Você está na página 1de 20

página

O Campesinato Brasileiro:
uma história de resistência
Maria de Nazareth Baudel Wanderley1

Resumo: A representação da agricultura brasileira associada a grandes propriedades


monocultoras e agroexportadoras é fruto de uma “amnésia social” que nega a
contribuição do campesinato para a sociedade. Definido como uma forma social
de produção, ao campesinato corresponde a um modo de vida e à uma cultura.
É necessário, pois, compreender as estratégias fundiárias, produtivas e familiares
que favoreceram, no Brasil, a ocupação de espaços precários e provisórios
ou a criação efetiva de comunidades camponesas com maior perenidade. A
modernização da agricultura no século XX provocou a expulsão dos moradores e
dos posseiros. Com a redemocratização, os movimentos sociais rurais reinscrevem
no debate da sociedade a atualidade da questão fundiária e a pertinência das
lutas pela terra. Os recentes debates teóricos e políticos a respeito das categorias
“campesinato” e “agricultura familiar” confirmaram a constituição de um setor
de agricultores não patronais e não latifundiários, que exercitam formas próprias
de viver e trabalhar, confirmada pelos dados do Censo Agropecuário de 2006. Os
estabelecimentos agrícolas economicamente mais precários foram considerados,
inicialmente, como uma “franja periférica”, enquanto os programas territoriais
os incorporaram na condição de “pobres do campo”. A inclusão produtiva que
corresponde a este tipo de agricultor deveria considerar sua histórica resistência
como camponeses.

Palavras-chaves: Campesinato, agricultura familiar, pobreza rural, desenvolvi­


mento rural.

Abstract: The representation of Brazilian agriculture, associated with large monocultures


and agroexport farms is the result of a “social amnesia” that denies the contribution of
the peasantry to society. Defined as a social production form, the peasantry represents a
way of life and a culture. It is necessary to understand agrarian, productive and familiar
strategies that favored, in Brazil, the occupation of precarious and temporary spaces or
the effective creation of rural communities with greater durability. The modernization of
agriculture in the twentieth century led to the expulsion of residents and squatters. With
democratization, rural social movements re-inscribe the debate about the relevance of the

1. Professora aposentada da Unicamp. Professora colaboradora do PPGS/UFPE. Bolsista do CNPq.


E-mail: nazarebw@gmail.com
land issue and the pertinence of land struggles. The recent theoretical and political debates about the categories
“peasantry” and “family farm” confirmed the formation of a sector of non-employers and non-landlords’ farmers,
who exercise their own ways of living and working, confirmed by data from the last Agricultural Census (2006). The
most economically disadvantaged establishments were initially considered as a “peripheral fringe”, while territorial
programs have incorporated them in the condition of “rural poor”. The inclusive production that corresponds to this
type of farmer should consider its historical resistance like peasants.

Key-words: Peasantry, family agriculture, rural poverty, rural development.

Classificação JEL: Q19.

1. Introdução espaço e reconhecimento, seja de resistência


às ameaças de destruição ao longo do tempo e
Não raramente, a representação socialmente em espaços diferenciados, prevalece um traço
comum que as define como lutas pela con­
construída da agricultura brasileira a associa a
dição de protagonistas dos processos sociais
grandes propriedades monocultoras, produzindo
(HISTÓRIA SOCIAL DO CAMPESINATO,
para os mercados internacionais, sobre a base de
2008/2009)3.
um moderno e sofisticado padrão tecnológico2. O
exemplo mais expressivo, nos dias de hoje, que Antes, porém, de expor esta argumentação,
é frequentemente veiculado nos meios de comu­ será necessário explicitar o que se pode enten­
nicação, é o das grandes plantações de soja nas der por campesinato. Numa perspectiva geral,
antigas regiões de fronteira agrícola do País. Na o campesinato corresponde a uma forma social
monótona e monocolorida paisagem da planície, de produção, cujos fundamentos se encontram
máquinas possantes vencem o tempo e o espaço no caráter familiar, tanto dos objetivos da ativi­
e diluem da imagem qualquer presença humana. dade produtiva – voltados para as necessidades
Na verdade, esta representação é fruto de da família – quanto do modo de organização do
uma “amnésia social” (MOTTA e ZARTH, 2008) trabalho, que supõe a cooperação entre os seus
que marcou, desde suas origens, a história do membros. A ele corresponde, portanto, uma
campesinato no Brasil, e que nega o reconheci­ forma de viver e de trabalhar no campo que, mais
mento de sua contribuição para a sociedade. O do que uma simples forma de produzir, corres­
presente texto se filia a uma outra concepção, ponde a um modo de vida e a uma cultura.
segundo a qual Naturalmente, esta caracterização é bastante
genérica e, assim apresentada, pode ser adequada
[...] o campesinato, forma política e acadêmica
à compreensão de uma grande diversidade de
de reconhecimento conceitual de produtores
situações concretas de reprodução dos campone­
familiares, sempre se constituiu, sob modali­
dades e intensidades distintas, um ator social ses. Importa, assim, compreender as especificida­
da história do Brasil. Em todas as expressões
de suas lutas sociais, seja de conquista de 3. A Coleção História Social do Campesinato, composta, até o
presente momento, de nove livros publicados entre 2008 e
2010, dedica-se ao estudo das diversas dimensões do cam­
2. A primeira parte deste artigo foi publicada na China e na pesinato. As passagens aqui citadas são da Apresentação
Inglaterra, como capítulo de um livro sobre as mudanças Geral, assinada pelos membros do Conselho Editorial da
sociais nos países Brics (WANDERLEY, 2011, 2013). Coleção e se encontra em todos os seus volumes.

RESR, Piracicaba-SP, Vol. 52, Supl. 1, p. S025-S044, 2014 – Impressa em Fevereiro de 2015
Maria de Nazareth Baudel Wanderley  S027

des de cada uma destas situações, que lhes dão lação jurídica, por pequenos agricultores, que
conteúdo social particular. nelas produziam para o consumo próprio, mas
No caso do campesinato do Brasil, é preciso também para o mercado.
considerar que a agricultura brasileira, na qual ele O “sistema de posse” não se extingue com a
está historicamente inserido, manteve, mesmo Lei de Terras de 1850, porque as grandes proprie­
longamente após o fim do período colonial, seus dades, localizadas, desde o início da colonização,
traços estruturantes, que consistiam na grande em áreas próximas ao litoral, deixavam, nas regi­
propriedade monocultora e no trabalho escravo. ões mais distantes, grandes espaços, não apro­
Este fato indiscutível não impediu, no priados juridicamente, que também podiam ser
entanto, que se constituíssem, nos interstícios ocupados por camponeses “posseiros”.
internos e externos dos latifúndios, espaços que Outro sistema de acesso precário à terra con­
escapavam, de direito ou de fato, da ocupação sistia na instalação de famílias de trabalhadores,
pelos senhores da terra e que eram, sob formas em uma pequena área (“sítio”), no interior das
distintas, usados produtivamente por pequenos fazendas – de cana de açúcar, de café etc – auto­
agricultores camponeses. Pode-se, assim, afirmar rizada pelos próprios proprietários, onde podiam
que as particularidades acima referidas resul­ cultivar alguns produtos alimentares em volta da
tam das estratégias de resistência camponesa ao casa de moradia. O trabalhador, no entanto, era
modo como se estruturou a atividade agrícola no obrigado a trabalhar na cultura principal, rece­
país, desde seus primórdios, sob o domínio dos bendo ou não um pagamento monetário comple­
grandes empreendimentos e de sua capacidade mentar, sob a forma de salário. Naturalmente, o
de criar espaços para uma outra agricultura, a de uso da terra estava condicionado ao vínculo de
base familiar e comunitária. trabalho com o patrão, não havendo nenhuma
Longe, portanto, de negar a existência do garantia quanto à sua continuidade (ANDRADE,
campesinato, no Brasil, trata-se de compreender, 1964).
em cada caso, as estratégias – fundiárias, produti­ A ambivalência da situação de moradores e
vas e familiares – e a amplitude desta capacidade colonos suscitou um grande debate em todo o
de iniciativa que, dependendo das circunstân­ país: trabalhadores ou camponeses? O que ocul­
cias concretas, pode oscilar entre a possibilidade tava este tipo de relação? Para o proprietário, sem
de negociar, de forma subalterna e assimétrica, a dúvida, esse sistema era apenas uma forma de
ocupação de espaços precários e provisórios e a recrutamento de mão de obra, com reduzidos
criação efetiva de raízes mais profundas de modo custos monetários, uma vez que transferia para
a estabelecer, no longo prazo, comunidades cam­ o próprio trabalhador o ônus de sua subsistência.
ponesas com mais perenidade. Para os “moradores” ou “colonos”, como eram
respectivamente chamados nas zonas canaviei­
ras do Nordeste, especialmente de Pernambuco e
2. As formas precárias nas zonas de produção de café em São Paulo, esta
de acesso à terra: a posse precária era a única via de acesso, mesmo em condições
e o sistema de morada extremamente precárias, à terra e à possibilidade
de organização de uma base produtiva de cará­
A legislação fundiária colonial, de origem ter familiar, que permitia a cultura de produtos de
portuguesa, que perdera legitimidade com a subsistência, cujo excedente podia ser, eventual­
independência nacional, em 1822, só foi substitu­ mente, destinado ao mercado (PALMEIRA, 1977).
ída em 1850, criando, assim, um lapso de tempo É importante registrar que há uma grande
em que apenas vigorava a posse efetiva da terra. diversidade de modalidades de cessão precária
Este “vazio” jurídico favoreceu, naquela ocasião, da terra, que variam de um máximo de subordi­
a ocupação precária destas terras, isto é, sem titu­ nação do trabalhador às demandas de trabalho

RESR, Piracicaba-SP, Vol. 52, Supl. 1, p. S025-S044, 2014 – Impressa em Fevereiro de 2015
S028  O Campesinato Brasileiro: uma história de resistência

das grandes propriedades a um grau de auto­ centrais e complementares. Em primeiro lugar, a


nomia, que permite assegurar mais dedicação subordinação da atividade agrícola às exigências
ao sítio familiar. Os moradores nordestinos utili­ dos setores dominantes da indústria e do capital
zam as categorias de “sujeitos” e “libertos” para financeiro, que se traduziu, fundamentalmente,
indicar estas distinções, como revela Afrânio Raul pela adoção de máquinas, equipamentos e insu­
Garcia Jr (1983, 1990). mos de origem industrial nos processos da pro­
Além destas formas principais de acesso pre­ dução agrícola (SILVA, 1981, 1982; KAGEYAMA,
cário à terra, a pequena propriedade é também 1996; DELGADO, 1985). Em segundo lugar, a
uma realidade significativa no campo brasileiro. ocupação das fronteiras agrícolas por grandes
Ela é particularmente importante na região Sul, empresas, que se beneficiaram de políticas públi­
onde tem sua origem na política de concessão de cas de incentivo a essa expansão.
um pequeno lote de terra aos migrantes estran­ Nos dois casos, as consequências sobre os
geiros, especialmente alemães, italianos e polo­ espaços de reprodução dos pequenos agriculto­
neses, que se instalaram na região, a partir do res camponeses são diretas e imediatas. As gran­
século XIX. Mas ela sempre existiu, sobre a base des propriedades expulsaram massivamente os
de distintas relações sociais em todas as regiões trabalhadores residentes em seu interior, pas­
do país (QUEIROZ, 1963, 1973; CANDIDO, 1964). sando a contratá-los apenas nos momentos de
Em São Paulo, com a crise do café dos anos 1930, necessidade de trabalho. Isso foi possível por­
cafeicultores endividados venderam parte de que a modernização da produção agrícola afe­
suas propriedades em pequenos lotes, que, em tou de forma diferenciada os diversos momentos
muitos casos, foram adquiridos por produtores do processo produtivo (SILVA, 1981). Enquanto
não proprietários. Mais recentemente, também as fases de preparo da terra e de cuidados com
merecem especial referência os chamados “pro­ a plantação foram mecanizadas e impulsionadas
dutores integrados”, isto é, aqueles que se tornam pelo uso de insumos modernos, a colheita per­
fornecedores de produtos agropecuários para as manecia, na maioria das culturas, como uma ati­
agroindústrias, situação predominante no Sul do vidade manual. Não havia, portanto, mais razão
País (FERREIRA, 1995; PAULILO, 1990). para o proprietário reter, em suas terras, a mão de
Em todos esses casos, a propriedade formal­ obra durante todo o ano.
mente reconhecida favorece a consolidação de Esse processo de expulsão será tanto mais
uma economia camponesa mais “liberta”, isto é, intenso, quanto os patrões temiam as consequên­
menos dependente dos grandes proprietários, cias da promulgação do Estatuto do Trabalhador
no que se refere ao acesso à terra. A tensão entre Rural (Lei n. 4.214, de 02 de março de 1963) – pri­
subordinação e autonomia se desloca, no entanto, meiro texto legal que reconheceu os trabalhadores
para o âmbito da comercialização dos produtos, como sujeitos de direitos trabalhistas, passíveis de
onde os camponeses sofrem as consequências de serem reclamados em justiça – pelo movimento sin­
relações também subordinadas e assimétricas. dical que nascia e se fortalecia na mesma ocasião.
Sem o recurso da produção de subsistência, o
trabalhador, expulso do campo, perde os pressu­
3. A modernização da agricultura: postos mínimos da condição camponesa e passa
descampesinização e campesinização a viver nas periferias degradadas das cidades, de
onde procura ocupação, agora, sem nenhum vín­
A partir dos anos 1960, assiste-se no Brasil culo, nas colheitas que se sucedem ao longo do
à emergência de profundas transformações no ano, num amplo espaço que pode ser, inclusive,
setor agrícola e no meio rural. No bojo destas inter-regional.
mudanças, está o processo de modernização da Os camponeses não sofreram passivamente
agricultura que, aqui, assume duas dimensões os efeitos deste processo de expulsão. Além do

RESR, Piracicaba-SP, Vol. 52, Supl. 1, p. S025-S044, 2014 – Impressa em Fevereiro de 2015
Maria de Nazareth Baudel Wanderley  S029

movimento sindical, já referido, é exatamente da Federação onde a luta pela terra não esti­
neste período, que surgem em Pernambuco as vesse presente, de forma mais ou menos aguda”
primeiras organizações das Ligas Camponesas (MEDEIROS, 1989, p. 110).
que, espalhando-se em seguida em várias regiões O momento da redemocratização, que se ins­
do país, expressam suas demandas em termos de titucionaliza com o fim dos governos militares e a
uma reforma agrária, que significasse a real e efe­ promulgação da Constituição de 1988, significou
tiva distribuição de terras (JULIÃO, 1962). Uma a (re)emergência dos movimentos sociais, que
demanda claramente camponesa. puderam, assim, construir publicamente suas
Por sua vez, a integração econômica das fron­ análises da realidade brasileira, em oposição às
teiras agrícolas ao modelo econômico dominante visões até então dominantes e impositivas e for­
resultou na deflagração de conflitos pela terra e mular suas demandas políticas e suas estratégias
na também massiva desarticulação das tradicio­ de luta. Da mesma forma, o Estado também inicia
nais relações de posse, predominantes nestas um processo de democratização em suas diver­
regiões. Fragilizados pela ausência de titulação sas instâncias, que o torna mais apto a acolher as
jurídica de suas posses, os camponeses sofrem demandas da sociedade, amparadas nos novos
as consequências da concentração fundiária, que preceitos constitucionais.
é a face mais aparente do capital que se impõe No que se refere ao meio rural, é fundado, em
por meio de grandes empresas agropecuárias 1984, o Movimento dos Trabalhadores Rurais sem
(ESTERCI, 1987). É por esta razão que a moder­ Terra (MST). Por sua vez, o Movimento Sindical
nização agrícola brasileira é denominada “con­ Rural, que existia desde o início dos anos 1960, se
servadora” (SILVA, 1982). Ela provoca – de uma fortalece, então, sob a liderança da Confederação
certa forma, paradoxalmente – um movimento Nacional dos Trabalhadores na Agricultura
de luta pela terra, que se estende por todas as (Contag). São estes movimentos, cada um a seu
regiões do país, porém, e mais intensamente, no modo, que reinscrevem no debate da sociedade,
Norte e no Centro-Oeste (MARTINS, 1981). Em a atualidade da questão fundiária e a pertinência
1980, um documento da Conferência Nacional das lutas pela terra pelos camponeses expropria­
dos Bispos do Brasil (CNBB), intitulado “A Igreja e dos ou com pouca terra.
os problemas da terra”, denuncia com veemência Os marcos dessas lutas nesses períodos são o
a “extrema violência da luta pela terra em nosso Estatuto da Terra (Lei n. 4.504, de 30 de novem­
país, com características de uma guerra de exter­ bro de 1964) – promulgado na vigência do pri­
mínio, em que as baixas mais pesadas estão do meiro governo militar – e, posteriormente, o I
lado dos lavradores pobres” (CNBB, 1980). Plano Nacional da Reforma Agrária, lançado em
Escrevendo no início dos anos 1980, José de 1985. Progressivamente, multiplica-se o número
Souza Martins afirma que “hoje, no Brasil, a ques­ de assentamentos rurais. O maior número foi
tão política no campo é, principalmente, a ques­ implantado na década de 1990, durante o Governo
tão da propriedade da terra” (MARTINS, 1982, de Fernando Henrique Cardoso, sob o efeito
p. 11). No mesmo sentido, Leonilde Sérvolo de das pressões dos movimentos de luta pela terra
Medeiros identifica, como traço comum a todos (MEDEIROS, 1989, 1994, 1999; BERGAMASCO e
os movimentos sociais rurais, neste período, “a NORDER, 1996; SCHMIDT, MARINHO e ROSA,
resistência dos trabalhadores rurais, fossem pos­ 1998; MARTINS, 2003; LEITE, 2004).
seiros, arrendatários, foreiros ou moradores, em Não resta dúvida que a ideologia conserva­
deixar a terra em que trabalhavam e da qual dora dos governos militares, bem como suas prá­
estavam sendo expulsos” (MEDEIROS, 1989, ticas autoritárias e repressivas, favoreceram a
p. 34). Por esta razão, a luta pela terra se disse­ consolidação do modelo da modernização con­
mina ao ponto de que, como afirma esta autora, servadora no Brasil. Com a redemocratização,
“não houve, na década de 70, um único estado foi possível introduzir no debate da sociedade

RESR, Piracicaba-SP, Vol. 52, Supl. 1, p. S025-S044, 2014 – Impressa em Fevereiro de 2015
S030  O Campesinato Brasileiro: uma história de resistência

novas ideias e propostas de novos modelos de foi duramente perseguido, como “subversivo”
agricultura. O ponto de partida dessa discussão, pelos governos militares, que dirigiram o Brasil
eminentemente política, é o reconhecimento de de 1964 a 1985. A busca de uma expressão poli­
que as unidades familiares de produção não são ticamente mais “neutra” levou, nesse período, a
incompatíveis com o desenvolvimento agrícola, que fossem adotadas, oficialmente, denomina­
isto é, de que são capazes de transformar seus ções como “pequenos produtores”, “agricultores
processos de produção, no sentido de alcançar de subsistência”, “produtores de baixa renda”
novos patamares tecnológicos, que se traduzam que, além de imprecisas, carregavam um forte
pela maior oferta de produtos, maior rentabili­ conteúdo depreciativo.
dade dos recursos produtivos aplicados e a plena Nos anos 1990, a categoria “agricultura
valorização do trabalho. Esta afirmação atinge familiar” foi adotada pelo próprio Estado, ao
diretamente o argumento central que justificava formular um vasto programa de apoio aos agri­
o apoio irrestrito e exclusivo, dado no Brasil à cultores (Pronaf), cuja atividade estivesse organi­
grande propriedade, considerada como a única zada pela e para a família (ABRAMOVAY, 1998;
em condições de modernizar o setor agrícola e ao ABRAMOVAY e VEIGA, 1999; MATTEI, 2005).
modelo de modernização “produtivista” que foi Com isso, diluía-se o conteúdo histórico-político
apoiado pelo Estado. que a palavra “camponês” inspirava, ao mesmo
tempo em que se afirmava, pela primeira vez, o
reconhecimento da condição de produtor agrí­
4. Conceituação do campesinato: cola e uma valoração positiva de suas particu­
uma disputa política por laridades. Atualmente, ela é consagrada, não só
reconhecimento pelas instituições do Estado, mas também pelos
próprios atores sociais, seus beneficiários.
A compreensão do que seja um campesi­ A respeito do Pronaf, Maria José Carneiro
nato no Brasil continua a ser objeto de um amplo considera que
debate e de acirradas disputas políticas, que
envolve, entre outros, pesquisadores acadêmicos, [...] a proposta de um programa de fortaleci­
formuladores de política e os distintos movimen­ mento da agricultura familiar voltado para
tos sociais. Está em questão o lugar social destes as demandas dos trabalhadores – sustentado
em um modelo de gestão social em parceria
agricultores, que se expressa por meio do signifi­
com os agricultores familiares e suas organi­
cado que se atribui às categorias “campesinato”,
zações – representa um considerável avanço
“agricultura familiar” e “agronegócio”.
em relação às políticas anteriores. Tal tenta­
No Brasil, a referência ao campesinato assume
tiva de ruptura é intencional e explícita no
dupla conotação. Por um lado, o campesinato próprio texto do Pronaf, quando ele chama a
corresponderia, para muitos, às formas mais tra­ si o desafio de construir um novo paradigma de
dicionais da agricultura, realizadas em pequena desenvolvimento rural para o Brasil sem os vícios
escala, dispondo de parcos recursos produtivos, do passado (CARNEIRO, 1997, p. 70).
pouco integrado ao mercado e à vida urbana e
frequentemente identificado à incivilidade e ao Os agricultores familiares são ainda perce­
atraso econômico e social. Neste sentido, ele se bidos, por alguns, como integrantes das princi­
distinguiria da agricultura familiar, a qual, apesar pais culturas agropecuárias do País, inclusive das
de ter também condições de produção restritas, grandes cadeias produtivas globalizadas. Neste
estaria mais integrada às cidades e aos mercados. caso, eles são incluídos na categoria genérica do
Por outro lado, a palavra “camponês” carrega “agronegócio”, juntamente com os grandes pro­
um forte conteúdo político, pois ela é frequente­ prietários e empresários do setor agrícola do País.
mente associada ao movimento camponês, que Esta corrente, ideologicamente mais ligada a este

RESR, Piracicaba-SP, Vol. 52, Supl. 1, p. S025-S044, 2014 – Impressa em Fevereiro de 2015
Maria de Nazareth Baudel Wanderley  S031

mesmo setor, considera o agronegócio em sua ções particulares, atribuindo a cada um caracte­
dimensão estritamente econômica, capaz de gerar rísticas excludentes e, mesmo antagônicas em
interesses comuns a todos aqueles que, de uma relação aos demais, deve-se atentar para a cons­
forma ou de outra, são agricultores. Negam-se, tituição de um vasto campo de agricultores não
assim, as dimensões identitárias que nutrem as patronais e não latifundiários que, como foi dito
categorias “camponês” e “agricultor familiar”, acima, exercitam formas próprias de viver e tra­
retirando delas toda referência à constituição de balhar no mundo rural. Esse conjunto se carac­
sujeitos políticos e, frequentemente, desconhe­ teriza por uma grande diversidade de situações
cendo o caráter subalterno de sua participação concretas, que geram múltiplas identidades,
setorial, que exclui qualquer possibilidade de ade­ com distintas relações com a cidade, com o mer­
são econômica e política à grande propriedade e à cado e com o Estado (HISTÓRIA SOCIAL DO
grande produção. CAMPESINATO, 2008/2010).
Nos dias atuais, percebe-se a revalorização Assim sendo, mais importante é perceber
das categorias “camponês” e “campesinato”. Isso que, apesar da heterogeneidade referida, todas
ocorre, sobretudo, no interior dos próprios movi­ estas situações concretas apontam para a existên­
mentos sociais, que as associam à profunda crítica cia, no meio rural brasileiro, de produtores agrí­
aos processos da modernização conservadora e à colas, vinculados a famílias e grupos sociais que
crescente valorização das práticas agroecológicas. se relacionam em função da referência ao patri­
mônio familiar e constroem um modo de vida e
As novas proposições e ações coletivas por uma forma de trabalhar, cujos eixos são consti­
uma agricultura diferente se apóiam forte­
tuídos pelos laços familiares e de vizinhança. É
mente nas críticas das noções de modernidade
a presença desta característica que nos autoriza
e de modernização, esboçando os contornos
a considerá-los camponeses, para além das par­
de uma outra modernização, que repousa
ticularidades de cada situação e da conexão (ou
nas noções e significações de “coletivo” e de
“comunidade/local” (ALMEIDA, 1999, p. 33). superposição) das múltiplas referências identitá­
rias, assumindo que os conceitos de campesinato
De fato, grupos cada vez mais numerosos e agricultura familiar podem ser compreendidos
de camponeses se organizam, em todas as regi­ como equivalentes.
ões, com o objetivo de afirmar a autonomia dos
agricultores familiares, considerando-os portado­
res de uma experiência camponesa, que os torna 5. Perfil atual da agricultura familiar
capazes de assumir, sob outros moldes, o pro­ no Brasil
gresso da agricultura e do meio rural brasileiros.
Para além das divergências conceituais, outra
Todas as críticas portam em si uma ideia cen­ grande dificuldade consiste em quantificar este
tral e dominante que é a de preservar uma universo de agricultores familiares camponeses.
certa categoria social e produtiva na agricul­
Até recentemente, as estatísticas oficiais não dis­
tura: o camponês, o pequeno agricultor/pro­
punham de critérios que permitissem distinguir
dutor ou, ainda, o agricultor familiar e, por
as unidades familiares do conjunto dos estabele­
conseguinte, a necessidade de reorientar os
sistemas produtivos e as tecnologias emprega­
cimentos agrícolas. Para superar a imprecisão das
das na direção de um reforço na capacidade categorias adotadas, os pesquisadores formula­
econômica e de autonomia dessa categoria vam exercícios de aproximação, mais ou menos
(ALMEIDA, 1999, p. 58). bem sucedidos, que variam ao sabor das con­
cepções teóricas de cada um e das restrições das
Parece-nos, portanto, evidente que, mais do informações disponíveis. Assim, ainda nos anos
que recortar campos distintos, com denomina­ 1970, a pesquisa realizada sob a coordenação de

RESR, Piracicaba-SP, Vol. 52, Supl. 1, p. S025-S044, 2014 – Impressa em Fevereiro de 2015
S032  O Campesinato Brasileiro: uma história de resistência

José Graziano da Silva adotou o pressuposto de alocados ao setor patronal, esta forma de agri­
que a produção camponesa estaria concentrada cultura revela uma grande capacidade produ­
nas faixas de área até 50 hectares, informação tiva. Do conjunto dos agricultores familiares, que
mais objetiva, disponível no Censo Agropecuário ocupa 30,5% da área total, 75% são proprietários
de 1970. A partir deste recorte, os referidos auto­ de áreas que, para a grande maioria, não ultra­
res puderam perceber a passam os cinco hectares. É nessas exíguas e insu­
ficientes áreas que a agricultura familiar chega a
[...] importância das formas da pequena pro­ absorver 76,9% do pessoal ocupado na atividade
dução no conjunto da produção agropecuária.
agrícola em todo o País e produz o equivalente a
Essa importância se revela em três planos: no
37,9% do valor bruto da produção agropecuária
número de pessoas envolvidas, tanto pelo seu
nacional, beneficiando-se, apenas, de 25,3% dos
valor absoluto, como em comparação com o
financiamentos destinados à agricultura.
que deveria representar a forma dominante
de trabalho sob o desenvolvimento do capital, Só recentemente, o IBGE, em cooperação com
ou seja, o assalariamento; em termos geográ­ o Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA),
ficos, isto é, da ocorrência generalizada dessas elaborou para o último Censo Agropecuário de
formas em praticamente todas as regiões estu­ 2006 uma grade de variáveis, que permitiu, pela
dadas; e, finalmente, na sua contribuição no primeira vez, introduzir a categoria de estabeleci­
produto gerado (SILVA, 1978, p. 240). mentos familiares em seus levantamentos (IBGE,
2006; FRANÇA et al., 2009). Essa categoria é tam­
Posteriormente, Sonia Bergamasco e Angela bém definida levando em consideração pressu­
Kageyama, analisando os dados do Censo postos teóricos e condicionamentos operacionais:
Agropecuário de 1980, construíram uma tipologia ela se baseou nas concepções adotadas pela Lei da
dos agricultores familiares, entendidos enquanto Agricultura Familiar (Lei n. 11.326/2006, Art. 3º),
aqueles que utilizam mão de obra familiar, em que considera as exigências de que o produtor:
sua atividade produtiva. Segundo estas autoras,
os estabelecimentos familiares correspondiam a I - não detenha, a qualquer título, área maior
71,6% do total dos estabelecimentos e se diferen­ do que 4 (quatro) módulos fiscais;
ciavam internamente em empresas familiares que II - utilize predominantemente mão de obra
contratam trabalhadores permanentes, estabele­ da própria família nas atividades econômicas
cimentos familiares complementados por empre­ do seu estabelecimento ou empreendimento;
III - tenha renda familiar predominantemente
gados temporários e os familiares puros, sem
originada de atividades econômicas vincula­
trabalhador externo à família (BERGAMASCO e
das ao próprio estabelecimento ou empreen­
KAGEYAMA, 1990).
dimento;
Baseando-se nos Censo Agropecuário de IV - dirija seu estabelecimento ou empreendi­
1996, um estudo, realizado pela FAO, em coo­ mento com sua família.
peração com o Ministério do Desenvolvimento
Agrário, coordenado por Carlos Guanzirolli, Segundo esses dados, havia naquela data,
formulou uma nova metodologia para apre­ em todo o País, um total de 4.367.902 estabeleci­
ender o perfil da agricultura familiar no Brasil mentos familiares, definidos, segundo os critérios
(GUANZIROLLI et al., 2001). De acordo com esta legalmente fixados, nos termos acima indicados,
abordagem, de um total de 4.859.732 estabeleci­ o que correspondia a 84,4% do total dos estabe­
mentos agrícolas, 4.139.369 são estabelecimentos lecimentos agropecuários. Essas unidades de
familiares, o que corresponde a 85,2%. produção familiares possuíam 80,25 milhões de
Esta pesquisa confirmou a contribuição mar­ hectares, equivalentes a 24,3% da área total.
cante da agricultura familiar. Apesar de não dis­ Tal como já indicavam as conclusões dos
por dos recursos produtivos comparáveis aos estudos anteriores, os novos dados reiteram que

RESR, Piracicaba-SP, Vol. 52, Supl. 1, p. S025-S044, 2014 – Impressa em Fevereiro de 2015
Maria de Nazareth Baudel Wanderley  S033

a agricultura familiar permanece significativa­ a linha de pobreza definida pelo Banco Mundial,
mente responsável pela produção de alimentos os autores do Programa definiram o público
no Brasil. Com efeito, provém deste setor, entre beneficiário do mesmo como “aquela parcela
outros bens: 87% da produção de mandioca; da população que não possui renda suficiente
70% do feijão, 58% do leite, 46% do milho, 38% para garantir sua segurança alimentar, estando,
do café, 34% do arroz, bem como, 59% do reba­ portanto, vulnerável à fome” (SILVA, BELIK e
nho de suínos, 50% dos efetivos avícolas e 30% TAKAGI, 2001, p. 70). As conclusões deste estudo
do gado bovino. apontam para
Para realizar essa intensa e diversificada ati­
vidade, os estabelecimentos familiares ocupam [...] um público potencial beneficiário de
44,043 milhões de pessoas, pertencentes a
um grande contingente de trabalhadores: 12,3
9,324 milhões de famílias. Esta população
milhões de pessoas, correspondentes a 74,4%
pobre representa 21,9% das famílias e 27,8%
do total do pessoal ocupado na agricultura bra­
da população total do país, sendo 19,1% da
sileira. Destes, 90% constituíam a força de traba­
população das regiões metropolitanas, 25,5%
lho familiar. O Censo de 2006 confirma, assim, das áreas urbanas não metropolitanas e 46,1%
mais uma vez, o peso dessa forma de produção, da população rural. Em termos absolutos,
ao mesmo tempo em que revela os limites de sua representam, respectivamente: 9.003 milhões,
reprodução, subordinada que está à perpetuação 20,027 milhões e 15,012 milhões, para cada
da concentração fundiária, marca da história da área de residência (p. 74).
agricultura e do mundo rural brasileiros. Cerca
de metade dos estabelecimentos familiares está Estes dados revelam com clareza que, embora
localizada na região Nordeste, onde representam não corresponda ao maior número de pobres do
89% dos estabelecimentos agrícolas da região. país, a pobreza que se manifesta nas áreas rurais
é, relativamente, a mais expressiva, uma vez que
atinge quase a metade da população do campo.
6. A pobreza rural Estudos recentemente elaborados atestam que os
programas de transferência de renda adotados
Estes dados, no entanto, não podem ofuscar nos últimos governos, para as populações mais
a forte e continuada incidência de situações de pobres, têm conseguido alterar esta realidade,
pobreza, inclusive da pobreza extrema no meio provocando significativos aumentos dos níveis
rural brasileiro. de renda e redução da desigualdade social.
São numerosos os estudos que tentam quan­ Também crescem hoje no Brasil as aborda­
tificar a pobreza rural, utilizando, para isso, crité­ gens sobre a pobreza que incorporam outras
rios distintos. Como exemplo, o documento que dimensões econômicas e sociais, para além da
integrou O Mapa da Fome, elaborado em 2003, dimensão exclusivamente monetária. Segundo
tomou como parâmetro o valor da cesta básica Ângela Kageyama e Rodolfo Hoffmann,
familiar para definir o número de famílias cuja
A noção de pobreza refere-se a algum tipo
renda não é suficiente para adquiri-la (PELIANO,
de privação, que pode ser somente mate­
1993). Por este critério, cerca de 32% dos brasilei­
rial ou incluir elementos de ordem cultural
ros (aproximadamente 54 milhões de pessoas)
e social, em face dos recursos disponíveis de
foram considerados pobres.
uma pessoa ou família. Essa privação pode
O Programa Fome Zero, implantado durante ser de natureza absoluta, relativa ou subjetiva
o primeiro Governo de Luiz Inácio Lula da Silva, (KAGEYAMA e HOFFMANN, 2006, p. 80)
construiu uma metodologia que procurou defi­
nir o “público vulnerável à fome”. Usando como Os referidos autores formularam uma clas­
base o valor de um dólar por dia per capita, que é sificação de “pobres e não pobres”, objetivando

RESR, Piracicaba-SP, Vol. 52, Supl. 1, p. S025-S044, 2014 – Impressa em Fevereiro de 2015
S034  O Campesinato Brasileiro: uma história de resistência

“considerar a pobreza não apenas pela baixa se dê a essa verdadeira população sobrante,
renda, mas também pela privação de bens essen­ marginal do ponto de vista das necessidades
ciais, cuja disponibilidade depende em parte de internas de acumulação do sistema (SILVA,
gastos públicos” (KAGEYAMA e HOFFMANN, 1995, p. 127).
2006, p. 83). Com base nesses critérios, reite­
ram a constatação de que “o Nordeste e a zona
rural continuam a ser os grandes ‘depósitos’ da
7. “Franja periférica”,
pobreza no Brasil” (KAGEYAMA e HOFFMANN, “pobres do campo”, “camponeses”:
2006, p. 97). olhares distintos,
Recentemente, os textos publicados pelo políticas diferenciadas
Instituto Interamericano de Cooperação para a
Agricultura (IICA) sobre essa questão oferecem A partir do final dos anos 1980, forma-se,
um conjunto de análises sobre o que é conside­ progressivamente, um amplo consenso, no sen­
rado “a nova cara da pobreza rural” (IICA, 2006, tido da necessidade de inclusão social deste vasto
2007, 2012b e 2013). Dentre esses estudos, Claudio setor reconhecido como agricultura familiar.
Salvadori Dedecca et al. referem-se à “necessidade Consenso que deixa, no entanto, uma larga mar­
de se analisar a pobreza numa perspectiva mul­ gem ao debate e às escolhas políticas dissonantes
tidimensional, que alargasse o enfoque centrado quanto a questões centrais: quem são estes agri­
na visão monetária do problema, isto é, da rela­ cultores? Como compreender sua diversidade?
ção estreita entre necessidade básica de renda e Quais políticas devem ser implementadas para
pobreza” (DEDECCA et al., 2012, p. 17) Com o apoiá-los social e economicamente? As categorias
objetivo de subsidiar as políticas sociais, os refe­ “franja periférica”, “pobres do campo” e “cam­
ridos autores estabeleceram seis dimensões con­ poneses” condensam o sentido das divergências
sideradas relevantes: “inserção no mercado de que se cruzam ao longo do tempo.
trabalho, renda familiar corrente, acesso à terra,
acesso à educação, perfil demográfico das famílias 7.1. A franja periférica
e condições de vida” (DEDECCA et al., 2012, p. 29).
O que é importante considerar em todas O estudo FAO/Incra (1994), acima referido,
estas análises é que se trata, fundamentalmente, distinguiu, num total de 7 milhões de estabeleci­
da pobreza gerada como consequência direta mentos, quatro categorias: patronal, abrangendo
do modelo de desenvolvimento rural prevale­ 500 mil estabelecimentos; familiar consolidada,
cente na sociedade brasileira e da forma como foi abarcando 1,5 milhão; em transição, correspon­
implantada no Brasil a moderna agricultura. Para dente a 2,5 milhões e periférica, somando 2,5
José Graziano da Silva, milhões de unidades produtivas4. Em termos
proporcionais, essas categorias correspondiam
Muito se tem falado e escrito sobre o “notá­ respectivamente a 7,1%, 21,5%, 35,7% e 35,7% do
vel” desempenho do ponto de vista produ­ número total dos estabelecimentos agropecuários
tivo da nossa agropecuária nessas décadas
do País.
passadas, especialmente na crise dos anos 80.
Considerando em particular as duas últimas
Mas, pouco se fala sobre o resultado do ponto
categorias, que totalizam 4 milhões de estabeleci­
de vista social desse modelo de crescimento
agroindustrial excludente que aumentou
mentos, o referido estudo afirma:
ainda mais a concentração da renda e a pro­
porção de pobres no campo. E quase nada se
tem escrito sobre o que fazer com os excluídos,
4. O Relatório FAO/Incra constituiu o principal documento
os “barrados do baile”, os descamisados, ou os de análise e proposições que inspirou a concepção do
pobres do campo ou qualquer outro nome que Pronaf.

RESR, Piracicaba-SP, Vol. 52, Supl. 1, p. S025-S044, 2014 – Impressa em Fevereiro de 2015
Maria de Nazareth Baudel Wanderley  S035

Por falta de capacidade de autofinanciamento, Essa concepção, segundo a qual parte sig­
pela exiguidade e fraqueza de suas terras, pela nificativa dos estabelecimentos familiares está
falta de capacitação de seus recursos humanos, à margem da atividade agropecuária, foi ado­
ou por ser vítima do forte viés urbano das políti­ tada por diversos outros pesquisadores, que a
cas públicas, uma importante fatia da agricultura
qualificam como “franja periférica”, “conjunto
familiar tende à degradação, seja pela migração
marginal de estabelecimentos” e “desvalidos”.
para as cidades, seja por meio da pulverização
Nessa perspectiva, as famílias e os indivíduos
minifundiária que gera estabelecimentos de ter­
não podem ser considerados sequer como pro­
ceira categoria (FAO/INCRA, 1994, p. 12).
dutores de baixa renda, visto que não possuem
Como consequência, para as ações do Estado, a nenhuma renda monetária proveniente da pro­
pesquisa FAO/Incra formulou duas grandes orien­ dução agropecuária. Sua sobrevivência é asse­
tações. Em primeiro lugar, considerando que seria gurada por ocupações temporárias e precárias
possível estabelecer uma “zona de transição for­ e os seus estabelecimentos constituem “mais
mada pela faixa mais fragilizada da agricultura fami­ locais de residência e subsistência de uma mão
liar e pela faixa menos desvalida da grande massa de obra desempregada ou subempregada, do
de sítios periféricos”, o “foco das políticas governa­ que, propriamente, empresas do setor agrope­
mentais para a agricultura” deveria ser ocupado cuário” (FAO/INCRA, 1994, p. 12).
por esses agricultores “em transição” (FAO/INCRA, Consequentemente, afirma-se a impotência
1994, p. 13). Em segundo lugar, reiterando a concep­ de medidas de política agrícola para melhorar as
ção de que os “periféricos” não podem ser conside­ condições de vida e de trabalho desse segmento
rados apropriadamente como agricultores, conclui: e se preconiza o apoio a atividades não agrícolas,
capazes de absorvê-los produtivamente.
O grande desafio é a criação de instrumentos A confirmação, em termos quantitativos, da
que gerem novas oportunidades de expan­ diversidade de situações, no interior do grande
são e/ou reconversão produtiva para o maior grupo de estabelecimentos familiares, consti­
número dos estabelecimentos que se encon­ tuiu, sem dúvida, um grande avanço naquele
trem na categoria transitória entre a “perifé­
momento. No entanto, parece também evidente
rica” e a “familiar consolidada”. Muitos desses
que os resultados obtidos, as análises formuladas
instrumentos ajudarão a agricultura familiar
e as propostas de política encaminhadas refletem,
em geral. Mas seria ilusão imaginar que pode­
riam responder também às dificuldades das
antes de tudo, as concepções teóricas e as esco­
cerca de 2,5 milhões de famílias que vivem em lhas metodológicas de seus autores, sobretudo,
estabelecimentos totalmente marginais (FAO/ no que diz respeito às relações da agricultura
INCRA, 1994, p. 15). familiar com o mercado, que não incorporam a
valorização do autoconsumo e da autoprovisão
O estudo propõe ainda que: do estabelecimento familiar e ao trabalho externo
da família, visto como uma perda de substân­
Parte desse último contingente, principal­
cia da condição de agricultor e como se fosse
mente, os jovens, deverá ser beneficiada pela
uma experiência exclusiva de agricultores “peri­
política de reforma agrária, como ocorreu com
féricos”. Além disso, apesar de admitir que os
pouco mais de 300 mil famílias assentadas nos
últimos anos. E a geração de empregos não dados possam refletir circunstâncias conjunturais
agrícolas, de preferência rurais, bem como a pouco favoráveis, estas não são levadas em conta
prestação de serviços temporários, que sur­ na caracterização dos tipos propostos. O semiá­
girão da dinamização da agricultura familiar, rido nordestino, por exemplo, corresponde, exa­
abrirão oportunidades para os demais (FAO/ tamente, a essa situação de perda, como analisa
INCRA, 1994, p. 15). Tânia Bacelar de Araújo:

RESR, Piracicaba-SP, Vol. 52, Supl. 1, p. S025-S044, 2014 – Impressa em Fevereiro de 2015
S036  O Campesinato Brasileiro: uma história de resistência

Porque daqueles 43% da população economi­ Na prática, no entanto, a universalização do


camente ativa do País que vive no Nordeste, crédito seria de difícil concretização para os agri­
a grande parte está no espaço semiárido. E, cultores familiares e as avaliações realizadas reve­
exatamente ali, no final da década de oitenta, lam que, já na primeira fase de sua implantação,
a única fonte de renda monetária da grande
o acesso ao crédito do Pronaf tendeu a se con­
massa de pequenos produtores havia aca­
centrar nos estados do Sul, especialmente entre
bado. A praga do bicudo havia atingido o
os agricultores com vínculos contratuais de for­
algodão e o desaparecimento dessa fibra tinha
necimento com agroindústrias, mais aptos a ofe­
eliminado a única fonte de renda monetária
deles (ARAÚJO, 2012, p. 22). recer as garantias exigidas pelo sistema bancário
(MATTEI, 2005, p. 20).
As conclusões desse debate inspiraram direta Mesmo considerando os critérios seletivos
e imediatamente a concepção da política de que informaram o Pronaf em suas fases iniciais, é
apoio à agricultura familiar, que se traduziu pela importante registrar todos os esforços que foram
implantação do Pronaf em 1995/1996 e que, sem empreendidos para dotar essa política de uma
excluir formalmente nenhuma categoria de agri­ maior abrangência nos planos regional e social.
cultores familiares, priorizou aquela definida Assim, com o objetivo de atender amplamente os
como “em transição”.5 Os numerosos e diversos pequenos agricultores familiares, o Pronaf ado­
analistas desse programa governamental tendem tou uma diferenciação dos públicos beneficiá­
a afirmar sua importância e os impactos positi­ rios, distinguindo os seguintes grupos: Grupo
vos que provocou, ao oferecer, de modo inédito, A: constituído dos agricultores assentados da
recursos produtivos para agricultores até então reforma agrária; Grupo B: agricultores com baixa
sem acesso a transações bancárias. produção e pouco potencial de aumento, no qual
também estão incluídos indígenas e quilombolas.
O maior interesse do Pronaf é que, desde o Os demais grupos, C, D e E correspondem aos
início, ele não foi construído simplesmente
produtores que dispõem de melhores níveis de
como um programa voltado ao atendimento
renda bruta familiar ou com potencial para atin­
específico de uma necessidade setorial e de
gir esses índices (MATTEI, 2006, p. 5).
um segmento particular. Ele se apoia em duas
Essa iniciativa significava claramente o esforço
premissas básicas, de ordem normativa. Em
primeiro lugar, o Pronaf afirma não apenas as do governo no sentido de ampliar o acesso dos
necessidades sociais, mas, e ao mesmo tempo, agricultores considerados “periféricos”, majorita­
a viabilidade econômica de unidades produti­ riamente presentes nas regiões Norte e Nordeste
vas cujo tamanho esteja ao alcance da capaci­ do País. Como afirma Valter Bianchini,
dade de trabalho de uma família. Para um país
de tradição latifundiária e escravista, formado [...] o Pronaf é um programa de inclusão pro­
por radicais formas de dissociação entre traba­ dutiva. Como programa da agricultura fami­
lho e propriedade, e trabalho e conhecimento, liar, ele tem responsabilidade de inclusão
afirmar a consistência econômica da unidade social, mas também de garantir condições
entre esses termos que a História separou não para as famílias que já estão inseridas no mer­
é trivial. A novidade do Pronaf estava em sua cado (BIANCHINI, 2012, p. 80).
intenção explícita de propiciar aumento da
geração de renda dos agricultores por meio de No entanto, apesar da crescente abrangência
seu acesso ao crédito bancário (ABRAMOVAY do programa, globalmente e em sua distribuição
e PIKETTI, 2005, p. 58). regional, a ampliação do atendimento ao Grupo
B continuava bloqueada.
5. Não pretendo aqui realizar uma avaliação do Pronaf,
mas apenas refletir sobre a concepção que orienta esse
programa, a respeito dos agricultores familiares mais Do ponto de vista do montante de recursos
empobrecidos. destinado às diversas categorias, não se obser­

RESR, Piracicaba-SP, Vol. 52, Supl. 1, p. S025-S044, 2014 – Impressa em Fevereiro de 2015
Maria de Nazareth Baudel Wanderley  S037

vam grandes alterações, em termos da con­ rural brasileiro (AQUINO e SCHNEIDER,


centração dos recursos em determinadas cate­ 2010, p. 15)6.
gorias. Assim, na safra de 1999, os agricultores
enquadrados no grupo D respondiam por 48% Mauro Del Grossi, analisando os mesmos
do total e os do grupo C, por 22%, revelando dados do Censo, observa:
que essas duas categorias detinham cerca de
70% do total do crédito disponibilizado pelo Em resumo, o Censo Agropecuário mos­
programa. O grupo A respondia por 21%; o tra uma agricultura familiar diversificada,
grupo B, por apenas 1% (primeiro ano de ope­ onde parte possui condições de produtivi­
ração dessa modalidade); e o restante dizia dade superior à da agricultura não familiar,
respeito aos contratos sem enquadramento enquanto outra parte sobrevive em condições
definido. Na safra agrícola de 2004, essa traje­ de renda agrícola reduzida, provavelmente,
tória mudou um pouco, sobretudo pela maior próxima à condição de pobreza (DEL GROSSI,
participação do grupo B, que passou a respon­ 2012, p. 322).
der por 7% do total, ao mesmo tempo em que
o grupo D reduzia sua participação em 11% e 7.2. Os pobres do campo
o grupo A em 13%. O grupo C aumentou sua
participação para 25% (MATTEI, 2005, p. 24). Em 2003, ocorrerá uma nova inflexão da tra­
jetória das políticas públicas em relação ao aten­
Dessa forma, o Pronaf não conseguia evitar, dimento dos agricultores economicamente mais
mais uma vez, a imagem de um programa vol­ fragilizados, com a implantação dos programas
tado para a camada dos agricultores familiares territoriais no âmbito do MDA. Essa nova orien­
da região Sul, cujas condições permitiam assumir tação representou um salto qualitativo em rela­
compromissos financeiros junto aos bancos. Para ção às políticas anteriores, precisamente, no que
Aquino e Schneider, se refere à consideração da pobreza e da desigual­
dade como o foco central das políticas públicas,
O Pronaf apresenta dificuldades para promo­ bem como à concepção adotada e ao tratamento
ver mudanças no campo, porque o modelo proposto aos agricultores, até então vistos como
de agricultura preconizado pelo programa “periféricos”.
está intimamente ligado com a lógica seto­ Tânia Bacelar de Araújo analisa a origem
rial e produtivista do padrão de desenvolvi­
dessa desigualdade:
mento convencional. Na verdade, o estilo de
agricultura familiar efetivamente privilegiado Esses territórios são frágeis e concentram
pela política de crédito do Pronaf ao longo de pobreza, pois foram abandonados no século
sua trajetória não foi aquele baseado na diver­ XX, quando o Brasil privilegiou investimentos
sificação de atividades e fontes de renda das nos grandes centros urbanos, na ânsia de se
unidades de produção, mas o da “pequena tornar potência industrial no âmbito mundial.
empresa familiar” especializada em ativida­ [...] O hiato entre o Brasil urbano e a grande
des agrícolas integradas às cadeias produtivas maioria dos Territórios rurais é uma herança
do agronegócio exportador (grupos D e E). do processo de desenvolvimento herdado
Ora, na medida em que se adotou este estilo (ARAÚJO, 2010, p. 204).
de agricultura familiar como referência para
a ação governamental, então, naturalmente, Caio Galvão de França também aponta os
o crédito passou a ser disponibilizado em sua caminhos necessários para assegurar a redução
maior parte para fortalecer a produção e a pro­ da pobreza e das desigualdades sociais:
dutividade das monoculturas de grãos, objeti­
vando, com isso, elevar a competitividade dos 6. Um novo salto será dado, em 2005, com a adoção do
Programa Agroamigo pelo Banco do Nordeste do Brasil,
“verdadeiros agricultores familiares” escolhi­
com atuação nos estados do Nordeste e no Norte de Minas
dos como protagonistas do desenvolvimento Gerais (www.bnb.gov.br).

RESR, Piracicaba-SP, Vol. 52, Supl. 1, p. S025-S044, 2014 – Impressa em Fevereiro de 2015
S038  O Campesinato Brasileiro: uma história de resistência

Num cenário de continuidade de crescimento grupos de beneficiários do Pronaf, os programas


econômico com distribuição de renda, redução territoriais levam em consideração a diversidade
da pobreza e redução das desigualdades, e de de situações que os caracterizam: assentados,
avanço das políticas sociais com suas potencia­ comunidades tradicionais, agricultores familiares
lidades para garantir um acesso universal aos
de comunidades rurais, etc. Em terceiro lugar, o
direitos fundamentais será preciso combinar,
crédito rural está associado a outras políticas, que
pelo menos, duas dimensões na dinâmica da
procuram apreender a complexidade da situação
participação social e da articulação dos atores.
dos agricultores pobres.
Por um lado, produzir a força social necessária
para efetivar os direitos, com as especificida­ O MDA incorporou o Pronaf aos seus progra­
des adequadas a cada segmento social e consi­ mas territoriais, propondo uma atenção especial
derando as múltiplas possibilidades de acesso. aos agricultores tipificados como Pronaf B.
Por outro lado, redesenhar novas demandas
e criar as melhores condições para a sua afir­ Criado em 2000, no âmbito do Pronaf para
mação como parte de uma agenda dirigida a combater a pobreza rural, o Microcrédito
aprofundar a democracia econômica e política Rural (também conhecido como Grupo B do
(FRANÇA, 2010, p. 79). Pronaf) é estratégico para os agricultores fami­
liares pobres, pois valoriza o potencial pro­
Nos documentos elaborados pelo MDA dutivo deste público e permite estruturar e
observa-se claramente uma mudança de lingua­ diversificar a unidade produtiva. Pode finan­
ciar atividades agrícolas e não agrícolas gera­
gem: a referência aos “pobres do campo” substi­
doras de renda. São atendidas famílias agri­
tui em larga medida as expressões “periféricos”,
cultoras, pescadoras, extrativistas, ribeirinhas,
“desvalidos” e “marginais”. Sob essa nova abor­
quilombolas e indígenas que desenvolvam ati­
dagem são enfocadas três dimensões comple­ vidades produtivas no meio rural. Elas devem
mentares. Em primeiro lugar, mais do que uma ter renda bruta anual familiar de até R$ 10 mil,
mudança de linguagem, a “franja periférica” sendo que no mínimo 50% da renda devem
passa a ser definida como o próprio público alvo ser provenientes de atividades desenvolvidas
dos programas territoriais, a quem se reconhece, no estabelecimento rural (www.mda.gov.br)
claramente, a condição de agricultor familiar e
se destina o apoio às atividades produtivas agrí­ Apesar da abordagem positiva e dinâmica
colas. Referindo-se ao Programa Territórios da dessa intervenção pública, não se pode desco­
Cidadania, que consideram “uma agenda demo­ nhecer as enormes dificuldades para a implan­
crática para o desenvolvimento rural”, Caio tação efetiva dos seus programas de combate à
Galvão de França e Joaquim Soriano afirmam: pobreza persistente. De fato, os agricultores cor­
respondentes ao Grupo B do Pronaf continuam
[...] dois elementos foram centrais na configu­ a exibir sinais evidentes de sua fragilidade, espe­
ração dessa agenda e das próprias condições cialmente no que se refere ao acesso à terra e às
para sua efetivação. O primeiro foi a trans­ condições de produção. São produtores que pos­
formação do paradigma da superação da
suem uma área exígua e insuficiente para a sua
fome e da pobreza, que tem no Projeto Fome
atividade, quase sempre inferior a 10 hectares – a
Zero sua expressão mais acabada. O segundo
maioria concentrada no estrato de um a menos de
foi a afirmação da identidade social da agri­
dois hectares; em muitos casos, são não proprietá­
cultura familiar e a legitimação de políticas
públicas agrícolas diferenciadas (FRANÇA e rios que produzem em terras alheias por meio de
SORIANO, 2010, p. 224). contratos precários e extorsivos de acesso à terra.
É significativa a proporção daqueles cuja renda
Em segundo lugar, apesar de manter as cate­ monetária é inferior ao salário mínimo. Essa
gorias de renda como elemento distintivo dos renda é completada, sobretudo, com as trans­

RESR, Piracicaba-SP, Vol. 52, Supl. 1, p. S025-S044, 2014 – Impressa em Fevereiro de 2015
Maria de Nazareth Baudel Wanderley  S039

ferências proporcionadas pelas políticas sociais O desafio consiste, no entanto, em definir a


governamentais. Além disto, a distância em rela­ natureza da inclusão produtiva que deve ser pro­
ção aos centros urbanos desfavorece o acesso a posta a este tipo de agricultor. A esse respeito,
serviços essenciais e, nos locais de moradia, são admite-se que os indivíduos, de um modo geral,
críticas as condições de saneamento, do acesso à demandam a ser inseridos na sociedade atra­
água potável, à coleta de lixo e à eletricidade. vés do reconhecimento de sua condição de tra­
Muitos obstáculos se interpõem, assim, inclu­ balhador. O lugar que assumem no mundo do
sive, internamente às próprias estruturas dos trabalho constitui o elemento central que forja
programas territoriais. A concepção dos peque­ a sua própria identidade social. Porém, no caso
nos estabelecimentos como não agrícolas con­ que estamos aqui considerando, não se trata de
tinua a ser defendida em foruns de reflexão e um trabalho qualquer. O que está fortemente
debate sobre o tema, influenciando fortemente a em questão é que tipo de trabalho corresponde
pesquisa acadêmica e as decisões dos formulado­ à inclusão social desse trabalhador em particu­
res de políticas públicas. Na verdade, o que está lar. A maioria dos agricultores antes considerados
em questão nessa nova orientação não é apenas “periféricos” reivindica o reconhecimento de sua
a redefinição de procedimentos formais que per­ identificação com um tipo de trabalho específico,
mitam ampliar a capilaridade e a abrangência dos aquele exercido de forma autônoma, em caráter
beneficiários efetivos do sistema de crédito, mas familiar, através da posse e controle dos meios de
uma nova concepção sobre as possibilidades de produção necessários. Em outras palavras, inclu­
sua inclusão produtiva. são social para os próprios produtores significa o
O Ministério do Desenvolvimento Social, reconhecimento de sua condição de agricultor, de
em documento citado por Lauro Mattei, define a suas formas de trabalhar e produzir, cujas poten­
inclusão produtiva como cialidades devem ser apoiadas pelas políticas
públicas.
[...] o processo econômico e social que conduz Pode-se concluir desse quadro geral que esses
à formação de cidadãos integrados ao mundo agricultores vivenciam situações de extrema pre­
por meio do trabalho. Portanto, o objetivo da cariedade e que têm, efetivamente, uma enorme
inclusão produtiva é proporcionar autono­
dificuldade para gerar renda monetária de sua
mia para as pessoas sobreviverem de maneira
atividade produtiva. No entanto, não é possível
digna e sustentável tendo trabalho (MATTEI,
desconhecer o fato, por todos afirmado, de que,
2012, p. 55).
apesar dos obstáculos, eles não são outra coisa
Para o autor, as políticas de inclusão produ­ senão agricultores: suas estratégias revelam os
tiva supõem a articulação das esferas: esforços empreendidos para assegurar a subsis­
tência através dos reduzidos meios que dispõem.
[...] de acesso aos mercados de bens e serviços Nesse e em outros contextos, os agricultores
e de inclusão social via políticas públicas. No familiares expressam suas demandas enquanto
primeiro caso, destacam-se políticas especí­ produtores e, sobretudo, se definem como agri­
ficas voltadas às atividades produtivas capa­ cultores. Albuquerque Neto e Silva (2012) são
zes de agregar valor aos produtos e ampliar bem claros a esse respeito:
o acesso aos mercados locais e regionais; e
voltadas ao processo de construção de novas Após perguntar aos entrevistados sobre
formas de organização da produção pautadas quanto tempo faz que ele (a) é agricultor (a),
pelo princípio da economia familiar e solidá­ escutamos quase que unanimemente as frases
ria, por exemplo, que procuram estabelecer “sempre foram agricultor”, “desde que eu me
métodos produtivos centrados na gestão e entendo de gente eu sempre fui agricultor”
conservação dos recursos naturais (MATTEI, e “desde que nasci”. Essas falas configuram
2012, p. 57). um modo de vida destes agricultores, que

RESR, Piracicaba-SP, Vol. 52, Supl. 1, p. S025-S044, 2014 – Impressa em Fevereiro de 2015
S040  O Campesinato Brasileiro: uma história de resistência

permitem compreender uma intensa rela­ distribuição de crédito aos mais pobres. O acesso
ção entre trabalho, terra e família segundo ao crédito deve estar inserido numa política mais
a visão de mundo destes produtores rurais ampla e completa, que considere o indivíduo ou
(ALBUQUERQUE NETO e SILVA, 2012, p. 15). a família que o recebe, não apenas como pobre,
mas como um agricultor que, se apoiado conve­
nientemente, tem potencialidades para assegu­
7.3. Camponeses
rar, em melhores condições, a sobrevivência de
Se a referência à categoria “franja periférica” sua família e participar da produção da riqueza
aponta para a perda de substância da condição de sua comunidade local. O apoio em questão
de agricultores, a de “pobres do campo” supõe diz respeito ao acesso ao conjunto dos recur­
que a superação deste estado de pobreza deve sos produtivos e aos bens e serviços necessários
ser buscada através das mais diversas atividades não apenas à reprodução de uma qualidade de
não agrícolas, sem necessariamente o respaldo vida considerada socialmente satisfatória, mas,
da centralidade da unidade de produção familiar. sobretudo, no sentido apontado por Steven M.
Em todos estes casos, as políticas públicas se dis­ Helfand e Vanessa da Fonseca Pereira, da cons­
tanciam das afirmações identitárias, dos próprios trução do “patrimônio dos pobres” (HELFAND e
agricultores, que não podem ser caracterizados PEREIRA, 2012, p. 126).
apenas como não produtores de renda monetária. Colocando-se na perspectiva dos sujeitos
De fato, a adoção da renda monetária prove­ analisados, e não daquela ditada pelas regras do
niente da atividade agropecuária como critério mercado, registra-se com muita frequência que as
distintivo dos estabelecimentos se contrapõe ao categorias familiares consideradas “em transição”
reconhecimento das especificidades dessa agri­ e “periféricas” não hesitam em se definir como
cultura familiar que se reproduz em condições agricultores, em suas práticas presentes e em seus
particularmente hostis na realidade brasileira. projetos de futuro. Para eles, a produção para o
próprio consumo ou para o consumo interno do
As configurações camponesas são bastante
seu estabelecimento é uma prática que os legi­
diversas, entretanto as visões correntes tendem
timam como agricultores familiares. Apesar da
a compreendê-las por meio de noções pré­
forma subordinada e precária, sua inserção nos
-concebidas, como a caracterização dos campo­
neses como praticantes de uma agricultura de
mercados agropecuários é reivindicada como um
subsistência e desprovidos de mecanismos de elemento central de suas estratégias produtivas.
geração de renda. Assim, necessitam de inter­ Se o trabalho fora do sítio familiar se impõe como
venção exterior de modo a modernizar suas uma necessidade para complementar a renda ou
práticas agrícolas para se posicionarem no pata­ para encaminhar profissionalmente os filhos, ele
mar de geradoras de renda e de maior inser­ não é percebido em contradição com as ativida­
ção no mercado. Essa pré-noção, que pode ser des agrícolas, porém, de modo articulado a essas,
identificada na formulação de diversos agentes sob a forma de um sistema de atividades fami­
como intelectuais, agências governamentais, liar, sobre o que muito ainda há a compreender.
igrejas e organizações não governamentais,
Assim, como para afirmar sua identidade de agri­
não dá conta das diferentes formas de organi­
cultores, eles têm uma experiência acumulada
zação social, das instituições econômicas e das
de estratégias e de práticas sociais, inclusive no
práticas culturais do campesinato (GODOI,
MENEZES e MARIN, 2009, p. 23). campo produtivo, que revelam sua capacidade
de sobreviver, enfrentando situações de grande
Assim como a condição de pobreza não se precariedade, a respeito do que, no Brasil, já se
esgota na reduzida disponibilidade de renda dispõe de uma vasta bibliografia.
monetária, expressa na relação dólar por dia, a Não é demasiado insistir que as políticas é
superação da pobreza não se esgota na simples que devem responder às necessidades concretas

RESR, Piracicaba-SP, Vol. 52, Supl. 1, p. S025-S044, 2014 – Impressa em Fevereiro de 2015
Maria de Nazareth Baudel Wanderley  S041

do seu público alvo e não o contrário, esse adap­ 8. Conclusões


tar-se aos condicionantes operacionais das políti­
cas. É o que propõe Ghislaine Duque, a respeito O futuro dos camponeses brasileiros se ins­
das tecnologias que deveriam ser geradas para creve num contexto particularmente complexo,
atender às particularidades do semiárido: marcado pelas escolhas da sociedade brasileira
sobre a maneira como enfrentará alguns de seus
Para que a convivência com o semi-árido seja
principais desafios, enquanto sociedade. Trata-se,
sustentável do ponto de vista econômico, as
entre outros temas, da preservação dos recursos
tecnologias propostas têm que ser de baixo
naturais, dos desafios tecnológicos face às exigên­
custo e de replicação fácil pelas famílias agri­
cultoras da região. Para que seja sustentável
cias bioéticas, ambientais e sociais, da disputa de
do ponto de vista ambiental, essas tecnolo­ espaços produtivos entre a produção de alimen­
gias devem ser respeitosas do meio ambiente. tos e de matérias-primas voltadas para a gera­
Finalmente, para que haja convivência social­ ção de energia, das relações produção-consumo
mente sustentável, essas mesmas tecnologias associadas à garantia da qualidade dos produ­
devem ser frutos de um processo pedagógico tos e das formas de produzir, da eliminação da
e político que aproveite o saber das famílias pobreza extrema e da consolidação da democra­
produtoras e dialogue com elas, permitindo­ cia pelo reconhecimento dos sujeitos de direito
-lhes apropriarem-se do mesmo e difundi-lo que vivem no campo.
de forma autônoma, dispensando aos poucos Cabe aos movimentos sociais demonstrar a
a presença de mediadores. Portanto, fica claro
sensibilidade e a firmeza para assumir a luta pela
que os aspectos organizativos e educativos
preservação de uma outra agricultura, que seja,
estão intimamente interligados com os aspec­
de fato, econômica, ambiental e socialmente sus­
tos tecnológicos (DUQUE, 2008, p. 137).
tentável. E cabe à academia produzir os conhe­
Nesse sentido, a incorporação do conceito de cimentos necessários, capazes de inspirar novas
“camponês”, tal como é analisado na vasta lite­ políticas de inclusão social, que efetivamente con­
ratura brasileira e estrangeira, e proposta na pri­ sidere o campesinato enquanto forma de produ­
meira parte deste artigo, permite superar o que ção e modo de vida.
ainda resta de viés operacional no tratamento aos
“pobres do campo”. 9. Referências bibliográficas
Essa compreensão deverá servir de base para
ABRAMOVAY, R. Bases para formulação da política
fundamentar politicamente as escolhas da socie­
brasileira de desenvolvimento rural: agricultura familiar e
dade a respeito dos agricultores familiares em desenvolvimento territorial. Brasília, NEAD/IICA, 1998.
suas distintas categorias. Em outras palavras,
______. e VEIGA, J. E. da. Novas Instituições para o
trata-se de justificar a opção política de oferecer desenvolvimento rural: o caso do Programa Nacional de
apoio às demandas produtivas desses agriculto­ Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF).
res mais precarizados, que vivem hoje o pior dos Brasília, IPEA, 1999. (Texto para Discussão, 641)
dois mundos: como não são considerados pro­ ALMEIDA, J. A construção social de uma nova agricultura.
dutores, acena-se com a possibilidade de acesso Porto Alegre: UFRGS, 1999.
a empregos não agrícolas, frequentemente não ANDRADE, M. C. de. A terra e o homem no Nordeste.
rurais, os quais, por sua vez, são reduzidos ou 2. ed. São Paulo, Brasiliense, 1964.
mesmo inexistentes na maioria dos pequenos ANJOS, F. S. dos. A agricultura familiar, pluratividade e
municípios e raramente são objetos de políticas desenvolvimento rural no Sul do Brasil. Pelotas, UFPEL,
específicas. 2003.

RESR, Piracicaba-SP, Vol. 52, Supl. 1, p. S025-S044, 2014 – Impressa em Fevereiro de 2015
S042  O Campesinato Brasileiro: uma história de resistência

BERGAMASCO, S. M. P. P. e KAGEYAMA, A. A Familiar no Brasil. Brasília, NEAD/MDA, 2009. (NEAD


estrutura de produção no campo em 1980. Perspectivas, Debate).
São Paulo, n. 12/13, 1989/1990, p. 55-72.
GARCIA JR, A. Terra de trabalho: trabalho familiar de
______. e NORDER, L. A. C. O que são assentamentos pequenos produtores. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1983.
rurais. São Paulo, Brasiliense, 1996. (Primeiros Passos, (Estudos sobre o Nordeste, 8).
301)
______. O Sul: caminho do roçado: estratégias de
BRANDÃO, C. R. O afeto da terra: imaginários, reprodução camponesa e transformação social. São
sensibilidades e motivações de relacionamentos com Paulo, Marco Zero, 1990. (Pensamento Antropológico).
a natureza e o meio ambiente entre agricultores e
criadores sitiantes do Bairro dos Pretos, nas encostas GODOI, E. P. de. O trabalho da memória: cotidiano e
paulistas da Serra da Mantiqueira, em Joanópolis. história no Sertão do Piauí. Campinas, UNICAMP,
Campinas, UNICAMP, 1999. (Pesquisas). 1999. (Pesquisas)

BRASIL. INCRA. Livro branco da grilagem de terras no GUANZIROLI, C. et al. Agricultura familiar e reforma
Brasil. Disponível em: www.incra.gov.br. Acesso em: 15 agrária no século XXI. Rio de Janeiro, Garamond, 2001.
set. 2009. HISTÓRIA SOCIAL DO CAMPESINATO. Apresentação
CANDIDO, A. Os parceiros do Rio Bonito: estudo sobre geral. São Paulo, UNESP, Brasília MDA, 2008/2009. 9
o caipira paulista e a transformação dos seus meios volumes.
de vida. Rio de Janeiro, José Olympio, 1964. (Col. IBGE. (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).
Documentos brasileiros, 118). Caderno da Agricultura Familiar: primeiros resultados.
CARNEIRO, M. J. Política pública e agricultura familiar: Disponível em: <www.ibge.gov.br>. Acesso em: 14 mar.
uma leitura do Pronaf. Estudos, Sociedade e Agricultura, 2011.
Rio de Janeiro, n. 8, abr. 1997, p. 70-82.
JULIÃO, F. Que são as ligas camponesas? Rio de Janeiro,
______. e MALUF, R. S. (Orgs.). Para além da produção; Civilização Brasileira, 1962. (Caderno do Povo
multifuncionalidade e agricultura familiar. Rio de Brasileiro, 1)
Janeiro, Mauad, 2003.
KAGEYAMA, A. A. (coord.) O novo padrão agrícola
CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil). A brasileiro: do complexo rural aos complexos
Igreja e os Problemas da Terra. Itaici, fevereiro de 1980. agroindustriais. In: DELGADO, Guilherme Costa;
(Documento aprovado pela 18ª Assembléia da CNBB GASQUES, José Garcia; VILLA VERDE, Carlos
em 14 de fevereiro de 1980). Monteiro (Orgs.). Agricultura e políticas públicas. 2.ed.
Brasília: IPEA, 1996, p. 113-223. .(IPEA, 127).
COHEN, M. e DUQUÉ, G. Les deux visages du Sertão:
stratégies paysannes face aux sécheresses: Nordeste du LAMARCHE, H. (Coord.). A agricultura familiar. 1.
Brésil. Paris, IRD, 2001. (Collection À Travers Champs). Comparação internacional: uma realidade multiforme.
DEL GROSSI, M. E., SILVA, J. G. e TAKAGI, M. Evolução Campinas, UNICAMP, 1993.
da Pobreza no Brasil, 1995/99. Campinas, IE/UNICAMP, ______. (Coord.) A agricultura familiar: 2. comparação
2001. (Texto para Discussão. n. 104) internacional: do mito à realidade. Campinas, UNICAMP,
DELGADO, G. C. Capital financeiro e agricultura no Brasil: 1998.
1965-1985. São Paulo, Ícone, 1985. (América Latina). LEITE, S. et al. Impactos dos assentamentos: um estudo
ESTERCI, N. Conflito no Araguaia; peões e posseiros sobre o meio rural brasileiro. São Paulo, UNESP, 2004.
contra a grande empresa. Petrópolis: Vozes, 1987. (Estudos NEAD, 6)

FERREIRA, A. D. D. Agricultores a agroindústrias: MARTINS, J. de S. Os camponeses e a política no Brasil.


estratégias, adaptações e conflitos. Reforma Agrária. Petrópolis: Vozes, 1981.
Revista da ABRA, Campinas, v. 25, n. 2/3, mai./dez. 1995, ______. Expropriação & violência; a questão política no
p. 86-113.
campo. 2. ed. São Paulo, HUCITEC, 1982.
______. e BRANDEMBURG, A. (Org.). Para pensar outra
______. (Coord.). Travessias: a vivência da reforma
agricultura. Curitiba, UFPR, 1998.
agrária nos assentamentos. Porto Alegre, Editora
FRANÇA, C. G. de, DEL GROSSI, M. E. e MARQUES, UFRGS, 2003, (Série Estudos Rurais). (2ª Edição em
V. P. M. de A. O Censo Agropecuário de 2006 e a Agricultura 2009).

RESR, Piracicaba-SP, Vol. 52, Supl. 1, p. S025-S044, 2014 – Impressa em Fevereiro de 2015
Maria de Nazareth Baudel Wanderley  S043

MATTEI, L. Impactos do PRONAF: análise de indicadores. SCHMIDT, B. V., MARINHO, D. N. e ROSA, S. L. C.


Brasília, NEAD/MDA, 2005. (Estudos NEAD, 11). (Orgs.). Os assentamentos de reforma agrária no Brasil.
Brasília, UnB, 1998.
MEDEIROS, L. S. de. História dos movimentos sociais no
campo. Rio de Janeiro, FASE, 1989. SILVA, J. F. G. da (Coord.). Estrutura agrária e produção
de subsistência na agricultura brasileira. São Paulo,
MEDEIROS, L. S. de et al. (Orgs.). Assentamentos
HUCITEC, 1978. (Estudos Rurais)
rurais; uma visão multidisciplinar. São Paulo, UNESP,
1994. SILVA, J. G. da. Progresso técnico e relações de trabalho
na agricultura. São Paulo, Hucitec, 1981. (Economia
______. e LEITE, S. (Org.). A formação dos assentamentos
&Planejamento. Teses e Pesquisas).
rurais no Brasil: processos sociais e políticas públicas.
Porto Alegre, UFRGS, 1999. (Estudos Rurais) ______. A modernização dolorosa: estrutura agrária,
fronteira agrícola e trabalhadores rurais no Brasil. Rio
MOTTA, M. e ZARTH, P. (Orgs.). Formas de resistência
de Janeiro, Zahar, 1982. (Agricultura e Sociedade).
camponesa: visibilidade e diversidade de conflitos ao
longo da história. 1: Concepções de justiça e resistência ______. Urbanização e pobreza do campo. IN: RAMOS, Pedro.
nos Brasis. São Paulo, UNESP; Brasília, Ministério do SILVA, J. G. da., BELIK, W. e TAKAGI, M. Projeto Fome
Desenvolvimento Agrário, NEAD, 2008. (História Zero – Uma Proposta de Política de Segurança Alimentar
Social do Campesinato no Brasil). para o Brasil. São Paulo, Instituto da Cidadania, 2001.
PALMEIRA, M. Casa e trabalho: nota sobre as relações WANDERLEY, M. de N. B. O campesinato brasileiro:
sociais na plantation tradicional. Contraponto, Rio de uma história de resistência. In: Bai xi nong min; Kang
Janeiro, v. 2, n. 2, 1977, p. 103-114. zheng de li shi. In: Peilin Li, M K Gorshkov, Celi Scalon,
PAULILO, M. I. S. Produtor e agroindústria: consensos K L Sharma. Jin Zhuan Guo Jia She Hul Fen Ceng; Bian
e dissensos: o caso de Santa Catarina. Florianópolis. Qian Yu Bi Jiao, Beijin, Social Sciences Academic Press,
UFSC, 1990. 2011, p. 133-145.

QUEIROZ, M. I. P. de. Uma categoria rural esquecida. ______. Brazilian Peasantry: a history of resistence.
Revista Brasiliense, S. Paulo, n. 45, 83-97, 1963. In: Peilin Li, M K Gorshkov, Celi Scalon, K L Sharma.
Social Stratification in the BRIC Countries: Change and
______. O campesinato brasileiro; ensaios sobre civilização Perspective. London, World Scientific Publishing Co,
e grupos rústicos no Brasil. S. Paulo, EDUSP, Petrópolis, 2013, pp. 163-183.
Vozes, 1973. (Estudos Brasileiros, 3).
WILKINSON, J. Mercados, redes e valores. Porto Alegre:
REYDON, B. P. (Orgs.). Agropecuária, situação atual e UFRGS, 2008.
perspectivas. Campinas, ABRA, 1995, p. 127-149.
WOORTMANN, E. F. Herdeiros, parentes e compadres:
SABOURIN, E. Camponeses do Brasil, entre troca mercantil colonos do sul e sitiantes do nordeste. São Paulo,
e reciprocidade. Rio de Janeiro, Garamond, 2009. HUCITEC, 1995.
SANTOS, J. V. T. dos. Colonos do vinho: estudo sobre a WOORTMANN, K. Com parentes não se neguceia: o
subordinação do trabalho camponês ao capital. São campesinato como ordem moral. Brasília, UnB, 1990.
Paulo, HUCITEC, 1978. (Ciências Sociais. Realidade (Anuário Antropológico, 87)
Social).
WOORTMANN, E. e WOORTMANN, K. O trabalho
______. Matuchos, exclusão e luta: do Sul para a da terra: a lógica e a simbólica da lavoura camponesa.
Amazônia. Petrópolis, Vozes, 1993. Brasília, UnB, 1997.

RESR, Piracicaba-SP, Vol. 52, Supl. 1, p. S025-S044, 2014 – Impressa em Fevereiro de 2015

Você também pode gostar