindo também em que situações devemos encaminhá-
lo a um especialista.

Espero que goste da disciplina e que possa aproveitá-la no seu dia a dia
profissional.

A autora.
C APÍTULO 1
Linguagem e Fonoaudiologia

A partir da perspectiva do saber fazer, neste capítulo você terá os seguintes


objetivos de aprendizagem:

 Conhecer a ciência Fonoaudiologia.

 Conhecer a função do fonoaudiógo e suas áreas de atuação.

 Articular a Fonoaudiologia e a Psicopedagogia.

 Diferenciar o papel do fonoaudiólogo e do psicopedagogo.

 Apresentar o conceito de linguagem, fala e voz.

 Aplicar os conceitos de linguagem, fala e voz em casos clínicos.


Linguagem e Fonoaudiologia em Psicopedagogia

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Capítulo 1 Linguagem e Fonoaudiologia

Contextualização
Neste primeiro capítulo, faremos um panorama breve da Fonoaudiologia e
discutiremos a sua relação com a Psicopedagogia.

Você verá que a Fonoaudiologia vai além de “ensinar as pessoas a falar e


fazer exames de audição”, conhecerá suas áreas e locais de atuação e também
seus principais objetos de estudo, como a linguagem, a fala, a voz, a audição e a
deglutição, etc.

Poderemos assim, juntos, entender por que a Psicopedagogia e a Fonoau-


diologia estão intimamente ligadas, e como uma pode ajudar na solução de prob-
lemas da outra.

Para que você possa aprofundar seus conhecimentos a respeito da Fonoau-


diologia, veremos alguns conceitos como linguagem, fala e voz, e como eles são
diferentes quando aparecem em patologias. No dia a dia, parece-nos ser a mesma
coisa, pois falamos, então usamos linguagem e voz.

Mas, quando nos perguntamos se uma criança surda que não fala tem lingua-
gem, nossa primeira resposta seria dizer que não, pois é óbvio, ela não fala, então
não tem linguagem.

Engano nosso, essa criança que não fala expressa sua linguagem das mais
diversas formas, através da linguagem de sinais (libras), através de seu olhar,
seus desenhos, da escrita, etc.

Examinaremos os conceitos, sempre procurando entender como eles inter-


ferem na nossa vida e no nosso entendimento quando estudamos algo ou precis-
amos atender um cliente.

Fonoaudiologia e Psicopedagogia
A idealização da profissão de fonoaudiólogo no Brasil data da década de 30,
e teve origem na preocupação da Medicina e da Educação com a profilaxia, bem
como com a correção de erros de linguagem apresentados pelos escolares.

Nessa época, muitas pessoas acreditavam que todo tipo de sotaque


ou regionalismo era um erro de linguagem, que descendentes de outras
nacionalidades falam errado ao emitirem o som de uma letra ou outras
particularidades, que também os regionalismos, os costumes de uma região,
cultura ou época deveriam ser “limpos” da nossa língua.

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Linguagem e Fonoaudiologia em Psicopedagogia

De lá pra cá, o fonoaudiólogo passou a ser um profissional que se fundamenta


em uma ciência.

Profilaxia: Prevenção de doenças, que se ocupa das medidas


necessárias à preservação da saúde da coletividade. (Moderno
Dicionário da Língua Portuguesa Michaelis). Ou seja, tudo que fosse
diferente de um modelo estabelecido de fala era considerado doença,
que o fonoaudiólogo deveria corrigir.

Mas, o que é afinal Fonoaudiologia? Quais as funções do


fonoaudiólogo? Quais suas áreas de atuação? E, mais importante, qual
a relação e as diferenças entre o fonoaudiólogo e o psicopedagogo?

Você percebeu que a Fonoaudiologia surgiu de uma necessidade na


Educação?

A Fonoaudiologia é a ciência que tem por objeto o estudo da


A Fonoaudiologia é
a ciência que tem comunicação e seus distúrbios. Para tanto, focaliza os processos e
por objeto o estudo aspectos participantes das ações do organismo em ambiente que
da comunicação requeira a comunicação, quais sejam, a linguagem oral e escrita,
e seus distúrbios. a articulação dos sons da fala, a voz, a fluência da fala e a audição.
Para tanto, focaliza (Conselho Federal de Fonoaudiologia, 2007).
os processos
e aspectos
participantes das Você já viu este símbolo? Este é o símbolo da Fonoaudiologia!
ações do organismo
em ambiente Figura 1 – Símbolo da fonoaudiologia
que requeira a
comunicação, quais
sejam, a linguagem
oral e escrita, a
articulação dos
sons da fala, a
voz, a fluência da
fala e a audição.
(Conselho Federal
de Fonoaudiologia,
Fonte: Disponível em: <www.fonoaudiologia.org.br/cffa/index.php/
2007).
simbolo-da-fonoaudiologia>. Acesso em: 29 jan. 2016.
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Capítulo 1 Linguagem e Fonoaudiologia

Se tiver curiosidade sobre a profissão de fonoaudiólogo, você


pode acessar o site do Conselho Federal de Fonoaudiologia: www.
fonoaudiologia.org.br.

Mas apesar de ter uma história antiga, a profissão de fonoaudiólogo só foi


reconhecida por lei em 1981, com a lei nº 6965, de 9 de dezembro de 1981 e pelo
decreto nº 87218, de 31 de maio de 1982.

Fonoaudiólogo é o profissional com graduação plena em Fonoaudiólogo é


Fonoaudiologia, que atua em pesquisa, prevenção, avaliação e o profissional com
terapia fonoaudiológicas na área da comunicação oral e escrita, voz graduação plena em
e audição, bem como em aperfeiçoamento dos padrões da fala e da Fonoaudiologia, que
voz.” (lei nº 6.965, de 9 de dez de 1981, art. 1º, parágrafo único). atua em pesquisa,
prevenção,
avaliação e terapia
Especialidades em Fonoaudiologia: fonoaudiológicas
na área da
 Linguagem comunicação oral
 Voz e escrita, voz e
 Neuropsicologia audição, bem como
em aperfeiçoamento
 Audiologia
dos padrões da fala
 Disfagia e da voz.” (lei nº
 Motricidade oral 6.965, de 9 de dez
 Educacional de 1981, art. 1º,
 Gerontologia parágrafo único).
 Fonoaudiologia neurofuncional
 Fonoaudiologia do trabalho
 Saúde coletiva

Talvez você não conheça alguns desses termos, então, aguce sua
curiosidade! Iremos falar de cada um deles nos capítulos seguintes.

Os locais de atuação do fonoaudiólogo são:

• unidades Básicas de Saúde;


• ambulatório de especialidades;
• hospitais e maternidades;
• consultórios;
• clínicas;
• home care;

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Linguagem e Fonoaudiologia em Psicopedagogia

• domicílios;
• asilos e casas de saúde;
• creches e berçários;
• escolas regulares e especiais;
• instituições de ensino superior;
• empresas;
• meios de comunicação;
• associações;
• ONGs.

Destacamos esses dentre outros que possam advir do trabalho


fonoaudiológico. (CRFa, 2007).

Agora já sabemos o que é Fonaudiologia, e quais as funções


Nos processos
de aprendizagem do fonoaudiólogo, mas qual a sua relação com a Psicopedagogia?
ocorre a transmissão
e apropriação de A Psicopedagogia busca a compreensão sobre os variados
conhecimentos, processos inerentes ao aprender humano, e para que ocorra a
que é perpassado aprendizagem, as pessoas precisam da mediação da linguagem.
pela comunicação,
É através da linguagem que ocorre a aprendizagem, seja linguagem
ou seja, pela
linguagem. falada, gestual, escrita ou visual.

O psicopedagogo necessita compreender os processos de aprendizagem


e entender as possíveis dificuldades situadas nesse processo. Durante esse
processo, ocorre a transmissão e apropriação de conhecimentos, que é
perpassado pela comunicação, ou seja, pela linguagem.

Por mais de uma década a American Speech-Language-Hearing


Association (ASHA) tem publicado artigos, comprovando a relação entre
distúrbios de linguagem e fracasso escolar.

Você está percebendo por que a Fonoaudiologia e a Psicopedagogia


estão intimamente ligadas? E você já parou para pensar o que é a linguagem?
É a mesma coisa que fala e que voz?

É comum as pessoas confundirem esses termos, que usualmente acabam


sendo empregados como sinônimos.

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Capítulo 1 Linguagem e Fonoaudiologia

Atividade de Estudos:

1) Como exercício, elabore um conceito de linguagem: que é


linguagem para você?
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Linguagem, Fala e Voz


Existem inúmeros conceitos de linguagem. Se você fizer uma
A linguagem é um
pesquisa, perceberá que cada autor conceitua linguagem de forma processo complexo
diferente, mas todos têm em comum que a linguagem é um processo que envolve função
complexo que envolve função cerebral e participa da comunicação. cerebral e participa
da comunicação.
A linguagem pode ser verbal ou não verbal. A linguagem verbal A linguagem pode
ser verbal ou não
acontece quando utilizamos as palavras, sejam elas faladas ou escritas.
verbal.
Podemos citar como exemplos um discurso, um diálogo ou uma carta.

Já na linguagem não verbal não utilizamos palavras. É o que podemos


observar em uma placa, um semáforo, gestos e até mesmo no choro do bebê.
Um apito no jogo de futebol, o cartão vermelho e amarelo e uma dança são outros
exemplos de linguagem não verbal.

Alguns exemplos de linguagem não verbal:

Figura 2 - linguagem não verbal

Fonte: Disponível em: <http://images.google.com.br/images?client=firefox-a&rls=org.


mozilla%3Apt-BR%3Aofficial&hl=pt-BR&source=hp&q=linguagem+n%C3%A3o+ve
rbal&btnG=Pesquisar+imagens&gbv=2&aq=f&oq=>. Acesso em: 10 ago. 2009.

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Linguagem e Fonoaudiologia em Psicopedagogia

Quando nos comunicamos, geralmente usamos a linguagem verbal e a não


verbal juntas, com palavras, expressões da nossa face e gestos.

Vejamos alguns conceitos:

Linguagem é um sistema de comunicação natural ou artificial,


humano ou não-humano. Assim, podemos nos referir à
linguagem corporal (humana), às expressões faciais, às
reações do nosso organismo (tanto aos estímulos do meio,
como do nosso pensamento, ou, mesmo, dos aspectos
fisiológicos), à linguagem de outros animais, aos sinais de
trânsito, à música, à maneira de nos vestirmos, à pintura,
enfim, todos os meios de comunicação, sejam cognitivos
(internos), socioculturais (relativos ao meio) ou da natureza,
como um todo (FERNANDES, 1998, p.10).

Halliday (1978) diz que a linguagem é um produto do processo de socialização,


pois a criança inicialmente cria sua própria linguagem, e depois a língua materna
na interação com seu grupo social. Quando a criança aprende a linguagem, ela
está construindo sua noção da realidade externa e interna e, ao mesmo tempo,
aprendendo coisas através da linguagem.
A língua é uma
construção
unicamente Já a língua é um sistema abstrato de regras gramaticais. É através
humana, constituída dela que podemos mais facilmente transmitir as informações. A língua é
por um povo. Ou formada por palavras e regras gramaticais.
seja, a língua é o
idioma falado por A língua é uma construção unicamente humana, constituída por
um povo.
um povo. Ou seja, a língua é o idioma falado por um povo.

Em algumas línguas como o inglês, há apenas uma palavra para


designar língua e linguagem (language), mas, mesmo em português,
em que existem vocábulos diferentes para designar os conceitos de
língua e linguagem, fazemos confusão. Também encontramos dois
termos em francês (langage/langue) e em espanhol (lengaje/lengua).

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Capítulo 1 Linguagem e Fonoaudiologia

Atividade de Estudos:

1) Qual a principal diferença entre língua e linguagem? Cite um


exemplo.
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A unidade mínima da comunicação linguística é o ato da fala, ou


A fala é a
seja, a produção de uma frase sob certas condições (ou de um grupo materialização da
de frases em um determinado contexto). linguagem e da
língua, ou seja, é
Então a fala é a materialização da linguagem e da língua, ou seja, a utilização da voz
é a utilização da voz com palavras e significados. A fala é a utilização com palavras e
significados.
da língua articulada com todo o aparato anatômico e fisiológico das
estruturas do corpo humano.
Voz é o som
produzido pela
Voz é o som produzido pela vibração das pregas vocais (também
vibração das pregas
conhecidas como cordas vocais) na laringe, pelo ar vindo dos vocais na laringe,
pulmões. Cada pessoa tem uma voz diferente. Podemos notar alguma pelo ar vindo dos
semelhança de voz entre familiares, mas as vozes não são exatamente pulmões.
iguais, em virtude da anatomia de cada laringe.

Atividade de Estudos:

1) Vamos então ver se entendemos! Escreva o que é linguagem,


fala e voz.
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Linguagem e Fonoaudiologia em Psicopedagogia

Algumas Considerações
Podemos considerar que a linguagem é a base para a comunicação. Não
adianta falarmos ou termos voz, se não desenvolvemos a linguagem. A linguagem
expressa a forma como nos comunicamos com os outros e com o mundo.

Para a fala ter sentido, utilizamos a língua. Podemos falar sons combinados
que não significam nada, e esses sons não deixariam de ser fala, mas a outra
pessoa não nos entenderia.

E por fim, a voz é o som que fazemos quando usamos a fala e a linguagem.
Ela só é possível de ser produzida porque temos um aparato anatômico e
fisiológico preparado para isso no nosso corpo.

Podemos assim perceber que esses conceitos que parecem tão semelhantes
vão fazer diferença, principalmente quando estudamos as patologias.

Uma professora que está rouca porque forçou demais a voz não está com um
problema de fala ou de linguagem, mas sim de voz, porque suas pregas vocais
não estão cumprindo seu papel fisiológico para que essa professora possa falar.

E uma criança em idade escolar que não fala não tem um problema de voz,
e sim de linguagem, pois é a forma de ela se comunicar com os outros e com o
mundo que está com déficit e não apenas uma alteração das pregas vocais.

Nos próximos capítulos estaremos falando mais a respeito desses conceitos.

Referências
BRASIL. Lei no 6.965, de 9 de dezembro de 1981. Dispõe sobre a
regulamentação da profissão de Fonoaudiólogo, e determina outras providências.
Diário Oficial da União. Brasília: 1981.

CFFa. Conselho Federal de Fonoaudiologia. Disponível em: <www.


fonoaudiologia.org.br>. Acesso em: 15 jan. 2016.

CRFa. Conselho Regional de Fonoaudiologia: 2º Região. Disponível em: <www.


fonosp.org.br>. Acesso em: 15 jan. 2016.

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C APÍTULO 2
Desenvolvimento Normal de
Linguagem

A partir da perspectiva do saber fazer, neste capítulo você terá os seguintes


objetivos de aprendizagem:

� Descrever o desenvolvimento normal de linguagem.

� Examinar as fases de desenvolvimento de linguagem na criança.

� Relatar a sequência de aquisição fonética e fonológica na criança.

� Valorizar a fase crítica de desenvolvimento de linguagem para a criança.


Linguagem e Fonoaudiologia em Psicopedagogia

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Capítulo 2 Desenvolvimento Normal de Linguagem

Contextualização
Você sabe como a criança desenvolve a linguagem? Com certeza, você já estudou
isso como pedagogo(a), e já deve ter se perguntado, muitas vezes, se esta ou aquela
criança estaria com o desenvolvimento de linguagem adequado para a sua idade.

Quando nos deparamos com uma criança que troca ou omite sons na fala,
procuramos saber se ela já não deveria estar falando corretamente ou se aquele
tipo de troca ainda é normal para a sua idade.

O desenvolvimento de linguagem é muito complexo, e depende de O desenvolvimento


muitos fatores: orgânicos, ambientais, sociais, etc. de linguagem é
muito complexo, e
É difícil entender, por exemplo, por que uma criança que tem o depende de muitos
biológico e o cognitivo adequados não fala na idade em que já deveria fatores: orgânicos,
ambientais, sociais,
estar falando.
etc.

Ou por que aquela criança que não consegue manter uma comunicação com
outra pessoa, nem mesmo para expressar suas necessidades, decora listas de
nomes de rua ou números de telefone.

Nós veremos, neste segundo capítulo, que cada criança é única, e vai
desenvolver a linguagem da sua maneira e no seu tempo, mas que existem
marcos nesse desenvolvimento que nos mostram se ele está ocorrendo dentro do
esperado ou não.

Veremos, também, como a interação com o outro é importante nesse


processo, e que quando a criança tem o aparato físico adequado, a interação é
que faz toda a diferença.

Conhecendo o desenvolvimento normal de linguagem, conseguimos perceber


quando algo não vai bem nesse processo, e poderemos mais cedo tomar atitudes
que minimizem os transtornos para a criança e sua família.

Linguagem
Conforme conversamos, você, como profissional da educação e saúde,
necessitará conhecer o desenvolvimento normal da linguagem.

21
Linguagem e Fonoaudiologia em Psicopedagogia

Mas por quê? Não me basta identificar as patologias de linguagem? Aqui é


que está o X da questão... como você irá identificar o patológico sem conhecer a
normalidade? Você concorda comigo?

Então começaremos com alguns pontos importantes a serem discutidos:

• A linguagem tem dois grandes papéis, segundo Vygotsky (1896-1934)


A linguagem tem
dois grandes papéis: e Luria (1902-1977): o de organizadora da cultura e o de organizadora
o de organizadora dos processos mentais superiores.
da cultura e o de
organizadora dos
processos mentais • Cada criança tem seu próprio tempo para desenvolver as
superiores. habilidades linguísticas, mas todas seguem um mesmo padrão de
desenvolvimento, então temos marcos de desenvolvimento, se
acreditarmos que o desenvolvimento da criança é fruto do biológico e
da interação com seu meio sociohistórico (VYGOTSKY, 1987).

• O desenvolvimento se constrói com a participação ativa da criança.

• É a partir da linguagem que o homem constrói formas superiores de


comportamento, que passa da relação direta com a natureza a uma
relação mediada pelos signos socialmente compartilhados, que passa do
mundo concreto ao simbólico (SILVEIRA, 1998).

Nossa, quanta coisa! É mesmo! Este capítulo é a base para


os seguintes. É ele que dará suporte para que você entenda as
próximas aulas.

Como a linguagem seria, então, organizadora da cultura?

O homem, segundo Vygotsky, é capaz de pensar, planejar, agir e


O homem pode,
através da transformar a natureza com o uso de instrumentos, criados por ele
linguagem, lidar e passados às gerações seguintes, e principalmente por causa da
com situações
passadas, presentes linguagem, que lhe permite passar esses conhecimentos de geração
e futuras, passando em geração. O homem pode, através da linguagem, lidar com situações
do concreto ao passadas, presentes e futuras, passando do concreto ao simbólico.
simbólico.

22
Capítulo 2 Desenvolvimento Normal de Linguagem

OK! Entendemos que, a partir do desenvolvimento da


linguagem, cada criança que nasce não precisa descobrir o
fogo, por exemplo, pois os conhecimentos são passados, pela
linguagem oral e escrita, de geração em geração.

Mas como a linguagem teria o papel de organizadora dos processos mentais


superiores e quais são os processos mentais superiores?

Segundo Luria (1979), os processos mentais superiores são a atenção,


a percepção, a memória, o movimento, o pensamento e a linguagem, sendo a
linguagem a organizadora dos processos cognitivos.

A linguagem cria um universo simbólico. Eu não preciso estar


vendo uma praia paradisíaca para desejar estar nela, ou para
conseguir imaginá-la através de uma gravura ou da descrição do
agente de viagem.

E é através da palavra que organizamos nossas experiências e aprendizados.

Atividade de Estudos:

1) Como a linguagem pode ser organizadora da cultura? Dê um


exemplo.
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Linguagem e Fonoaudiologia em Psicopedagogia

“O elemento fundamental da linguagem é a palavra. A palavra designa


as coisas, individualiza suas características. Designa ações, relações, reúne
objetos em determinados sistemas. Dito de outra forma, a palavra codifica nossa
experiência.” (LURIA, 1987, p. 27).

A palavra é o componente essencial da linguagem e também da fala, que é


um meio especial de comunicação, como já discutimos no capítulo anterior.

Atividade de Estudos:

1) Tente explicar para você mesmo, pode ser mentalmente, o


caminho da sua casa até o trabalho, sem palavras. Agora tente
imaginar como você contaria a um amigo como foi a festa de
aniversário ontem à noite, sem usar as palavras.
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Desenvolvimento De Linguagem
É por meio da fala É por meio da fala do adulto que a criança começa a desenvolver
do adulto que a sua própria linguagem.
criança começa a
desenvolver sua
própria linguagem. Silveira (1998) descreve as fases de desenvolvimento da linguagem,
e também da sua organização frente ao mundo, como dependente da
mediação da fala do adulto, baseada em Vygostsky, sendo que não determina
idades para cumprir determinadas funções, e sim marcos de desenvolvimento:

Quando dizemos à criança “olha a bola”, “pega a outra bola”,


“chuta a bola”, “olha a bola grande”, “veja quantas bolas
coloridas”, estamos fazendo com que oriente sua ação de
determinadas formas, nesse caso: olhar, pegar, chutar, observar,
perceber. Estamos fazendo com que desenvolva uma capacidade
de orientar seu comportamento. Em primeiro lugar, destaca-se

24
Capítulo 2 Desenvolvimento Normal de Linguagem

um objeto frente a vários outros, ou seja, educa-se a atenção


ao fazer com que a criança selecione um estímulo específico e
torne-o relevante dentro de um determinado quadro perceptivo.
Em segundo lugar, o fato de designar um objeto sempre pelo
mesmo significante, no caso bola, faz com que a criança abstraia
suas características essenciais (objeto esférico) e as separe dos
seus atributos variáveis (cor, tamanho, textura, material e outros),
generalizando e estabilizando sua percepção. (SILVEIRA, 1998,
p. 41).

Dessa maneira, podemos perceber que aprender a falar não


Aprender a falar
é só aprender a articular sons ou aprender palavras novas, mas sim não é só aprender
conhecer e organizar o mundo que cerca a criança. E é através da a articular sons ou
aprender palavras
fala do adulto, e da sua própria fala, que ela organiza seus processos novas, mas sim
mentais, como vimos anteriormente. conhecer e organizar
o mundo que cerca a
criança.
Vejamos no quadro 1 o que acontece com a linguagem, enquanto
a criança interage com o adulto.

Quadro 1 – A fala como reguladora da conduta


A criança ainda não fala.
1º momento
É a fala do adulto que orienta o comportamento da criança.
A criança começa a falar as primeiras palavras, mas só nomeia o que vê (fala dirigi-
2º momento
da para o presente) ou ações que acabaram de acontecer (passado recente).
A criança fala enquanto age, é a “fala egocêntrica” que se constitui num exercício de
3º momento autorregulação.
É a fala se internalizando.
A criança fala antes de agir (fala dirigida para o futuro).
A fala se internalizou.
4º momento
A fala se converte em instrumento de planejamento e organização do próprio
comportamento.
Fonte: Silveira (1998, p. 42).

Exemplo do quadro 1 é o desenho infantil. No início, a criança


só o nomeia após tê-lo terminado. Num segundo momento, ela o vai
nomeando e organizando enquanto desenha e, por último, nomeia
antes de desenhar, caracterizando a função planejadora da linguagem.

Por volta de 1 ano e meio, 1 ano e 8 meses, a palavra começa a adquirir o


caráter de substantivo, passando a ter uma significação mais precisa. Isso faz

25
Linguagem e Fonoaudiologia em Psicopedagogia

com que a criança tenha necessidade de mais palavras para diferentes objetos,
provocando um aumento quantitativo no seu vocabulário.

Antes, um mesmo som podia significar várias coisas, tendo a criança que
estar realizando as suas ações para o entendimento de sua fala.

Inicialmente, a criança faz maior uso dos substantivos, verbos e adjetivos


(mamãe, caiu, grande).

Atividade de Estudos:

1) Dê um exemplo de atividade infantil, caracterizando os 4 momentos


de desenvolvimento descritos por Silveira no quadro 1.
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Em um segundo momento, a partir da reflexão das relações estabelecidas


entre objetos do mundo que a cerca, começa a incluir preposições, pronomes,
conjunções, advérbios, etc., como mostra o quadro 2.

Quadro 2 – Desenvolvimento linguístico da fala infantil


1º momento A criança faz uso basicamente de substantivos, verbos e adjetivos.
A criança amplia seu vocabulário, passando a fazer uso também de prepo-
2º momento
sições, pronomes, conjunções, advérbios, etc.

Fonte: Silveira(1998, p. 43).

A Importância Do Modelo Do Adulto


As fases do desenvolvimento linguístico, propostas por Luria (1979), nos
mostram a importância do modelo do adulto no desenvolvimento da linguagem da
criança. São elas: repetição, nomeação e fala narrativa.

26
Capítulo 2 Desenvolvimento Normal de Linguagem

Por volta de 1 ano de idade, quando começa a falar as primeiras palavras, a


criança depende totalmente do modelo do adulto para realizar suas emissões. É a
etapa da repetição.

Por volta de 1 ano e 6 meses, desenvolve-se a nomeação. Nessa fase, se


pedirmos para uma criança contar uma estória seguindo um livro, ela irá virar as
páginas e apenas nomear as gravuras.

A terceira etapa, a da fala narrativa, introduz a frase.

Até então, a criança usava a palavra-frase, uma palavra designando uma


ação. Por exemplo: bola poderia significar me dá a bola.

O quadro 3 nos mostra os três momentos do desenvolvimento de linguagem:

Quadro 3 – Desenvolvimento da linguagem expressiva


1º momento Repetição: necessidade do modelo do adulto.
Nomeação: estabilização dos significados; diferenciação da percepção; uso de pala-
2º momento
vra-frase.
Fala narrativa: formação de frases; introdução de elementos de encadeamento
3º momento (preposições, conjunções, pronomes, advérbios, etc.); expressão de pensamento e
julgamentos.

Fonte: Silveira(1998, p. 44).

Etapas do Desenvolvimento de
Linguagem
Além de estudar o desenvolvimento da linguagem como ocorrendo de forma
processual e ativa por parte da criança, também precisamos ter ideia das etapas
de desenvolvimento da linguagem de forma cronológica, para que tenhamos um
parâmetro, quando nos depararmos com uma criança em fase de aquisição de
linguagem.

...a linguagem aparece em todas as crianças normais em


marcos cronológicos muito semelhantes. A aquisição da
linguagem e a comunicação se desenvolvem segundo etapas
de ordem constante, ainda que o ritmo de progressão possa
variar de um sujeito para outro. Segundo o processo normal
de desenvolvimento pode-se esperar uma variação de seis
meses aproximadamente. (CRYSTAL, 1981 apud DEL RIO;
VILASECA, 1992, p. 22).

27
Linguagem e Fonoaudiologia em Psicopedagogia

Olharemos para o quadro de desenvolvimento de linguagem não como uma


regra pré-fixada, em que todas as crianças terão que seguir as idades indicadas.
Mas poderemos, se tivermos o quadro em mente, perceber se esta criança está
com seu desenvolvimento de linguagem alterado.

A classificação de categorias por idade, listadas a seguir, é baseada no


protocolo utilizado na Clínica Uni Duni Tê, em Brusque, SC.

De 1 ano a 1 e 6 meses

1. Usa uma palavra com sentido, como “dá”, ou alguma produção verbal
referente a uma palavra, quando deseja algum objeto;
2. A criança bate palmas, manda beijo, dá tchau;
3. A criança compreende ordens simples;
4. A criança executa ordens simples;
5. Fala pelo menos uma palavra com sentido, parte do corpo, nome de um
animal, nome de um alimento;
6. A criança brinca simbolicamente;
7. A criança aceita a intervenção do outro na brincadeira;
8. A criança apresenta intenção comunicativa.

De 1 e 6 meses a 2 anos

1. A criança une de duas a três palavras em uma frase;


2. Fala durante a brincadeira, referindo-se a acontecimentos imediatos;
3. Pede coisas de seu desejo com palavras;
4. Reconhece e fala partes do corpo;
5. Usa o pronome EU;
6. Diz oi e tchau;
7. Fala o nome de alguns objetos de casa, brinquedos, ou alimentos;
8. Usa sons onomatopéicos na brincadeira ou para se referir ao nome
dos objetos;
9. As ações simbólicas são efetivas;
10. A criança tem o outro como um parceiro de troca na brincadeira;
11. Tem interesse por pequenas histórias e mantém atenção às mesmas;
12. Interessa-se por figuras.

De 2 a 3 anos

1. Usa frases com mais de três palavras sobre situações do dia a dia ou
situações presentes;
2. Compreende ordens gramaticais;

28
Capítulo 2 Desenvolvimento Normal de Linguagem

3. Usa efetivamente pronomes, principalmente o “EU”, há presença de


outros pronomes;
4. Diz seu próprio nome;
5. Usa o plural;
6. Seu vocabulário abrange 100 a 200 palavras;
7. Segue ordens complexas;
8. Faz perguntas;
9. Usa recorte da fala do outro como organizadora de sua linguagem;
10. A criança é capaz de relatar pequenos fatos, principalmente acontecimentos
imediatos;
11. É capaz de narrar fatos do passado com o auxílio do adulto;
12. A criança já é capaz de ampliar a brincadeira e nestas inventar contextos
simbólicos;
13. A fala da criança é inteligível.

3 a 4 anos e meio

1. A criança é capaz de narrar fatos passados sem o auxílio do adulto;


2. É capaz de narrar fatos com coerência de acontecimentos e coesão de idéias;
3. A criança compreende onde, quando;
4. O simbolismo é usado referenciando eventos passados e futuros;
5. Faz comentários sobre acontecimentos;
6. Toma a iniciativa para relatar eventos e ações;
7. As aquisições cognitivas estão presentes em seu discurso, classificação,
noção temporal, noção de tamanho, conhecimento sobre funções.

Atividade de Estudos:

1) O que podemos considerar como individual de cada criança no


desenvolvimento de linguagem?
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Linguagem e Fonoaudiologia em Psicopedagogia

Aquisição dos Fonemas


Também é importante termos ideia da sequência de aquisição de fonemas
(sons), no vocabulário brasileiro, por parte das crianças, para que possamos
perceber por exemplo, se aquele /r/ que a criança está trocando por /l/ ainda está
em período de aquisição ou já deveria ter sido adquirido.

Lembremos que, dentro de um mesmo idioma, ocorrem variações articulatórias.


O que pode parecer inadequado em uma região é o adequado em outra. Temos
como exemplo o sotaque alemão nas cidades colonizadas pelos alemães.

Com base em estudos de Wertzner (2000) apud Castro (2006),


Sobre a aquisição
dos fonemas, a sobre a aquisição dos fonemas, a maioria deles já está adquirida aos
maioria deles já está três anos e meio, como: /p b t d k g f v s z l j r m n nh x/. Outros são
adquirida aos três
anos e meio, como: adquiridos aos 5 anos, como o R de carro.
/p b t d k g f v s z l j
r m n nh x/. Outros Os encontros consonantais que terão sido adquiridos aos 4 anos
são adquiridos aos 5
anos, como o R de são: /pr br kr gr vr gl/; dos 4 aos 6: /dr fr kl fl/; aos 5 anos: /tr/; dos 5 aos
carro. 6: /bl/ e aos 6 anos e meio: /pl/.

Claro que não é tão simples assim observar a fala de uma criança e dizer se ela
está no processo normal de desenvolvimento de fala ou não, já que são muitas as
variações e condições dependentes para que este processo aconteça.

Algumas Considerações
Como vimos, segundo Vygotsky (1896-1934) e Luria (1902-1977), a
linguagem tem dois grandes papéis: o de organizadora da cultura e o de
organizadora dos processos mentais superiores.

Graças à linguagem, o homem pode passar informações e conhecimentos


de geração em geração, e também lidar com situações passadas, presentes e
futuras, com a passagem do concreto ao simbólico.

Vimos também que aprender a falar não é só aprender a articular sons ou


aprender palavras novas, mas sim conhecer e organizar o mundo que nos cerca.

Por isso, a interação torna-se tão importante: é através desta com o


adulto que a criança desenvolve a linguagem e organiza os seus processos
mentais superiores, além de aprender a falar ou comunicar-se de outra forma

30
Capítulo 2 Desenvolvimento Normal de Linguagem

na impossibilidade de utilização da linguagem oral, como, por exemplo, com a


utilização da língua de sinais.

Podemos considerar como fases de desenvolvimento linguístico a repetição,


a nomeação e a fala narrativa, sendo que essas fases são dependentes da
interação da criança com o adulto.

Além de estudar o desenvolvimento da linguagem como ocorrendo de forma


processual e ativa por parte da criança, também precisamos ter ideia das etapas
de desenvolvimento da linguagem de forma cronológica, para que tenhamos um
parâmetro, quando nos depararmos com uma criança em fase de aquisição de
linguagem.

Existem marcos importantes no desenvolvimento linguístico, que podem variar


em detalhes de autor para autor, mas acabam seguindo mais ou menos a mesma
ordem, e podemos considerar que de 1 ano a 1 e 6 meses, a criança usa uma
palavra com sentido, como “dá”, ou alguma produção verbal referente a uma palavra,
quando deseja algum objeto. De 1 ano e 6 meses a 2 anos, a criança une de duas
a três palavras em uma frase; já dos 2 aos 3 anos, ela usa frases com mais de três
palavras sobre situações do dia a dia ou situações presentes; e dos 3 aos 4 anos e
meio, a criança é capaz de narrar fatos passados sem o auxílio do adulto.

Também é importante termos ideia da sequência de aquisição de fonemas


(sons), no vocabulário brasileiro, por parte das crianças, para que possamos
perceber por exemplo, se aquele /r/ que a criança está trocando por /l/ ainda está
em período de aquisição ou já deveria ter sido adquirido.

Este capítulo, como dissemos anteriormente, serve de base para os


próximos, em que iremos estudar as patologias de linguagem.

Referências
CASTRO, M. M. Distúrbio Fonológico. In: Cadernos do Fonoaudiólogo:
Linguagem. São Paulo: Lovise, 2006.

DEL RIO, M. J.; VILASECA, R. Sobre a aquisição e desenvolvimento da


linguagem. In: CASANOVA, J.P. Manual de Fonoaudiologia. Porto Alegre: Artes
Médicas, 1992. p. 22.

31
Linguagem e Fonoaudiologia em Psicopedagogia

LURIA, A. R. El cérebro em acción. Barcelona, Editorial Fontanella, S.A.: 1979.


_____. Pensamento e linguagem: as últimas conferências de Luria. Porto
Alegre, Artes Médicas: 1987.

MORGOF, K.; BISHOP, D. Desenvolvimento da Linguagem em condições


normais. In: Desenvolvimento da Linguagem em circunstâncias
excepcionais. Rio de Janeiro: Revinter, 2002. p. 19.

SILVERIA, V. P. Linguagem: Cultura, Fala e Cognição – Um estudo da


contribuição de Vygotsky e Luria. In: Revista da Sociedade Brasileira de
Fonoaudiologia – ano 2 – nº4, dez. 1998, p. 41- 44.

VYGOTSKY, L. S. Pensamento e Linguagem. São Paulo: Martins Fontes, 1987.

32
C APÍTULO 3
Alterações de Linguagem

A partir da perspectiva do saber fazer, neste capítulo você terá os seguintes


objetivos de aprendizagem:

� Conhecer o conceito de atraso no desenvolvimento da


linguagem, e de desvio fonológico e fonético.

� Apontar os sintomas do atraso no desenvolvimento da linguagem, do desvio


fonológico e fonético.

� Conhecer os conceitos de gagueira, afasia e autismo.

� Apontar os sintomas da gagueira, afasia e autismo.

� Aplicar as orientações práticas para a escola e família.


Linguagem e Fonoaudiologia em Psicopedagogia

34
Capítulo 3 Alterações de Linguagem

Contextualização
Podemos considerar que o trabalho, a linguagem e a vida humana estão
intimamente relacionados, não podendo ser concebidos de forma independente
das vivências humanas e de um processo constante de reelaboração e
transformação do estabelecido (VARGENS, 2006).

Para Bakhtin (1979, 1929), apud Vargens, 2006, a língua não é vista
como mera estrutura, concebendo-a a partir do seu uso concreto. Para o autor,
a linguagem está diretamente relacionada à ação sobre o outro e se tem no
enunciado uma constante resposta aos enunciados do outro e aos seus próprios
enunciados. O sujeito, para expressar-se, considera a reação de seu co-
enunciador ao que lhe está sendo dito e isso influencia sua fala.

Poderemos perceber, ao longo deste terceiro capítulo, essas características


da linguagem na criança, principalmente nas patologias, em que esses processos
ficam bastante explícitos, no momento, por exemplo, em que uma criança não
considera o outro como seu interlocutor, no caso do autismo, ou como a expressão
de estranhamento na face dos pais de uma criança que troca os fonemas na fala
faz com que a mesma (a criança) tente corrigir sua fala e aproximar-se do modelo
dado pelo adulto.

Com este capítulo iniciamos o estudo sobre as patologias fonoaudiológicas


relacionadas com a linguagem, como atraso no desenvolvimento de linguagem,
desvio fonético e fonológico, afasia, gagueira, e autismo.

Este texto não tem o objetivo de prepará-lo para atender terapeuticamente


uma patologia fonoaudiológica, mas, sim, dar noções básicas e gerais sobre
algumas patologias, cujo tratamento é de competência do fonoaudiólogo, mas
que podem aparecer no seu percurso profissional.

Afinal, as pessoas não vêm repartidinhas em pedacinhos, este pedacinho


vai ao fono, este pedacinho ao psicopedagogo e este pedacinho ao pediatra...
Poderíamos até achar graça desse exemplo, mas ele nos faz pensar que
em nossa profissão lidamos com pessoas e não com patologias. Por isso, é
responsabilidade de todos saber e dar resolubilidade às demandas do nosso
cliente. E essa resolubilidade pode acontecer através de uma orientação ou até
mesmo de um encaminhamento a outro profissional, mas temos que saber a que
profissional encaminhar, certo?

35
Linguagem e Fonoaudiologia em Psicopedagogia

Atraso no Desenvolvimento de
Linguagem
Para falarmos de atraso no desenvolvimento de linguagem, teremos que
considerar que a linguagem não pode se desenvolver separadamente dos
aspectos orgânicos, emocionais, cognitivos e sociais, e que ela só tem significado
em relação ao contexto em que se manifesta (CERVONE; FERNANDES, 2005).

Estudos mostram que até o 15º mês de vida as crianças usam principalmente
os gestos e que estes, por volta dessa idade, são substituídos pela fala.

Aos dois anos, a criança desenvolve estratégias mais elaboradas para


expressar seu repertório linguístico, que já se encontra mais desenvolvido devido
à aquisição de regras semânticas e sintáticas.

Dos dois aos três anos, as crianças demonstram maior significação linguística
através de revisões do discurso, e ocorrem então trocas rápidas no tópico do
mesmo.

Aos quatro anos, já é capaz de adaptar seu discurso à idade do ouvinte,


começa a produzir sentenças indiretas e aos cinco anos já possui padrão
linguístico semelhante ao do adulto (CERVONE; FERNANDES, 2005).

Em pesquisa realizada com crianças de 4 e 5 anos, percebeu-se que

As crianças mais novas chamavam a atenção da avaliadora


na maior parte do tempo, pediam sua afirmação ou atenção
nas atividades. As crianças mais velhas pareciam mais
independentes... as crianças maiores não apresentaram as
funções de exibição, pedido de consentimento e pedido de
rotina social, que são funções mais interativas e que requerem
maior atenção e participação do ouvinte. Por outro lado, as
crianças mais velhas contavam histórias, suas e dos livrinhos
disponíveis (CERVONE; FERNANDES, 2005, p. 104).

Por que voltamos ao ponto do desenvolvimento de linguagem? - você poderia


me perguntar. Porque, de forma bem sucinta e até reducionista, poderíamos
dizer que a criança que aos dois anos não estiver expressando-se verbalmente,
que aos três não faça troca de turno com seu interlocutor ou que aos cinco
não estiver utilizando a linguagem em todas as suas formas, terá um atraso no
desenvolvimento de linguagem.

36
Capítulo 3 Alterações de Linguagem

Troca de turno com interlocutor: duas pessoas conversando são


dois interlocutores. A passagem da fala de um para o outro é a troca
de turno de interlocutores.

Simples assim? Não!

Teremos que considerar vários aspectos, como já vimos no início do capítulo.

Vejamos algumas nomenclaturas:

Atraso: a progressão da linguagem processa-se na sequência


correta, mas em ritmo mais lento, sendo o desempenho semelhante
ao de uma criança de idade inferior.

Dissociação: existe uma diferença significativa entre a evolução


da linguagem e a das outras áreas do desenvolvimento.

Desvio: o padrão de desenvolvimento é mais alterado, verifica-


se uma aquisição qualitativamente anômala da linguagem. É um
achado comum nas perturbações do espectro autismo. (SCHIMER
et al., 2004).

Se levarmos esses conceitos em consideração, podemos então Uma criança


com atraso no
dizer que uma criança com atraso no desenvolvimento de linguagem
desenvolvimento de
é aquela que se apresenta em uma fase do desenvolvimento de linguagem é aquela
linguagem não condizente com sua idade, mas que as características que se apresenta
que está apresentando não são diferentes da linguagem de uma em uma fase do
criança mais nova. Ou seja, ela está no processo de desenvolvimento desenvolvimento
de linguagem, só que atrasada. de linguagem não
condizente com sua
idade, mas que as
Parece redundante, mas, para ficar mais claro, vamos aos características que
sintomas: está apresentando
não são diferentes da
linguagem de uma
criança mais nova.

37
Linguagem e Fonoaudiologia em Psicopedagogia

• a criança compreende, mas não fala, ou sua fala é ininteligível;

• geralmente, não tem deficiência auditiva, deficiência mental, transtorno


global do desenvolvimento, ausência dos órgãos fonoarticulatórios;

• geralmente sua brincadeira também é bastante empobrecida, em


decorrência da ausência ou deficiência de interação com o adulto;

• quando quer pedir algo, aponta ou leva o adulto até o objeto desejado;

• fica nervosa ou furiosa quando não é atendida.

Uma criança com uma patologia associada que irá interferir no desenvolvimento
de linguagem, como surdez, paralisia cerebral, autismo, etc., também pode apresentar,
e é bem provável que apresente, um atraso no desenvolvimento de linguagem, mas
nesse caso não diremos que é um atraso simples no desenvolvimento de linguagem,
e sim associado à patologia causadora.

O atraso no desenvolvimento de linguagem não significa ausência


da fala ou fala distorcida. Exemplo: é possível que uma criança com
fisssura labiopalatal tenha algumas características de fala como fala
soprosa e/ou nasalisada. Mas isto não caracteriza um atraso de
linguagem, ela pode desenvolver a linguagem no tempo esperado.

Por que uma criança Se pensarmos no atraso de desenvolvimento de linguagem em


irá pedir algo falando uma criança com desenvolvimento global adequado para sua idade,
se, quando ela sem patologias associadas, poderíamos arriscar dizer que as possíveis
aponta, ganha de causas desse atraso seriam a diminuição ou a ausência de estímulos, a
imediato o objeto de superproteção familiar, a deficiência na interação entre adulto e criança
seu desejo? Você
e a falta de limites dos pais para a criança.
falaria?

Vejamos o seguinte: por que uma criança irá pedir algo falando se, quando
ela aponta, ganha de imediato o objeto de seu desejo? Você falaria?

“Por que eu vou falar? Se eu chorar todos vão me dar atenção e vão fazer o
que eu quero”.

38
Capítulo 3 Alterações de Linguagem

Atividade de Estudos:

1) Caracterize uma criança com atraso no desenvolvimento de


linguagem.
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a) Orientações para pais e professores de crianças com atraso no


desenvolvimento de linguagem

O fonoaudiólogo irá acompanhar essa criança, sua família e a escola; e você


poderá auxiliar neste processo de orientação, seja na instituição ou na clínica.

A valorização da criança enquanto interlocutor e da linguagem


enquanto meio de conhecer e atuar no mundo são tão
essenciais para o desenvolvimento da linguagem quanto
o oferecimento de padrões de fala corretos e hábitos orais
adequados. (FERNANDES, 1998, p. 24).

Para que a pessoa que estamos orientando entenda o que deve ser feito,
precisamos primeiro dar uma breve noção do desenvolvimento de linguagem,
como acontece e a melhor forma de estimulá-la.

Precisamos explicar que a criança aprende, inclusive, a falar,


através da brincadeira; que nós, adultos, aprendemos estudando, Devemos orientar esta
lendo, conversando com um amigo, etc., mas que a criança só aprende família a sentar-se na
brincando e interpretando as coisas do dia a dia através da brincadeira. altura da criança e
brincar com ela, com
brincadeiras de faz
Devemos orientar esta família a sentar-se na altura da criança e
de conta (casinha,
brincar com ela, com brincadeiras de faz de conta (casinha, fazenda, fazenda, posto de
posto de gasolina,etc) , que estimulam a criança a falar, mesmo que gasolina,etc) , que
seja apenas o som das coisas e dos animais. estimulam a criança a
falar, mesmo que seja
apenas o som das
coisas e dos animais.

39
Linguagem e Fonoaudiologia em Psicopedagogia

O adulto deve falar corretamente com a criança, para que o modelo adequado
de fala seja dado a ela, evitando usar diminutivos, pois repetir casa é mais fácil do
que repetir casinha e pé do que pezinho.

Quando a criança pede as coisas apontando, não entregar imediatamente.


Sempre perguntar o que ela quer, dando duas opções de resposta, por exemplo, “o que
você quer? É o pão ou a bolacha? Porque, se apenas perguntamos o que ela quer, no
início da aquisição da linguagem, a criança pode não saber a palavra correspondente
àquele objeto, mas se dermos o modelo fica mais fácil para que ela repita.

Precisamos também explicar que não é na primeira emissão de fala que


a criança irá falar a palavra corretamente, por exemplo, para bolacha, ela vai
começar falando “bo” ou “acha”. E que isto é o processo de aquisição normal,
mesmo que ela seja uma criança mais velha.

Desvio Fonético e Fonológico


Segundo Castro (2006, p. 33), “A aquisição dos sons da língua ocorre
naturalmente e sem dificuldades, entretanto, para algumas crianças, essa tarefa é
árdua. Trata-se das crianças que possuem o distúrbio fonológico”.

A aquisição dos A aquisição dos fonemas segue padrões universais, e cada criança
fonemas segue apresenta suas características individuais. A criança é ativa durante todo
padrões universais, o processo, e é comum ocorrerem vários processos fonológicos (erros
e cada criança que acontecem durante a aquisição, que são normais) simultaneamente,
apresenta suas sendo a fase de maior uso produtivo até os 4 anos.
características
individuais. Sendo O processo de aquisição e desenvolvimento do
a fase de maior uso conhecimento fonológico ocorre de modo gradual até que
produtivo até os 4 haja o estabelecimento do sistema fonológico de acordo com
anos. a comunidade linguística em que a criança está inserida. A
idade esperada para o término deste aprendizado ocorre
por volta dos cinco anos, podendo estender-se dos quatro
até, no máximo, os seis anos de idade (GRINDI-VIEIRA et
al., 2004, p. 144).

Os processos fonológicos pertencem a diferentes categorias, como


substituição, omissão ou distorção. Esses processos são considerados normais
durante a fase inicial de aquisição de linguagem.

Como exemplo, citamos uma criança de 2 anos de idade que fala /alala/ ao invés
de /arara/. Ela está substituindo o /r/ pelo /l/. Outro exemplo de substituição seria /
xícara/ por /sícala/. Aqui a criança substituiu o /x/ pelo /s/ e o /r/ pelo /l/.

40
Capítulo 3 Alterações de Linguagem

Um exemplo de omissão, também normal no início da aquisição da


linguagem, seria a troca de /bolacha/ por /boacha/, ou de /guarda/ por /gada/.

As distorções acontecem quando a criança modifica um som, mas mesmo assim


esse som, continua inteligível, apenas distorcido, como falar o /s/ com um chiado.

A dificuldade pode estar relacionada com a representação mental do som,


com o armazenamento do som (quanto ao acesso e/ou recuperação) e/ou com a
produção do som.

a) Desvio Fonético
Quando a criança
tem uma dificuldade
Quando uma criança tem uma dificuldade de articulação de comunicação
envolvendo a produção da fala, manifestado por inabilidade em articular envolvendo a
os sons, esta dificuldade é considerada fonética. Por exemplo, a criança produção da fala,
que distorce o som, mas mesmo assim ele continua a ser entendido, manifestado por
como o “s” falado com a língua para fora dos dentes, ou jogando o ar da inabilidade em articular
os sons da fala,
cavidade oral para as bochechas e não para os lábios.
esta dificuldade é
considerada fonética.
As manifestações fonéticas manifestam-se principalmente por meio
de distorções, ou seja, dificuldades na produção do som. A regra fonológica As manifestações
encontra-se respeitada. fonéticas manifestam-
se principalmente por
meio de distorções,
Em resumo, a criança não troca os sons da fala por outros. Utiliza
ou seja, dificuldades
os corretos, mas com a articulação imprecisa ou distorcida. na produção do som.
A regra fonológica
b) Desvio Fonológico encontra-se
respeitada.
Já as dificuldades de comunicação de ordem linguística,
envolvendo a distinção dos sons usados para diferenciar o significado entre as
palavras, são consideradas de ordem fonológica.

Para algumas crianças, o processamento das informações


fonológicas acontece de maneira diferente do esperado. Essas
crianças têm dificuldade na organização mental dos sons que
ocorrem contrastivamente na língua, no estabelecimento do
sistema fonológico alvo, bem como na adequação do input
recebido. Estes casos são denominados desvio fonológico.

O desvio fonológico caracteriza-se pela desorganização,


inadaptação ou anormalidade no sistema de sons da criança,
em relação ao sistema padrão de sua comunidade lingüística,
inexistindo quaisquer comprometimentos orgânicos. O quadro
clínico é representado pela fala espontânea ininteligível em
idade superior a quatro anos, condições de desenvolvimento
global adequadas à sua faixa etária, nível cognitivo,

41
Linguagem e Fonoaudiologia em Psicopedagogia

auditivo, psicomotor, normalidade anatomofisiológica do


aparelho fonador e capacidades de linguagem expressiva e
compreensiva bem desenvolvidas.

O desvio fonológico trata-se de um desvio (afastamento de


uma linha), e não de uma desordem ou um distúrbio, no sentido
de que a fala com desvios constitui um sistema fonológico,
embora inadequado e afastado do esperado. Esse desvio é
fonológico, de um dos componentes da linguagem, e não no
nível articulatório. O desvio ocorre no desenvolvimento, como
parte do processo de aquisição, e tem etiologia desconhecida,
embora alguns trabalhos mostrem possíveis fatores influentes,
como memória de trabalho, processamento auditivo e
consciência fonológica.” (GRINDI-VIEIRA et al., 2004, p.145).

As alterações fonológicas manifestam-se principalmente por meio de


omissões e /ou substituições, em que a criança omite ou substitui o som-alvo por
outro presente em seu inventário fonético (CASTRO, 2004 apud CASTRO, 2006).

As alterações Alterações fonéticas e fonológicas podem ocorrer simultaneamente,


fonológicas comprometendo a articulação e o conhecimento internalizado do
manifestam-se sistema de sons da língua. Tais crianças geralmente apresentam
principalmente por audição normal, assim como os aspectos cognitivos, emocionais e
meio de omissões
social (CASTRO, 2006, p. 32).
e /ou substituições,
em que a criança
omite ou substitui o Os distúrbios fonológicos estão entre os mais frequentes distúrbios
som-alvo por outro da comunicação em crianças. Afetam aproximadamente 10% da
presente em seu população, e 80% dos indivíduos apresentam distúrbio severo que
inventário fonético. requer tratamento (GIERUT, 1998 apud CASTRO, 2006).

Caro(a) Pós-graduando(a), para facilitar a compreensão


dos processos fonológicos, adaptei o quadro usando o grafema
correspondente ao fonema.

Quadro 4 – Processos fonológicos usuais no desenvolvimento normal

Processos fonológicos Exemplo


Redução de sílaba /xícara/ → /xíca/
Harmonia consonantal /macacu/ → /cacacu/
Plosivização de fricativa /sapu/ → /tapu/
Posteriorização para velar /tatu/ → /kaku/
Posteriorização para palatal /sapu/ → /xapu/
Frontalização de velar /karu/ → / taru/
Frontalização de palatal /xavi/ → /savi/

42
Capítulo 3 Alterações de Linguagem

Simplificação de líquida /kara/ → /kaya/


Simplificação de consoante final /iskola/ → /ikola/
Simplicação do encontro consonantal /pratu/ → /patu/

Fonte: Adaptação de Castro(2006).

Quadro 5 – Processos fonológicos não usuais no desenvolvimento normal

Processos fonológicos Exemplo


não usuais
Sonorização de plosivas /patu/ → /batu/
Sonorização de fricativas /faca/ → /vaca/ /selu/ → /zelu/
Ensurdecimento de plosivas /bolu/ → /polu/ /dadu/ → /tatu/
Ensurdecimento de fricativas /vasu/ → /fazu/

Fonte: Adaptação de Castro(2006).

Velleman (2002) apud Castro (2006) alertou que as palavras derivam sua
estrutura não somente dos sons que as incluem, mas também da organização desses
sons dentro da palavra. A criança pode produzir consoantes e vogais adequadas à
idade, mas nem sempre é hábil para produzí-las nas configurações requeridas pela
língua, como consoante final, encontros consonantais, palavras multissilábicas.

Atividade de Estudos:

1) Dê exemplo de fala de uma criança com desvio fonético e um


exemplo de fala de criança com desvio fonológico.
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Linguagem e Fonoaudiologia em Psicopedagogia

c) Orientações para pais e professores de crianças com desvio fonético


ou fonológico

O tratamento das alterações fonéticas e/ou fonológicas deve ser realizado


pelo fonoaudiólogo, mas algumas orientações são úteis para facilitar a aquisição
dos fonemas, e a principal delas é falar corretamente com a criança.

Para facilitar a aquisição de linguagem, o adulto deve falar as


Para facilitar a
palavras corretamente e não usar diminutivos, como já foi colocado
aquisição de
linguagem, o adulto nas orientações de linguagem. Uma estratégia que a família e o
deve falar as palavras professor podem usar para auxiliar a criança a perceber que está
corretamente e não falando errado é a seguinte: quando a criança trocar sons na fala, o
usar diminutivos. adulto deve fazer expressão de dúvida, repetindo a palavra exatamente
como a criança falou, para que ela possa ouvir a sua produção, e
esperar que ela se corrija. Se a mesma não conseguir, você então fala a palavra
correta para que a criança tenha um modelo de fala para copiar.

É importante observar que, se a criança se aproximar do período de


alfabetização e não estiver falando corretamente, deve ser encaminhada a um
fonoaudiólogo, para que seja avaliada. A linguagem escrita tem relação direta com
a falada, e uma alteração na fala pode interferir neste processo.

Algumas crianças ficam irritadas quando pedimos que elas repitam a palavra
correta. Se este for o caso da sua criança, basta repeti-la corretamente que,
aos poucos, juntamente com o trabalho terapêutico do fonoaudiólogo, ela vai
adequando sua fala ao modelo dado pelo adulto.

Gagueira
Na fluência, há uma transição articulatória de um fonema a outro, com
regularidade e facilidade.

Todos nós já ficamos disfluentes em algum momento da nossa vida, quando


ficamos nervosos, quando tivemos que falar em público, dar uma explicação, ou
quando mentimos. Você já se percebeu disfluente? Qual foi a sensação?

a) Fluência

Há um período na vida da criança, entre dois e quatro anos de idade, em


que ela pode apresentar fala disfluente. Isso acontece em momentos em que

44
Capítulo 3 Alterações de Linguagem

ela quer contar algo, pois o pensamento ainda é mais rápido que a capacidade
articulatória, e a organização do discurso está se desenvolvendo. Na maioria das
vezes, a criança não percebe que está gaguejando.

Tendo em vista que 80 por cento das crianças Hoje, a maioria dos
com gagueira conseguem se recuperar
especialistas em
espontaneamente, a recomendação usual para
um pai preocupado costumava ser, até pouco
fluência recomenda
tempo atrás, ter calma e esperar. O problema é que que os pais
esperar pode ser muito desvantajoso para crianças procurem tratamento
que se beneficiariam da intervenção precoce. Hoje, especializado caso
a maioria dos especialistas em fluência recomenda a criança esteja
que os pais procurem tratamento especializado gaguejando por
caso a criança esteja gaguejando por mais de 6 mais de 6 meses,
meses, principalmente se for algo que a incomode. principalmente se for
(CHANG, 2008, p. 1333-1344) algo que a incomode.
b) Gagueira

Segundo a Classificação Internacional de Doenças (CID-10), a gagueira é


caracterizada como um distúrbio ou transtorno de fluência de fala, com o código
F98.5. Muitas pessoas acreditam que a gagueira é um distúrbio emocional ou
psicológico, em virtude de sua intensidade variar e da existência de momentos de
fluência.

Mas, com o uso moderno de neuroimagem, em exames funcionais, pode-se


constatar cientificamente que pessoas que gaguejam e pessoas fluentes exibem
claras diferenças nos padrões de atividade no cérebro durante a produção da
fala. Além disso, pessoas que gaguejam também exibem sutis déficits estruturais
envolvendo primariamente áreas do hemisfério esquerdo responsáveis pela
produção da fala fluente. (CHANG, 2008).

Então, o senso comum de que a gagueira é causada por um susto, stress,


por pais rígidos, etc, está sendo desmistificado graças a exames objetivos de
neuroimagem.

Podemos pensar na gagueira como um sintoma de linguagem que carrega


sofrimento e não apenas uma fala que se interrompe no fluxo do tempo
(OLIVEIRA; FRIEDMAN, 2006).

Algumas características:

1. esforço físico durante a fonação;

2. estado de ansiedade, tensão e medo, em relação à fala;

45
Linguagem e Fonoaudiologia em Psicopedagogia

3. conflitos em relação à fala;

4. alterações fisiológicas durante a fonação, como: suor exagerado,


alteração das batidas cardíacas;

5. dificuldade em manter o contato visual durante a fala;

6. nas palavras que considera difícil, uso de sinônimos, e às vezes, mudança


até do conteúdo da mensagem;

7. desenvolvimento de manias, como passar a mão no rosto quando falar,


ter sempre algo na mão;

8. fazer expressões corporais de sofrimento, como torcer as mãos, bater na


mesa, bater um dos pés no chão.

CARACTERIZAÇÃO DA GAGUEIRA

O problema central na gagueira consiste em uma dificuldade do


cérebro para sinalizar o término de um som ou uma sílaba e passar
para o próximo. Desta forma, a pessoa consegue iniciar a palavra,
mas fica presa em algum som ou sílaba (geralmente o primeiro)
até que o cérebro consiga gerar o comando necessário para dar
prosseguimento com o restante da palavra.

Acredita-se que as estruturas cerebrais envolvidas com a


gagueira sejam os núcleos da base, os quais são envolvidos com a
automatização de tarefas (dirigir, calcular, escrever, falar, etc).

Em relação a fala, os núcleos da base atuam principalmente


em situações de fala espontânea. O envolvimento dos núcleos
A dificuldade do da base tendem a diminuir em situações que não envolvem
cérebro em gerar fala espontânea (exemplos, falar com animais, com crianças
comandos para pequenas, sozinho), e é por isso que estas situações geralmente
terminar um som induzem a fluência em pessoas que gaguejam.
ou sílaba no tempo
previsto manifesta-
A dificuldade do cérebro em gerar comandos para terminar um
se externamente
como bloqueios, som ou sílaba no tempo previsto manifesta-se externamente como
prolongamentos e/ou bloqueios, prolongamentos e/ou repetições de sons e sílabas.
repetições de sons e
sílabas.

46
Capítulo 3 Alterações de Linguagem

A gagueira é então, um distúrbio neurológico e as variações A gagueira é


de fluência podem ser explicadas pelo maior ou menor então, um distúrbio
envolvimento dos núcleos da base na fala. neurológico e é
involuntária
A gagueira é involuntária, ou seja, a pessoa que gagueja não
tem controle sobre a sua fala e não consegue evitar a ocorrência da
gagueira, por mais que se esforce.

Além dos sinais esternos, a gagueira está associada com grande


sofrimento interno, porque a pessoa tem o que falar, sabe o que falar,
mas não consegue. Interfere na comunicação e nos desempenhos
escolar e profissional.

Fonte: Disponível em: <http://www.gagueira.org.br/conteudo.


asp?id_conteudo=29>. Acesso em: 20 jan. 2016.

c) Orientações aos Professores

Os professores normalmente tem dúvidas sobre como proceder com crianças


que gaguejam. Diante disso, apresentamos a seguir algumas orientações. Veja:

ORIENTAÇÕES AOS PROFESSORES: A


CRIANÇA QUE GAGUEJA NA ESCOLA

Criança na pré escola e jardim de infância: Todas as crianças


nessa faixa de idade estão ativamente aprendendo a falar, e é natural
que cometam erros de fala, como hesitações/ disfluências. Algumas
apresentam mais do que outras e isso é normal. Se você estiver
preocupado quanto a possibilidade de gagueira em uma dessas
crianças, não deixe que ela perceba qualquer atenção especial neste
momento. Ao invés disso, procure um fonoaudiólogo especializado
em gagueira para receber orientações e sugestões.

A criança do ensino fundamental: Nesta faixa de idade, há


crianças que não somente repetem e prolongam os sons, mas também
que fazem esforço e ficam tensas e frustradas com suas tentativas de
falar. Elas precisam de ajuda. Sem a ajuda necessária, é provável que
a gagueira afete negativamente seu desempenho em sala de aula.
Fale com os pais, e sugira que procurem um fonoaudiólogo.

47
Linguagem e Fonoaudiologia em Psicopedagogia

Os professores frequentemente tem dúvidas sobre como agir


com uma criança que gagueja em sala de aula. Ela deve ser cobrada
para fazer apresentações orais, ler em voz alta ou responder
perguntas? O professor deve comentar com a criança a respeito de
sua fala ou simplesmente ignorar?

Fale com a criança - mostre seu apoio: Normalmente, é


aconselhável que você converse com a criança de forma reservada.
Explique a ela que quando falamos às vezes cometemos erros
(assim como acontece com outras tarefas). Nós nos atrapalhamos
com os sons, repetimos palavras e nos confundimos com elas. Com
a prática, melhoramos. Explique que você está lá para ajudá-la. Falar
com a criança desta forma permitirá que ela saiba que você esta
ciente da dificuldade e que a compreende e aceita.

Responder oralmente à perguntas: Ao fazer perguntas em


sala de aula, é possível adotar certos procedimentos para tornar a
situação mais fácil para a criança que gagueja:

– Até que ela se ajuste a turma, faça perguntas que possam ser
respondidas com poucas palavras.
– Se cada criança tiver que responder uma pergunta, chame a
criança que gagueja no início, porque a tensão e a ansiedade podem
aumentar a medida que ela espera sua vez.
– Informe a classe que eles terão o tempo que precisarem para
responder às questões e que você quer que raciocinem antes de
responder e não apenas que respondam rapidamente.

Leitura em voz alta: A maioria das crianças que gaguejam são


fluentes quando lêem em uníssono com outras. Ao invés de chamar
a criança que gagueja, permita que leia junto com outra criança.

Permita que a classe inteira leia em duplas algumas vezes,


para que a criança que gagueja não fique se sentindo especial.
Gradualmente, ela pode se sentir mais confiante e conseguir ler em
voz alta por conta própria.

As ridicularizações: As ridicularizações podem ser muito


dolorosas para a criança que gagueja e devem ser eliminadas o mais
rápido possível. Ajude a criança a entender porque os outros reagem
assim e sugira formas de responder assertivamente às provocações.

48
Capítulo 3 Alterações de Linguagem

Sugestões para falar com a criança que gagueja:

– Não diga para a criança falar mais devagar ou relaxar.


– Fale com a criança de forma calma, sem pressa, pausando
frequentemente. Antes de começar a falar, ouça a criança até
o fim e espere alguns segundos após ela ter concluído aquilo
que queria dizer. Isso desacelerará o ritmo geral da conversa.
– Ajude todos os alunos da classe a aprender que há momentos
de falar e momentos de escutar. Todas as crianças,
especialmente aquelas que gaguejam, acham mais fácil falar
quando há poucas interrupções e quando tem a atenção dos
ouvintes.
– Use expressões faciais, contato visual e outras formas de
linguagem corporal para comunicar à criança que você está
prestando atenção ao conteúdo da mensagem e não somente
à forma como ela está falando.
– Não subestime a criança. Espere a mesma qualidade e
quantidade de trabalhos por parte das crianças que gaguejam.
– Procure reduzir as críticas, padrões rápidos de fala e
interrupções.
– Não complete as palavras para a criança, nem fale por ela.
– Converse individualmente com o aluno que gagueja sobre
as modificações necessárias para sua adaptação em sala de
aula. Respeite suas necessidades, sem subestimá-lo.
– Não torne a gagueira algo vergonhoso. Fale sobre a gagueira
como se estivesse falando sobre qualquer outro assunto.

Fonte: Disponível em: <http://www.gagueira.org.br/conteudo.


asp?id_conteudo=118>. Acesso em: 25 jan. 2016.

Para mais informações sobre a gagueira, acesse o site do


Instituto Brasileiro de Fluência, que contém muitos artigos científicos.
<www.gagueira.org.br>.

49
Linguagem e Fonoaudiologia em Psicopedagogia

Atividade de Estudos:

1) Quais as primeiras providências a tomar quando você percebe


que seu aluno está gaguejando?
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Afasia
Para você entender o que é a afasia, vamos começar estudando a afasia no
adulto, que não é uma doença rara ou nova, mas é ainda pouco conhecida pela
população e até mesmo no meio acadêmico.

a) Afasia no adulto

Em um conceito simplificado, a afasia é uma alteração de linguagem, em


decorrência de um dano neurológico.

A afasia ou disfasia é uma patologia de linguagem, classificada no CID 10 com


o código R47.0, e caracteriza-se por dificuldades na comunicação após um insulto
neurológico, podendo a dificuldade apresentar-se na linguagem oral e/ou escrita.

Então vamos aos conceitos:

Joanette et al. (1995, p. 3), define afasia como:

Dificuldade para entender a linguagem dos outros, encontrar


o nome das coisas, produzir sua própria linguagem, organizar
o conjunto dos comandos motores responsáveis pela boa
articulação das palavras: esses são alguns dos sinais
possíveis desse tipo de comprometimento; é o conjunto de
perturbações da linguagem oral e/ou escrita que acompanha
uma lesão cerebral que designamos com o termo afasia.

Joanette et al., 1995, 8, também diz que: “A afasia não afeta o indivíduo
em sua própria essência, quer dizer, no nível de seu pensamento. A afasia afeta
principalmente o instrumento de comunicação a serviço deste pensamento.”
50
Capítulo 3 Alterações de Linguagem

A afasia não afeta o pensamento ou a inteligência do sujeito acometido e sim a


capacidade de expressar-se através da fala. Em alguns casos, afeta a capacidade
de entender as palavras que escuta. Alguns relatos sugerem que o afásico escute
sua língua materna como se estivesse ouvindo uma língua estrangeira nunca
ouvida antes, as palavras não fazem sentido. Por isso, na maioria das vezes, tem-
se a impressão de que o raciocínio está afetado, pois o mesmo não consegue
entender ou fazer-se entender.

Se falarmos com o sujeito afásico por meio de gestos, ele nos


responderá com coerência, pois não terá que usar palavras.

Alguns afásicos também terão problemas com a linguagem escrita, pois ao


perder a lembrança das palavras ouvidas, também perdem sua representação
gráfica. Alguns conseguem escrever somente seu nome.

A afasia tem sido definida como a perda ou debilidade da


função da linguagem causada por um prejuízo no cérebro. Ela
é um enfraquecimento, devido a lesão cerebral, da capacidade
para interpretar e formular símbolos linguísticos. A afasia é uma
desordem multimodal (isto é, manifestada por dificuldades em
falar, ler e escrever) e envolve uma redução na capacidade
de decodificar (interpretar) e codificar (formular) elementos
linguísticos com significado, (por exemplo, palavras e unidades
sintáticas maiores, tais como as sentenças). O paciente afásico
tem debilitada a compreensão, a formulação e a expressão da
linguagem. (MURDOCH, 1997, p. 42).

Mas o que causaria esses distúrbios no cérebro?

As principais doenças do sistema nervoso que produzem distúrbios da


linguagem são as doenças cerebrovasculares (conhecidas como derrame ou AVC),
desordens neoplásicas (tumores benignos ou malignos), traumatismo craniano,
condições tóxicas (drogas lícitas ou ilícitas, álcool), doenças degenerativas (Doença
de Alzheimer, Parkinson, Esclerose múltipla, etc), e doenças infecciosas.

Lesão neurológica, ou cerebral, ou encefálica (podem ser


usadas as três nomenclaturas), é a mesma coisa, só muda o nome.

51
Linguagem e Fonoaudiologia em Psicopedagogia

O homem que confundiu sua mulher com um chapéu. É um


livro no qual o autor descreve em forma de contos, com linguagem
simples e divertida, vários casos de distúrbios neurológicos, entre
eles a afasia. Vale a pena ler!

SACKS, O. O homem que confundiu sua mulher com um


chapéu. São Paulo: Companhia das Letras, 1997.

As afasias têm diversas classificações, não nos cabe aqui discuti-las, basta
saber que, sempre que ouvir falar em afasia, haverá um comprometimento
neurológico e uma alteração de linguagem, seja ela da fala, da leitura e da escrita,
ou de compreensão.

Alguns afásicos que se recuperaram tiveram a oportunidade de


descrever como é ficar trancado num mundo sem palavras. Todos os
depoimentos foram retirados do livro O Afásico. Convivendo com a
lesão cerebral, de 1995:

“Eu ouvia alguma coisa, mas não compreendia, era como


chinês ou como... não sei o que... não uma língua estrangeira,
era mais como alguma coisa que não tinha nenhum sentido;
como diria, eu ouvia palavras vazias.” (C.C.)
“A gente se sente como numa caverna, escuta sua própria voz
como em um precipício. Temos medo das pessoas, não queremos
sair sozinhos.” (L.M.)
“Eu não sou mais o mesmo. Eu pensava ser o mesmo. Eu vivo
em contradição. Eu não sou capaz de ler, não sou capaz de escrever,
não sou capaz de falar e, também, não compreendo, então, nesses
momentos, eu me sinto bem miserável.” (C.C.)
“Eu tinha uma sensação terrível de estar presa dentro de mim
mesma.” (H.W.)
“Eu me sentia no sentido figurado, fechado, como em um
túmulo.” (S.S.)

52
Capítulo 3 Alterações de Linguagem

Filmes interessantes sobre o assunto:

• O escafandro e a borboleta.
• Uma segunda chance.

b) Afasia congênita

A afasia congênita, segundo Casanova (1988), refere-se ao não surgimento


da linguagem em crianças que, aparentemente, não apresentam traços de outras
síndromes que poderiam explicar tal ausência (surdez, autismo, etc.).

Na afasia congênita expressiva, a primeira linguagem não aparece até os 5-6


anos e, em alguns casos, não aparece nunca.

Em geral, a criança com afasia congênita se interessa pelos objetos e pelas


pessoas e integra atividades espontâneas como jogos, utilização de brinquedos e
objetos familiares, mas pode ter dificuldades para expressar-se verbalmente, para
compreender a fala ou ambas as coisas.

A expressão limita-se a poucas palavras, geralmente incompreensíveis


para os estranhos e não se observa elaboração espontânea de enunciados que
combinem várias palavras.

A compreensão também apresenta graves alterações, ainda que se situe em


um melhor nível que a expressão.

c) Afasia adquirida na infância

Segundo Casanova, 1988, a afasia infantil adquirida é a que resulta do


surgimento de uma lesão cerebral focalizada depois dos 2-3 anos de idade.

É raro que a compreensão seja perfeitamente normal (isto é, que coincida


com a idade mental da criança). A criança tem dificuldades quando o enunciado é
extenso, utiliza estruturas complicadas ou quando tem duplo sentido. Geralmente
a compreensão verbal é melhor que a expressão.

Além da limitação quantitativa do léxico, existem problemas de evocação


(lembrar os nomes) que se traduzem na expressão constantemente interrompida,

53
Linguagem e Fonoaudiologia em Psicopedagogia

com substituições de palavras. No nível sintático, a evolução ainda é mais lenta,


as frases são ditas na ordem imposta pelo pensamento.

A linguagem se mantém unida às ações, cada enunciado é utilizado para


uma única função, como nos primeiros níveis do desenvolvimento, dificilmente
chegando à narração.

Trocar de registro e adaptar-se ao interlocutor é muito difícil para a criança


afásica, sendo que, geralmente pela falta de desenvolvimento da intersubjetividade,
só entendem e se fazem entender por um número limitado de pessoas.

As alterações na conduta social e as reações emocionais diante da


aprendizagem parecem depender mais das respostas do entorno que do próprio
quadro sintomatológico.

No Manual de Classificação Internacional de Doenças (CID 10) está descrita


uma Síndrome em que a principal característica é a afasia.

A Síndrome de Landau- Kleffner (afasia adquirida com epilepsia), é um


transtorno no qual a criança, tendo feito anteriormente progresso normal no
desenvolvimento da linguagem, perde tanto a habilidade de linguagem receptiva
quanto expressiva, mas mantém uma inteligência normal, a ocorrência do
transtorno é acompanhada de anormalidades paroxísticas no EEG, e na maioria
dos casos há também convulsões epilépticas.

Usualmente o início se dá entre os três e os sete anos, sendo que as


habilidades são perdidas no espaço de dias ou de semanas.

Tem sido sugerido como possível causa deste transtorno um processo


inflamatório encefalítico.

Cerca de dois terços dos pacientes permanecem com um déficit mais ou


menos grave da linguagem receptiva.

Transcrição de um texto livre sobre uma paisagem, de uma


menina de 10 anos, em tratamento por afasia infantil desde os 6
anos de idade (CASANOVA, 1988, p. 262):

“A paisagem é uma orla que onde seve pem existe faz frio. A
paisagem está curfada e é muito bonita felá desde esta paisagem.
A paisagem tem muita casas e muitos vizinhos. Na paisagem a

54
Capítulo 3 Alterações de Linguagem

meninos brincam por é paisagem a muitos meninos brincando na


paisagem. Há muito que vão a comerei a paisagem e cae muita
chuva e a chuva cae na paisagem e se vai ao rio e ao mar.”

Transtorno do Espectro Autista


Os Transtornos do Espectro do Autismo (TEA) referem-se a um grupo
de transtornos caracterizados por um espectro compartilhado de prejuízos
qualitativos na interação social, associados a comportamentos repetitivos e
interesses restritos pronunciados (BRENTANI et al, 2013). Os TEAs apresentam
uma ampla gama de severidade e prejuízos. Há uma grande heterogeneidade na
apresentação fenotípica do TEA, com relação à configuração e severidade dos
sintomas comportamentais (GESCHWIND, 2009).

Crianças com  Transtorno do Espectro Autista (TEA)  já começam a


demonstrar sinais nos primeiros meses de vida: elas não mantêm contato visual
efetivo e não olham quando você chama. A partir dos 12 meses, por exemplo, elas
também não apontam com o dedinho. No primeiro ano de vida, demonstram mais
interesse nos objetos do que nas pessoas e, quando os pais fazem brincadeiras
de esconder, sorrir, podem não demonstrar muita reação.

O diagnóstico do TEA é clínico, feito através de observação direta do


comportamento e de entrevista com os pais ou responsáveis. Os sintomas
costumam estar presentes antes dos 3 anos de idade, sendo possível fazer o
diagnóstico por volta dos 18 meses de idade.

Em 2013, com a edição do DSM 5 (American Psychiatric Association), houve


uma reformulação no nome e nos critérios de diagnóstico do autismo, que passou
a se chamar transtorno do espectro do autismo.

O novo nome para a categoria, Transtorno do Espectro do Autismo, inclui o


transtorno autístico (autismo), transtorno de Asperger, transtorno desintegrativo
da infância, e transtorno global ou invasivo do desenvolvimento sem outra
especificação.

A seguir os critérios diagnósticos do DSM-V.

55
Linguagem e Fonoaudiologia em Psicopedagogia

CRITÉRIOS DE DIAGNÓSTICO

DSM-V : Transtorno do Espectro do Autismo


Deve preencher os critérios 1, 2 e 3 abaixo:

1. Déficits clinicamente significativos e persistentes na


comunicação social e nas interações sociais, manifestadas de todas
as maneiras seguintes:
a) Déficits expressivos na comunicação não verbal e verbal
usadas para interação social;
b) Falta de reciprocidade social;
c) Incapacidade para desenvolver e manter relacionamentos de
amizade apropriados para o estágio de desenvolvimento.

2. Padrões restritos e repetitivos de comportamento, interesses


e atividades, manifestados por pelo menos duas das maneiras
abaixo:
a) Comportamentos motores ou verbais esteriotipados, ou
comportamentos sensoriais incomuns;
b) Excessiva adesão/aderência a rotinas e padrões ritualizados
de comportamento;
c) Interesses restritos, fixos e intensos.

3. Os sintomas devem estar presentes no início da infância, mas


podem se manifestar completamente até que as demandas sociais
excedam o limite de suas capacidades.

[...]

1. O Transtorno do Espectro do Autismo é um transtorno


do desenvolvimento neurológico, e deve estar presente desde o
nascimento ou começo da infância, mas pode não ser detectado
antes, por conta das demandas sociais mínimas na mais tenra
infância, e do intenso apoio dos pais ou cuidadores nos primeiros
anos de vida.

O DSM-5 também reconhece que indivíduos afetados variam


com relação a sintomas não específicos do TEA, tais como habilidade
cognitiva, habilidade de linguagem expressiva, padrões de início, e
comorbidades psicopatológicas.

56
Capítulo 3 Alterações de Linguagem

Apesar dos avanços genéticos em relação ao TEA, as


bases genéticas associadas aos fenótipos ainda permanecem
desconhecidas devido à grande heterogeneidade genética e
fenotípica da doença, pois o TEA não é visto como uma doença
atrelada a um único gene, mas sim uma doença complexa resultado
de variações genéticas simultâneas em múltiplos genes (Iyengar and
Elston 2007) junto com uma complexa interação genética, epigenética
e fatores ambientais (Persico and Bourgeron 2006, Eapen 2011).

Como há uma enorme variabilidade em termos de comportamento


(gravidade dos sintomas), cognição e mecanismos biológicos,
construindo-se a idéia de que o TEA é um grupo heterogêneo, com
etiologias distintas, eles se beneficiam de avaliação individualizada
para propor a melhor composição de acompanhamento para o caso.

Aproximadamente 60-70% têm algum nível de deficiência


intelectual, enquanto que os indivíduos com autismo leve, apresentam
faixa normal de inteligência e cerca de 10 % dos indivíduos com
autismo têm excelentes habilidades intelectuais para a sua idade
(Brentani, et al. 2013).

Fonte: Disponível em: <http://goo.gl/Ckc0ha>. Acesso em: 03 mar. 2016.

Também segundo a ASA (2002), indivíduos com autismo exibem pelo menos
metade das características a seguir:

1. dificuldade de relacionamento com outras crianças;


2. riso inapropriado;
3. pouco ou nenhum contato visual;
4. aparente insensibilidade à dor;
5. preferência pela solidão, modos arredios;
6. rotação de objetos;
7. inapropriada fixação em objetos;
8. perceptível hiperatividade ou extrema inatividade;
9. ausência de resposta aos métodos normais de ensino;
10. insistência a repetição, resistência a mudança de rotina;
11. não tem real medo do perigo;
12. procedimentos com poses bizarras (fixar objeto ficando de cócoras,
colocar-se de pé um uma perna só, impedir a passagem por uma porta,
somente liberando-a após tocar de uma determinada maneira os alisares);
13. ecolalia (repete palavras ou frases em lugar de uma linguagem normal);

57
Linguagem e Fonoaudiologia em Psicopedagogia

14. recusa colo ou afagos;


15. age como se estivesse surdo;
16. dificuldade em expressar necessidades (usa gestos no lugar de palavras);
17. acessos de raiva, demonstra extrema aflição sem motivo aparente;
18. irregular habilidade motora, pode não querer chutar uma bola, mas
conseguir arrumar blocos.

No quadro a seguir, são representadas algumas das características do


indivíduo com autismo. Acompanhe!!!

Quadro – 6 Características do autismo

USA AS RESISTE A NÃO SE MISTURA APEGO NÃO


PESSOAS COMO MUDANÇAS COM OUTRAS APROPRIADO
FERRAMENTAS DE ROTINA CRIANÇAS A OBJETOS

NÃO MANTÉM NÃO DEMONSTRA


AGE COMO SE RESISTE AO
CONTATO MEDO DE
FOSSE SURDO APRENDIZADO
VISUAL PERIGOS

RISOS E GIRA OBJETOS


ACENTUADA
MOVIMENTOS RESISTE AO DE MANEIRA
HIPERATIVIDADE
NÃO CONTATO FÍSICO BIZARRA E
FÍSICA
APROPRIADOS PECULIAR

ÁS VEZES É E COMPORTAMENTO
AGRESSIVO E INDIFERENTE E
DESTRUTIVO MODO ARREDIO

Fonte: Extraído e adaptado de: <http://www.autismo.


com.br/site.htm>. Acesso em: 10 jul. 2009.

58
Capítulo 3 Alterações de Linguagem

www.ama.org.br – Neste site você encontra todas as informações


sobre o autismo. Pode se cadastrar no site e pode assistir a animações
feitas com a Turma da Mônica sobre o autismo. Entre no site – clique no
link O autismo – depois clique em Conceito – e então encontrará o link
Turma da Mônica. Vale a pena conferir.

No site www.autismo.com.br você encontrará uma lista de


referências bibliográficas para se aprofundar no assunto se for de
seu interesse.

Associação Brasileira de autismo (ABRA): <www.autismo.org.br>.


Autismo e Realidade: <www.autismoerealidade.org>.
Revista Autismo: <www.revistaautismo.com.br>.
Universo Autista: <www.universoautista.com.br>.
Inspirados pelo autismo: <www.inspiradospeloautismo.com.br>.

a) Tratamentos e prognóstico

A terapêutica pressupõe uma equipe multi- e interdisciplinar – tratamento


médico (pediatria, neurologia, psiquiatria e odontologia) e tratamento não-
médico (psicologia, fonoaudiologia, pedagogia, terapia ocupacional, fisioterapia e
orientação familiar), profissionalizante e inclusão social, uma vez que a intervenção
apropriada resulta em considerável melhora no prognóstico. A base da terapêutica
presume o envolvimento da família. A farmacoterapia continua sendo componente
importante em um programa de tratamento, porém nem todos os indivíduos
necessitarão utilizar medicamento, pois não existe medicação e nem tratamento
específicos para o transtorno autista. A demora no processo de diagnóstico e
aceitação é prejudicial ao tratamento, uma vez que a identificação precoce desse
transtorno global do desenvolvimento permite um encaminhamento adequado e
influencia significativamente na evolução da criança. Os atendimentos precoces
e intensivos podem fazer uma diferença importante no prognóstico do autismo. O
quadro de autismo não é estático, alguns sintomas modificam-se, outros podem
amenizar-se e vir a desaparecer, porém outras características poderão surgir
com a evolução do indivíduo. Portanto se aconselham avaliações sistemáticas e
periódicas (KUPERSTEIN, 2009).

Segundo Brentani, Paula e Bordini (2013, p. 69):

59
Linguagem e Fonoaudiologia em Psicopedagogia

Escalas e instrumentos específicos devem ser usados


para avaliar manifestações clínicas, e guiar a construção e
monitoria de programas de tratamento abrangentes. Uma
verdadeira recuperação do autismo não foi relatada na história,
mas terapias educacionais, psicossociais e linguísticas,
frequentemente combinadas com tratamentos adjuvantes,
como terapia com drogas para sintomas específicos, estão
bem estabelecidas para seus benefícios no TEA. A natureza
complexa e persuasiva do TEA requer uma equipe de múltiplos
profissionais para um diagnóstico apurado e cuidados clínicos.

O tratamento da criança com TEA, deve ter, ainda segundo Brentani, Paula e
Bordini (2013) algumas características essenciais como:

1. Iniciar o programa de intervenção o mais cedo possível.


2. Tratamento intensivo, 5 dias por semana.
3. Uso de oportunidades de ensino planejado repetidas vezes, estruturadas
durante breves períodos de tempo.
4. Atenção adulta, individualizada e diária.
5. Inclusão de um componente familiar, incluindo treinamento para os pais.
6. Mecanismos de avaliação contínua, com ajustes correspondentes na
programação.

Conforme Silva, Gaiato e Reules (2012), é possível utilizar as seguintes


abordagens de tratamento:

• ABA (Análise Aplicada do Comportamento): objetiva modificar os


comportamentos inadequados, substituindo-os por outros mais funcionais.
Comportamentos social, verbal e extinção da birra. Criar oportunidades
para que a criança possa aprender e praticar habilidades por meio de
incentivos e reforços positivos.
• TEACCH (Tratamento e Educação para Crianças Autistas e Crianças
com Déficit relacionados com  a Comunicação): programa que
combina diferentes materiais concretos e visuais, que auxilia as crianças a
estruturarem seu ambiente e rotina. Através de estrutura externa , permite
que as crianças criem mentalmente estruturas internas, transformando-as
em estratégias para que possam se desenvolver de forma que consigam o
máximo de autonomia na vida adulta.
• PECS (Sistema de Comunicação por troca de figuras): utiliza figuras
para facilitar a comunicação e a compreensão, ao estabelecer uma
associação entre a atividade e o símbolo. Não tem por objetivo substituir a
fala, mas sim estimulá-la. Diminuem as crises de birra pela dificuldade de
comunicação.

60
Capítulo 3 Alterações de Linguagem

Atividade de Estudos:

1) Das características do autismo, qual você definiria como a mais


importante?
_____________________________________________________
_____________________________________________________
_____________________________________________________
_____________________________________________________
_____________________________________________________

Algumas Considerações
Estudamos sobre as patologias fonoaudiológicas, em especial neste capítulo,
as patologias de linguagem, que irão interferir diretamente no seu trabalho como
psicopedagogo. Em alguns casos, você fará parte da equipe multiprofissional que
estará atendendo as crianças.

Então vamos relembrar, a criança com atraso de linguagem é aquela que está
demorando para falar, ou que se apresenta em uma fase de desenvolvimento de
linguagem não condizente com sua faixa etária. Já a criança que fala tudo, forma
frases e narra fatos, mas troca os sons da fala, provavelmente apresenta desvio
fonológico. E temos ainda, aquela que fala tudo, mas na hora de produzir alguns
sons, estes saem distorcidos (desvio fonético). O fonoaudiólgo fará o diagnóstico
diferencial, que muitas vezes confunde-se quando ouvimos a criança conversar, e
poderá orientar a família e a escola sobre como estimular a linguagem desta criança.

A gagueira já é mais perceptível e quase não nos traz dúvidas de que algo
não está indo bem. Pode trazer desconforto ao ouvinte e a própria criança que
está falando, sendo muito importante a avaliação de um fonoaudiólogo e sua
orientação da conduta mais adequada.

No caso de patologias neurológicas podemos receber uma criança com


afasia, com distúrbio de linguagem, que pode ser expressiva e/ou compreensiva.
E o transtorno do espectro autista, em que a principal dificuldade está na interação
social, comunicação e uso de comportamentos esteriotipados.

61
Linguagem e Fonoaudiologia em Psicopedagogia

Em todos os casos, o diagnóstico e a intervenção precoce pode minimizar os


sintomas, diminuir a angústia da família e potencializar o desenvolvimento da criança.

Referências
BRITO, M.C.; MISQUIATTI, A. R. Transtornos do espectro do autismo e
fonoaudiologia: atualização multiprofissional em saúde e educação. Curitiba:
CRV, 2013.

CASANOVA, J. P. Manual de Fonoaudiologia. Porto Alegre: Artes Médicas, 1988.

CERVONE, L. M.; FERNANDES, F. D. M. Análise do perfil comunicativo de crianças


de 4 e 5 anos na interação com adulto. Revista da Sociedade Brasileira de
Fonoaudiologia, São Paulo, v. 10, n. 2, abr./jun. 2005. p. 97-105.

CHANG, Soo-Eun. Desvendando os mistérios da gagueira através da


neuroimagem. In: Cerebrum Magazine. Artigo original disponível in: bit.Iy/soo-
eun-chang. Tradução Hugo Silva. Disponível em: <www.gagueira.org.br>. Acesso
em: 15 fev. 2016.

FAY, W. H. Autismo infantil. In: BISHOP; MORGOF. Desenvolvimento da


linguagem em circunstâncias excepcionais. Rio de Janeiro: Editora Revinter,
2002. p. 266.

FERNANDES, F. D. M. Os atrasos de aquisição de linguagem. In: GOLDFELD,


M. Fundamentos em Fonoaudiologia: Linguagem. Rio de Janeiro: Editora
Guanabara Koogan, 1998.

GRINDI-VIEIRA, M et al. Relação entre idade, grau de severidade do desvio


fonológico e consciência fonológica. Revista da Sociedade Brasileira de
Fonoaudiologia, São Paulo, v. 9, n. 3, jul/set 2004. p. 144-145.

JOANETTE, Y.; LAFOND, D.; LECOURS, A. R. A afasia do afásico. In: PONZIO


et al. O afásico: Convivendo com a lesão cerebral. São Paulo: Livraria e editora
Maltese, 1995.

KUPERSTEIN, Adriana Latosinski. Autismo. Disponível em: <http://www.autismo.


com.br/site.htm>. Acesso em: 10 jul. 2009.

LIMA, C. B. Perturbações do espectro do autismo: manual prático de


intervenção. Lisboa: Lidel, 2012.

62
Capítulo 3 Alterações de Linguagem

MURDOCH, B. E. O desenvolvimento da fala e distúrbios da linguagem:


Uma abordagem neuroanatômica e neurofisiológica. Rio de Janeiro: Revinter,
1997.

OLIVEIRA, P.; FRIEDMAN, S. A clínica da gagueira: diferentes paradigmas e


suas consequências. In: Cadernos da Fonoaudiólogo, volume 1. São Paulo:
Lovise, 2006.

ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE. Classificação Estatística Internacional de


Doenças e Problemas Relacionados à Saúde – CID 10.

SACKS, O. O homem que confundiu sua mulher com um chapéu. São Paulo:
Companhia das Letras, 1997.

SILVA, A. B.; GAIATO, M. B. & REULES, L. T.. Mundo Singular: Entenda o


autismo. SãoPaulo: Editora Objetiva, 2012.

SHIMER, C. R. et al. Distúrbios da aquisição da linguagem e da aprendizagem.


In: Jormal de Peditatria, 2004.

TRAUTMAN, Lisa. Notes to the teacher: The child who stutters at school. In:
Stuttering Foundation of America. Tradução e adaptação Hugo Silva. Revisão
Sandra Merlo. Disponível em: <www.gagueira.org.br>. Acesso em: 15 fev. 2016.

VARGENS. D P.; GIORGI, M. C. Complexidade do Trabalho do professor:


linguagem, o elemento especificador. In: Revista Letra Magna. Revista
Eletrônica de Divulgação Científica em Língua Portuguesa, Linguística e
Literatura. Ano 03. N. 5. 2006.

63
Linguagem e Fonoaudiologia em Psicopedagogia

64
C APÍTULO 4
Alterações de Fala e Voz

A partir da perspectiva do saber fazer, neste capítulo você terá os seguintes


objetivos de aprendizagem:

� Conhecer o conceito de disartria, fissura palatina e disfonia.

� Apontar os sintomas da disartria, fissura palatina e disfonia.

� Aplicar as orientações práticas para a disfonia infantil na escola.


Linguagem e Fonoaudiologia em Psicopedagogia

66
Capítulo 4 Alterações de Fala e Voz

Contextualização
Neste capítulo conheceremos as patologias de fala e voz. Se tiver dúvidas,
volte ao primeiro capítulo, onde apresentamos as definições.

A fala começa no cérebro. O processo de pensamento ou de resposta conduz


a uma sequência de impulsos neurais, que são transmitidos para a musculatura
do sistema respiratório, para a laringe e para as estruturas articuladoras. Esses
impulsos neurais podem ser levados para toda a musculatura ao mesmo tempo ou
para determinadas estruturas. Receptores especializados em nossas articulações,
tendões e músculos fornecem informações ao cérebro sobre como as coisas vão
indo (ZEMLIN, 2000).

A fala e a voz são produzidas pela ação conjunta dos pulmões, da traquéia,
laringe, cavidades nasais e cavidade oral.

A corrente de ar que vem dos pulmões passa para a traquéia e finalmente


para a laringe. Na laringe, encontram-se as pregas vocais, que produzem a voz
através da sua vibração.

A abertura e o fechamento rápidos das pregas vocais interrompem


periodicamente a corrente de ar, de modo a produzir um som no interior das
cavidades faríngea, oral e nasal.

A modificação dessas estruturas transforma um som indiferenciado em sons


de fala com significado.

Essa cadeia altamente integrada e complexa de eventos pode ser


interrompida por uma doença em qualquer estágio.

Perceba que o que, para nós, parece muito simples e fácil, para quem tem
uma patologia de fala e/ou voz torna-se muito difícil, pois para falar, utilizamos
diversas estruturas e sistemas do nosso organismo.

Neste capítulo, caracterizaremos a disartria, de causa neurológica e a


fissura labiopalatal, causada por má formação congênita, ambas patologias com
alteração de fala e voz. E abordaremos também a disfonia (alteração vocal).

67
Linguagem e Fonoaudiologia em Psicopedagogia

Disartria
O Sistema Nervoso evolui por um período extenso que se prolonga desde
a vida pré-uterina até a vida adulta, o que contribui para uma maior perfeição
funcional, mas torna-o também mais vulnerável aos agentes agressores, como os
acidentes vasculares encefálicos, traumatismos cranioencefálicos, etc. Dentre as
sequelas dessas alterações neurológicas estão as disartrias, que correspondem a
alterações fonoarticulatórias de origem neurológica que influem consideravelmente
nas habilidades comunicativas do indivíduo, uma vez que interferem tanto nos
mecanismos de controle da voz, como nos da fala (SIQUEIRA, 2002).

Segundo Siqueira (2002), as alterações de voz nas disartrias influem


consideravelmente na inteligibilidade da fala e no mecanismo laríngeo. Por
outro lado, o impacto da disartria, para o indivíduo, não se restringe apenas à
comunicação. O isolamento causado por essa alteração acaba comprometendo
também o estado psicológico do indivíduo, podendo levá-lo à depressão, visto
que o homem é um ser essencialmente social.

O termo disartria vem do grego dys + atthoun, inabilidade


para articular sons de maneira distinta, ressaltando assim o caráter
articulatório das alterações fonoarticulatórias de origem neurológica.

Darley, Aronson e Brown (1975) definiram disartria como alterações


resultantes de distúrbios no controle muscular do mecanismo da fala devido a um
dano no sistema nervoso central ou periférico, problemas na comunicação oral
devido à paralisia, fraqueza ou incoordenação da musculatura relacionada à fala.

Vamos então tentar entender esse conceito, que vem sendo aceito pela
comunidade científica desde a década de 70.

Você lembra quando falávamos de afasia, e vimos que, para ser afasia,
necessariamente o sujeito deveria ter um comprometimento neurológico e de
linguagem?

Para ser disartria, Pois bem, agora, para ser disartria, necessariamente o sujeito
necessariamente o deve ter um comprometimento neurológico e de fala.
sujeito deve ter um
comprometimento
neurológico e de fala.

68
Capítulo 4 Alterações de Fala e Voz

Mas então, qual a diferença entre os dois conceitos? Eles são muito
parecidos: nos dois, o sujeito deve ter um comprometimento neurológico e os dois
envolvem a comunicação.

Até profissionais competentes da área da saúde confundem-se com esses


conceitos, por isso não se preocupe em decorar o que é cada um, e sim em
reconhecer suas características, para que, quando encontrar algum paciente com
esses sintomas, possa encaminhá-lo ao neurologista.

Você sabia que algumas pessoas apresentam na fala os primeiros sintomas


neurológicos de uma doença? E que, às vezes, nem se dão conta de que precisam
procurar o médico? Nesse caso, você pode auxiliá-lo, explicando a importância de
consultar um neurologista.

Observe este relato: na clínica, uma paciente com disartria


solicitou, na recepção, que chamassem um rádio-táxi, e quando o
táxi chegou, o taxista não a levou, pois achou que estivesse bêbada.

A fala disártrica geralmente é uma fala lenta, quase arrastada (dando


impressão de embriaguez), com esforço. Nem todos os sons são produzidos,
então algumas palavras são ditas pela metade ou faltando o começo ou o fim.

Vamos tentar imaginar uma pessoa com disartria: um jovem de 18 anos


sofre um acidente de moto e estava sem capacete. Quando caiu da moto, bateu
com a cabeça no meio-fio da calçada. Levado às pressas ao hospital, consegue
sobreviver e não tem sequelas mentais, entende tudo o que lhe dizem, consegue
responder que sim e não, e escrever as suas respostas, mas quando vai falar,
sente que a sua boca não lhe obedece. Ele quer fazer o som, mas a língua não
vai para onde ele tenta levá-la. Não consegue fazer biquinho, e quando vai falar,
chega até a fazer careta de tanto esforço que faz. Fala devagar e com uma voz
meio fanha.

Perceba que esse moço não bateu a boca no meio-fio, e sim a cabeça. Não há
nenhum problema com sua boca, e antes do acidente, ele falava muito bem. Mas a
lesão aconteceu onde? No cérebro, na área que controla os músculos da fala.

Dulce Lemos (1992, p. 1) conceitua as disartrias como:

69
Linguagem e Fonoaudiologia em Psicopedagogia

defeitos na emissão dos sons, existindo dificuldade em sua


articulação e, também, na conexão de sílabas e palavras,
sendo esta dificuldade gerada por lesões do sistema nervoso
central, geralmente dos centros bulbares que comandam o
mecanismo fonador.

E acrescenta que as disartrias são quadros característicos dos tetraplégicos,


hemiplégicos, pacientes acometidos por neurites bulbares, esclerose múltipla,
encefalopatias, encefalopatia crônica não evolutiva da infância e também por
paralisia infantil quando esta ataca o bulbo.

Continua dizendo que nas disartrias existe a diminuição ou perda da


faculdade de unir os sons, ou mesmo de produzi-los. Quando são enviados aos
órgãos articulatórios, os impulsos têm a chegada a seu destino impedida e não
vão a eles de maneira precisa, fazendo com que a emissão de sílabas, palavras
ou frases não se faça de maneira correta.

Tetraplégico: pessoa com paralisia em todos os quatro membros.


Hemiplégico: pessoa com paralisia de um dos lados do corpo
ou só parte deste lado.
Neurite: doença no sistema nervoso.
Esclerose múltipla: doença degenerativa que atinge os neurônios.
Encefalopatia: doença no encéfalo.
Encefalopatia crônica não evolutiva da infância: paralisia cerebral.

A falta total de articulação se chama anartria.

Existem alguns tipos de disartria que vão se diferenciar pela localização


da lesão cerebral, pelo órgão fonoarticulatório (respiração, voz, articulação,
ressonância) comprometido e pelas características da fala disártrica (lenta,
rápida, fanhosa, com ou sem dificuldade respiratória associada) e também pela
inteligibilidade de fala (omite sons, troca sons, adiciona sons).

Só para você ter uma ideia, segue uma classificação: Disartria flácida,
Disartria espástica, Disartria atáxica, Disartria hipocinética, Disartria hipercinética,
e Disartria Mista (MURDOCH, 2005).

70
Capítulo 4 Alterações de Fala e Voz

a) Disartria infantil

As disartrias infantis são classificadas, de um modo geral, como adquiridas ou


congênitas. As disartrias adquiridas resultam de alguma doença ou evento (p. ex.
traumatismo craniano, acidente vascular cerebral, tumor cerebral, etc.) iniciando
durante o período pediátrico (0-15 anos de idade), mas geralmente seguindo
um período de fala e desenvolvimento da linguagem normais. Em contraste, as
disartrias congênitas estão associadas a doenças presentes no nascimento e
são também chamadas disartrias do desenvolvimento. Exemplos de disartrias
do desenvolvimento incluem aquelas observadas nas paralisias cerebrais e na
Síndrome de Moebius. (Murdoch, Horton, 2005).

Assim como no adulto, as lesões que causam a disartria podem ocorrer em


áreas motoras do córtex cerebral, cerebelo, núcleos da base, tronco encefálico
e sistema nervoso periférico, além de doenças na junção neuromuscular ou dos
próprios músculos.

Dependendo do tempo de início da disartria, a fala da criança e o


desenvolvimento de linguagem podem não ser completos. Sendo assim, torna-
se primordial o diagnóstico diferencial de problemas de fala motora adquirida,
dificuldades de articulação e atrasos fonológicos.

As características mais comumente descritas na fala da criança com disartria,


são distúrbios articulatórios, incluindo a imprecisão da produção consonantal e
hipernasalidade.

O prognóstico para recuperação apresentada por crianças que sofreram


lesões leves na cabeça foi registrado como excelente. O prognóstico para
recuperação de lesões severas na cabeça é menos certo, mas foi registrado como
sendo bem melhor para crianças do que para adultos.

Exemplos clássicos:

As crianças com neuropatia crônica não evolutiva da infância


(nome atualmente usado para designar a paralisia cerebral), quando
chegam a falar, apresentam disartria, pois nessa patologia há um
comprometimento nas áreas cerebrais responsáveis pela parte
motora do desenvolvimento. Assim, a criança com essa neuropatia
pode ter inteligência normal ou quase normal e não conseguir falar
por não conseguir controlar os músculos da fala, em função da
disartria.

71
Linguagem e Fonoaudiologia em Psicopedagogia

Nos pacientes com Mal de Parkinson, com a evolução da


doença, fica prejudicado antes o motor do que o cognitivo, sendo que
esses pacientes começam cedo a perder a capacidade de falar, mas
entendem tudo e podem muito bem organizar o seu pensamento em
um discurso coerente, mas, com a disartria, começa a dificuldade em
articular os sons para formar as palavras.

Atividade de Estudos:

1) Quais as diferenças entre afasia e disartria?


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Fissura Lábiopalatina
Segundo o Centro de Pesquisa e Reabilitação Lábio-palatais da USP,
conhecido como Centrinho, a fissura lábiopalatal é uma abertura no lábio ou
palato (céu da boca), ocasionada pelo não fechamento dessas estruturas, que
normalmente ocorre entre a 4ª e a 12ª semana de gestação.

As fissuras podem ser unilaterais ou bilaterais e variam desde as formas


mais leves, como cicatriz labial ou úvula (campainha) bífida (repartida em 2
partes), até formas mais graves como as fissuras completas de lábio e palato.
Por vezes, podem acometer fissuras atípicas que envolvem outras áreas além do
lábio superior e palato, como a região oral, nasal, ocular ou craniana.

O bebê portador de fissura labiopalatina apresenta uma variedade de


problemas que requerem a atuação de diversos profissionais. Além das cirurgias
a que deve ser submetido, pode vir a apresentar problemas de fala, de audição,
dentários, ortodônticos, cosméticos e emocionais. Assim, a família dever ser
informada quanto a esses problemas e deve ser orientada a como lidar com eles.

72
Capítulo 4 Alterações de Fala e Voz

O tratamento fonoaudiológico deve ser iniciado na própria maternidade, pois


o bebê fissurado pode apresentar alterações nas funções vitais de deglutição,
sucção e respiração (Altmann, 1993).

A reação da família pode ser de exclusão ou de proteção, e provavelmente


as pessoas terão a impressão de que a fissura é um machucado aberto e que vai
doer quando tocarem no bebê, e como a fissura pode acometer o céu da boca
também, quando esta criança começa a se alimentar e o leite voltar pelo nariz
será mais um susto.

Se essa família não for bem orientada desde o início, ela não vai saber nem
como alimentar a criança e suprir suas necessidades básicas de sobrevivência
e afeto.Quanto mais cedo a família entender o que aconteceu e como será a
adaptação da criança, maiores as chances de que esta tenha um desenvolvimento
normal, como qualquer criança.

Essa família necessita receber orientação para alimentar a criança


adequadamente, e até para desmistificar a imagem de que pode machucá-la ao
tocá-la ou pegá-la no colo.

Para a eficácia da reabilitação, os especialistas aconselham que os pais


comecem o tratamento o mais cedo possível. As primeiras cirurgias são feitas,
normalmente, quando a criança tem poucos meses de vida, de acordo com a
sequência das etapas terapêuticas.

O tratamento só termina quando o paciente está próximo de alcançar a


maioridade. Isso não impede que uma pessoa adulta, que não teve acesso ao
tratamento quando criança, busque o atendimento (CENTRINHO, 2009).

A criança com fissura labiopalatina vai precisar fazer cirurgias para corrigir a fissura
no lábio e/ou no palato em idades específicas e fazer tratamento fonoaudiológico,
principalmente para corrigir alterações de fala e ressonância (nasalidade).

Os indivíduos acometidos pela fissura de palato


podem apresentar distúrbios articulatórios
Quanto mais cedo
de desenvolvimento, compensatórios e/ou
obrigatórios. Os distúrbios articulatórios de a família entender
desenvolvimento (linguagem e fala) são aqueles o que aconteceu
que podem estar presentes em qualquer criança e como será a
e não apresentam relação direta com a fissura. adaptação da
Os distúrbios articulatórios compensatórios são criança, maiores
provenientes de tentativas dos fissurados em as chances de
compensar a válvula velofaríngea deficiente, que esta tenha um
nas fases iniciais da aquisição de linguagem. desenvolvimento
A inadequação dos órgãos fonoarticulatórios
normal, como
faz com que estes indivíduos busquem outros
locais de produção dos sons plosivos e fricativos, qualquer criança.

73
Linguagem e Fonoaudiologia em Psicopedagogia

na tentativa de tentar bloquear a corrente de ar fonatória.


(PENIDO, 2007, p. 126).

O desenvolvimento de linguagem acontecerá normalmente, desde que a


criança tenha condições e estímulos adequados ao seu desenvolvimento. A
fissura labiopalatina não dificultará o desenvolvimento de linguagem, mas sim a
superproteção ou rejeição da família em que a criança estiver inserida.

Sua fala pode ser um pouco anasalada e alguns fonemas podem ser
produzidos com distorção em virtude da fissura, e nesse caso a criança precisará
de acompanhamento fonoaudiológico.

a) Causas: Muitos cientistas têm pesquisado sobre os fatores que podem


provocar a fissura. A conclusão é de que a causa é multifatorial. Por
vezes, uma combinação de fator genético e ambiental pode ser a causa da
fissura. O fator genético envolve uma inter-relação de várias informações
genéticas (genes) herdadas dos pais. Entre os fatores ambientais, o
uso de álcool ou cigarros; a realização de raios X na região abdominal;
a ingestão de medicamentos, como anti-convulsivantes ou corticóide,
durante o primeiro trimestre gestacional também podem provocar a
malformação do lábio e/ou do palato.

b) Incidência: No Brasil, a cada 650 crianças nascidas uma tem essa


malformação. As fissuras labiais e labiopalatal são mais frequentes no
sexo masculino e as fissuras somente de palato ocorrem mais no sexo
feminino.

c) A Escola: Ao lado da família, o conjunto de variáveis que terá maior


influência sobre a vida da criança será a escola. Para a criança portadora
de deformidade facial, será a primeira e mais importante experiência
sistemática fora do ambiente do lar. A escola será o palco onde terá que
enfrentar novos relacionamentos, será olhada, julgada, avaliada e sua
aparência física será uma variável importante nestes julgamentos. A
experiência escolar para a criança portadora de fissura labiopalatina é
cheia de fatores estranhos, sobre os quais ela não tem nenhum controle,
e um deles é a sua própria dificuldade de fala. (AMARAL, 1993).

Site interessante: www.centrinho.usp.br

O Centrinho, como é chamado o hospital em Bauru que se


especializou em fissuras labiopalatinas, oferece tratamento e suporte

74
Capítulo 4 Alterações de Fala e Voz

completo para o paciente e sua família, inclusive hospedagem e


serviço de assistência social quando necessário.

O acompanhamento inicial é feito no próprio hospital em Bauru


e, quando possível, o paciente e sua família voltam para sua cidade
de origem levando todas as orientações para acompanhamento na
mesma. O centrinho continua acompanhando esses pacientes até
sua total reabilitação.

São atendidos pacientes do Brasil inteiro com fissura labiopalatina.

Figura 1 – Crianças com fissura labiopalatina

Fonte: Disponível em: <www.centrinho.com.br>. Acesso em: 10 jul. 2009.

Atividade de Estudos:

1) Uma criança com fissura labiopalatal terá seu desenvolvimento


de linguagem atrasado? Por quê?
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Disfonia
As modificações vocais maiores e mais rápidas ocorrem na puberdade, até
quando não há diferença significativa entre as vozes de meninos e meninas. A
laringe dos meninos cresce rapidamente na puberdade, as pregas vocais chegam
a alongar-se 1 cm, enquanto que nas meninas alongam-se de 3 a 4 mm. Isso

75
Linguagem e Fonoaudiologia em Psicopedagogia

tem grande impacto na sonoridade da voz. Já no envelhecimento, a laringe


sofre o mesmo processo de atrofia encontrado nos músculos de outras partes
do organismo idoso, além de a mucosa se tornar mais fina e menos hidratada e
apresentar perda da elasticidade. (DEDIVITIS, 2002).

O que prejudica a
Já vimos como e onde a voz é produzida, e que uma boa emissão
emissão vocal?
O uso incorreto da depende de uma quantidade de ar para colocar as pregas vocais
voz, inadaptações em vibração, laringe com tensão adequada e lubrificada para poder
fônicas (anatômicas, produzir a vibração e de cavidades de ressonância (cavidade oral e
funcionais e nasal) abertas para amplificar o som.
miodinâmicas),
fatores
E o que pode interferir nessa emissão? O uso incorreto da voz,
psicoemocionais,
e também, claro, inadaptações fônicas (anatômicas, funcionais e miodinâmicas), fatores
tumores e doenças psicoemocionais, e também, claro, tumores e doenças que atinjam a
que atinjam a laringe. laringe (CASTRO, 1994).

O nome cordas vocais, utilizado popularmente para pregas


vocais, está incorreto, pois não se trata de cordas e sim de pregas de
mucosa com musculatura.

Segundo Siqueira, 2005, embora a voz de cada indivíduo tenha suas


características próprias, é possível estabelecer os valores que são normalmente
encontrados em determinados grupos de indivíduos, como, por exemplo, os indivíduos
sem alterações orgânicas e/ou funcionais no mecanismo de produção vocal.

O conjunto de fatores que caracterizam a voz dos indivíduos sem alterações


vocais varia de acordo com vários aspectos, entre eles, as características
anatomofisiológicas, os hábitos alimentares e fonatórios, podendo, então, ser
encontrada variação entre diferentes populações (SIQUEIRA, 2005).

Eufonia é caracterizada por uma voz agradável, sem alterações.


Disfonia é a voz que não é agradável, causada por uma
alteração nas pregas vocais, como a rouquidão ou a voz produzida
com esforço.
Afonia: é a ausência total de voz.

76
Capítulo 4 Alterações de Fala e Voz

Figura 2 – Pregas vocais

Fonte: Disponível em: <http://www.rc.unesp.br/pef/2003_projetos/


Pedro/fotos/FOTO1.JPG>. Acesso em: 10 jun. 2009.

a) A voz do professor

Conforme Penteado (2007), a saúde vocal é um aspecto importante da saúde


geral e da qualidade de vida do professor, pois a voz é o seu principal instrumento
de trabalho e importante recurso no processo de ensino-aprendizagem. As
alterações de voz são responsáveis por um número significativo de queixas,
licenças médicas, afastamentos e readaptações funcionais. Vários são os
fatores apontados na literatura como possíveis causas de alterações vocais
em professores, como a falta de informação sobre o mecanismo fonatório,
presença de demanda vocal excessiva, comportamento vocal inadequado e as
características do próprio trabalho.

Pesquisa publicada em 2005 na Revista da Sociedade


Brasileira de Fonoaudiologia aponta que, entre os professores, são
significativos:

• a ocorrência de alterações vocais;


• o predomínio da auto-percepção vocal negativa;
• o desconhecimento das normas básicas de higiene vocal e
cuidados com a voz;
• o fator idade contribuindo para o aparecimento de alterações
na voz;
• a falta de evidências de queixas quanto aos ruídos externos
e internos da sala de aula, ao tamanho das salas e disposição das
classes e ao excesso de alunos nas salas de aula (SCHWARZ,
2005).

77
Linguagem e Fonoaudiologia em Psicopedagogia

Grande parte dos Hermes e Nakao (2003) colocam que a literatura atribui grande
problemas de voz, parte dos problemas de voz ao desconhecimento de técnicas e cuidados
estão relacionados especiais com a saúde vocal.
ao desconhecimento
de técnicas e
A higiene vocal deveria ser um hábito para qualquer profissional da
cuidados especiais
com a saúde vocal. voz, como exercícios pré e pós jornada de trabalho, adequações vocais
(impostação, projeção, intensidade, ataque vocal, etc.) e fonatórios
(articulação, dicção, pausa, prosódia, etc.), hidratação, postura, respiração,
alimentação, vestimenta, entre outros, que trazem resultados diretos à produção
vocal, e que, além de auxiliar o locutor no momento do seu discurso, promovem a
prevenção de disfonias (HERMES; NAKAO, 2003).

b) Higiene vocal

Higiene vocal é um termo usado para definir algumas normas básicas


que auxiliam a conservação da saúde vocal e a prevenção do aparecimento
de alterações vocais. Essas normas devem ser seguidas por todos, mas
especialmente por quem utiliza a voz como seu instrumento de trabalho, como
professor, cantor, ator, coralista, palestrante, padre e pastor, locutor, etc.

Os tópicos foram baseados no Manual de Higiene Vocal, de Mara Behlau e


Paulo Pontes (1993):

• Fumo: altamente nocivo, pois no momento em que se traga, a fumaça


quente agride todo o sistema respiratório, e principalmente, as pregas
vocais. A fumaça age diretamente na mucosa das pregas vocais, causando
descarga intensa de muco (aquela sensação de que tem algo na garganta
incomodando), e parada da movimentação ciliar do epitélio, causando
um depósito de secreção que provoca o pigarro. A toxina do cigarro é
diretamente depositada nas pregas vocais, favorecendo a instalação de
diversas alterações pela irritação provocada. O fumo é considerado uma
das maiores causas de câncer de laringe e pulmão.

O fumo é • Álcool: A irritação no aparelho fonador é semelhante à causada pelo


considerado uma das cigarro, adicionada à ação de imunodepressão, ou seja, redução das
maiores causas de respostas do organismo. Aparentemente, em alguns indivíduos o
câncer de laringe e uso da bebida causa a sensação de melhora na voz. Isso acontece
pulmão. porque há uma liberação inicial do cérebro nas primeiras doses, o
que faz o indivíduo sentir-se mais solto; e há uma leve anestesia na
faringe, e com a redução da sensibilidade nessa região, os abusos
vocais são cometidos sem que se perceba. As consequências desse
abuso só serão percebidas após o efeito da bebida, tais com ardor,
queimação e voz rouca e fraca.

78
Capítulo 4 Alterações de Fala e Voz

• Drogas: a ação da maconha é extremamente lesiva, irritando a mucosa


não somente pela agressão do fumo, mas também pelas toxinas da
queima do papel no qual a erva é enrolada. A aspiração da cocaína em pó
pode lesar diretamente a mucosa de qualquer região do trato vocal, lesões
perfuradas de septo nasal e ulcerações nas pregas vocais.

• Alergias: Indivíduos com alergias manifestadas nas vias respiratórias,


tais como bronquite, asma, rinite, faringite, etc. são mais propícios a
desenvolverem alterações vocais.

• Hábitos vocais inadequados: pigarrear ou “raspar a garganta”,


A utilização do
tossir e realizar competição sonora. A utilização do pigarrear, pigarrear, raspar a
raspar a garganta ou tossir produz a sensação de remoção de garganta ou tossir
corpo estranho ou alívio do sintoma de pressão na garganta, produz a sensação
piorando, porém, a condição da laringe, através do atrito que de remoção de
provoca irritação e descamação do tecido da laringe. Evite corpo estranho ou
alívio do sintoma de
pigarrear e, ao invés disso, inspire profundamente pelo nariz
pressão na garganta,
e degluta logo a seguir, o que auxilia a retirada do excesso de piorando, porém, a
secreção. Outro fator prejudicial é a competição sonora: quando condição da laringe,
se está num lugar barulhento, eleva-se a voz e o esforço para através do atrito que
se comunicar, na tentativa de vencer o ruído de fundo. provoca irritação
e descamação do
tecido da laringe.
• Ar condicionado: ocorre agressão à mucosa das pregas
vocais, pois o resfriamento do ambiente é realizado por meio da redução
da umidade do ar com consequente ressecamento do trato vocal, o que
induz uma produção da voz com esforço e tensão. Ingira constantemente
água em temperatura ambiente.

• Alimentação: alimentos pesados e muito condimentados dificultam


a digestão e dificultam também a movimentação livre do músculo do
diafragma, essencial para a respiração. A energia do corpo é direcionada
para a função digestiva e a função vocal fica comprometida. Alimentos
leves, verduras e frutas bem mastigadas relaxam a musculatura da
mandíbula, melhorando a dicção. Evitar chocolate, leite e derivados antes
do uso intensivo da voz. Esses alimentos aumentam a secreção do muco no
trato vocal, prejudicando a ressonância e produzindo pigarro. Evitar bebidas
gasosas que favorecem a flatulência. Balas, pastilhas e sprays acabam
por mascarar a dor do esforço vocal, prejudicando mais ainda o estado da
mucosa. A maçã, por sua propriedade adstringente, auxilia a limpeza da
boca e da faringe, favorecendo uma voz com melhor ressonância. Sucos
cítricos auxiliam a absorção do excesso de secreção. Goles de água fresca
em temperatura ambiente são essenciais para manter a qualidade vocal.
Alimentos e bebidas geladas geram um choque térmico que causa uma
descarga imediata do muco e edema de pregas vocais.
79
Linguagem e Fonoaudiologia em Psicopedagogia

• Vestuário: roupas leves e folgadas permitem a movimentação livre


do corpo. Não usar roupas e adereços apertados, principalmente na
região do pescoço, onde se encontra a laringe com as pregas vocais,
e na cintura, onde se encontra o músculo diafragma, importante para o
apoio respiratório na fonação. Sapatos com sola de borracha dificultam
a descarga de energia elétrica e aumentam a tensão do indivíduo. Saltos
altos provocam uma postura tensa a fim de se manter o corpo ereto, e
enrijecem a postura corporal.

• Esportes: os exercícios de esforço muscular não devem ser realizados


conjuntamente com a fala e vocalizações, para que não haja sobrecarga
do aparelho fonador.

• Alterações hormonais: No período pré-menstrual, nos primeiros dias da


menstruação, durante a gestação e com o uso de pílulas anticoncepcionais
pode aparecer discreta rouquidão, com voz grossa, fadiga vocal, em
consequência do edema (inchaço) das pregas vocais provocado pela
alteração hormonal. Durante a menopausa, a diminuição dos hormônios
Problemas de voz femininos produzirá uma voz mais grave nas mulheres e no homem, na
podem colocar em
terceira idade, provocará uma voz mais fina.
risco sua profissão
e até mesmo sua
vida, mas são Ao observar voz alterada por mais de 15 dias, dor ao falar, sensação
facilmente tratados de esforço, aperto, ardor, queimação ou cansaço ao falar, procure um
quando correta fonoaudiólogo ou um médico otorrinolaringologista. Problemas de voz
e precocemente podem colocar em risco sua profissão e até mesmo sua vida, mas são
identificados.
facilmente tratados quando correta e precocemente identificados.

Atividades de Estudos:

1) Você estudou os hábitos que são nocivos à saúde da voz e como


fazer a higiene oral. Dê exemplos práticos, do seu dia a dia, de
atitudes que prejudicam a sua voz.
_____________________________________________________
_____________________________________________________
_____________________________________________________
_____________________________________________________
_____________________________________________________

2) Agora dê exemplos práticos, do seu dia a dia, de como realizar a


higiene vocal.

80
Capítulo 4 Alterações de Fala e Voz

_____________________________________________________
_____________________________________________________
_____________________________________________________
_____________________________________________________
_____________________________________________________

c) Disfonia infantil

Na medida em que as crianças crescem e são expostas a uma variedade


maior de grupos e modelos vocais, em grande parte, elas aprendem a ajustar o
seu estilo vocal espontaneamente, de acordo com o contexto da comunicação.
Quando o problema de voz está relacionado a desvios anatômicos ou fisiológicos
do trato vocal, normalmente a criança tenta compensar. A maioria dos problemas
de voz na população infantil parece estar relacionada com abuso vocal. (FREITAS
et AL., 2000).

O autor também reforça que disfonia não é um sintoma incomum em crianças.


Na maior parte, os estudos epidemiológicos referem uma prevalência entre 6 e
9% de disfonia e problemas articulatórios na infância, sendo em dois terços dos
casos em indivíduos do sexo masculino.

As etiologias são bastante diversas, desde alterações funcionais, passando


por lesões nodulares, até lesões incapacitantes e com risco de vida, como
tumores e estenoses laríngeas de graus variados. Portanto, é sempre necessária
uma investigação diagnóstica aprofundada. (FREITAS, et al., 2000).

Fatores de risco relacionados variam com o tipo de etiologia da disfonia e incluem


abuso e mau uso vocal, história familiar, insuficiência velopalatina, uso de esteróides
inalatórios, intubação endotraqueal, refluxo gastroesofágico e alergia, entre outros.

A abordagem dos problemas de voz na criança difere em muitos aspectos em


relação ao adulto. Além de esses problemas poderem se apresentar associados a
outros distúrbios de desenvolvimento, crianças costumam não estar aptas a cooperar
com os procedimentos de diagnóstico e de terapêutica, que devem ser, portanto, os
menos invasivos e menos cansativos possíveis. Mais ainda: o envolvimento dos pais
e outros membros da família é fundamental para que o diagnóstico preciso e a terapia
bem sucedida sejam estabelecidos. (FREITAS et al., 2000).

Atribui-se a predominância de pacientes do sexo masculino ao fato de os


meninos desempenharem um papel socialmente mais agressivo e competitivo,

81
Linguagem e Fonoaudiologia em Psicopedagogia

o que leva a um uso mais intenso do aparelho fonador. A partir dos 12 anos de
idade, as alterações predominam em pacientes do sexo feminino, com maior
prevalência de nódulos vocais em pessoas desse sexo. (FREITAS, et al., 2000).

A idade na qual se Nódulos vocais são as lesões mais frequentemente diagnosticadas


dá maior procura por entre crianças e adolescentes com queixa de disfonia, seguidos de
assistência médica perto pelas alterações estrutruturais mínimas de laringe. A idade na qual
dos pacientes com se dá maior procura por assistência médica dos pacientes com disfonia
disfonia corresponde
corresponde ao início da idade escolar.
ao início da idade
escolar.
Nódulos vocais predominam em meninos menores de 12 anos, e
em meninas a partir dessa idade. Alterações estruturais mínimas de laringe são
mais comuns em indivíduos do sexo masculino antes dos 12 anos de idade, sem
uma clara predominância de sexo a partir daí. (FREITAS et al., 2000).

Algumas Considerações
Neste capítulo estudamos as principais patologias de fala. Você conseguiu
perceber como são diferentes das alterações de linguagem? Nas patologias de
fala há um componente orgânico bem definido causando as alterações.

O diagnóstico pode ser realizado de maneira mais precisa, pois há estruturas


orgânicas comprometidas, como nervos e músculos, a face ou as pregas vocais.

Não menos importantes que as patologias de linguagem, as patologias de


fala também causam danos importantes às pessoas e, quanto antes elas forem
diagnosticadas, melhor prognóstico terão.

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Capítulo 4 Alterações de Fala e Voz

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Linguagem e Fonoaudiologia em Psicopedagogia

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ZEMLIN, W. R. Princípios de Anatomia e Fisiologia em Fonoaudiologia. Porto


Alegre: Artmed, 2000.

84
C APÍTULO 5
Alterações Auditivas

A partir da perspectiva do saber fazer, neste capítulo você terá os seguintes


objetivos de aprendizagem:

� Conhecer o conceito da deficiência auditiva.

� Apontar os sintomas da deficiência auditiva.

� Conhecer a lei que regulamenta o teste a orelhinha.

� Conhecer o conceito de distúrbio de processamento auditivo.

� Apontar as características do distúrbio de processamento auditivo.


Linguagem e Fonoaudiologia em Psicopedagogia

86
Capítulo 5 Alterações Auditivas

Contextualização
A audição é um dos cinco sentidos básicos, cuja função é captar os sons existentes
no meio em que vivemos e enviá-los ao cérebro. A orelha é um órgão sensível que
capta as ondas sonoras para que nosso organismo inicie o processo de percepção
e interpretação do som. Infelizmente nesse caminho podem acontecer distúrbios,
causando alterações auditivas que podem se caracterizar por um rebaixamento na
acuidade auditiva, ou seja, a pessoa ouve menos ou não ouve, ou apresenta ainda
outro tipo de perda, quando ela ouve o som, mas tem dificuldade em interpretá-lo.

A fisiologia da audição é muito complexa e são muitas as causas de


alterações e perdas auditivas, principalmente na infância.

A surdez pode ser definida a partir de aspectos orgânicos, sendo classificada


de acordo com o local da lesão. Perda auditiva condutiva, quando se localiza
na orelha externa ou média; perda auditiva neurossensorial, quando a lesão se
localiza na orelha interna (cóclea ou nervo auditivo); ou perda mista, em que o
comprometimento está localizado tanto na orelha externa, quanto na média e na
interna (GOLDFELD, 1998).

As perdas auditivas são classificadas também dependendo do seu grau:


audição normal, até 25 dB, perdas leves (26 a 40 dB), perdas
A surdez caracteriza-
moderadas (41 a 70 dB), perdas severas (71 a 90 dB) e perdas se por uma privação
profundas (a partir de 90 dB). sensorial. Suas
consequências,
A surdez caracteriza-se por uma privação sensorial. Suas no entanto, não
consequências, no entanto, não se limitam às dificuldades auditivas, se limitam às
dificuldades
refletindo aspectos linguísticos, emocionais, educacionais, sociais e
auditivas, refletindo
culturais (GOLDFELD,1998). aspectos linguísticos,
emocionais,
Neste capítulo, abordaremos as causas das alterações auditivas, como educacionais, sociais
a surdez interfere na aquisição da linguagem oral e escrita e a importância da e culturais
detecção precoce. Descobriremos que existe uma lei federal que determina que todos os
recém-nascidos façam um exame auditivo logo após o nascimento, chamado teste da
orelhinha. Falaremos também de educação e sua evolução no Brasil.

Deficiência Auditiva Ou Surdez Processos


infecciosos como
as otites costumam
Muitas alterações orgânicas ou funcionais são responsáveis por ser a causa mais
distúrbios do aparelho auditivo. Processos infecciosos como as otites comum da deficiência
costumam ser a causa mais comum da deficiência auditiva. auditiva.

87
Linguagem e Fonoaudiologia em Psicopedagogia

O processamento de sons ao longo das vias auditivas envolve a participação


de redes neuronais complexas e de funções mentais superiores na interpretação
de sons verbais e não verbais. Para que tal processo aconteça é fundamental a
integridade do sistema auditivo periférico e central, bem como a exposição aos
estímulos acústicos (BARRETO, 2004).

A capacidade de ouvir é uma habilidade que depende da capacidade inata do


indivíduo e da experimentação deste com o meio, e qualquer prejuízo na audição
pode ocasionar dificuldades com a linguagem receptiva e expressiva.

A criança que nasce surda ou se torna surda no período pré-linguístico (até 2


ou 3 anos) sofre grande dificuldade em relação à aquisição da linguagem, sendo
essa dificuldade a principal característica da pessoa surda que poderá desencadear
consequências em outras áreas, como a escolarização (GOLDFELD, 1998).

Como vimos, a surdez pode ser congênita ou adquirida.

Na surdez congênita a criança adquire a deficiência durante a


gestação. A aquisição da surdez pelo bebê pode se dar por:

• Medicamentos tomados pela gestante;


• Doenças adquiridas durante a gestação, como sífilis e
toxoplasmose;
• Hereditariedade;
• A exposição da mãe a radiações e problemas no parto;
• O fato de a criança nascer antes ou depois do tempo;
• Infecções hospitalares e;
• O uso de fórceps para retirar a criança ou a falta de oxigenação.

Fonte: Disponível em: <www.direitodeouvir.com.br>. Acesso em: 25 jan. 2016.

Para que, nesses casos, a criança possa ter o atendimento adequado, e a


intervenção precoce possa acontecer, é realizado o teste da orelhinha.

O teste da orelhinha ou emissões otoacústicas evocadas (EOAs) é rápido,


indolor e não tem contraindicação. Utiliza-se um fone na parte externa da orelha
do bebê. Demora de 5 a 10 minutos, não acorda nem incomoda o bebê.

Este exame é regulamentado por lei e obrigatório em todo o território


nacional. Conforme a Lei nº 12.303, de 2 de agosto de 2010: Art. 1o É obrigatória a
88
Capítulo 5 Alterações Auditivas

realização gratuita do exame denominado Emissões Otoacústicas Evocadas, em


todos os hospitais e maternidades, nas crianças nascidas em suas dependências. 

Quando detectado algum problema, o bebê é encaminhado


para um serviço de diagnóstico, onde serão realizados a avaliação
otorrinolaringológica e exames complementares. Nessa fase muitos
bebês apresentarão audição normal e alguns terão a perda auditiva
confirmada. Uma vez confirmados o tipo e o grau da perda auditiva,
o bebê será encaminhado para um programa de intervenção precoce
a fim de orientar a família, preparar para o uso de aparelhos de
amplificação ou implante coclear e terapia fonoaudiológica.

Fonte: Disponível em: <http://bvsms.saude.gov.br/bvs/dicas/242_


teste_da_orelhinha.html>. Acesso em: 25 jan. 2016.

Na surdez adquirida ou causas pós natais, a criança fica surda em


decorrência de problemas após seu nascimento como por exemplo, meningite;
remédios ototóxicos em excesso ou sem orientação médica; sífilis adquirida;
sarampo, caxumba; exposição contínua a ruídos ou sons muito altos; traumatismos
cranianos, otite, entre outros.

Para compreender o significado da surdez, devemos pensar no significado


da linguagem. Luria diz que a linguagem é o que permite ao homem dar o salto do
sensorial para o racional. Se acreditarmos nisso, teremos de pensar na maneira
como uma criança que está impedida de adquirir espontaneamente a linguagem
dará esse salto do sensorial ao racional. E a partir disso, poderemos refletir que o
surdo, apesar de aparentemente ser igual aos ouvintes, se não for devidamente
estimulado poderá tornar-se um indivíduo com características muito diferentes
dos ouvintes. (GOLDFELD, 1998).

Por esse motivo, considero importante refletirmos sobre o modo como as


crianças surdas têm sido educadas e estimuladas.

Na antiguidade, os surdos eram tratados com piedade e compaixão, como


pessoas castigadas pelos deuses ou enfeitiçadas, e por isso eram abandonados
ou sacrificados.

A crença de que o surdo era uma pessoa primitiva fez com que a ideia de
que ele não poderia ser educado persistisse até o século XV. A partir do século

89
Linguagem e Fonoaudiologia em Psicopedagogia

XVI tem-se notícia dos primeiros educadores de surdos. Esses criaram diferentes
metodologias, alguns baseando-se apenas na língua oral, ou seja, na língua auditiva
oral utilizada em seu país, como o português no Brasil. Outros pesquisadores
defenderam a língua de sinais, que é uma língua espaçovisual criada através das
gerações pelas comunidades de surdos. Foram ainda criados códigos visuais que
não se configuraram como uma língua. Até hoje existem diferentes correntes em
relação à educação de surdos (GOLDFELD, 1997).

Em 1620, Juan Martin Pablo Bonet publicou, na Espanha, o livro


que trata da invenção do alfabeto manual.

Em 1750, surgiram na Alemanha as primeiras noções do que hoje constitui


a filosofia educacional Oralista, que acredita ser o ensino da língua oral e a
rejeição à língua de sinais o ideal para integrar o surdo na comunidade em geral.

No século XVIII teve grande impulso a educação de surdos, quantitativamente e


qualitativamente. Através da língua de sinais, os surdos podiam aprender e dominar
diversos assuntos e exercer várias profissões.

Surge depois a filosofia da Comunicação Total, de acordo com a qual o surdo


utilizava a língua oral, a língua de sinais e a mímica.

Devido a avanços tecnológicos que facilitavam a aprendizagem da fala pelo


sujeito surdo, a partir de 1860 o método oral começa a ganhar força, e a ideia de
que a língua de sinais era prejudicial ao aprendizado da língua oral fez com que,
em 1880, a língua de sinais fosse oficialmente proibida.

O Oralismo dominou em todo o mundo até a década de 60. A partir daí


surgiram várias pesquisas sobre a língua de sinais e sua aplicação na educação e
na vida do surdo, que, aliadas a uma grande insatisfação por parte dos educadores
e dos surdos com o método oral, deram origem à utilização da língua de sinais e
de outros códigos manuais na educação da criança surda.

a) Educação de surdos no Brasil

Goldfeld, 1997, descreve como aconteceu esse percurso no Brasil. Em 1855,


chegava ao Brasil o professor surdo francês Hernest Huet, trazido pelo imperador D.
Pedro II, para iniciar um trabalho de educação de duas crianças surdas.

90
Capítulo 5 Alterações Auditivas

Em 26 de setembro de 1857 foi fundado o Instituto que daria origem ao atual


Instituto Nacional de Educação dos Surdos (INES), que utilizava a língua de sinais.

Em 1911, o INES, seguindo a tendência mundial, estabeleceu o oralismo puro


em todas as disciplinas. Em 1957, a língua de sinais foi proibida nas salas de aula,
mas, mesmo assim, continuou a ser utilizada nos pátios e corredores da escola.

No fim da década de 70, chega ao Brasil a Comunicação Total. Na década


seguinte inicia no Brasil o Bilinguismo e, a partir de 1994, passa-se a utilizar a
LIBRAS (Língua Brasileira de Sinais), que foi criada pela própria comunidade
surda.

Na metodologia oralista, a criança surda deve submeter-se a um processo


de reabilitação que inicia com a estimulação auditiva precoce, ou seja, que
consiste em aproveitar os resíduos auditivos que quase a totalidade dos surdos
possuem e lhes possibilitar discriminar os sons que ouvem. Esse processo,
que deve ser iniciado no primeiro ano de vida da criança, dura entre 8 a 12
anos.

Já o bilinguismo defende que os surdos, formam uma comunidade, com


cultura e língua próprias. A noção de que o surdo deve, a todo custo, tentar
aprender a modalidade oral da língua para poder se aproximar o máximo possível
do padrão de normalidade é rejeitada. Isso não significa que a aprendizagem da
língua oral não seja importante para o surdo, ao contrário, esse aprendizado é
bastante desejado, mas não é percebido como o único objetivo educacional do
surdo, nem como uma possibilidade de minimizar as diferenças causadas pela
surdez. (GOLDFELD, 1997).

No Brasil, na tribo indígena Urubu-Kaapor, na qual existem


alguns surdos congênitos, os índios ouvintes são bilíngues e os
surdos, monolingues. Para seus membros, a surdez não é percebida
como um fato trágico e as pessoas surdas não vivem isoladas, nem
deixam de participar de eventos sociais, já que todos os ouvintes se
comunicam com eles em língua de sinais.

Goldfeld, 1997, questionou, então, por que a surdez causa tantas


consequências se o surdo tem um canal (espaçovisual) tão competente quanto
o canal auditivo-oral para se comunicar. Chegou então à conclusão de que o
problema do surdo não é orgânico e sim cultural, social. A realidade do Brasil e

91
Linguagem e Fonoaudiologia em Psicopedagogia

da maioria dos países é que as crianças surdas não têm contato com a língua
de sinais desde pequenas, e como não podem adquirir a língua oral num ritmo
semelhante ao das crianças ouvintes, elas, na maioria esmagadora das vezes,
sofrem atraso de linguagem.

Não pretendi, com esse breve relato da história, defender uma ou outra
concepção de educação da criança surda, mas deixar em aberto uma reflexão sobre
o papel da linguagem no desenvolvimento da criança, de qualquer criança, e não só
da criança surda, como primordial para suas funções cognitivas, organizacionais,
de planejamento, abstração, etc., para que possamos questionar o que é melhor
para a criança que estamos atendendo, o que lhe trará mais benefícios.

Caro(a) pós-graduando(a): Se você deseja conhecer mais sobre


a questão da surdez, leia: Vendo Vozes: uma jornada pelo mundo dos
surdos, de Oliver Sacks. É uma leitura leve, que retrata as dificuldades
e contém histórias interessantes sobre o universo dos surdos.

Atividade de Estudos:

1) Você já conhecia os métodos utilizados na educação da criança


surda? Como eles se caracterizam?
_____________________________________________________
_____________________________________________________
_____________________________________________________
_____________________________________________________
_____________________________________________________

b) Linguagem gráfica na surdez


Um indivíduo
surdo geralmente A perda auditiva interfere na detecção e na discriminação sonora.
não apresenta o Quando os sons da fala não são ouvidos com clareza, não há proporção
domínio do sistema de fala adequada, o que levará a dificuldades no desenvolvimento da
linguístico, que é uma
linguagem gráfica, uma vez que a escrita representa a fala (PATATAS;
condição básica para
se compreeder um CHIARI, 2006).
texto.

92
Capítulo 5 Alterações Auditivas

Os autores, Patatas e Chiari, dizem que, além disto, um indivíduo surdo


geralmente não apresenta o domínio do sistema linguístico, que é uma condição
básica para se compreeder um texto.

A maioria dos surdos demonstra sentir dificuldade na compreensão do texto


escrito, principalmente pela falta de domínio da língua oral, provavelmente devido
à privação da totalidade da experimentação linguística durante o período de
desenvolvimento de linguagem (PATATAS; CHIARI, 2006).

A leitura é algo externo ao indivíduo surdo. Ela se dá, em geral, por meio de
textos elaborados pelos professores, com estrutura e vocabulário simplificados.
Assim, ela é treinada, exercitada e memorizada, mas não necessariamente
compreendida. Sua ênfase se dá na decodificação, ou decifração, perdendo-se
no sentido e ganhando-se mecanicidade (PATATAS; CHIARI, 2006).

Alguns autores realizaram estudos sobre a relação entre surdez e


compreensão de leitura. Em um desses estudos, encontrou-se uma defasagem
escolar de dois anos ou mais entre o grupo de indivíduos surdos e o de ouvintes.
O autor apontou também que surdos, mesmo com o primeiro grau completo, são
propensos a ter dificuldade na interpretação de uma mensagem escrita devido às
limitações de linguagem que estes apresentam com relação à sintaxe, morfologia
e vocabulário (PATATAS; CHIARI, 2006).

Processamento Auditivo
Processamento Auditivo é o processo e mecanismo do sistema auditivo
responsável pelos fenômenos comportamentais de localização e lateralização
sonora, discriminação auditiva, reconhecimento de padrão auditivo, aspectos
temporais da audição, performance auditiva com sinais acústicos competitivos e
performance auditiva com sinais acústicos distorcidos. Quando ocorre um déficit
em um ou mais dos processos citados, denomina-se distúrbio de processamento
auditivo central (DPAC) (MINARDI et al., 2004).

Um indivíduo pode ter alteração do processamento auditivo mesmo que


sua capacidade de detectar sons esteja na faixa de normalidade. Ou seja, o
sujeito escuta, mas não realiza características específicas do processamento
auditivo no cérebro. Pode-se citar como exemplo: ele não localiza, não
discrimina, não entende a mensagem em situações de ruído, não apresenta
memória auditiva, etc. Isso, porém, não quer dizer que ele não escutou.

93
Linguagem e Fonoaudiologia em Psicopedagogia

O processamento Segundo Katz, 1997, o processamento auditivo é o que fazemos


auditivo é um com o que ouvimos. O processamento auditivo é um dos fatores que
dos fatores que podem interferir no aprendizado da leitura e da escrita.
podem interferir
no aprendizado da Segundo Bowen e Hynd (apud SANTOS; SHOCHAT, 2003),
leitura e da escrita.
crianças com dificuldade de aprendizagem apresentam déficit na
habilidade de atenção seletiva por não selecionarem os estímulos relevantes dos
irrelevantes.

Algumas crianças com alteração no processamento auditivo só entendem a


mensagem se esta for falada em ambiente extremamente favorável.

Algumas Considerações
Muitas são as causas da perda auditiva, algumas podem ser evitadas com
medidas simples como vacinação das gestantes, não utilização de medicamentos
sem orientação médica e os cuidados com a saúde geral e tratamento das otites.

Mas, algumas vezes as causas da perda auditiva fogem ao nosso controle, e


temos que oferecer e orientar a detecção precoce e tratamento adequado.

Apesar de sabermos que a lei do teste da orelhinha não atinge a totalidade


da população brasileira, é um avanço termos esse tipo de avaliação, que visa a
detecção precoce da surdez, disponível aos recém-natos.

Levando em consideração que a audição é o sentido mais importante para


o desenvolvimento de linguagem, se detectada precocemente a surdez, o bebê
terá melhores condições de ter um desenvolvimento mais adequado, seguindo
o protocolo de intervenção, como preparo para utilização de prótese auditiva ou
implante coclear e posterior terapia fonoaudiológica.

Independente do procedimento a ser realizado, a criança e sua família


necessitará de orientação e estimulação adequada para o desenvolvimento de
linguagem e posteriormente escolarização.

Referências
BARRETO, M. et al. Desempenho da habilidade de resolução temporal em
crianças de 07 a 13 anos. Revista da Sociedade Brasileira de Fonoaudiologia,
São Paulo, v. 9, n. 4, p. 220-228, 2004.

94
Capítulo 5 Alterações Auditivas

GOLDFELD, M. A criança surda: Linguagem e cognição numa perspectiva


sócio-interacionista. São Paulo: Plexus, 1997.

GOLDFELD, M. Surdez. In: Fundamentos em Fonoaudiologia: Linguagem. Rio


de Janeiro: Guanabara, 1998.

KATZ, J. Uma Introdução ao processamento auditivo. In: LICHTIG, I.;


CARVALHO, R. Audição: Abordagens atuais. Carapicuíba: Pró-fono, 1997.

MAGNI, C. Bases genéticas da deficiência auditiva. Revista da Sociedade


Brasileira de Fonoaudiologia, São Paulo, v. 10, n. 4, p. 239-245, 2005.

MINARDI, C. et al. Questionário Fisher e fissuras palatinas. Revista da


Sociedade Brasileira de Fonoaudiologia, São Paulo, v. 9, n. 3, p. 164-167,
2004.

PATATAS, O.; CHIARI, B. Reconto e compreensão de leitura em um grupo de


indivíduos com surdez. Revista da Sociedade Brasileira de Fonoaudiologia,
São Paulo, v. 11, n. 2, p. 96-105, 2006.

SACKS, O. Vendo vozes: uma jornada pelo mundo dos surdos. Rio de Janeiro:
Imago, 1989.

SANTOS, F.; SHOCHAT, E. Dificuldade em ouvir na presença de ruído e a


dificuldade de aprendizagem. Fonoaudiologia Brasil: Conselho Federal de
Fonoaudiologia, v. 2, n. 3, 2003.

95
Linguagem e Fonoaudiologia em Psicopedagogia

96
C APÍTULO 6
Alterações das Funções
Neurovegetativas ou de Motricidade
Oral

A partir da perspectiva do saber fazer, neste capítulo você terá os seguintes


objetivos de aprendizagem:

� Conhecer o conceito de função neurovegetativa e motricidade oral.

� Apontar as causas das alterações oclusais.

� Apontar os hábitos deletérios para a oclusão oral.

� Conhecer a lei que regulamenta o teste da linguinha.

� Conhecer o conceito e os sintomas de respiração oral.

� Analisar como a respiração oral interfere no aprendizado escolar da criança.

� Conhecer o conceito e sintomas de disfagia.


Linguagem e Fonoaudiologia em Psicopedagogia

98
Capítulo 6 Alterações das Funções
Neurovegetativas ou de Motricidade Oral

Contextualização
O nome deste capítulo pode parecer bem estranho para você, mas não se
preocupe, esses nomes são esquisitos mesmo, e eu vou explicar do que se trata...
Você verá como é simples!

Função neurovegetativa é toda função que nos mantém vivos, como respirar,
circular o sangue, transpirar, sentir medo, sugar o leite quando nascemos, engolir, etc.
Funções que o nosso organismo realiza sem que nós precisemos pensar, ordenar, ou
coordenar. Que é inerente ao ser vivo. Funções essenciais para nossa sobrevivência.
Já a motricidade oral tem relação com os movimentos realizados pela boca para que
possamos sugar, mastigar, engolir e até falar.

Por isso, trataremos da oclusão dentária, que será importante na hora de


mastigar, engolir, falar, etc. Veremos também quantas coisas são prejudiciais para
o correto desenvolvimento da nossa arcada dentária e até da nossa face.

Abordaremos a deglutição, que é o ato de engolir, e conheceremos uma


patologia, que é mais comum do que podemos imaginar, que é a dificuldade em
engolir, como, por exemplo, quando a pessoa engasga, tosse, ou a comida cai
para fora da boca.

Neste capítulo, então, você conhecerá algumas patologias que são mais
específicas do trabalho do fonoaudiólogo, do dentista e do médico, mas para cuja
prevenção podem contribuir também todos os profissionais da saúde e da educação.

Função Neurovegetativa e
Motricidade Oral
A participação do sistema nervoso neurovegetativo no controle do organismo
se faz presente em todas e quaisquer funções, proporcionando reações
adequadas e coordenadas com o sistema nervoso da vida de relação, através de
suas íntimas conexões com os centros corticais, com os núcleos da base, com o
diencéfalo e formação reticular. Essas conexões são recíprocas, agindo os centros
neurovegetativos sobre os centros de vida de relação e vice-versa, modulando-se
reciprocamente, tantas são suas interconexões anatômicas e funcionais com o
sistema nervoso de vida de relação, com os núcleos do hipotálamo que controlam
o sistema endócrino e com o sistema imunitário (SOBRINHO, 2003).

99
Linguagem e Fonoaudiologia em Psicopedagogia

As funções Ou seja, podemos dizer que as funções neurovegetativas são


neurovegetativas aquelas que nos mantêm vivos, como, por exemplo, o controle cardíaco,
são aquelas que nos modificação da pressão arterial, controle respiratório, temperatura
mantêm vivos. corporal, sudorese, a dor (provoca midríase). A ação de correr põe em
funcionamento as funções neurovegetativas do sistema vascular e digestivo.

O fato de imaginar algum evento já coloca em funcionamento o sistema


neurovegetativo, como a emoção, o medo e a atenção que, ativados pela
memória, sofrem todo tipo de exaltação ou inibição.

Quando estimulados, alguns centros neurovegetativos provocam


vasoconstricção, hipertensão arterial, taquicardia, taquipneia, dilatação pupilar,
inibição da motilidade e das secreções do tubo digestivo, aumento da temperatura.

Na Fonoaudiologia, estudamos as funções neurovegetativas que têm relação


com a área de atuação, como sucção, respiração, mastigação e deglutição,
processos reflexos que já estão presentes no recém-nascido, garantindo a
preservação da vida.

A motricidade oral A motricidade oral relaciona-se ao estudo das regiões orofacial


relaciona-se ao e cervical, sua embriogênese, anatomia, fisiologia, alterações
estudo das regiões e tratamentos. Considera-se uma especialidade do trabalho do
orofacial e cervical.fonoaudiólogo, que vai intervir nas alterações de respiração, sucção,
mastigação e deglutição.

Contempla a região orofacial e cervical também, pois algumas funções como


a respiração e a deglutição acontecem não apenas na região oral, mas também
na região cervical (pescoço, laringe, faringe, etc.).

Midríase: paralisia da íris, aumento dos diâmetros da pupila.

Alterações Oclusais
O desenvolvimento das dentições (decídua, mista e permanente) está
diretamente relacionado com o crescimento da face.

100
Capítulo 6 Alterações das Funções
Neurovegetativas ou de Motricidade Oral

Dentição decídua: dentes de leite.

Os dentes constituem a substância mais dura do corpo humano (esmalte) e


têm também o mais longo período de formação, quando comparados aos outros
tecidos orgânicos. Ao nascimento, a maxila e a mandíbula são pequenas em
comparação com as outras estruturas da cabeça do indivíduo. E, seis a oito meses
após o nascimento, já se processou um crescimento desta região que contém os
germes dentários, permitindo uma disposição harmoniosa dos dentes decíduos
nas suas respectivas arcadas. (KOHHER, 1994).

De acordo com Figun e Garino (apud KOHLER, 1994), os dentes decíduos,


durante seu período de existência na cavidade bucal, cumprem algumas funções:
ação mastigatória, estabelecimento de uma linha e plano de oclusão, manutenção
da dimensão vertical, início da fonação, manutenção do espaço necessário para a
correta erupção dos futuros dentes permanentes, ação estimulante no crescimento
ósseo alveolar dos maxilares, e atuação no processo de erupção dos futuros dentes
permanentes, pela relação de proximidade que têm com os mesmos.

Na fase da dentição mista, a criança tem um aumento de cerca de 60% nas


possibilidades de ter instaladas situações anômalas no seu complexo dento-
ósteo-músculo-esqueletal, em virtude das próprias alterações esqueletais, da
ação muscular, da ação anormal das funções de respiração, deglutição e fonação
e da ação de hábitos locais de caráter danoso ás estruturas sobre as quais atuam
seus efeitos prejudiciais.

a) Causas da alteração da oclusão

Segundo Schwartz e Schwartz (1994), são vários os fatores que podem


desenvolver uma oclusão anormal:

• Hereditariedade: o padrão de crescimento e desenvolvimento apresenta


forte componente hereditário. Como exemplo, as mordidas abertas
esqueletais, prognatismo inferior, problemas relativos ao número e
tamanho dos dentes.

• Anomalias congênitas: são as que se formam desde a fecundação até


o nascimento. Por exemplo, as fissuras labiopalatinas, tumores, paralisia
cerebral, hemangiomas e sífilis congênita.

101
Linguagem e Fonoaudiologia em Psicopedagogia

• Anomalias adquiridas: são as diversas alterações dentofaciais que


surgem pela ação de fatores locais ou gerais. Os hábitos viciosos como
sucção de dedo e chupeta, interposição de lábio e língua, a predisposição
a moléstia, alterações metabólicas, má nutrição e pressões anormais por
hábito ou função.

Fatores locais que podem contribuir para a má oclusão:

• anomalias de número de dentes;


• anomalias de tamanho de dentes;
• anomalia de forma;
• freios labiais;
• perda prematura dos dentes;
• retenção prolongada dos dentes;
• irrupção tardia dos dentes permanentes;
• eixo de irrupção anormal, no caso de traumatismos, falta de espaço, etc.;
• anquilose (impedimento físico para que o dente faça sua irrupção);
• cárie dentária;
• restauração dentária inadequada.

b) Hábitos deletérios

Hábito deletério é um Hábito deletério é um hábito prejudicial, nesse caso, prejudicial à


hábito prejudicial à
oclusão dentária. O hábito é um reflexo, um estímulo, aprendido, que
saúde.
traz um certo prazer ou satisfação. A simples descoberta do hábito não
tem nenhum significado clínico, se não conhecermos sua origem, implicações e
consequências. (MORESCA; FERES, 1994).

Quando se percebe um mau hábito bucal, deve-se levar em consideração


a idade da criança, estágio no qual se encontra a troca de dentes, a oclusão e
todas as funções envolvidas. Deve-se também procurar descobrir a causa e as
circunstâncias sob as quais o hábito foi desenvolvido, pois além de provocar
malefícios à oclusão, pode representar uma situação emocional da criança, que
se torna evidente em momentos de angústia e ansiedade. A descrição a seguir
baseou-se em Moresca, 1994.

• Hábito de sucção
O hábito de
sucção de polegar
e de outros O hábito de sucção de polegar e de outros dedos, chupeta
dedos, chupeta e e mamadeira, é causa de alterações no equilíbrio do aparelho
mamadeira, é causa estomatognático.
de alterações no
equilíbrio do aparelho
estomatognático.

102
Capítulo 6 Alterações das Funções
Neurovegetativas ou de Motricidade Oral

O osso, por ser um tecido plástico, reage a todo tipo de pressão exercida
sobre ele. Na posição em repouso, há um equilíbrio entre os músculos e todos
os tecidos peribucais. A quebra desse equilíbrio pode gerar pressões anormais,
podendo fazer com que haja alterações de estímulo de crescimento anormal dos
maxilares, alterando as funções bucofaríngeas que exercem papel importante no
crescimento craniofacial.

A sucção da chupeta, mesmo sendo deletéria, é menos prejudicial que a


sucção do polegar; geralmente os danos se limitam à região anterior, e se tiver
uma oclusão balanceada, ao remover o estímulo, tem-se um crescimento normal.

Quando a sucção se estende até os 4 anos de idade, possivelmente


trará as seguintes alterações: retrognatismo mandibular (a mandíbula terá um
deslocamento para trás), prognatismo maxilar (a maxila terá um deslocamento
para frente), mordida aberta, musculatura labial superior hipotônica (mole),
musculatura labial inferior hipertônica (rígida), atresia de palato (céu da boca
profundo), interposição de língua, atresia de arco superior, respiração oral, calo
ósseo na região do polegar.

• Onicofagia

Onicofagia é o hábito de roer unhas, que geralmente se inicia aos 4 ou 5 anos


de idade e funciona como um substituto a sucção digital ou como um libertador
de tensões. Apresenta natureza mais localizada do que aqueles envolvidos
com o hábito de sucção, por pressão anormal. Geralmente os fatores
psicológicos são mais importantes que os fatores oclusivos. A mordida aberta,
bem como a
• Interposição lingual sobremordida, faz
com que a criança
tenha dificuldade
A mordida aberta, bem como a sobremordida, faz com que a na realização do
criança tenha dificuldade na realização do selamento labial correto, selamento labial
requerido para a deglutição normal. Com a finalidade de compensação, correto, requerido
os músculos mentonianos (ao redor dos lábios) tornam-se hipertônicos, para a deglutição
e a língua é projetada para frente, para realizar o selamento labial. normal.

Atividade de Estudos:

1) O que pode causar a má oclusão? E o que a má oclusão pode


causar?
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Linguagem e Fonoaudiologia em Psicopedagogia

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Teste da Linguinha
Com o objetivo de prevenir dificuldades para mamar, estresse tanto para o
bebê e para a mãe; crianças, jovens e adultos com dificuldades na mastigação/
deglutição e alterações na fala, em virtude da alteração de freio lingual, em
2014 foi sancionado pela presidência da república e publicado no  Diário Oficial
da União, em edição especial de 23 de junho/2014 a lei que torna obrigatório a
realização do Teste da Linguinha em recém-nascidos – Lei nº13.002/14.

O teste consiste na avaliação do frênulo da língua em bebês recém-nascidos


para verificar futuros problemas na amamentação, dentição e língua presa.

Língua presa é uma alteração comum, mas muitas vezes ignorada. Ela está
presente desde o nascimento, e ocorre quando uma pequena porção de tecido,
que deveria ter desaparecido durante o desenvolvimento do bebê na gravidez,
permanece na parte de baixo da língua, limitando seus movimentos.

O teste da linguinha é um exame padronizado, realizado pelo


fonoaudiólogo, que possibilita diagnosticar e indicar o tratamento
precoce das limitações dos movimentos da língua causadas pela
língua presa que podem comprometer as funções exercidas pela
língua: sugar, engolir, mastigar e falar.

Fonte: Disponível em: <http://www.sbfa.org.br/portal/pdf/


testelinguinha_2014_livro.pdf>. Acesso em: 25 jan. 2016.

Respiração oral,
como o próprio Respiração Oral
nome sugere, ocorre
quando a respiração, Respiração oral, como o próprio nome sugere, ocorre quando a
que deveria ser respiração, que deveria ser realizada pelo nariz, é realizada pela boca.
realizada pelo nariz, é
realizada pela boca.

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Capítulo 6 Alterações das Funções
Neurovegetativas ou de Motricidade Oral

Segundo Francesco, 2003, a obstrução nasal é uma das


A obstrução nasal
queixas mais comuns em consultórios médicos. Frequentemente, a é uma das queixas
obstrução nasal é crônica e como mecanismo de compensação o mais comuns em
paciente passa a respirar pela boca. Por isso acontecer muito na consultórios médicos.
população em geral, acaba passando despercebido, como se fosse
um hábito natural. Mas a respiração oral gera uma série de distúrbios locais e
sistêmicos que podem comprometer a qualidade de vida do indivíduo, além de
influenciar no crescimento e desenvolvimento craniofacial.

A respiração oral não deve ser considerada uma alternativa fisiológica e sim
uma situação patológica. A respiração nasal é essencial para o crescimento e o
desenvolvimento craniofacial harmoniosos.

As crianças com respiração oral, durante o sono, geralmente apresentam


roncos e, em casos mais graves, chegam a ter apneias obstrutivas (interrupção
da passagem do ar nas vias aéreas superiores).

Em condições normais, a mandíbula é o ponto de apoio que estabiliza a


permeabilidade das vias aéreas superiores, e na respiração oral, não há como
manter essa estabilidade. Em casos de apneia do sono há uma ativação dos
músculos masseteres, para manter a posição da mandíbula e para garantir a
passagem do ar, o que pode promover bruxismo (ranger dos dentes).

Essas crianças também comumente apresentam enurese noturna (xixi na


cama), pois pelos despertares frequentes e os distúrbios respiratórios, há uma
produção aumentada de urina e da excreção de sais.

Alguns sintomas são característicos de crianças que apresentam apneia do


sono, causada pela respiração oral (FRANCESCO, 2003):

• Noturnos: apneia, roncos, despertares frequentes, pesadelos, enurese


noturna.

• Diurnos: respiração oral, hipersonolência, baixa performance escolar,


comportamento agressivo, hiperatividade, déficit de atenção, cefaleia
matinal, infeccções das vias aéreas, rinorreia crônica, distúrbios de
deglutição.

Gozal (1998, apud FRANCESCO, 2003) realizou um estudo no qual


observou uma queda no desempenho escolar de adolescentes de 13 a 14 anos
que apresentavam história prévia de apneia do sono na infância. Ele concluiu
que isso resulta de alterações que podem ter ocorrido durante fases críticas do
crescimento e desenvolvimento cerebral da criança.

105
Linguagem e Fonoaudiologia em Psicopedagogia

O tratamento da O tratamento da respiração oral evita complicações sistêmicas e


respiração oral locais, melhorando a qualidade de vida como um todo.
evita complicações
sistêmicas e locais, Com certeza, você se deparará com estes sintomas, e, apesar de
melhorando a não ser o seu objetivo terapêutico intervir nestas patologias, elas irão
qualidade de vida
interferir no aprendizado do seu aluno.
como um todo.

Como profissionais da saúde/educação, é nosso dever conhecê-los para que


possamos fazer os devidos encaminhamentos, contribuindo assim para a melhora
da saúde geral e consequentemente do desempenho acadêmico do cliente.

No caso da respiração oral, vimos que esta tem relação direta com a
aprendizagem, e por vezes, podemos imaginar que aquela criança que é
dispersa, desligada e tem baixo rendimento escolar tem uma patologia como
por exemplo, déficit de atenção, e esquecemos de levar em consideração as
noites mal dormidas, a dificuldade em manter-se acordado e atento em sala de
aula, a dificuldade em alimentar-se em decorrência da boca aberta, as infecções
frequentes de garganta e/ou ouvido (ocasionando faltas às aulas), etc., tudo em
virtude da respiração oral, que poderia ser, em grande parte das vezes, facilmente
resolvida. Os prejuízos poderão se estender a adolescência e a vida adulta se a
importância devida não for dada.

Cada vez mais estamos preocupados em interceptar alterações que podem


ocasionar prejuízos ao ser humano precocemente, e isto faz com que distúrbios
sejam evitados na infância e adolescência, como é o caso do teste da linguinha,
que já é lei federal.

Com este capítulo conseguimos ter a clareza de que o nosso aluno/cliente


necessita de um olhar do profissional voltado para o seu ser como um todo e não
somente para as alterações de aprendizagem, pois provamos que o que poderia
caracterizar-se como uma dificuldade de aprendizagem seja talvez uma alteração
de outra ordem, por exemplo, respiratória, com consequências na aprendizagem.

Podemos organizar as causas da respiração oral em:

• Fatores anatômicos: desvio de septo, hipertrofia de adenoide, pós-


operatório de cirurgia de nariz, hipertrofia de cornetos inferiores.

• Fatores congênitos (malformações): atresia de coana, cisto dermoide,


glioma nasal, encefalocele.

• Fatores inflamatórios: rinites não infecciosas (rinite alérgica, vasomotora,


medicamentosa, atrófica), polipose nasossinusal, pólipo antrocoanal.

106
Capítulo 6 Alterações das Funções
Neurovegetativas ou de Motricidade Oral

• Fatores infecciosos: resfriado comum, rinossinusite bacteriana, outras.

• Fatores neoplásicos: osteoma, hemangioma, nasoangiofibroma juvenil,


carcinoma epidermoide.

• Doenças sistêmicas.

• Outras causas: corpo estranho, perfuração septal, hematoma e absesso


septal, papiloma, mucocele.

Esses fatores são desencadeadores da respiração oral, mas não são


os únicos, há outros ainda, e assim temos uma ideia de como o diagnóstico é
complexo e merece uma investigação detalhada pelo médico. Além do prejuízo
que a respiração oral causa a todo o organismo, ela também pode ser sintoma
indicativo de alguma doença que talvez ainda não tenha sido diagnosticada.
A população em geral e também os profissionais da saúde, muitas vezes,
menosprezam esse sintoma.

As características faciais do respirador oral são: maxila atrésica, As características


protrusão de incisivos superiores, mordidas abertas e cruzadas, faciais do respirador
eversão do lábio inferior, lábio superior hipodesenvolvido, narinas oral são: maxila
atrésica, protrusão de
estreitas, e flacidez da musculatura orofacial. (FRANCESCO, 2003).
incisivos superiores,
mordidas abertas e
Segundo Assencio-Ferreira, 2003, a respiração oral também causa cruzadas, eversão
distúrbios neurológicos quando atinge os pares cranianos: do lábio inferior,
lábio superior
• Distúrbios gustativos: a respiração oral proporciona maior hipodesenvolvido,
narinas estreitas,
perda da umidade local, levando a ressecamento das mucosas
e flacidez da
e perda da sensibilidade das papilas. O sabor se altera, musculatura orofacial.
principalmente o doce e o salgado.

• Mastigação e deglutição: podem estar alteradas devido à diminuição


de saliva e por provocar desconforto na hora de coordená-las com a
respiração.

• Respiração: a introdução do ar inspirado pela via oral é altamente


maléfica ao sistema respiratório, pois sua inalação sem estar aquecido e
filtrado ocasiona progressivo comprometimento das mucosas faríngeas,
laríngeas e da traqueia.

• Secreção lacrimal: o ressecamento das mucosas provoca maior produção


de saliva pelas glândulas salivares, o que exige presença de maior
quantidade de impulsos nervosos. Essa excessiva estimulação nervosa

107
Linguagem e Fonoaudiologia em Psicopedagogia

desencadeia o reflexo gustatoriolacrimal, clinicamente caracterizado pelo


aumento na secreção de lágrimas.

Além disso, nos respiradores orais, é frequente a obstrução


da tuba auditiva por secreção e falta de aeração das vias
respiratórias, podendo ocasionar alterações timpânicas (otites
de repetição), sendo possível a ocorrência de perda auditiva.
(MARTINS, et al., 2006, p. 176).

Atividade de Estudos:

1) Qual a importância da respiração nasal?


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Disfagia
Disfagia é Disfagia é caracterizada por uma alteração no processo de
caracterizada por deglutição, ou seja, qualquer modificação, desde o momento em que o
uma alteração
alimento entra na boca até sua chegada ao estômago.
no processo de
deglutição, ou
seja, qualquer A disfagia não é uma doença, e sim um sintoma de alguma
modificação, desde patologia que já está instalada ou que está iniciando.
o momento em
que o alimento A deglutição acontece em fases: Antecipatória, Preparatória Oral,
entra na boca até
Oral, Faríngea e Esofageana.
sua chegada ao
estômago.
A fase preparatória oral é responsável pela manipulação,
mastigação e pelo posicionamento final do bolo na cavidade oral
para o transporte pela faringe.

A fase oral é voluntária e responsável pelo transporte do bolo alimentar


até a faringe. Inicia-se quando a língua começa a movimentar o bolo alimentar
posteriormente.

108
Capítulo 6 Alterações das Funções
Neurovegetativas ou de Motricidade Oral

A fase faríngea é reflexiva e responsável pelo transporte do bolo alimentar da


faringe até o esôfago, através da contração da faringe, fechamento velofaríngeo,
elevação e fechamento da laringe, alem da abertura do cricofaríngeo.

A fase esofágica é inconsciente e involuntária e responsável pelo transporte


do bolo alimentar do esôfago ao estômago.

Disfagia então é a dificuldade de deglutição, que interfere no transporte do


bolo alimentar da boca ao estômago.

As causas podem ser:

• Neurogênicas (neurológicas): A.V.E., traumatismo cranioencefálico,


doenças degenerativas, tumores no cérebro, paralisia cerebral,
síndromes, ou seja, qualquer doença que atinja o sistema nervoso e
a região responsável pelo comando de qualquer uma das fases de
deglutição.

• Mecânicas: são aquelas em que falta alguma das estruturas responsáveis


pela deglutição, por exemplo, no caso da retirada da língua ou laringe por
um tumor, um trauma de face, quando alguma das estruturas é quebrada,
traqueostomia, fissura labiopalatina, etc.

• Psicogênicas (psicológicas): a pessoa sente geralmente “um bolo na


garganta”, ou alguma sensação que dificulta a deglutição, mas através de
exames conclui-se que não há um motivo anatômico ou fisiológico para a
queixa.

• Induzidas por drogas: algumas drogas medicamentosas causam secura


na boca (xerostomia), atraso no disparo do reflexo de deglutição, etc., que
interferem em parte do processo de deglutição.

• Decorrentes da idade: nesse caso não será chamada de disfagia e sim


de presbifagia, e é um processo natural do envelhecimento das estruturas
responsáveis pela deglutição.

A disfagia é sintoma de alguma alteração nos mecanismos do controle


neuromotor ou sensorial da deglutição. Esses mecanismos estão relacionados
com uma complexa ativação de vários circuitos neuronais que exigem uma
execução harmônica envolvendo a integridade das vias aferentes, eferentes,
sensitivas e motoras.

109
Linguagem e Fonoaudiologia em Psicopedagogia

Um indivíduo disfágico pode ter um leve desconforto ao engolir,


Um indivíduo
disfágico pode ter enquanto outro pode ser incapaz de ingerir qualquer alimento de
um leve desconforto maneira segura e apresentar complicações clínicas como desnutrição,
ao engolir, enquanto desidratação, pneumonia aspirativa, entre outras.
outro pode ser
incapaz de ingerir A alimentação para esses pacientes torna-se preocupante e afeta sua
qualquer alimento
vida diária, sendo necessário que durante todas as deglutições estejam
de maneira segura
e apresentar atentos à forma de engolir, passando de um processo inconsciente para
complicações clínicas um processo consciente.
como desnutrição,
desidratação, As manifestações mais frequentes observadas nos pacientes com
pneumonia disfagia são:
aspirativa, entre
outras.
• hesitação ou inabilidade para engolir;
• retenção de alimento na boca ou na faringe;
• regurgitação nasal do alimento (o alimento volta pelo nariz);
• deglutição múltipla (tem que engolir muitas vezes para que a deglutição
seja eficiente);
• limpeza frequente da garganta (pigarros e sensação de que ficou algo na
garganta);
• voz molhada após a deglutição (sinal de que ficou alimento ou saliva em
cima das pregas vocais);
• tosse durante ou depois de engolir;
• necessidade de limpar a garganta após engolir alimentos sólidos;
• perda de peso por causa da dificuldade de engolir, e desidratação;
• episódios periódicos de pneumonia (porque o alimento, ao invés de ir
para o estômago, vai para o pulmão, causando a pneumonia aspirativa);
• engasgos durante a alimentação.

Atividade de Estudos:

1) O que é disfagia? Você já conhecia esta patologia? Qual é o


profissional que deve tratá-la?
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Capítulo 6 Alterações das Funções
Neurovegetativas ou de Motricidade Oral

Algumas Considerações
Neste capítulo pudemos perceber o quanto é importante o adequado
funcionamento de todas as estruturas orofaciais e cervicais e das funções
neurovegetativas.

Com certeza, você se deparará com estes sintomas, e, apesar de não


ser o seu objetivo terapêutico intervir nestas patologias, elas irão interferir no
aprendizado do seu aluno.

Como profissionais da saúde/educação, é nosso dever conhecê-los para que


possamos fazer os devidos encaminhamentos, contribuindo assim para a melhora
da saúde geral e consequentemente do desempenho acadêmico do cliente.

No caso da respiração oral, vimos que esta tem relação direta com a
aprendizagem, e por vezes, podemos imaginar que aquela criança que é
dispersa, desligada e tem baixo rendimento escolar tem uma patologia como
por exemplo, déficit de atenção, e esquecemos de levar em consideração as
noites mal dormidas, a dificuldade em manter-se acordado e atento em sala de
aula, a dificuldade em alimentar-se em decorrência da boca aberta, as infecções
frequentes de garganta e/ou ouvido (ocasionando faltas às aulas), etc., tudo em
virtude da respiração oral, que poderia ser, em grande parte das vezes, facilmente
resolvida. Os prejuízos poderão se estender a adolescência e a vida adulta se a
importância devida não for dada.

Cada vez mais estamos preocupados em interceptar alterações que podem


ocasionar prejuízos ao ser humano precocemente, e isto faz com que distúrbios
sejam evitados na infância e adolescência, como é o caso do teste da linguinha,
que já é lei federal.

Com este capítulo conseguimos ter a clareza de que o nosso aluno/cliente


necessita de um olhar do profissional voltado para o seu ser como um todo e não
somente para as alterações de aprendizagem, pois provamos que o que poderia
caracterizar-se como uma dificuldade de aprendizagem seja talvez uma alteração
de outra ordem, por exemplo, respiratória, com consequências na aprendizagem.

Você não irá atender terapeuticamente pacientes que apresentam esses


sintomas no consultório ou na instituição, mas pode orientá-los sobre os
malefícios da respiração oral, dos hábitos prejudiciais ao desenvolvimento de
nossas estruturas craniofaciais e também fazendo prevenção, evitando que esses
hábitos se instalem na população atendida por você.

111
Linguagem e Fonoaudiologia em Psicopedagogia

Referências
ASSENCIO-FERREIRA, V. Alterações dos pares cranianos devido à respiração
oral. In: Respiração Oral. São José dos Campos: Pulso, 2003.

FRANCESCO, R. Consequências da respiração oral. In: Respiração Oral. São


José dos Campos: Pulso, 2003.

KOHLER, G. Desenvolvimento da Oclusão. In: PETRELI, E. Ortodontia para


Fonoaudiololgia. São Paulo: Lovise, 1994.

MARTINS, A. et al. Estudo da relação entre respiração oral e perda auditiva.


Revista da Sociedade Brasileira de Fonoaudiologia, São Paulo, v. 11, n. 3, p.
175-180, 2006.

MORESCA, C.; FERES, M. Hábitos viciosos bucais. In: PETRELI, E. Ortodontia


para Fonoaudiololgia. São Paulo: Lovise, 1994.

SCHWARTZ, E.; SCHWARTZ, E. Etiologia da Má Oclusão. In: PETRELI, E.


Ortodontia para Fonoaudiololgia. São Paulo: Lovise, 1994.

SOBRINHO, J. B. Fisiologia do Sistema Nervoso Neurovegetativo. Acta


Fisiátrica. v. 10, n. 3, p. 122-132, 2003.

112
C APÍTULO 7
Alterações de Aprendizagem

A partir da perspectiva do saber fazer, neste capítulo você terá os seguintes


objetivos de aprendizagem:

33 Analisar o papel do fonoaudiólogo e do psicopedagogo


nas alterações de aprendizagem.

33 Constatar o conceito de dislexia, disortografia e disgrafia.

33 Aplicar orientações práticas para a escola e a família.


Linguagem e Fonoaudiologia em Psicopedagogia

114
Capítulo 7 Alterações de Aprendizagem

Contextualização
Para finalizar este caderno de estudo falaremos brevemente sobre
as alterações de aprendizagem. A aprendizagem é o objeto de estudo do
psicopedagogo e do fonoaudiólogo, visto que os dois profissionais dedicam-se,
com olhares específicos, a estudar a linguagem escrita.

Um dos principais objetivos da escolarização é a aprendizagem da leitura


e escrita, objeto com o qual o sujeito irá interagir ao longo da vida, das mais
diversas formas, seja acadêmica ou cotidiana, desde ler o letreiro no ônibus,
acompanhar um filme legendado no cinema ou dedicar-se a uma profissão que
exija conhecimento aprofundado da língua.

Mas, parece que isto não tem sido tarefa fácil. Segundo o INEP, estima-
se que 40% da população ou mais dos estudantes estão tendo dificuldades no
processo de aprendizagem, principalmente envolvendo o domínio da leitura e
escrita. (ZORZI, 2003).

Os valores indicativos de altos índices de dificuldades de


aprendizagem e de baixo rendimento escolar, mesmo daque-
las crianças consideradas como não apresentando qualquer
distúrbio de aprendizagem levantam questões fundamentais,
particularmente em termos das etapas iniciais da escolariza-
ção. (ZORZI, 2003, p. 120).

A aprendizagem pode sofrer influência de diferentes fatores, e entre estes se


encontram os fatores sociais-econômicos-culturais, emocionais, educacionais,
neurológicos e genéticos. Por isso, ao se investigar as possíveis causas dos
problemas de aprendizagem, devemos ter o cuidado em diferenciar aqueles que
apresentam dificuldade de origem social-econômica-cultural e emocional daqueles
que apresentam alterações nas habilidades cognitivo-linguísticas de origem genético-
neurológica (CAPELLINI; CIASCA 2000; CAPELLINI; SALGADO 2003; CAPELLINI;
PADULA; CIASCA 2004 apud CAPELLINI; GERMANO; PADULA, 2010).

Os profissionais da saúde e da educação devem estar atentos e preparados


para identificar os fatores desencadeantes e agravantes dos problemas de
aprendizagem, uma vez que independentemente das manifestações, que
são semelhantes, ou seja, dificuldades para ler, escrever, resolver cálculo
matemático ou problemas aritméticos com enunciado, as causas são diversas e
consequentemente as formas de intervenção no contexto clínico e educacional
têm que ser distintas para um melhor desenvolvimento acadêmico dos escolares
com algum tipo de dificuldade na aprendizagem escolar. (CAPELLINI; GERMANO;
PADULA, 2010).

115
Linguagem e Fonoaudiologia em Psicopedagogia

A Linguagem e as Dificuldades de
Aprendizagem
As dificuldades de aprendizagem são bastante discutidas e ainda hoje
polêmicas. O que as causa? Como tratá-las? Quem é o profissional que deve
responsabilizar-se?

Começo dizendo que todos nós somos responsáveis. Nós quem? Pedagogos,
professores, auxiliares de classe, gestores públicos, pais, formadores de opinião, etc.

Mas não são os professores os responsáveis por “ensinar” a ler e a escrever?


Depende do conceito de “ensinar”. Se considerarem que fazer as crianças
repetirem, copiarem e tomarem cuidado para não adivinharem o que está escrito,
sem considerar suas hipóteses na construção deste conhecimento, diria a você
que não deveria ser nenhuma dessas pessoas.

Por que não sentamos a criança pequena em um banco a nossa frente, e


fazemos com que ela repita todas as letras, para só então permitirmos que ela
fale as sílabas, e depois, na sequência, as palavras? Porque a criança é ativa no
processo de desenvolvimento de linguagem. Por que não seria ela no processo
de aquisição da linguagem escrita?

Claro que, como em todas as patologias e dificuldades do ser humano, as


dificuldades de aprendizagem também podem ter um fundo biológico, orgânico,
de adaptação, etc. Mas será que tudo que a escola, e nós mesmos, como
profissionais da linguagem, rotulamos como dificuldade de aprendizagem da
criança, não é causado por uma dificuldade nossa em compreender o processo
de aquisição dessa linguagem?

Por que não podemos considerar que a criança está lendo o rótulo da coca-
cola, e dizemos “impossível, ela ainda não aprendeu as letras na escola”?.

Quando a criança inicia a fase escolar, ela não deixa tudo que viveu e
aprendeu do lado de fora do portão, para, a partir daquele momento, realmente
aprender a ler e escrever.

Gostaria que neste capítulo, ao invés de rótulos, como criança disléxica ou


disgráfica, pudéssemos pensar um pouquinho mais no processo em que a criança
está inserida, e como é difícil para ela ter que aprender uma forma de linguagem
que não faz sentido naquele momento, como não faz sentido para ela também

116
Capítulo 7 Alterações de Aprendizagem

ficar quatro horas diárias, quando não mais, na escola, aprendendo algo que
dizem que precisa aprender para ser “alguém na vida”.

Hoje, como você já sabe, as escolas, muitas delas, estão desenvolvendo


metodologias de aprendizagem pautadas em projetos, em que a criança decide,
com a classe e a professora, a rotina, as atividades, e aprende que escrever
não serve só para fazer vestibular, mas para poder participar de um processo
cooperativo com seus colegas, para que possa localizar-se em um mapa, ou
escrever um bilhete, e aí, sim, sem ter que decorar as letras, poder, com liberdade,
aprender a escrever, como aprendeu a falar.
Para Moraes, 1998, a aquisição da leitura e escrita faz parte de um processo
lingüístico complexo e, portanto, a dificuldade não pode ser considerada de forma
isolada, mas fazendo parte de uma dificuldade na estrutura e organização da
linguagem em geral.

Por essas razões, a autora citada complementa que a criança precisa ser
vista de forma particular, porém o problema tem que ser visto de modo global,
abrangendo todos os aspectos que possam estar envolvidos.
A dificuldade de
Até os anos 50, as dificuldades escolares eram vistas como aprendizagem vai
incapacidade de aprender, sendo que este aprender referia-se a captar muito além de ler e
ideias, fixar seus conteúdos, retê-los e evocá-los. A partir daí, várias escrever, ou decifrar
pesquisas vêm sendo realizadas, percebendo-se que a dificuldade de um código, mas
aprendizagem vai muito além de ler e escrever, ou decifrar um código, está diretamente
relacionada com a
mas está diretamente relacionada com a linguagem.
linguagem.

Atividade de Estudos:

1) Pegue uma folha de papel e um lápis e obrigue-se a fazer para si um


inventário de suas leituras do dia de ontem. Faça-o em três colunas:

O que eu li? Em que situação? Por quê?


Para quê?

O que observou? Não se esqueceu de nada? Nem das placas de trânsito?


Quais os problemas enfrentados para completar esse quadro?
Qual a relação entre tais situações de leitura e as propostas pela escola?

Fonte: Atividade sugerida em: OLIBERT, J. e col. Formando


crianças leitoras. Porto Alegre: Artes Médicas, 1994. p. 16.

117
Linguagem e Fonoaudiologia em Psicopedagogia

Dificuldades de Aprendizagem /
Distúrbios de Aprendizagem
Dificuldade e distúrbio de aprendizagem muitas vezes são confundidos, mas
não devem ser vistos como sinônimos.

A dificuldade de aprendizagem refere-se a um termo mais geral e abrangente


com causas relacionadas com o sujeito que aprende, com os conteúdos
pedagógicos, com o professor, com os métodos de ensino, com o ambiente
físico e social da escola, e o distúrbio de aprendizagem se refere a um grupo
de dificuldades mais difíceis de serem identificadas, mais específicas e pontuais,
com presença de alteração neurológica, responsável pelo insucesso na escrita,
na leitura e no cálculo matemático (CAPELLINI; GERMANO; PADULA, 2010).

Torgensen e Wong (1986) e Lerner (1989) descreveram que fazem parte do


distúrbio de aprendizagem as seguintes manifestações:

• Distúrbios da atenção sustentada,


• Problemas receptivos e de processamento da informação,
• Dificuldades de leitura, e
• Dificuldades em matemática.

Capellini, Germano e Padula (2010) colocam que o atraso na aquisição e


desenvolvimento de linguagem são alguns prejuízos anteriores aos distúrbios de
aprendizagem, e Gerber (1996) identificou que nos distúrbios de aprendizagem
relacionados com a linguagem, os déficits fonológicos comprometem a codificação
fonológica na memória de curto prazo, percepção do material auditivo verbal da
linguagem oral e a percepção fonológica na segmentação da palavra falada.

Dislexia
A dislexia do desenvolvimento é uma desordem definida como uma
dificuldade de realizar a leitura, mesmo com a inteligência dentro dos padrões
de normalidade, motivação e educação adequadas. (TEMPLE et al, 2000 apud
CAPELLINI; GERMANO; PADULA, 2010).

É considerada um distúrbio específico de aprendizagem de origem genética


e neurológica. Os genes ligados a dislexia estão localizados nos cromossomos
2, 3, 6, 15 e 18. (BRAMBATI et al, 2006; FISHER; FRANCKS, 2006; GIBSON;
GRUEN, 2008; apud CAPELLINI; GERMNAO; PADULA, 2010).

118
Capítulo 7 Alterações de Aprendizagem

Estes mesmos autores colocam que a base neurológica da dislexia vem de


estudos de investigação de imagem funcional do cérebro, os quais demonstram
uma falha no sistema funcional durante a leitura no hemisfério esquerdo, devido
a uma atividade menor em algumas partes do cérebro em comparação aos
indivíduos normais, tais como o córtex perissilviano esquerdo, o córtex temporal
inferior e mediano (áreas de processamento fonológico), a inervação magnocelular
visual e a auditiva (áreas de processamento visoespacial e auditivo), conforme
descrito por Galaburda e Cestnick (2003) e Galaburda (2005).

Além disso, colocam que umas das maiores contribuições dos estudos
sobre a dislexia foi o entendimento de que sua origem se dá durante o período
embrionário, significando que não se trata de consequência de um problema
ambiental ou social, mas decorrente de um dano neurológico que ocorre no
período de desenvolvimento fetal.

Disgrafia A disgrafia
caracteriza-se
pela dificuldade
A disgrafia caracteriza-se pela dificuldade motora, letra ilegível motora, letra ilegível
(irregular), má organização da escrita na página, distorções na forma (irregular), má
de letras ou letras com traçados irregulares. organização da
escrita na página,
Os fatores ligados ao desenvolvimento da criança incidem distorções na forma
de letras ou letras
diretamente no grafismo e manifestam-se nesta ordem, segundo
com traçados
Moraes (1998): irregulares.

• desenvolvimento de motricidade: é a base essencial para a escrita;

• desenvolvimento da linguagem e estruturação espaço-temporal: o


texto escrito marca o domínio da linguagem da criança. A sucessão de
grafemas que forma as palavras estrutura-se no tempo e no espaço, daí a
importância do ritmo gráfico e das unidades espaçotemporais;

• a influência e as exigências da situação e do meio: a escrita não começa


na escola, mas resulta de um processo de evolução que nasce em virtude
do meio e adquire significado na escola.

Um bom traçado na escrita (grafia) exige, entre outras coisas, controle motor
fino, integração viso-motora, planejamento motor, propriocepção, percepção
visual, atenção sustentada e consciência sensorial dos dedos. (FEDER;
MAJNEMER, 2007; ROSEEMBLUM; ALONI; JOSMANN, 2009; RODRIGUES;
CASTRO; CIASCA, 2009 apud FUKUDA; OKUDA, 2010).

119
Linguagem e Fonoaudiologia em Psicopedagogia

Para que o ato motor adequado ocorra, há um processo natural que se inicia
no sistema nervoso central para coordenar e integrar a função motora. Assim,
é na região anterior do cérebro que acontece o planejamento, organização e
execução do movimento. Outras áreas também participam da ação motora,
enviando mensagens, dosando a força, a agilidade, fornecendo feedback visual,
tátil e auditivo, permitindo dessa forma, o ajuste constante do movimento. Na
região frontal, o movimento acontece da seguinte forma: primeiramente, há uma
intenção de movimento, um planejamento elaborado no córtex pré-frontal, em
seguida, essa informação passa para a área pré-motora (que fica entre o lobo
frontal e a área motora), que é responsável por organizar a sequência motora,
posteriormente, esta é projetada na área motora primária (que fica no giro pré-
central) que enviará os impulsos (via medula) para a musculatura a fim de executar
o movimento planejado. Este processo é controlado por muitas outras estruturas
que dosam a força, a velocidade, e dão feedback constante ao movimento (KOLB;
WHISHAW, 2002; FUKUDA; OKUDA, 2010).

Ufa! Que processo complexo! Como seria importante se pudéssemos


perceber as dificuldades que as crianças demonstram precocemente, e que
podem já estar indicando dificuldades que terão na aprendizagem, para que
pudéssemos intervir o quanto antes, minimizando prejuízos na alfabetização.

Tabaquim (2008 apud FUKUDA; OKUDA, 2010), descreveu alguns sinais de


alerta para a disgrafia, que podem nos servir de guia na observação de nossos
alunos/clientes:

• Ter dificuldade em escrever (traçado de má qualidade, distorção da forma


da letra, substituição de curvas por ângulos, separação inadequada das
letras, irregularidade no espaçamento das letras nas palavras),

• Apresentação desordenada de textos (dificuldade com alinhamento,


irregularidade entre palavras, linhas, entrelinhas, direção da escrita
oscilando para cima e para baixo),

• Margens malfeitas ou inexistentes,

• Dificuldades com as atividades que requerem o uso coordenado dos dois


lados do corpo,

• Dificuldade para balancear a necessidade de velocidade com a de


exatidão (letra com forma boa, mas escrita lenta),

• Dificuldades acadêmicas em disciplinas que requerem escrita correta e


organizada na página (matemática, ditado, redação),

120
Capítulo 7 Alterações de Aprendizagem

• Problemas em atividades de vida diária, como abotoar, fechar zíper, entre


outros, e

• Problemas na organização (carteira, mesa, armário, dever de casa ou


mesmo espaço na página).

A intervenção nos casos de disgrafia se inicia com a prevenção no jardim


de infância, onde os escolares devem ser estimulados a realizar atividades que
trabalhem a coordenação motora fina, objetivando a preparação motora para a
escrita e consequentemente a diminuição de casos de crianças com disgrafia, em
casos não associados com uma patologia maior.

Disortografia
A codificação da palavra em um sistema de escrita alfabético pode ser
explicada pelo processo Dupla-Rota, isto é, a escrita pode ser produzida por meio
de um processo envolvendo a mediação fonológica direta – rota fonológica – ou
por meio de um processo visual direto envolvendo a representação das palavras
conhecidas, armazenadas no léxico de input visual – rota lexical. A escrita pela rota
fonológica depende da utilização do conhecimento das regras de conversão entre
grafema e fonema para que a construção da grafia da palavra possa ser efetuada.
É criado, então, um código fonológico com o objetivo de este ser identificado pelo
sistema de reconhecimento auditivo de palavras, liberando o significado da palavra.
Já a escrita pela rota lexical depende do acesso ao léxico pelo input visual, formado
mediante o reconhecimento de uma palavra e memorização desta, da recuperação
do significado e da pronúncia dessa palavra por meio de endereçamento direto ao
léxico. (ELLIS; YOUNG, 1988; ELLIS, 1995; PINHEIRO; ROTHE-NEVES, 2001;
PINHEIRO, 2006; BATISTA; GONÇALVES; NOBRE, 2010).

O escritor utiliza a rota fonológica para escrever pseudopalavras e palavras


pouco frequentes ou desconhecidas, e utiliza a rota lexical para escrever as
palavras que compõem o léxico grafêmico ou ortográfico, permitindo deste modo,
também escrever palavras de ortografia arbitrária.

A disortografia, então, compreende um padrão de escrita que foge às regras


ortográficas, estabelecidas convencionalmente, que regem determinada língua.

De um modo geral, podem se apresentar como substituição, omissão e


inversão de grafemas, alteração na segmentação de palavras, persistência do
apoio da oralidade na escrita e dificuldade na produção de textos.

121
Linguagem e Fonoaudiologia em Psicopedagogia

Atividade de Estudos:

Tome um artigo ou uma página de romance que você tem vontade de


ler com atenção. Reserve-o, não o percorra com o olhar.

Agora, pegue uma folha de papel branco, grossa (não transparente)


e uma tesoura. Na folha branca, recorte três janelinhas, uma embaixo
da outra e separadas por faixas de pelo menos cinco centímetros,
com a seguinte dimensão: a primeira, com o tamamho de uma sílaba
de três letras do texto; a segunda com o tamanho de uma palavra de
sete a oito letras do texto; e a terceira janela, com o tamanho de uma
linha inteira do texto.

Está pronto? Obrigue-se a ler as cinco primeiras linhas do texto


somente através da janela-sílaba, a seguir, cinco a seis linhas com
a janela-palavra, as linhas seguintes com a janela-linha e, para
terminar, o resto do texto sem nenhuma janela.

Fonte: JOLIBERT, J. e col. Formando crianças leitoras.


Porto Alegre: Artes Médicas, 1994. p.17.

1) Observações? Problemas? Deduções?

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Algumas Considerações
Vimos, no decorrer deste capítulo, que não é possível dissociar a
aprendizagem da linguagem.

Você conseguiu perceber que as duas estão intimamente ligadas e que


muitas das dificuldades de aprendizagem que as crianças “apresentam” ocorrem
em virtude de desconsiderarmos essa premissa?

122
Capítulo 7 Alterações de Aprendizagem

Claro que realmente existem dificuldades de aprendizagem, não estou


considerando que a escola ou os profissionais da educação são os grandes vilões,
mas alertando para o fato de que, antes de diagnosticarmos uma patologia de
aprendizagem em uma criança, temos que considerar a aprendizagem como um
processo, e reconhecer tudo o que interfere nesse processo.

Esta disciplina propôs-se a discutir as questões relacionadas à comunicação


humana, principalmente a linguagem.

Durante esse processo de busca pelo conhecimento, tivemos a oportunidade


de relembrar alguns conceitos e aprender alguns novos.

A intenção durante todo o tempo foi de levá-lo pelos caminhos da linguagem


e concluir, ao final, o quanto esta é importante para qualquer aprendizado, seja
ele formal ou não.

É através da linguagem que nos conectamos ao mundo. Nossas primeiras


relações, ainda enquanto bebês, são realizadas na e pela linguagem.

Estamos inseridos, querendo ou não, num mundo onde a linguagem, seja ela
da forma que for, nos é imprescindível, pois somos seres sociais.

Freud, em um de seus escritos, afirmou que não nos tornamos homens, seres
racionais, porque pensamos, e sim porque estamos inseridos na linguagem.

É ela, a linguagem, que nos oportuniza passar nossos conhecimentos de


geração para geração, e também organizar nossos processos mentais, como
raciocínio, planejamento, e até nossas ações.

E quando levamos em consideração que ela é biológica, mas também fruto


do social, temos de lembrar que cada sujeito, por ser individual, terá também uma
linguagem individual, que é opaca e polissêmica.

Dizemos que é opaca porque não é transparente, é como um vidro que


não nos permite ver o que há no seu interior. É exatamente este o sentido de
opaca: o que dizemos não é transparente ao outro, que nos escuta. Cada um
irá interpretar um dizer de forma diferente, dependente do seu conhecimento,
da sua vivência pessoal, e até da experiência que está vivendo. Explico melhor:
digamos que várias pessoas estão assistindo a um filme ou a uma palestra. Cada
um dos ouvintes irá entender a mensagem de formas diferentes, dependendo do
seu conhecimento, vivência e momento. Uma mensagem, que foi extremamente
significativa para um, pode não ter tido importância para o outro. Nos filmes isso
sempre acontece. Se formos comparar, em um filme, em que momento cada um

123
Linguagem e Fonoaudiologia em Psicopedagogia

dos espectadores chorou, perceberemos como a mensagem foi diferente para


cada um. Há aqueles que não se emocionam com uma determinada cena, mas
choram em outra que não é tão emocionante para nós, porque o que emociona
um não emociona o outro, e aí está a opacidade da linguagem.

E por que a linguagem é polissêmica? Polissemia quer dizer vários


sentidos, ou seja, em um enunciado podemos encontrar várias interpretações.
Isso fica muito claro na nossa vida profissional, quando orientamos um cliente
e, na semana seguinte, a mãe daquela criança chega e diz “eu fiz exatamente
como você orientou”, e quando o cliente conta como fez, você pensa ” mas eu
orientei exatamente o contrário”. Isso acontece porque em tudo que dizemos
há sempre mais de um sentido. Você já deve ter vivenciado uma briga com
namorado(a) ou cônjuge, e quando a discussão termina, tem sempre alguém
que diz, “mas não foi isso que eu quis dizer”. Por quê? Porque a linguagem é
polissêmica.

Por esses motivos, não é tão simples ser educador ou terapeuta, porque ao
mesmo tempo em que estamos inseridos na linguagem, estamos nos utilizando
dela para realizar nosso trabalho.

E complica ainda mais quando o que nos chega é a linguagem patológica.


Se já não é simples quando está tudo indo bem, imagine quando tem algo errado.
E sabemos que, na realidade, somos chamados, infelizmente, mais para apagar
fogo, ou seja, resolver situações já instaladas do que propriamente para fazer
prevenção dessas situações.

Por isso me preocupei tanto, durante esta disciplina, em passar conteúdos referentes
também à normalidade e não só às situações patológicas, para que você possa, além
de “apagar incêndio”, construir uma trajetória profissional preocupando-se não só com a
reabilitação, mas também com a promoção da saúde.

Em algumas situações, caberá ao psicopedagogo encaminhar o seu cliente


a outro profissional, mas nesse caso você terá que reconhecer o que está
alterado e qual o profissional mais adequado. Parece redundante, mas, muitas
vezes, deixamos passar despercebidos detalhes que poderiam melhorar muito a
qualidade de vida de nosso cliente e de sua família. Um bom exemplo é o caso
da respiração oral, que não será tratada pelo psicopedagogo, mas aquela família
atendida por você talvez não saiba que a respiração oral pode estar interferindo
na aprendizagem da criança.

Ou que aqueles engasgos frequentes podem estar sinalizando uma patologia


neurológica.

124
Capítulo 7 Alterações de Aprendizagem

Estar atento a todos os detalhes da vida do nosso cliente, e não só olhar


para ele como um quadradinho, onde se coloca um diagnóstico e um prognóstico,
deve ser a atitude do profissional comprometido com o juramento que fez no dia
da formatura.

E, para isto, não basta saber técnicas, mas antes de tudo, ter sensibilidade
de escutar e entender as entrelinhas da queixa que nos é trazida. Entretanto,
a sensibilidade, sozinha, não faz nada. Temos de ter conhecimento para dar
resolubilidade às situações que nos aparecem, mesmo que não seja da nossa
formação e tivermos que encaminhar as pessoas a outro profissional.

Por fim, termino este caderno, consciente de que todos os dias novas
informações surgirão e que o assunto não se esgota aqui. Procurei plantar uma
sementinha para sensibilizá-lo com relação a alguns assuntos. Desejo que essa
semente germine, e que você possa buscar sempre novas formas de ser um
profissional melhor, como a que você buscou fazendo este curso.

Atividade de Estudos:

1) Qual a relação da aprendizagem com a linguagem?


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Referências
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CAPELLINI, S.A.; GERMANO, G.D.; CUNHA, V.L. (Orgs). Transtornos de
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dos Campos: Pulso Editorial; 2010. p. 91-103.

125
Linguagem e Fonoaudiologia em Psicopedagogia

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JOLIBERT, J. Formando crianças leitoras. Porto Alegre: Artes Médicas, 1994.


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MASSI, G.; BERBERIAN, A. A clínica fonoaudiológica voltada aos chamados


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Você também pode gostar