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Dinossauros258 PDF
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O fim dos di
A vida na Terra passou por várias ‘crises’, como podem
ser chamadas as extinções massivas de espécies. Em uma delas,
há cerca de 65 milhões de anos, os dinossauros desapareceram.
É indiscutível que, nessa época, um grande asteroide se chocou
com a superfície do planeta, e que isso contribuiu para a extinção
desses animais ou a acelerou, mas essa não foi a única ou a maior razão.
As causas foram provavelmente alterações drásticas em ecossistemas
marinhos e terrestres. Mas o que teria provocado tais mudanças?
O debate entre os que defendem o cataclisma cósmico e os que sustentam
um vulcanismo intenso como o fator principal já dura quase 30 anos.
Recentes estudos mostram que as extinções massivas têm causas muito
mais complexas do que se poderia supor. Esse tema é bem atual:
nos últimos 500 anos, mais de mil espécies desapareceram,
o que pode indicar que estamos no limiar de uma nova
extinção massiva, talvez decorrente de ações humanas.
José Antônio de Freitas Pacheco
Observatoire de la Côte d’Azur (Nice, França)
A diversidade das diferentes formas de vida existentes na as espécies que surgiram durante a evo
Terra causa espanto e admiração. Até hoje, lução do planeta foram extintas.
foram descritas cerca de 2 milhões de Formas de vida desaparecem con
espécies, mas diferentes estimativas indi tinuamente no decorrer da evolução,
cam que o número total estaria hoje entre mas o estudo da história da vida revela
5 e 100 milhões. A grandeza desses nú momentos em que ocorreram extinções
meros é mais surpreendente diante da em massa. Uma extinção é dita massiva
constatação de que cerca de 90% de todas quando há um súbito aumento da taxa de
nossauros
Choque de um asteroide, vulcanismo ou outra causa?
Nesse caso, diferentes tipos de organismos extinções representam apenas uma que
desaparecem rapidamente (em termos de da temporária no processo evolutivo da
tempo geológico) e em escala global. Ex diversificação.
tinções massivas, porém, não são eventos As causas das extinções em massa são
sempre iguais e não impediram, no longo debatidas há décadas por especialistas de
prazo, a evolução biológica. Nos últimos diferentes disciplinas, e o tema ganhou re
500 milhões de anos, a diversidade de levância diante da constatação das atuais
Figura 4. A cratera Chicxulub, associada ao impacto ocorrido há 65 milhões de anos, na transição entre o Cretáceo e o Terciário,
está soterrada na península de Yucatán, no México (a imagem no detalhe, em cores artificiais,
foi obtida com base em dados de variações gravimétricas e magnéticas)
Os efeitos da erosão e da evolução da crosta vada, estimou-se que o asteroide responsável teria
terrestre tornam difícil detectar, na Terra, restos de cerca de 10 km de diâmetro e 1 trilhão de toneladas.
crateras de impacto. Mesmo assim, muitas estrutu- Simulações em computador indicaram que a crate-
ras geológicas são atribuídas à queda de corpos ra gerada teria entre 150 e 200 km de diâmetro. Mas
celestes, como as existentes nas regiões de Vredefort, onde estaria essa cratera?
na África do Sul (diâmetro em torno de 300 km), e Nos anos 70, dois geólogos a serviço de uma
de Sudbury, no Canadá (250 km) – os impactos teriam empresa petrolífera, o mexicano Antonio Camargo
ocorrido, respectivamente, há cerca de 2 bilhões e e o norte-americano Glen Penfield, haviam encon-
de 1,8 bilhão de anos. No Brasil existe uma impor- trado, na península de Yucatán (México), resquícios
tante cratera, em Araguainha (MT), com 40 km de de uma cratera com cerca de 65 milhões de anos
diâmetro, formada há 244 milhões de anos. (figura 4). A teoria de Alvarez fez com que essa
A evidência de um impacto ocorrido há 65 mi- cratera – denominada Chicxulub – fosse mais estu-
lhões de anos, coincidente com a extinção entre o dada. Descobriu-se que tem cerca de 180 km de
Cretáceo e o Terciário, foi apresentada pela primei- diâmetro, forma ovalada (o que indica um ângulo
ra vez pelo filho de Luis Alvarez, o geofísico Walter de impacto entre 20 e 30 graus), e que rochas asso-
Alvarez, e colaboradores, em 1980. Eles constataram, ciadas a ela contêm, além de altos níveis de irídio,
em camadas geológicas com essa idade, uma con- microestruturas que representam ‘assinaturas’ in-
centração do elemento irídio maior que a normal na confundíveis do impacto de um asteroide.
Terra (onde é extremamente raro). Os registros in- Outras evidências associam impactos cósmicos
dicavam que esse metal foi depositado em um in- a extinções massivas. Há alguns anos, o geólogo
tervalo curto de tempo. Como a concentração anor- australiano John Gorter propôs a existência de uma
mal nessa camada é similar à que ocorre em me- cratera soterrada no noroeste da Austrália, com diâ-
teoritos, Alvarez e equipe sugeriram que as ‘nuvens metro aproximado de 200 km, denominada Bedout.
de poeira’ geradas pela queda de um grande asteroi- Segundo estudos posteriores, de uma equipe lide-
de teriam depositado o irídio em escala global, como rada pela geóloga norte-americana Luanne Becker,
acontece com as cinzas de grandes erupções vulcâ- Bedout teria cerca de 250 milhões de anos, coinci-
nicas. Para depositar a quantidade de irídio obser- dindo com a extinção Permiano-Triássico, e seria
uma cratera de impacto. No entanto, a maioria dos ejeção de partículas pelo Pinatubo causou um res-
especialistas acredita que teve origem vulcânica. friamento em escala mundial, com redução média
Outra possibilidade foi sugerida pelos geólogos Ri- de 0,5°C na temperatura (figura 5).
chard A. Schmidt (em 1962) e John G. Weihaupt No período Triássico (250 a 203 milhões de anos
(em 1976). Eles propuseram, com base em anomalias atrás), a Terra tinha apenas um supercontinente
observadas nas rochas da região de Wilkes Land, na (Pangea) e um superoceano (Panthalassa). Logo de-
Antártida, a existência ali, sob a camada permanen- pois, no Jurássico, a movimentação da crosta terres-
te de gelo, de uma cratera de impacto com 480 km tre quebrou Pangea em dois: Laurasia, ao norte, e
de diâmetro (o maior já registrado), tese reforçada Gondwana, ao sul, que sofreriam separações adicio-
por estudos feitos com sensores de satélites. Sua nais no período seguinte, Cretáceo, iniciado há 146
idade, embora incerta, também é estimada em cerca milhões de anos. Esses períodos são marcados por
de 250 milhões de anos. vários episódios de intensa atividade vulcânica,
capazes de gerar alterações climáticas fortes o bas-
tante para causar extinções em massa (figura 6).
Figura 5.
A erupção
do vulcão
Pinatubo,
nas Filipinas,
em 1991, lançou
grande volume
de partículas
na atmosfera
e causou uma
redução da
temperatura
média global
foto Dave Harlow/U.S. Geological Survey Photograph
Figura 6. da ‘grande mortandade’, um derramamento (da Os processos de extinção, que afetam tanto seres
Grandes ordem de 2,5 milhões de km3 de lava) aconteceu marinhos quanto terrestres, começam com a des-
derramamentos
na Sibéria. Há 203 milhões de anos, durante a truição de formas de vida tropical e subtropical e
de lava ocorridos
nos últimos formação do oceano Atlântico, houve outro derra- depois atingem formas menos especializadas. Na
300 milhões mamento relevante na área central desse oceano, e Terra, as plantas resistem melhor que os animais.
de anos suspeita-se que esteja associado à extinção ocorrida Compreender por que certas espécies sobreviveram,
e localização naquela época. e outras não, talvez seja uma das chaves para en-
atual dos
tender ‘o’ ou ‘os’ mecanismos de destruição.
‘pontos quentes’
responsáveis Na ‘grande mortandade’, por exemplo, os animais
pela liberação
da lava
Como as catástrofes matam? com esqueletos maiores e carbonatados foram mais
destruídos que aqueles com pouco ou nenhum
A ideia original de Alvarez consistia no surgimento carbonato no esqueleto. Já na extinção Cretáceo-
de um clima invernal após o impacto, análogo ao Terciário, foram mais atingidos os consumidores
‘inverno nuclear’ que resultaria de um conflito nu- diretos de produtos da fotossíntese. Um enigma de
clear global. O impacto de um asteroide com 10 km difícil solução, nesse último caso, é a sobrevivência
de diâmetro pode pulverizar um volume de rochas das aves. Como elas têm alta taxa metabólica e
suficiente para formar, na atmosfera, uma cobertura baixa reserva de energia, e usam a visão na busca
de poeira que, além de reduzir a temperatura média de alimentos, o ‘inverno’ resultante de um impacto
da Terra, filtraria a luz solar por meses. Tais condi- ou de vulcanismo deveria levar a um alto índice de
ções afetariam fortemente os organismos que reali- mortalidade, mas isso não foi constatado. Fósseis
zam fotossíntese. Outro cenário é o seguinte: como de seres marinhos e terrestres (inclusive pólen)
as rochas na região de Chicxulub são ricas em en- indicam um tempo curto (alguns milhares de anos)
xofre, o impacto poderia liberar um grande volume para a extinção de 65 milhões de anos atrás. No
de aerossóis ricos em sulfatos, que gerariam chuvas entanto, segundo novos dados paleontológicos e
ácidas, devastadoras para as plantas. Os sulfatos ain paleoclimáticos, essa extinção foi mais progressiva
da sufocariam os animais vertebrados que respiram o do que abrupta.
ar diretamente e dissolveriam as conchas protetoras Ela teria começado meio milhão de anos antes,
de animais marinhos nas áreas litorâneas. quando houve um resfriamento global, seguido por
um curto pulso de aquecimento (de 400 a 200 mil Chicxulub. Nesse caso, não se pode excluir uma
anos antes da transição), que pode ter sido desen- origem vulcânica: o derramamento que originou as Sugestões
para leitura
cadeado pelo derramamento de Deccan. Um novo escadas de Deccan.
resfriamento (de 2°C a 3°C), com cerca de 100 mil As extinções massivas estão entre os eventos mais HALLAM, A.
Phanerozoic
anos, ocorreu logo depois, e nessa fase a extinção enigmáticos da história de nosso planeta e os resul-
sea-level changes.
acelerou-se. Além disso, medidas da proporção tados científicos citados aqui confirmam a comple- Nova York,
13
C/12C indicam que a produtividade oceânica sofreu xidade dos processos que as deflagram. Não há Columbia
University Press,
relevantes flutuações nos 3 milhões de anos ante- apenas uma causa, mas a superposição de diferentes 1992.
riores a essa extinção. Após a transição, a produti- processos, com variados níveis de significância. COWEN, R. The
history of life.
vidade oceânica caiu a níveis baixíssimos. O ecos- Existe hoje certo consenso de que grandes extinções Boston,
sistema marinho só se restabeleceu entre 2 e 3 mi- ocorrem quando as condições ambientais sofrem al Blackwell Science,
lhões de anos depois. terações rápidas e as espécies, nos diferentes ecos- 1999.
PROTHERO, D. R. &
O cenário da ‘grande mortandade’ também está sistemas, não têm tempo para se adaptar. DOTT Jr., R.H.
ficando mais explícito. Segundo estudos do geólogo Recentemente, o geólogo Shanan Peters, da Uni- Evolution of Earth.
Nova York,
Robert Berner, da Universidade Yale, o teor de oxigê- versidade de Wisconsin-Madison, mostrou de modo McGraw Hill,
nio na atmosfera (hoje de 21%) chegava a 30% no convincente o que já se suspeitava há décadas: a 2002.
período Carbonífero, mas no final do Permiano e em variação do nível dos oceanos, resultante da deriva SKELTON, P. (Ed.).
The Cretaceous
parte do Triássico caiu para 12,6%. As prováveis das placas tectônicas e de alterações do clima, está world.
causas são o clima árido da época e o derramamento fortemente relacionada a grandes extinções. O estu- Nova York,
Cambridge Press,
de lava na Sibéria, que aumentaram o teor de gás do revela que grupos distintos de animais marinhos 2003.
carbônico e reduziram o de oxigênio na atmosfera, preferem hábitats diferentes. Grupos mais antigos, WARD, P. D. Under
a green sky.
situação fatal para os animais com alto metabolismo. como corais e braquiópodes, habitam um fundo
Nova York,
O aumento de cerca de 6°C na temperatura diminuiu marinho rico em rochas calcárias, enquanto os mais HarperCollins,
a solubilidade do oxigênio nas águas oceânicas, o que recentes, como peixes e crustáceos, vivem em um 2007
extinguiu animais situados na base da cadeia alimen- fundo arenoso. O fundo é alterado pelas mudanças
tar (como se observa hoje no mar Mediterrâneo e no do nível oceânico, que destroem o hábitat de um ou
mar do Norte). Um baixo teor de oxigênio nos mares de outro grupo, e Peters encontrou forte relação
favorece a proliferação de bactérias produtoras de entre essas alterações e a taxa de extinção. Hoje, há
sulfeto de hidrogênio (H2S), tóxico para a vida mari- fortes indícios de que as extinções do final do Or-
nha (o que se vê hoje no mar Negro). No ano passa- doviciano e do final do Devoniano estão relaciona-
do foram encontrados indícios da presença de bac- das a quedas do nível dos mares, causadas por
térias que produzem H2S em sedimentos do final do glaciações.
Permiano, dando novo suporte ao cenário proposto. O estudo de Peters abre novas perspectivas para
a previsão do que acontecerá com as formas de
vida atuais se o nível dos oceanos subir devido ao