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2 As nossas sugestões
wook temos 22 de A a W
Carlos Vaz Marques
na estante
6 Especial
Prémio Nobel 24 Entrevista exclusiva
Monja Coen
da Literatura
8 Leituras de outono
Vire a página 30 Guia infantojuvenil
Livros que piscam
com livros o olho ao Pai Natal
18 Centenário
Sophia 32 Poema
«Ode aos livros que
e Jorge de Sena não posso comprar»
PROPRIEDADE Porto Editora S.A. DIREÇÃO Luís Morais RESPONSÁVEL PELO PROJETO Ana Chaves
COLABORAM NESTE NÚMERO António Vale, Matilde Vieira, Pedro Ribeiro, Sandra Reis, Sara Santos Silva e Vanessa Pereira
CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO Rosália Teixeira, Graciete Teixeira, Vasco Teixeira, José António Teixeira SEDE DE ADMINISTRAÇÃO E REDAÇÃO Rua da Restauração, 365; 4099-023 Porto
IMPRESSÃO Bloco Gráfico – Unidade Industrial da Maia Via Doutor Vasco Teixeira, 370; 4470-498 Maia NIPC 500 221 103 PERIODICIDADE Trimestral
TIRAGEM 20 000 exemplares CONTACTO wookacontece@wook.pt
Registo da ERC n.º 127305 O estatuto editorial da revista Wookacontece está disponível em wook.pt
wookacontece • outono
wook temos
Aos 77 anos, e no ano em que ce-
lebra 40 anos de vida literária, An-
tónio Lobo Antunes, presença habi-
tual na rentrée, apresenta um novo
Não ficção
Estamos no outono, mas já parece Natal. A Planeta editou Vigilância Massiva,
Na altura do ano em que mais livros dão Registo Permanente, de Edward
Snowden, a história na primeira pes-
à estampa, mostramos-lhe algumas soa do jovem espião que colocou
das novidades literárias que as editoras em xeque a diplomacia internacio-
nal, e a Objectiva publica Um Futuro
apresentaram no último trimestre. Livre e Radioso, de Paul Mason, que
nos mostra uma perspetiva profu-
samente otimista e promissora do
setembro
futuro e nos deixa a questão: «Que-
Pela Dom Quixote saiu o último livro remos ser controlados? Ou quere-
de Afonso Reis Cabral, o jovem es- mos algo melhor?»
critor agraciado com o Prémio José Para encontrar respostas e bons
Ficção Saramago 2019. Leva-me Contigo
é um diário de viagem sobre a
conselhos, procure este título: A Sa-
bedoria da Transformação, o último
Para começar em beleza a tempo- aventura de percorrer a pé a maior livro da inspiradora figura budista
rada, a Porto Editora apresentou estrada de Portugal, a mítica Estra- Monja Coen (entrevista exclusiva na
dois grandes títulos: Milkman, obra da Nacional 2. página 24 desta revista).
magnífica de Anna Burns que ven-
ceu o prestigiado The Man Booker A Bertrand publicou Lisboa, Chão
Prize 2018, e Lá, Onde o Vento
Chora, romance de estreia da nor-
Sagrado, de Ana Bárbara Pedrosa
(fixe este nome, ainda vai ouvir falar
Infantojuvenil
te-americana Delia Owens que con- muito dele), que é uma das boas No mundo dos sonhos, a Minotauro
quistou leitores por todo o mundo. novidades da literatura portuguesa: editou O Elefante com o Coração na
um romance pungente e visceral Lua, de Marlene Ferraz, e as Edições
que não vai conseguir parar de ler. ASA, um livro que narra as aventuras
de um avô muito especial – Paul Mc-
Cartney – e os seus netos: Ei, Avozão!
Poesia
A Dom Quixote reuniu Os Sonetos
de Manuel Alegre e Nuno Júdice e
brindou-nos com O Coro da Desor-
dem.
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3
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novembro
mente acutilante e humano.
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5
ESPECIAL Em dose
Prémio Nobel da Literatura dupla
A fisionomia Com um interregno
de um ano, após os
de um prémio
escândalos sexuais
que envolveram
membros do júri, a Real
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A Alegria de Viver O Caminho
Yongey Mingyur Rinpoche Menos Percorrido
M. Scott Peck
Um livro que não se resume a
práticas budistas, mas antes a uma «A vida é difícil.» Esta é a primeira
forma de encarar a vida com uma frase do livro e é para ser lida com
certa leveza para encontrar o espírito construtivo, no sentido em
próprio caminho. que o sofrimento traz dor, mas
Nas palavras de Daniel Goleman, também traz em si a possibilidade
autor de Inteligência Emocional, de crescimento interior. Deixe-se
«[…] esta obra é um guia prático, guiar em direção a uma nova forma
um manual para tornar a vida de serenidade e plenitude na vida.
O outono marca o início melhor. E essa viagem começa
do tempo frio e oferece-nos, onde quer que estejamos, ao
mais do que qualquer outra darmos o primeiro passo.»
estação do ano, a
oportunidade de renovação.
Quando foi a última vez que parou Erling Kagge explora a caminhada Sabia que o riso pode aliviar
e respirou fundo? O yoga é uma como uma arte de viver sem a tensão física e libertar endorfina,
prática milenar com a qual pressa na era da velocidade. Se por uma substância química que gera
aprenderá a relaxar a mente e o um lado a prática da caminhada a sensação de bem-estar
corpo com o propósito de alcançar nos traz os usuais benefícios e relaxamento? Nada como
a calma e a plenitude em diversas físicos, por outro lado permite-nos transformar problemas em risadas
vertentes da sua vida. Ponha-se abstrair das dificuldades do dia de amor-próprio. Um livro cheio
em forma e recupere o equilíbrio. a dia e contemplar o mundo com de amor, humor e ironia, com
Mais do que ter flexibilidade uma nova perspetiva. Um passo ilustrações muito criativas.
corporal encontre uma sensação de cada vez.
de bem-estar duradoura.
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José
Luís
Entrevista
Peixot «Sem
dificuldades
não existe
realização»
Uma Autobiografia que é um
romance, uma obra de ficção
plena de realidade.
s
preguiçosos, José Luís Peixoto
apresenta-nos um jovem escriba
e um escritor consagrado
– José e Saramago – e serve-nos
de bandeja possivelmente o seu
melhor romance até à data.
José Luís Peixoto, Galveias, Portalegre, Alto Alentejo, o espaço onde se desenrola o meu último romance –
1974. «Portugal é o instante exato em que nasci.» Autobiografia.
Queres explicar esta frase?
Quando escrevi esse poema em que falava sobre Como é que acontece a transição de professor
Portugal, no fundo, aquilo que eu queria referir era do ensino secundário para escritor?
a questão da relação identitária com o país e aquilo Durante grande parte do meu tempo de estudante,
que, para mim, é o significado desse país, que é sempre achei que ia ser professor.
indissociável de mim próprio. A minha cultura sou eu; A minha irmã mais velha é professora, tem 13 anos
o meu país é a minha cultura. Penso na minha família, a mais do que eu, e ela era o meu modelo de vida.
penso nas minhas origens. Penso naquilo que me Eu achava qua ia seguir esse caminho e estava
constitui e que eu não consigo, de maneira nenhuma, contente com isso. Na verdade, fui professor apenas
separar de mim. durante quatro anos, mas foi uma experiência muito
cativante. Quando surgiu a oportunidade de viver da
Galveias faz parte de um interior do país esquecido, escrita, algo que eu nunca tinha considerado, decidi
deprimido, envelhecido. Nunca foi entendido como um tentar esse caminho, e aí não houve regresso.
lugar onde as oportunidades não surgem? A escrita tornou-se cada vez mais presente na minha
Galveias é um lugar deste país. Para mim, é muito vida, e isso fez com que a escola passasse a ser um
importante dizer isso, porque, uma vez que escrevi um lugar onde eu continue a ir, mas enquanto escritor.
romance com esse título, às vezes, pode haver a Vou lá para desassossegar os alunos, provocá-los um
tentação de se pensar que é apenas uma abstração, pouco, falar de leitura e literatura de uma forma que eu
mas não. Enquanto estamos aqui, existem pessoas pretendo que seja sempre irreverente… e, depois, no
nessas ruas, e isso é fundamental. Mas efetivamente dia seguinte, volto para a minha vida.
vivemos num país muito centralizado, o que, a meu ver,
não tem qualquer razão de ser. Somos um país com Dizias, há pouco, que não foi possível voltar atrás
uma superfície não tão grande assim para que também porque foste o mais jovem escritor de sempre
tenhamos estas fronteiras invisíveis a separar as a receber o Prémio Saramago. Tinhas 27 anos.
oportunidades que existem nas grandes cidades e no Recordas-te desse dia?
litoral de uma forma tão vincada em relação àquelas Quando recebi o Prémio José Saramago, mudou tudo.
que não existem no interior. Espero que essa seja uma Estava a viver um momento muito especial.
memória distante daqui a algum tempo e que Tinha publicado o meu primeiro romance
consigamos ter uma visão equilibrada do território – Nenhum Olhar –, depois de ter passado um período
– e que Galveias continue a prosperar. longo à procura de editora, sem resultados, e também
publiquei aquele que é efetivamente o meu o primeiro
A caminho de Lisboa, o que é que ficou para trás? livro, que se chama Morreste-me, em edição de autor.
Como muitas outras pessoas, fui estudar no ensino Quando recebi o Prémio Literário José Saramago,
superior numa grande cidade, neste caso, em Lisboa, houve uma espécie de explosão no que diz respeito
e a partir daí a minha vida tem-se desenvolvido à curiosidade que um número alargado de pessoas
justamente à volta de Lisboa, embora tenha vivido sentiu em relação àquilo que eu escrevia.
alguns anos em Coimbra e alguns em Cabo Verde. Tive um número maior de leitores e surgiram várias
Há muitas coisas que ficam nesse caminho, mas oportunidades no estrangeiro para tradução de livros
prefiro olhar para certos aspetos que ganhei. meus. Mudou tudo. Foi aí que comecei a viver
Até em relação ao meu passado, ganhei uma certa da escrita, e o caminho fez-se até àquilo que é hoje.
distância que me permitiu escrever sobre ele.
Comecei a escrever sobre a minha infância e as Falaste do processo de encontrares uma editora
minhas origens geográficas justamente quando deixei que te quisesse publicar. Recentemente, ouvi um
de viver lá e percebi a importância efetiva que tinham podcast no Expresso em que a Maria do Rosário
na minha vida e na pessoa que sou. Por outro lado, Pedreira, que foi a editora que te lançou, afirmava
Lisboa é uma cidade que também me diz muito – e que a literatura portuguesa está num mau momento.
um sinal disso é até o facto de a ter chamado para ser
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«Quando recebi
o Prémio José
Saramago,
mudou tudo»
Qual é a tua opinião sobre isso?
É muito difícil ter uma opinião valorativa sobre
a literatura portuguesa no exato momento em que
a estamos a viver. A literatura precisa de um tempo
para que nos distanciemos de certas questões do
momento, que têm muita importância agora, mas não
sabemos como as iremos ver no futuro. Ainda assim,
a forma como eu olho para a literatura portuguesa
contemporânea é encontrando uma diversidade
enorme, e isso é um sinal de riqueza. É claro que
tenho as minhas opiniões, até porque eu escrevo livros,
e uma parte da ambição dos meus livros
é comunicar com esse panorama, acrescentando-lhe
alguma coisa. Sinto que na prosa e na poesia estamos
a viver um momento que, para já, me parece bastante
estimulante.
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Estás a falar da boa literatura e dos teus pares, e eu com questões ligadas à identidade do narrador,
estava a perguntar-te pelos livros, na sua globalidade, seja sob o ponto de vista prático, no que se refere
que são publicados em Portugal… à vida dos escritores, à forma como eles lidam com
[risos] Falar de livros é falar de muita coisa. Há livros o texto ou como as suas vidas são vividas.
com muitas características, e eu não tenho capacidade
para acompanhar sequer todo o mundo editorial Podias ter escolhido outro escritor que não Saramago?
português. Há três ou quatro autores que eu vou Podia ter escolhido, mas dificilmente teria escolhido
acompanhando e, por vezes, aventuro-me em alguns outro escritor com um lugar semelhante àquele que
nomes que nunca ouvi. Às vezes, tenho boas Saramago tem, não só no que diz respeito à literatura
surpresas, outras nem tanto. portuguesa contemporânea, como figura tutelar que
deixou uma marca impossível de negar, mas também
Lembras-te de alguma boa surpresa recente? na presença que teve na minha vida com o Prémio
Há vários casos. Por exemplo, o da Djaimilia Saramago. Tive contacto com Saramago a partir desse
[Pereira de Almeida], que é fabuloso. É uma autora momento – portanto, desde 2001 até 2010 –, e isso
de que seguramente iremos ouvir falar sempre que também me forneceu matéria-prima para eu criar esta
ela publique, porque é uma voz que se vê que tem imagem, que é uma imagem ficcional naquilo que lhe
segurança. Ou o Bruno Vieira Amaral, que é é mais essencial, mas que dialoga muito diretamente
um autor já muito reconhecido. com os aspetos documentais dessa vida – com a obra,
com os factos que aconteceram – e com um aspeto
Quais são as características que um livro deve ter subjetivo, ainda assim suficientemente objetivo, que é a
para que o aprecies? minha memória e as minhas avaliações dos momentos
A primeira característica que um livro, no caso, um livro em que tive oportunidade de privar com ele.
de literatura, tem de ter para que o considere sequer
competente é a coerência interna. Tem de ser E se Saramago ainda fosse vivo, terias escrito
consequente na história, na construção das este livro?
personagens, na linguagem. Os diversos elementos A primeira vez que pensei nisso tive logo a tentação de
têm de manter essa coerência. Depois, tem de ter dizer que não. Mas, pensando melhor, cheguei à
aqueles rasgos que me surpreendam, e que podem conclusão que talvez o pudesse ter feito.
também acontecer em qualquer um desses níveis, seja Em primeiro lugar, talvez não o fizesse por respeito
com a construção das personagens, a estrutura da e devido a uma certa distância que eu mantinha para
narrativa, a linguagem, a ousadia de tratar certos temas com José Saramago. Quando o conheci, era um autor
que acrescente alguma coisa que eu nunca tenha visto, que já tinha ganhado o Prémio Nobel e que já passava
que me faça saber algo que eu não sabia antes. dos 80 anos, com toda uma obra e uma presença que
era um pouco intimidante para mim. Por outro lado,
Isso é algo que nós, leitores, sentimos com este sempre tive dele uma grande consciência das regras
teu novo livro, Autobiografia, que é, na verdade, do trabalho literário, no sentido em que, se havia
um romance em que transformas Saramago numa alguém que verdadeiramente compreendia aquilo que
personagem. Como é que surgiu esta ideia, se propõe neste livro, seguramente seria José
esta ousadia? Saramago, na medida em que a proposta deste livro
A primeira ideia para escrever este livro foi justamente é essencialmente literária.
a de ter Saramago como personagem. Quando surgiu, Não posso saber se teria escrito o livro na presença
era ainda bastante vaga, mas teve de se tornar de José Saramago, mas, agora que está escrito, fico
concreta para poder edificar o romance à volta desse muito satisfeito por o ter feito.
conceito. E, claro, depois, foram surgindo novas ideias,
novas questões, atualmente tão importantes como
essa para aquilo que é realmente o livro, como seja
o facto de se tratar de um livro que anda à volta de
questões ligadas com a própria escrita, com a leitura,
seja sob o ponto de vista verdadeiramente literário,
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Referes muitas vezes que Saramago te dizia para que se coloque um propósito e que esse propósito dê
olhares para a tua obra. Tens como hábito trabalho e exija sacrifício, e que se consiga lá chegar.
confrontar-te sobre o que fizeste, com o que fazes? Aquilo a que se chama o bloqueio criativo, assim de
Chegas a alguma conclusão? uma forma mais estereotipada, eu tento ultrapassar
Sempre tive essa consciência de obra – até uma fase através de uma série de estratégias, porque afinal
em que não existia obra e eu estava a ser muito também já tenho muita experiência.
otimista e ambicioso de mais ao já colocar as coisas
nesse pé. Mas eu sempre sonhei com essa construção. Pois tens. Aliás, tu moves-te com sucesso em
E hoje, que estou prestes a fazer 20 anos desde a diferentes géneros literários: romance, poesia, crónicas,
publicação do meu primeiro livro, já sinto que existe infantojuvenil. Quando começas a escrever, já sabes
alguma coisa construída, porque aquilo que escrevi, o que vai sair?
embora mantenha uma certa diversidade, também Tento sempre definir alguns aspetos essenciais do livro,
tem uma série de linhas que realmente são os temas nomeadamente, o enredo. Normalmente, sei o que irá
acerca dos quais eu tenho alguma coisa para dizer e, acontecer até ao final, porque também preciso de
por motivos difíceis de explicar, aqueles que mais começar a preparar o final logo no início. O futuro já
me tocam. está aqui. Nós é que não somos capazes de distinguir,
Quando escrevo um novo livro, parece-me mas, daqui a dez anos, quando olharmos para este
efetivamente diferente de tudo aquilo que eu já escrevi, momento, perceberemos que muitas das coisas que
mas, depois, à medida que vai avançando, vou vão acontecer já estavam aqui em potência. Isso é
encontrando todas as linhas e vou percebendo que também o que tem de acontecer às personagens de
todas essas obsessões, no fundo, são questões para as um livro. O futuro delas já tem de estar de alguma
quais eu ainda não encontrei uma resposta e, por isso, forma presente ou possível no início. Ainda assim, o
continuo a insistir nelas. caminho da escrita deixa muito espaço para se
encontrarem elementos que são do momento.
Este bloqueio criativo, em que está submerso o jovem A escrita, as palavras, a linguagem… em certos
literato José, é algo que te aconteça com frequência? aspetos, é muito bom que exista espontaneidade;
Toda a gente tem de lidar com o bloqueio criativo. muitas vezes surpreendo-me a mim próprio quando
Essas dificuldades são o que todos necessitamos de escrevo.
ultrapassar para depois alcançarmos a realização.
Sem dificuldades não existe realização. Quando não Qual foi o último livro que leste e recomendas?
existe, há que duvidar e há que procurar. Uma leitura intensa e exigente que terminei há alguns
Essa superação é que vai trazer aquela indicação de meses: um livro do Salman Rushdie, que se chama
que se conseguiu chegar a algum lugar. Os Filhos da Meia-Noite.
No fundo, é isso que a escrita de um livro exige:
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Gran de s l iv ros
«Augustus» é o mais premiado Dois mestres da espionagem.
romance do autor do bestseller Dois bestsellers. Da realidade
internacional «Stoner». à ficção, não faltarão descobertas.
Finalmente em português
O Verdadeiro Mestre
um dos mais icónicos
do thriller nórdico.
romances de Roth.
O esplendor
das coisas
visíveis
Há 100 anos, no Porto, nascia
Sophia de Mello Breyner
Andresen. De ascendência
dinamarquesa pelo lado
paterno, criada no seio
de uma família aristocrata,
mulher de silêncio, olhos grandes
e azuis pousados insistentemente
na contemplação de tudo
quanto a rodeava.
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Jorge
A figura do engenheiro que se dedicava às letras,
a frontalidade, a ironia mordaz e a forma implacável
como condenava, nas suas próprias palavras,
«a mediocridade, a estupidez, a vileza, a malignidade,
de Sena
a incultura», não foram alheias à forma muitas vezes
amargurada com que Sena se referiu a um país que
nunca soube realmente reconhecer o seu génio.
Como ficcionista, Jorge de Sena foi autor de obras
marcantes como O Físico Prodigioso (1977) ou Sinais
«uma extraordinária de Fogo (1979); como tradutor, deu a conhecer obras
de autores tão importantes como Faulkner, Emily
Passados 100 anos sobre o nascimento de Jorge «Penso que o sentimento poético está
de Sena, um olhar atento sobre a sua obra revela sempre por detrás de tudo o que escrevo.
não só o seu lugar único na literatura portuguesa Por isso considero-me realmente um poeta,
do século XX mas, sobretudo, a figura do homem mesmo quando escrevo estudos eruditos.»
de letras na verdadeira aceção da palavra. À vida
e à obra de Sena poder-se-ia acrescentar como Desde o seu primeiro livro Peregrinação, publicado
epígrafe o célebre verso-sentença de Ricardo Reis: em 1942, a poesia de Sena assume-se como uma
«Para ser grande, sê inteiro». poesia comprometida com o mundo. Não com escolas
Poeta, ficcionista, crítico, tradutor, ensaísta, professor, ou correntes poéticas, que sempre recusou, mas com
poucos autores se terão desdobrado com tamanho ideais maiores como a liberdade ou a justiça. Ainda
mérito em tantos papéis. que o poeta escreva, como no poema Tentações
Estar perante Jorge de Sena é estar diante de um do Apocalipse, que «não é de poesia que precisa
escritor prodigioso e multifacetado, mas também o mundo», a verdade é que é o mesmo Sena
de um homem singular, marcado pela condição a defender num prefácio à sua obra que «à poesia,
do ser estrangeiro em toda a parte. melhor que a qualquer outra forma de comunicação,
Nascido em Lisboa em 1919, Sena ingressa na cabe, mais que compreender o mundo, transformá-lo.»
Escola Naval, mas acaba por cursar Engenharia Civil
na Universidade do Porto. Depois trabalha como A propósito de um dos seus volumes de poesia,
engenheiro até 1959, ano em que, por razões Sophia de Mello Breyner, amiga de longa data, fez
políticas, parte para o Brasil, onde se naturaliza, faz notar «uma grandeza que é estilo, precisão, exatidão,
o doutoramento em letras e inicia uma carreira força, construção e mais ainda testemunho, olhar
de professor universitário. olhando de frente, inteireza, coragem.»
Daí sairá, depois do golpe de estado de 1964, para
os Estados Unidos, onde dará aulas, primeiro no Poderíamos dizer o mesmo do escritor. Da obra
Wisconsin, depois em Santa Barbara, na Califórnia, de Sena emerge a figura de um homem íntegro que
onde permanece até à sua morte em 1978. nos continua a dar, 100 anos depois, um testemunho
Esta itinerância não faz mais do que sublinhar valioso de Humanidade. Segundo o poeta:
um certo isolamento dentro das letras portuguesas, «Não me arrependo de ter tido essas palavras.
como o próprio autor sublinha numa entrevista: Tive-as, não as tenho mais, elas me têm a mim.»
«Fui sempre um exilado, mesmo antes de sair
de Portugal, em 1959».
* Sophia de Mello Breyner Andresen em carta a Jorge de Sena,
20 de março de 1961.
20
Um thriller de cortar a respiração
Do autor de
O Silêncio
Dos Inocentes
JÁ DISPONÍVEL!
de Tinha o ficheiro
a no computador
«e ia acrescentando,
cortando, substituindo,
a um ritmo que podia
prolongar-se
indefinidamente»,
começa por dizer
no e-mail de resposta.
«Quis fazer uma
enumeração caótica,
borgesiana, em que
não houvesse um
padrão definido.»
A
Ainda não é o fim nem
o princípio do mundo; calma,
é apenas um pouco tarde ¶
Carlos Vaz
B
Beckett, Beethoven,
Marques
Benfica – nem sempre
por esta ordem ¶
C
Comer bem ¶
K
Kafka e o riso de Kafka ¶
S
«Só sei que nada sei» ¶
D
Dirijo-me apenas às coisas
L
Lisboa ¶
T
Ter tempo
que me excitam / é o supremo luxo ¶
M
Positivamente e me levam a
U
fazer outras coisas, dirijo-me /
Às pessoas de que gosto,
nunca às de que não gosto ¶ Mahler, Miles, Metheny;
música, incluindo a que não Um só, como explicou
E
começa por M ¶ o Sr. Whitman, pode
ser uma multidão ¶
O W
Fernando António Nogueira
Caeiro de Campos Reis
Soares Pessoa ¶
Olhai os lírios do campo ¶ Wikipedia e Google
G
e o privilégio do acesso
P
imediato a toda a memória
do mundo ¶
Gatos ¶
Prosa sempre, poesia sempre
H
que possível ¶
Hoje é o dia ¶
Q
I
Querer não é poder ¶
A ideia: o convidado deve
R
percorrer as letras de A a W
Inquietação, inquietação ¶ (de WOOK) e dizer… o que
bem entender.
O desafio: a ausência
J
Rejeitar a nostalgia ¶ de amarras criativas;
a criatividade.
O resultado: sempre uma
«Je est un autre» ¶ incógnita.
23
Monja
Coen
wookacontece • outono
25
wookacontece • outono
entrevista
«A meditação não cura E quando você trabalha e vive para um bem maior do
que o seu individual, do egoico, do pequeno, você vive
nem ansiedade nem em plenitude. Enquanto eu quero tirar vantagens das
coisas e penso muito o que é bom para mim, eu estou
depressão, mas ela nos perdendo oportunidade de pensar o que é bom
para nós.
aponta um caminho.»
Nas suas palestras, tem abordado os temas da
ansiedade e depressão, que são já consideradas as
doenças do século. A meditação ajuda até que ponto?
A meditação não cura nem ansiedade nem depressão,
Para mim, de repente, eu fiz a comunhão entre os mas ela nos aponta um caminho. Ela faz com que
dois. E foi nesse dia que minha mãe me telefonou do a pessoa perceba o que está acontecendo e saiba lidar
Brasil, eu estava nos Estados Unidos, em Los Angeles, melhor. Então, a pessoa muito ansiosa, ela não vai
e disse: Minha filha, eu entendo, você estará servindo deixar de ser tão ansiosa, talvez fique um pouco menos,
a quem eu chamo de Deus. Seja qual for a tradição mas vai perceber a hora em que a ansiedade vem
espiritual a que vá, é a Deus que estará servindo e como lidar com ela, e a chave-mestra é a respiração
e eu a abençoo. Então, com a bênção de minha mãe, consciente. Perceba que, em toda a ansiedade,
eu pude me tornar monja. a respiração vai ficando mais alta e mais rápida.
Se você trabalha com essa chave de ouro, que é
Que recordações guarda da sua infância? a respiração consciente, pode baixar o nível da
Tem boas e más. As nossas infâncias não são só ansiedade para poder resolver suas questões.
prazeres: têm alegrias, contentamentos, descobertas, A Espanha, recentemente, teve o que se chama a gota
o maravilhamento pela existência... Mas também tem fria, que foi a grande depressão. Nunca haviam usado
coisas mais difíceis: perder os dentes não é fácil! esta palavra, depressão, para questões climáticas, mas
Trocar os dentes, escola, muitas vezes, repreensões... veja que é semelhante à nossa mente. Quando vêm
Todo o processo educacional na infância é tão questões climáticas é muito aguaceiro, não é? Então,
agradável quanto também desagradável. o que acontece? É muito choro, muito pranto, muito
desencontro, e nós podemos ser levados por esta água
Há um capítulo neste livro com o título das nossas tristezas, daquilo que vem e destrói os
«O que se move?» cuja resposta é «a nossa mente». nossos sonhos, as nossas expectativas, as nossas
O que a move a si? casas, o nosso trabalho. E é um pouco isto, mas nós
A vida me move. Nós todos somos movimento não ficamos lá. Assim como nenhum país fica quando
e transformação. Nenhum de nós está parado; há inundações; passada a inundação, reconstruímos.
a diferença é quando você percebe isto. Todo o nosso E há pessoas que não, elas ficam naquele estado:
corpo é uma renovação constante de células. Nada Nossa, foi tudo destruído, o que eu sonhei, o que eu
para nem por um instante. Somos a vida da Terra, esperava, a vida ficou branca e preta, não tenho mais
estamos girando junto com o planeta, em torno de si nada. Quando não temos mais nada, estamos abertos
mesmo e em torno do Sol. Não dá uma parada nem a ter tudo e a recomeçar e a ressignificar a existência.
vai para trás. Então, o movimento é contínuo, sempre Eu trabalho muito com isso de dizer: o sofrimento é
em transformação e para a frente. opcional. A dor existe, a perda existe, temos que
Quando nós percebemos isso, podemos fluir com atravessar os lutos das perdas, quer sejam de pessoas
o fluir da vida. É o autoconhecimento que transcende que nós amamos, que vão embora, quer seja dos
o eu menor. O Freud vai chamar de ego. Nós podemos nossos sonhos e expectativas. Atravessamos e nos
chamá-lo de eu menor. Sem ele, nós não comemos, renovamos, e isso é o mais importante, o ressignificar
não nos vestimos, não nos banhamos e não tomamos a existência.
decisões. Mas é preciso perceber que existe alguma
coisa maior do que isto.
26
wookacontece • outono
Acredita que é possível treinarmos a nossa mente tem jeito, a vida é sofrimento e dor, não podemos
no sentido de vermos só coisas boas? sair daqui, é um vale de lágrimas, como dizia a minha
Não, não queremos ver só coisas boas. A nossa mente avozinha! E não é, ela tem lágrimas, mas tem
tem que ser capaz de ver tudo. Os nossos ouvidos sorrisos também.
ouvem todos os sons: ruídos e sons harmoniosos.
As nossas narinas sentem todos os odores e a boca Outro assunto a que dá ênfase no seu livro é
todos os paladares e os olhos tudo veem. A diferença a importância de parar. De nos sabermos ouvir.
é que eu vejo e compreendo. Há uma analogia de que Que conselhos daria a um leigo interessado
gosto muito de um monge vietnamita, Thich, em que na prática budista para iniciar o seu caminho?
ele diz o seguinte: as pessoas preferem ver a flor e Qual seria o primeiro passo?
sentir a fragância de uma flor e têm repulsa pelo lixo; O primeiro passo é sentar-se ou deitar-se, se não
mas se esquecem que a flor murchará e estará no lixo, poder se sentar, numa posição correta, alongamento
e o lixo que você tanto rejeita vai ser o húmus fértil dos da coluna vertical, ombros para trás e para baixo e
alimentos que vai comer. vamos trabalhar com respiração consciente.
Olhar em profundidade não significa que só quero ver Geralmente, colocamos as mãos no que chamamos
o que é bonito e belo. Eu vejo tudo o que acontece. o mudra cósmicos, a mão direita em baixo, a esquerda
Como uma câmara, ela filma tudo, a luz e a sombra, em cima e os polegares se tocam bem de leve – faz
mas nós podemos depois escolher as imagens que uma elipse, que são os planetas em torno do Sol.
queremos desenvolver em nós. A mídia, por exemplo, Estamos nos cosmos e o cosmos está em nossas
pelo menos no Brasil, dá muita ênfase a tudo o que mãos. Serve também como um termómetro, para você
é criminoso, pecaminoso, destruidor, e se nós ficarmos perceber como está. Quem estiver com muita
sendo bombardeados por informações prejudiciais fraqueza, pouca energia vital, o que acontece?
o tempo todo, nossa mente fica assustada, somos A mão cai. E quem estiver com muita tensão,
sensíveis e vamos ficar com medo, vamos ficar com a mão fica dura. Você pode se alinhar, perceber como
ansiedades e depressões. Tem que ver um pouco está e aí trabalhamos com respiração consciente.
também da maneira que as informações chegam A inspiração é passiva, o ar apenas entra
até nós. Então, o que é que importante? Saber filtrar. e a expiração é ativa. Fazemos isso algumas vezes,
A quem interessa essa informação? Quais são os grupos umas duas, três, e depois ficamos em silêncio.
que estão interessados em passar para a Humanidade Os olhos pousados no chão, observando, estando
esse tipo de informação? Porque outras coisas lindas presente onde está, sentindo o corpo que se move
estão acontecendo e, muitas vezes, não se dá com a inspiração, a expiração, percebendo o
prioridade àquilo que é bom, benéfico e saudável. movimento mental, pensamentos, emoções,
É preciso manter esse equilíbrio. Mas os olhos tudo sentimentos e tudo faz parte, não há nada a ser jogado
têm de ver. Temos de perceber tudo e entender. fora, mas apenas silenciar e observar. Até que há um
ponto em que não há mais observado e observador,
Porque é que acha que isso acontece, a nossa você se torna e se percebe a vida da terra,
tendência para focarmos mais vezes no mau interconectada a tudo e a todos.
do que no bom?
A nossa tendência de nos cuidarmos faz com que Quantas vezes pratica meditação no seu dia a dia?
demos bastante atenção ao que possa ser prejudicial. Não é a questão de quantas vezes, é mais a qualidade
Não é porque nós tenhamos uma mente malévola do que a quantidade. Cada um de nós deve saber os
nem depressiva, mas exatamente aquilo que pode seus momentos. É recomendado logo ao acordar,
causar mal ao ser humano é que nos chama mais à antes de tomar café da manhã. Ir ao banho, lavar-se e
atenção, que é uma espécie a dizer: cuidado, preste sentar-se em algum lugar confortável. Pode ser numa
atenção! Isto pode ser perigoso para você, para a cadeira, pode ser numa almofada, com as perninhas
Humanidade. Então, essa ênfase que se dá naquilo cruzadas, e para quem estiver doente, pode ser na
que não é benéfico tem um sentido de cuidado, mas cama, desde que não durma; por isso nós procuramos
se nós não percebermos que existem caminhos de manter os olhos entreabertos, porque às vezes
libertação, nós ficamos aprisionados, dizendo não fechamos os olhos e começamos a imaginar coisas.
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wookacontece • outono
entrevista
VÍDEO
Veja esta entrevista.
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Guia de leitura infantojuvenil 1-5 anos
365 Histórias
Livros que
para Dormir
Noite após noite, uma
nova história para embalar
o sono. Contos que
piscam o olho
transformam a hora
de ir dormir num
momento único.
Histórias
Histórias Viradas
do Avesso
Sónia Morais Santos
Cinquenta histórias em
que não faltam leões cor-
-de-rosa e madrastas que
afinal são boas, entre
outras travessuras. Para ler
sem pressas, como todas
as boas histórias para
crianças.
O Meu Coração
Corinna Luyken
Com ilustrações e palavras
delicadas, este livro leva os
leitores a pensarem no seu
próprio coração e na
importância do amor
por si e pelos outros.
wookacontece • outono
A Lagartinha Muito
Comilona – O meu livro
pop-up
Eric Carle
O ciclo vital de uma lagarta ganha
vida a cada página, numa arquitetura
tridimensional.
O Diário de um Banana
Contos Clássicos De-mo-li-ção
pop-up – Branca de Neve Jeff Kinney
e Os Sete Anões Sozinho em Casa Não é fácil ser criança.
Susanna Davidson Kim Smith E ninguém sabe isso melhor
A narrativa da Branca de Neve O clássico do cinema é agora do que o Greg.
e os Sete Anões numa nova um livro ilustrado para toda a família O regresso do herói improvável
dimensão e com mais graciosidade. – cheio de ladrões desastrados, e divertido, como sempre.
Um conto clássico para desfrutar armadilhas e um rapaz chamado
uma e outra vez. Kevin que se vê sozinho em casa. Caderno (da Natureza)
do Bicho do Mato
Um Conto de Natal Diana de Oliveira
Geronimo Stilton Um guia para explorar e
A obra clássica de Charles Dickens experimentar a Natureza com
livremente adaptada por Geronimo técnicas essenciais, como construir
Stilton. Será o Natal uma perda um abrigo ou decifrar códigos.
de tempo? Tudo para um verdadeiro explorador!
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Sena, um rio de palavras.
Assinalamos o centenário do seu nascimento com um
dos poemas mais bonitos de toda a literatura portuguesa.
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