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UNIVERSIDADE ESTADUAL DO RIO GRANDE DO SUL

UNIDADE UNIVERSITÁRIA EM PORTO ALEGRE


CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM TEORIA E PRÁTICA DE FORMAÇÃO DO LEITOR
PROF. ME GILMAR DE AZEVEDO

A LEITURA DA LITERATURA – A FORMAÇÃO DO


LEITOR

PORTO ALEGRE
2019
PROGRAMAS DE LEITURA

- A leitura de literatura é vista como atividade da elite dominante;

PESQUISA RETRATOS DA LEITURA NO BRASIL – INSTITUTO PRÓ-LIVRO. 4ª ed. São Paulo:


2016:
- Média de leitura de livros (4,96), livros inteiros (2,43), livros de literatura (1,26), recomendados pela
escola (0,42), 56% é considerada leitora com ao menos 1 livro (inteiro ou em partes) em 3 meses.
Objetivo: “Transformar o Brasil em um país de leitores”.

PLANO NACIONAL DO LIVRO E DA LEITURA (Decreto nº 7.559, 1º de setembro de 2011):


- Democratização do acesso ao livro;
- A formação de mediadores para incentivo à leitura.
REFERENCIAL TEÓRICO

LEITURAS E RELAÇÃO TEXTO-LEITOR

- “O que o autor quis-dizer”;


- “Texto: código de comunicação”;
- “Foco no leitor: atribui significado à leitura”;
- 1980 – Linguística da Enunciação: interação autor-texto-leitor: A leitura é vista como atividade de produção de
sentidos, a língua tem uma função interacional, dialógica, os sujeitos são vistos como atores/construtores
sociais.

- “A leitura
. do mundo precede a leitura da palavra” (FREIRE, Paulo. A importância do ato de ler: em três
artigos que se complementam. 45ª ed. São Paulo: Cortez, 2003, p. 11).

- “Ler as letras de uma página é apenas um de seus muitos disfarces [...] [textos] compartilham com os leitores
de livros a arte de decifrar e traduzir signos [...] contudo, em cada caso é o leitor que lê o sentido [...] é o leitor
que deve atribuir significado a um sistema de signos” (MANGUEL, Alberto. Uma história da leitura. São
Paulo: Companhia das Letras, 1999, p. 19).

- Atualmente, lê-se bastante em sites da internet, blogs, redes sociais;


- A escola pedagogiza a leitura, atribuindo a mesma função da leitura utilitária à literária.
LEITURAS E RELAÇÃO TEXTO-LEITOR

Tipos possíveis de leitura (SOARES, Magda. O jogo das escolhas. In: MACHADO, Maria Zélia Versiani;
PAIVA, Aparecida; MARTINS, Aracy Alves; PAULINHO, Graça (Orgs). Escolhas (literárias) em jogo. Belo
Horizonte Autêntica, 2009, p. 19-34).
1- Funcional: informações e conhecimentos necessários para o cotidiano (situações práticas da vida-
utilitária);
.
2- Entretenimento: forma de lazer (a serviço do ser humano);
3- Literária: questiona a significação, busca sentido, persegue o valor mutante e mutável da palavra, que é
dirigida pelo estético - A diferença não está no texto e sim em quem lê, para que lê, no modo de ler.
- Para que serve a literatura? Para nada, e para tudo? A literatura não presta para nada. A poesia, o romance, o conto, a crônica, as
narrativas fantásticas e as de cotidiano, as histórias e fatos que não aconteceram e que podiam ou podem acontecer – a literatura não
forma nem conforma os espíritos, não salva nem consola, não ensina nem estimula. Enfim, não se presta para muito para coisa
práticas e aplicadas. Não produz realidades mensuráveis e negociáveis. A literatura presta para tudo. O texto literário é um convite a
uma ação desinteressada, gratuita, uma ação que não se espera que dela resulte lucro ou benefício. É o simples pôr-se em
movimento, para sentir-se e existir num tempo suspendido na história, um tempo em que a pessoa se faz somente para si, para ser,
um tempo de indagação e contemplação, de êxtase e sofrimento, de amor e angústia, de alívio e esperança, disso tudo de uma vez e
para sempre. Nela a gente se forma e se conforma, perde-se e salva-se, se consola e se estimula, aprende e ensina a viver em
realidades incomensuráveis ainda que realmente intangíveis. (BRITTO, Luiz Percival Leme. Ao revés do avesso: leitura e formação.
São Paulo: Pulo do Gato, 2015, p. 53-54)

Para que serve a ficção? Tem alguma utilidade, alguma funcionalidade na formação de uma pessoa [...]? Todos nós, homens e mulheres,
vamos ao dicionário para saber sobre as palavras, aos livros de ciência para saber ciência, aos jornais e às revistas para ler notícias da
.
atualidade e aos cartazes de cinema para saber os filmes que estão passando. Mas onde vamos quando queremos saber de nós
mesmos? Nós, os leitores, vamos à ficção para tentar compreender, para conhecer algo mais acerca de nossas contradições, nossas
misérias e nossas grandezas, ou seja, acerca do mais profundamente humano. (ANDRUETTO, Maria Teresa. Por uma leitura sem
adjetivos. São Paulo: Pulo do Gato, 2013, p. 53-54).

“Entendemos por literatura toda produção escrita através de recursos linguísticos com função estética, da história e da
imaginação da humanidade, veículo de reflexão e libertação para o ser humano” (RÖSING, Tânia; MARTINS, Ana
Carolina. Práticas leitoras para uma cibercivilização. Passo Fundo: EDIUPF, 1999, p. 32).
FORMAÇÃO DE LEITORES E MEDIAÇÃO DE LEITURA

- A leitura é autônoma e individual, mas pode ser mediada.

- No início, as leituras eram orais e com afeto com quem as contava (LOIS, Lena. Teoria e prática da formação do leitor: leitura e literatura na sala de
aula. Porto Alegre: Artmed, 2010);

- Agora, a função da formação de leitores fica delegada à escola, por meio de professores e bibliotecários: “[...] oferecendo informações contextuais, dando
pistas para ler nas linhas, nas entrelinhas e por trás das linha; propondo um corpus de textos selecionados pela sua qualidade estética, ética e social (gêneros
discursivos), criando espaços de leitura compartilhada (orientada, reflexiva) e autônoma nos processos de educação literária” (ABRANTES, W.M.
Caminhos metodológicos para a formação de mediadores da leitura. In: Biblioteca e mediação da leitura. Rio de Janeiro: Fundação Biblioteca Nacional,
2010, p.76,84).

- No .entanto, “professores não são leitores” (SILVA, Ezequiel Theodoro da. O professor leitor. In: SANTOS, Fabiano dos; MARQUES NETO, José Castilho;
RÖSING, Tânia M.K.(Orgs). Mediação de leitura: discussões e alternativas para a formação de leitores. São Paulo: Global, 2009, p. 23-36).

E:
“A ausência de uma cultura de leitura impõe a constituição de mediadores entre o texto e o leitor, seja no contexto da escola, seja no contexto da família ou,
mesmo, do exercício profissional” (LUFT, Gabriela Fernanda Sé. Práticas leitoras multimídiais e formação de leitores: a leitura como ato criativo,
participativo e dialógico. In: NEVES, I.C.B; MORO, E.L.S; ESTABEL, L.B. (Orgs). Mediadores de leitura na bibliodiversidade. Porto Alegre: Evangraf,
2012, p.159-166.

- Contação de histórias (hora do conto), Leitura em voz alta, Memoriais de leitura (história de leituras), Intertextualidades...
Prof. Gilmar de Azevedo

A LITERATURA COMO FORMAÇÃO DO HOMEM,


de Antônio Cândido

Recorte:
- A grande função (social) da literatura é a humanização do homem para confirmar a
sua humanidade;
- Nela está a ideia de valor para a pessoa (escritor, leitor e público) e num sentido
trans-histórico, em interesse pelos elementos contextuais (o texto se forma a partir
dele) para confirmar identidade, destino na projeção da experiência humana;
- Função psicológica: atuação psíquica e social do autor, do valor para a projeção da
experiência humana;
- Como? Na necessidade universal de ficção e de fantasia: no primitivo, no civilizado; na
criança, no adulto; no instruído e no analfabeto;
- Mas: a fantasia quase nunca é pura: imaginação explicativa (ciência); fantástica ou
ficcional ou poética (artista, escritor) – “estímulos de realidade” – realidade sensível do
mundo (devaneio) – sub e inconsciente = inculcamento.
LAJOLO, Marisa. Os leitores, esses temíveis desconhecidos. In: LAJOLO, Marisa. Do mundo da leitura
para a leitura do mundo. 3ª ed. São Paulo: Ática, 1997, p. 33-40.
Recorte:
- O leitor, que se encontra com o livro aberto, pergunta para o autor: “Trouxeste a chave?”;
- O autor deve cativar o leitor porque este sempre tem razão;
- O leitor desfruta de imenso poder, inclusive quando 10% da venda dos livros passam para
o autor;
- Há leitores mais íntimos, profissionais, interlocutores, comparsas – o texto diz o que
diz...: “O leitor é irmão, mas é hipócrita” (p.35 – sobre a distância entre autor e leitor que
pode fechar o livro - o autor tem a obrigação de terminar o que começou);
- Mas há muitos que não têm acesso à palavra, à voz: silêncio e solidão;
- Leitores profissionais: compromissos, confiança da comunidade cultural sobre leitura e
linguagem – em relação ao mercado, atravessadores do mercado organizado. E podem
constituir leituras e leitores em mercadorias;
- O autor tem que construir hipóteses relativas ao leitor que deseja seduzir: imagem que o
leitor tem de si mesmo, que gostaria que o autor tivesse dele. É o leitor, no entanto, que é
seduzido pela história;
- É necessário desconfiar da máscara do leitor: “Em que espelho ficou perdida a minha
face” (Cecília Meireles).
ZILBERMAN, Regina. Como e por que ler a literatura infantil brasileira.
Rio de Janeiro: Objetiva, 2005.
Recorte:
O que é que a literatura tem?
-Um bom livro é aquele que agrada, faz voltar a trechos que provocaram prazer particular;
-Eles constituem a biblioteca interior, ficam na memória, como “O velho, o burro e o Estado
Novo”, de Affonso Romano de Sant’Anna:
Será que ela não entende
que em tempos de ditadura
a imaginação se anula
e gera além da moldura
na gravura
outra gravura
como um louco que descerra
na escuridão de seus gestos
a interna luz da loucura?
[…]
Lá vai o ditador
entrando para a Academia
com todos os votos:
quarenta vivos
– e cinco mortos.
O ditador pinta o sete com os políticos
é futurista regionaista, é político apartidário
é fala de fome e povo
– num painel de Portinari.
O ditador aprende com Niemayer a arquitetar o poder,
mistura discurso e ferro, argamassa promessa e areia
e enreda o povo e a esperança como um aranha na teia.
O ditador é pequeno, mas não é bobo,
é capaz de solo e coro
é sem que Villa-Lobos veja
se oculta na partitura
e surge na praça rindo
regendo e encantando o povo.
Recorte:

E para a poesia não vai nada?


-Poetas parnasianos (Olavo Bilac e Francisca Júlia) fizeram poemas infantis (1883);
- Vários poetas escreveram obras infantis, mas alguns modernistas se especializaram no gênero: Sérgio
Caparelli, Roseana Murray, Elias José (Atirei o pau no gato...);
-Poemas para brincar (José Paulo Paes): diversão e jogo para crianças.
Convite
Poesia
é brincar com palavras
como se brinca
com bola, papagaio, pião.
Só que
bola, papagaio, pião
de tanto brincar
se gastam.
As palavras não:
quanto mais se brinca
com elas
mais novas ficam.
Como a água do rio
que é água sempre nova
Como cada dia
que é sempre um novo dia.
Vamos brincar de poesia?
- Henriqueta Lisboa
ESTRANHAMENTO
O menino poeta - Mário Quintana
não sei onde está. Pé de Pilão
Recorte: Procuro daqui
Outra vez nas ondas. O pato ganhou sapato
Procuro de lá Ai! que esse menino Foi logo tirar retrato.
será que será? O macaco retratista
Tem olhos azuis Certo peregrino Era mesmo um grande artista.
ou tem olhos negros? passou por aqui Disse ao pato: "Não se mexa
Parece Jesus conta que um menino
Para depois não ter queixa".
ou índio guerreiro? das bandas de lá
furtou uma estrela. Olhe pra cá direitinho:
Vai sair um passarinho.
Tra -la- la - la- li Tra - la - li - la lá O passarinho saiu,
tra - la- la- la- la Bicho assim nunca se viu.
A estrela num choro Com três penas no topete
Mas onde andará o menino rindo.
E no rabo apenas sete.
que ainda não vi? E como enfeite ele tinha
Porém de repente
Nas águas de Lambari, Um guizo em cada peninha.
menino tão lindo!
nos reinos do Canadá? subiu pelo morro, Pousou no bico do pato:
Estará no berço tornou a pregá - la - Eu também quero retrato!
brincando com os anjos, com três pregos de ouro No retrato saio só eu,
na escola travesso nas saias da lua. Pra mandar a minha vó!
rabiscando bancos? A discussão não parava
Ai!que esse menino
será, não será? E cada qual mais gritava.
O vizinho ali Passa na rua um polícia.
disse que acolá Procuro daqui "Uma briga? Que delícia!"
existe um menino procuro de lá. Entra como um pé de vento
com dó dos peixinhos. O menino poeta Prende tudo num momento.
Um pescou por pescar quero ver de perto
um peixinho de âmbar quero ver de perto
para me ensinar
coberto de sal. as bonitas coisas
Depois o soltou Do céu e do mar.
- Cecília Meireles
Recorte: - Vinícius de Moraes
Uma flor quebrada Colar de Carolina - Sérgio Caparelli
As Abelhas
A raiz era a escrava, Com seu colar de coral, Pintando o Sete
A abelha mestra Descabelada negrinha Carolina
e as abelhinhas Que dia e noite ia e vinha corre por entre as colunas Um pinguço pega o pito
Tão todas prontinhas E para a flor trabalhava. da colina. e pita debaixo da pita.
Para ir para festa E a árvore foi tão bela! A pita, com muita pinta,
Como um palácio. E o vento O colar de Carolina pinta uma dúzia de pintos,
Num zune-que-zune Pediu em casamento colore o colo de cal, com pingos pretos de tinta.
Lá vão para o Jardim A grande flor amarela. torna corada a menina.
Brincar com a cravina Mas a festa – E o pinguço?
Valsar com o jasmim tão E o sol, vendo aquela cor
Da rosa para o cravo breve, do colar de Carolina, – Pinta o sete.
Do cravo para a rosa Pois era um vento tão forte põe coroas de coral
Da rosa pro favo Que em vez de amor trouxe morte nas colunas da colina. – Como pinta o sete
E de volta para a rosa À airosa flor tão leve. o pinguço?
Venham ver como dão mel E a raiz suspirava
As abelhas do céu. Com muito sentimento. – Pita pinto pinga pita
Seu trabalho onde estava? pia pintos pingos pingam
A abelha rainha Todo perdido com o vento. pia pia pinto pinto
está sempre cansada pinga pito pinto pinga
Engorda a pancinha pingo pinga pinta pia
E não faz mais nada
Depois o pinguço dorme
e a língua morde
Potencialidades sonhando que chovem
fônicas pingos de pinga.
Recorte: Teatro: valorização da trama e conflitos solucionados de forma engenhosa pelas
personagens crianças, com humor e imaginação.
Ivo Bender: O macaco e a velha;
Raimundo Matos Leão: Quem conta um ponto aumenta um ponto (folclore popular): (macaco x muher; mãe x sequestrador da
filha; conflito entre cachorro, gato e rato; Lampião x demônios).
Sylvia Orthof: Eu chovo, tu choves, ele chove (chuveiro que dá ordens ao pingo, nuvem, tromba d’água que aparece sob a forma de
Príncipe Elefântico)

Maria Clara Machado: autora do livro “Hoje tem espetáculo (1984).


- O rapto das cebolinhas;
- A bruxinha que era boa;
- O cavalinho azul;
- A menina e o vento;
- Pluft, o fantasminha: casa mal-assombrada, mãe (conversa com a prima Bolha D’
Água), viúva (saudosa do marido), tio Gerúndio (sono), menina Mirabel (sequestrada
pelo pirata Perna de Pau) que deseja encontrar o tesouro na casa (era do Cap.
Bonança, avô de Mirabel, que é ajudada por 3 marinheiros): ela é salva por Pluft
(fantasma que tem medo de gente, tímido e inseguro e que deve se portar como
fantasma para orgulhar o pai, o Fantasma da Ópera).

Chico Buarque de Holanda: Os saltimbancos (baseado nas obras dos irmãos Grimm:
originalidade e propriedade em suspeita - recontextualização): bichos se expressam
como pessoas e lutam contra as maldades – Ditadura Militar (1977)

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