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Como diretor

1991 Ave! (curta)


1994 Juvenília (curta)
2003 O Prisioneiro da Grade de Ferro (auto-
retratos) apresenta

Como produtor (somente os longas)


2002 Amarelo Manga, de Claudio Assis

Como montador (somente os longas)


2000 Cronicamente Inviável, de Sérgio
Bianchi
Tônica Dominante, de Lina Chamie
2002 Amarelo Manga, de Cláudio Assis
2003 O Prisioneiro da Grade de Ferro (auto-
retratos)
2004 Quanto Vale ou é por Quilo, de Sérgio
Bianchi (em montagem) 14 de Abril de 2004 – Ano II – Edição nº 47
FILMOGRAFIA
Paulo Sacramento

SESSÃO CINECLUBE PRÓXIMO FILME

Mediação do Debate: 21/abr Persona - Quando duas Mulheres Pecam


O PRISIONEIRO DA GRADE DE FERRO
Eduardo Valente e Ruy Gardnier. de Ingmar Bergman de Paulo Sacramento
Programação e Produção:
Grupo Estação e Contracampo. Convidado: Paulo Sacramento

Um ano antes da desativação da Casa de Detenção do O Prisioneiro da Grade de Ferro – Brasil,


Carandiru, detentos aprendem a utilizar câmeras de vídeo e 2003, cor, 123'
documentam o cotidiano do maior presídio da América Direção e Roteiro: Paulo Sacramento

FICHA TÉCNICA
Latina. Fotografia: Aloysio Raulino
realização colaboração Montagem: Idê Lacreta e Paulo Sacramento
Produção: Gustavo Steinberg
SINOPSE

www.estacaovirtual.com www.contracampo.com.br
Sem sua sequência inicial e sua sequência final, O Prisioneiro da Grade de Ferro separação com créditos ou com uma montagem onde ficasse
seria um dos mais importantes documentários já feitos no Brasil e um dos filmes claro o que no filme foi filmado por quem: onde começa um
AUTORIA E AUTORIDADE EM CHEQUE: AUTO-RETRATO DE UM PAÍS mais impressionantes sobre seu tema, em qualquer lugar ou época. Com estas duas trecho filmado por um detento, onde volta à documentação
sequências que inauguram e fecham seu discurso, o filme passa desta categoria realizada pelo diretor e sua equipe. Mas, esta não foi a opção
para a de obra-prima indiscutível. dele: em O Prisioneiro da Grade de Ferro as imagens são parte
de um mesmo todo, e quem as captou não faz a menor diferença
No início, uma imagem aparentemente abstrata vai se revelando uma imensa porque todos (inclusive a equipe original, o que é
nuvem de fumaça cor de terra e branca. Esta nuvem se movimenta de forma impressionante) assumem a mesma voz.
estranha, e demoramos a entender que a imagem está sendo projetada de trás para
a frente. A cada segundo e movimento, aquilo que vemos se torna mais e mais A montagem do filme tem a inteligência de escapar tanto do
claro: a implosão de um prédio é mostrada no sentido inverso. E aí, com a magia denuncismo barato e fácil quanto de um esvaziamento do horror
audiovisual que só o cinema poderia captar, ressurge em nossa frente o complexo das penitenciárias. Assumindo na sua forma a multiplicidade de
penitenciário do Carandiru: das cinzas da sua recente implosão, ele volta à sensações e experiências que vemos, o filme toma para si o
existência. Afora o fascínio visual verdadeiro deste momento, muito mais registro do quebra-cabeças formado por fragmentos que fazem
importante é seu significado: implodido (como se isso fosse solução de algum pouco sentido em si, mas muito sentido quando vistos em
problema), o Carandiru ressurge como uma assombração - há algo de sobrenatural conjunto (embora, neste caso, não haverá jamais uma imagem
naquele movimento às avessas. O Carandiru ter ido ao chão, nos diz a sequência e final única a ser formada). Por isso mesmo, o filme revela desde
o filme, nada faz para resolver ou acabar com os problemas que ele sempre a alegria do jogo de futebol e das visitas, as realidades da prática
representou. Pelo contrário, só serve para tentar esconder (numa nuvem de do sexo ou religiosa, até as condições sub-humanas de celas
fumaça) a realidade que ainda está nos presídios e na organização social-política de super-lotadas e os horrores de um atendimento médico precário
todo o país. O movimento essencial deste filme será (e daí a importância desta e insuficiente. O pagode, o rap, os facões e a pinga produzida ali
sequência inicial) trazer de volta este mundo que se pretende esconder, como o dentro mesmo têm o mesmo peso, pois são todos partes de um
prédio ressurgindo das suas cinzas. imenso todo, e assim são tratados pela montagem Um outro
trabalho que precisa ser muito destacado, aliás, é o da edição de
Chegaremos na sequência final e sua ligação com este início, mas antes é preciso som (além da captação deste: em si, simplíssima, mas muitas
falar do tal filme impressionante que está no meio deste início e deste fim. O maior vezes prodigiosa): som e montagem nos fazem transbordar pelo
dos méritos do Paulo Sacramento documentarista, que este filme revela, é sua Carandiru, o tempo todo.
curiosidade e humildade imensas. Mais importante do que ele é o seu filme, e
muito mais ainda, seus objetos de olhar. Tão importantes, mas tão importantes, E, finalmente, voltamos ao já mencionado final do filme. Após
que de objeto de olhar eles viram co-realizadores do filme. Quando Sacramento (e reconstruir com tal ineditismo e respeito a experiência dos
sua equipe) opta por um formato de realização onde, através de workshops com os detentos deste fantasma de concreto, o filme passa a palavra às
detentos, estes aprendem a manejar o equipamento digital e a documentar eles autoridades. Primeiro, com falas de vários ex-diretores do
mesmos a sua realidade, a importância deste procedimento não é "humanitária" complexo, onde o sentimento onipresente é o de que há algo de
nem muito menos oportunista. Há por trás deste movimento um reconhecimento completamente errado num modelo que prega a correção ou a
pelo documentarista dos limites impostos ao seu conhecimento de um ambiente ao solução quando é, obviamente, muito mais causa e distorção. E,
mesmo tempo tão particular, fechado e cheio de limites quanto é o de um presídio. finalmente, a palavra das autoridades atuais, encarnadas no
A câmera "imparcial" do documentarista só poderia ir até um certo ponto, assim governador de São Paulo que, ao contrário da implosão inicial,
como sua capacidade de se relacionar com aquele ambiente, em parte por motivos discursa na abertura de uma nova cadeia, de uma nova
práticos, e em grande parte pelo excesso de clichês já criados no jornalismo e na penitenciária. Seu orgulho ao falar dos números de vagas para
ficção sobre a representação deste espaço. Ao passar a câmera para os detentos, detentos criados em seu governo, como se falasse de construção
Sacramento assume suas impossibilidades. de estradas ou escolas, é da natureza mais abjeta do jogo das
autoridades, em completo desacordo e habitante um universo
E, mais do que isso, a verdadeira importância: a passagem de objetos a sujeitos distinto de todo da realidade, que acabamos de presenciar. Ali
daqueles homens retratados - eles devem escapar da imagem simplista de importa menos que seja Alckmin ou qualquer outro nome: o que
marginais tanto quanto da de coitadinhos. Eles são muito mais do que um ou do vemos é a completa distância que separa quem decide de quem
que o outro, por serem antes de tudo homens, indivíduos que dividem uma sofre as consequências. Aquele sorriso grotesco, aquelas palmas
realidade comum sem que esta os torne apenas símbolos ou emblemas. Tratá-los submissas, todos contraditos pelas palavras do padre que
como tal seria reproduzir os estigmas que os acompanham desde sempre, e faria abençoa a inauguração e lamenta o motivo de estar ali. Como o
muito pouco sentido para quem buscasse revelar algo de realmente nunca plano inicial, voltamos a ver nas palavras do governador a certeza
visto/ouvido/pensado sobre este espaço. Mas, além deste movimento significar de que o horror continua e continuará por um bom tempo.
este reconhecimento de uma limitação, ele também possui outra característica
de Eduardo Valente

Derrubar paredes de um presídio como se o concreto fosse a


essencial ao melhor documentarista: saber que seu tema, seu objeto, não deve causa do que ali dentro aconteceu (e acontece) é parte da mesma
estar previamente entendido ao ponto que se saiba que filme vai-se fazer ao "sair lógica segundo a qual número de vagas em cadeias é orgulho
de casa". A realidade é de tal modo fluida, inconstante e complexa que qualquer para governantes. Esta lógica que circunda e oprime a realidade
filme que a use como prova de tese pré-construída estará fadado ao fracasso que vimos aprisionada no filme entre estes dois momentos, e
completo ou a irrelevância. Ao entregar suas câmeras aos detentos, Sacramento faz que torna O Prisioneiro da Grade de Ferro um dos mais
o movimento mais difícil de um realizador contemporâneo: questiona sua própria contundentes e coerentes exemplos do discurso
autoria do material. Esta idéia estaria completamente jogada no lixo se fosse cinematográfico unindo forma a conteúdo e unindo cinema a
Sacramento um realizador mais ingênuo (ou covarde mesmo) e resolvesse esta realidade.

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