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NON SENCE ANA C Trab FINAL PDF
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Doravante Ana C.
tanto estranhamento, ao menos despertam a curiosidade. Especialmente
nesse caso em particular, em que a poeta em questão trabalhava com esses
gêneros da intimidade de forma tão intensa e desconcertante. Logo após o
ato aconteceu o inevitável: buscou-se explicar a obra pela vida, já que havia
várias menções a esse ato final disseminados em sua poesia. Porém, o mais
significante fora deixado de lado por um momento, o veemente lapidar com
as palavras a fim de atingir o efeito de singularização.
Eu acho que existe uma palavra não falada [...] Acho que ele (o livro
A teus pés) conta com alguma coisa que não foi dita; conta, mas conta
enquanto questão literária. Na literatura sempre haverá uma coisa que
escapa. Então não dá nem mais pra chorar em cima disso. [...] A
poesia moderna é uma poesia que se lanceta. Ela é toda cheia de
arestas, é angulosa, não tem, digamos, um desenvolvimento coerente,
linear.
CESAR, 1999. P260, 261
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Segundo a definição de Barthes, biografema “trata-se de uma coleção de objetos parciais <nunca
encerrados numa estrutura> e que favorecem um certo fetichismo neste <Eu> que gosta de saber,
tomando esta mesma coleção <estrutura inventada> como um franco gesto amoroso. Inventada não
porque se ponha de antemão falsear, mas porque, na impossibilidade de resgatar a linha histórica
<haverá de ter uma?>, resta ao biógrafo tentar, à sua maneira. (COSTA, Luciano Bedin. 2010. P.107).
Nesse desenho3, observa-se que a protagonista se chama “Anabela”. Esse
texto se desenrola em uma narrativa que culmina com a personagem se
atirando ao mar. Poderia buscar explicações psicologizantes, tentando
conectar algum elo entre o salto mortal e o desenho da juventude.
Justamente porque ela era tão nova quando o produziu. Mas me contento em
indicá-lo como um biografema que assinala já na produção da menor idade,
senão um fator de estranhamento na obra; ao menos como um caso de
ostranenie na pessoa do ser, por causa da obra, por já ter começado a
produzir uma obra em que uma noite se anuncia em tão terna idade.
Para finalizar, gostaria de expor um de seus poemas-prosa, publicado
postumamente em antigos e soltos (2008. P.1554). Esse poema em prosa
pertence ao gênero da intimidade bastante praticado por Ana C: trata-se do
diário; seu título “13 de setembro de 1977”.
Nele o processo de singularização ocorre primeiramente através de
uma parataxe em “Voltar a escrever enfrentar o fantasma (...)”. Logo em
seguida, uma hipotaxe, entre uma sentença e outra. As sentenças não se
conectam; não há nada que estabeleça uma ligação entre ambas. Inclusive há
uma ocorrência de hipotaxe com parataxe, no mínimo, insólita: “Dia do
parto hora de cagar, não agüento mais de vontade”. Para reforçar esse efeito
uma série de aliterações das letras “p”, “t”, e “r” espalhados pelo poema que
contiguamente com o efeito mencionado produzem ritmo.
Fora referido no início desse texto que o projeto poético
desenvolvido pela poeta se deu sob a égide do signo do segredo e do
nonsense.
Não foi possível explorar a temática do segredo em sua obra, devido
ao tempo restrito. No entanto, é válido apontar que o segredo é produzido na
performance do segredo; no ato de simulá-lo. Ela cria esse aspecto em seus
“diários” e “cartas”. É como se houvesse um segredo a ser desvendado; ao
interlocutor, o eu lírico se dirige como se soubesse qual seria esse mistério.
Contudo, ao leitor resta somente a curiosidade e a eterna dúvida sobre o que
está oculto. Assim, o segredo pode ser uma forma de causar o
3
Ver anexos
4
Idem
estranhamento necessário à arte; pois leva ao leitor a se questionar se a
autora escreve por entrelinhas, como tantas vezes fora questionada.
Já o nonsense foi explorado e se identifica como uma de suas
maneiras de causar o estranhamento; por exemplo, a hipotaxe e a parataxe.
Referencias
______. Organizado por Viviana Bosi. Antigos e soltos: poemas e prosas da pasta rosa.
São Paulo: Instituto Moreira Salles, 2008.
COSTA, Luciano Bedin. Biografema como estratégia biográfica. Porto Alegre:2010.
Tese defendida no programa de pós-graduação da Faculdade do Rio Grande do Sul.
Disponível em:
http://www.lume.ufrgs.br/bitstream/handle/10183/27673/000766488.pdf?sequence=1
Acessado em 25/05/14.
SUSSEKIND, Flora. Até segunda ordem não me risque nada: os cadernos, rascunhos e
a poesia em vozes de Ana Cristina Cesar. 2.ed. Rio de Janeiro: 7 Letras, 2007.