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Andréa Borges Leão

FAZER DO VELHO UMA NOVIDADE:

DOSSIÊ
as reinvenções dos best-sellers juvenis1

Andréa Borges Leão*

O artigo organiza um debate sobre a produção literária juvenil associada à venda massiva. Tem o duplo ob-
jetivo de conceituar os best-sellers e traçar as linhas históricas de conexão da produção contemporânea com
a presença do livro europeu e americano na edição brasileira, desde o século XIX. A formação de um espaço
literário nacional foi marcada pela importação de clássicos do patrimônio literário mundial, romances de
viagem e de aventura, narrativas sentimentais e contos de fadas orientados pela circulação transatlântica da
oferta e do consumo massivo. Os critérios estabelecidos para a análise da obra seriada da escritora Thalita
Rebouças, que hoje objetiva o fenômeno best-seller nacional, embasam o argumento de que o livro juvenil,
quando pego na lógica da circulação mundial da cultura, lança mão de um retorno temático ao passado,
reinventando-se ao fazer do velho sempre uma novidade.
Palavras-chave: Best-sellers juvenis. Circulação transnacional da cultura. Série literária. Autoria literária.

INTRODUÇÃO: os fluxos transna-


1 cisivo na luta pela constituição e autonomia
cionais da cultura nacional de um espaço para o livro infantil e juvenil.
Monteiro Lobato, Orígenes Lessa e toda a gera-
Já publiquei sete livros em Portugal e, em 2012, se ção de escritores surgida nos anos 1970 e 1980,
tudo correr bem, meus livros serão editados em ou- a exemplo de Ruth Rocha, Ana Maria Macha-
tros países da Europa e na América Latina. Depois do, Ziraldo, Marina Colasanti, entre outros,
de tantos anos correndo atrás, atingi um milhão (!!) foram importantes artífices desse movimento.
de livros vendidos em 2011. Mas eu ainda quero
Só assim os caminhos seriam pavimentados
mais, muito mais. Thalita Rebouças
para o amadurecimento do gênero e a profis-
Até a década de 1980, os escritores, edi- sionalização do trabalho literário. Hoje, os in-

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tores e estudiosos da literatura juvenil brasi- fantojuvenis − recriados muito mais como um
leira buscavam articular um projeto nacional gênero da edição do que da literatura – são as
comum alicerçado nas diferenças regionais.2 melhores vendas das editoras, além de objetos
Não se pode desconhecer que os esforços na de políticas públicas, apostas e investimentos
busca de uma marca nacional como marca comerciais em traduções para o mercado mun-
identitária correspondiam a um momento de- dial. Os produtores já não se movem mais em
1 função das disputas simbólicas em torno do li-
2 vro nacional. As oposições entre o nacional e o
*
Universidade Federal do Ceará – UFC. Departamento de
Ciências Sociais. Programa de Pós-Graduação em Sociologia. importado, o popular e o canônico, perderam
Av. da Universidade, 2995. Cep: 60.020-181. Benfica – For- forças ou, ao menos, foram levadas a se redefi-
taleza – Ceará – Brasil. aborgesleao@gmail.com
1
Devo essa expressão a Jean-Marc Gouanvic, que a publi- nir, e a presença das traduções se impõe como
cou no texto “Traduire/adapter les classiques de la littéra-
ture ‘populaire’ américaine en français, ou de l’art de faire modelo, não provocando mais tanto conflito e
‘du neuf avec du vieux’”. In: Sapiro, Gisèle (sous la direc- tensão3 (Fundação…, [20--]).
tion). Les Contradictions de la Globalisation Éditoriale.
2
Note-se que, no Brasil, os estudos críticos da literatura 3
A Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil (FNLIJ),
infantil e juvenil são tardios e dispersos. Marco inicial é importante instância de mediação crítica, promove con-
o livro de Leonardo Arroyo, Literatura Infantil Brasileira, cursos e atribui selos de qualidade e excelência literária
publicado Melhoramentos em 1968. aos livros produzidos no Brasil. Sua atuação em prol da

http://dx.doi.org/10.1590/S0103-49792016000300004 463
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Desde o século XIX, a formação de um traçar as linhas de suas conexões, na história


espaço literário nacional foi marcada pela im- da edição juvenil brasileira, com a presença
portação de clássicos do patrimônio universal, do livro europeu. Nos dias que correm, cada
romances de viagem e de aventura, narrativas vez mais os produtores se orientam por uma
sentimentais e contos de fadas europeus orien- concepção de campo literário em escala inter-
tados pela circulação transatlântica da oferta nacional, sobretudo face à intensificação das
de países como França, Portugal e Inglaterra, trocas decorrentes da concentração de grupos
e pelo consumo massivo incrementado pelos editoriais. Pode-se afirmar que a circulação
novos leitores das ex-colônias americanas. transnacional dos livros e impressos publica-
Por sua vez, os escritores brasileiros também dos na Europa é um traço comum entre a atua-
cruzaram fronteiras. A obra de José Mauro de lidade e o passado.
Vasconcelos, autor do best-seller O Meu Pé de No segundo tempo da discussão, a obra
Laranja Lima, publicado em 1968, abre um seriada da escritora Thalita Rebouças, que
profícuo debate sobre a dimensão transatlân- objetiva o fenômeno best-seller, é situada nas
tica do que se constrói como ficção no plano diferenças e continuidades das estratégias,
local, além de reequilibrar os termos da opo- alvos de conquista e trajetórias para a profis-
sição entre sucesso comercial e legitimidade sionalização literária. A autora de sucesso, que
literária. Em 1978, a editora francesa Stock bateu a casa do milhão na venda de exempla-
forma a coleção de livros de bolso Mon bel or- res5 (Thalita, [20--]), circula desenvolta entre
anger com as traduções dos romances de Vas- os mundos da literatura, do teatro, do cinema,
concelos, que conhecem um sucesso absoluto4 da televisão, do futebol e do carnaval, inven-
(Avignon off, 2015). A não equivalência lin- tando uma posição literária de fronteira, como
guística e as forças desiguais implicadas nas forma de aquisição de valor. Observando suas
trocas e empréstimos entre espaços literários estratégias de aquisição de valor e afirmação
nacionais, a exemplo das que organizam, ainda de visibilidade, pode-se dizer que as frontei-
hoje, a carreira internacional do escritor brasi- ras do campo literário são reposicionadas. Os
leiro na França, permitem observar processos critérios metodológicos estabelecidos para a
de formação literária em constituição nos dois análise embasam o argumento de que os li-
países. Não se pode perder de vista, no entan- vros best-sellers, pegos na lógica da circulação
to, que as circulações dos livros no mercado mundial da cultura, lançam mão de um retor-
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mundial de bens simbólicos são fortemente no temático ao passado, reinventando-se ao fa-


assimétricas, como lembram Sapiro, Pacouret zerem do velho uma novidade. O trabalho dos
e Picaud (2015), com a tendência à hegemonia agentes da circulação do livro, vinculados ou
do mercado norte-americano, em geral, e o de não ao mundo oficial – agentes literários, tra-
língua inglesa, em particular. dutores, livreiros, editores, diretores de cole-
Neste ensaio, formulo o duplo objetivo ção, professores − ganha protagonismo, assim
de conceituar os best-sellers contemporâneos e como a balança de trocas e apropriações entre
as mais diversas línguas nacionais. A relação
formação da leitura literária a leva a conhecer uma parte dessa produção ficcional com as instâncias de
dos livros publicados no Brasil. Esses conflitos e tensões,
no entanto, aparecem em algumas diretrizes e tomadas de legitimidade e mediações da literatura também
posição da FNLIJ.
se redefine. Tudo leva a crer que os escritores
4
Sobre o percurso longevo e atual da obra de José Mauro
de Vasconcelos na França, gostaria de destacar a adapta- em posição best-seller tendem a dispensar os
ção de O Meu Pé de Laranja Lima, traduzido como Mon
Bel Oranger, para o teatro juvenil de marionetes, em 2015, mediadores que portam competências intelec-
da companhia de teatro para jovens Théâtre De La Courte tuais específicas, caso da crítica especializada.
Échelle. Sobre a apresentação festival “Avignon off 2015”.
Disponível em: https://compagnieaffable.wordpress.
com/2015/05/29/le-programme-du-festival-davignon-off- 5
Thalita Rebouças atinge a marca de 1 milhão de livros
2015-est-en-ligne/. vendidos em 2011, com a série Fala Sério.

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Outro ponto de deslocamento relaciona- QUANDO OS BESTS TORNAM-SE


do ao precedente concerne ao público de leito- LONG-SELLERS
res. Situados em blogs na esfera digital, agru-
pados ou individualmente, os jovens leitores Um livro best-seller destinado a jovens
de best-sellers são chamados a exercer funções leitores pode transforma-se em long-seller, ou
críticas, são autorizados e autorizam-se a in- até em clássico, adquirindo estabilidade pelo
terpretar e a comentar as narrativas a partir de êxito das vendas, a depender do teor do que
suas próprias categorias de julgamento estético se configura como legitimidade, leia-se visibi-
em formação, uma vez que as fronteiras entre lidade pela repetição do consumo, conquista-
o mundo do livro, o mundo do autor e seus do pelo texto e pelo autor face aos leitores-fãs
próprios mundos se esgarçam a cada novo lan- (Heinich, 2012). Por isso, a questão mais im-
çamento, a cada nova postagem dos editores portante para a definição do livro best-seller
nas redes sociais, a cada nova aparição pública não pode ser reduzida ao êxito comercial. O
de escritores celebridades. prestígio literário que reveste ou não uma obra
Valérie Beaudouin (2012) argumenta não e a figura do autor é o critério fundamental
se tratar propriamente da dispensa ou supres- na classificação desse gênero do impresso. Os
são de mediadores especializados, mas de uma índices de prestígio são alcançados pelo reco-
redefinição nas formas de mediação e julga- nhecimento do público massivo e, em decor-
mento, quando autores, sobretudo os que atu- rência, emergem novas exigências de origina-
am nos espaços de escrita da web, inscrevem lidade e singularidade, tanto no texto escrito
os leitores − e até seus próprios pares − nos como no estatuto da autoria literária. Nesse
territórios da crítica profissional. Para esta auto- caso, os prêmios das instituições literárias
ra, fica difícil uma simples projeção do campo e os selos de indicações de usos nas escolas
literário, tal como definiu Bourdieu (1996), no são atributos apenas complementares de reco-
espaço digital de produção da escrita. nhecimento. Não que os best-sellers juvenis
Se toda cultura nacional é um mundo sejam livros publicamente condenáveis. Sim-
de conexões históricas transnacionais, o es- plesmente inexistem em certos espaços de me-
tudo dos best-sellers contemporâneos juvenis diações críticas porque são desconsiderados
requer cronologia mais alargada. Os elos com a como ficção literária. Uma pergunta se impõe:
tradição literária, convocados por uma sociolo- a que se deve o silêncio histórico dos estudio-

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gia processual da circulação simbólica (Elias, sos, mediadores tão importantes nas classifica-
1994), que privilegia operações lógicas e afe- ções da ficção juvenil?
tivas nas construções de repertórios de textos As melhores vendas apresentadas perio-
separados no tempo e no espaço, organiza met- dicamente nas listas dos infantojuvenis publi-
odologicamente a reflexão. Para estudar a lite- cadas na grande imprensa e sites especializa-
ratura juvenil na perspectiva das conexões his- dos não delimitariam as obras, sob o ângulo de
tóricas, é preciso ir além da parte mais visível e análise da sociologia, a uma classificação me-
atual do mercado: o dinamismo e as inovações ramente comercial, sobretudo porque dizem
dos produtores, que sabem tirar proveito da respeito à preferência de milhares de leitores.
moda inaugurada pela série de sucesso Harry Uma autora na posição best-seller, situada nas
Potter, de J. K. Rowling. É preciso introduzir fronteiras entre diversos setores da produção
uma reflexão sobre as transferências, trocas cultural, depende da conquista de visibilidade
e empréstimos culturais efetivados no longo midiática proporcionada pelas estratégias de
prazo. publicidade dos grupos editoriais representa-
dos por suas obras. Mas, fundamentalmente,
depende da cumplicidade dos leitores. Por

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isso, os best-sellers são saudados, para ficar parte se destina à compra e distribuição pelo
com a observação de Letourneux (2010), como governo federal e pelos governos estaduais, a
signos do retorno dos jovens às práticas de lei- exemplo do Programa Nacional do Livro Didá-
tura6 (Casa…, [20--]). Desse modo, conquistam tico (PNLD), e do Programa Nacional Biblioteca
respeitabilidade, ao menos no que concerne da Escola (PNBE). Não se pode perder de vista,
à educação do gosto de leitores massivos, en- nesta discussão, que as escolhas das agências
quanto seus autores vão perdendo posição aos não poderiam ser aleatórias, uma vez que são
olhos e julgamentos dos que falam em nome guiadas por comissões de especialistas.
das convenções canônicas da literatura, sen- Ao invés da pura e simples condenação
do postos no lugar de educadores, formadores dos best-sellers como gêneros menores, de es-
pela via do entretenimento. critas ligeiras e mecânicas, um caminho possí-
Do ponto de vista da crítica literária, o vel seria inseri-los nos regimes de historicida-
termo best-seller, observa Silvia Borelli (1996, de nos quais adquirem sentido, o que permite
p. 139), “preenche certo número de critérios e compreender tanto seus sucessos e suas rela-
requisitos que o separam da literatura culta e ções com as instituições de consagração e do-
erudita”. A classificação editorial, por sua vez, minação simbólica como a crítica literária que
priorizaria critérios quantitativos, encarando os condena. O importante, sugere Jean-Yves
o livro como mercadoria sujeita às regras do Mollier (2003), é indagar a história dos suces-
mercado, com “muito pouca, ou quase nenhu- sos literários do ponto de vista dos produtores
ma, densidade literária”, observa a socióloga. e dos leitores: o que se lê em determinados
Os elementos da linguagem e da narrativa só períodos, quais são os usos dos livros na vida
seriam levados em conta quando úteis para cotidiana (distração, instrução, passatempo) e
atrair o grande público, quer dizer, para me- se os best-sellers são fontes de distinção ou de
diar a relação de compra e venda do produto. O estigmatização para quem os lê ou possui.
best-seller, sob esse ângulo, não passaria de um Deslocada em relação ao que se pode-
livro de melhor venda, oferecido a um mercado ria chamar longevo paradigma Monteiro Lo-
homogêneo e sem rumo, como se não impor- bato – ainda em uso para definir o escritor de
tassem os agentes mediadores e as instituições excelência, que representa, a um só tempo, o
culturais que orientam as escolhas − as livra- moderno e a nação –, a geração de escritoras
rias, as editoras e as escolas − ou os projetos teen, composta por Thalita Rebouças, Paula
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intelectuais que visam a garantir a qualidade Pimenta, Patrícia Barboza, Babi Dewet, Bruna
dos produtos no mercado. Nessa linha de racio- Vieira, entre outras, é produto da internacio-
cínio, o mercado seria constituído apenas pela nalização da cultura. As trajetórias dessas jo-
comercialização do livro “procurado e selecio- vens mulheres cristalizam o investimento da
nado por livre escolha”, continua a socióloga edição juvenil brasileira no mercado latino-
(Borelli, 1996, p. 140). As listas dos best-sellers americano e europeu. E as consequências são
seriam montadas exclusivamente a partir dos ainda maiores. Se Thalita Rebouças passa a ser
dados de vendas que dispensam as mediações editada em Portugal, fecha contratos com edi-
de especialistas. Ora, quando consultamos as toras espanholas e italianas8 (Pimenta, 2010), e
listas dos livros infantojuvenis produzidos no Paula Pimenta segue em direção aos países de
país7 (Publish…, 2001), constatamos que boa língua espanhola e inglesa, pode-se vislumbrar
6
Ver trechos de entrevistas publicadas no site da escritora a constituição de comunidades transnaciona-
Thalita Rebouças, que ela sugestivamente nomeia de “casa is de leitores (em inglês, espanhol, italiano e
virtual”. Disponível em: http://thalita-reboucas.blogspot.
com.br/2009/01/que-cena-mae.html. português), aproximando, por exempo, os tra-
7
Foram consultadas, entre os anos de 2013 e 2015, as seguin-
tes fontes: jornal Folha de São Paulo, revista Veja e site Pu- 8
Matéria publicada na revista eletrônica Educar para
blishnews. Disponível em: http://www.publishnews.com.br Crescer, da Editora Abril, reproduzida da Veja Rio.

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balhos de Paula Pimenta aos da norte-amer- A vocação exportadora da edição euro-


icana Meg Cabot, só para ficar no gênero que peia, francesa e inglesa e, em consequência,
mistura romances de sensibilidade do século o intenso movimento das trocas culturais ini-
XVIII, no estilo da inglesa Jane Austen, com re- ciado pela circulação internacional das obras
criações dos contos de fadas de Charles Perrault no século XIX, ocupam o centro das atenções
e até das fábulas morais dos irmãos Grimm. As dos estudiosos da formação cultural brasileira.
trocas entre os românticos Diário da Princesa As influências, imitações, assimilações ou de-
(primeiro volume da coleção de Meg Cabot) e pendências da cultura brasileira em relação à
o Livro das Princesas (em que colaboram com presença do produto europeu e americano ain-
capítulos Meg Cabot, Paula Pimenta, Lauren da hoje animam as discussões e pontuam as
Kate e Patrícia Barboza), publicado na coleção agendas dos pensadores sociais.9
Galera Record, da editora Record, supõem a Se vistas por outro ângulo, percebe-se
aproximação no gosto, na preferência e na com- que as importações de livros populares fran-
petência, entre categorias nacionais de leitores. ceses, portugueses e ingleses, na sociedade
Essa pode ser uma revolução simbólica, opera- brasileira do século XIX, permitiram decisiva
da pelas novas mulheres de letras, confirmando transferência de capital literário, formas nar-
a hipótese de que, na lógica da formação dos rativas e uma estrutura de aprendizagem a ser
espaços mundiais, as novidades se fazem com adaptada por escritores que destinavam suas
a circulação de velhas fórmulas. Uma das es- obras a um incipiente público juvenil, a exem-
tratégias da internacionalização da cultura, não plo de Figueiredo Pimentel, Júlia Lopes de Al-
se pode desconsiderar, é a extensão dos espaços meida, Olavo Bilac, Coelho Neto, Viriato Cor-
da recepção, lembra Gisele Sapiro (2013). rea e Paulo Barreto, o João do Rio (Leão, 2012).
Do ponto de vista dos nexos transnacio- No caso específico do Brasil, o que poderia ser
nais, as autoras best-sellers, que transbordam um projeto de colonização cultural, de pura e
as próprias obras e circulam pelas fronteiras simples imposição de modelos, imagens e bens
das produções culturais nacionais, inauguran- de consumo, permitiu o acúmulo de capital
do um novo sistema de autoria, apresentam-se, simbólico necessário à autonomia da literatu-
sobretudo, como elásticas. É importante desta- ra nacional. Importador de artefatos culturais
car, na dinâmica das circulações, a emergência desde fins do século XIX e por todo o século
de autores elásticos, que permitem, com maior XX e, agora, no XXI, o Brasil assume um lugar

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facilidade, as transferências entre tradições na circulação mundial dos bens simbólicos, de
culturais. Os autores de grande elasticidade ou tal modo que os horizontes de expectativas do
de grande alcance tornam-se estratégicos por leitorado, que se ampliaram ainda nos tempos
transmitirem valores morais sumários, normas do Império, lançam as bases para o que viria a
de conduta estabelecidas, e mobilizarem um ser um público de massa.
repertório de sentimentos e emoções previsí- Os livreiros estrangeiros que imigraram
veis, complementa Pierre Bourdieu (2009). Se para o Rio de Janeiro a partir de 1850, os ir-
as obras preferidas do público não costumam mãos Garnier, os Aillaud, Garroux, Briquiet e
alimentar projeto de nação, tampouco costu- Laurrane, investiram no trabalho de difusão de
mam fixar temporalidades, tanto no que toca textos europeus clássicos, já de largo sucesso
aos enredos, que podem se passar em qualquer comercial em seus países de origem, apostan-
época, quanto no que diz respeito às suas car- do na durabilidade de diversos gêneros, ven-
reiras editoriais de longa duração. Permanecem dendo, editando e reeditando, por longos anos,
por meses e até por anos nas listas dos mais 9
Gilberto Freyre consagra a esse assunto boa parte da dis-
vendidos, acabando por se tornarem long-sell- cussão do segundo livro da sua trilogia sobre a formação
da sociedade brasileira, Sobrados e mucambos. Consultar:
ers. Vejamos como isso foi possível, no Brasil. Leão, Andréa Borges, 2014.

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romances para a juventude, a obra de escrito- polos,11 que podem ou não coincidir sem ser
res de sucesso, como os franceses Jules Verne obrigatoriamente excludentes.
e Sophie de Ségur, uma vasta literatura de via- Ora, uma obra, quando circula de um país
gens inglesas, todas as variações do Robinson ou continente a outro, adverte Pierre Bourdieu
Crusoé, dos contos de Perrault, dos irmãos (2009), leva consigo o campo de sua produção.
Grimm e das viagens de Gulliver. Anos após, As transferências entre espaços nacionais se fa-
empresas nacionais, como as editoras Melho- zem por meio de uma série de operações entre
ramentos, Globo e Edições de Ouro, seguem a agentes sociais, a exemplo da seleção do que me-
mesma linha e estratégia, publicando clássicos rece ser traduzido e publicado e dos que reúnem
como Pinóquio, Alice no País das Maravilhas e competência e legitimidade para verter os textos
O Pequeno Príncipe, elenca Laurence Hallewel, de uma tradição linguística a outra. Tais opera-
em O livro no Brasil (2012). Tudo indica que a ções de leitura estão baseadas em categorias de
contingência das trocas e empréstimos no vasto percepção e problemáticas próprias a um campo
espaço transatlântico prosseguiu na formação nacional específico. O trabalho da tradução atri-
de uma indústria cultural e ainda se faz notar bui novos sentidos aos textos. Na lógica das es-
nas reinvenções do século XXI. Assim, torna-se colhas, as afinidades de gosto de linhas editoriais
evidente que um dos princípios da formação da e títulos podem ser explicadas por homologia de
esfera literária juvenil brasileira são as incorpo- posições entre campos nacionais. As tramas de
rações de traduções e adaptações dos clássicos imposição simbólica ditadas pelas altas posições
universais. Vale observar que a categoria uni- de escritores e editoras não reconhecem frontei-
versal diz respeito aos conteúdos morais das ras, podendo se tornar um dos pontos de con-
narrativas, fazendo com que suas aplicações vergência entre as esferas nacionais e uma das
práticas sejam um complemento da leitura. propriedades do que se poderia chamar de es-
No primeiro momento, a criação de um paços transnacionais de circulação literária. Por
circuito de importação de obras estrangeiras exemplo, gigantes e potentes grupos editoriais
causou reação adversa. A principal delas foi empreendem negócios e fusões com os grupos
o movimento de formação de um mercado de brasileiros já estabelecidos no mercado.
obras populares nacionais, escritas, impressas Por outro lado, as estratégias de anexação
e comercializadas no país, protagonizado pe- de obras traduzidas ao repertório das coleções
los livreiros-editores Pedro da Silva Quaresma e séries juvenis brasileiras têm como objetivo
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e Francisco Alves de Oliveira, no final do sé- nacionalizar os produtos estrangeiros. A cir-


culo XIX e início do século XX.10 O livro Para culação de modelos literários acaba por firmar
Crianças, uma categoria criada para formar pactos de leitura que auxiliam a compreensão
coleções populares e baratas, assumiu o proje- do sucesso local de aventuras que se passam
to de simbolizar a nação. Não se pode afirmar no Egito antigo, das fantasias medievais com a
que toda e qualquer produção ampliada seja explosão da magia de fadas, elfos e anões em
situada nas margens do sistema literário, con- J. R. R. Tolkien, autor de Senhor dos Anéis, das
duzindo ao descarte metodológico das duali- tramas de Harry Potter, de J. R. Rowling, da no-
dades entre os domínios do popular e do não vidade dos velhos diários na série Diário de um
popular, aí incluindo os bens produzidos em Banana, de Jeff Kinney, das atualizações da mi-
larga escala e que criam ou atendem públicos tologia greco-romana nas traduções de Rick Ri-
ampliados. Uma sociologia dos processos de ordan, entre outros universos e tempos médios
circulação acaba enfrentando o modelo da di-
visão de uma mesma esfera literária em dois
11
No livro As regras da Arte: gênese e estrutura do campo
literário (1996), Pierre Bourdieu estuda a dinâmica da vida
literária francesa de meado do século XIX. As adaptações,
10
Consultar: Leão, Andréa Borges. Brasil em Imaginação: usos e abusos que se fazem para as mais diversas esferas
livros, impressos e leituras infantis (1890-1915), 2012. literárias nacionais escapam ao projeto do sociólogo.

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vividos por guerreiros, príncipes e princesas, “Não, meninas, não conheço absolutamente
anões e dragões. Não por acaso, o livro Peque- ninguém do mundinho fashion. Melhor procu-
no Príncipe, do francês Antoine Saint-Exupéry, rar agências de modelos no Google. Boa sorte!”.
publicado em 1943, é um dos mais traduzidos Para quem ocupa uma posição de fronteira en-
no Brasil e vem ocupando posição de destaque tre os espaços da produção simbólica e não
nas listas dos tops nacionais. Da safra dos best- estabelece interlocução com os mediadores
sellers destaca-se o já citado Meu pé de Laranja especializados, a atenção do público é atraída
Lima, de José Mauro de Vasconcelos, publicado mais pela distribuição massiva de sua imagem,
em 1968 e hoje traduzido em 52 línguas, o que que modula opiniões e dicas de escrita, obser-
aponta para o movimento de internacionaliza- va Nathalie Heinich (2012), do que pelas obras
ção dos produtos nacionais. Mais recentemen- publicadas. A conversa epistolar entre a autora
te, o mesmo tem acontecido com os sucessos de e seus leitores, via internet, não poderia girar
Thalita Rebouças, Fala sério, na editora Rocco, em torno de estética, simplesmente porque os
a partir de 2003, e de Paula Pimenta, Fazendo o jovens estão ainda sendo formados em litera-
meu Filme, lançado pela Gutenberg a partir de tura em escolas que talvez nem os preparem
2008. O que é efetivamente necessário compre- para o trabalho crítico. Para um autor, o que
ender é que as publicações em séries criam um importa, continua a socióloga, no regime de vi-
amplo e cativo mercado receptivo em torno de sibilidade contemporânea, não é propriamente
heróis e heroínas recorrentes e estão longe de a assinatura do nome, mas o rosto e o corpo
significar apenas obras mecânicas e apressadas. tornados visíveis em grande escala. O mundo
Situando a posição best-seller de Thalita dos livros pode levar às passarelas, já que am-
Rebouças na longa história da publicação dos bos são parte do mesmo universo fashion cons-
gêneros contos de fadas e romances popula- truído pelo mundo da autora. Vejamos a seguir.
res sentimentais, fica evidente a permanência Ser uma fada pop, emancipada e cons-
de velhos modelos literários em um universo ciente de suas emoções, sem coações externas
cada vez mais orientado pela circulação trans- para realizar magias, necessitando apenas da
nacional de bens simbólicos, sob o domínio boa leitura de um manual, corresponde ao
acelerado da concentração de grupos editoriais horizonte de expectativas de uma leitora-mo-
e de grandes redes de livrarias. delo. É o que expressa a personagem do livro
Uma Fada veio me visitar. Publicado pela edi-

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tora Rocco, na coleção Jovens Leitores, o livro
THALITA REBOUÇAS, AUTORIA E conta a aventura de uma fada de 857 anos, um
FRONTEIRAS DA PRODUÇÃO ser atemporal que atualiza a moda da década
SIMBÓLICA de 60 em pleno ano de 2007. Tatu, a fada, sur-
ge em um apartamento da zona sul do Rio de
Na sessão “Perguntas e Respostas” da Janeiro com a missão de ajudar a adolescente
“casa virtual” de Thalita Rebouças, o site ofi- Luna a dar uma lição de moral na orgulhosa
cial da escritora, entre várias cartas de leitores Lara, que vê sua rica família desmoronar com
perguntando como conseguir a primeira edi- a prisão da irmã, Milena, acusada de partici-
tora e como tornar-se escritor, além dos pedi- par de roubos de obras de arte no exterior. A
dos de leitura de originais, aparece uma garota moral é a de que não se deve julgar os outros
perguntando como fazer para entrar no mundo pela aparência. Milena caiu no golpe por ter
da moda: “Você pode me ajudar a virar mo-
delo?”12 (Rebouças, [20--]). Thalita responde: da obra ou estudo biográfico da escritora, o caminho possí-
vel foi recorrer a essa fonte. Tomei todo o cuidado para não
cair nas armadilhas da produtora do site, a própria autora,
12
As notas e passagens biográficas de Thalita Rebouças fo- na construção de sua autoimagem. Data de Acesso: 18 de
ram tomadas do site. Como não existe uma fortuna crítica março de 2016.

469
FAZER DO VELHO UMA NOVIDADE ...

acreditado na conversa de um grupo de ban- séries são descritas como um sintoma do triun-
didos que a convidou para uma festa num fo da industrialização da cultura. Em Fala Sé-
castelo. Eternamente jovem, aparentando ter rio!, iniciada em 2004, no selo Rocco Jovens
20 anos, a fada Tatu frequenta academia, vê o Leitores, cada episódio da vida da personagem
oprograma “Fadástico” aos domingos, flutua e Maria de Lourdes, a Malu, corresponde a um
reaparece, nos capítulos finais, à moda antiga: volume. O leitor acompanha o aprendizado da
com uma estrela lilás “carimbada na boche- heroína na seguinte ordem de relações: Fala
cha”. A mesma estrela que traz a autora na foto Sério, Mãe!, Fala Sério, Pai!, Fala Sério, Filha!,
que ilustra a orelha do livro, embaraçando o Fala Sério, Amor!, Fala sério, Amiga!, Fala Sé-
mundo da ficção e a vida de Thalita Rebouças. rio, professor!.
Essas aproximações entre os dois mundos con- No blog da autora, o público é chama-
tribuem para a seguinte estratégia de profis- do a intervir nos textos ainda não publicados
sionalização do autor best-seller: a busca de no suporte impresso, comentando as tramas
engajamento e cumplicidade do leitor para o precedentes, enviando sugestões para os pró-
exercício de uma função crítica singular, a de ximos episódios e para a construção de novos
comentador nos blogs e redes sociais. Outra personagens. Forma-se um triângulo amoroso
estratégia de afirmação da autoridade literária entre autor, leitor e personagem. Além de co-
é o encontro com o público nos blocos de car- mentadores, os leitores inspiram a elaboração
naval, em torcidas de futebol e séries de tele- de novos enredos. Uma visita à “casa virtual”
visão, espaços de reconhecineto de Thalita Re- acaba fidelizando-os.
bouças. O episódio da série Fala Sério!, Fala Em função dos e-mails recebidos após as
Sério, Mãe!, composto de crônicas humoradas, visitas, o que traduz o nível de prestígio alcan-
foi adaptado para o seriado As Brasileiras, da çado, Thalita resolve oferecer um curso online
Rede Globo, com o nome de A Mãe da Barra. sobre “como iniciar uma carreira de escritor”,13
Thalita assinou o roteiro e atuou como atriz. conferindo a si mesma a legitimidade para fa-
Jornalista de formação, a carioca Thalita lar em nome do que é e de como praticar a lite-
Teixeira Rebouças é a única filha de pai den- ratura. No compartimento Quem sou da casa,
tista e mãe dona de casa. Cursou a faculdade Thalita propõe o seu lugar no sistema de fron-
de direito por dois anos, antes de entrar para teira simbólica da autoria, onde se lê:
o curso de jornalismo, onde se titulou. Partici-
Caderno CRH, Salvador, v. 29, n. 78, p. 463-476, Set./Dez. 2016

Sou fofa. Pelo menos é o que dizem as boas línguas.


pou da Oficina de Atores da Rede Globo, uma Nasci no dia 10 de novembro de 1974, sou cario-
porta de entrada na emissora, e iniciou a car- quésima (daquelas que louvam o Rio e agradecem
reira de jornalista no jornal Gazeta Mercantil. diariamente por ser de uma cidade tão linda e es-
Na autorrepresentação oferecida na sua casa pecial), empolgada, teimosa, escorpiana, portelen-
virtual, vê-se a imagem de uma mulher em- se, Fluminensesesê!, abracenta, sorridente, chata à
beça na TPM, chorona (do tipo ridícula, choro até
preendedora que tem o projeto intelectual de
vendo comercial de detergente), alucinada por sam-
divertir e cativar os fãs, com a marca do humor bas e marchinhas de Carnaval, louca por brigadeiro
e da ironia, praticando a crônica como “roman- (para comer de colher) e adrenalina − já saltei de
ces em pílulas”, aproximando seus livros das pára-quedas e asa-delta algumas vezes − e viciada
séries de sucesso da televisão. em algumas séries de TV (Friends, Seinfeld, Sex and
A publicação seriada define uma litera- The City, Big Bang Theory e Brothers and Sisters são
minhas preferidas) (Thalita..., 2016).
tura em sequencia (em pílulas), cuja função é
atrair o leitor com dramas e aventuras de per- A vontade de escrever, declara, nasceu
sonagens recorrentes em vários episódios de da paixão material pelos impressos. Aos 10
uma mesma e longa narrativa. A depender da
ocasião, adverte Letourneux (2010, p. 91), as 13
Disponível em: http://www.iedb.com.br/.

470
Andréa Borges Leão

anos, sonhava em ser “fazedora de livros”. De- ra não se restringiria ao mundo da escrita. A
pois de corrigir os textos, preocupava-se com partir daí, começa um trabalho independente
os mínimos detalhes da produção − desenha- de divulgação do livro. Dispensou intermediá-
va, encadernava, grampeava a capa e as fo- rios como mais tarde dispensaria as mediaçãos
lhas. Com esses ingredientes autobiográficos, críticas, e saiu batendo nas portas das grandes
conquista um lugar de inserção ou paixão na redes de livrarias para anunciá-lo, como um
cultura literária juvenil e vai preparando, via caixeiro viajante ou um vendedor de enciclo-
internet, a recepção de sua obra. pédias. Não tardou para que a experiência da
A carreira literária de Thalita Rebouças escritora pop star se transformasse em ficção.
começou mesmo em 2001, na Bienal do Livro Em março de 2003, assina contrato com a edi-
do Rio de Janeiro, em frente ao estande de sua tora Rocco para a publicação do seu primeiro
primeira editora, Ao Livro Técnico. Foi assim, best-seller, Tudo por um Pop Star. Esse livro
narra a escritora: conta as aventuras de três amigas da cidade
de Resende, Manu, Gabi e Ritinha. O trio parte
Vários autores consagrados estavam presentes, como
eu poderia competir com eles? Meu Traição entre
em busca dos ídolos de uma banda internaci-
amigas era apenas mais um livro naquele universo nal que está vindo ao Rio de Janeiro fazer um
de títulos disponíveis na Bienal. O estande da minha show, no estádio do Maracanã. O cantor pop
editora, apesar de bonitinho e bem localizado, era um Júnior Lima assina um texto de apresentação
entre muitos espalhados em dois imensos pavilhões aos leitores, que provavelmente fazem parte da
do Riocentro. Se eu quisesse vender livros teria que
mesma comunidade de fãs de suas canções.
inventar uma forma de chamar atenção, de aparecer,
de me destacar e rápido (Thalita..., 2016).
O universo cor-de-rosa das meninas pop
sugere, como hipótese, a filiação atualizada
Nessa tarde, lembrou do tempo em que da escritora carioca aos romances populares
fazia teatro e começou “a bater palmas, a brin- e sentimentais da série Rosa da coleção Har-
car com quem passava na frente do estande e lequin, que publicava, nos anos 40 e 50 do
a anunciar o livro em altos brados, como um século XX, histórias açucaradas conhecidas
vendedor empolgado com o seu produto”. Co- como “romances para moças”. Esses romances
merciante dela mesma, Thalita Rebouças pre- formavam a sensibilidade das leitoras numa
para uma cena literária fora da literatura, dan- linha de continuidade à recepção feminina de
do um rosto a um nome que começaria a circu- histórias românticas no século XIX. Tudo sem

Caderno CRH, Salvador, v. 29, n. 78, p. 463-476, Set./Dez. 2016


lar. O problema por vir seria, lembra Heinich perder o frescor. As interdependências entre
(2012, p. 159), converter o reconhecimento do o novo e o velho indicam que uma etapa de
grande público em valor literário. No relato da formação da esfera literária juvenil contém,
atuação, fica evidente o cuidado especial com simultaneamente, sua antecedência e suces-
a didatização de uma imagem que se voltaria são. Norbert Elias (1998) descortinaria, nesses
para o público juvenil: “logo juntou gente ao processos, tendências de civilização que orien-
meu redor, rindo e escutando, e o livro come- tariam estruturas de aprendizagem. A obra de
çou a vender como água no deserto”. Ao mes- Thalita Rebouças conduz a sua interpretação,
mo tempo em que recupera a “arte das vovós” retrospectivamente, como uma assimilação
contadoras de histórias e transmissoras orais, dos diversos gêneros da literatura popular,
animando rodas de leitores, encarnava outras desde os contos de fadas, os romances-folhe-
figuras populares, os mágicos e os comercian- tins do século XIX, os clássicos universais tra-
tes de feiras, tornando a Bienal um espaço de duzidos e toda a produção destinada ao grande
construção da autoria, como se ela mesma es- público que marcou a indústria editorial e a
crevesse um prefácio elogioso a seu livro. Para cultura de massa no Brasil.
Thalita Rebouças, a indentidade de uma auto- Para Daniel Compère (2011), o romance

471
FAZER DO VELHO UMA NOVIDADE ...

popular nasce no ano de 1836, com o apare- Do mesmo modo, a coletânea de contos
cimento do romance-folhetim publicado em O livro das princesas – Novos contos de fadas,
capítulos nos jornais franceses. Gênero menor publicada pela Galera, do Grupo Editorial Re-
diante da poesia e do teatro, o romance popular cord, em 2013, e na qual colabora a escritora
voltava-se para a satisfação das expectativas de Paula Pimenta, deve muito aos compiladores
novos leitores que emergiam com o progresso dos contos populares de fins do século XVII,
da alfabetização, as mulheres, os jovens e os em especial a Charles Perrault. O livro, que
trabalhadores. É amplamente difundido graças já nasceu duplamente clássico e best-seller, e
ao jornal, um meio acessível a todos. Do pon- deve muito à posteridade e às transformações
to de vista dos estudos literários, o romance do gênero.
popular inicia a sua carreira por uma não re- Uma chave de compreensão da carrei-
cepção, quer dizer, pela exclusão do repertório ra de Thalita Rebouças é a que situa sua obra
das obras legítimas e reconhecidas por instân- nas reinvenções retrospectivas de uma cul-
cias como a crítica e a escola. Assim, continua tura literária para a juventude. Ou melhor, a
Compère, os romances populares estão vincu- que apreende os processos de informalização14
lados a um público ampliado, formado pelos (Wouters, 2007) dos comportamentos que in-
progressos da educação e pelo desenvolvimen- vestem os livros alinhados em uma dinâmica
to de novas formas de publicação. O exemplo da produção que atualiza velhas fórmulas edi-
são as coleções de livros de aventuras e via- toriais, temas e modelos literários. Os roman-
gens do editor francês Louis Hachette, baratos ces de princesas com a nostalgia das aventuras
e de pequenos formatos, feitos para a venda e regressos do heroísmo, as narrativas intimis-
nas estações de trem de Paris. A partir daí, o tas de conselhos, diários e cartas, definem uma
romance popular foi se diversificando em sub- literatura sentimental, aparentada aos melo-
gêneros: a ficção-científica, os policiais e wes- dramas dos séculos XIX e XX. Não faltam re-
terns, as fantasias, o horror e demais formas gras e padrões de etiqueta. A permanência, na
sobrenaturais, os sentimentais, os eróticos e a atualidade, de temas já gastos, como as fadas
pornografia. Os subgêneros, voltados ao entre- e outros seres sobrenaturais, evidencia o pa-
tenimento dependem dos suportes de difusão pel da literatura nos processos de refreamento
e da distribuição comercial ampliada. dos afetos e controle das emoções, conforme
Pode-se, então, elaborar a hipótese de identificou Norbert Elias (1994) em estudo
Caderno CRH, Salvador, v. 29, n. 78, p. 463-476, Set./Dez. 2016

que as escritoras em posição best-seller utili- clássico baseado no corpus dos livros de boas
zam os blogs e redes sócias da internet do mes- maneiras. Tudo leva a crer que a civilidade
mo modo que os escritores de romace-folhetim contemporânea é um ponto de encontro com
do século XIX utilizavam o jornal impresso e o passado. Os sucessos juvenis, desse modo,
os das novelas utilizavam as rádios, eviden- ocupam tanto lugares de inserção nos sistemas
ciando uma linha de sucessão também midi- literários nacionais como se inscrevem no pa-
ática (Ortiz, 1988). Vale lembrar, com Marlyse trimônio universal.
Meyer (1996), a velocidade com que o roman- O que explica o sucesso de venda e a
ce folhetim oitocentista atravessa o Atlântico reação apaixonada são os pactos de leitura fir-
e passa a circular no Brasil. As traduções das mados entre autoras e leitores-fãs e um maior
novelas francesas para o Jornal do Comércio controle da produção e distribuição dos livros
eram feitas imediatamente após aparecerem por parte dos escritores. O meio digital abre ca-
em Paris. Por essas e outras estratégias de cir-
culação, os best-sellers são constantemente
14
Considero processos de informalização,emancipação
das emoções nas sociedades contemporâneas. Com a
reinventados, e a literatura de entretenimento maior flexibilidade e diferenciação dos códigos sociais, as
pessoas tornam-se menos rígidas e mais conscientes das
continua um sucesso. restrições sociais.

472
Andréa Borges Leão

minho para uma nova invenção autoral e, por do computador, até mesmo a leitura escolar de
conseguinte, para a redefinição de interesses apoio às “práticas da educação básica”16 (Fun-
e reposicionamento dos agentes nos circuitos do Nacional do Desenvolvimento da Educação,
de produção e recepção. A nova geração de es- 2012). Diante disso, os usos dos best-sellers
critoras, sem ambivalências, concebe os livros juvenis trazem para o debate o problema das
simultaneamente como obras literárias e pro- novas recepções e modalidades de apropriação
dutos à venda. Tudo indica que o acesso à visi- (nos blogs de escritores e nas redes sociais),
bilidade como uma marca de reconhecimento que supõem um gosto estético comum às con-
converte o sucesso comercial do livro em valor exões literárias das séries contemporâneas (aos
literário. Para elas, o importante é correspon- mesmos heróis e tramas). O leitor entra num
der aos horizontes de expectativas de meni- universo que se torna familiar e não consegue
nas fãs de princesas e de meninos românticos. mais sair dele, passando a viver a continuação
Suas atenções não se prendem aos paradoxos dos episódios na pele dos heróis. Esta lógica
do que seja ou não a verdadeira literatura, do pode fazer de um best um long seller, traçando
que seja o livro nacional ou as fronteiras que os destinos da série Fala Sério! por gerações de
separam o centro e as margens na esfera literá- leitores ainda por vir.
ria brasileira. O dilema do duplo, intelectual e
negociante, que marcou a carreira de gerações
de escritores em busca de autonomia no inte-
rior de um campo, passa longe delas. O desafio CONCLUSÕES
da análise é apreender a psicogênese15 do leitor
previsto nos best-sellers e, em consequência, A primeira conclusão é a de que um as-
seguir as pistas explicativas das identificações pecto comum aos livros eleitos pelo público,
e preferências de longo prazo. Essas pistas nos dos mais populares aos canonizados, é o des-
levam não apenas às variações no gosto lite- conhecimento de nacionalidades. A força de
rário, mas também às censuras e proibições representação dos best-sellers parece seguir a
veiculadas nas narrativas, à assimilação das lógica inversa dos discursos da identidade na-
regras e ao progressivo relaxamento no mane- cional. Se seus autores escapam à categoria de
jo das emoções nas práticas de leitura. Como gênios da nação, talvez isso não se deva uni-
lembra Roger Chartier (2000), o livro impresso camente à força da interlocução estabelecida

Caderno CRH, Salvador, v. 29, n. 78, p. 463-476, Set./Dez. 2016


é o melhor lugar para o encontro entre a forma com os leitores. Thalita Rebouças encarna a
material, o texto e o leitor. autoria contemporânea por insistir em encon-
Com relação aos leitores, uma última trar seus leitores nos diversos espaços da pro-
palavra. Deve-se levar em conta que o gênero dução cultural, prolongando o convívio entre
jovem adulto, no qual boa parte dos best-sel- as festas de carnaval e tardes de partidas de
lers juvenis são classificados, relaciona-se tan- futebol com a leitura de textos fáceis de ler e
to às injunções das políticas públicas do livro de interessar.
e da leitura, a exemplo do Programa Nacional A segunda conclusão é a de que os he-
Biblioteca na Escola (PNBE), como às transfor- róis, heroínas e tramas dos sucessos juvenis
mações do mercado editorial transnacional. continuam seguindo temas abstratos, como
Os livros destinados a um público leitor que amizade, amor, traição, inveja, o que os torna
vai dos 12 aos 20 e poucos anos preveem lei- ainda clássicos, por deixarem as temporalida-
turas tanto no suporte impresso como na tela des e espaços nacionais em suspenso. Por isso,
prestam-se tão bem a representar processos de
15 Norbert Elias (1994), na teoria da civilização, incorpora a
ideia de mudança na estrutura psíquica e cognitiva dos indi-
víduos, atribuindo a esse fenômeno o termo “psicogênese”. 16
A esse respeito, consultar PNBE.

473
FAZER DO VELHO UMA NOVIDADE ...

nacionalização literários diversificados (afinal, contos de fadas não é simples experiência de


quem conseguiria localizar o planeta de O Pe- retorno ao passado. As mutações da sociedade
queno Príncipe?). Também se tornam clássicos contemporânea afetam a estrutura das narra-
por força da estabilidade das vendas, perma- tivas e a concepção dos personagens, apro-
necendo por anos a fio nos catálogos das edito- ximando o universo atemporal da fantasia à
ras. Em consequência, os best-sellers são facil- sociedade midiática, à tecnologia e à tradição.
mente traduzidos e adaptados, circulando com Tudo leva a crer que existam gêneros ficcionias
desenvoltura de uma língua a outra, de uma em estado de latência; de tempos em tempos,
dinâmica literária a outra, por entre espaços com a emergência das indústrias editoriais,
nacionais, continentes e épocas. Os temas, po- eles vêm à tona. O importante é considerar
tencialmente universais, resumiu muito bem os gêneros literários, sobretudo, como cons-
Jean-Marc Gouanvic (2009), possuem o con- truções do mercado editorial, o que explica
dão de fazer do velho sempre uma novidade. os dispositivos de classificação e controle dos
O que muda, com a passagem do tempo, são as textos utilizados pelos agentes da produção.
práticas de leitura de acordo com os modos de Reunir textos e inventar coleções juvenis tam-
vida e as percepções dos leitores. bém diz respeito às gradações do aprendizado
A terceira conclusão segue aquela a que e às formas de divertimento que podem ofere-
chegou o sociólogo Renato Ortiz (1988), em cer (Cf. Olivero, 1999). Os critérios de classifi-
análise sobre a consolidação de uma sociedade cação do cânone literário em padrões de exce-
de mercado no Brasil nos anos de 1970: em uma lência, que operam distinções e gradações de
indústria popular de massa, o contato histórico literalidade, o que é ou não a boa ficção, pouco
com os produtos estrangeiros por meio de im- ajudam a elucidar o problema. Sendo assim, a
portações e traduções, diversas vezes pensado compreensão do que sejam obras populares e
como dependência e colonialismo cultural em eruditas, best ou long-seller, é apropriadamen-
relação aos países de economias centrais, atesta te alcançada por meio de uma sociologia pro-
uma mudança de posição do país periférico no cessual da circulação simbólica (Elias, 1994),
contexto internacional. Esse reposicionamento que privilegia operações lógicas e afetivas nas
coincide com a progressiva autonomia da esfe- construções de repertórios de textos separados
ra cultural brasileira. Sem desconhecer, é claro, no tempo e no espaço.
que os espaços internacionais de circulação dos
Caderno CRH, Salvador, v. 29, n. 78, p. 463-476, Set./Dez. 2016

textos não estão orientados por livres trocas,


Recebido para publicação em 04 de maio 2016
mas por relações de força hierárquicas e desi- Aceito em 05 de setembro de 2016
guais entre agentes e instituições.
A quarta e última conclusão aponta para
a necessidade de se fazer um inventário his- REFERÊNCIAS
tórico dos sucessos juvenis, considerando as
especificidades de cada conjuntura editorial ALMEIDA, P. Surge uma nova categoria de leitores: o new
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BEAUDOUIN, V. Trajectoires et réseau des écrivains
mo modo que, hoje, as boas vendas devem sur le web: construction de la notoriété et du marché.
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Andréa Borges Leão

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475
FAZER DO VELHO UMA NOVIDADE ...

MAKING THE OLD A NOVELTY: reinventions of C’EST AVEC DU VIEUX QUE L’ON FAIT DU NEUF:
children and young adult literature best-sellers les ré-inventions des best-sellers juvéniles

Andréa Borges Leão Andréa Borges Leão

This article organizes a debate about the young L’article propose un débat sur la production littéraire
adult literary production associated to mass juvénile associée aux ventes massives. Il a comme
production. Thus, the article has the double double objectif de conceptualiser les best-sellers et
objective of conceptualizing the best-sellers and de retracer le lien entre les tendances historiques
tracing the historic lines of connection of the de la production contemporaine, en prenant en
contemporary production with the presence of considération la présence des livres européens et
European and American books in Brazilian edition américains dans les éditions brésiliennes depuis
since the 19th century. The formation of a Brazilian le XIXe siècle. La formation d’un espace littéraire
national literary space was marked by the importing national a été marquée par l’importation des
of classics of world literary heritage, travel and classiques du patrimoine littéraire mondial, romans
adventure romances, sentimental narratives and de voyage et d’aventure, narratives sentimentales et
fairy-tales guided by the transatlantic circulation contes de fées, suivant la tendance de la circulation
of the offer and the mass consumption. The criteria transatlantique de l’offre et de la demande massives.
established for the analysis of the writer Thalita Les critères établis pour l’analyse de l’oeuvre de
Rebouças’ series, which focus on the national best- l’écrivaine Thalita Rebouças, qui fait actuellement
seller phenomenon today. These criteria supports the l’objet d’un phénomène national de best-seller,
argument that the young adult book when following se basent sur l’argument selon lequel les livres
the logic of world culture circulation makes use of juvéniles, lorsqu’ils entrent dans la logique de la
a thematic return to the past, reinventing itself by circulation mondiale de la culture, ont recours à
making the old a novelty. des thèmes du passé et se réinventent en faisant
toujours du vieux quelque chose de neuf.

Keywords: Young adult best-sellers. Transnational Mots-clés: Best-sellers juvéniles. Circulation


circulation of culture. Literary series. Literary transnationale de la culture. Série littéraire. Auteur
authorship. littéraire.
Caderno CRH, Salvador, v. 29, n. 78, p. 463-476, Set./Dez. 2016

Andréa Borges Leão – Doutora em Sociologia pela Universidade de São Paulo. Professora do Departamento
de Ciências Sociais e do Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Federal do Ceará.
Pós-doutorado em História Cultural, na École des Hautes Études en Sciences Sociales, Paris, sobre as
coleções juvenis da Livraria Garnier, e no Centre d’Histoire Culturelle des Sociétés Contemporaines, da
Université de Versailles Saint-Quentin-en-Yvelines, sobre as traduções brasileiras dos livros juvenis de
Sophie de Ségur e Jules Verne. Integra os grupos de pesquisa CMD (Cultura, Memória e Desenvolvimento)
e GECCA (Grupo de Estudos em Cultura, Comunicação e Arte). Desenvolve pesquisas na área da edição
e circulação da literatura infantil e juvenil. Atua nos seguintes temas: Sociologia e História Editorial,
Práticas Editoriais, Circulação da Cultura e da Literatura, Representações Literárias e Sociologia Histórica
da Cultura. Publicações recentes: O popular no Brasil numa fábula de costume francesa: estéticas e
mediações transatlânticas. Sociedade e Estado (UnB. Impresso), v. 31, p. 631-650, 2016; Fazer do velho
uma novidade: as reinvenções dos best-sellers juvenis. Caderno CRH (UFBA. Impresso), v. 29, p. 463-476,
2016; Ceará, lado moleque (as letras e a sociogênese do humor). Arquivos do CMD, v. 3, p. 1-16, 2015.

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