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Brasil:
a nação revisitada

Abertura Pátria, morrer por ti


ou pelo menos te
ofertar este ramo
de palavras ardentes.
Vou à rua, peroro
com voz de calça curta
ordeno ao município
que marche resoluto
a combater os boches.
Carlos Drummond de Andrade, 1914

Os versos de Carlos Drummond de Andrade falam da guerra, dos senti-


mentos de um garoto pelo seu país. Num rompante de patriotismo, ele pede a
entrada do país na guerra. A voz desse menino não é um fato isolado.
Em outubro de 1917, quando os submarinos alemães bombardearam os
nossos navios mercantes, ocorreu uma verdadeira explosão de patriotismo.
Nas praças públicas, multidões se acotovelaram exigindo uma posição do
governo.
Todo esse clima de exaltação patriótica já vinha sendo preparado anterior-
mente. Em 1916, Olavo Bilac dera início à campanha cívica. Ele viajou por todo
o Brasil fazendo inflamados discursos em que defendia o serviço militar obriga-
tório e a mobilização do Exército.
O que mobilizava os corações e mentes era a idéia de defender as fronteiras
da nacionalidade. Para esse nacionalismo militarista, defender as fronteiras
significava defender a nossa língua, os nossos costumes e a nossa cultura:
“esta guerra universal e minha”, diz a poesia de Drummond.
Essas idéias fizeram época. Foi por causa delas que o Brasil afinal foi para a
guerra, ao lado dos Aliados. Em defesa da civilização
civilização.
Nesta aula, você vai ver como o final da guerra, em 1918, modificou o nosso
país. Mudou o cenário internacional, mudaram as ideologias, mudou o Brasil. É
nessa roda viva que vemos aparecer uma nova imagem do país.
Que imagem é essa?
Você vai ver também o que significou “lutar pela civilização”. Que realidade
estava por trás dessa palavra?
Quando o Brasil entrou na guerra, em 1917, entrou defendendo os ideais da
civilização francesa. A influência dessa cultura era muito forte, não só no nosso

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país, mas no mundo inteiro. Paris era o centro exportador da literatura, da Movimento
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pintura, das operetas e dos cafés-concertos.
Esse período da influência francesa durou mais de trinta anos e ficou
conhecido como a Belle Epoque . Os nossos intelectuais viviam voltados para a 24
“Cidade Luz”, como era chamada Paris.
O escritor Lima Barreto fez uma piada sobre o assunto, dizendo que o
intelectual brasileiro “anda, come, dorme e sonha em Paris”.
Café no Rio de
Janeiro, onde se
reuniam artistas e
intelectuais.

O que vinha da França era civilizado. O que estava aqui era primitivo e não
prestava. Essas idéias acabaram quando acabou a guerra. Terminado o conflito,
que durou quatro anos, a Europa já não era a mesma. Ruínas. Desolação. Cidades
inteiras desapareceram. A “Cidade Luz” já não brilhava.
Muita gente perdera a vida, muita gente perdera a ilusão de ver um mundo
melhor. Desmoronara a idéia de progresso indefinido. Desmoronara a Europa
como modelo de civilização e desenvolvimento.
O fim da guerra foi o fim dessa ideologia chamada liberalismo. Afinal de
contas, que comunidade era essa, na qual os irmãos se matavam nos campos de
batalha? Que liberdade mais enganosa fazia alguns países enriquecerem à custa
de outros? Que igualdade de condições permitia que uns tivessem todos os
direitos e outros mal conseguissem sobreviver?
Em 1916, um escritor chamado Spengler escreveu um livro que ficou famoso:
Utopia é uma
A decadência da civilização ocidental . Esse livro anunciava a decadência da
referência
Europa e a aurora do Novo Mundo. Era na América que ia surgir a nova
imaginária a uma
civilização. situação perfeita.
Era mais uma utopia! Mas essa imagem tão promissora teve papel importan- De tão perfeita, é
te. Levou os brasileiros a se olharem. Perplexos, eles chegaram à conclusão de sempre irrealizável.
que quase nada sabiam sobre a nossa cultura!
Mais uma vez foi o escritor Lima Barreto quem chamou a atenção para o fato:
“Nós não nos conhecemos uns aos outros, dentro do nosso próprio país.”
Era necessário encarar o país. Até então, o Brasil tinha, ou desejava ter, a cara
da França. Podia ser uma máscara bonita, de Pierrô. Mas o que estava por trás
dela?

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EmA tempo
U L A Se nós dermos um salto na história e chegarmos a 1992, vamos ver os
estudantes que saíram de cara pintada para as ruas. Eles reivindicavam um

24 Brasil melhor e mais justo.


Os caras-pintadas usaram máscaras para expressar o seu protesto. Nas
máscaras dos estudantes estava uma das caras do Brasil dos anos 90.
As expressões variam de acordo com a época...

A década de 1920 foi uma época de intensas inda-


gações e descobertas. Os artistas e intelectuais busca-
ram um novo jeito de expressar o país por meio da
literatura, das artes plásticas, da música e da pintura.
Esse movimento ganhou o nome de modernismo. O
que é ser moderno
moderno? É estar de acordo com a moda? É
copiar modelos? Ou será que ser moderno é só se
atualizar sem precisar copiar?
Eram essas perguntas que estavam na cabeça dos
nossos artistas e intelectuais. Eles queriam atualizar a
nossa cultura. Mas, para isso, era preciso descobri-la.
O marco simbólico do modernismo brasileiro foi a
Semana da Arte Moderna, que se realizou em São Paulo
em fevereiro de 1922. Mas esse foi só um marco simbó-
lico. O modernismo já vinha acontecendo antes da
Semana e iria continuar acontecendo depois dela, como
vamos ver adiante.
No Rio da Janeiro, desde o final do século XIX, já
se percebia um interesse pela música popular, como o
maxixe, o corta-jaca e as modinhas. Alguns artistas
compreendiam que a cultura negra devia ser respeitada como expressão do
Brasil. Também em São Paulo, Minas e outros Estados essa atitude começava
a existir.
Mas, afinal de contas, o que aconteceu em São Paulo na Semana de Arte
Moderna?
Entre os dias 13 e 17 de fevereiro de 1922, no Teatro Municipal, foram
realizados concertos, exposições, palestras. No seu concerto, o maestro e compo-
sitor Heitor Villa-Lobos causou grande impacto ao incorporar à orquestra
instrumentos de congada, tambores e uma folha vibratória de zinco.
Na época, esses instrumentos eram considerados populares e não deviam
fazer parte de uma orquestra. A congada e os tambores pertenciam às culturas
negra e indígena, vistas como primitivas e bárbaras. Os modernistas mostraram
que eram justamente essas culturas que tornavam o nosso país original e
diferente.
Esse era o espírito do movimento: mostrar uma nova imagem do país, uma
nova fisionomia cultural. O que antes era escondido, agora era mostrado. Por que
negar as culturas africana e indígena, se elas faziam parte da nossa realidade?
Na Semana de Arte Moderna também foram expostas as pinturas de Anita
Malfatti, Di Cavalcanti, Goeldi. Mário de Andrade, Oswald de Andrade e
Ronald de Carvalho apresentaram ao público os seus escritos.

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A Semana funcionou como um estopim. A arte buscava refletir as transfor- A U L A
mações por que passavam o mundo e o país. Em meio a um acelerado processo
de industrialização e urbanização, surgiam nas grandes cidades edifícios, letrei-
ros luminosos, viadutos, máquinas e fábricas. 24

Oswald de Andrade (sentado no chão), em foto com outros


organizadores da Semana de 22.

O tempo corria mais rápido. A arte precisava acompanhar o “fluxo da vida


moderna”, diziam os modernistas. Para isso, era necessário mudar a maneira
tradicional de se expressar. Mais ousadia criativa, mais rebeldia e menos
formalidade. Mas era necessário, também, responder a algumas perguntas.
Que país é este? Quem somos nós? Os modernistas contaram uma outra
história do Brasil. Não aceitavam mais a história “balofa” dos heróis, dos grandes
feitos, dos monumentos e medalhas, e então usaram o humor e a sátira sátira.
A história que contaram falava da cobiça dos povos, da exploração dos índios e
negros, da depredação de nossas riquezas. Vejamos como Oswald de Andrade
contou sua “História pátria”:

Lá vai uma barquinha carregada de


aventureiros
Lá vai uma barquinha carregada de
bacharéis
Lá vai uma barquinha carregada de
cruzes de cristo...

Essas barquinhas eram as caravelas da colonização portuguesa, escrevendo


a nossa história. Uma história de altos e baixos, aventura e violência, amor e ódio.
Mas repare como essa história era contada agora com humor e criatividade! Esse
era o estilo dos modernistas.

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Desenho de
Cícero Dias para
o livro Macunaíma.

Em 1928, Mário de Andrade publicou Macunaíma, cujo personagem-


título era a cara do Brasil. Macunaíma nasceu índio, depois virou negro e depois
branco. Essa era a imagem do nosso país na sua diversidade de culturas.
Macunaíma sobrevoou o país num pássaro chamado tuiuiú. Ele viu o país
lá do alto. Viu como as regiões são diferentes, mas viu também que são essas
diferenças que fazem o Brasil.
Mário de Andrade mostrava que nós não somos completamente brancos,
nem completamente negros, nem completamente índios. Somos um povo em
formação. Com muito mais perguntas do que respostas...
Mas os escritores modernistas não pensavam sempre igual. Dentro do
movimento existia um grupo chamado Verde Amarelo, ao qual pertencia o
escritor Cassiano Ricardo. Na mesma época em que Mário de Andrade escreveu
Macunaíma, Cassiano Ricardo escreveu Martim Cererê. O personagem-título era
agora um herói bem comportado, sério e patriota. Você se lembra do nacionalis-
mo de Olavo Bilac? Pois Martim Cererê era uma espécie de soldado sempre
defendendo as nossas fronteiras. Ele não olhava do alto, como Macunaíma.
O que estamos querendo mostrar é como o modernismo iria construir
diferentes visões da nacionalidade. Alguns viam o país como uma interrogação,
um desafio. Já outros preferiam vê-lo como realidade pronta a ser louvada em
versos. Mas, apesar dessas diferenças, o modernismo teve um saldo muito
positivo: mostrou como era importante pensar a nossa cultura e ousar novas
formas de expressão.

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O jeito rebelde que caracteriza a maior parte dos artistas modernistas é uma Em
A Utempo
L A
marca da nossa cultura. Ela reaparece na década de 1970 com o movimento
tropicalista.
Também na música de Raul Seixas vemos essa atitude de indagação: 24
Eu prefiro ser essa metamorfose ambulante
do que ter aquela velha opinião formada sobre tudo...

Essa foi uma das propostas do modernismo: acabar com as velhas opiniões
sobre o Brasil, sobre a nossa cultura. Ser moderno era estar a par das inovações
artísticas e intelectuais. Mas ser moderno era, sobretudo, absorver essas informa-
ções de forma criativa e crítica.
A cultura exprime o jeito de ser de cada nacionalidade. Ela não está só nos
livros, mas nas cirandas, vaquejadas, marujadas; está no vatapá, tacacá, arroz de
cuxá; nas histórias de botos encantados, da mula sem cabeça, do Saci Pererê. Interpretação
sociológica quer
Também são cultura o casario colonial, as igrejas barrocas e as carrancas do rio
dizer interpretação
São Francisco...
mais fiel às
O que o modernismo mostrou é que a cultura não está apenas nas grandes características de
cidades, mas nas várias regiões brasileiras. Na década de 1930, o modernismo uma sociedade.
tomou grande impulso no Nordeste. Foi o movimento do regionalismo literário
literário.
Os romances de Jorge Amado falam da Bahia, José Lins do Rego descreve os
engenhos de açúcar; Graciliano Ramos conta a vida de Alagoas, Érico Veríssimo
a do Rio Grande do Sul. Já em Pernambuco é Gilberto Freyre quem busca uma
nova interpretação sociológica para a cultura brasileira. Esse movimento deu
origem a uma nova imagem do Brasil.

Na década de 1920, os nossos artistas e intelectuais estavam construindo Pausa


uma nova imagem do Brasil. Nessa imagem, eles mostraram que o Brasil se
caracterizava por muitas culturas.
Dê uma olhada no texto e responda: que cara ou que caras você acha que o
Brasil deve ter? Brasil-Pierrô? Brasil-Macunaíma? Brasil-Cererê? Brasil-cara-
pintada?
Explique por que você escolheu uma dessas caras como expressão do país.

Nesta aula, vimos como as mudanças ocasionadas pela Primeira Guerra Últimas
Mundial afetaram culturalmente o nosso país. Vimos também como os nossos palavras
artistas e intelectuais construíram uma nova imagem do Brasil, de acordo com
os tempos modernos.
Mas os efeitos da guerra não pararam por aí. Em 1929, a crise econômica
mundial gerou uma onda de desemprego nos campos e fábricas. O governo
republicano caiu no descrédito popular.
É dessa crise política que vamos falar na nossa próxima aula...

Exercício 1 Exercícios
Explique a frase de Lima Barreto: “O intelectual brasileiro anda, come,
dorme e sonha em Paris”.

Exercício 2
Identifique uma proposta do movimento modernista.

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