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para designar os profissionais que denunciavam o que havia de
pior na sociedade: casos de corrupção política, exploração laboral
e demais abusos de personagens e instituições da época.
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da guerra de infantaria dos americanos foram responsáveis pela
derrota alemã” — Seldes diz ter ouvido isso da boca do militar.
Ao voltar para o acampamento aliado com a maior entrevista de
sua vida, foi ameaçado de morte por fuzilamento pelos generais
franceses: os jovens jornalistas quebraram o armistício, cruzando
uma fronteira proibida e cometendo um crime que poderia com-
prometer o acordo de paz. Todo o material coletado na entrevista
histórica foi confiscado e, por pouco, os quatro não voltam para
casa. Aqui, há muito campo para especulação: até sua morte,
Seldes sustentou que os antigos jornalistas presentes no campo
dos aliados (inclusive homens do New York Times) criaram pressão
suficiente entre os grandes escalões do exército para que aqueles
quatro desconhecidos não publicassem a maior matéria do dia.
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recuperamos até hoje.3 Muito da mídia independente, da mídia
local e dos veículos de comunicação ligados a sindicatos foram à
falência; se o crescimento de uma cultura popular de massa vinha
se formando desde os muckrakers, sempre localmente e voltado
a pequenas comunidades, 1929 foi o momento em que a mídia
corporativa teve terreno livre para expandir sua influência. Com a
plataforma de distribuição avançada e a necessidade de sobreviver à
recessão, além do aperfeiçoamento de tecnologias de radiodifusão,
logo surge espaço para comentadores públicos e ideólogos, algo
que ajudou a derrubar as barreiras entre a notícia e o comentário.
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A tarefa do jornalista ante a ascensão do fascismo
O percurso de Seldes como jornalista independente foi bri-
lhante: de 1940 a 1950, seu In Fact foi publicado como um boletim
semanal de quatro páginas, informando os desdobramentos da
política nacional e internacional.6 A metodologia de aliar o que
ocorria no estrangeiro e pesar suas repercussões em casa era, por si
só, um gesto vanguardista. Um levantamento sobre o jornalismo
de uma geração antes, em 1927, mostra que eventos estrangeiros
preenchiam meros 2,5 a 9% dos veículos de mídia estadunidenses.7
Como resultado, havia um grande despreparo por parte dos pro-
fissionais para relatar ocorridos de demais contextos com devido
embasamento, além da falta de interesse público pelo que não fosse
estritamente local; daí advém um certo paroquialismo político na
esfera pública estadunidense desde aquela época.
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Seldes pôde acompanhar passo a passo da insanidade peri-
gosa em que o povo alemão afundava, a complacência da classe
média que se julgava “cansada da política”, e aceitava deixá-la nas
mãos de quem vociferasse mais alto suas promessas de redenção.
Se hoje ainda circula a teoria (absurda) de que Hitler foi um
grande estrategista, um gênio da oratória carismático, e que isso
contribuiu para a sua ascensão — até mesmo historiadores liberais
insistem nesse mito —, o texto de Fatos e Fascismo nos mostra
como ninguém nos anos 1920 sofria de tal ilusão. Hitler sempre
foi um pintor de paredes ensandecido que ninguém levava a sério
até ser posto no poder. Era evidente, mesmo antes da eclosão da
campanha imperialista do Reich que terminou na Segunda Guerra
Mundial, como os grandes capitalistas alemães arquitetaram a
imagem pública do Führer. Um deles foi Fritz Thyssen, o cabeça
do riquíssimo Truste das Indústrias de Aço da região do Reno.
Nas palavras de Seldes,
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as contribuições de Seldes como obras de um fanático para quem
tudo e todos eram agentes de extrema-direita disfarçados. Isso
se deu, em partes, a partir da reação contra uma série de artigos
veiculados em 1942 no já mencionado semanário In Fact, onde
seu editor propôs fornecer um guia detalhado de como ler a mídia
americana. Alguns trechos não passam de provocações em tom de
piada, como no tópico em que Seldes responde à questão “Como
ler a coluna editorial?” com um simples “Don’t”. “Não a leia”. (Isso
é uma piada, embora haja algo inquietante por trás dessa dica;
colunas editoriais até hoje são meros artigos de opinião, e a opinião
pessoal de um jornalista pouco deveria importar para o público.
Muito menos guiá-lo em suas decisões políticas).
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formação de outras críticos brilhantes da opinião pública como
I. F. Stone, Noam Chomsky, Michael Moore, Edward Snowden e
Glenn Greenwald. Aprender com Seldes é, também, uma urgência
na era das fake news, em que o pendor à distorção da antiga mídia
comercial chega ao ponto de descolar a opinião pública da realidade
com tal eficácia que produz um regime onde mentiras óbvias
operam como verdades. Elas operam como se fossem verdades,
alterando atitudes de massas que encaram a objetividade do mundo
como um jogo retórico.
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