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Educação LITERATURA HISPANO-AMERICANA Veridiana Almeida

Veridiana Almeida
HISPANO-AMERICANA
LITERATURA
Literatura
Hispano-Americana
Veridiana Almeida

Curitiba
2018
Ficha Catalográfica elaborada pela Fael.

A447 Almeida, Veridiana


Literatura hispano-americana / Veridiana Almeida. – Curitiba:
Fael, 2018.
279 p.: il.
ISBN 978-85-5337-030-6

1. Literatura espanhola e hispano-americana I. Título

CDD 860

Direitos desta edição reservados à Fael.


É proibida a reprodução total ou parcial desta obra sem autorização expressa da Fael.

FAEL

Direção Acadêmica Francisco Carlos Sardo


Coordenação Editorial Raquel Andrade Lorenz
Revisão Editora Coletânea
Projeto Gráfico Sandro Niemicz
Capa Vitor Bernardo Backes Lopes
Imagem da Capa Shutterstock.com/Sergei Babenko/Scharfsinn
Arte-Final Evelyn Caroline dos Santos Betim
Carta ao Aluno | 5

1. Introdução e Conceitos Básicos Sobre a


Literatura Hispano-Americana | 9

2. Das origens ao Barroco | 39

3. Século XIX: do Romantismo ao Realismo | 65

4. O século XX e o Modernismo | 95

5. A poesia do século XX: Vanguarda | 125

6. A principais tendências da narrativa do século XX | 157

7. A nova narrativa hispano-americana | 185

8. Tendências contemporâneas | 231

Gabarito | 263

Referências | 271
Carta ao Aluno

Prezado(a) aluno(a),
Todos tenemos una idea más o menos clara del tema
de nuestra conversación. Cierto. Es uno y múltiple.
Sus orígenes son obscuros. Sus límites vagos, su natu-
raleza cambiante y contradictoria. Su fin imprevisible.
No importa: todas estas circunstancias y propriedades
divergentes se refieren a un conjunto de obras literarias:
poemas, cuentos, novelas, dramas, ensayos… escritas
en castellano en las antiguas posesiones de España en
América. Ese es nuestro tema.
Octavio Paz

A literatura hispano-americana não é somente uma, pois cor-


responde a cada país de língua espanhola integrado a esse termo
abrangente. Fazem parte os países da América, México, América
Literatura Hispano-Americana

Central, América do Sul e Caribe. Dessa forma, a grande extensão e varie-


dade desta produção literária faz com que uma análise minuciosa se torne
extremamente difícil. Sem a intenção de traçar um amplo painel, optamos
por oferecer uma abordagem significativa para demonstrar a importância
e a inegável qualidade desta literatura.
Apresentamos, de maneira simples e didática, a literatura hispano-
-americana desde o século XVI até os dias atuais, com ênfase em alguns
aspectos dos autores e nas obras mais expressivas de cada época. Trechos
de contos, poemas e romances foram cuidadosamente escolhidos para que
você se sinta instigado a ler a obra completa. E não estamos nos referindo
a histórias literárias desconectadas, pois veremos que há uma relação de
influência, diálogos e tendências que ultrapassam as fronteiras dos países
envolvidos. De acordo com essa perspectiva, dividimos o nosso estudo em
oito capítulos.
Em Introdução e conceitos básicos sobre a literatura hispano-ameri-
cana, a abordagem é destinada ao conceito e às características, bem como
um breve panorama sobre o seu surgimento na época dos conquistadores,
no século XVI. Mas notamos que foi somente a partir dos anos sessenta
que tal literatura teve visibilidade e tornou-se percebida no mundo todo.
Referimo-nos a um fenômeno literário chamado boom, que marcou defi-
nitivamente a historiografia literária, oportunizando o reconhecimento de
vários escritores.
No capítulo intitulado Das origens ao Barroco, observamos que na
literatura pré-colombiana encontramos raízes literárias e traços culturais.
No entanto, é por meio das cartas de Cristóvão Colombo que se inaugura
a literatura de língua espanhola na Hispano-América. Também, neste capí-
tulo, vamos conhecer a literatura barroca, suas características, principais
obras e autores.
Em Século XIX: do Romantismo ao Realismo, revelamos algumas
características e principais obras de Esteban Echeverría, José Mármol,
Jorge Isaacs, entre outras que fizeram parte da estética literária, chamada
Romantismo. Após, a exposição se volta ao movimento realista, cuja
manifestação retratava a realidade objetivamente, na qual a razão e a
observação predominaram sobre o sentimento e a imaginação.

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Carta ao Aluno

No capítulo O século XX e o Modernismo, vamos estudar o primeiro


movimento estético originado na América latina, o Modernismo. Cons-
tatamos que foi a forma literária de um mundo em transformação, com
características marcadamente cosmopolitas, que multiplicou os modos
diferentes de encarar a realidade.
Em A poesia do século XX: Vanguarda, entendemos que, a partir da
década de 1920, a literatura hispano-americana tomou outro rumo, sur-
gindo, assim, outra corrente: a Vanguarda. A poesia incorporou elementos
como o verso livre, a supressão da rima, a liberdade na invenção de metá-
foras, entre outras características que serão abordadas.
No capítulo intitulado As principais tendências da narrativa do
século XX, como o próprio nome já diz, vamos investigar as principais
tendências narrativas do século XX na literatura hispano-americana. Para
melhor entendimento, dividimos em três temáticas fundamentais: 1) a nar-
rativa regionalista ou da terra, cujos temas são a natureza; 2) a narrativa da
Revolução Mexicana, com a temática centrada nos problemas políticos; e
3) a narrativa social ou “indigenismo”.
Em A nova narrativa hispano-americana, nosso olhar se volta ao
reconhecimento internacional da narrativa hispano-americana, cujo fenô-
meno recebeu o nome de boom. Os autores envolvidos nesse movimento
promoveram uma verdadeira inovação nos romances e transgrediram
regras na forma de linguagem utilizada em seus textos. Citamos, breve-
mente, algumas características literárias dos maiores representantes, que
foram: Mario Vargas Llosa, Julio Cortázar, Carlos Fuentes e Gabriel Gar-
cía Márquez.
No último capítulo, Tendências contemporâneas, procuramos mos-
trar que a literatura hispano-americana encontrou sua expressão própria
depois do boom. Os editores aproveitaram esse fato com o lançamento
constante de romances, uma vez que o caminho estava aberto para a proli-
feração de novos autores e títulos nos anos 80. Escolhemos alguns autores
e obras para entendermos melhor essa produção.
Com essa abordagem, desejamos oferecer ao leitor a presença de
vozes e visões de mundo que evidenciam o melhor da prosa e da poe-
sia desta produção literária, bem como instigar no leitor à curiosidade de

– 7 –
Literatura Hispano-Americana

conhecer os originais, os quais exibem uma realidade ficcional múltipla e


instável. Além disso, certamente, a riqueza e o encantamento da literatura
hispano-americana serão o alicerce para maiores buscas.
Bons estudos!
A autora

– 8 –
1
Introdução e
Conceitos Básicos
Sobre a Literatura
Hispano-Americana

O presente capítulo procura traçar um breve panorama acerca


da literatura hispano-americana, com uma apreciação de suas ten-
dências diferenciais, bem como de seu conceito e de seu surgi-
mento, alguns de seus principais autores e suas obras represen-
tativas, com dados de biográficos e uma rápida avaliação crítica.
Procuramos oferecer uma “primeira impressão” dessa lite-
ratura que sem dúvida é imprescindível, ainda que tenha sua
história pouco conhecida no Brasil. Veremos que os autores
hispano-americanos não tinham ambição de ultrapassar as fron-
teiras do país ao qual pertenciam. Contudo, podemos atestar que
na década de 1960 surgiu uma nova geração de escritores que
promoveu uma verdadeira revolução cultural no setor, em um
fenômeno chamado El boom hispano-americano.
Literatura Hispano-Americana

1.1 Convite à literatura hispano-americana


Se procurarmos os termos literatura hispano-americana no site
de buscas mais conhecido entre os usuários da internet – o Google –,
encontraremos vários artigos e pesquisas de estudantes, professores,
estudiosos ou simplesmente amantes de bons livros que se perguntam:
há uma literatura hispano-americana? No que consiste a literatura his-
pano-americana? Quando teve início? Quais são os autores e as obras
que representam essa literatura?
São muitos questionamentos, mas podemos afirmar que aquele que
aparece com mais recorrência é sobre seu conceito: o que é a literatura
hispano-americana? Essa é uma dúvida natural, uma vez que as literaturas
brasileira e portuguesa são mais propagadas no Brasil. Autores afirmam
que o próprio conhecimento cultural, geográfico, histórico, político e eco-
nômico da América Hispânica é, entre nós, pouco divulgado.
Dessa forma, tentaremos buscar respostas para as discussões que
envolvem esse tipo de literatura, de maneira simples e didática, na litera-
tura dos povos das Américas de língua castelhana, enfatizando autores e
obras mais significativas de cada época, bem como as correntes literárias
até a contemporaneidade. Paz (1981), com uma visão mais geral sobre a
nacionalidade de literatura(s), diz que tem seu início ligado ao processo
histórico-cultural da colonização da América: “la Literatura es un con-
junto de obras, autores y lectores: una sociedad dentro de la sociedad. Hay
excelentes poetas y novelistas colombianos, nicaragüenses y venezolanos
pero no hay una literatura colombiana, nicaragüense o venezolana. Todas
esas literaturas son inteligibles solamente como partes de la literatura his-
pano-americana”.
Portanto, podemos declarar com propriedade a existência de tal lite-
ratura, uma vez que percebemos se tratar de um conjunto de obras escritas
e produzidas nos países da América: “Es indudable la existencia de la lite-
ratura hispano-americana: las obras están allí, al alcance de los ojos y de
la mente. Muchas de esas obras son notables y algunas entre ellas son de
verdad únicas” (PAZ, 2011). Contudo, não devemos pensar que estamos
nos referindo a histórias literárias desconectadas e fragmentadas de cada
um dos países; há uma relação de influências, diálogos e tendências que

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Introdução e Conceitos Básicos Sobre a Literatura Hispano-Americana

ultrapassam as fronteiras dos países, ou seja, não estamos fazendo menção


a uma mera soma das histórias nacionais, e sim a uma história viva do
sistema literário.
Respondido o questionamento sobre a existência da literatura his-
pano-americana, notamos que consiste em toda literatura produzida pelos
falantes da língua espanhola nos países da América, procedentes do
México, da América Central, da América do Sul e do Caribe. Vale ressaltar
que os autores brasileiros não estão incluídos e que não podemos confun-
dir os gentílicos hispano-americano e latino-americano, pois há diferen-
ças entre eles, apesar de muitas vezes serem empregados como sinônimos.

Importante

Hispano-americano ou latino-americano?

Atenção para a diferença!

O adjetivo hispano-americano faz referência aos países ameri-


canos nos quais se fala espanhol e às pessoas originárias desses
países. Por exemplo, o Peru é um país hispano-americano, mas
não o Brasil, cuja língua oficial é o português.

O adjetivo latino-americano faz referência aos países ameri-


canos nos quais se fala uma língua de origem latina, ou seja,
românica – portanto, o espanhol, o português ou o francês – e às
pessoas desses países. Por exemplo, podemos usar esse termo
para nos referirmos ao Brasil.

É interessante trazer à discussão os conceitos de pan-hispânico,


pan-americano e ibero-americano. O primeiro termo se refere
aos povos que falam a língua espanhola; o segundo diz respeito
a todos os países americanos; e o terceiro é um termo utilizado
para se referir a Portugal, à Espanha e a cada um dos países
americanos colonizados por essas nações (SORGATO, 2013).

A literatura hispano-americana passou por várias fases, todas com um


significado particular: estético, político, histórico, social ou popular. Torna-

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Literatura Hispano-Americana

-se fundamental para qualquer pessoa reconhecer sua riqueza e os pensado-


res que fizeram parte dela. Se analisarmos a partir do ponto de vista cultural,
observaremos que é ampla e diversa, repleta de experiências, de compreen-
sões múltiplas e de diferentes visões de vida que foram lidas, pensadas e rei-
teradas por artistas e intelectuais em vários lugares e momentos da história.
Segundo Queiroz (1971, p. 17), “Devemos, pois, apreender os traços fun-
damentais dessa literatura. O mais nos será dado por acréscimo. Tentemos
surpreendê-la na sua riqueza exuberante, em que nada termina e nada está
separado: clássico, romântico, moderno, tudo se funde e superpõe, como
num rio cujas águas arrastam, à passagem, quando se encontram”.
Essa discussão a respeito da importância da literatura hispano-americana
acontece devido ao fato de que “o público leitor, durante muitos anos, via a
América Hispânica com os olhos do colonizador: como algo raro e exótico”
(JOSEF, 1989, p. 13). Estamos falando sobre algo além, uma luta entre a iden-
tidade hispano-americana e o mútuo reconhecimento, objetivando a formação
de uma identidade própria, pois muitos especialistas atestam que o Brasil se
mantém afastado do mundo hispânico para se refugiar na cultura francesa.
Isso é constatado quando buscamos pesquisas sobre o assunto e descobrimos
que são escassas. Mas também encontramos estudiosos que afirmam que o
contraste com os países europeus e os Estados Unidos não é mais tão notável
e que as letras hispano-americanas deixaram o reino das universidades e os
centros especializados para alcançar o leitor comum (JOSEF, 1989).
Assim, há uma “América à nossa espera”, como bem retrata Queiroz
(1971, p. 21). Como sujeitos culturais, consideramos de grande importân-
cia ter noção do que é a literatura hispano-americana e quais são as possi-
bilidades que ela nos oferece de absorção dos textos escritos nesses países,
assim como conhecer, compreender e entender melhor suas conquistas.
A cada um de nós, tal literatura se revelará distintamente, da mesma
maneira como o grande poeta chileno Pablo Neruda traduz sua alma e sua
identidade latino-americana no poema América, no invoco tu nombre en vano:

América, no invoco tu nombre en vano


América, no invoco tu nombre en vano.

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Introdução e Conceitos Básicos Sobre a Literatura Hispano-Americana

Cuando sujeto al corazón la espada,


cuando aguanto en el alma la gotera,
cuando por las ventanas
un nuevo día tuyo me penetra,
soy y estoy en la luz que me produce,
vivo en la sombra que me determina,
duermo y despierto en tu esencial aurora:
dulce como las uvas, y terrible,
conductor del azúcar y el castigo,
empapado en esperma de tu especie,
amamantado en sangre de tu herencia.
Fonte: Neruda (1950). Disponível em: <https://
www.neruda.uchile.cl/obra/obracantogene-
ral38.html>. Acesso em: 31 dez. 2017.

Saiba mais

Canto geral, lançado em 1950, foi considerado por Neruda seu


livro mais “fervente e vasto”, um clássico da poesia contem-
porânea universal composto por 15 seções e mais de 200 poe-
mas. É aclamado por muitos críticos como “a grande canção
da América”.

1.2 Panorama geral


A literatura hispano-americana teve início na época dos conquista-
dores, no século XVI. É imprescindível salientar que, apesar de essa lite-
ratura apresentar grandes autores antes da década de 1960, podemos dizer
que era isolada e relegada a certo ostracismo. Os escritores não tinham a
ambição de ultrapassar as fronteiras do país ao qual pertenciam por vive-
rem momentos em que se apresentavam empecilhos e dificuldades de cir-

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Literatura Hispano-Americana

culação das obras, até mesmo na própria América Latina. Ratificando essa
afirmação, Queiroz (1971) sustenta que argentinos e uruguaios liam com
mais facilidade os bons autores franceses e ingleses do que os escritores
peruanos, mexicanos, chilenos ou bolivianos.
Somente a partir dos anos 1960 a literatura hispano-americana teve
visibilidade e começou a ser percebida em todo o mundo. Trata-se de um
fenômeno literário chamado Boom, que marcou definitivamente a histo-
riografia literária, oportunizando o reconhecimento de vários escritores.
Segundo López (c2017):
el descubrimiento mundial de la novela hispano-americana comienza
en 1962 con La ciudad y los perros de Mario Vargas Llosa. Este fue
el punto de arranque de un fenómeno editorial conocido como “el
boom” de la novela hispano-americana: bajo el epígrafe del Rea-
lismo mágico, toda una generación de escritores con Gabriel García
Márquez a la cabeza fueron reconocidos, leídos y seguidos por infi-
nidad de lectores. El éxito también condujo a rescatar a autores de
generaciones anteriores: Borges, Carpentier, Rulfo, etc.

Há vários rumores de que esse fenômeno não foi acidental. Os auto-


res se correspondiam e discutiam criticamente as obras uns dos outros e
estabeleciam metas para vencerem as imposições do realismo europeu. A
troca de ideias traçou diretrizes importantes que caracterizaram formal-
mente as obras publicadas durante esse período histórico. Se consultarmos
no dicionário Real Academia Española (c2017) o significado do termo
boom, encontraremos a seguinte definição: “Éxito o auge repentino de
algo, especialmente de un libro. El boom de la novela hispanoamericana.”.
Os maiores representantes desse movimento foram o colombiano
Gabriel García Márquez (1927-2014), o argentino Julio Cortázar (1914-
1984), o mexicano Carlos Fuentes (1928-2012) e o peruano Mario Var-
gas Llosa (1936-). De acordo com Stanley (2016), quase todos os autores
migraram para a Europa e lá encontraram um mercado editorial muito
ativo, o que facilitou a repercussão internacional de suas obras. A conso-
lidação do movimento só aconteceu devido ao caráter inovador que esses
autores propuseram como fuga do limbo pelo qual a literatura passava.
Um dos elementos buscado por eles foi a difusão do chamado realismo
fantástico ou mágico, conceito que veremos mais adiante no desenrolar da
história da literatura hispano-americana.

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Introdução e Conceitos Básicos Sobre a Literatura Hispano-Americana

Figura 1.1 – Obras de Julio Cortázar, Gabriel García Márquez, Mario Vargas Llosa
e Carlos Fuentes

Fonte: El Boom… (2016).

Para termos uma ideia da dimensão dessa fertilidade literária, o


romance Cien años de soledad, de Gabriel García Márquez, lançado em
1967, vendeu 8 mil cópias em uma semana – 500 mil cópias em 3 anos.
Três décadas depois, foi traduzido para 37 idiomas e vendeu 25 milhões
de exemplares em todo o mundo. Contudo, não podemos afirmar que o
Boom se tratava exclusivamente de um êxito editorial; o que podemos
falar é que se tratava de uma unidade estética e ideológica daqueles que
integraram o movimento frente à literatura e à sociedade.

“Construir a história latino-americana tão repleta de guerras e soli-


dão a partir da árvore genealógica de uma família, que na realidade
é a sua. Fazer isso articulando gerações e gerações sem perder o fio
da meada não é tarefa para qualquer um. Transportar o leitor para o
mundo de solidão dos personagens tão apegados a guerras inúteis,
à solidão e magia inerente a sociedades lentas e subdesenvolvidas,
léguas distantes da modernidade, sem citar explicitamente aonde
quer chegar, mas levando leitores mais experientes a intuírem a
mensagem do escritor não é tarefa para um autor comum. Enfim,
elaborar tudo isso num ambiente narrativo repleto de imaginação,
recorrendo à fantasia para revelar a realidade, é o que fez desse
escritor um mestre num estilo que conhecemos como realismo
mágico. É o que conhecemos como arte. Arte por meio da escrita
é o que construiu o colombiano Gabriel García Márquez na obra
definitiva, que certamente muito contribuiu para que a ele fosse
merecidamente concedido o Prêmio Nobel de Literatura, de 1982.”

– 15 –
Literatura Hispano-Americana

CORREIA, S. S. Cem Anos de Solidão, o livro que criou uma


geração de leitores. Revista Bula, c2017. Disponível em: <http://
www.revistabula.com/671-cem-anos-de-solidao-o-livro-que-
-criou-uma-geracao-de-leitores>. Acesso em: 31 dez. 2017.

1.3 Autores e obras que representam


a literatura hispano-americana
Como introdução ao estudo da literatura hispano-americana, listare-
mos aqui alguns autores representativos para que você tenha um conheci-
mento prévio sobre eles e sobre seus modelos de produção escrita em lín-
gua espanhola. A escolha não procura distinguir escolas e épocas, embora
os contemporâneos, evidentemente, tenham prioridade. Nesse panorama
geral e resumo biográfico, há a presença de autores da Argentina, do Chile,
da Colômbia, do México, do Paraguai, do Peru e do Uruguai, cujas obras
oferecem disparidades, mas o nexo que os une é a problemática comum
do Continente Americano.
No decorrer de nosso estudo, além de conhecermos outros autores,
retomaremos com mais profundidade as características e a notabilidade de
cada um dos descritos a seguir.

Figura 1.2 – Jorge Luis Borges


1.3.1 Jorge Luis Borges
(1899-1986)
Nasceu na capital argentina, Buenos Aires,
Fonte: tradutoradeespanhol.com.br.

e é um dos escritores mais importantes da lite-


ratura contemporânea do século XX. Percorreu
vários gêneros literários, como ensaio, narrativa
e poesia, com trabalhos admiráveis, pertencen-
tes ao melhor da inteligência não só latino-ame-
ricana, mas também universal.
Ressignificou os conceitos de invenção e
de criatividade literárias e é definido como um

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Introdução e Conceitos Básicos Sobre a Literatura Hispano-Americana

escritor intelectual, complexo e exigente com o leitor, que alçou a notorie-


dade entre escritores e críticos literários de todo o mundo.
Principais obras: El Aleph (1949); Fervor de Buenos Aires (1923); El
idioma de los argentinos (1928); Luna de enfrente (1925); Cuaderno San
Martín (1929); Poemas (1923-1943); El hacedor (1960); Para las seis
cuerdas (1967); El otro, el mismo (1969); Elogio de la sombra (1969); El
oro de los tigres (1972); La rosa profunda (1975); Obra poética (1923-
1976); La moneda de hierro (1976); Historia de la noche (1976); La cifra
(1981); Los conjurados (1985); La muerte y la brújula (1951); El informe
Brodie (1970); El libro de arena (1975); La memoria de Shakespeare
(1983); El congreso (1971); Libro de sueños (1976).

1.3.2 Julio Cortázar (1914-1984)


Figura 1.3 – Julio Cortázar

Fonte: tradutoradeespanhol.com.br

Nasceu em Bruxelas, na Bélgica, mas se mudou com os pais para


Buenos Aires em 1918 e, em 1951, partiu para a França por não concordar
com a ditadura argentina. Seu principal romance, Rayuela (1963), é consi-
derado uma obra-prima da literatura hispano-americana.
De acordo com Rodrigues (1971), Cortázar tomou posições român-
ticas e ingênuas no episódio das guerrilhas, dada sua amizade com Che

– 17 –
Literatura Hispano-Americana

Guevara. Com a derrocada desse tipo de ação, o escritor se deprimiu


muito, o que influenciou sua literatura.
Principais obras: Rayuela (1963); Bestiario (1951); Las armas
secretas (1959); Final de juego (1956); Todos los fuegos el fuego
(1966); Presencia (1938); La otra orilla (1945); Los reyes (1949); Los
premios (1960); Carta a una señorita en París (1963); La autopista del
Sur (1964); La vuelta al día en ochenta mundos (1967); El persegui-
dor y otros cuentos (1967); Buenos Aires, Buenos Aires (1967); Casa
tomada (1969); Último round (1969); Relatos (1970); Viaje alrededor
de una mesa (1970); La isla a mediodía y otros relatos (1971); Prosa del
observatorio (1972); Libro de Manuel (1973); La casilla de los Morelli
(1973); Octaedro (1974); Alguien que anda por ahí (1977); Territorios
(1979); Silvalandia (1984); Salvo el crepúsculo (1984); Divertimento
(1986); El examen (1986).

1.3.3 Isabel Allende (1942-)


Figura 1.4 – Isabel Allende

Fonte: CC BY 2.0

Nasceu em Lima, no Peru, mas se considera chilena por formação


e vive atualmente nos Estados Unidos. Após estrear no campo da ficção,
a partir da década de 1980, tornou-se umas das principais revelações da
literatura latino-americana e sua obra foi traduzida para 35 idiomas.

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Introdução e Conceitos Básicos Sobre a Literatura Hispano-Americana

De acordo com Josef (1989), Allende preocupou-se em dar seu teste-


munho diante da repressão do Chile, recriando momentos que se tornaram
marcos na história do país; após uma estreia fulgurante, deixou de lado a
técnica experimental em busca de sua própria expressão.
Principais obras: La casa de los espíritus (1982); De amor y de som-
bra (1984); Eva Luna (1987); El plan infinito (1991); Paula (1995); Afro-
dita (1998); Hija de la fortuna (1999); Retrato en sepia (2000); La ciu-
dad de las bestias (2002); El reino del dragón de oro (2003); El bosque
de los pigmeos (2004); El Zorro (2005); Inés del alma mía (2006); La
suma de los días (2007); La isla bajo el mar (2009); El cuaderno de Maya
(2011); El juego de Ripper (2014); El amante japonés (2015); Más allá del
invierno (2017); El embajador (1971); La balada del medio pelo (1973);
Los siete espejos (1974); Los tomates del Fabio Cagón (2004).

1.3.4 Pablo Neruda (1904-1973)


Figura 1.5 – Monumento do famoso poeta chileno Pablo Neruda em Valparaiso, no Chile

Fonte: Shutterstock.com/Dmitry Chulov

Nasceu no Chile e foi considerado um dos melhores poetas do século


XX, tendo publicado mais de 30 obras de poesia. Vale salientar que
Neruda é pseudônimo (que posteriormente se tornou oficial) de Ricardo
Eliécer Neftalí Reyes Basoalto. Recebeu o Nobel de Literatura em 1971
e sua obra mais famosa foi uma compilação de poesias intitulada Veinte
poemas de amor y una canción desesperada (1924).

– 19 –
Literatura Hispano-Americana

Suas poesias da primeira fase são inspiradas por uma angústia alta-
mente romântica. Esteve no Brasil diversas vezes e, em uma delas, decla-
mou seus poemas perante grande massa popular concentrada no estádio
do Pacaembu, em São Paulo (SP).
Principais obras: Veinte poemas de amor y una canción desesperada
(1924); Memorial de Isla Negra (1964); Arte de pájaros (1966); Jardín
de invierno (1974); Para nacer he nacido (1978); Crepusculario (1923);
Tentativa del hombre infinito (1926); El habitante y su esperanza (1926);
Residencia en la tierra (1935); España en el corazón (1937); Canto gene-
ral (1950); Los versos del Capitán (1952); Todo el amor (1953); Odas
elementales (1954); Nueva odas elementales (1955); Tercer libro de las
odas (1957); Estravagario (1958); Cien sonetos de amor (1959); Navega-
ciones y regresos (1959); Poesías: Las piedras de Chile (1960); Fulgor y
muerte de Joaquín Murieta (1967); La barcarola (1967); Las manos del
día (1968); Maremoto (1970); La espada encendida (1970); Libro de las
preguntas (1974).

1.3.5 Gabriel García Márquez (1927-2014)


Figura 1.6 – Gabriel García Márquez

Fonte: CC BY 2.0

– 20 –
Introdução e Conceitos Básicos Sobre a Literatura Hispano-Americana

Nasceu em Aracataca, na Colômbia, foi escritor, jornalista,


editor, ativista e político. Considerado um dos autores mais impor-
tantes do século XX, foi laureado com o Prêmio Internacional Neustadt de
Literatura, em 1972, e com o Nobel de Literatura, em 1982. Foi responsá-
vel por criar o realismo mágico na literatura latino-americana.
A obra Cien años de soledad (1967) o deixou conhecido mundial-
mente, com um romance que narra a história da família Buendía e da fun-
dação do povoado de Macondo. De acordo com Oviedo (2015, p. 157),
“la obra de García Márquez se divide claramente en dos partes: antes y
después de Cien años de soledad. Igual puede decirse de la novelística
hispano-americana, que, desde entonces, ya no volvió a ser la misma.”.
Principais obras: Cien años de soledad (1967); Crónica de una
muerte anunciada (1981); El amor en los tiempos del cólera (1985); La
Hojarasca (1955); El general en su labirinto (1989); El coronel no tiene
quien le escriba (1961); La mala hora (1962); El otoño del patriarca
(1975); Del amor y otros demonios (1994); Memoria de mis putas tristes
(2004); Relato de un náufrago (1955); Noticia de un secuestro (1996); Los
funerales de la Mamá Grande (1962); La increíble y triste historia de la
cándida Eréndira y de su abuela desalmada (1972); Ojos de perro azul
(1950); Doce cuentos peregrinos (1992); Diálogo del espejo (1949); La
mujer que llegaba a las seis (1992); La siesta del martes (1999); El mar
del tiempo perdido (1961); El último viaje del buque fantasma (1993).

Figura 1.7 – Carlos Fuentes


1.3.6 Carlos Fuentes (1928-2012)
Nasceu na cidade do Panamá, foi escri-
tor e ensaísta, cosmopolita e poliglota, um dos
grandes narradores e pensadores mexicanos
– é considerado mexicano devido à nacionali-
dade dos pais. Ao lado de Mario Vargas Llosa,
Gabriel García Márquez e Otavio Paz, foi um
expoente do Boom literário latino-americano
Fonte: CC BY 2.0

na década de 1960.
Filho de um diplomático mexicano, nas-
ceu na época em que o pai servia no Panamá.

– 21 –
Literatura Hispano-Americana

Viveu a infância em vários países, como Argentina, Brasil, Chile, Uruguai


e Estados Unidos. Aos 16 anos de idade iniciou seu trabalho como jorna-
lista no México.
Sua obra ficcional é vasta, totalizando 22 romances e 9 coletâneas
de contos que abordam um panorama da história mexicana. Seu primeiro
livro de contos – Los dias enmascarados – foi publicado em 1954 e bem
aceito pela crítica. Segundo Oviedo (2015, p. 177), “el mundo narrativo
de este escritor mexicano ama la desmesura, las fantasmagorías, la mons-
truosidade; arte de lo grotesco y lo abigarrado.”.
Principais obras: Los días enmascarados (1954); Gringo viejo (1985);
Constancia y otras novelas para vírgenes (1990); Cantar de ciegos (1964);
La campaña (1990); El naranjo o los círculos del tempo (1993); Diana o
la cazadora solitaria (1996); La frontera de cristal (1995); Los años con
Laura Díaz (1999); Instinto de Inez (2001); La silla del águila (2003);
La voluntad y la fortuna (2008); La gran novela latinoamericana (2011);
La región más transparente (1958); Las buenas conciencias (1959); La
muerte de Artemio Cruz (1962); Aura (1962); Zona sagrada (1967); Cam-
bio de piel (1967); Cumpleaños (1969); Terra nostra (1975); La cabeza de
la hidra (1978); Una familia lejana (1980); Adán en Edén (2009); Fede-
rico en su balcón (2012).

1.3.7 Juan Rulfo (1917-1986) Figura 1.8 – Juan Rulfo

Nasceu no México e publicou apenas


duas obras em vida, que foram traduzidas
para vários idiomas. De acordo com Rodri-
gues (1971), existe nos livros de Rulfo uma
violenta crítica às estruturas socioeconômi-
cas não apenas mexicanas, mas também do
Continente. Mesmo assim, seu trabalho foi
adotado oficialmente nas escolas do país,
como exemplo de rebeldia e inconformismo.
Rulfo é considerado o principal pre-
cursor do chamado realismo mágico latino-
-americano, que contou com Gabriel García Fonte: CC BY 2.0

– 22 –
Introdução e Conceitos Básicos Sobre a Literatura Hispano-Americana

Márquez, Jorge Luis Borges e Julio Cortázar. Exerceu grande influência


sobre uma geração inteira de escritores.
Principais obras: El llano en llamas (1953); Pedro Páramo (1955).

1.3.8 Octavio Paz (1914-1998)


Figura 1.9 – Octavio Paz

Fonte: CC BY 2.0

Nasceu no México e foi poeta, ensaísta, tradutor e diplomata. Abar-


cou vários gêneros literários e é considerado um dos maiores escritores
do século XX. Publicou vários livros de poesia, de ensaios em literatura,
arte, cultura e política. Recebeu o Nobel de Literatura em 1990 e ganhou
notoriedade por sua produção na área da poesia moderna ou de vanguarda.
Lutou na guerra civil com os republicanos e é interessante mencio-
narmos que sua produção poética inicial, de quando tinha apenas 19 anos,
compilada em Libertad bajo palabra (1960), sofreu influência da estética
surrealista para abordar problemas existenciais como a solidão, o tempo e
o amor por meio de uma linguagem complexa e hermética.
Principais obras: Libertad bajo palabra (1958); El labirinto de la
soledad (1950); Salamandra (1962); Ladera Este (1969); Vuelta (1976);
Árbol adentro (1987); El arco y la lira (1956); Puertas al campo (1966);
La estación violenta (1956); Tiempo nublado (1983); La otra voz (1990);

– 23 –
Literatura Hispano-Americana

Convergencias (1991); Al paso (1992); La llama doble (1993); Pasado en


claro (1975); Itinerario (1994); Vislumbres de la India (1995); Hombres
en su siglo (1984); Sombras de obras (1983); Luna silvestre (1933); Raíz
del hombre (1937); Bajo tu clara sombra y otros poemas sobre España
(1937); La hija de Rappaccini (1991); Discos visuales (1968); Topoemas
(1971); Las peras del olmo (1957); Los signos en rotación (1965); Puertas
al campo (1966); Corriente alterna (1967); Conjunciones y disyunciones
(1969); El signo y el garabato (1973).

1.3.9 Augusto Roa Bastos (1917-2005)


Figura 1.10 – Augusto Roa Bastos

Fonte: CC BY 2.0

Nasceu em Assunção, no Paraguai, e foi ensaísta, roteirista, poeta


e romancista. Escreveu mais de 20 títulos que foram traduzidos para 25
idiomas. Ganhou o Prêmio Cervantes, em 1989, foi considerado o autor
mais importante de seu país e um dos mais notáveis na literatura latino-
-americana.
A obra de Roa Bastos é identificada pelo retrato da dura realidade do
povo paraguaio por meio da recuperação da história do país, uma vez que
a maior parte de seu trabalho foi produzida no exílio.
Principais obras: La carcajada (1930); Fulgencio Miranda (1937); La
residenta: El niño del rocío (1942); El ruiseñor de la aurora y otros poe-
mas (1942); Mientras llegue el día (1946); La Inglaterra que yo vi (1946);

– 24 –
Introdução e Conceitos Básicos Sobre a Literatura Hispano-Americana

El trueno entre las hojas (1953); El naranjal ardiente (1960); Hijo de hom-
bre (1960); El baldío (1966); Los pies sobre el agua (1967); Madera que-
mada (1967); Moriencia (1969); Cuerpo presente y otros cuentos (1971);
Yo el supremo (1974); Antología personal (1980); Contar un cuento y otros
relatos (1984); Vigilia del Almirante (1992); El fiscal (1992); Contravida
(1994); Madama Sui (1996); Lucha hasta el alba (1979).

1.3.10 Mario Vargas Llosa (1936-)


Figura 1.11 – Mario Vargas Llosa

Fonte: CC BY 2.0

Nasceu em Arequipa, no Peru, é escritor, jornalista, ensaísta e polí-


tico. Recebeu o Nobel de Literatura em 2010 e, desde então, tornou-se
figura de destaque na literatura mundial e qualquer título que publique tem
atenção instantânea.
É o escritor peruano de maior prestígio, com traduções para 30 idio-
mas. Foi o protagonista do fenômeno literário Boom hispano-americano
com outros grandes nomes. Sua obra é vasta e, além de romances, escre-
veu diversos ensaios – grande parte com cunho político.
Principais obras: Los jefes (1959); Los cachorros (1976); La ciudad
y los perros (1963); La casa verde (1966); Conversación en la catedral
(1969); Pantaleón y las visitadoras (1973); La tía Julia y el escribidor
(1977); La guerra de fin del mundo (1981); Historia de Mayta (1984);
¿Quién mato a Palomino Molero? (1986); El hablador (1987); Elogio

– 25 –
Literatura Hispano-Americana

de la madrasta (1988); Lituma en los Andes (1993); Los cuadernos de


Don Rigoberto (1997); La fiesta del Chivo (2000); El paraíso en la otra
esquina (2003); Travesuras de la niña mala (2006); El sueño del celta
(2020); El héroe discreto (2013); Cinco esquinas (2016).

1.3.11 Juan Carlos Onetti (1909-1994)


Figura 1.12 – Juan Carlos Onetti

Fonte: CC BY 2.0

Nasceu em Montevidéu, no Uruguai, foi romancista e contista, consi-


derado o escritor mais importante da literatura do país. Foi um dos maio-
res criadores de ficção em espanhol do século XX. Uma curiosidade é de
que Onetti foi um autodidata bem-sucedido e não chegou a concluir os
anos escolares.
Dedicou-se completamente à produção literária, escrevendo mais de 15
obras que lhe renderam o Prêmio Cervantes de Literatura do ano de 1980.
Principais obras: El pozo (1939); Tierra de nadie (1941); La cara
de la desgracia (1960); Los adioses (1954); Jacob y el otro (1961); El
astillero (1961); Tan triste como ella y otros cuentos (1963); La muerte y
la niña (1973); Un sueño realizado; Para esta noche (1943); La casa en
la arena (1949); La vida breve (1950); Cuando entonces (1987); Dejemos

– 26 –
Introdução e Conceitos Básicos Sobre a Literatura Hispano-Americana

hablar al viento (1979); Cuando ya no importe (1993); Tiempo de abrazar


(1974); La novia robada y otros cuentos (1968); Cuentos secretos (1986);
Presencia y otros cuentos (1986).

1.3.12 Horacio Quiroga (1879-1937)


Figura 1.13 – Horacio Quiroga

Fonte: CC BY 2.0

Nasceu em Salto, no Uruguai, foi contista, dramaturgo e poeta. Seus


contos normalmente abordavam eventos fantásticos e macabros na linha
de Edgar Allan Poe e de temas relacionados à selva. Segundo informações,
a vida do escritor foi muito trágica, pois perdeu o pai quando tinha apenas
5 anos, o padrasto se suicidou, o melhor amigo morreu com um tiro aci-
dental disparado por ele próprio e a esposa e os três filhos se suicidaram.
Quiroga também cometeu suicídio, no Hospital de Clínicas de Bue-
nos Aires, na Argentina, tomando uma dose letal de cianureto após ter sido
diagnosticado com câncer gástrico. Vale salientar que a obra que mais se
destacou foi Cuentos de amor de locura y de muerte, na qual se encontra
o famoso conto La gallina degollada.
Principais obras: Los arrecifes de coral (1901); El crimen del otro
(1904); El almohadón de plumas (1917); Historia de un amor turbio (1908);
Los perseguidos (1905); El salvaje (1920); Las sacrificadas (1920); Ana-

– 27 –
Literatura Hispano-Americana

conda (1921); El desierto (1924); Cuentos de amor de locura y de muerte


(1917); Los desterrados (1926); Suelo natal (1931); Pasado amor (1929).

Da teoria para a prática


Selecionamos um dos contos mais notáveis de Horácio Quiroga, A
galinha degolada, com tradução de Jádson Barros Neves. O autor uru-
guaio teve uma vida marcada por acontecimentos trágicos e tem seu estilo
adaptado magistralmente a assuntos selvagens, às personagens-bichos de
suas narrativas terríveis, algumas com realismo brutal.
Sugerimos que você também faça a leitura desse conto em língua
espanhola, no original Cuentos de amor de locura y de muerte.

Saiba mais

Figura 1.14 – Galinha morta

Fonte: Shuttestock.com/ thiraphonthongaram

A galinha degolada

O dia inteiro sentados num banco do pátio, ficavam os quatro filhos


idiotas do matrimônio Mazzini-Ferraz. Tinham a língua entre os lábios,
os olhos estúpidos vazios e se voltavam com a boca aberta. O pátio era
de chão batido, fechado a oeste por um muro de ladrilhos. O banco

– 28 –
Introdução e Conceitos Básicos Sobre a Literatura Hispano-Americana

ficava paralelo a ele, a uma distância de cinco metros, e ali os filhos se


mantinham imóveis, com os olhos fixos nos ladrilhos. O sol desaparecia
detrás do muro e, ao declinar, os idiotas faziam festa. A princípio, a luz
alucinante chamava sua atenção e, pouco a pouco, seus olhos se anima-
vam: riam finalmente estrepitosos, congestionados pela mesma hilari-
dade ansiosa, contemplando o sol com uma espécie de alegria bestial.

Outras vezes, alienados no banco, zumbiam horas inteiras, imitando o


bonde elétrico. Os ruídos violentos sacudiam desta forma sua inércia
e então corriam, mordendo a própria língua e bramando, ao redor do
pátio. Contudo, quase sempre estavam apagados, imersos na profunda
letargia do idiotismo, e passavam todo o dia sentados em seu banco, com
as pernas suspensas e quietas, empapando a calça de uma saliva grossa.

O mais velho tinha doze anos e o menor, oito. Em todo seu aspecto sujo
e miserável, notava-se a falta absoluta de um mínimo cuidado mater-
nal. Esses quatro idiotas, no entanto, tinham sido um dia o encanto de
seus pais. Com três meses de casados, Manzzini e Berta orientaram seu
estreito amor de marido e mulher, mulher e marido, para um futuro
muito mais vital: um filho. Que maior felicidade para dois apaixonados
que essa honrosa consagração de seu carinho, libertado já do vil ego-
ísmo de um mútuo amor sem objetivo algum e o que é pior para o amor
mesmo, sem esperanças possíveis de renovação?

Assim estavam Mazzini e Berta, e quando o filho nasceu, aos catorze


meses de casamento, acreditaram cumprida sua felicidade. A criança cres-
ceu bela e radiante, até um ano e meio. Porém, no vigésimo mês, sacudi-
ram-na uma noite convulsões terríveis, e na manhã seguinte não conhecia
mais seus pais. O médico examinou-o com essa atenção profissional de
quem está visivelmente buscando o mal nas enfermidades dos pais.

Depois de alguns dias, os membros paralisados recuperaram o movi-


mento; porém a inteligência, a alma, até o instinto se haviam ido tudo:
tinha ficado profundamente idiota, babão, pendente, morto para sem-
pre sobre os joelhos da sua mãe.

– Filho, meu filho querido! – soluçava esta, sobre aquela espantosa


ruína de seu primogênito.

– 29 –
Literatura Hispano-Americana

O pai, desolado, acompanhou-a ao médico.

– A você se pode dizê-lo. Creio que é um caso perdido. Poderá melho-


rar, educá-lo com todas as limitações de seu idiotismo, porém não
mais longe.

– Sim…! Sim – assentia Mazzini.

– Porém, diga-me: você acredita que é hereditário, que…?

– Quanto à hereditariedade paterna, já lhe disse o que acreditava


quando vi seu filho. Respeito sua mãe, mas há ali um pulmão que não
sopra bem. Não vejo nada mais, porém há um sopro um pouco áspero.
Faça com que ela o examine bem.

Com a alma destroçada pela aflição, Mazzini redobrou o amor a seu


filho, o pequeno idiota que pagava pelos excessos do avô. Teve assim
mesmo que consolar, prestar apoio sem trégua a Berta, ferida no mais
profundo por aquele fracasso de sua jovem maternidade.

Como é natural, o casamento pôs todo seu amor na esperança de outro


filho. Nasceu este, e sua saúde e seu riso límpido reacenderam o futuro
extinto. Porém, aos dezoito meses as convulsões do primogênito se
repetiram, e no dia seguinte amanheceu idiota.

Desta vez, os pais mergulharam em profundo desespero. Logo seu san-


gue, seu amor estavam malditos! Seu amor, sobretudo! Vinte e oito anos
ele; vinte e dois, ela, e toda sua apaixonada ternura não conseguia criar
um átomo de vida normal. Já não pediam mais beleza e inteligência
como no primogênito; mas apenas um filho! Um filho, como todos!

Do novo desastre brotaram novas labaredas do dolorido amor, um


louco desejo de redimir uma vez para sempre a santidade de sua ter-
nura. Vieram gêmeos, e ponto por ponto, repetiu-se o processo dos dois
mais velhos.

Mas, por cima de sua imensa amargura, ficava em Mazzini e Berta uma
grande compaixão por seus quatro filhos. Teve que arrancar do limbo
da mais funda animalidade, não já suas almas, senão o instinto mesmo
abolido. Não sabiam deglutir, trocar de lugar, nem mesmo sentar-se.

– 30 –
Introdução e Conceitos Básicos Sobre a Literatura Hispano-Americana

Aprenderam finalmente caminhar, porém se chocavam contra tudo,


por não se dar conta dos obstáculos. Quando os banhavam, mugiam
até injetar-se de sangue o rosto. Animavam-se somente ao comer, ou
quando viam cores brilhantes ou quando ouviam trovões. Riam-se,
então, jogando para fora a língua e rios de baba, radiantes de frenesi
bestial. Tinham, em troca, certa faculdade imitativa; porém não se
pode obter nada mais. Com os gêmeos parecia haver-se concluído a
aterradora descendência. Contudo, transcorridos três anos, desejaram
de novo ardentemente outro filho, confiando em que o longo tempo
transcorrido houvesse serenado a fatalidade.

Não satisfaziam suas esperanças. E nesse ardente desejo que se exas-


perava, em razão de sua infrutuosidade, acidularam-se. Até esse
momento, cada qual havia tomado sobre si a parte que lhe correspon-
dia na miséria de seus filhos; porém a desesperança de redenção ante
as quatro bestas que haviam nascido deles, jogaram fora essa imperiosa
necessidade de culpar aos outros, que é patrimônio específico dos cora-
ções inferiores.

Iniciaram-se com a troca do pronome: teus filhos. E, além do insulto,


havia a insídia, a atmosfera se carregava.

– Me parece – disse-lhe uma noite Mazzini, que acabava de entrar e


lavava as mãos – que poderias deixar mais limpos os meninos.

Berta continuou lendo como si não o houvesse ouvido.

– É a primeira vez – refez-se a tempo – que te vejo inquietar-te pelo


estado de teus filhos.

Mazzini voltou um pouco a cara para ela com um sorriso forçado:

– De nossos filhos, me parece?

– Bom, de nossos filhos. Fica bem assim? – levantou ela os olhos.

Desta vez, Mazzini expressou-se claramente:

– Creio que não vais dizer que eu tenho a culpa, não?

– Ah, não! – sorriu Berta, muito pálida – porém eu tampouco, supo-


nho…! Não faltava mais…! – murmurou.

– 31 –
Literatura Hispano-Americana

– O quê, não faltava mais?

– Que se alguém tem a culpa, não sou eu, entenda-o muito bem! Isso é
o que queria te dizer.

Seu marido olhou-a por um momento, com um brutal desejo de insultá-la.

– Deixemos! – articulou, secando-se por fim as mãos.

– Como quiseres; porém se quiseres dizer…

– Berta!

– Como quiseres!

Este foi o primeiro choque, e lhes sucederam outros. Porém, nas inevi-
táveis reconciliações, suas almas uniam-se com duplo arrebatamento e
loucura por outro filho.

Nasceu assim uma menina. Viveram dois anos com a angústia à flor da
pele, esperando sempre outro desastre. Nada aconteceu, entretanto, e
os pais puseram nela toda sua complacência, que a pequena levava aos
mais extremos limites do mimo e da má criança.

Se assim nos últimos tempos Berta cuidava sempre de seus filhos, ao


nascer Bertita, esqueceu-se quase de todo dos outros. Só sua recordação
a horrorizava, como algo atroz que a houvessem obrigado a cometer. A
Mazzini, bem que em menor grau, acontecia o mesmo.

Não por isso a paz havia chegado a suas almas. À menor indisposição
de sua filha, corria para fora, com o terror de perdê-la, os rancores de
sua descendência podre. Tinham acumulado ressentimento de sobra
para que o vaso ficasse tenso, e ao menor contato o veneno se esva-
ziasse para fora. Desde o primeiro desgosto inoculado, haviam-se per-
dido o respeito; e se há algo que o homem se sente trasladado com cruel
gozo é quando já se começou a humilhar de todo a uma pessoa. Antes
se continham pela mútua falta de êxito; agora que este havia chegado,
cada qual, atribuindo-o a si mesmo, sentia maior a infâmia das quatro
aberrações que o outro lhe havia forçado a conceber.

Com estes sentimentos, não houve já para os quatro filhos maiores


nenhum afeto possível. A empregada doméstica os vestia, dava-lhes de

– 32 –
Introdução e Conceitos Básicos Sobre a Literatura Hispano-Americana

comer, deitava-os, com visível brutalidade. Quase nunca os banhava.


Passavam quase todo o dia sentados de frente para o muro, abandona-
dos de qualquer remota carícia.

Deste modo, Bertita cumpriu quatro anos, e nessa noite, por causa dos
doces que era aos pais absolutamente negar-lhe, a menina teve calafrios
e febre. O temor de vê-la morrer ou tornar-se idiota, tornou a reabrir a
eterna ferida.

Fazia três horas que não se falavam e o motivo foi, como quase sempre,
os fortes passos de Manzini.

– Meu Deus! Não podes caminhar mais devagar? Quantas vezes…?

– Bem, é que me esqueço. Acabou-se. Não o faço de propósito.

Ela sorriu com desdém:

– Não, não te acredito tanto!

– Nem eu, jamais, tinha acreditado tanto em ti… tisiquinha!

– Quê! Quê disseste…?

– Nada!

– Sim, ouvi algo de ti! Olha, não sei o que disseste; porém te juro que
prefiro qualquer coisa a ter um pai como o que tens tido tu!

Manzini ficou pálido.

– Por fim! – murmurou com os dentes cerrados.

– Por fim, víbora, hás dito o que querias!

– Sim, víbora, sim! Porém eu tive pais sadios! Ouves? Sadios! Meu pai
não morreu de delírios! Eu havia de ter tido filhos como os de todo o
mundo! Esses são filhos teus, os quatro, teus!

Mazzini explodiu por sua vez:

– Víbora tísica! Isso é o que lhe disse, o que quero te dizer! Pergunta-o
ao médico, pergunta ao médico quem tem a maior culpa da meningite
de teus filhos: meu pai ou teu pulmão doente, víbora!

– 33 –
Literatura Hispano-Americana

Continuaram cada vez mais com maior violência, até que um gemido
de Bertita selou instantaneamente suas bocas. À uma da manhã, a
ligeira indigestão havia desaparecido, como acontece fatalmente com
todos os casais jovens que têm se amado intensamente uma vez sequer,
a reconciliação chegou, tanto mais efusiva quanto mais ofensivos foram
os ultrajes.

Amanheceu um dia esplêndido, e enquanto Berta se levantava, cuspiu


sangue. As más emoções e a má noite passada tinham, sem dúvida,
grande culpa. Mazzini a reteve abraçada um longo tempo, e ela cho-
rou desesperadamente, porém sem que nenhum se atrevesse a dizer
uma palavra.

Às dez decidiram sair, depois de comer. Como mal tinham tempo,


ordenaram à empregada que matasse uma galinha.

O dia radiante havia arrebatado os idiotas de seu banco. De modo que


enquanto a empregada degolava na cozinha a ave, dessangrando-a com
parcimônia (Berta havia aprendido de sua mãe este bom modo de con-
servar a carne mais fresca), acreditou sentir algo como respiração atrás
dela. Voltou-se, e viu aos quatro idiotas, com os ombros emparelhados
um ao outro, olhando estupefatos a operação… Vermelho… Vermelho…

– Senhora, os meninos estão aqui na cozinha.

Berta chegou; não queria que jamais pisassem ali. E nem ainda nessas
horas de pleno perdão e felicidade reconquistada, podia evitar-se essa
horrível visão! Porque, naturalmente, quanto mais intensos eram os
êxtases de amor a seu marido e sua filha, mais irritado era seu humor
com os monstros.

– Que saiam, Maria! Expulse-os! Expulse-os, lhe digo!

As quatro pobres bestas, sacudidas, brutalmente empurradas, foram


para seu banco.

Depois de almoçar, saíram todos. A empregada foi a Buenos Aires, e o


casal a passear pelas chácaras. Quando o sol baixou voltaram, porém,
Berta quis saudar um momento suas vizinhas de frente. Sua filha esca-
pou-se em seguida rumo a casa.

– 34 –
Introdução e Conceitos Básicos Sobre a Literatura Hispano-Americana

Entretanto os idiotas não se haviam movido todo o dia de seu banco. O


sol já havia transposto o muro, começava a fundir-se, e eles continua-
vam contemplado os ladrilhos, mais inertes do que nunca.

De repente, algo se interpôs entre seu olhar e o muro. Sua irmã, cansada
de cinco horas junto ao pai, queria observar por sua conta. Parada ao
pé do muro, olhava pensativa o cume. Queria subir, isso não oferecia
dúvida. Por fim decidiu-se por uma cadeira, sem fundos, porém faltava
mais. Recorreu então a uma caixa de querosene e seu instinto topográ-
fico fez-lhe colocar o móvel na vertical, com o qual triunfou.

Os quatro idiotas, com o olhar indiferente, viram como sua irmã lograva
pacientemente dominar o equilíbrio, e como, na ponta dos pés, apoiava
a garganta sobre o topo do morro, entre suas mãos delicadas. Viram-na
olhar para todos os lados, e buscar apoio com o pé para elevar-se mais.

Porém o olhar dos idiotas havia se animado. Uma mesma luz insis-
tente estava fixa em suas pupilas. Não afastavam os olhos de sua irmã,
enquanto uma crescente sensação de gula bestial ia transtornando cada
linha de seus rostos. Lentamente avançaram até o muro. A pequena,
que tendo conseguido calçar um pé, ia já montar a cavalo no muro e
a cair do outro lado, seguramente, mas sentiu-se segura pela perna.
Debaixo dela, os oito olhos cravados nos seus lhe deram medo.

– Solta-me! Deixa-me! – gritou sacudindo a perna. Porém foi atraída.

– Mamãe! Ai, Mamãe! Mamãe, papai! – chorou imperiosamente. Tratou


ainda de agarrar-se à borda, porém sentiu-se arrancada e caiu.

– Mamãe, aí! Ma… – Não conseguiu gritar mais. Um deles lhe apertou o
pescoço e os outros arrastaram-na por uma só perna até a cozinha, onde
essa manhã haviam dessangrado a galinha, bem submissa, arrancando-
lhe a vida por segundos.

Mazzini, na casa em frente, acreditou ouvir a voz de sua filha.

– Me parece que te chama – disse-lhe Berta.

Prestaram atenção, inquietos, porém não ouviram mais nada. Contudo,


um instante depois se separaram, e enquanto Berta ia deixar seu cha-
péu, Manzzini avançou no pátio:

– 35 –
Literatura Hispano-Americana

– Bertita!

Ninguém respondeu.

– Bertita! – elevou mais a voz, já alterada.

E o silêncio foi tão fúnebre para seu coração sempre aterrorizado, que
a coluna se lhe gelou de um horrível pressentimento.

– Minha filha! – correu já desesperado até os fundos. Porém ao passar


em frente da cozinha, viu no piso um mar de sangue. Empurrou violen-
tamente a porta entreaberta, e lançou um grito de horror.

Berta, que já se havia lançado correndo por sua vez ao ouvir o aflito
chamado do pai, ouviu o grito e respondeu com outro. Porém ao pre-
cipitar-se na cozinha, Manzini, muito lívido, interpôs-se, contendo-a.

– Não entres! Não entres!

Berta conseguiu ver o piso inundado de sangue. Só pôde jogar seus


braços sobre a cabeça e abraçar-se ao marido com um áspero suspiro.

Figura 1.15 – Machado

Fonte: Shutterstock.com/Photosampler

Após a leitura do conto A galinha degolada, é interessante instigar os


alunos para as seguintes reflexões:

– 36 –
Introdução e Conceitos Básicos Sobre a Literatura Hispano-Americana

a) O universo literário de Quiroga está repleto de temas como decep-


ções, tragédias e tristezas que se lançam sobre a vida das perso-
nagens. Será que há alguma relação com a vida pessoal do autor?
b) Em A galinha degolada, o autor aborda a influência de pessoas
e essa questão é trazida à tona quando os irmãos veem a empre-
gada degolando a galinha e fazem o mesmo com a irmã. Algu-
mas pessoas fazem coisas surpreendentes, como no exemplo, os
irmãos tinham problemas, eram aparentemente inofensivos, mas
degolaram a irmã. Que análise pode ser feita dessa ideologia?
c) Esse conto é um dos mais cruéis do autor, retrata o cotidiano de
uma família que se deteriora por completo em virtude de os pais
não conseguirem gerar um filho “normal”. Trace um paralelo com
o romance brasileiro intitulado O filho eterno, de Cristovão Tezza,
lançado em 2007 e que marcou sua produção literária, apontada
como o ponto mais alto de reconhecimento e de evidência pessoal.
d) A história nos faz refletir sobre o preconceito sofrido pelos defi-
cientes mentais no início do século XX: “O dia todo, sentados num
banco no quintal, estavam os quatro filhos idiotas do matrimônio
Mazzini-Ferraz. Tinham a língua entre os lábios, os olhos estúpi-
dos, e viravam a cabeça com a boca toda aberta.”. Esse preconceito
ainda acontece na atualidade, por parte dos pais ou da sociedade?

Síntese
Neste capítulo, procuramos traçar um breve panorama da litera-
tura hispano-americana, que teve início na época dos conquistadores,
no século XVI, mas somente a partir dos anos 1960 teve visibilidade e
tornou-se conhecida no mundo todo. Referimo-nos a um fenômeno literá-
rio chamado Boom, que marcou definitivamente a historiografia literária,
oportunizando o reconhecimento de vários escritores.
Vimos que os maiores representantes desse movimento foram
Gabriel García Márquez (Colômbia), Julio Cortázar (Argentina), Carlos
Fuentes (México), Mario Vargas Llosa (Peru), entre outros. Após essa
discussão, listamos alguns autores representativos e seus textos modelos

– 37 –
Literatura Hispano-Americana

de produção escrita em língua espanhola. A escolha tentou não distinguir


escolas e épocas, embora os contemporâneos, evidentemente, tenham
recebido prioridade.

Atividades
1. Defina os conceitos e as diferenças entre literatura hispano-ame-
ricana e literatura latino-americana.
2. Leia o seguinte parágrafo:
O público leitor, durante muitos anos, via a América Hispânica
com os olhos do colonizador: como algo raro e exótico. Ocasional-
mente, olhos de turista aliviaram esta visão distanciadora. Hoje, o
contraste com os países europeus e os Estados Unidos não é mais
tão notável. Já se cita Borges, devora-se Cortázar e García Már-
quez e traduz-se Fuentes. A causa das letras hispano-americanas
deixou o reino das Universidades e os centros especializados para
alcançar o leitor comum. (JOSEF, 1989, p. 13)

A partir dessa afirmação, qual é sua opinião sobre a importân-


cia de estudar a literatura hispano-americana?
3. Pesquise dois autores que não foram citados neste capítulo e
escreva um resumo sobre vida e sua
Figura 1.16 – Cinco esquinas,
obra. de Mario Vargas Llosa
4. Leia o romance Cinco esquinas,
de Mario Vargas Llosa, um dos
autores mais importantes da atuali-
dade. Em seguida, escreva um texto
que expresse suas ideias acerca da
sociedade de Lima (Peru) nos anos
1990, na qual acontece a história.

– 38 –
2
Das origens ao Barroco

O presente capítulo procura traçar o surgimento da literatura


hispano-americana. Por isso, veremos que antes da chegada dos
europeus à América havia a presença de alguns povos, como os
maias (na América central), os incas (na cadeia dos Andes) e os
astecas (no planalto do México). Na literatura pré-colombiana,
encontramos raízes literárias e traços culturais, no entanto, é por
meio das cartas de Cristóvão Colombo que inauguramos a litera-
tura de língua espanhola na Hispano-América.
Observaremos que o descobrimento e a conquista do Novo
Mundo, a terra e seus habitantes foram descritos em cartas de
importantes navegadores e missionários, como Hernán Cortés,
Alvar Núñez Cabeza de Vaca, Bartolomé de Las Casas e, sobre-
tudo, Cristóvão Colombo. Sem ambições literárias, relataram
aspectos históricos, políticos, impressões e interpretações desse
momento histórico.
Prosseguindo os estudos, conheceremos a literatura barroca,
suas características, suas principais obras e autores, como Carlos
de Sigüenza y Góngora e Juan del Valle y Caviedes. E daremos
atenção especial à poetisa Sóror Juana Inés de la Cruz, que teve
grande importância literária.
Literatura Hispano-Americana

2.1 Literatura pré-colombiana


Já vimos que a literatura hispano-americana se refere à literatura dos
povos do México, da América Central, da América do Sul e do Caribe,
cuja língua materna é o espanhol. Dessa maneira, o Brasil não faz parte
dessa história. Mas e como essa literatura teve início?
Figura 2.1 – Mapa da América latina

BRASIL

AMÉRICA
LATINA

Fonte: Shutterstock.com/gst.

– 40 –
Das origens ao Barroco

A literatura hispano-americana surgiu com a chegada das três cara-


velas de Colombo ao Continente Americano, no século XVI. É possível
afirmar que no Novo Mundo havia civilizações com culturas próprias e
definidas, no entanto, a maioria foi erradicada. Algumas conseguiram
sobreviver e todas, de uma maneira ou de outra, influenciaram a literatura
em estudo.
Por esse motivo, muitos autores afirmam que antes das cartas dos
colonizadores havia uma rica e importante literatura “pré-hispânica”. De
acordo com Garcia e Serrão (2013),
queremos llamar la atención para el hecho de que la litera-
tura que llegó al continente por las manos de los coloniza-
dores españolas, a servicio de las escrituras oficiales para
la Corona, como el registro de cartas, crónicas de viajes y
documentos eclesiásticos, no debe ser la única y primera
producción literaria y lingüística de América Hispánica.

Importante

22 Entre todas as etnias e variedades linguísticas existentes nas Américas,


os povos que mais se destacaram em suas produções foram os maias,
os incas e os astecas.

22 De acordo com alguns autores, a literatura espanhola não foi a primeira


manifestação literária que circulou nas Américas.

22 A literatura dos colonizadores substituiu o sistema de símbolos e de


imagens culturais pré-existentes; em outras palavras, as criações indí-
genas se misturaram às da cultura hispânica.

22 Para alguns estudiosos, a versão autêntica do processo de criação da


literatura hispano-americana se encontra em crônicas de viagens, docu-
mentos históricos e relações eclesiásticas; ou seja, com a chegada dos
colonizadores, no século XVI.

Na literatura pré-colombiana encontramos as raízes literárias e os tra-


ços culturais deixados pelos povos maias, astecas e incas, cujas criações

– 41 –
Literatura Hispano-Americana

verbais estavam repletas de imagens míticas. Trata-se de um período rico,


antes da chegada de Colombo, e que desencadeou vários caminhos literá-
rios, seja em poesia, seja em prosa.
Mas essa literatura é muito remota e poucas produções foram resgatadas,
visto que havia muitas etnias e formas, o que demonstra certa mestiçagem
literária, uma convivência de dois sistemas: o pré-colombiano e o espanhol.
Saiba mais

No YouTube podem ser encontrados alguns documentários


sobre o universo pré-colombiano. Leia um trecho da resenha do
vídeo intitulado El código Maya.

La civilización maya habitó una vasta región denominada


Mesoamérica, en el territorio hoy comprendido por cinco esta-
dos del sureste de México que son, Campeche, Chiapas, Quin-
tana Roo, Tabasco y Yucatán; y en América Central, en los ter-
ritorios actuales de Belice, Guatemala, Honduras y El Salvador,
con una historia de aproximadamente 3.000 años. Durante ese
largo tiempo, en ese territorio se hablaron cientos de dialectos
que generan hoy cerca de 44 lenguas mayas diferentes. Hablar
de los “antiguos mayas” es referirse a la historia de una de las
culturas mesoamericanas precolombinas más importantes,
pues su legado científico y astronómico es mundial. Contraria-
mente a una creencia muy generalizada, la civilización maya
nunca “desapareció”. Por lo menos, no por completo, pues sus
descendientes aún viven en la región y muchos de ellos hablan
alguno de los idiomas de la familia mayense. La literatura maya
ilustra la vida de esta cultura. Obras como el Rabinal Achí, el
Popol Vuh, los diversos libros del Chilam Balam, son muestra
de ello. Lo que sí fue destruido con la conquista es el modelo
de civilización que hasta la llegada de los primeros españoles,
había generado tres milenios de historia.

Fonte: EL CODIGO Maya. [2010?]. Disponível em: <https://www.


youtube.com/watch?v=wnrOo-WkrY0>. Acesso em: 23 jan. 2018.

Não deixe de assistir!

– 42 –
Das origens ao Barroco

2.2 Literatura dos colonizadores


A literatura hispano-americana não pode ser considerada somente
uma, mas várias, já que corresponde a cada país integrado sob esse
nome genérico. Por ser extensa e apresentar grande produção literária, é
extremamente difícil fazer uma análise minuciosa de cada ponto. Entre-
tanto, a literatura hispano-americana evoluiu muitas vezes independen-
temente e de maneira inerente a suas características; em outras ocasiões,
ligada a outras literaturas, sobretudo a europeia. Ratificando tal afirmação,
Queiroz (1971, p. 22) esclarece que,
Quando se considera a literatura hispano-americana com o intuito
de traçar-lhe a perspectiva, entra pelos olhos a visão caleidoscó-
pica deste mundo novo, de tão complexa formação. Como reduzi-
-la à unidade se, das pirâmides astecas às solidões da Patagônia,
tudo é Hispano-América? Haverá também para tão larga faixa de
terra onde se fala espanhol a possibilidade de síntese literária?

Diante disso, percebemos como a literatura hispano-americana é


vasta e complexa para delimitarmos e abarcarmos toda sua história. Lite-
raturas argentina, uruguaia, paraguaia, venezuelana, chilena, peruana
etc. exigem pesquisas detalhadas; por isso tentaremos, em nosso estudo,
expressar algumas questões importantes para sua compreensão.
Uma dessas questões é o fato de que a versão autêntica do processo
de criação da literatura hispano-americana se encontra em crônicas de
viagens, em documentos históricos e nas relações eclesiásticas. Falamos
anteriormente que alguns autores afirmam que tal literatura teve início
com os indígenas que habitavam as Américas: “Entre todas esas mani-
festaciones, las crónicas merecen un lugar aparte, no sólo en este primer
siglo de colonización, siglo XVI, sino también en los siglos siguientes,
pues marcaron el nacimiento de la literatura hispanoamericana.” (GAR-
CIA; SERRÃO, 2013). Assim, observamos que os elementos pré-hispâ-
nicos, as contribuições espanholas e a aculturação processada ao longo
dos séculos fazem parte de toda a história do surgimento da literatura
hispano-americana.
De acordo com Josef (1989), o primeiro documento que se refere
concretamente à América são as cinco “Cartas” de Colombo, das quais
só quatro são conhecidas. A primeira teve grande destaque por relatar o

– 43 –
Literatura Hispano-Americana

descobrimento e, ainda que não seja uma obra especificamente literária,


difundir a ideia do “bom selvagem” – Colombo descreveu o índio ame-
ricano de maneira amável: “Certifico a Vuestras Altezas – diz o genovês
em seu Diário – que en el mundo creo que no hay mejor gente ni mejor
tierra: ellos aman a sus prójimos como a si mismos y tienen un habla
la más dulce del mundo, y mansa, y siempre con risa.” (FERREIRA,
[1959], p. 13).
Na verdade, as descrições de Colombo estavam longe de repre-
sentar a realidade da terra americana, pois, para exaltar o grande feito,
usou muita imaginação e recursos literários que tiveram grande reper-
cussão na mente dos europeus. No entanto, a obra não foi escrita por
escolha própria, mas por obrigação de informar à Coroa espanhola
tudo que estava acontecendo no processo de exploração e de conquista
das novas terras:
No podemos olvidar que Colón no era un escritor y tampoco un
letrado de la época. Era un gran y ambicioso navegante, que fue
empujado por las circunstancias a escribir sobre las tierras que des-
cubrió, y esto hizo que su producción fuera, en muchos momen-
tos, monótona y meramente informativa. Además, por supuesto,
se puede identificar la interpretación personal del Almirante de
la realidad americana, llena de creencias medievales e imágenes
fabulosas asociadas a la noción de paraíso. (GARCIA; SERRÃO,
2013, p. 7)

Assim, o descobridor da América é considerado o primeiro cro-


nista da literatura hispano-americana, apresentando nos textos sua per-
cepção do mundo desconhecido por meio de um discurso com estilo
lacônico, rápido, usando a terceira pessoa para falar de si mesmo, o
que confere maior formalidade ao texto e, em outras ocasiões, com
estilo poético, altamente emocionante e criativo. Há abundância no
uso de adjetivos e de advérbios de intensidade, além de metáforas e
de imagens usadas para convencer e persuadir o sucesso do descobri-
mento. O resultado foi a invenção de novas terras, novas gentes e de
uma profusão de riquezas.

– 44 –
Das origens ao Barroco

Figura 2.2 – Cristóvão Colombo

Fonte: Shuttestock.com/vkilikov.
Acredita-se que Cristóvão Colombo nasceu em 1451 e faleceu em
1506. Fez quatro viagens ao Novo Mundo e é considerado o pri-
meiro cronista a descrever a América. Foi por meio de seu El Diario,
de suas cartas e de outros documentos que os europeus receberam
informações sobre o Novo Continente, materiais nos quais são
relatadas as características da terra, a forma de vida e suas riquezas.

Entre os cronistas diretamente associados ao descobrimento e à con-


quista, podemos destacar Hernán Cortés (conquistador do México) e Álvar
Núñez Cabeza de Vaca. Apesar de não apresentarem ambições literárias,
assim como Cristóvão Colombo, desempenharam importante papel ao faze-
rem os registros que trouxeram informações sobre o período em que vive-
ram na América. Segundo Garcia e Serrão (2013, p. 5), “todavía, vale apun-
tar que en este período surgieron las primeras manifestaciones de la crónica

– 45 –
Literatura Hispano-Americana

propiamente dicha, con la intención de ser más amplia, más reflexiva, que
presentaban cuestiones relacionadas al sometimiento de las culturas aborí-
genes, la evangelización y el proceso de formación de la colonia”.

Figura 2.3 – Hernán Cortés

Fonte: www.biography.com.
Hernán Cortés (1485-1547) foi o grande protagonista da conquista
do México: “Al llegar a esas tierras, Cortés entró en contacto con las
culturas mexicanas, muy desarrolladas para su sorpresa, pero que
no lo hicieron volver o desistir de su objetivo.” (GARCIA; SER-
RÃO, 2013, p. 8). Suas Cartas de relación, cinco no total, foram as
que mais se destacaram literariamente nas crônicas da conquista.
Vale ressaltar que o autor espanhol descreveu o povo asteca, suas
instituições e seus costumes com grande interesse. Era um homem
letrado, que foi em busca de novas terras e riquezas, corajoso e hábil
guerreiro, político fino e sagaz. Como ratifica Bandeira (1960),
Cortés merece ser exaltado tanto pela bravura quanto pela visão
política: em sua igual aptidão para as armas e para as letras.
Os trechos mais importantes das Cartas de relación tratam
do encontro do conquistador com a paisagem e a civilização
asteca, que o seduziram para o resto da vida, e se referem a
sua atuação como governante e explorador de novas terras.
Para ler um fragmento da obra na qual o autor descreve a
cidade de Tenochtitlán, acesse o site da biblioteca mexicana

– 46 –
Das origens ao Barroco

(<http://www.biblioteca.tv/artman2/publish/1522_275/
La_Gran_Tenochtitl_n_por_Hern_n_Cort_s_456.shtml>).

É possível notarmos que algumas obras transmitem um pouco da


visão dos conquistadores espanhóis ao chegarem ao Novo Mundo e se
depararem com uma natureza exuberante e com os indígenas. Todas as
obras estão relacionadas a um mesmo contexto histórico, mas com especi-
ficidades e características inerentes a cada um dos conquistadores e nave-
gantes. Além da imaginação, “ellos traen en las naves la transcendência de
una España católica que ganó la guerra de Reconquista, la transición entre
el mundo medieval y el pensamiento Renacentista, y trajo también una
nueva lengua y un patrón cultural, elementos que, fundidos, dan el tono de
una nueva literatura” (GARCIA; SERRÃO, 2013).
Diante disso, comprovamos que a literatura dos países hispano-ame-
ricanos começou como um capítulo colonial da literatura espanhola. E
assim como a carta de Pero Vaz de Caminha iniciou a literatura de língua
portuguesa, as cartas de Colombo inauguram a literatura de língua espa-
nhola na Hispano-América.

Figura 2.4 – Álvar Núñez Cabeza de Vaca

Fonte: www.ivoox.com.

– 47 –
Literatura Hispano-Americana

Não podemos afirmar os dados do nascimento e da morte de


Cabeza de Vaca, mas alguns escritores trazem as datas de 1490-
1556 e narram que, durante a vida, ele desempenhou várias funções
de acordo com o momento que vivia e as situações a que estava
exposto: foi aventureiro, soldado, escravo, náufrago, comerciante,
curandeiro, camareiro, governador, prisioneiro e escritor.
Sua interessante e incrível trajetória é descrita por López (c2017),
quando diz que Cabeza de Vaca salió de España en el 1527 y
naufragó varias veces. En tierra pasó penurias, luchas, hambre,
etc. Cautivo de los indios, es maltratado por unos y por otros
idolatrado. Recorrió a pie una enorme masa del continente,
desde el Golfo de México al de California. Nueve años de cauti-
verio lo convirtieron en un indio más; andaba desnudo y comía
como los indios. De ellos solo le diferenciaba su fe cristiana.
Escreveu Naufragios, obra elaborada para a Coroa espanhola e
que exibe suas aventuras em detalhes reveladores, com estilo
rápido, emocionante e fluido; publicada pela primeira vez em
Zamora, na Espanha, em 1542. Cabeza de Vaca “fue, sin dudas,
el que más distancias recorrió en varias regiones de América, y
anotó en su diario de náufrago, Naufragios, un verdadero relato
antropológico de las etnias por él encontradas y de las tier-
ras por donde pasara.” (GARCIA; SERRÃO, 2013, p. 8).

Outro fato interessante que precisamos destacar foi a contribuição


dos missionários. A conquista política do Novo Mundo, alcançada de
maneira definitiva com os vice-reinados e as capitanias, foi seguida da
espiritual, de responsabilidade da Igreja. Por meio da instrução dos índios,
visava-se à evangelização: os missionários foram os mestres improvisados
para transmitir a nova língua e a nova fé (JOSEF, 1989).
Como dissemos, a missão dos padres era evangelizar, civilizar, o
que não aconteceu sem abusos cruéis. Há muitos relatos na história sobre
essa questão, mas alguns membros do clero deixaram documentos notá-
veis sobre a cultura índia. O padre Bartolomé de las Casas (1484-1566)
se destaca na defesa dos índios posicionando-se contra a crueldade dos
conquistadores, não ficando indiferente ao genocídio e aos extermínios
violentos e tentando de todas as formas uma colonização pacífica. Como
tinha voz ativa perante as autoridades civis e eclesiásticas da Espanha,
escreveu livros que tiveram grande repercussão e iniciou sua campanha

– 48 –
Das origens ao Barroco

– as Novas Leis – em 1542, que regulamentava o estatuto dos índios,


impedindo que fossem escravizados. Na primeira junta dos bispos mexi-
canos, em 1546, las Casas conseguiu a Declaración de los derechos de
los indígenas.
Sua obra está associada a sua experiência na expansão do território da
região do Caribe e também ao debate do tratamento ao índio americano.
Escreveu quatro grandes livros: A historia de las Indias, que vai da Des-
coberta até 1520; Historia apologética de las Indias; Brevísima relación
de la destruición de las Indias; e Del único modo de atraer a todos los
pueblos a la Verdadera Religión. Seu estilo seguia uma linguagem simples
e clara e era marcado por argumentos fortes e críticos.
Figura 2.5 – Bartolomé de Las Casas

Fonte: www.biography.com.

Com a transformação do conquistador espanhol em colonizador, os


índios pacificados e distribuídas as encomiendas (trabalho imposto aos
indígenas), as cidades começaram a ser erguidas; com a urbanização
e a posse de grandes propriedades rurais, a sociedade aristocrática foi
consolidada: assim surgiram as primeiras universidades espelhadas no
padrão europeu.

– 49 –
Literatura Hispano-Americana

2.3 Barroco
O estilo Barroco surgiu depois da época renascentista, no século
XVII, e foi o primeiro movimento artístico hispano-americano, no qual
houve renovação poética por meio de metáforas, hipérbatos, antíteses,
assíndetos, perífrases, simetrias, entre outros. Para Rodríguez (2004),
el barroco es pues el estilo de lo suntuoso, que estima lo remoto,
los mitos, las elucubraciones místicas y deducciones filosóficas.
Explora formas, se deleita en acertijos y en oscuridades que no
pocas veces degeneran en galimatías. Un estilo que dilapida sus
recursos, que revela de manera manifiesta la vanidad del escritor.

¿Tu sabías?
Según el Diccionario de la Real Academia de la Lengua, la palabra
“barroco” viene del francês “baroque”, y este resultante de fundir en
un vocablo Baroco, figura de silogismo, y el portugués “barroco”,
perla irregular. El Barroco significa eso, joya, adorno, lujo, esplen-
dor que evita la regularidad monótona de las normas clásicas del
Renacimiento y se explaya en movimiento, acción, voluntad, retor-
cimiento, luces y sombras, en un afán de novedosidad, “ingenio” o
artificio frente al “genio natural” renacentista, artificiosidad frente a
naturalidad, originalidad ingeniosa frente a genialidad natural. Se ha
llamado al Barroco, en oposición al Renacimiento, la decadencia del
Renacimiento. Para otros autores, el Barroco es la cumbre y perfec-
ción del Renacimiento. Para otros la palabra “barroco” deriva de la
figura lógica “baroco” en el sentido de extravagante, excéntrico, raro.
Fonte: López (c2017).

A asserção de López (c2017) acerca da origem da palavra nos leva a


vários caminhos e possibilidades de sua construção , conduzindo-nos a com-
preender um pouco de sua natureza ambígua ao mesmo tempo que nos apre-
senta a riqueza desse estilo literário. Assim, torna-se importante dizer que
alguns críticos subdividem o Barroco em três fases, mas separá-las não é uma
tarefa fácil – é um tanto confuso e complexo. Segundo Josef (1989), são:
1) Maneirismo (1530-1620) – Forma tardia de Renascimento, um
estilo pré-barroco que se caracteriza por aspectos ornamentais

– 50 –
Das origens ao Barroco

marcantes, contesta e prolonga o Renascimento, reestruturando


suas formas, numa dúvida interior que se transformará no conflito
do Barroco.
2) Barroco (1570-1730) – Estilo notavelmente visual, cuja ideo-
logia deriva da Contrarreforma. Caracteriza-se pelo contraste e a
tensão de contrários, aplicando a regra aristotélica da unificação.
3) Rococó (1715-1780) – Época de crise e interpenetração de
tendências, procura de simplicidade e proporção sob a inspiração
da natureza.

Mas o que nos interessa aqui é destacar que o Barroco comparti-


lha com o Renascimento algumas características como a aspiração pela
beleza, a admiração pela mitologia greco-romana e o culto à poesia. Con-
tudo, os conceitos renascentistas de equilíbrio, harmonia e clareza são
substituídos, no Barroco, pela tensão psicológica entre o ser e o parecer, o
contraste e a dualidade de sentimentos.
Examinaremos melhor essas características nas obras e em alguns
aspectos biográficos de dois grandes eruditos da época: Carlos de Sigüenza
y Góngora e Juan del Valle y Caviedes. Daremos, ainda, atenção especial à
poeta Sóror Juana Inés de La Cruz, que Figura 2.6 – Carlos de Sigüenza y Góngora
teve grande importância literária pela
excelência de sua produção sobre o
amor, principalmente nos poemas que
versam sobre a ausência e o ciúme.
Carlos de Sigüenza y Góngora
(1645-1700) nasceu no México e foi
um polígrafo interessado na arqueo-
logia pré-colombiana, na astronomia,
na física e na matemática. Foi tam-
bém humanista, filósofo e escritor,
destacando-se na retórica barroca
com Primavera indiana, poema dedi-
cado à Nossa Senhora de Guadalupe,
e Triunfo parténico.
De acordo com López (c2017),
Fonte: eluniversal.com.

– 51 –
Literatura Hispano-Americana

escribió la primera novela americana con el larguísimo título


de Infortunios de Alonso Ramírez, natural de la ciudad de San
Juan de Puerto Rico, padeció allí en poder de ingleses piratas que
lo apresaron en las Islas Filipinas, navegando por sí solo y sin
derrota, hasta parar en la costa de Yucatán, consiguiendo por este
medio dar la vuelta al mundo (1690). Es un delicioso ensayo de
novela de aventuras. Se ha visto en esta novela rasgos de la novela
picaresca española al estilo del Lazarillo de Tormes (1554).

Para conhecermos melhor as características de sua obra, vejamos as


cinco primeiras estrofes de Primavera indiana, o extenso poema sacro-his-
tórico publicado em 1668, que é um dos documentos mais importantes para
uma psicanálise do inconsciente do povo mexicano. No total, tem 79 estrofes.

I
Si merecí Calíope tu acento
de divino furor mi mente inspira,
y en acorde compás da a mi instrumento,
que de marfil canoro, a trompa aspira.
Tu dictamen: atienda a mi concento
cuanto con luces de sus rayos gira
ardiente Febo sin temer fracaso
del chino oriente, al mexicano ocaso.

II
Oiga del septentrión la armoniosa
sonante lira mi armonioso canto
correspondiendo a su atención gloriosa
del clima austral el estrellado manto.
Alto desvelo pompa generosa
del cielo gloria, del Leteo espanto
que con voz de metal canta Talía
o nazca niño el sol, o muera el día.

III
Rompa mi voz al diáfano elemento
los líquidos obstáculos, y errante
encomiendo a sus alas el concento,
que aspira heroico a persistir diamante.
Plausible empresa, soberano intento,
que al eco del clarín siempre triunfante

– 52 –
Das origens ao Barroco

de la fama veloz monstruo de pluma,


sonará por el polvo y por la espuma.

IV
Si indigna copa a metros raudales
la atención se recata, temerosa
de investigar con números mortales
la inmortal primavera de una rosa.
Al acorde murmullo de cristales,
que Hipocrene dispende vagarosa,
afecte dulce el de Libetra coro
la voz de plata, las cadencias de oro.

V
Matiz mendigue de la primavera,
que afectuoso venero, humilde canto
de Amaltea la copia lisonjera
el de Fabonio colorido manto.
Mientras clarín de superior esfera,
en fijos polos, el florido espanto,
publica del invierno, que volantes
copos, anima en flores rozagantes.
[…]
Fonte: Sigüenza y Góngora (1668).

Figura 2.7 – Obra Diente Del


Passemos agora a outro escritor que se Parnaso, de Juan del Valle y Caviedes
destacou no período barroco: Juan del Valle
y Caviedes (1645-1697), que nasceu na
Espanha e se mudou para Lima (Peru) ainda
criança. Era crítico social e político e denun-
ciou as deficiências e as hipocrisias dos admi-
nistradores coloniais hispano-americanos.
Sua mais importante obra é Diente del Par-
naso, com poemas de sátira social em grande
Fonte: Bulzoni Editore.

número dirigidos aos médicos limenhos.


Nessa obra, é possível percebermos
que Caviedes tinha problemas de saúde e os
médicos que o tratavam não estavam certos

– 53 –
Literatura Hispano-Americana

de suas doenças ou não podiam curá-las, por isso escreveu muitas sátiras
de poder agressivo. O fato começou quando, em 1683, adoeceu grave-
mente. Alguns críticos também defendem a ideia de que o poeta odiava os
médicos por causa da morte de sua mulher. Vejamos um de seus poemas:

Poema a un medico tuerto

Tuerto dos veces, por vista


La una y la otra por ciencia.
Pues en la endiablada tuya
Nunca haces cosas a derechas.

No llames siempre ante-ojos


A los que traes, porque a medias
Ante-tuerto has de llamarlos.
Pues la mitad está a ciegas.

Si no tienes más que un ojo


Ociosa está una vidriera:
Parece remedio tuyo
Por cosa que no aprovecha.
Sin embargo eres el rey

En la medical ceguera;

si todos a ciegas curan


Tú no, que curas a tuertas.

Tu vista nadie la entiende,


Pues si se repara en ella
Tú no miras sino apuntas,
Tú no ves sino que asestas

¿Cómo si apuntando curas


No atinas con las recetas,
Pues das tan lejos el mal
Que todas las curas yerras?

A los enfermos les comes


Las comidas y aun las cenas
Para hacerles este mal

– 54 –
Das origens ao Barroco

Y que se mueran de dieta.

Ayúdales a beber
Tus malditas purgas puercas,
Y les darás media vida
Y tú tendrás otra media.

De las ayudas aleves


Pero también, que les hechas,
Y ejercitaras dos ojos
Que en un tuerto es cosa nueva.

Que el comerle las viandas


No es curarle las dolencias,
Sino curarte del hambre
Canina que te atormenta.

Si con los enfermos curas


Tus hambres y tus pobrezas
Ellos los médicos son
Tú el enfermo que remedian.

Media visita debían


Pagarte, en Dios y en conciencia,
Que quien medio ve al enfermo
No debe llevarla entera.

Del Callao te han echado


Con descrédito de albéitar,
Por enjalma de Galeno,
Por limillo de avicena.

Hínchate, doctor, de paja,


Que las albardas rellenas
No matan tanto, y tendrás
Hecho tu plato con ellas.

Que eres albarda no hay duda,


Y me remito a la prueba,
Pues la medicina tuya
Por ser de albarda esta en jerga.
Fonte: Valle y Caviedes (1947).

– 55 –
Literatura Hispano-Americana

Caviedes também escreveu poesias líricas, nas quais se mostra discí-


pulo dos conceptistas nos jogos de simetria verbal e nos equívocos, assim
como deixou poemas de inspiração religiosa. Sem estudos universitários,
en su Carta a Sor Juana se enorgullece de que su única universi-
dad había sido su espíritu y que había aprendido más de los hom-
bres que en los libros. Su poesía –satírica, pero también religiosa y
lírica– es de lo más fresco del Perú colonial. Su poesía representa
la reacción popular frente a un barroquismo en exceso amanerado
y culto; todo ello impregnado de un hondo sentimiento existencial.
(LÓPEZ, c2017)
Figura 2.8 – Juan del Valle y Caviedes

Fonte: poetassigloveintiuno.blogspot.com.br.

Agora conheceremos o maior ícone barroco: Sóror Juana Inés de la


Cruz, também chamada de A décima musa e A fénix da América (Dice
que yo soy la Fênix/que burlando las edades/ya se vive, ya se muere,/ya
se entiera, ya de nace), a primeira feminista do Novo Mundo. Desde a
primeira infância, revelou extraordinária precocidade intelectual.
A vida dessa poeta autodidata e questionadora de dogmas religiosos
teve grande destaque no México colonial e, até hoje, é lembrada ao lado
de Frida Kahlo, Marta Lamas, Marcela Lagarde e Florinda Lazos Léon.

– 56 –
Das origens ao Barroco

Figura 2.9 – Sóror Juana Inês de la Cruz

Fonte: www.antoniomiranda.com.br.

Juana Inês de La Cruz (ou seu nome completo Juana Inés de Asbaje
y Ramírez de Santillana Gonzáles y España) nasceu em 1651, no México,
e morreu em 1695. Aos 3 anos de idade, aprendeu a ler e a escrever, pois
estudava na biblioteca de seu avô, Pedro Ramírez; aos 8 anos, escreveu
um louvor eucarístico; aos 16 anos, pediu à mãe que a matriculasse em
uma escola, porém não obteve sucesso. Instigada pelo jesuíta Antonio
Núñez de Miranda, decidiu entrar no convento de San José de los Carmeli-
tas Descalzas para estudar. Deixou esse convento e entrou em outro – San
Jerónimo – menos rigoroso, no qual permaneceu pelo resto de sua vida.
Adquiriu conhecimentos das mais diversas disciplinas, como Teolo-
gia, Astronomia, pintura, línguas, Filosofia e música. Tinha uma biblioteca
com mais de 4 mil livros, da qual teve de se livrar devido à perseguição
que sofria. Com vontade de aprender, conseguiu destaque na sociedade, o
que a tornou próxima da realeza, para quem escrevia poe-
sias e tocava vários instrumentos musicais.
É interessante mencionarmos que ela surgiu nas cédu-
las mexicanas de alta denominação. Inicialmente apareceu

– 57 –
Literatura Hispano-Americana

nas cédulas de mil pesos, que saiu de circulação; depois, nas cédulas de
200 pesos. Tornou-se freira e chegou ao cargo mais alto: Sóror. Dedicou-se
à vida religiosa sem deixar de escrever poesias que falassem de amor.

Que da medio para amar sin mucha pena

Yo no puedo tenerte ni dejarte,


ni sé por qué, al dejarte o al tenerte,
se encuentra un no sé qué para quererte
y muchos sí sé qué para olvidarte.

Pues ni quieres dejarme ni enmendarte,


yo templaré mi corazón de suerte
que la mitad se incline a aborrecerte
aunque la otra mitad se incline a amarte.

Si ello es fuerza querernos, haya modo,


que es morir el estar siempre riñendo:
no se hable más en celo y en sospecha,

y quien da la mitad, no quiera el todo;


y cuando me la estás allá haciendo,
sabe que estoy haciendo la deshecha.
Fonte: De la Cruz (S.d.).

Figura 2.10 – Estátua de Juana Inês da Cruz dedicado


Há cerca de 65 sonetos pelo México a Madri, Espanha
que versam sobre temas varia-
dos como a filosofia, o amor,
a mitologia e a moral, mas
sem dúvida o destaque maior
fica em seu discurso amoroso.
Segundo críticos, Primero
Sueño, publicado em 1692, é
o poema mais importante da
poetisa, com 975 versos.

Fonte: Shutterstock.com/Pixachi.

– 58 –
Das origens ao Barroco

Da teoria para a prática


Um dos melhores poetas do Barroco no Peru foi Juan del Valle y
Caviedes (1655-1695). Muitos críticos o denominaram como Boca do
Inferno da sociedade de Lima, por suas sátiras irreverentes e mordazes.
Gregório de Matos Guerra (poeta do Barroco da literatura brasileira) e
Caviedes realmente apresentam muitas semelhanças na vida e na obra.
Ambos exibiram talento multifacetado e produziram poesias satíricas, líri-
cas e religiosas.
Pesquise sobre esses dois grandes poetas e construa uma comparação
entre eles.

Síntese
Neste capítulo, vimos que na literatura pré-colombiana podemos
encontrar raízes literárias e traços culturais deixados pelos povos maias,
astecas e incas. Foi um período rico, antes da chegada de Cristóvão
Colombo, e que desencadeou vários caminhos literários, seja em poesia,
seja em prosa. Mas a versão autêntica do processo de criação da literatura
hispano-americana se encontra em crônicas de viagens, documentos his-
tóricos e relações eclesiásticas; ou seja, com a chegada dos colonizadores,
no século XVI.
Estudamos também sobre o Barroco, um estilo que surgiu depois
da época renascentista, no século XVII. Trata-se do primeiro movimento
artístico hispano-americano, no qual houve renovação poética por meio
de metáforas, hipérbatos, antíteses, assíndetos, perífrases, simetrias, entre
outras características relevantes.
Por fim, destacamos algumas particularidades barrocas na obra e
na vida de Carlos de Sigüenza y Góngora, Juan del Valle y Caviedes, e,
em especial, Sóror Juana Inés de la Cruz, que teve grande importância
literária pela excelência de sua produção que discorre, principalmente,
sobre o amor.

– 59 –
Literatura Hispano-Americana

Atividades
1. Leia um trecho de um dia do registro do diário de Cristóvão
Colombo e observe a descrição do Novo Mundo feita por esse con-
quistador. Depois responda: como Colombo descreveu os indíge-
nas? Como ele analisou os povos encontrados no Novo Mundo?

Figura 2.11 – Estátua de Cristóvão Colombo em Barcelona,


Espanha

Fonte: Shutterstock.com/Marco Giovanelli.

Jueves, 11 de octubre de 1492

[…] Puestos en tierra vieron árboles muy verdes y aguas


muchas y frutas de diversas maneras. El Almirante llamó a los
dos capitanes y a los demás que saltaron en tierra, y a Rodrigo
de Escobedo, Escribano de toda la armada, y a Rodrigo Sánchez
de Segovia, y dijo que le diesen por fe y testimonio como él por
ante todos tomaba, como de hecho tomó, posesión de la dicha
isla por el Rey y por la Reina sus señores, haciendo las protesta-
ciones que se requerían, como más largo se contiene en los tes-
timonios que allí se hicieron por escripto. Luego se ayuntó allí
mucha gente de la Isla. Esto que se sigue son palabras formales
del Almirante, en su libro de su primera navegación y descubri-
miento de estas Indias: “Yo (dice él), porque nos tuviesen mucha

– 60 –
Das origens ao Barroco

amistad, porque conocí que era gente que mejor se libraría y


convertiría a nuestra Santa Fe con amor que no por fuerza, les
di a algunos de ellos unos bonetes colorados y unas cuentas
de vidrio que se ponían al pescuezo, y otras cosas muchas de
poco valor, con que hubieron mucho placer y quedaron tanto
nuestros que era maravilla. Los cuales después venían a las bar-
cas de los navíos adonde nos estábamos, nadando, y nos tra-
ían papagayos y hilo de algodón en ovillos y azagayas y otras
cosas muchas, y nos las trocaban por otras cosas que nos les
dábamos, como cuenticillas de vidrio y cascabeles. En fin, todo
tomaban y daban de aquello que tenían de buena voluntad. Mas
me pareció que era gente muy pobre de todo. Ellos andan todos
desnudos como su madre los parió, y también las mujeres, aun-
que no vide más de una harto moza. Y todos los que yo vi eran
todos mancebos, que ninguno vide de edad de más de treinta
años: muy bien hechos, de muy fermosos cuerpos y muy buenas
caras: los cabellos gruesos cuasi como sedas de cola de caballos,
e cortos: los cabellos traen por encima de las cejas, salvo unos
pocos de tras que traen largos, que jamás cortan. Dellos se pin-
tan de prieto, y ellos son de la color de los canarios, ni negros
ni blancos, y dellos se pintan de blanco, y dellos de colorado, y
dellos de lo que fallan, y dellos se pintan las caras, y dellos todo
el cuerpo, y dellos solos los ojos, y dellos sólo la nariz. Ellos
no traen armas ni las conocen, porque les amostré espadas y
las tomaban por el filo, y se cortaban con ignorancia. No tienen
algún fierro, sus azagayas son unas varas sin fierro, y algunas de
ellas tienen al cabo un diente de pece, y otras

de otras cosas. Ellos todos a una mano son de buena estatura


de grandeza y buenos gestos, bien hechos. Yo vide algunos que
tenían señales de feridas en sus cuerpos, y les hice señas qué era
aquello, y ellos me amostraron como allí venían gente de otras
islas que estaban acerca y les querían tomar y se defendían. Y yo
creí e creo que aquí vienen de tierra firme a tomarlos por capti-
vos. Ellos deben ser buenos servidores y de buen ingenio, que
veo que muy presto dicen todo lo que les decía, y creo que lige-

– 61 –
Literatura Hispano-Americana

ramente se harían cristianos; que me pareció que ninguna secta


tenían. Yo, placiendo a Nuestro Señor, llevaré de aquí al tiempo
de mi partida seis a Vuestra Alteza para que deprendan fablar.
Ninguna bestia de ninguna manera vide, salvo papagayos en
esta Isla.” Todas son palabras del Almirante.

Fonte: Colombo (1492).

2. Assista ao filme Cabeza de Vaca, Figura 2.12 – Filme Cabeza de Vaca


no qual são narradas as aventuras
do conquistador espanhol Álvar
Núñez Cabeza de Vaca na Amé-
rica. O filme foi produzido no
México, em 1991, com direção
de Nicolás Echevarría. A história
é muito interessante, repleta de
incidentes, pois foi aventureiro,
soldado, escravo, náufrago,
comerciante, curandeiro, cama-
reiro, governador, prisioneiro e
escritor. Depois, faça comentá-
rios acerca da vida e da trajetória
desse grande herói.

3. Leia um fragmento da poe-


Fonte: www.ensinarhistoriajoelza.com.br.
sia Amor importuno, de Sóror
Juana Inés de La Cruz, liste algumas características barrocas e
comente a importância dessa poetisa para o mundo literário.

Amor importuno

Dos dudas en que escoger


Tengo, y no se a cual prefiera,
Pues vos sentís que no quiera
Y yo sintiera querer.

– 62 –
Das origens ao Barroco

Con que si a cualquiera lado


Quiero inclinarme, es forzoso
Quedando el uno gustoso
Que otro quede disgustado.

Si daros gusto me ordena


La obligación, es injusto
Que por daros a vos gusto
Haya yo de tener pena.

Y no juzgo que habrá quien


Apruebe sentencia tal,
Como que me trate mal
Por trataros a vos bien.

Mas por otra parte siento


Que es también mucho rigor
Que lo que os debo en amor
Pague en aborrecimiento.

Y aun irracional parece


Este rigor, pues se infiere,
Si aborrezco a quien me quiere
¿qué haré con quien aborrezco?
[…]
Fonte: De la Cruz (S.d.).

4. Carlos de Sigüenza y Góngora foi filósofo, historiador, físico,


astrônomo, matemático e poeta. Ilustre cientista e escritor res-
peitado, seus textos se caracterizaram por uma carga minuciosa
do gosto barroco, ricos em procedimentos técnicos na lingua-
gem. Leia a seguir um dos seus poemas mais famosos, intitu-
lado Soneto del triunfo parténico, e registre a sua impressão
sobre a temática abordada pelo autor:

Soneto del triunfo parténico

Si celeste, si cándida, si pura


es etérea azucena al Sol luciente,

– 63 –
Literatura Hispano-Americana

cuando indultando a Delos por su Oriente


privilegia de intacta su hermosura,

¿cómo pudo el borrón de sombra impura


profanar su excepción? ¿Cómo indecente
villana espina horrorizar ardiente
la luz nevada que aun en Delos dura?

Si en la sombra no hay sombra, si en la idea


la mancha falta, no queriendo el Día
que menos que de luz su cuna sea,

¿cómo el Original? ¿Cómo podía


hallarse impuro con la culpa fea,
siendo de luz la sombra de María?

Fonte: Disponível em: https://www.ecured.cu/Carlos_de_


Sig%C3%BCenza_y_G%C3%B3ngora. Acesso em 17 mar. 2018.

Figura 2.13 – Barroco

Fonte: Shutterstock.com/JurateBuiviene.

– 64 –
3
Século XIX: do
Romantismo
ao Realismo

O presente capítulo procura abordar, em um primeiro


momento, a estética literária chamada Romantismo. Veremos
algumas características e as principais obras de Esteban Echever-
ría, José Mármol, Jorge Isaacs; e, na poesia gauchesca, Domingo
Faustino Sarmiento e José Hernández.
O Romantismo teve início na época da independência de
alguns países latino-americanos. As principais características
encontradas nas obras são a subjetividade, o sentimentalismo, a
liberdade artística, o amor, a paixão, a morte trágica, o amor à
pátria, as temáticas indígenas e a história política.
Em um segundo momento, apresentaremos o movimento
realista, manifestação que retratava objetivamente a realidade,
na qual a razão e a observação predominavam sobre o sentimento
e a imaginação. Para isso, estudaremos os autores Alberto Blest
Gana, Clorinda Matto de Turner e Eduardo Acevedo Díaz.
Literatura Hispano-Americana

3.1 Características
O Romantismo surgiu em um momento histórico em que os paí-
ses latino-americanos (com exceção de Porto Rico e de Cuba) viviam a
inquietação da independência. Nesse contexto, ocorreu uma revolução na
política e também na literatura. De acordo com López (c2017), as caracte-
rísticas do movimento romântico podem ser assinaladas como:
22 influência de autores franceses como Jean-Jacques Rousseau,
François-René de Chateaubriand e Bernardin de Saint-Pierre;
22 amor impedido por diferenças de raça ou de classe como enredo
mais comum;
22 heroína que confere, muitas vezes, o nome à narrativa;
22 amores que terminam em tragédia, com a morte de um dos amantes;
22 forte presença do religioso-católico, em geral das correntes tra-
dicionais e conservadoras do Romantismo europeu;
22 sentimentalismo exacerbado;
22 história dos povos e evocação de um passado nacionalista.
A abordagem da história pode ser entendida como a busca do passado
e dos elementos da identidade do país – podemos dar o exemplo dos poe-
mas sobre os pampas. E devemos acrescentar que o Romantismo refor-
çou os sentimentos de identidade de cada uma das nações porque tinha o
intuito de mostrar as particularidades da alma popular, como sua história,
sua linguagem e sua cultura. Vejamos mais algumas características:
El romanticismo hispanoamericano se asociaba casi exclusiva-
mente con el liberalismo de los autores europeos como el francés
Victor Hugo que los conservadores como Chateaubriand. Los ele-
mentos principales del estilo romántico incluyeron el subjetivismo,
el sentimentalismo y la libertad artística. El amor y la pasión, la
muerte trágica, la libertad del individuo, la devoción patriótica y
la independencia eran los temas esenciales en el movimiento, aun-
que el romanticismo hispanoamericano también se enfocó en los
temas del indio y el esclavo y la historia política. Los románticos
rechazaron el lenguaje convencional de los neoclásicos y renova-
ron el estilo linguística con los regionalismos y el habla del pueblo
indígena. (CAMACHO, 2014, s/p)

– 66 –
Século XIX: do Romantismo ao Realismo

Camacho (2014) mostra características típicas que alimentam todas


as perspectivas românticas, como a subjetividade, o sentimentalismo, a
liberdade artística, a morte trágica, o amor à pátria, o enfoque aos temas
do indianismo e a história política. Também não podemos nos esque-
cer de mencionar o fato de que o homem e a natureza são
um mesmo elemento, ou seja, os personagens românticos se
confundem com o cenário natural como uma extensão dos
próprios sentimentos.

3.2 Principais autores Figura 3.1 – Esteban Echeverría


O Romantismo hispano-ameri-
cano (1830-1890), apesar de não ter
se caracterizado por uma ruptura com
o passado, deu um upgrade na temá-
tica literária. O autor argentino Eche-
verría ofereceu os pampas aos poetas
e, assim como Mármol, bradou contra
o ditador Juan Manuel de Rosas em
sua obra; já Isaacs provou à América
que na Colômbia não havia somente
gramáticos e filólogos (QUEIROZ,
1971). Contudo, o Romantismo
trouxe a semente do Modernismo. O
grupo que se formou foi de poetas,
historiadores, sociólogos, políticos e
militares, simultaneamente – homens
de pensamento e de ação.
Fonte: www.cervantesvirtual.com.
Esteban Echeverría (1805-
1851) fundamentou em sua literatura a crueldade e o amargor da dita-
dura rosista. Para entendermos melhor a história, precisamos destacar
que Juan Manuel José Domingo Ortiz de Rozas y López de Osor-
nio foi um político e militar argentino. Com o mesmo status de um pre-
sidente da República, governou em um regime brutal a Província de
Buenos Aires, uma das mais importantes do território no período; e todo

– 67 –
Literatura Hispano-Americana

esse horror foi refletido na obra de Echeverría, que acreditava que a obri-
gação do escritor era lutar contra a ignorância de uma ditadura.
É importante salientar que Echeverría iniciou o movimento român-
tico, impregnado de inovação intelectual, com o conto El matadero, no
qual comparou as cenas de um matadouro de Buenos Aires com a ditadura
de Juan Manuel Rosas. Trata-se de uma representação metafórica em que
os matadouros são considerados as forças bárbaras que destroem os inimi-
gos sem piedade, enquanto o gado representa os homens executados pelo
ditador argentino com sua polícia secreta chamada “Mazorca”. Sobre El
matadero, Sobejano-Móran e Bianco (2005, p. 61) declaram que
La acción narrativa ocurre en la Cuaresma, y el marco espacial se
sitúa en el matadero de la Convalescencia, al sur de Buenos Aires.
El tirano Rosas ha enviado a este matadero cincuenta reses para
alimentar al pueblo, y al comenzar la matanza de los animales pasa
por el lugar un
joven unitario al Figura 3.2 – El matadero, de Esteban
que los carniceros
Echeverría
gastan una broma
fingiendo que lo
van a matar. Le
cortan la barba, y
al tratar de desnu-
darlo el joven se
muere en la mesa
del matadero.

El matadero foi o primeiro


conto a reunir temas, ambiente e
linguagem totalmente america-
nos e descrever como o homem
comum pode se comportar do
mesmo modo que o ditador que o
controla. Na história, é quaresma,
mas os seguidores de Rosas conti-
nuam a comer carne; o matadouro
abre no fim do período da qua- Fonte: planetalibro.net.
resma e apenas um touro escapa da morte, um rebelde que simboliza a
independência que não pode existir sobre Rosas.

– 68 –
Século XIX: do Romantismo ao Realismo

Saiba mais

El matadero foi publicado em 1871, aos 20 anos da morte de Echeverría,


na Revista del Río de la Plata, após ser encontrado entre os pertences do
autor por Juan María Gutiérrez (1809-1878), que organizava a publicação
de suas obras completas. Acredita-se, segundo investigações, que tenha
sido escrito entre 1838 e 1840, período em que o escritor se encontrava exi-
lado. Considerado pela crítica como um dos melhores textos escritos pelo
autor, sua publicação póstuma gerou uma série de controversas hipóteses
a respeito da decisão de Echeverría de não o publicar (SIMÕES, [2012?]).

Acesse o link a seguir e faça a leitura completa do conto:

<http://bibliotecadigital.educ.ar/uploads/contents/EstebanEcheverra-
-Elmatadero0.pdf>.

Para Josef (1989), o pampa se tornou lugar-comum, mas entrou na


literatura por meio de Echeverría, que concebia a ideia de uma literatura
nacional, embora o tipo do gaúcho não apareça em sua obra. Como poeta,
sua primeira contribuição foi o poema Elvira o La novia del plata, de
1832; em 1824, publicou Los consolares, no qual apresentou elementos
históricos, costumes típicos e paisagens locais; em 1837, publicou uma de
suas melhores obras, La cautiva, que conta uma história de amor trágico e
mostra lugares argentinos: o deserto do pampa e o málon dos índios:
Podemos decir que, como poeta, Echeverría no fue de los más ins-
pirados; un tanto insípida, a su expresión le faltó espíritu, viveza,
gracia, siendo lo más salvable “La cautiva”, poema que, bajo una
invocación byroniana, presenta la primera heroína romántica de la
literatura hispanoamericana: María es la pura y abnegada amada de
Brian y el drama se centra en su lucha contra las fuerzas de la natu-
raleza, los indios y el destino en nombre de este amor. (GARCIA;
SERRÃO, 2013, p. 103)

De acordo com os autores citados e com alguns críticos literários,


Echeverría não foi um grande poeta nem suas teses representaram notável
contribuição à problemática do Romantismo; contudo, foi um iniciador
empenhado na apresentação de uma nova literatura.

– 69 –
Literatura Hispano-Americana

Figura 3.3 – José Mármol

Fonte: biografiasyvidas.com.

O poeta, narrador e político natural de Buenos Aires, José Mármol


(1817-1871), foi, entre os exilados em Montevidéu, o mais eloquente
poeta contra Rosas, a quem disse: “Como hombre te perdono mi cárcel
y cadenas, pero como argentino las de mi patria, no!” (BANDEIRA,
1960, p. 95).
Em Amalia (1851), verdadeiro documento social e político, enunciou-
-se claramente o compromisso do autor em criticar a ditadura do gover-
nador argentino. A história se concentra nos dois protagonistas, Eduardo
Belgrano e sua namorada, Amalia: depois de casarem, Belgrano é morto
pelos federais na própria casa. O enredo se concentrou em um ambiente
de violência e terror, assim como aconteceu em Buenos Aires durante o
período rosista.

José Mármol (1817-1871)


Narrador y poeta argentino del romanticismo, perteneciente
a la generación de 1837. Es uno de los principales escritores

– 70 –
Século XIX: do Romantismo ao Realismo

románticos de su país. Su obra más popular es la novela Ama-


lia (1851-1855), alegato antirrosista. Escribió también dra-
mas y poemas políticos. Hijo de un soldado español y de una
dama uruguaya, llegó a conjeturarse que su verdadero padre
fue el general Tomás Guido, con quien tenía gran parecido
y que fue su protector. Mármol estudió primero en Mon-
tevideo e inició en Buenos Aires la carrera de derecho.
Fonte: JOSÉ Mármol, (c2018).

Figura 3.4 – Jorge Isaacs

Fonte: CC BY 2.0/Cultura Banco de la República.

O autor colombiano Jorge Isaacs (1837-1895) se destacou no Roman-


tismo hispano-americano devido ao pequeno volume de poemas (Poesias,

– 71 –
Literatura Hispano-Americana

1864) e a um único romance chamado María, publicado em 1867, que


teve sucesso imediato e se tornou uma das obras mais populares da Amé-
rica Latina.
O tema de María é o amor impossível e a paixão trágica. O narrador,
o jovem Efraín, relata com êxtase o modo como se apaixonou pela moça
chamada María e a felicidade que de estar com ela. Contudo, o espírito
trágico prevalece porque María sofre de epilepsia e, por causa dessa fra-
gilidade, não pode se casar. Efraín, quando volta à cidade, descobre que
a amada já faleceu, mas seu amor por ela perdura. Ou seja, o personagem
nada exigiu e se satisfez com a ausência de reciprocidade de afeto.
De acordo com Queiroz (1971), a identificação da natureza com as
personagens – a íntima relação estabelecida entre a vida da protagonista
e as circunstâncias que a cercaram – confere à mensagem de Isaacs uma
característica própria do Romantismo. Vale ressaltar que foi construído
“todo um prestígio do autor em volta desse livro, pois María fez correr
mais lágrimas que qualquer outro romance hispano-americano” (QUEI-
ROZ, 1971, p. 176).
O cenário que envolve as personagens favorece a concepção pla-
tônica do amor, com campos, flores, árvores e bosques que participam
do drama vividos por Efraín e María: “¿Aquellas soledades, sus bosques
silenciosos, sus flores, sus aves y sus aguas por qué me hablaban de ella?
¿Qué había allí de María en las sombras húmedas en la brisa que movía
los follajes, em el rumor del rio?” (ISAACS, 2016). Dessa maneira, a
natureza acompanha o luto pela perda da mulher amada, sendo solidária
com a dor de Efraín.

3.3 A poesia gaúcha


No vale do Rio da Prata, no decorrer do século XIX, desenvolveu-se um
tipo de poesia que exaltou o gaúcho, habitante do chamado pampa argentino.
Suas características eram de desbravador, soldado intrépido e espadachim
hábil, mas somente tornou-se símbolo nacional do heroísmo ao tomar partido
em defesa da nação na guerra pela independência. Antes disso, os gaúchos
eram vistos como foras da lei e rebeldes com vidas irregulares.

– 72 –
Século XIX: do Romantismo ao Realismo

Saiba mais

Durante las Guerras de Independencia surge la voz del gaucho. La


palabra aparece en Río de la Plata a finales del siglo XVIII con signifi-
cado negativo: vagabundo, cuchillero, antiautoritario, rebelde. Luego
adquirió un valor positivo al tomar parte los gauchos en la defensa de la
nación frente a piratas ingleses y a favor, más tarde, de la independen-
cia. La literatura gaucha no recoge la obra de los gauchos, sino la tradi-
ción elaborada por cultos simpatizantes con el mundo de los gauchos.
Gaucho era el nombre dado a los vaqueros de las pampas de Argentina
y Uruguay, que vivieron en las verdes llanuras meridionales de Suda-
mérica desde mediados del siglo XVIII hasta mediados del siglo XIX,
en su mayoría nómadas mestizos (población de origen indígena y euro-
peo, principalmente español). Jinetes hábiles e intrépidos, se ganaban
la vida vigilando al ganado o comerciando ilegalmente con caballos o
ganado en la frontera brasileña.

Fonte: López (c2017).

A poesia gauchesca é Figura 3.5 – Domingo Faustino Sarmiento


essencialmente narrativa, com
características de todos os
gêneros, pois buscava o con-
tato dramático, acrescentava
recursos líricos e demonstrava
uma filosofia moral. Por meio
da linguagem popular do gaú-
cho, esse tipo de poesia se
destacou no meio literário. Os
autores argentinos Domingo Fonte: www.biografiasyvidas.com.
Faustino Sarmiento e José Hernández representaram, em suas obras, a
figura do gaúcho de diversas maneiras durante a época romântica.
Domingo Faustino Sarmiento (1811-1888) nasceu em San Juan, na
Argentina, foi jornalista, escritor e presidente. Devido a sua oposição
ao regime de Juan Manuel de Rosas, escreveu sua obra mais famosa,

– 73 –
Literatura Hispano-Americana

Facundo: civilización y barbarie, em 1845. Nela conta, à primeira vista, a


biografia de Juan Facundo Quiroga como representante das forças contra
o progresso e as regras da sociedade civilizada. Contudo, o livro tornou-
-se mais que uma biografia, foi um manifesto modernizador, um tratado
etnográfico e a fundação da narrativa argentina.
Figura 3.6 – Facundo: civilización y barbárie, de Domingo Faustino Sarmiento

Fonte: www.iberlibro.com.

Para Idelberavelar (2011), Facundo consolidou a oposição entre os


termos civilização e barbárie, que atravessaram todo o pensamento latino-
-americano no século XIX. Composto de três eixos principais: uma des-
crição histórica e geográfica da Argentina, uma compilação das proezas
de Facundo Quiroga e uma acusação de cunho político antirrosista, o livro
associou a civilização a um modelo de desenvolvimento inspirado princi-
palmente nos Estados Unidos.

– 74 –
Século XIX: do Romantismo ao Realismo

Figura 3.7 – José Hernández

Fonte: www.lagaceta.com.ar.

José Hernández (1834-1886) nasceu em Buenos Aires, na Argen-


tina, foi poeta, político e jornalista. Ficou conhecido, sobretudo, pelo
livro Martín Fierro (1872) e pela continuação La vuelta de Martín Fierro
(1879), considerada a obra mais importante do país. Muitos autores
comentam a diferença da descrição do gaúcho – representante da barbárie
– de Domingo Faustino Sarmiento, uma vez que Hernández o apresenta
como uma vítima dos abusos da autoridade do país, detalhando seu modo
de viver com nostalgia e respeito em prol do bem da própria civilização.
Martín Fierro narra sua vida, expressando a simplicidade rural, a
independência e a paz de espírito. O poema começa com a felicidade de
sua vida familiar até que é forçado a se alistar no exército, sua rebelião
e sua posterior deserção. Após o retorno, ele descobre que sua casa foi
destruída e sua família sumiu. Desesperado, une-se aos índios e se torna
um homem ilegal. Na sequência do poema, La vuelta de Martín Fierro,
publicada sete anos depois, finalmente conhece os filhos já adultos.

– 75 –
Literatura Hispano-Americana

Na figura do gaúcho, descobre a encarnação da coragem e a integri-


dade peculiar da vida independente. Ao terminar a história, a reflexão é
sobre a memória que ficará do povo gaúcho. O poema é dividido em can-
tos com 1.193 estrofes, em sua maioria com seis versos.
Vejamos as últimas estrofes:

La vuelta de Martín Fierro


1188
Permítanme descansar,
¡pues he trabajado tanto!
En este punto me planto
y a continuar me resisto:
estos son treinta y tres cantos,
que es la mesma edá de Crist.

1189
Y guarden estas palabras
que les digo al terminar:
en mi obra he de continuar
hasta dárselas concluida,
si el ingenio o si la vida
no me llegan a faltar.

1190
Y si la vida me falta,
tenganló todos por cierto
que el gaucho, hasta en el desierto,
sentirá en tal ocasión
tristeza en el corazón,
al saber que yo estoy muerto.

1191
Pues son mis dichas desdichas
las de todos mis hermanos;
ellos guardaran ufanos
en su corazón mi historia:
me tendrán en su memoria
para siempre mis paisanos.

– 76 –
Século XIX: do Romantismo ao Realismo

1192
Es la memoria un gran don,
calidá muy meritoria;
y aquellos que en esta historia
sospechen que les doy palo,
sepan que olvidar lo malo
también es tener memoria.

1193
Mas naides se crea ofendido
pues a ninguno incomodo,
y si canto de este modo,
por encontrarlo oportuno,
no es para mal de ninguno
sino para bien de todos.
Fonte: Hernández (1872).

É interessante mencionarmos que esse livro foi traduzido para mais


de 30 idiomas. Para língua portuguesa foi traduzido por sete tradutores,
em uma quantidade desconhecida de edições. Além disso, tem cerca de
duas adaptações em prosa, sendo uma infantojuvenil e um infantil.
Figura 3.8 – Martín Fierro e La vuelta de Martín Fierro, de José Hernández
Fonte: CC BY 3.0.

– 77 –
Literatura Hispano-Americana

3.4 Realismo
O Realismo é um movimento literário que supõe uma ruptura com o
Romantismo, mas percebemos que há um diálogo entre as duas tendên-
cias, ou seja, o Realismo se mescla principalmente com o fim do Roman-
tismo. Assim, os primeiros trabalhos realistas apresentam, muitas vezes,
características da estética anterior.
Surgiu na Europa e tempos depois chegou à América latina, na metade
do século XIX. Ressaltamos que alguns acontecimentos impulsionaram o
Realismo hispano-americano, como a Revolução Mexicana, a Primeira
Guerra Mundial, o início da Guerra Civil Espanhola, a derrota do anar-
quismo e o fluxo migratório.
Em suas obras, os escritores buscaram refletir a realidade com certa
clareza, uma reprodução exata, completa e sincera do ambiente social
e do comportamento humano. Procuraram externar os problemas polí-
tico-sociais com grande objetividade e foi por isso que encontraram no
romance a máxima expressão. Há a descrição detalhada dos ambientes e
das personagens como forma de encontrar essa representatividade obje-
tiva e direta.
É importante destacarmos que os escritores deixaram de escrever
sobre a realidade como desejavam que ela fosse e passaram a descrevê-la
como achavam que ela era.

Características del Realismo


22 Se atiende más al mundo exterior que ha de ser escrito de
manera objetiva y fiel y precisa.
22 Los autores se centran en la realidad más próxima, más cono-
cida.
22 El método utilizado por los autores es la observación directa,
toma de apuntes, documentación rigurosa.
22 Los escritores reflejan com precisión tanto los ambientes
(costumbres, lugares, vestidos, etc), como los caracteres de las
personas.
22 Abundan las descripciones.

– 78 –
Século XIX: do Romantismo ao Realismo

22 La actitud del autor es a priori objetiva e impersonal ya que


actúan como un notario o un cronista que por lo general
no está presente en el relato. Se suele utilizar el narrador en
tercera persona.
22 El estilo suele ser natural y la lengua adaptada a la situación
y la condición de vida de los personajes: culta, popular e
incluso vulgar.
22 Los temas tratados son muy variados: la política, el trabajo, la
vida de los barrios bajos, etc.
22 La intención puramente estética de los autores románticos dará
paso a una intención moralizante y crítica.
Fonte: Fausto M.; Jorge J. (2008).

Figura 3.9 – Alberto Blest Gana

Fonte: CC BY 3.0/archivoescritor.

– 79 –
Literatura Hispano-Americana

O escritor mais importante do Realismo hispano-americano


foi Alberto Blest Gana (1830-1920). Romancista chileno nascido
em Santiago, teve uma vida política trabalhando como prefeito, deputado,
ministro e escritor. Seu principal mérito foi ter fundado o romance no
Chile, com obras que misturaram características românticas e realistas.
Publicou La aritmética del amor (1860); Martín Rivas (1862); El ideal de
un calavera (1863); Durante la reconquista (1897); El loco estero (1909);
Los transplantados (1904), entre outras obras.
Sua obra Martín Rivas é um dos romances mais celebrados e que
apresenta como tema a história de um jovem pobre e humilde que se muda
para Santiago para melhorar sua condição de vida. Passa a viver com uma
família de classe alta e, em troca de aloja-
mento, torna-se responsável pelas contas de Figura 3.10 – Martín Rivas, de
Alberto Blest Gana
Don Dámaso (pai e chefe da família), que é
um grande político do partido conservador
da sociedade chilena.
A história começa com a chegada de
Martín à casa de Don Dámaso. No primeiro
capítulo, é narrada a apresentação do protago-
nista e a de seu anfitrião. A descrição de Mar-
tín é a de um rapaz melancólico, com olhar
desfalecido e pensativo, mas de estatura regu-
lar e formas bem proporcionais:
El conjunto de su persona tenía
cierto aire de distinción que
contrastaba con la pobreza del
traje, y hacía ver que aquel
joven, estando vestido con
elegancia, podía pasar por un
buen mozo a los ojos de los que
no hacen consistir únicamente
la belleza física en lo rosado
de la tez [...]. (BLEST GANA, Fonte: Catedra (2006)
2016, p. 8)

Esse romance foi adaptado para o cinema, para o teatro e para a tele-
visão em forma de novela em três ocasiões: 1970, 1979 e 2000.

– 80 –
Século XIX: do Romantismo ao Realismo

Vejamos a parte inicial do primeiro capítulo de Martín Rivas:

Capítulo 1

A principios del mes de julio de 1850, atravesaba la puerta de la


calle de una hermosa casa de Santiago un joven de veinte y dos
a veinte y tres años.

Su traje y sus maneras estaban muy distantes de asemejarse a


las maneras y al traje de nuestros elegantes de la capital. Todo
en aquel joven revelaba al provinciano que viene por primera
vez a Santiago. Sus pantalones negros embotinados por medio
de anchas trabillas de becerro, a la usanza de los años de 1842
y 43; su levita de mangas cortas y angostas; su chaleco de raso
negro con grandes picos abiertos, formando un ángulo agudo,
cuya bisectriz era la línea que marca la tapa del pantalón; su
sombrero de extraña forma y sus botines, abrochados sobre los
tobillos por medio de cordones negros, componían un traje que
recordaba antiguas modas, que sólo los provincianos hacen ver
de tiempo en tiempo por las calles de la capital.

El modo como aquel joven se acercó a un criado que se balance-


aba mirándole, apoyado en el umbral de una puerta, que daba
al primer patio, manifestaba también la timidez del que penetra
en un lugar desconocido y recela de la acogida que le espera.

Cuando el provinciano se halló bastante cerca del criado, que


continuaba observándole, se detuvo e hizo un saludo, al que el
otro contestó con aire protector, inspirado tal vez por la triste
catadura del joven.

-¿Será ésta la casa del señor don Dámaso Encina? -preguntó


éste, con voz en la que parecía reprimirse apenas el disgusto
que aquel saludo insolente pareció causarle.

-Aquí es -contestó el criado.

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Literatura Hispano-Americana

-¿Podrá usted decirle que un caballero desea hablar con él? A


la palabra caballero, el criado pareció rechazar una sonrisa bur-
lona que se dibujaba en sus labios.

-¿Y cómo se llama usted? -preguntó con voz seca.

-Martín Rivas -contestó el provinciano, tratando de dominar su


impaciencia, que no dejó por esto de reflejarse en sus ojos.

[…]

Fonte: Blest Gana (1862).

Figura 3.11 – Clorinda Matto de Turner

Fonte: CC BY 3.0/Picasaweb.

A escritora Clorinda Matto de Turner (1852-1909) nasceu em Cuzco,


no Peru, e escreveu sobre as condições trágicas em que viviam os índios.

– 82 –
Século XIX: do Romantismo ao Realismo

Seu famoso romance Aves sin nido (1889) provocou protestos e escân-
dalos, iniciando uma visão revolucionária do problema. Segundo alguns
críticos, a obra é pobre de estilo, mas rica pelo tema da denúncia dos
maus-tratos aos indígenas. Para López (c2017), essa escritora “funda el
indigenismo de la literatura andina. Los héroes parecen más tipos que per-
sonas vivas. La autora tiene un puesto especial como audaz fundadora de
la literatura de reivindicación social, tan copiosa generaciones más tarde”.
Escreveu outros dois romances, intitulados Índole (1891) e Herencia
(1893). García e Serrão (2013, p. 6) colocam que Clorinda
fue a vivir a Lima, tras la guerra entre Perú y Chile, cuyas tertulias
y círculos literarios frecuentó. Publicó los dos volúmenes de Tra-
diciones cuzqueñas y leyendas (1883-1896), bajo el evidente estí-
mulo de las Tradiciones peruanas de Ricardo Palma, y dirigió El
Perú Ilustrado (1889-1892). Sus actividades políticas la obligaron
a buscar el exilio en Buenos Aires en 1895. Allí siguió colaborando
en el periodismo y publicando libros hasta su muerte.
Figura 3.12 – Aves sin nido, de Clorinda Matto de Turner

Fonte: independenciaspsu15.com.

– 83 –
Literatura Hispano-Americana

Vejamos o primeiro capítulo do romance Aves sin nido, de Clorinda


Matto de Turner:

Capítulo 1

Era una mañana sin nubes, en que la Naturaleza, sonriendo de


felicidad, alzaba el himno de adoración al Autor de su belleza.

El corazón, tranquilo como el nido de una paloma, se entregaba


a la contemplación del magnífico cuadro.

La plaza única del pueblo de Kíllac mide trescientos catorce


metros cuadrados, y el caserío se destaca confundiendo la
techumbre de teja colorada, cocida al horno, y la simplemente
de paja con alares de palo sin labrar, marcando el distintivo de
los habitantes y particularizando el nombre de casa para los
notables y choza para los naturales.

En la acera izquierda se alza la habitación común del cristiano,


el templo, rodeado de cercos de piedra, y en el vetusto campa-
nario de adobes, donde el bronce llora por los que mueren y
ríe por los que nacen, anidan también las tortolillas cenicien-
tas de ojos de rubí, conocidas con el gracioso nombre de cullcu.
El cementerio de la iglesia es el lugar donde los domingos se
conoce a todos los habitantes, solícitos concurrentes a la misa
parroquial, y allí se miente y se murmura de la vida del prójimo
como en el tenducho y en la era, donde se trilla la cosecha en
medio de la algazara y el copeo.

Caminando al Sur media milla, escasamente medida, se encuen-


tra uma preciosa casa-quinta notable por su elegancia de cons-
trucción, que contrasta con la sencillez de la del lugar; se llama
«Manzanares», fue propiedad del antiguo cura de la doctrina,
don Pedro de Miranda y Claro, después obispo de la dióce-
sis, de quien la gente deslenguada hace referencias no santas,
comentando hechos realizados durante veinte años que don
Pedro estuvo a la cabeza de la feligresía, época en que construyó
«Manzanares», destinada, después, a residencia veraniega de

– 84 –
Século XIX: do Romantismo ao Realismo

Su Señoría Ilustrísima.

El plano alegre rodeado de huertos, regado por acequias que


conducen aguas murmuradoras y cristalinas, las cultivadas
pampas que le circundan y el río que le baña, hace de Kíllac una
mansión harto poética.

La noche anterior cayó una lluvia acompañada de granizo y relám-


pagos, y, descargada la atmósfera dejaba aspirar ese olor peculiar
a la tierra mojada em estado de evaporación: el sol, más riente y
rubicundo, asomaba al horizonte, dirigiendo sus rayos oblicuos
sobre las plantas que, temblorosas, lucían la gota cristalina que no
alcanzó a caer de sus hojas. Los gorriones y los tordos, esos alegres
moradores de todo clima frío, saltaban del ramaje al tejado, ento-
nando notas variadas y luciendo sus plumas reverberantes.

Auroras de diciembre espléndidas y risueñas, que convidan


al vivir: ellas, sin duda, inspiran al pintor y al poeta de la
patria peruana.

[…]

Fonte: Turner (1889).

Figura 3.13 – Eduardo Acevedo Díaz


O escritor e político Eduardo Ace-
vedo Díaz (1851-1921) nasceu no Uruguai
e escreveu Ismael (1888), Nativa (1890),
Fonte: http://museovirtualdesanjose.gub.uy.
Grito de gloria (1893), Lanza y sable
(1914), Brenda (1886), Minés (1907),
Soledad (1894), entre outras obras. Com
esse autor, iniciou-se o romance verda-
deiramente nacional, na totalidade de sua
concepção, de seu tema e de suas caracte-
rísticas, nos aspectos geográfico e social.
De acordo com Josef (1989, p. 99), “toda
a sua obra tem por objetivo a glorifica-
ção das lutas pela independência e, mais
tarde, pela afirmação nacional.”.

– 85 –
Literatura Hispano-Americana

Seus quatro romances – Ismael, Nativa, Grito de gloria e Lanza y


sable – reconstroem os anos da luta pela independência, bem como as pri-
meiras guerras civis (1808-1825), com a intenção de afirmar a formação da
consciência nacional. E encontramos alguns traços do Romantismo onde
estão presentes os conflitos amorosos e as relações íntimas em Brenda,
Minés e, em menor intensidade, em Soledad.
Blixen (1988) explica que o romance histórico Ismael concilia a ima-
ginação criadora do romancista com a realidade, por meio dos limites e
dos obstáculos, como a localização geográfica, os costumes, o período,
as características étnicas etc. O protagonista Ismael Velarde aparece no
capítulo VIII: é um gaúcho infeliz que foge da autoridade hispânica. Para
entendermos melhor as características de suas obras, vejamos um frag-
mento do primeiro capítulo de Ismael:

La ciudad de Montevideo, plaza fuerte destinada a ser el punto


de apoyo y resistencia del sistema colonial en esta zona de Amé-
rica, por su posición geográfica, su favorable topografía y sus
sólidas almenas, registra en la historia de los tres primeros lus-
tros del siglo páginas notables.

Encerrada en sus murallas de piedra erizadas de centenares


de cañones, como la cabeza de un guerrero de la edad media
dentro del casco de hierro con visera de encaje y plumero de
combate, ella hizo sentir el peso de su influencia y de sus armas
en los sucesos de aquella vida tormentosa que precedió al desar-
rollo fecundo de la idea revolucionaria.

Dentro de su armadura, limitado por las mismas piezas defen-


sivas, cual una reconcentración de fuerza y de energía que no
debía expandirse ni cercenarse en medio del general tumulto,
persistía casi intacto el espíritu del viejo régimen, la regla del
hábito invariable, la costumbre hereditaria pugnando por sofo-
car la tendencia al cambio, al pretender más de una vez destruir
las fuerzas divergentes con su mano de plomo.

Asemejábase en el período de gestación, y de deshecha bor-

– 86 –
Século XIX: do Romantismo ao Realismo

rasca luego, a un enorme crustáceo que, bien adherido a la roca,


resistía impávido y sereno el rudo embate de la corriente que
arrastraba preocupaciones y errores, brozas y despojos para
reservarse descubrir y alargar las pinzas sobre la presa, así que
el exceso desbordado de energía revolucionaria se diera treguas
en la obra de implacable destrucción.

Esa corriente, con ser poderosa, no podía detenerse a romper su


coraza, y pasaba de largo ante el muro sombrío rozándolo en
vano con su bullente espuma.

El recinto amurallado, verdadero cinturón volcánico, no abría


sus colosales portones ni tendía el puente levadizo, sino para
arrojar falanges disciplinadas y valerosas, con la consigna
severa de triunfar o de morir por el rey.

Fue así como un día, de aquellos tan grandes en proezas legen-


darias, la pequeña ciudad irritada ante un salto de sorpresa del
fiero leopardo inglés sobre su hermana, la heroica Buenos Aires,
arma sus legiones y coadyuva en primera línea a su inmortal
victoria: y así fue como, celosa de la lealtad caballeresca y del
honor militar rechaza con hierro la metralla de Popham, sacri-
fica en el Cardal la flor de sus soldados y sólo rinde el baluarte
a los ejércitos aventureros, cuando delante de la ancha brecha
yacían sin vida sus mejores capitanes.

Por un instante entonces en su epopeya gloriosa, cesó de flotar


en lo alto de las almenas el pendón ibérico: la espada vence-
dora había cortado al casco la cimera, y, vuelta a la vaina sin
deshonra, cedido a una política liberal la palabra para desar-
ticular sin violencia los huesos al «esqueleto de un gigante».
Bradford diluyó sobre los vencidos palabras misteriosas y pro-
féticas; ¡Montevideo vio brillar la primera en América latina
una estrella luminosa, Southern star, que enseñaba el rumbo a
la mirada inquieta del pueblo, para ocultarse bien pronto entre
las densas nubes de la tormenta!

El ligero resplandor, parecido a un fuego de bengala, pasó

– 87 –
Literatura Hispano-Americana

sin ruido en la atmósfera extraña de aquel tiempo; el esfuerzo


heroico desalojó de la capital del virreinato a la fuerte raza con-
quistadora; Montevideo recibió la recompensa de su abnegado
denuedo, y el león recobró su guarida.

Volvieron los portones a cerrarse con rumor de cadenas: reinstalá-


ronse las guardias en baterías, flancos, ángulos y cubos; absorbieron
en su ancho vientre las casernas de granito, pólvora y balas; lució el
soldado del Fijo su sombrero elástico con coleta en la plataforma de
los baluartes: y, en pos de las borrascas parciales y de las batallas
gloriosas... siguiose la vida antigua, la eterna velada colonial.

La ciudad, como toda plaza fuerte, en que ha de reservarse


más espacio a un cañón con cureña que a una casa de familia,
y mayor terreno a un cuartel o a un parque de armas, que a
un colegio o instituto científico, no poseía a principios del siglo
ningún palacio o edificio notable.

[…]

Fonte: Diaz (1888).

Figura 3.14 – Ismael, de Eduardo Acevedo Díaz


Fonte: CC BY 3.0.

– 88 –
Século XIX: do Romantismo ao Realismo

Da teoria para a prática


Selecionamos um dos contos mais notáveis de Esteban Echeverría, El
matadero. Faça a leitura completa da obra, pois aqui apresentamos apenas
o fragmento inicial:

A pesar de que la mía es historia, no la empezaré por el arca de


Noé y la genealogía de sus ascendientes como acostumbraban
hacerlo los antiguos historiadores españoles de América que
deben ser nuestros prototipos. Temo muchas razones para no
seguir ese ejemplo, las que callo por no ser difuso. Diré sola-
mente que los sucesos de mi narración, pasaban por los años de
Cristo de 183… Estábamos, a más, en cuaresma, época en que
escasea la carne en Buenos Aires, porque la iglesia adoptando
el precepto de Epitecto, sustine abstine (sufre, abstente) ordena
vigilia y abstinencia a los estómagos de los fieles, a causa de
que la carne es pecaminosa, y, como dice el proverbio, busca a
la carne. Y como la iglesia tiene ab initio y por delegación directa
de Dios el imperio inmaterial sobre las conciencias y estómagos,
que en manera alguna pertenecen al individuo, nada más justo
y racional que vede lo malo.

Los abastecedores, por otra parte, buenos federales, y por lo


mismo buenos católicos, sabiendo que el pueblo de Buenos
Aires atesora una docilidad singular para someterse a toda
especie de mandamiento, solo traen en días cuaresmales al
matadero, los novillos necesarios para el sustento de los niños
y de los enfermos dispensados de la abstinencia por la Bula…,
y no con el ánimo de que se harten algunos herejotes, que no
faltan, dispuestos siempre a violar los mandamientos carnifici-
nos de la iglesia, y a contaminar la sociedad con el mal ejemplo.

Sucedió, pues, en aquel tiempo, una lluvia muy copiosa. Los


caminos se anegaron; los pantanos se pusieron a nado y las cal-
les de entrada y salida a la ciudad rebosaban en acuoso barro.
Una tremenda avenida se precipitó de repente por el Riachuelo

– 89 –
Literatura Hispano-Americana

de Barracas, y extendió majestuosamente sus turbias aguas


hasta el pie de las barrancas del alto. El Plata creciendo embra-
vecido empujó esas aguas que venían buscando su cauce y las
hizo correr hinchadas por sobre campos, terraplenes, arboledas,
caseríos, y extenderse como un lago inmenso por todas las bajas
tierras. La ciudad circunvalada del Norte al Este por una cintura
de agua y barro, y al Sud por un piélago blanquecino en cuya
superficie flotaban a la ventura algunos barquichuelos y negre-
aban las chimeneas y las copas de los árboles, echaba desde sus
torres y barrancas atónitas miradas al horizonte como implo-
rando misericordia al Altísimo. Parecía el amago de un nuevo
diluvio. Los beatos y beatas gimoteaban haciendo novenarios
y continuas plegarias. Los predicadores atronaban el templo y
hacían crujir el púlpito a puñetazos. Es el día del juicio, decían,
el fin del mundo está por venir. La cólera divina rebosando
se derrama en inundación. ¡Ay de vosotros pecadores! ¡Ay de
vosotros unitarios impíos que os mofáis de la iglesia, de los san-
tos, y no escucháis con veneración la palabra de los ungidos del
Señor! ¡Ay de vosotros si no imploráis misericordia al pie de
los altares! Llegará la hora tremenda del vano crujir de dientes
y de las frenéticas imprecaciones. Vuestra impiedad, vuestras
herejías, vuestras blasfemias, vuestros crímenes horrendos, han
traído sobre nuestra tierra las plagas del Señor. La justicia y el
Dios de la Federación os declarará malditos.

[…]

Fonte: Echeverría (1871).

Após a leitura do fragmento do conto El matadero, é interessante


instigar os alunos para as seguintes reflexões:
a) Explorar o ambiente onde ocorre a história: o matadouro como
cenário social característico – o conto identifica o regime de

– 90 –
Século XIX: do Romantismo ao Realismo

Juan Manuel de Rosas com o ato que ocorre nos matadouros.


Trata-se de uma representação metafórica em que os matadouros
são considerados as forças bárbaras que destroem os inimigos
sem piedade, enquanto o gado representa os homens executados
pelo ditador argentino por meio de sua polícia secreta chamada
“Mazorca”. Dessa maneira, é interessante fazer um paralelo
sobre a motivação do conto.
b) El matadero é a primeira obra romântica em língua espanhola na
qual o trágico e o grotesco reunidos servem ao propósito do pro-
testo social. Romântico defensor do povo, devoto da liberdade
e da justiça, Esteban Echevarría atua como um escritor enga-
jado. De acordo com essa perspectiva, traçar uma análise sobre
a temática “a arte a serviço da causa que professa”.

Síntese
Neste capítulo, estudamos os movimentos romântico e realista his-
pano-americanos. Destacamos algumas características literárias, seus
principais autores e fragmentos de algumas obras. É evidente que não con-
seguimos abarcar a totalidade, uma vez que nessas duas fases da literatura
tivemos notáveis publicações.
No Romantismo, vimos que as principais características são a sub-
jetividade, o sentimentalismo, a liberdade artística, o amor, a paixão, a
morte trágica e o amor à pátria, enfocando as temáticas indígenas e a his-
tória política. Citamos Esteban Echeverría, José Mármol, Jorge Isaacs. Já
na poesia gauchesca apontamos os autores Domingo Faustino Sarmiento
e José Hernández.
No Realismo, notamos que, em virtude do desejo de retratar objeti-
vamente a realidade, os escritores abandonaram a poeticidade e reduziram
a linguagem figurada ao essencial, ou seja, a razão e a observação efetiva-
mente predominaram sobre o sentimento e a imaginação. Apresentamos
os autores Alberto Blest Gana, Clorinda Matto de Turner e Eduardo Ace-
vedo Díaz.

– 91 –
Literatura Hispano-Americana

Atividades
1. O Romantismo surgiu em um momento histórico em que os paí-
ses latino-americanos (com exceção de Porto Rico e de Cuba)
viviam a inquietação da independência. Nesse contexto, ocorreu
uma revolução na política e também na literatura. Diante dessa
perspectiva, citamos os autores Esteban Echeverría, José Már-
mol, Jorge Isaacs. Já na poesia gauchesca, apontamos Domingo
Faustino Sarmiento e José Hernández. Pesquise mais dois auto-
res e escreva um resumo sobre vida e obra.
2. A respeito do Romantismo, podemos afirmar que:
I. a heroína confere, muitas vezes, o nome à narrativa;
II. os amores terminam em tragédia, com a morte de um dos
amantes;
III. há uma forte presença do religioso-católico, em geral das
correntes tradicionais e conservadoras do Romantismo
europeu.
IV. há a presença do sentimentalismo exacerbado;
V. os argentinos Esteban Echeverría e José Mármol e o colom-
biano Jorge Isaacs são exemplos de escritores do período.
Assinale a alternativa correta:
a) Estão corretas apenas as afirmativas II e III.
b) Está correta apenas a afirmativa III.
c) Todas as afirmativas estão corretas.
d) Estão corretas as afirmativas I, IV e V.
e) Todas as afirmativas estão incorretas.
3. Aprendemos um pouco mais sobre o Realismo hispano-ameri-
cano e sobre alguns escritores, como Alberto Blest Gana. Assista
ao primeiro capítulo da novela chilena de época Martín Rivas,
no YouTube, e registre suas impressões.

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Século XIX: do Romantismo ao Realismo

4. Assinale a alternativa que não apresenta características do


Realismo:
a) Reprodução da realidade pelo documento fiel da vida que
pretendia introduzir na obra.
b) O romance realista pretendia de fato tornar-se um retrato da
realidade em que se inspirava.
c) Os escritores deixaram de escrever sobre a realidade como
desejavam que ela fosse e passaram a descrevê-la como
achavam que ela era.
d) A linguagem realista buscava a objetividade dos fatos.
e) O escritor realista se deixou arrebatar pelo conflito entre o
mundo real e o imaginário, expressos em um sentimenta-
lismo acentuado.

– 93 –
4
O século XX e o
Modernismo

Neste capítulo, estudaremos o Modernismo, considerado


o primeiro movimento estético originado na América Latina; a
forma literária de um mundo em transformação, com caracterís-
ticas marcadamente cosmopolitas, que multiplicou os diferentes
modos de encarar a realidade.
Esse movimento foi representado por muitos escritores em
todo o continente, no entanto nos concentraremos na vida e na
obra de Rubén Darío, conhecido como o “papa do Modernismo”,
com quem sem dúvidas o Modernismo realmente se definiu e se
consagrou. Veremos, também, alguns precursores do movimento,
como José Martí, Julián del Casal, Manuel Gutiérrez Nájera e
José Asunción Silva.
Literatura Hispano-Americana

Por meio desses autores foi anunciada a nova corrente estética


que demonstrou ser determinante no desenvolvimento da literatura
hispano-americana.

4.1 Modernismo
O movimento modernista foi fundamental para que a literatura his-
pano-americana se afirmasse como independente, assumindo seu espaço
na literatura universal. Alguns críticos se referem a esse fenômeno como
la personalidad creadora y la independencia literaria de América. Diante
dessa perspectiva, Chorén, Goicoechea e Rull (2014, p. 6) colocam que
el movimiento modernista fue clave para alcanzar la mayoría de
edad en las letras, lo cual lleva implícita también la conquista de
un paso más en el camino hacia la autenticidad y la identidad lati-
noamericanas, y ello fue posible gracias al talento de los autores
modernistas para hacer suyo el lenguaje que les había sido here-
dado por España.

Torna-se importante, dessa maneira, destacarmos a novidade do


Modernismo como primeiro movimento da independência cultural nas-
cido na América Latina. Rodriguez (2004, p. 97) também declara sinteti-
camente que o modernismo foi “un gran movimiento de entusiasmo hacia
la belleza”, sendo o primeiro estímulo para explorar formas e fomentar
princípios estéticos. Podemos afirmar, efetivamente, que essa estética se
importou, acima de tudo, com a criação do belo:
No debe ser preocupación del arte la discusión ni la expressión de
la verdad. La única atención del arte se debe dirigir a sí mismo,
nacer y terminar en él, el discutido lema del arte por el arte. En
otras palabras, con el arte se podría mentir, tergiversar, pero haci-
éndolo de un modo hermoso. (RODRIGUEZ, 2004, p. 98)

De acordo com esse pensamento, Josef (1989) afirma que o Moder-


nismo foi a reação, no mundo hispânico, para a crise da cultura ocidental.
Caracterizou-se pela pluralidade de traços estilísticos, em uma relação de
ambiguidade com sua época; tratou-se da configuração literária
de um mundo em transformação, síntese das inquietações e dos
ideais de uma classe que atingiu seu apogeu no século XX. E vale

– 96 –
O século XX e o Modernismo

ressaltar que seu alcance não somente renovou a maneira de fazer litera-
tura na América Latina, mas também na Espanha.
Para López (2017), o Modernismo defendia a originalidade, a liber-
dade, a sinceridade e o trabalho consciente para fazer da poesia uma obra
de arte e, sobretudo, proporcionar liberdade e criatividade à linguagem.
Os movimentos posteriores também defenderam a sinceridade (Pós-
-modernismo) e a originalidade (Vanguarda), mas ambos conservaram os
princípios do Modernismo: liberdade e arte criadora.
O gênero que predominou foi a poesia, uma vez que a narrativa
levou mais tempo para chegar. Pouco depois surgiu o ensaio e, no século
XX, encontramos obras de teatro em toda a América Latina. Vejamos um
exemplo da poesia de Julio Herrera y Reissig, intitulada El regreso:

El regresso

La tierra ofrece el ósculo de un saludo paterno


Pasta un mulo la hierba mísera del camino
y la montaña luce, al tardo sol de invierno,
como una vieja aldeana, su delantal de lino.

Un cielo bondadoso y un céfiro tierno...


La zagala descansa de codos bajo el pino,
y densos los ganados, con paso paulatino,
acuden a la música sacerdotal del cuerno.

Trayendo sobre el hombro leña para la cena,


el pastor, cuya ausencia no dura más de un día,
camina lentamente rumbo de la alquería.

Al verlo la familia le da la enhorabuena...


Mientras el perro, en ímpetus de lealtad amena,
describe coleando círculos de alegría.

Fonte: Herrera y Reissig (1904-1907).

– 97 –
Literatura Hispano-Americana

Figura 4.1 – Livro

Fonte: Shutterstock.com/Pakhnyushchy.

No poema de Herrera y Reissig, notamos que a modéstia verbal não


é um traço característico, uma vez que o requinte das palavras utilizadas
se integra ao contexto simples e bucólico da cena descrita – ósculo, céfiro
e zagala são exemplos da preocupação do autor com a linguagem. Para
Rodríguez (2004, p. 108),
los cuartetos de este soneto refieren al ambiente físico, grácil y
transparente de una montaña, com los colores del cielo. Los ter-
cetos se ocupan de la descripción humana, de una familia unida.
El perro hace preponderar la actitude de fidelidad. Es una escena
plácida, pictórica, que con los años se torna cada vez más lejana.

Em El regreso, podemos observar alguns aspectos essenciais do


Modernismo, na maneira de descrever o ambiente harmônico com os per-
sonagens, que é bem frequente nos poemas.

Importante

Características del modernismo

22 Reacción a las tendencias artísticas del Realismo y Naturalismo.

22 El rechazo de la realidad cotidiana, ante la cual el escritor puede huir en


el tiempo (evocando épocas pasadas y mejores) o en el espacio (muchos
de los poemas se desarrollan en lugares exóticos y lejanos).

– 98 –
O século XX e o Modernismo

22 Una actitud aristocratizante y cierto preciosismo en el estilo, así como


la búsqueda de la perfección formal (de inspiración parnasiana) que se
aprecia no sin cierto individualismo.

22 La búsqueda de la belleza se consigue a través de imágenes muy plás-


ticas y acercamiento a las artes, de una adjetivación con predominio
del color y con imágenes relacionadas a todos los sentidos, así como
con la musicalidad que produce el abuso de la aliteración, los ritmos
marcados y la utilización de la sinestesia (influencias del simbolismo).

22 Tanto la fidelidad a las grandes estrofas clásicas como las variaciones


sobre los moldes métricos, utilizando versos medievales como el alejan-
drino, el dodecasílabo y el eneasílabo; con aportes de nuevas variantes
al soneto.

22 El uso de la mitología y el sensualismo.

22 Una renovación léxica con el uso de helenismos, cultismos y galicis-


mos, que no buscaba tanto la precisión como el prestigio o la rareza
del vocablo.

22 El deseo innovador que aspiraba a la perfección que apreciaban en la


literatura europea.

22 La adaptación de la métrica castellana a la latina.

22 El culto a la perfección formal, con poesía serena y equilibrada.

Fonte: Modernismo… (c2018).

Alguns críticos defendem que o Modernismo não é uma escola lite-


rária, mas uma atitude intelectual e individual, marcada tanto na política
quanto na literatura e ainda em outros aspectos da vida. Na literatura, essa
atitude é característica de escritores cultos – a minoria –, que se recusam a
se fechar na civilização hispânica e se abrem às influências vindas de outras
partes (JOSEF, 1989). Esse fenômeno é chamado de cosmopolitismo.
Dizemos que alguém é cosmopolita quando o julgamos cidadão do
mundo, alheio às individualidades do nacionalismo, uma pessoa atualizada
acerca dos fatos e das criações universais. Por isso, afirmamos que o escri-

– 99 –
Literatura Hispano-Americana

tor cosmopolita se interessa pelo indivíduo em sua essência, independente-


mente das contingências apresentadas por cada lugar. Em outras palavras, o
modernista não se limita à reflexão das condições de seu próprio país. E essa
corrente existe até hoje. Segundo Garcia e Serrão (2013, p. 9),
así estamos ante un fenómeno que, en busca de una identidad pro-
pia, se abrió a un cosmopolitismo enriquecedor, al mestizaje, a la
hibridez total. El grupo de nuevos autores que escudriñaba una
expresión renovada, reencontró, además, lo que Octavio Paz reco-
noce como uno de los grandes aportes modernistas: la intercone-
xión del mundo de la sensibilidad con el mundo de la inteligencia,
es decir retomaron el sendero de las correspondencias que ya los
simbolistas habían desvelado, y lo explotaron todas sus posibilida-
des; ellos redescubrieron y potenciaron el imperio de la analogia.

Outro ponto importante que precisamos ressaltar é o fato de que,


quando falamos do Modernismo hispano-americano, não estamos nos
referindo à verdadeira acepção do termo modernismo –­ que, na língua
inglesa, aborda os movimentos literários e artísticos que se iniciaram na
segunda década do século XX. Então, quando os críticos falam sobre
modernismo, estão expressando o que na França, na Espanha e nos países
latino-americanos é chamado de Vanguarda.

O Modernismo tem, na literatura de língua espanhola, um sentido


bem diferente da literatura brasileira: “O que chamamos no Brasil
de Parnasianismo e Simbolismo, a Hispano-América chama de
Modernismo. O nosso Modernismo no Brasil corresponde à
Vanguarda nos demais países da América.” (JOSEF, 1989, p. 113).

O movimento modernista foi representado por muitos escritores em


todo o continente: o cubano José Martí (1853-1895), o argentino Ángel
de Estrada (1872-1923), o cubano Julián del Casal (1863-1893), o colom-
biano José Asunción Silva (1865-1896), o mexicano Manuel Gutiérrez
Nájera (1859-1895), o uruguaio Amado Nervo (1870-1919), o argen-
tino Ricardo Jaimes Freyre (1866-1933), o argentino Leopoldo Lugones
(1874-1938), o uruguaio Julio Herrera y Reissig (1875-1910), o mexicano
Manuel José Othon (1858-1906), o mexicano Luis Gonzaga Urbina (1868-
1934), o peruano Clemente Palma (1872-1946), o guatemalteco Enrique

– 100 –
O século XX e o Modernismo

Gómez Carrillo (1873-1927), o guatemalteco Rafael Arévalo Martínez


(1884-1975), o chileno Pedro Prado (1886-1952), o colombiano Guil-
lermo Valencia (1873-1943), o colombiano Tomás Carrasquilla (1858-
1940), o equatoriano Arturo Borja (1892-1912), o uruguaio José Enrique
Rodó (1871-1917), o venezuelano Manuel Díaz Rodríguez (1871-1927),
o paraguaio Eloy Fariña Núnez (1885-1929), entre outros.

Importante

O Modernismo foi um movimento de individualidades, ou seja, os


iniciadores provavelmente não tinham consciência de seu papel e tra-
balhavam independentes uns dos outros. As obras são extremamente
diferentes, mas todas são, à própria maneira, revolucionárias.

Há um consenso em atribuir o início do movimento modernista da


língua espanhola ao poeta nicaraguense Félix Rubén García Sarmiento,
conhecido como Rubén Darío (1867-1916) e também chamado de Prín-
cipe de las letras castellanas. Dessa forma, podemos observar que
un poeta de la talla de Rubén Darío hizo que, por primera vez en
la historia de América Latina, se generara una poderosa influencia
de las letras americanas hacia España, donde los escritores de la
Generación del 98 admiraron y adoptaron las innegables aporta-
ciones modernistas a la literatura española. (CHORÉN; GOICOE-
CHEA; RULL, 2014, p. 7)

Rubén Darío participou do desenvolvimento da nova estética e da


divulgação de obras literárias dentro e fora do Continente Americano,
sendo chamado de “papa do Modernismo”. Foi o primeiro a formular as
exigências da nova arte, a semear a boa nova modernista e a fazê-la triun-
far. Para Josef (1989), “sua obra representa ao mesmo tempo a síntese, o
coroamento e a superação do modernismo”. Com Azul (1888), colocou
os pilares da nova estética; com Prosas profanas e outros poemas (1896),
o movimento chegou a sua plenitude – significa a consolidação da linha
elegante e refinada que o poeta buscava ansiosamente:
Ser el vínculo que haga una y fuerte la idea americana en la uni-
versal comunión artística […]. Levantar oficialmente la bandera
de la peregrinación estética que hoy hace con visible esfuerzo, la

– 101 –
Literatura Hispano-Americana

juventud de la América Latina a los Santos Lugares del Arte y a los


desconocidos orientes del Ensueño […]. Trabajar por el brillo de
la lengua castellana en América, y, al par que por el tesoro de sus
riquezas antiguas, por el engrandecimiento de esas mismas rique-
zas en vocabulario, rítmica, plasticidad y matiz […]. Luchar por-
que prevalezca el amor a la divina belleza, tan combatida hoy por
invasoras tendências utilitarias. (DARÍO apud GULLÓN, 1980,
p. 47-48)

O rigor, a especialização, o estudo da composição técnica precisa, a


liberdade individual e a beleza são algumas características mais destacadas
de sua produção criadora. Seus poemas evocavam palácios, princesas, pai-
sagens requintadas, mármores, pedras raras e animais delicados como cisnes
e pavões. Seguia a beleza e a perfeição, a elegância e a figura aristocrática.
Relacionamos a seguir, suas obras em verso e prosa, com a data das
primeiras edições:

Poesía

22 Abrojos. Santiago de Chile: Imprenta Cervantes, 1887.

22 Rimas. Santiago de Chile: Imprenta Cervantes, 1887.

22 Azul. Valparaíso: Imprenta Litografía Excelsior, 1888.

22 Canto épico a las glorias de Chile. Santiago de Chile: 1887.

22 Primeras notas, [Epístolas y poemas, 1885]. Managua: Tipografía


Nacional, 1888.

22 Prosas profanas y otros poemas. Buenos Aires: 1896. Segunda edi-


ción, ampliada,

22 París, 1901.

22 Cantos de vida y esperanza. Los cisnes y otros poemas. Madrid: Tipo-


grafía de

22 Revistas de Archivos y Bibliotecas, 1905.

– 102 –
O século XX e o Modernismo

22 Oda a Mitre. París: Imprimerie A. Eymeoud, 1906.

22 El canto errante. Madrid: Tipografía de Archivos, 1907.

22 Poema del otoño y otros poemas. Madrid: Biblioteca “Ateneo”, 1910.

22 Canto a la Argentina y otros poemas. Madrid: Imprenta Clásica


Española, 1914.

22 Lira póstuma. Madrid, 1919.

Prosa

22 Los raros. Buenos Aires: Talleres de “La Vasconia”, 1906.

22 España contemporánea. París: Librería de la Vda. de Ch. Bouret,


1901.

22 Peregrinaciones. París: Librería de la Vda. de Ch. Bouret, 1901.

22 La caravana pasa. París: Hermanos Garnier, 1902.

22 Tierras solares. Madrid: Tipografía de la Revista de Archivos,


1904.

22 Opiniones. Madrid: Librería de Fernando Fe, 1906.

22 El viaje a Nicaragua e Intermezzo tropical. Madrid: Biblioteca “Ate-


neo”, 1909.

22 Letras. (1911).

22 Todo al vuelo. Madrid: Juan Pueyo, 1912.

22 La vida de Rubén Darío escrita por él mismo. Barcelona: Maucci,


1913.

22 La isla de oro. (1915) (inconclusa).

22 Historia de mis libros. Madrid: Librería de G. Pueyo, 1916.

22 Prosa dispersa. Madrid: Mundo Latino, 1919.

Fonte: Garcia; Serrão (2013).

– 103 –
Literatura Hispano-Americana

Figura 4.2 – Livros

Fonte: Shutterstock.com/ Reinhold Leitner.

Rubén Darío nasceu em Metapa (Nicarágua). A família desunida, a


saúde frágil, o nervosismo e a inteligência precoce foram os primeiros
fatores de uma personalidade profundamente desequilibrada. Compôs
versos aos 11 anos de idade e leu, na mesma idade, os clássicos espanhóis
e os românticos franceses. Seu conhecimento dos clássicos começou nessa
época e cresceu com o passar dos anos, mas sua saúde física e mental foi
piorando com o tempo. Estudou muito, viajou por quase todo o mundo,
amou, contraiu várias doenças, tornou-se alcoólatra, escreveu e publicou
com intensidade.
Figura 4.3 – Monumento a Rubén Darío em Santiago,
Sua vida transcorreu sob no Chile
grandes dificuldades e priva-
ções, sobretudo financeiras.
Muitas vezes não tinha dinheiro
para se alimentar, sua moradia
foi sempre em quartos baratos
e, em vários momentos, depen-
deu da generosidade de amigos e
de admiradores. De acordo com
Ferreira (1959, p. 331), Darío
não teve uma vida brilhante, pois
“sob o signo do fracasso, peregri- Fonte: pedrosevylla.com.

– 104 –
O século XX e o Modernismo

nou, inquieto e inquietante, sofrendo e fazendo sofrer. Mas sua poesia, em


oposição, resplandece e perdura pela honestidade intelectual e artística
com que foi realizada.”.
Depois de morar em vários lugares como Argentina, El Salvador,
Guatemala, Costa Rica, Chile e em algumas cidades da Europa, retornou
para Nicarágua e morreu na miséria, em 1916.
Figura 4.4 – Rubén Darío

Fonte: www.poemas-del-alma.com.
Sua primeira grande obra, Azul, proporcionou-lhe a notoriedade
continental e o contágio da nova poesia. Na verdade, todos os textos que
constituem essa obra foram publicados na imprensa chilena entre 1886 e
1888. Rubén Darío “transformou o matiz celeste na cor emblemática do
modernismo” (JOSEF, 1989, p. 41). É interessante colocarmos que o título
do livro – Azul – significou, para o escritor, “a cor do sonho e da arte, e
que nela condensara a primavera de sua criação poética” (FERREIRA,
[1959], p. 33).

– 105 –
Literatura Hispano-Americana

A obra é composta de contos fantásticos e de poemas que constituem


tentativas de adaptar ao castelhano os temas e as formas da literatura fran-
cesa contemporânea. São apenas 15 poemas que retrataram o pessimismo
metafísico, o erotismo vago e a musicalidade criadora da beleza e que
constituem o objetivo e os meios de sua arte poética. Vale a pena ressal-
tarmos que, na segunda edição – Guatemala, 1890 –, Darío acrescentou ao
livro novas composições em prosa e em verso.
Figura 4.5 – Azul, de Rubén Darío

Fonte: 50latamobjects.wordpress.com.

Anagke é um dos poemas da obra Azul e foi publicado pela primeira


vez em um diário de Santiago, no Chile, intitulado La Época, no dia 11
de fevereiro de 1887. Torna-se importante mencionarmos que Anagke é
uma palavra grega que significa necessidade, destino, fatalidade; o fim do
poema sugere uma disputa entre as forças que governam o Universo.

– 106 –
O século XX e o Modernismo

Anagke

Y dijo la paloma:
– Yo soy feliz. Bajo el inmenso cielo,
en el árbol en flor, junto a la poma
llena de miel, junto al retoño suave
y húmedo por las gotas de rocío,
tengo mi hogar de ave,
del amado árbol mío
hasta el bosque lejano,
cuando al himno jocundo
del despertar de Oriente,
sale el alba desnuda, y muestra al mundo
el pudor de la luz sobre su frente.
Mi ala es blanca y sedosa;
la luz la dora y baña
y céfiro la peina.
Son mis pies como pétalos de rosa.
Yo soy la dulce reina
que arrulla a su palomo en la montaña.
En el fondo del bosque pintoresco
está el alerce en que formé mi nido;
y tengo allí, bajo el follaje fresco,
un polluelo sin par, recién nacido.
Soy la promesa alada,
el juramento vivo;
soy quien lleva el recuerdo de la amada
para el enamorado pensativo;
yo soy la mensajera
de los tristes y ardientes soñadores,
que va a revolotear diciendo amores
junto a una perfumada cabellera.
Soy el lirio del viento.
Bajo el azul del hondo firmamento
muestro de mi tesoro bello y rico
las preseas y galas:
el arrullo en el pico,
la caricia en las alas.
Yo despierto a los pájaros parleros
y entonan sus melódicos cantares:
me poso en los floridos limoneros
y derramo una lluvia de azahares.

– 107 –
Literatura Hispano-Americana

Yo soy toda inocente, toda pura.


Yo me esponjo en las ansias del deseo,
y me estremezco en la íntima ternura
de un roce, de un rumor, de un aleteo.
¡Oh, inmenso azul! Yo te amo. Porque a Flora
das la lluvia y el sol siempre encendido:
porque, siendo el palacio de la aurora,
también eres el techo de mi nido.
¡Oh, inmenso azul! Yo adoro
tus celajes risueños,
y esa niebla sutil de polvo de oro
donde van los perfumes y los sueños.
Amo los velos, tenues, vagarosos,
de las flotantes brumas,
donde tiendo a los aires cariñosos
el sedeño abanico de mis plumas.
¡Soy feliz! porque es mía la floresta,
donde el misterio de los nidos se halla;
porque el alba es mi fiesta
y el amor mi ejercicio y mi batalla.
Feliz, porque de dulces ansias llena
calentar mis polluelos es mi orgullo,
porque en las selvas vírgenes resuena
la música celeste de mi arrullo,
porque no hay una rosa que no me ame,
ni pájaro gentil que no me escuche,
ni garrido cantor que no me llame.

– ¿Sí? – dijo entonces un gavilán infame,


y con furor se la metió en el buche.

Entonces el buen Dios, allá en su trono,


(mientras Satán, para distraer su encono
aplaudía a aquel pájaro zahareño),
se puso a meditar. Arrugó el ceño,
y pensó, al recordar sus vastos planes,
y recorrer sus puntos y sus comas,
que cuando creó palomas
no debía haber creado gavilanes.

Fonte: Darío (1989, p. 163).

– 108 –
O século XX e o Modernismo

Figura 4.6 – Pomba

Fonte: Shutterstock.com/LittlePerfectStock.

O poema é uma extensa descrição de uma pomba e a tragédia de ser


devorada por um gavião: “La paloma describe su ambiente con la pompa
de la realeza, se define como puro amor, paz, como el espíritu de concordia
entre los seres humanos, como la mensajera de afectos.” (RODRÍGUEZ,
2004, p. 110). O fim é irônico: a pomba declara que todos os seres a escu-
tam e a invocam – mal pronuncia sua última palavra quando o gavião,
símbolo da depredação, engole-a.

4.2 Precursores do Modernismo


Para muitos estudiosos, os precursores do Modernismo foram os
cubanos José Martí e Julián del Casal, o mexicano Manuel Gutiérrez
Nájera e o colombiano José Asunción Silva. Por meio desses autores, foi
anunciada a nova corrente estética que demonstrou ser determinante no
desenvolvimento da literatura hispano-americana.
Não diminuindo em nada a glória de Rubén Darío como o “papa do
Modernismo”, tais autores integraram essa ampla estética renovadora que
foi difundida no mundo hispânico como se fosse uma preparação para
Azul. Eles “sentiram, definiram e realizaram o desejo de mudança tanto
quanto Rubén Darío” (JOSEF, 1989, p. 38). No entanto, “os escritores
citados manifestaram em seus estilos certas preocupações formais que

– 109 –
Literatura Hispano-Americana

serão a dos modernistas, mesmo sem formular claramente todas as ambi-


ções do movimento renovador” (JOSEF, 1989, p. 38).

4.2.1 José Martí


Entre os primeiros modernistas, José Martí (1853-1895) foi, sem
dúvida, o maior e mais completo, pela grandeza de seus conhecimentos
e pela profusão de suas atividades. Martí nasceu em Havana (Cuba) e
foi jornalista, político, intelectual, poeta, orador, filósofo, herói, devoto
à pátria e aos ideais cívicos, criador do Partido Revolucionário Cubano
(PRC). Foi também o grande mártir da Independência de Cuba, pela qual
morreu com apenas 42 anos de idade.

Figura 4.7 – José Martí

Fonte: www.biography.com.
José Martí é, antes de tudo, o símbolo da independência e da sobera-
nia de Cuba e o arquiteto da nacionalidade cubana, a cubanía. Vetor
de ideias universais de emancipação, lançou as bases da unidade
nacional não apenas contra o colonialismo espanhol, mas sobretudo
contra o expansionismo dos Estados Unidos, preconizando, ao

– 110 –
O século XX e o Modernismo

mesmo tempo, uma grande união pan-americana e a realização do


sonho de Bolívar: a “Pátria Grande”. Ao mesmo tempo visionário
e homem de seu tempo, precursor do anti-imperialismo estaduni-
dense, convencido de que “pátria é humanidade”, uniu seu destino à
sorte dos humildes, “com os pobres da terra”, como clamou em seus
Versos singelos e foi fiel a seu adágio segundo o qual “o único autó-
grafo digno de um homem é o que deixa escrito com suas obras”.
Continue lendo!
Acesso site que descreve 50 verdades sobre José
Martí, por Salim Lamrani. Disponível em:
<http://operamundi.uol.com.br/conteudo/opiniao/37770/50+
verdades+sobre+jose+marti.shtml#>. Acesso em: 8 fev. 2018.

Em muitos de seus livros, é notável o amor de José Martí por sua


pátria, um grande orgulho e honra para todos os cubanos. Tanto a poesia
como a prosa demonstram uma escrita extremamente bela e refinada. Des-
tacamos algumas obras como Abdala (1869), El presidio politico en Cuba
(1871), La República Española ante la Revolución Cubana (1873), Amor
con amor se paga (1875), Ismaelillo (1882), Amistad Funesta (1885), La
Edad de Oro (1889), Versos Sencillos (1891).
Ismaelillo é composto por poemas feitos para seu filho, José Fran-
cisco, os quais se destacaram na história da poesia em língua espanhola.
No ano anterior a sua publicação, Martí se separou da esposa Carmen
Zayas Bazán e perdeu o contato com seu menino. Um exemplo desse amor
pelo filho é encontrado nos versos de Mi caballero:

Mi caballero

Por las mañanas


Mi pequeñuelo
Me despertaba
Con un gran beso.
Puesto a horcajadas
Sobre mi pecho,
Bridas forjaba

– 111 –
Literatura Hispano-Americana

Con mis cabellos.


Ebrio él de gozo,
De gozo yo ebrio,
Me espoleaba
Mi caballero:
¡Qué suave espuela
Sus dos pies frescos!
¡Cómo reía
Mi jinetuelo!
Y yo besaba
Sus pies pequeños,
¡Dos pies que caben
En solo un beso!

Fonte: Martí (1882).

Figura 4.8 – Filho

Fonte: Shutterstock.com/ESB Professional.

Assim, observamos que o tema da obra Ismaelillo é a tristeza do autor


ao se separar do filho, com quem provavelmente não voltou a se encontrar.
Trata-se de um exercício de catarse, no qual resplandecem a nova poesia
e a nova moral, na medida em que o pai busca o filho, evoca sua presença
no sofrimento, na experiência da dor e ao se sentir atingido pelos golpes
da maldade humana.

– 112 –
O século XX e o Modernismo

Figura 4.9 – Ismaelillo, de José Martí

Fonte: libreriavirtualcuba.com.
Ismaelillo apresenta 15 poemas que José Martí publi-
cou em 1882, nos quais expôs sua realidade e sua tristeza
devido à incompreensão, ao abandono e ao regresso da
esposa a Cuba, levando consigo seu filho José Francisco.

4.2.2 Julián del Casal


Julián del Casal nasceu em Havana (Cuba), em 1863, e morreu em
1893, triste, pobre e doente. Viveu por apenas 29 anos e foi um exemplo
de ser humano sonhador, que procurou viver longe da realidade, em uma
área de refinamento, exotismo e imprecisão do longínquo: “A poesia que
deixou denuncia-lhe o constante desejo de evasão. Sonhava com países
distantes, terras amenas e coloridas onde pudesse extinguir a sua ansia
infinita de llorar a solas, a imensa tristeza, o cansaço e o desengano.”
(FERREIRA, [1959], p. 309).

– 113 –
Literatura Hispano-Americana

Figura 4.10 – Julián del Casal

Fonte: www.biografiasyvidas.com.

Escreveu Hojas al viento (1890), seu primeiro livro de poesias com


influência romântica espanhola e francesa; Nieve (1892), com caracterís-
ticas parnasianas; Bustos y rimas (1893), conjunto de prosa e verso, uma
obra póstuma, considerada a mais original e sombria. Este último livro
“predomina el subjetivismo peculiar de Casal, su alma lírica dominada
por la tristeza irreparable, por el ensueño superador de la estrecha y mísera
realidad provinciana, monótona y vulgar, que le rodea” (BIOGRAFÍAS Y
VIDAS, c2018).

4.2.3 Manuel Gutiérrez Nájera


Manuel Gutiérrez Nájera, outro importante precursor do Moder-
nismo, nasceu em 1859 na Ciudad de Mexico e morreu, em 1895, aos 36
anos. Com Julián del Casal e José Asunción Silva, Nájera se integra aos
poetas sofredores e doentios do mal do século.
Exerceu grande influência sobre Rubén Darío e escreveu Poemas
(1896), que foi publicado um ano após sua morte. Há a presença da duali-
dade em sua poesia “de tons suaves e murmúrio interior, de intimidade e
lamento, do irremediável e angústia do esquecimento” (JOSEF, 1989, p.
118). Todo seu pessimismo está resumido nos seguintes versos:

– 114 –
O século XX e o Modernismo

Para entonces

Quiero morir cuando decline el día,


en alta mar y con la cara al cielo,
donde parezca sueño la agonía
y el alma un ave que remonta el vuelo.

No escuchar en los últimos instantes,


ya con el cielo y con el mar a solas,
más voces ni plegarias sollozantes
que el majestuoso tumbo de las olas.

Morir cuando la luz triste retira


sus áureas redes de la onda verde,
y ser como ese sol que lento expira;
algo muy luminoso que se pierde.

Morir, y joven; antes que destruya


el tiempo aleve la gentil corona,
cuando la vida dice aún: Soy tuya,
aunque sepamos bien que nos traiciona.

Fonte: Nájera (1896).

Figura 4.11 – Morte

Fonte: Shutterstock.com/Fahroni.

– 115 –
Literatura Hispano-Americana

Saiba mais

Após a leitura do poema, sugerimos que você acesse o YouTube e bus-


que a declamação do poema Para entonces, de Manuel Gutiérrez Nájera.

Disponível em <https://www.youtube.com/watch?v=KFDbFW9_-fM>.
Acesso em 23 mar. 2018.

4.2.4 José Asunción Silva


O colombiano José Asunción Silva nasceu em Bogotá, foi emotivo,
fascinado por todas as formas da existência, como artes, ciências, polí-
tica, luxo, prazeres, misticismo, amor e guerra. Apesar de “fascinado”,
não conseguiu se adaptar à vida. Foi o mais romântico dos autores cita-
dos, conheceu os azares e as tristezas e, segundo alguns especialistas,
devido a problemas financeiros, cometeu suicídio aos 30 anos com um
tiro no coração.
De notável inteligência, escreveu Poesias (1886); Una noche (1894);
Nocturno III; De sobremesa (1925). Os temas constantes são morbidez,
lamentações, alusões eróticas e também a morte da irmã. De acordo com
López (c2017), “taciturno desesperado en el ambiente semicolonial, pesi-
mista amargo en ambiente romántico, sus poesías han sido muy leídas y
están llenas de sensual melancolía.”. Teria se tornado o maior poeta do
Modernismo colombiano se tivesse vivido mais tempo.
Vejamos um dos poemas mais conhecidos, Una noche, que mostra a
musicalidade métrica do modernismo:

Una noche

Una noche
una noche toda llena de perfumes, de murmullos y de música de alas,
Una noche
en que ardían en la sombra nupcial y húmeda, las luciérnagas fantásticas,
a mi lado, lentamente, contra mí ceñida, toda,

– 116 –
O século XX e o Modernismo

muda y pálida
como si un presentimiento de amarguras infinitas,
hasta el fondo más secreto de tus fibras te agitara,
por la senda que atraviesa la llanura florecida
caminabas,
y la luna llena
por los cielos azulosos, infinitos y profundos esparcía su luz blanca,
y tu sombra
fina y lángida
y mi sombra
por los rayos de la luna proyectada
sobre las arenas tristes
de la senda se juntaban.
Y eran una
y eran una
¡y eran una sola sombra larga!
¡y eran una sola sombra larga!
¡y eran una sola sombra larga!

Esta noche
solo, el alma
llena de las infinitas amarguras y agonías de tu muerte,
separado de ti misma, por la sombra, por el tiempo y la distancia,
por el infinito negro,
donde nuestra voz no alcanza,
solo y mudo
por la senda caminaba,
y se oían los ladridos de los perros a la luna,
a la luna pálida
y el chillido
de las ranas,
sentí frío, era el frío que tenían en la alcoba
tus mejillas y tus sienes y tus manos adoradas,
¡entre las blancuras níveas
de las mortüorias sábanas!
Era el frío del sepulcro, era el frío de la muerte,
Era el frío de la nada...

Y mi sombra
por los rayos de la luna proyectada,
iba sola,
iba sola
¡iba sola por la estepa solitaria!
Y tu sombra esbelta y ágil

– 117 –
Literatura Hispano-Americana

fina y lánguida,
como en esa noche tibia de la muerta primavera,
como en esa noche llena de perfumes, de murmullos y de músicas de alas,
se acercó y marchó con ella,
se acercó y marchó con ella,
se acercó y marchó con ella... ¡Oh las sombras enlazadas!
¡Oh las sombras que se buscan y se juntan en las
noches de negruras y de lágrimas!...

Fonte: Silva (1891).

Figura 4.12 – Noite

Fonte: Shutterstock.com/FOTO PATTAYAKORN.

Nesse poema, vemos que o autor elaborou, com seus versos, a música
perfeita, repetida em várias combinações. Segundo Josef (1989, p. 122),
“nas sombras da noite e na evanescência da recordação, Silva modula o
gemino discreto de seu desespero.”. Inspirado na morte da irmã, a bela
Elvira, grande amiga e confidente, a quem dedicava especial ternura, ele
conseguiu atingir o ponto mais alto de sua arte, pois, por meio de seu
talento, fundiu seu angustioso estado da alma a uma melodia delicada,
fina e penetrante.

– 118 –
O século XX e o Modernismo

Figura 4.13 – José Asunción Silva

Fonte: www.biografiasyvidas.com.

Dessa maneira, podemos observar que o impacto do Modernismo foi


tão grande que as gerações literárias seguintes tiveram de se definir em
relação a esse movimento, ou seja, prolongariam ou resistiriam à revo-
lução linguística que foi desencadeada com grande maestria: “O Moder-
nismo, havendo cumprido sua missão, terminou em 1905, quando os poe-
tas ultrapassaram o movimento ou reagiram contra ele, corrigindo seus
excessos” (JOSEF, 1989, p. 155). No próximo capítulo, entenderemos o
fato de que, em alguns países, a herança do Modernismo não foi total-
mente esquecida, mas sim transformada.

Da teoria para a prática


Selecionamos uma das obras escritas por José Martí, intitulada El
presidio político en Cuba. Sugerimos que faça a leitura completa da obra,
pois colocamos aqui apenas o fragmento inicial:

– 119 –
Literatura Hispano-Americana

El presidio político en Cuba

Dolor infinito debía ser el único nombre de estas páginas.

Dolor infinito, porque el dolor del presidio es el más rudo, el


más devastador de los dolores, el que mata la inteligencia, y
seca el alma, y deja en ella huellas que no se borrarán jamás.

Nace con un pedazo de hierro; arrastra consigo este mundo


misterioso que agita cada corazón; crece nutrido de todas las
penas sombrías, y rueda, al fin, aumentado con todas las lágri-
mas abrasadoras.

Dante no estuvo en presidio.

Si hubiera sentido desplomarse sobre su cerebro las bóvedas


oscuras de aquel tormento de la vida, hubiera desistido de pin-
tar su Infierno. Las hubiera copiado, y lo hubiera pintado mejor.

Si existiera el Dios providente, y lo hubiera visto, con la una


mano se habría cubierto el rostro, y con la otra habría hecho
rodar al abismo aquella negación de Dios.

Dios existe, sin embargo, en la idea del bien, que vela el naci-
miento de cada ser, y deja en el alma que se encarna en él una
lágrima pura. El bien es Dios. La lágrima es la fuente de senti-
miento eterno.

Dios existe, y yo vengo en su nombre a romper en las almas


españolas el vaso frío que encierra en ellas la lágrima.

Dios existe, y si me hacéis alejar de aquí sin arrancar de voso-


tros la cobarde, la malaventurada indiferencia, dejadme que os
desprecie, ya que no puedo odiar a nadie; dejadme que os com-
padezca en nombre de mi Dios.

Ni os odiaré, ni os maldeciré.

– 120 –
O século XX e o Modernismo

Si yo odiara a alguien, me odiaría por ello a mí mismo.

Si mi Dios maldijera, yo negaría por ello a mi Dios.

[…]

Fonte: Martí (1871).

Figura 4.14 – Prisão

Fonte: Shutterstock.com/Dan Henson.

Após a leitura do fragmento de El presidio político en Cuba, é inte-


ressante instigar os alunos para as seguintes reflexões:
a) Trata-se de uma obra escrita por José Martí com aproximada-
mente 50 páginas, nas quais relata, de forma amarga, sua expe-
riência durante o período em que foi preso, obrigado a trabalhar
em condições sub-humanas. Qual história vivida no presídio
mais gerou impacto em você? Por quê?
b) A visão geral da obra de José Martí mostra que existe uma fusão
entre poesia, moral e política que determina a modernidade de
seus escritos, entre a defesa de princípios e a excelência esté-
tica. De acordo com essa perspectiva, trace uma análise sobre
os procedimentos poéticos empregados que conferem a essa
obra a emoção e a ideologia para transmitir uma mensagem de
alcance universal.

– 121 –
Literatura Hispano-Americana

Síntese
Neste capítulo, vimos a importância do movimento modernista para
a literatura hispano-americana. Observamos que foi com o escritor Rubén
Darío que o Modernismo atingiu seu ápice, definindo-se e afirmando-se no
cenário mundial. Mencionamos algumas caraterísticas que se destacaram
na época, como a ampla liberdade de invenção nos temas, nas imagens,
nos metros, no vocabulário requintado, no gosto pelo raro e pelo exótico
e, sobretudo, o cosmopolitismo.
Abordamos, também, os precursores do movimento, os cubanos José
Martí e Julián del Casal, o mexicano Manuel Gutiérrez Nájera e o colom-
biano José Asunción Silva. Enfatizamos que, dentre os primeiros moder-
nistas, José Martí foi, sem dúvida, o maior e mais completo, pela grandeza
de seus conhecimentos e pela profusão de suas atividades.

Atividades
1. O escritor modernista é cosmopolita, pois sua obra não se limita
à reflexão das condições de seu próprio país; há uma preocupa-
ção com o indivíduo em sua essência, independentemente das
contingências de sua terra; e suas histórias podem ocorrer em
diferentes lugares, comumente urbanos e de sofisticação intelec-
tual. Leia um fragmento do poema Divagación, de Rubén Darío,
e reflita sobre essa característica.

Amo más que la Grecia de los griegos


la Grecia de la Francia, porque Francia
al eco de las Risas y los Juegos,
su más dulce licor Venus escancia.
Demuestran más encantos y perfídias
coronadas de flores y desnudas,
las diosas de Clodión que las de Fidias.
Unas cantan francés, otras son mudas.
Verlaine es más que Sócrates; y Arsenio
Houssaye supera al viejo Anacreonte.

– 122 –
O século XX e o Modernismo

En París reinan el Amor y el Genio.


Ha perdido su imperio el dios bifronte.

Monsieur Prudhomme y Homais no saben nada.


Hay Chipres, Pafos, Tempes y Amatuntes,
donde el amor de mi madrina, un hada,
tus frescos labios a los míos juntes).

Sones de bandolín. El rojo vino


conduce un paje rojo. ¿Amas los sones
del bandolín, y un amor florentino?
Serás la reina en los decamerones,
la barba de los Términos joviales.

(Un coro de poetas y pintores


cuenta historias picantes. Con maligna
sonrisa alegre aprueban los señores.
Clelia enrojece, una dueña se signa).

¿O un amor alemán??que no han sentido


jamás los alemanes?: la celeste
Gretchen; claro de luna; el aria; el nido
del ruiseñor; y en una roca agreste,

la luz de nieve que del cielo llega


y baña a una hermosa que suspira
la queja vaga que a la noche entrega
Loreley en la lengua de la lira.
[…]
Fonte: Darío (1989, p. 607).

2. Busque no YouTube e assista à declamação do poema Anagke,


de Rubén Darío, e registre suas impressões.
3. Julián del Casal foi um poeta e escritor nascido em Cuba, um
dos grandes expoentes do Modernismo hispano-americano.
Tinha uma sensibilidade mórbida e melancólica, comprazendo-
-se no próprio sofrimento – teve pressentimento da própria
morte prematura, que seria uma libertação do mundo vazio.
Afetado pela tuberculose durante toda a vida, morreu aos 29

– 123 –
Literatura Hispano-Americana

anos por causa da ruptura de um aneurisma depois de um jantar


com amigos, quando um dos presentes lhe contava uma piada.
Com esses dados, pesquise alguns poemas do autor que enfati-
zem essas características.
4. O movimento modernista foi fundamental para que a literatura
hispano-americana se afirmasse como independente, assumindo
seu espaço na literatura universal. Diante dessa perspectiva,
citamos o autor Rubén Darío, que foi considerado o “papa do
Modernismo”, e alguns precursores dessa geração, como José
Martí, Julián del Casal, Manuel Gutiérrez Nájera e José Asun-
ción Silva. Pesquise mais dois autores que não foram apresenta-
dos e escreva um resumo sobre vida e obra.

– 124 –
5
A poesia do século
XX: Vanguarda

O movimento modernista aconteceu por aproximadamente


40 anos e, a partir da década de 1920, a literatura hispano-ame-
ricana tomou novo rumo, do qual surgiu outra corrente: a Van-
guarda; com isso, a poesia incorporou elementos como o verso
livre, a supressão da rima, a liberdade na invenção de metáforas,
entre outras características que abordaremos neste capítulo. Os
principais poetas foram Vicente Huidobro, Jorge Luis Borges,
César Vallejo e Pablo Neruda.
Veremos as tendências chamadas Criacionismo, Ultraísmo
e Surrealismo, quem têm em comum a rejeição pela realidade
objetiva. Os “ismos”, mediante manifestos, procuraram estabe-
lecer uma nova forma de fazer literatura. Assim, várias esco-
las foram formadas com características próprias, mas somente
alguns poetas se mantiveram mais ou menos fiéis – alguns se
deixaram influenciar pelo movimento para depois abandoná-lo.

5.1 Vanguarda
A poesia passou a ser valorizada por si mesma e os poetas
queriam apenas ser poetas – esse foi o princípio norteador dos
Literatura Hispano-Americana

movimentos de Vanguarda. Em outras palavras, a liberdade formal foi


uma das grandes conquistas da época. Os poetas praticaram o verso livre,
inovaram a maneira de aproveitar o espaço em branco na folha e explora-
ram as possibilidades sugestivas das palavras. Apenas por meio da ruptura
promovida pelas vanguardas é que se tornaram possíveis tais realizações,
as quais ampliaram os limites expressivos da linguagem:
La vanguardia latinoamericana comienza experimentando en la
poesía. Difunde sus postulados y su teoría estética a través de
manifiestos, programas o revistas, todo en un tono apasionado,
que busca escandalizar al público a través de propuestas contrarias
a los cánones imperantes. En sus primeras expresiones, las van-
guardias de América del Sur asimilaron las innovaciones europeas,
reaccionaron contra el Modernismo decadente y trabajaron por
revolucionar el lenguaje poético a fin de producir, desde América,
latina un arte tan universal y trascendente como el de las metrópo-
lis europeas. (LÓPEZ, c2017, s/p)

O termo vanguarda é relativo às novas sensibilidades literárias e


artísticas que, de modo geral, representaram uma ruptura com a tradição
retórica e formal do movimento iniciado por Rubén Dário no fim do século
XIX. O novo estilo se estendeu do início do século XX até o Surrealismo,
e tal renovação foi considerada o último ímpeto vanguardista, por volta de
1924. Em geral, os movimentos não tiveram grande duração.
Para Garcia e Serrão (2013, p. 14), “Vanguardia es el nombre colec-
tivo que se da a las tendencias artísticas (los llamados ismos) que surgen
en Europa a principios del siglo XX. A grosso modo, su común propósito
fue la renovación del arte institucionalizado”. E é importante mencionar-
mos que o movimento se caracterizou por haver um grupo de artistas que
se organizavam ao redor de um fundador, o qual redigia uma espécie de
manifesto no qual declaravam seus princípios.
A palavra vanguarda tem origem no francês avant-garde e signi-
fica o impulso “guerreiro” desse movimento artístico, no qual os auto-
res se consideravam contrários a tudo o que já havia sido produzido
nas escolas anteriores. Eles queriam romper com as normas impostas
e alçar uma liberdade total de concepção da arte em busca de uma
nova expressão.

– 126 –
A poesia do século XX: Vanguarda

O esgotamento da vertente formal do Modernismo ficou muito


claro após a morte de Rubén Darío, em 1916; com isso constata-
mos, nos versos do mexicano Enrique González Martínez (1871-
1952), a superação do movimento modernista e a revolução na
linguagem. Cabe enfatizarmos, ainda, que tal autor fez parte do
Modernismo, no entanto, com seu livro Los senderos ocultos, de
1911, pôs fim ao movimento. Vejamos alguns versos dessa obra:
Tuércele el cuello al cisne
Tuércele el cuello al cisne de engañoso plumaje
que da su nota blanca al azul de la fuente;
él pasea su gracia no más, pero no siente
el alma de las cosas ni la voz del paisaje.
Huye de toda forma y de todo lenguaje
que no vayan acordes con el ritmo latente
de la vida profunda... y adora intensamente la vida,
y que la vida comprenda tu homenaje.
Mira al sapiente búho cómo tiende las alas
desde el Olimpo, deja el regazo de Palas
y posa en aquel árbol el vuelo taciturno...
Él no tiene la gracia del cisne, mas su inquieta
pupila, que se clava en la sombra, interpreta
el misterioso libro del silencio nocturno.
Fonte: Martínez (1951).
Figura 5.1 – Poesia

Fonte: Shutterstock.com/BrAt82.

– 127 –
Literatura Hispano-Americana

Como já mencionamos, alguns elementos foram incorporados à


produção literária, como o verso livre, a supressão da rima, o emprego
de composições tipográficas, a liberdade na invenção das metáforas e a
riqueza inovadora e fundamental do Surrealismo: “Existe, pues, la volun-
tad de quebrantar lo anterior, de subvertir el sentimentalismo, de sacar a
la luz el inconsciente; hay un deseo de libertad, hay pasión e individua-
lismo. Y, así, nacen las vanguardias en las primeras décadas del siglo XX.”
(GARCIA; SERRÃO, 2013, p. 15).
A atitude experimental que caracterizou as vanguardas na Europa nos
anos 1920 também refletiu na América, onde proliferaram os “ismos” de
caráter transgressor e triunfaram, sobretudo, o Criacionismo, o Ultraísmo
e o Surrealismo. Para López (c2017, s/p),
la característica de las vanguardias es la fragmentación en nume-
rosos “ismos”, tendencias o movimientos que, mediante manifies-
tos, establecían “un modo de hacer literatura”. Se formaron varias
escuelas con características propias. Pero mientras unos autores se
mantuvieron más o menos fieles a un “ismo”, otros poetas tan solo
tomaron algunos ecos, especialmente del surrealismo, dejándose
influir solo parcialmente.

Ratificando tal afirmação, quase todos os poetas da época flertaram em


maior ou menor medida com tais tendências, dependendo do momento artís-
tico que cada um teve de viver. Também não se pode dizer que um poema
seja vanguardista porque seu autor já pertencia à Vanguarda. Houve inúme-
ros autores, como Jorge Luis Borges, César Vallejo e Pablo Neruda, que fize-
ram parte da Vanguarda durante um período e depois a abandonaram.

5.2 Criacionismo
O Criacionismo foi uma doutrina poética que proclamou a autono-
mia total do poema, que não precisava imitar ou refletir a natureza e suas
aparências. Fundado pelo poeta chileno Vicente Huidobro, em 1914, com
o manifesto poético chamado Non serviam, defendeu a autonomia da cria-
ção artística, comparando o poeta a um pequeno Deus.
Para López (c2017), os “principios creacionistas son crear un
poema tomando de la vida sus motivos y transformándolos para darles

– 128 –
A poesia do século XX: Vanguarda

una vida nueva e independiente. Nada anecdótico ni descriptivo. La


emoción ha de nacer de la única virtud creadora. Hacer un poema como
la naturaleza hace un árbol.”. Dessa forma, temos que o criacionismo
negou que a arte deveria imitar a natureza e sustentou a necessidade de
criar novas realidades por meio das palavras, suprindo o anedótico e se
baseando na metáfora.
Vejamos o manifesto Nos serviam, na íntegra, para entendermos
melhor os fundamentos dessa estética literária hispano-americana, que
clamava a liberdade do poeta e anunciava a mudança, que nada mais era
do que outro capítulo do constante processo de ruptura com o passado e da
defesa da criação de novos mundos:

Non ser viam

Y he aquí que una buena mañana, después de una noche de preciosos


sueños y delicadas pesadillas, el poeta se levanta y grita a la madre
Natura: Non serviam.

Con toda la fuerza de sus pulmones, un eco traductor y optimista repite


en las lejanías: «No te serviré».

La madre Natura iba ya a fulminar al joven poeta rebelde, cuando éste,


quitándose el sombrero y haciendo un gracioso gesto, exclamó: «Eres
una viejecita encantadora».

Ese non serviam quedó grabado en una mañana de la historia del


mundo. No era un grito caprichoso, no era un acto de rebeldía
superficial. Era el resultado de toda una evolución, la suma de múl-
tiples experiencias.

El poeta, en plena conciencia de su pasado y de su futuro, lanzaba al


mundo la declaración de su independencia frente a la Naturaleza.

Ya no quiere servirla más en calidad de esclavo.

El poeta dice a sus hermanos: «Hasta ahora no hemos hecho otra cosa
que imitar al mundo en sus aspectos, no hemos creado nada. ¿Qué ha
salido de nosotros que no estuviera antes parado ante nosotros, rode-
ando nuestros ojos, desafiando nuestros pies o nuestras manos?

– 129 –
Literatura Hispano-Americana

»Hemos cantado a la Naturaleza (cosa que a ella bien poco le importa).


Nunca hemos creado realidades propias, como ella lo hace o lo hizo en
tiempos pasados, cuando era joven y llena de impulsos creadores.

»Hemos aceptado, sin mayor reflexión, el hecho de que no puede haber


otras realidades que las que nos rodean, y no hemos pensado que noso-
tros también podemos crear realidades en un mundo nuestro, en un
mundo que espera su fauna y su flora propias. Flora y fauna que sólo
el poeta puede crear, por ese don especial que le dio la misma madre
Naturaleza a él y únicamente a él».

Non serviam. No he de ser tu esclavo, madre Natura; seré tu amo.


Te servirás de mí; está bien. No quiero y no puedo evitarlo; pero yo
también me serviré de ti. Yo tendré mis árboles que no serán como los
tuyos, tendré mis montañas, tendré mis ríos y mis mares, tendré mi
cielo y mis estrellas.

Y ya no podrás decirme: «Ese árbol está mal, no me gusta ese cielo….


los míos son mejores».

Yo te responderé que mis cielos y mis árboles son los míos y no los
tuyos y que no tienen por qué parecerse. Ya no podrás aplastar a nadie
con tus pretensiones exageradas de vieja chocha y regalona. Ya nos
escapamos de tu trampa.

Adiós, viejecita encantadora; adiós, madre y madrastra, no reniego ni


te maldigo por los años de esclavitud a tu servicio. Ellos fueron la más
preciosa enseñanza. Lo único que deseo es no olvidar nunca tus lec-
ciones, pero ya tengo edad para andar solo por estos mundos. Por los
tuyos y por los míos.

Una nueva era comienza. Al abrir sus puertas de jaspe, hinco una
rodilla en tierra y te saludo muy respetuosamente.

Fonte: Huidobro (1914).

– 130 –
A poesia do século XX: Vanguarda

Figura 5.2 – Ruptura

Fonte: Shutterstock.com/Amanda Carden.

A grande novidade consistiu, portanto, no tratamento dado à lingua-


gem, em fazer da palavra a protagonista do poema, transformando a cria-
ção em uma crítica de si mesma. O movimento alcançou seu ápice com a
publicação do poema Altazor, de Huidobro. Publicado em 1931, na Espa-
nha, traz com clareza o emprego de imagens ilógicas, um grande jogo de
palavras que tornam o poema desconcertante. Extenso e de difícil leitura,
Altazor está dividido em sete cantos que avançam como uma viagem de
ordem temática até a desconstrução da linguagem, fundamentando-se por
meio da preocupação com a mortalidade.

– 131 –
Literatura Hispano-Americana

Figura 5.3 – Altazor, de Vicente Huidobro

Fonte: memoriachilena.com.

Vicente Huidobro (1893-1948) nasceu em Santiago, no Chile, foi


considerado um dos maiores poetas da história, fez carreira internacional
e instituiu o movimento chamado Criacionismo. Cresceu em uma família
rica e intelectual: sua mãe era escritora e feminista, recebia em sua casa
personalidades do mundo da cultura, o que influenciou a vocação literária
do filho. Extremamente inteligente, publicou seu primeiro livro em 1911,
intitulado Ecos del alma. De acordo com Josef (1989, p. 199),
Huidobro deixou trinta e um livros, em prosa e verso, dos quais
nove em francês, abordando temática variada, sobressaindo o
aspecto intelectual e racional de sua personalidade. Procura, num
delírio verbal, e, transcendentalismo lúdico, alcançar dimensões
cósmicas: o universo, os astros, numa ânsia de abarcar a criação:
“el poeta es um pequeno Deus”.

– 132 –
A poesia do século XX: Vanguarda

Além disso, envolveu-se ativamente na política, favorecendo o par-


tido comunista. Também escreveu romances, crônicas e roteiros cinema-
tográficos, foi professor e poeta até a morte, em Cartagena, na Espanha.
Com Gabriela Mistral e Pablo Neruda, Huidobro fez parte do trio da poe-
sia chilena.
Vejamos algumas obras do autor, extraídas do site da Universidade
do Chile, por meio de um projeto criado para difundir as obras das figuras
chilenas mais destacadas e divulgar a produção dos escritores.

Obras de Vicente Huidobro


22 Ecos del alma. Santiago, Imprenta Chile, 1911.
22 La gruta del silencio. Santiago, Universitaria, 1913.
22 Canciones en la noche. Santiago, Imprenta Chile, 1913.
22 Pasando y pasando. Santiago, Universitaria, 1914.
22 Las pagodas ocultas. Santiago, Universitaria, 1914.
22 Adán. Santiago, Universitaria, 1916.
22 El espejo de agua. Buenos Aires, Oríón, 1916.
22 Horizon carré. París, Paul Birault, 1917.
22 Tour Eiffel. Madrid, Pueyo, 1918.
22 Halliali. Madrid, Jesús López, 1918.
22 Ecuatorial, Madrid, Pueyo, 1918.
22 Poemas árticos. Madrid, Pueyo, 1918.
22 Saisons choisies. París, La Cible, 1921.
22 Finis Britanniae. París, Fíat Lux, 1923.
22 Autonne régulier. París, Libraine de France, 1925.
22 Tout á coup. París, Au Sans Pareil, 1925.
22 Manifestes. París, La Revue Mondiale, 1925.
22 Vientos contrarios. Santiago, Nascimento, 1926.
22 Mío Cid Campeador. Madrid. C.I.A.P., 1929.
22 Altazor o El viaje en paracaídas. Madrid, C.I.A.P., 1931.

– 133 –
Literatura Hispano-Americana

Figura 5.4 – Livros

Fonte: Shutterstock.com/vipman.

Huidobro produziu várias obras, Figura 5.5 – Vicente Huidobro


no entanto, o valor poético de Altazor
segue incalculável até a atualidade. A
maioria dos estudiosos de sua litera-
tura diz que isso é devido ao deslum-
bramento das imagens, à vivacidade, à
invenção e à inconformidade do poeta
perante as letras hispano-americanas.
Sobre isso, deixou até mesmo um epi-
táfio de caraterística criacionista em
sua lápide: Abrid esta tumba: al fondo
se ve el mar.

5.3 Ultraísmo
O que traziam de novo os poetas
de “Ultra” em seus poemas, manifes-
tos, debates? O movimento se enqua-
drava aproximadamente nos limites
do Cubismo e do Criacionismo, com
objetivo de romper, de uma vez por Fonte: memoriachilena.cl.

– 134 –
A poesia do século XX: Vanguarda

todas, com os resíduos do passado. A poesia não deveria, por exemplo,


servir-se dos acontecimentos vividos pelo poeta, como o sentimento e a
emoção, que foram temáticas das escolas anteriores.
O Ultraísmo pode ser considerado uma memorável vanguarda
hispano-americana, ocorrida na Argentina, com seu auge entre 1921
e 1927. Apesar de ter sido breve, é possível notarmos que as formas
tradicionais perderam o significado, como a estrofe, a rima, o ritmo, a
sintaxe, entre outras, dando lugar à metáfora por meio de construções
imagéticas. Para Ferreira (1959, p. 388), os itens que sintetizam a esté-
tica ultraísta são quatro:
1) redução da lírica ao seu elemento fundamentar, a metáfora; 2)
inutilização das frases intermediárias, os nexos e os adjetivos inú-
teis; 3) abolição dos trabalhos ornamentais, o confessionalismo, o
circunstancial, as prédicas e a nebulosidade rebuscada; 4) síntese
de duas ou mais imagens em uma, que desse modo vê aumentada
sua faculdade de sugestão.

Podemos afirmar que o Ultraísmo foi um movimento muito aberto,


eclético, receptivo ao novo, que reuniu elementos do Futurismo, do
Expressionismo, do Dadaísmo, do Cubismo e do Criacionismo. Segundo
Garcia e Serrão (2013, p. 14), “como en otros ismos, en el ultraísmo se
constatala tendencia a suprimir los signos de puntuación, el realce de los
efectos visuales que pueden lograrse com la tipografía, el descubrimiento
del cosmopolitismo y el gusto por temas prosaicos.”. O grupo ultraísta
foi formado em Buenos Aires depois que Jorge Luis Borges regressou da
Espanha, mas essa afinidade não durou muito, pois logo ele abandonou o
movimento. Segundo López (c2017, s/p),
Después de un año en España e instalado definitivamente
en su ciudad natal, Borges colaboró en algunas revistas lite-
rarias y con dos libros adicionales, Luna de enfrente (1925)
e Inquisiciones —que nunca reeditó— establecería para
1925 su reputación de jefe de la más joven vanguardia. En
los siguientes treinta años Borges se transformaría en uno de
los más brillantes y más polémicos escritores de América.
Cansado del ultraísmo que él mismo había traído de España,
intentó fundar un nuevo tipo de regionalismo, enraizado en
una perspectiva metafísica de la realidad.

– 135 –
Literatura Hispano-Americana

Dessa forma, Borges fundou as revistas Prisma e Proa, nas quais


publicou poemas e manifestos com ideias que trouxe da Espanha. Cola-
borou, também, em Nosotros e Martín Fierro – título escolhido como um
símbolo do argentinismo puro.

¿Tu sabías?
La llegada de Borges aceleró el proceso de introducción en Bue-
nos Aires de las ideas renovadoras y los inconformismos creativos.
En diciembre de 1921 aparece la hoja mural Prisma, en cuyo
primer cartel se lanza la Proclama ultraísta, redactada por Bor-
ges y firmada por él mismo, González Lanuza, Guillermo Juan
y Guillermo de Torre. Proa, con sus dos épocas (1922-1923 y
1924-1926) y el regreso de Martín Fierro (1924-1927) fueron
las dos publicaciones vanguardistas que sirvieron de voceros a
las inquietudes de los ultraístas. Importante para este momento
vanguardista de la literatura argentina es el grupo Florida, que se
aglutinó en torno a Martín Fierro, y usó las páginas de la publi-
cación para que Jorge Luis Borges, Oliverio Girondo, Evar Mén-
dez, Norah Lange, Leopoldo Marechal, Conrado Nalé Roxlo,
José de España, Horacio Rega Molina, Francisco Luis Bernárdez,
entre otros, sacaron a la luz sus ideales literarios ultraístas de
ruptura con los cánones. Fonte: Garcia; Serrão (2013, p. 14).

O primeiro livro de Jorge Luis Borges (1899-1986) foi publicado


em 1923, intitulado Fervor de Buenos Aires, no qual narra o reencon-
tro com a cidade de sua infância. Esse autor “conseguiu unir os dois
aspectos que alimentaram a sua literatura: a presença da cidade (o
fervor em Buenos Aires) e a preocupação metafísica” (JOSEF, 1989,
p. 186).
Trata-se de uma interpretação afetuosa da capital da Argentina, tra-
duzida de uma maneira que foge à retórica e aos excessos sentimen-
tais. É um amor inteligente, que procura no objeto amado – ruas, casas,
pátios, crepúsculos, árvores – o contorno transcendente, oferecendo ao
autor a oportunidade de viver as questões que o comovem o sentimento
e o espírito. Vejamos um trecho de Las calles, extraído do livro Fervor
de Buenos Aires:

– 136 –
A poesia do século XX: Vanguarda

Figura 5.6 – Fervor de Buenos Aires

Fonte: poetrydispatch.com.
Las calles
Las calles de Buenos Aires
ya son mi entraña.
No las ávidas calles,
incómodas de turba y ajetreo,
sino las calles desganadas del barrio,
casi invisibles de habituales,
enternecidas de penumbra y de ocaso
y aquellas más afuera
ajenas de árboles piadosos
donde austeras casitas apenas se aventuran,
abrumadas por inmortales distancias,
a perderse en la honda visión
de cielo y llanura.
Son para el solitario una promesa
porque millares de almas singulares las pueblan,

– 137 –
Literatura Hispano-Americana

únicas ante Dios y en el tiempo


y sin duda preciosas.
Hacia el Oeste, el Norte y el Sur
se han desplegado -y son también la patria- las calles;
ojalá en los versos que trazo
estén esas banderas.
Fonte: Borges (1923).

Borges começou sua carreira literária com a poesia e, à medida que o


tempo avançou, aumentou a produção em prosa. Seus poemas são espelhos
da condição humana, ao mesmo tempo que são fixados dentro do império da
forma, ao tomar consciência da incapacidade de atingir o absoluto. Assim,
a expressão de Borges é reflexo direto de sua concepção de mundo: “Acima
da deslumbrante riqueza de linguagem, além da enorme capacidade inven-
tiva, o aspecto mais emocionante de sua obra é o tremor da confissão íntima,
revelando-nos um dos aspectos do homem.” (JOSEF, 1989, p. 188).
Borges nasceu em Buenos Aires e foi escritor, poeta, tradutor, crítico
literário e ensaísta. Com vasta cultura literária e filosófica, elaborou um
tipo de linguagem em que há ocorrências metafísicas, históricas e teoló-
gicas em sua ficção. Mesclando ficção Figura 5.7 – Jorge Luis Borges
e realidade, concentrou-se em temas
universais, o que lhe garantiu conheci-
mento mundial, já que é considerado o
maior escritor argentino e um dos mais
importantes nomes da história da lite-
ratura até hoje.
É importante mencionarmos que
Borges recebeu inúmeros prêmios,
entre eles o Prêmio do Congresso
Internacional de Editores, além de
reconhecimentos do governo da Itália,
da França, da Inglaterra e da Espanha.
Infelizmente, prejudicado por proble-
mas nos olhos, foi aos poucos per- Fonte: estantevirtual.com.br.
dendo a visão, mas contou com o auxílio da mãe para escrever seus livros

– 138 –
A poesia do século XX: Vanguarda

quando ficou totalmente cego, aos 55 anos. Por causa da doença, viveu em
reclusão até o fim da vida.

Algumas obras de Jorge Luis Borges


22 Fervor de Buenos Aires (1923)
22 Luna de enfrente (1925)
22 Cuaderno San Martín (1929)
22 Poemas (1923-1943)
22 El hacedor (1960)
22 Para las seis cuerdas (1967)
22 El otro, el mismo (1969)
22 Elogio de la sombra (1969)
22 El oro de los tigres (1972)
22 La rosa profunda (1975)
22 Obra poética (1923-1976)
22 La moneda de hierro (1976)
22 Historia de la noche (1976)
22 La cifra (1981)
22 Los conjurados (1985)

Figura 5.8 – Livro de poesia


Fonte: Shutterstock.com/finwal89.

– 139 –
Literatura Hispano-Americana

Importante

A última entrevista de Jorge Luis Borges

“Não criei personagens. Tudo o que escrevo é autobiográfico. Porém,


não expresso minhas emoções diretamente, mas por meio de fábulas e
símbolos. Nunca fiz confissões. Mas cada página que escrevi teve ori-
gem em minha emoção.”

Na entrevista concedida em julho de 1985 ao jornalista Roberto D’Ávila,


Borges falou sobre a infância, a cegueira e a morte e afirmou que o fra-
casso e o sucesso são impostores. Traduziu seu amor pela literatura em
uma frase: “Se recuperasse a visão eu não sairia de casa. Ficaria lendo
os muito livros que estão aqui, tão perto e tão longe de mim”. Borges
morreu menos de um ano depois de ter concedido a entrevista.

Leia a entrevista na íntegra no site da Revista Bula (<http://www.revista-


bula.com/533-a-ultima-entrevista-de-jorge-luis-borges>).

5.4 Surrealismo
O Surrealismo surgiu como uma ação que acumulou as caracterís-
ticas da poesia e da arte das estéticas anteriores – entre as tendências da
Vanguarda, foi a que teve maior destaque e melhor trajetória. Trata-se do
último “ismo” que conservou e renovou a vitalidade literária; e torna-
-se importante ressaltarmos que o Surrealismo se manifestou como um
movimento de luta e depois se converteu em uma visão de mundo. Seu
fundador foi o escritor francês André Breton (1896-1966), que publicou,
em 1924, o Manifesto do Surrealismo, no qual apresentou os principais
fundamentos sobre a emancipação total do ser humano.

Importante

El surrealismo es un movimiento nacido en Francia a partir del dada-


ísmo y desarrollado durante las primeras décadas del siglo XX.
La palabra surrealista se refiere a aquello que está sobre (sur) o por

– 140 –
A poesia do século XX: Vanguarda

encima del realismo, de la realidad. Por lo tanto, los autores que for-
man parte de este movimiento intentan descubrir una verdad implícita
mediante escrituras automáticas, sin correcciones racionales ni el res-
peto por un razonamiento lógico. Los poetas surrealistas utilizan todo
tipo de imágenes para expresar sus emociones.

Fonte: Gudiña (2008).

Os autores aderiram ao registro da obra sem preocupação com pontua-


ção, sem ordem, no caos, ou seja, o que lhes chegava à mente: eram adeptos
da “escrita automática”. Nos países latino-americanos, o movimento surre-
alista contou com a adesão de vários poetas: César Vallejo, Pablo Neruda,
Braulio Arenas, César Moro, Xavier Abril, entre outros. Como houve mui-
tas manifestações nos grandes centros culturais dos países do imenso con-
tinente, torna-se impossível abarcarmos todos. Assim, faremos um breve
recorte das características e das obras de César Vallejo e Pablo Neruda.
Figura 5.9 – César Vallejo
César Vallejo (1894-1938) nas-
ceu no Peru e seus poemas se tornaram
famosos devido à tristeza nostálgica
e ao pessimismo da raça indígena: há
uma sensibilidade do autor perante
injustiça e dor. Além de poeta, foi ensa-
ísta, romancista, dramaturgo e contista.
As obras Los heraldos negros (1918)
e Trilce (1922) são consideradas duas
das mais importantes da América pela
profundidade de sentimentos e pela
ousadia da renovação literária. Vale
ressaltar que Vallejo iniciou com a
poesia modernista, ao estilo de Rubén
Darío, mas é considerado vanguardista
por seu estilo inovador.
Em Los heraldos negros, o
autor apresenta uma visão sombria
Fonte: CC BY 3.0/Juan Domingo Córdoba.

– 141 –
Literatura Hispano-Americana

de um mundo em que o ser humano é um ser sofrido; em Trilce, a angús-


tia e a desolação estão presentes em uma linguagem nova que contribui
para a sensação de um mundo caótico e angustiante. Já suas últimas
obras, Poemas humanos (1939) e España, aparta de mí ese cáliz (1940),
demonstram uma poesia com intenção social e comprometida com a
Guerra Civil Espanhola.
De acordo com Josef (1989), por meio de uma poesia carregada de
vivências sombrias e patéticas, de uma profunda melancolia, perpassa a
paisagem que foi testemunha de anos de infância e de adolescência aco-
metidos por sofrimento. Vallejo aprofundou sua sensibilidade e criou for-
mas transcendentais com seus temas: sua poesia é universal em sua dor, o
que o aproxima de todos os homens.
Por razões políticas, mudou-se para Paris, onde viveu sofrendo seus
últimos dias e quase esquecido até a morte, em 15 de abril de 1938, uma
sexta-feira santa e chuvosa em Paris, e não em uma quinta-feira, como ele
previu em seu poema Piedra negra sobre una piedra blanca:

Piedra negra sobre una piedra blanca

Me moriré en París con aguacero,


un día del cual tengo ya el recuerdo.
Me moriré en París — y no me corro —
Tal vez un jueves, como es hoy, de otoño.
Jueves será, porque hoy, jueves, que proso
estos versos, tos húmeros me he puesto
a la mala y, jamás como hoy, me he vuelto,
con todo mi comino, a verme solo.
César Vallejo ha muerto, le pegaban
todos sin que él les haga nada;
le daban duro con un palo y duro
también con una soga; son testigos
los días jueves y los huesos húmeros,
la soledad, la lluvia, los caminos…

Fonte: Vallejo (1936?).

– 142 –
A poesia do século XX: Vanguarda

Figura 5.10 – Chuva

Fonte: Shutterstock.com/Kichigin.

Pablo Neruda (1904-1973) nasceu em Parral, no Chile, e ficou conhe-


cido como “poeta do povo”, pois transportou para a poesia suas viagens
pelo mundo, seus amores e suas amizades. Foi considerado uma das maio-
res vozes do continente com ressonância internacional e recebeu o Prêmio
Nobel de Literatura, em 1971: “Sem dúvida, estamos diante de um grande
poeta. Grande pela intenção social de sua produção, grande pelo elogio
incansável à sua região e à toda a América, grande pela capacidade inova-
dora da linguagem.” (BERTUSSI, 2009, p. 877).
Seu verdadeiro nome era Ricardo Eliecer Neftalí Reyes Basoalto.
Em 1921, mudou-se para Santiago com o intuito de estudar Pedagogia e
francês na Universidade de Chile. Em 1927, iniciou a carreira diplomá-
tica que ocupou até 1940. Em suas inúmeras viagens, conheceu várias
personalidades literárias, como Federico García Lorca e Rafael Alberti.
A Guerra Civil Espanhola e a morte de Lorca fizeram Neruda aderir à
causa republicana.
Foi senador no Chile entre 1945 e 1948 e, em 1970, foi nomeado
para a presidência do país por seu partido, mas renunciou a favor de seu
amigo Salvador Allende. Foi embaixador na França, cargo que ocupou
entre 1971 e 1972. Suas ideias políticas o conduziram a vários momentos
de exílio e perseguições. Morreu em 23 de setembro de 1973, em San-
tiago, em circunstâncias não esclarecidas.

– 143 –
Literatura Hispano-Americana

O carteiro e o poeta é um livro de Antonio Skármeta que


narra a amizade de Pablo Neruda com um carteiro em
um momento de exílio do escritor. Em 1994, tornou-
-se um filme que alcançou grande sucesso de crítica.
“– Eu também queria ser poeta. Como fazer para tornar-
-se poeta? São as palavras que ligam estes dois homens,
tão diferentes quanto às suas histórias, suas classes
sociais, suas profissões, seus mundos, suas crenças.”
Segue um fragmento da análise do filme:
“É um filme para todos os sentidos e em todos os sentidos. A
fotografia é linda, a música, maravilhosa e os textos, magní-
ficos. Um libelo à amizade, à fraternidade e à lealdade. Uma
ode ao amor e à poesia. Uma prova incontestável de que a
poesia pode estar em toda parte, basta que alguém seja capaz
de resgatá-la para fazer-se poeta. Para Munsterberg, “um filme
deve ser feito para despertar emoções” – é este o filme.
O cenário do filme é uma ilha isolada na costa italiana
onde o poeta Pablo Neruda curte exílio político.
Mario Ruopollo, tímido e introspectivo filho de pescador, não
consegue ajustar-se ao ofício da pesca, sua sensibilidade o chama
para algo que não pode ainda perceber o que seja. Em certa medida,
Mario é também um exilado. É político o exílio de Neruda, psi-
cossocial, o de Mario. O pai de Mario quase não fala e, quando o
faz, é para cobrar do filho que procure uma ocupação. De repente,
Mario se depara com um cartaz na porta dos Correios, procurando
um carteiro que possua bicicleta, para um emprego temporário.
Mal poderia imaginar que este trabalho mudaria o seu destino.
Mario é contratado para entregar, diariamente, a correspondência
do poeta Pablo Neruda, numa casa singela, em Cala di Sotto.”
Continue a leitura!
Disponível em: <http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_art
text&pid=S0100-34372008000100015>. Acesso em: 18 fev. 2018.
Assista ao filme e leia o livro.

– 144 –
A poesia do século XX: Vanguarda

Figura 5.11 – O carteiro e o poeta

Fonte: Editora Record.

A estrutura da obra de Pablo Neruda apresentou períodos marcados


por temáticas e estratégias expressivas. Iniciou com a poesia sensual, com
o predomínio de temas amorosos; fez a transição para o Surrealismo, que
mostrava a solidão, a angústia e o caos da humanidade; em seguida, partiu
para a temática social e humana, defendendo os humildes e os oprimidos;
depois, para a poetização do cotidiano, no qual estavam presentes a polí-
tica e o humor; por fim, voltou-se para a poesia de íntima reflexão e para
os aspectos biográficos. De acordo com Plaza (2014, s/p),
En sus comienzos, Neruda muestra cierta inclinación hacia el
romanticismo y el modernismo, Bécquer y Darío son sus princi-
pales fuentes; es la época en la que escribe el libro Crepusculario.
Después, a partir de la obra Veinte poemas de amor y una canción
desesperada, vemos ya en Neruda una poesía más personal en la
que expresa sus sentimientos con un toque dramático, que le hará
inconfundible. Aparecen ya en ese momento los rasgos definitorios
de su poesía: metáforas, comparaciones, símbolos, tintes surrea-
listas. La composición más ambiciosa de este escritor es la titu-
lada Canto general, en la que plasma el espíritu del pueblo chileno.

– 145 –
Literatura Hispano-Americana

A transição para o Surrealismo aconteceu com a obra Tentativa del


hombre infinito, publicada em 1926, e firmou-se com Residencia en la
Tierra (1932), na qual demonstrou sua transcendência social. Essa obra
nasceu de uma profunda crise existencial e “a dor passa a ser, aos poucos,
a angústia de quem vive num mundo destroçado e desintegrado. A tristeza
pessoal transforma-se em desespero cósmico.” (JOSEF, 1989, p. 202).
Vejamos, então, como Pablo Neruda tratou a morte como o fim do
processo de destruição no poema Sólo la muerte, extraído da obra Resi-
dencia en la Tierra:

Sólo la muerte
Hay cementerios solos,
tumbas llenas de huesos sin sonido,
el corazón pasando un túnel
oscuro, oscuro, oscuro,
como un naufragio hacia adentro nos morimos,
como ahogarnos en el corazón,
como irnos cayendo desde la piel al alma.
Hay cadáveres,
hay pies de pegajosa losa fría,
hay la muerte en los huesos,
como un sonido puro,
como un ladrido sin perro,
saliendo de ciertas campanas, de ciertas tumbas,
creciendo en la humedad como el llanto o la lluvia.
Yo veo, solo, a veces,
ataúdes a vela
zarpar con difuntos pálidos, con mujeres de trenzas muertas,
con panaderos blancos como ángeles,
con niñas pensativas casadas con notarios,
ataúdes subiendo el río vertical de los muertos,
el río morado,
hacia arriba, con las velas hinchadas por el sonido de la muerte,
hinchadas por el sonido silencioso de la muerte.
A lo sonoro llega la muerte
como un zapato sin pie, como un traje sin hombre,
llega a golpear con un anillo sin piedra y sin dedo,
llega a gritar sin boca, sin lengua, sin garganta.

– 146 –
A poesia do século XX: Vanguarda

Sin embargo sus pasos suenan


y su vestido suena, callado, como un árbol.
Yo no sé, yo conozco poco, yo apenas veo,
pero creo que su canto tiene color de violetas húmedas,
de violetas acostumbradas a la tierra
porque la cara de la muerte es verde,
y la mirada de la muerte es verde,
con la aguda humedad de una hoja de violeta
y su grave color de invierno exasperado.
Pero la muerte va también por el mundo vestida de escoba,
lame el suelo buscando difuntos,
la muerte está en la escoba,
es la lengua de la muerte buscando muertos,
es la aguja de la muerte buscando hilo.
La muerte está en los catres:
en los colchones lentos, en las frazadas negras
vive tendida, y de repente sopla:
sopla un sonido oscuro que hincha sábanas,
y hay camas navegando a un puerto
en donde está esperando, vestida de almirante.
Fonte: Neruda (1932)..
Figura 5.12 – Morte

Fonte: Shutterstock.com/Fantom666.

– 147 –
Literatura Hispano-Americana

A morte e o sofrimento se manifestam na poesia de Neruda como


uma maneira de desvirtuar as perspectivas de explicações otimistas da
existência humana – a concepção de vida, para o poeta, é de uma visão
trágica. Podemos afirmar que a guerra da Espanha produziu um grande
impacto em sua escrita, uma vez que não sabia como se refugiar da angús-
tia de contemplar a desintegração do próprio ser. Sentia-se parte da huma-
nidade e sofria com ela, pois disse: “yo tengo un concepto dramático de la
vida y romántico; no me corresponde lo que no llega profundamente a mi
sensibilidad” (NERUDA, 1926, p. 9).
Figura 5.13 – Pablo Neruda

Fonte: www.scoopnest.com.

Obras de Pablo Neruda


22 Crepusculario. Santiago, Ediciones Claridad, 1923.
22 Veinte poemas de amor y una canción desesperada. Santiago, Nasci-
mento, 1924.
22 Tentativa del hombre infinito. Santiago, Nascimento, 1926.
22 El habitante y su esperanza. Novela. Santiago, Nascimento, 1926.
(prosa)
22 Residencia en la tierra (1925-1931). Madrid, Ediciones del
Arbol, 1935.
22 España en el corazón. Himno a las glorias del pueblo en la guerra:
(1936- 1937). Santiago, Ediciones Ercilla, 1937.

– 148 –
A poesia do século XX: Vanguarda

22 Tercera residencia (1935-1945). Buenos Aires, Losada, 1947.


22 Canto general. México, Talleres Gráficos de la Nación, 1950.
22 Los versos del Capitán. Losada, 1952.
22 Todo el amor. Santiago, Nascimento, 1953.
22 Odas elementales. Buenos Aires, Losada, 1954.
22 Nuevas odas elementales. Buenos Aires, Losada, 1955.
22 Tercer libro de las odas. Buenos Aires, Losada, 1957.
22 Estravagario. Buenos Aires, Losada, 1958.
22 Cien sonetos de amor. Santiago, Ed. Universitaria, 1959.
22 Navegaciones y regresos. Buenos Aires, Losada, 1959.
22 Poesías: Las piedras de Chile. Buenos Aires, Losada, 1960.
22 Cantos ceremoniales. Buenos Aires, Losada, 1961.
22 Memorial de Isla Negra. Buenos Aires, Losada, 1964. 5 vols.
22 Arte de pájaros. Santiago, Ediciones Sociedad de Amigos del Arte
Contemporáneo, 1966.
22 Fulgor y muerte de Joaquín Murieta. Bandido chileno injusticiado
en California el 23 de julio de 1853. Santiago, Zig-Zag, 1967.
(obra teatral)
22 La Barcaola. Buenos Aires, Losada, 1967.
22 Las manos del día. Buenos Aires, Losada, 1968.
22 Fin del mundo. Santiago, Edición de la Sociedad de Arte Contem-
poráneo, 1969.
22 Maremoto. Santiago, Sociedad de Arte Contemporáneo, 1970.
22 La espada encendida. Buenos Aires, Losada, 1970.
22 Discurso de Stockholm. Alpigrano, Italia, A. Tallone, 1972.
22 Invitación al Nixonicidio y alabanza de la revolución chilena. San-
tiago, Empresa Editora Nacional Quimantú, 1973.
22 ibro de las preguntas. Buenos Aires, Losada, 1974.
22 Jardín de invierno. Buenos Aires, Losada, 1974.
22 Confieso que he vivido. Memorias. Barcelona, Seix Barral, 1974.
22 Para nacer he nacido. Barcelona, Seix Barral, 1977.
22 El río invisible. Poesía y prosa de juventud. Barcelona, Seix Bar-
ral, 1980.

– 149 –
Literatura Hispano-Americana

Figura 5.14 – Livros

Fonte: Shutterstock.com/Thomas Bethge.

Observamos que a voz de Pablo Neruda é atual e chega até os leitores


por meio da publicação de obras póstumas e, principalmente, por meio de
suas comoventes memórias – Confieso que he vivido. Mas também pode-
mos afirmar, de maneira geral, que todas as correntes da poesia hispano-
-americana ainda estão bastante representadas na literatura atual, apesar
de novas tendências surgirem e tentarem realizar a síntese de várias fontes
de inspiração.

Da teoria para a prática


O poema Altazor, do poeta chileno Vicente Huidobro, foi publicado
na Espanha em 1931. Trata-se de um poema extenso, com sete cantos que
retratam uma nova linguagem que rompe com a tradição modernista. O
ritmo do poema, sua nova concepção de musicalidade lírica e as palavras
mostradas na materialidade proporcionaram um novo código de ordem
na língua espanhola. O poema está inserido no movimento vanguardista
chamado Criacionismo, que se desenvolveu no século XX.
Ouça a declamação do fragmento do Canto II, El lado oscuro del
corazón 2, no YouTube. Sugerimos, também, que você faça a leitura com-

– 150 –
A poesia do século XX: Vanguarda

pleta da obra de Huidobro, disponível no site Memória Chilena <http://


www.memoriachilena.cl/archivos2/pdfs/MC0005042.pdf>.
Após ouvir a declamação do fragmento do Canto II, da obra Altazor,
é interessante instigar os alunos para as seguintes reflexões:
a) Os versos do Canto II foram dedicados a quem? De que maneira
isso ocorre?
b) O Canto II está repleto de imagens belas e originais no emprego
da linguagem. Encontre e comente alguns exemplos que susten-
tam essa informação.
c) Vicente Huidobro se mostra como um artista criador, e não imita-
dor da natureza. Faça uma análise a respeito dessa característica.

Síntese
Neste capítulo, observamos que a Vanguarda surgiu como oposição
ao Modernismo. As correntes vanguardistas como o Criacionismo, o Ultra-
ísmo e o Surrealismo tiveram o objetivo de eliminar os modelos formais
da métrica, da rima e do ritmo e a liberdade na escrita e o uso da metáfora
foram características exploradas em busca de uma nova expressão.
No Criacionismo, destacamos o poeta Vicente Huidobro; no Ultra-
ísmo, vimos a importância de Jorge Luis Borges; e, no Surrealismo, abor-
damos alguns traços fundamentais de dois grandes poetas: César Vallejo
e Pablo Neruda. Assim, na poesia do século XX vimos que os poetas qui-
seram apenas ser poetas – esse foi o princípio norteador dos movimentos
chamados de “ismos”.

Atividades
1. A vanguarda hispano-americana representou uma ruptura com
a tradição retórica e de harmonia formal do movimento moder-
nista, iniciado por Rubén Darío. Leia o fragmento a seguir e
escreva suas impressões sobre a forma como foi apresentada a
poesia dentro dessa tendência literária:

– 151 –
Literatura Hispano-Americana

Los poemas de Vallejo, Girondo y Huidobro son emblemáticos de la


renovación que vive la poesía durante las vanguardias. La rima, la pre-
cisión métrica y el uso de esquemas estróficos de la poesía tradicional
desaparecen para hacer fluir la expresión poética más allá de cualquier
límite estructural. El verso breve se sucede o se agrupa siguiendo el
ritmo del concepto, las imágenes se yuxtaponen y se continúan en el
poema en prosa de Girondo. La palabra poética se lanza hacia el vacío
en largas tiradas de versos libres e irregulares, en el caso de Huidobro.
El ritmo está marcado por la sonoridad de las palabras, que incorporan
expresiones coloquiales y cotidianas que cada poeta reinventa en su
trabajo constante con el lenguaje. (LÓPEZ, c2017, s/p)

2. Vicente Huidobro foi o precursor do Criacionismo e até hoje sua


obra é referência para os autores chilenos. Leia a poesia Arte
poética, extraída de El espejo de agua (1916), e explique o verso
El poeta es un pequeño Dios.

Arte poética
Que el verso sea como una llave
que abra mil puertas.
Una hoja cae; algo pasa volando;
cuanto miren los ojos creado sea,
y el alma del oyente quede temblando.

Inventa mundos nuevos y cuida tu palabra;


el adjetivo, cuando no da vida, mata.

Estamos en el ciclo de los nervios.


El músculo cuelga,
como recuerdo, en los museos;
mas no por eso tenemos menos fuerza:
el vigor verdadero
reside en la cabeza.

Por qué cantáis la rosa, ¡oh poetas!


hacedla florecer en el poema.

Sólo para nosotros


viven todas las cosas bajo el sol.

El poeta es un pequeño Dios.


Fonte: Huidobro (1916).

– 152 –
A poesia do século XX: Vanguarda

Figura 5.15 – Mundo novo

Fonte: Shutterstock.com/Shevs.

3. O Ultraísmo foi introduzido na literatura hispano-americana por


Jorge Luís Borges, a partir de 1921. Foi um movimento de curta
duração, mas constituiu-se em um processo muito aberto, eclé-
tico, receptivo ao novo, que reuniu elementos do Futurismo, do
Expressionismo, do Dadaísmo, do Cubismo e do Criacionismo.
De acordo com essa perspectiva, assista ao vídeo Ultraísmo –
Jorge Luis Borges, no YouTube, e cite as características dessa
estética literária.
4. Em contato com as ousadias dos movimentos de Vanguarda,
Pablo Neruda tinha seus traços voltados para o Surrealismo.
Leia La calle destruida, poema extraído do livro Residencia en
la Tierra II, e registre suas impressões:

La calle destruída
Por el hierro injuriado, por los ojos del yeso
pasa una lengua de años diferentes

– 153 –
Literatura Hispano-Americana

del tiempo. Es una cola


de ásperas crines, unas manos de piedra llenas de ira,
y el color de las casa enmudece, y estallan
las decisiones de la arquitectura,
un pie terrible ensucia los balcones:
con lentitud, con sombra acumulada,
con máscaras mordidas de invierno y lentitud,
se pasean los días de alta frente
entre casas sin luna.

El agua y la costumbre y el lodo blanco


que la estrella despide, y en especial
el aire que las campanas han golpeado con furia,
gastan las cosas, tocan
las ruedas, se detienen
en las cigarrerías,
y crece el pelo rojo en las cornisas
como un largo lamento, mientras a lo profundo
caen llaves, relojes,
flores asimiladas al olvido.

¿Dónde está la violeta recién parida? ¿Dónde


la corbata y el virginal céfiro rojo?
Sobre las poblaciones
una lengua de polvo podrido se adelanta
rompiendo anillos, royendo pintura,
haciendo aullar sin voz las sillas negras,
cubriendo los florones del cemento, los baluartes de metal
destrozado,
el jardín y la lana, las ampliaciones de fotografías ardientes
heridas por la lluvia, la sed de las alcobas, y los grandes
carteles de los cines en donde luchan
la pantera y el trueno,
las lanzas del geranio, los almacenes llenos de miel perdida,
la tos, los trajes de tejido brillante,
todo se cubre de un sabor mortal
a retroceso y humedad y herida.

Talvez las conversaciones anudadas, el roce de los cuerpos,


la virtud de las fatigadas señoras que anidan en el humo,
los tomates asesinados implacablmente,
el paso de los caballos de un triste regimiento,
la luz, la presión de muchos dedos sin nombre
gastan la fibra plana de la cal,

– 154 –
A poesia do século XX: Vanguarda

rodean de aire neutro las fachadas


como cuchillos: mientras
el aire del peligro roe las circunstancias,
los ladrillos, la sal se derraman como aguas
y los carros de gordos ejes tambalean.

¡Ola de rosas rotas y agujeros! ¡Futuro


de la vena olorosa! ¡Objetos sin piedad!
¡Nadie circule! ¡Nadie abra los brazos
dentro del agua ciega!
¡Oh movimiento, oh nombre malherido,
oh cucharada de viento confuso
y color azotado! ¡Oh herida en donde caen
hasta morir las guitarras azules!
Fonte: Neruda (1925-1931).
Figura 5.16 – Destruição

Fonte: Shutterstock.com/Pavel Chagochkin.

– 155 –
6
A principais tendências
da narrativa do
século XX

Neste capítulo, procuraremos abordar as principais ten-


dências narrativas da literatura hispano-americana no século
XX. Para facilitar o entendimento, dividimos em três temáti-
cas fundamentais.
A primeira, chamada de narrativa regionalista ou da terra, apre-
senta a natureza com grandiosas proporções. Veremos alguns títulos
como La vorágine, de José Eustasio Rivera; Don Segundo Sombra,
de Ricardo Güiraldes; e Doña Bárbara, de Rómulo Gallegos.
A segunda temática que abordaremos será a chamada nar-
rativa da revolução mexicana, centrada nos problemas políticos
– as histórias são um testemunho dos acontecimentos no México
entre 1910 e 1920. A obra que deu início ao gênero foi Los de
abajo, de Mariano Azuela, mas também veremos La sombra del
caudillo, de Martín Luis Guzmán, e Tropa vieja, de Francisco
Luis Urquizo.
Literatura Hispano-Americana

Por fim, abordaremos a terceira temática, conhecida como narrativa


social ou indigenismo. No século XX, a corrente indigenista foi inaugu-
rada com Raza de bronce, de Alcides Arguedas. Outros títulos impor-
tantes são Huasipungo, de Jorge Icaza, e El mundo es ancho y ajeno, de
Ciro Alegría.

6.1 O romance hispano-americano


Na primeira metade do século XX, o gênero literário que mais se
destacou na literatura hispano-americana foi a poesia; no entanto, durante
a segunda metade do século, a narrativa atingiu seu auge e ficou conhecida
mundialmente. Os conteúdos abordados pelos autores foram a natureza,
os temas sociais e o indigenismo, mas em certas ocasiões apresentaram
traços naturalistas e, ao mesmo tempo, foram compatíveis com alguns res-
quícios da linguagem romântica.
E vale ressaltarmos que as obras tinham em comum a busca pela
identidade nacional. Devemos reconhecer, também, que a pressão dos
acontecimentos fez, sem dúvidas, que o romance se elevasse à categoria
de gênero mais representativo da literatura hispano-americana.

6.2 A narrativa regionalista ou da terra


O tema fundamental do romance de 1920 a 1930 foi a natureza em
grandes proporções. Também encontramos a força da terra que condi-
ciona a aventura humana e que se ambienta nas cordilheiras, nos pampas
e na selva. A atenção às peculiaridades de cada área é encontrada com
frequência no romance regionalista ou da terra. De acordo com López
(c2017, s/p),
La naturaleza – pampa, selva virgen, río misterioso o caudaloso,
desierto interminable lleno de sugestión o reino de desolación–
atrae profundamente al escritor y le induce a manifestar sus pro-
pias emociones en obras que construyen la epopeya del continente
americano. De este modo surge una literatura nueva que es para
algunos críticos la única voz realmente original de América, expre-
sión genuina de un mundo que logra, mediante la complejidad de
sus elementos, atraer la atención de un numeroso público lector.

– 158 –
A principais tendências da narrativa do século XX

Dentro dessa linha, destacamos três grandes romances: La vorágine,


de José Eustasio Rivera; Don Segundo Sombra, de Ricardo Güiraldes; e
Doña Bárbara, de Rómulo Gallegos.
Figura 6.1 – José Eustasio Rivera

Fonte: www.biografiasyvidas.com.

José Eustasio Rivera (1888-1928) nasceu na Colômbia e foi escritor,


político e advogado. Participou do estabelecimento das fronteiras entre a
Venezuela e a Colômbia, o que o permitiu conhecer as planícies e as selvas
de seu país em uma experiência que resultou em sua obra mais famosa, de
veia “telúrica”, intitulada La vorágine. Também escreveu uma coletânea
de sonetos com forma pós-modernista.
A obra La vorágine foi publicada em 1924 e traduzida para vários
idiomas, entre eles inglês, francês, alemão, russo, italiano, japonês e
português. É considerada um clássico da literatura colombiana e foi
adaptada uma vez para o cinema e duas para a televisão, como novela e
minissérie com 13 capítulos. Foi escrita após a viagem de Rivera pelas
áreas dos rios Negro e Orinoco como membro de uma comissão diplo-

– 159 –
Literatura Hispano-Americana

mática encarregada de estudar os limites entre a Venezuela e a


Colômbia (FERREIRA, [1959]).
Esse romance reproduziu o conflito entre a civilização e a barbá-
rie por meio das aventuras do poeta Arturo Cova e de sua amante Ali-
cia. Trata-se de uma história de paixão e vingança ao mesmo tempo que
expõe as tristes condições de vida dos seringueiros na floresta amazônica.
Segundo López (c2017), nessa narrativa “sobresale la denuncia del trato
al que se veían sometidos los trabajadores de las caucherías. La voracidad
de la naturaleza es incontenible y el hombre sucumbe bajo la milagrosa y
siniestra fuerza que ella engendra.”.

Figura 6.2 – La vorágine, de José Eustasio Rivera

Fonte: editorialdracena.com.
O romance trata da selva tropical e também dos seringueiros em luta
com a indomável natureza amazônica e com os homens ganan-
ciosos que os exploram e matam. Um dos trechos mais marcantes
descreve a chegada das formigas carnívoras, as tambochas:

– 160 –
A principais tendências da narrativa do século XX

Aquí, los responsos de sapos hidrópicos, las male-


zas de cerros misántropos, los rebalses de caños
podridos. Aquí, la parásita afrodisíaca que llena
el suelo de abejas muertas; la diversidad de flores
inmundas que se contraen con sexuales palpita-
ciones y su olor pegajoso emborracha como una
droga: la liana maligna cuya pelusa enceguece los
animales; la pringamosa que inflama la piel, la
pepa del curujú que parece irisado globo y sólo
contiene ceniza cáustica, la uva purgante, el
corozo amargo. Aquí, de noche, voces descono-
cidas, luces fantasmagóricas, silencios fúnebres.
Es la muerte, que pasa dando la vida. (Rivera,
1938, p. 169)

Figura 6.3 – Ricardo Güiraldes

Fonte: biografiasyvidas.com.

Ricardo Güiraldes (1886-1927) tinha uma personalidade encantadora,


nasceu na Argentina e, segundo os críticos, criou a obra-prima da literatura
gauchesca com o romance intitulado Don Segundo Sombra, publicado em
1926. Escreveu vários livros interessantes e é possível ressaltar que “o tema
essencial de suas obras é a vida, numa dupla orientação terrestre e suprater-

– 161 –
Literatura Hispano-Americana

restre, na tentativa de abarcar a natureza material e espiritual do universo e


a unidade cósmica de seres e coisas.” (JOSEF, 1989, p. 161).
Iniciou sua carreira literária com um livro de poesia chamado El
cencerro de cristal (1915) e seguiu com Cuentos de muerte y de sangre
(1915); Raucho (1917); Rosaura (1922); Xaimaca (1927). Em seus últi-
mos textos, sua preocupação se voltou para temas espirituais, místicos,
teosóficas e hindus, características vistas em Poemas solitarios (1928) e
Poemas místicos (1928).
Don Segundo Sombra é uma das obras mais importantes da literatura
argentina e sua publicação foi recebida com entusiasmo pelos intelectuais.
Para López (c2017), Don Segundo “es una obra universal, como el Qui-
jote, es el Quijote de las Pampas: bueno, sencillo, noblote y sobrio. Tiene
un ideal social, pero velado por el buen gusto: colaboración de clases y
razas para formar una patria estable.”.
O romance conta a história de um rapaz, o narrador, que está fas-
cinado pela figura serena e forte do gaúcho Segundo Sombra. Segue-o
durante anos, desenvolve seu aprendizado da vida dos pampas e se torna
também um homem do campo. Todavia, é obrigado a interromper a vida de
aventuras para voltar à estância e suceder o falecido pai. Segundo Sombra
o acompanha, mas observa que o antigo discípulo já é um homem e que
não precisa mais dele. A despedida dos dois amigos é de grande emoção:

XXVII

[…]

Aunque no me negara a los nuevos modos de vida y encontrara un


acerbo gusto en mi aprendijaze mental, algo inadaptado y huraño me
quedaba del pasado.

Y esa tarde iba a sufrir el peor golpe.

Miré el reloj. Eran las cinco. Monté a caballo y fui para el lado del
callejón, donde hallaría a mi padrino. Resultaba ya imposible retenerlo,
después de tanta insistencia inútil. Él estaba hecho para irse, siempre,

– 162 –
A principais tendências da narrativa do século XX

y tres años de permanencia en un lugar, lo habían saturado de inmovi-


lidad. Demasiado sentía yo en mí la sorbente sugestión de todo camino,
para no comprender que en don Segundo huella y vida eran una sola
cosa. ¡Y tenerme que quedar!

Nos saludamos como siempre.

A la par, tranqueando, hicimos una legua por el callejón. Entramos


a un potrero, para cortar campo, y llegamos hasta la loma nombrada
«del Toro Pampa», donde habíamos convenido despedirnos. No hablá-
bamos. ¿Para qué?

Bajo el tacto de su mano ruda, recibí un mandato de silencio. Tris-


teza era cobardía. Volvimos a desearnos, con una sonrisa, la mejor
de las suertes. El caballo de don Segundo, dio el anca al mío y rea-
licé, en aquella divergencia de dirección, todo lo que iba a separar
nuestros destinos.

Lo vi alejarse al tranco. Mis ojos se dormían en lo familiar de sus


actitudes. Un rato ignoré si veía o evocaba. Sabía cómo levantaría el
rebenque, abriendo un poco la mano, y cómo echaría adelante el cuerpo,
iniciando el envión del galope. Así fue. El trote de transición le sacudió
el cuerpo como una alegría. Y fue el compás conocido de los cascos
trillando distancia: galopar es reducir lejanía. Llegar no es, para un
resero, más que un pretexto de partir.

Por el camino, que fingía un arroyo de tierra, caballo y jinete repecha-


ron la loma, difundidos en el cardal. Un momento la silueta doble se
perfiló nítida sobre el cielo, sesgado por un verdoso rayo de atardecer.
Aquello que se alejaba era más una idea que un hombre. Y bruscamente
desapareció, quedando mi meditación separada de su motivo.

Me dije: «ahora va a bajar por el lado de la cañada. Recién cuando


cruce el río, lo veré asomar en el segundo repecho.» El anochecer vencía
lento, seguro, como quien no está turbado por un resultado dudoso.
Unas nubes tenues hacían largas estrías de luz.

La silueta reducida de mi padrino apareció en la lomada. Pensé que era


muy pronto. Sin embargo era él, lo sentía porque a pesar de la distancia
no estaba lejos. Mi vista se ceñía enérgicamente sobre aquel pequeño
movimiento en la pampa somnolente. Ya iba a llegar a lo alto del

– 163 –
Literatura Hispano-Americana

camino y desaparecer. Se fue reduciendo como si lo cortaran de abajo


en repetidos tajos. Sobre el punto negro del chambergo, mis ojos se
aferraron con afán de hacer perdurar aquel rezago. Inútil, algo nublaba
mi vista, tal vez el esfuerzo, y una luz llena de pequeñas vibraciones se
extendió sobre la llanura. No sé qué extraña sugestión me proponía la
presencia ilimitada de un alma.

«Sombra», me repetí. Después pensé casi violentamente en mi padre


adoptivo. ¿Rezar? ¿Dejar sencillamente fluir mi tristeza? No sé cuan-
tas cosas se amontonaron en mi soledad. Pero eran cosas que un hom-
bre jamás se confiesa.

Centrando mi voluntad en la ejecución de los pequeños hechos, di


vuelta mi caballo y, lentamente, me fui para las casas.

Me fui, como quien se desangra.

Fonte: Güiraldes (1926, p. 225).

Figura 6.4 – Don Segundo Sombra, de Ricardo Güiraldes

Fonte: Editora LPM.

– 164 –
A principais tendências da narrativa do século XX

Don Segundo Sombra é, portanto, uma evocação do gaúcho e da


paisagem argentina, obra na qual Rivera fez uma enorme documentação
sobre a vida nos pampas, com vocabulário gauchesco e termos técnicos de
criação de gado e do trabalho no campo.

“Don Segundo Sombra es una película argentina de 1969, dirigida


por Manuel Antín, protagonizada por Adolfo Güiraldes. Estre-
nada en Buenos Aires el 14 de agosto de 1969. Cóndor de Plata
como mejor película de 1970. Fue también nominado a la Palma
de Oro del Festival de Cannes.” (DON SEGUNDO…, c2018).

Figura 6.5 – Rómulo Gallegos

Fonte: CC BY 3.0/Biblioteca Ayacucho.

Rómulo Gallegos (1884-1969) tinha raízes humildes, foi professor,


escritor e político venezuelano, chegando a ocupar o cargo de presidente
da República da Venezuela durante breve período. Doña Bárbara (1929) é
sua obra mais conhecida e considerada por críticos como sua obra-prima,
na qual prega o respeito à lei e à justiça.

– 165 –
Literatura Hispano-Americana

As críticas desse romance contra o ditador Juan Gomes levaram o


autor ao exílio em 1931. Quando retornou, foi nomeado Ministro da Edu-
cação, mas seus esforços para realizar uma reforma escolar falharam e por
isso foi forçado a renunciar. Para López (c2017, s/p),
Rómulo Gallegos ha interpretado como nadie el complejo espíritu
de su país en una serie de novelas que han consolidado su fama
de narrador. Su obra literaria está muy ligada a su compromiso
político: regeneración nacional. Sus novelas, dentro de la corriente
regionalista, se inspiran en la tierra americana y tratan de resolver
el conflicto que una naturaleza exuberante y salvaje y la necesidad
de hacer de ella una civilización moderna. Pero su estilo no se ciñe
al realismo costumbrista del romanticismo tardío, sino que toma
toda la riqueza lingüística del modernismo para convertir a su país
en una realidad multiforme que traspasa los límites nacionales para
hacerse universal.

As obras que mais se destacaram foram escritas na Espanha durante


seu autoexílio – além de Doña Bárbara, encontramos Canaima (1935) e
Cantaclaro (1934). Alguns romances foram escritos com propósito didá-
tico, como Pobre negro (1937), Sobre la misma tierra (1943), El forastero
(1942), Reinaldo Solar (1930), La brizna de paja en el viento (1952). Para
Joset (1987, p. 75), “Colorido, simbólico, épico, o estilo de Gallegos é
herdado do modernismo. Pode-se dizer que seus romances são a expressão
mais elevada da corrente romanesca, transformada pelo venezuelano em
prosa simplesmente moderna”.
Doña Bárbara narra a história de uma heroína bela e rica que se
vinga em todos os homens que atravessam seu caminho pelo sofrimento
que passou na adolescência. Quando jovem, foi estuprada violentamente
e salva por índios. Alguns homens ela manda matar e alguns converte
em escravos de sua luxúria pela feitiçaria ou pelo álcool. Conhece Santos
Luzardo, administrador da fazenda abandonada de seus pais e que é indi-
ferente a seus encantos.
Assim, tal obra nos lembra La vorágine, do colombiano José Eustasio
Rivera, uma vez que no livro há uma sucessão de episódios intensamente
dramáticos, repletos de trechos de interpretação lírica da planície vene-
zuelana. Sua visão também é ampla, abarca o cenário e os homens que o
habitam, mostrando o conflito entre cultura e barbárie.

– 166 –
A principais tendências da narrativa do século XX

Jorge Amado, tradutor de Dona Bárbara


“O romancista Jorge Amado, esporadicamente exerceu a ati-
vidade de tradutor, sendo o responsável pela divulgação de
vários escritores hispânicos no mercado editorial brasileiro, nos
anos quarenta, como o equatoriano Jorge Icaza, o uruguaio
Enrique Amorim, o peruano Ciro Alegría e o venezuelano
Rómulo Gallegos, de quem traduziu o romance Doña Bár-
bara. Hoje é possível encontrar a edição da Record, de 1974,
revista e readaptada, acompanhada de notas de rodapé.”
Continue a leitura!
Disponível em: http://www.telenoveleiros.com/2011/12/jorge-
-amado-o-tradutor-de-dona-barbara.html>. Acesso em: 21 fev. 2018.

Figura 6.6 – Doña Bárbara, de Rómulo Gallegos

Fonte: Romulo Gallegos.

– 167 –
Literatura Hispano-Americana

6.3 A narrativa da revolução mexicana


O romance da revolução mexicana narra os feitos, as crueldades, as
derrotas e as singularidades dos grandes chefes revolucionários. Nesse
sentido, trata-se de uma literatura de reportagem, mas nem por isso
deixa de ser romanesca, transpondo para o plano da imaginação o apelo
popular que abalou o México entre 1910 e 1920. De acordo com López
(c2017, s/p),
Junto a la novela indigenista hay que situar la novela surgida con
motivo de la Revolución Mexicana contra la dictadura de Porfirio
Díaz en el 1910. Esta literatura surge junto al movimiento armado
que se inicia en 1910, cuando Francisco I. Madero se levanta en
contra del régimen del dictador Porfirio Díaz. Está inspirada en las
acciones militares, la movilización popular, los cambios políticos y
sociales que trajeron consigo los diversos movimientos de ese con-
flicto militar que cronológicamente termina en 1920 con la caída y
muerte del presidente Venustiano Carranza.

A revolução mexicana transcende, portanto, a ficção. Os romances


têm como características a interpretação objetiva e realista dos fatos; a
maioria das obras foi escrita por pessoas que participaram do movimento
armado e foi publicada entre 1928 e 1940. Entre os autores que se des-
tacaram pela participação estão Mariano Azuela, Martín Luis Guzmán e
Francisco Luis Urquizo.
Torna-se importante mencionarmos que foram muitos os autores
que incorporaram em suas obras os fatos que abalaram a vida social
e política do país, cujos acontecimentos ainda repercutem no México
atual: “La revolución siguió siendo en la vida de México algo muy
actual, un recuerdo vivo desde el cual se orienta la vida política del
país.” (LÓPEZ, c2017).
O romance que deu início ao gênero foi Los de abajo (1916), de
Mariano Azuela, que fez carreira como médico cirurgião e começou a
escrever durante a ditadura de Porfírio Díaz, já que testemunhou a trágica
realidade da guerra civil, uma vez que se integrou como médico nas forças
de Francisco Villa. Escreveu várias obras de grande intensidade que retra-
tam um forte realismo, sua concepção de vida de um homem amargo e a
preocupação com os problemas éticos relacionados a seu país.

– 168 –
A principais tendências da narrativa do século XX

Figura 6.7 – Mariano Azuela


Mariano Azuela (1873-
1952) nasceu em Lagos de
Moreno e morreu na Ciudad de México,
ambas no México. Em sua carreira lite-
rária, escreveu contos, ensaios críticos,
teatros, além de romances pelos quais
teve maior reconhecimento. Seu pri-
meiro romance foi María Luisa (1907),
seguido por Los fracasados (1908),
Mala yerba (1909), Andrés Pérez,
maderista (1911), Sin Amor (1912),
Los de abajo (1916), entre outros.
Fonte: escritores.cinemexicano.unam.mx.

Importante

Figura 6.8 – Los de abajo, de Mariano Azuela

Fonte: aboutespanol.com.

– 169 –
Literatura Hispano-Americana

“La historia tiene lugar durante la Revolución Mexicana y comienza con


la llegada de unos federales a la casa humilde de Demetrio Macías, un
campesino que vive en el sur de Zacatecas con su mujer e hijo pequeño.
Los federales amenazan con violar a su esposa, pero cuando Demetrio
aparece, huyen. Tras este episoio, Demetrio decide esconderse en el pue-
blo con su mujer e hijo, y los federales le prenden fuego a su casa.”

Continue a leitura!

Disponível em: <https://www.aboutespanol.com/los-de-


-abajo-2206746>. Acesso em: 21 fev. 2018.

Figura 6.9 – Martín Luis Guzmán

Fonte: biografiasyvidas.com.

Martín Luis Guzmán (1887-1976) nasceu em Chihuahua, no México,


e foi um revolucionário ativo, participando de todas as fases importan-

– 170 –
A principais tendências da narrativa do século XX

tes da revolução. Conviveu com os chefes Madero, Carranza, Obregón e


Pancho Villa, do qual foi secretário. Narrou em El águila y la serpiente
(1928), em primeira pessoa, os acontecimentos dos anos de 1913 a 1915
como memórias, por meio de
reuniones, aventuras, luchas crueles y odiseas de los caudillos
revolucionarios. Es la violencia desatada, simbolizada en el águila
voraz y sin ley frente a la serpiente que el águila despezada, ser-
piente que simboliza los millones de indios fatalísticamente resig-
nados a su destino. (LOPEZ, c2017, s/p)

Em La sombra del caudillo (1929), Guzmán recriou os acontecimen-


tos históricos com precisão, denunciando os abusos do poder da época
pós-revolucionária. E em Memorias de Pancho Villa (1934) descreveu
Villa como uma personalidade de destaque em suas facetas de bandido,
general, guerrilheiro, constitucionalista, entre outras.

No YouTube podemos encontrar o filme La sombra del caudillo,


baseado na obra de Martín Luis Guzmán. Foi produzido em 1960,
dirigido por Julio Bracho e censurado durante 30 anos (1960 a
1990), pois retrata os primeiros anos após a revolução mexicana.
Embora seja uma história real, os nomes dos personagens
foram alterados para não causar conflitos com o governo,
mas a identificação ficou evidente. Corrupção, assassinato de
opositores políticos e traição foram os temas da época pós-
-revolucionária e que levaram o filme a ganhar dois prêmios no
Festival Internacional de Karlovy-vary, na Checoslováquia.
En los años veinte, el general Aguirre, Ministro de Guerra, se hace
amante de la joven Rosario y retira su candidatura a la presiden-
cia debido a que el caudillo en el poder apoya al general Jiménez,
Ministro de Gobernación. Sin embargo, Olivier, líder del Partido
Radical Progresista, mantiene su apoyo a Aguirre, pero no puede
retractarse de su propia orden para que el gobernador Ibañez
lance la candidatura de Jiménez, lo que causa un altercado. Como
amenaza, el diputado Askaná, amigo de Aguirre, es secuestrado.
La prostituta Mora se entera y avisa a Aguirre, que hace firmar una
confesión a uno de los plagiarios y la lleva al caudillo, pero acaba
por distanciarse de él, pues no cree que Aguirre sea sincero en su
retiro de la candidatura. En efecto, Aguirre renuncia a su ministerio
y lanza de nuevo su candidatura. La represión no se hace esperar.
Fonte: LA SOMBRA… [c2018?].

– 171 –
Literatura Hispano-Americana

Figura 6.10 – Francisco Luis Urquizo

Fonte: cervantesvirtual.com.

Francisco Luis Urquizo (1891-1969) foi um escritor fundamental da


narrativa da revolução mexicana. Nasceu em San Pedro de las Colonias,
no México, e foi militar, general, escritor e historiador. Por duas vezes, foi
secretário da defesa nacional. Em 1911, ainda adolescente, entrou para a
guerra e participou de vários combates.
Tropa vieja, publicada em 1943, foi considerada sua melhor obra e,
por causa disso, recebeu o apelido de novelista del soldado. Escreveu tex-
tos para o exército e uma ampla variedade de obras literárias – 34 no total
–, como contos, romances, crônicas, biografias, ensaios etc. Citamos os
romances Fui soldado de levita de esos de caballería (1967) e Memórias
de campaña (1971).
Publicou várias crônicas, como Cosas de la Argentina (1923) e
Madrid de los años veinte (1961), sobre os lugares que conheceu, e bio-

– 172 –
A principais tendências da narrativa do século XX

grafias de José Maria Morelos, de Francisco Madero e de Venustiano Car-


ranza, entre outras obras.
Em Tropa vieja, o personagem principal – Espiridión Sifuentes – é
também o narrador que conta a vida dos soldados mexicanos no começo
do século XX. Trata-se de um testemunho dos eventos mais importantes
da revolução no México desde o início até a Decena trágica. O romance
foi escrito com o propósito de questionar as consequências da guerra e, ao
mesmo tempo, entender o sentimento do indivíduo que é obrigado a lutar
na revolução.
Figura 6.11 – Tropa vieja, de Francisco Luis Urquizo

Fonte: https://porrua.mx.

– 173 –
Literatura Hispano-Americana

6.4 A narrativa social ou indigenismo


Essa forma de romance teve o intuito de denunciar e protestar con-
tra as desigualdades sociais e a triste condição do índio. No entanto,
essa temática já esteve presente em épocas anteriores, como na obra
Aves sin nido, de Clorinda Matto de Turner, na qual há a denúncia da
opressão indígena. No século XX, a corrente indigenista foi inaugu-
rada com Raza de bronce, de Alcides Arguedas. Outros títulos impor-
tantes são Huasipungo, de Jorge Icaza, e El mundo es ancho y ajeno,
de Ciro Alegría.
Figura 6.12 – Alcides Arguedas

Fonte: www.escritores.org.

Alcides Arguedas (1879-1946) nasceu na Bolívia e foi escritor, polí-


tico e historiador. Escreveu livros de história e de literatura, como Pue-
blo enfermo (1909); Raza de bronce (1919); Pisagua (1903); Wata Wara
(1904); Vida criolla (1912); La danza de las sombras (1934); La funda-

– 174 –
A principais tendências da narrativa do século XX

ción de la República (1920); Historia general de Bolivia (1922); Los cau-


dillos letrados (1923); La plebe en acción (1924). De acordo com López
(c2017), “Arguedas no es solo un escritor comprometido y revolucionario,
es ante todo un poeta, fascinado por el paisaje americano que él interpreta
con sutil emoción.”
Raza de bronce (1919) foi, sem dúvida, sua obra de maior destaque
e uma das mais importantes narrativas indigenistas hispano-americana.
Nela, há a denúncia das terríveis condições dos camponeses indígenas, de
seus problemas com as terras, da escravização e da violência.
Figura 6.13 – Raza de bronce, de Alcides Arguedas

Fonte: Editorial Juventud.

A história acontece nas montanhas de La Paz, especificamente em


fazendas nas quais os indígenas são explorados pelos patrões. De acordo
com Valencia (2008, p. 3), “mientras que los patrones viven en abundan-
cia, los indígenas se tienen que quebrar el lomo en sus campos para vivir
un poco mejor que los animales.”

– 175 –
Literatura Hispano-Americana

Outro importante escritor que Figura 6.14 – Jorge Icaza


representou a narrativa indigenista
no século XX foi Jorge Icaza (1906-
1978). Nasceu em Quito, no Equador,
e praticamente todas suas obras nar-
ram a situação do índio equatoriano.
Em seu primeiro romance, intitulado
Huasipungo e publicado em 1934,
expõe a péssima condição em que os
índios se encontravam, submetidos à
escravidão, cujos patrões eram prote-
gidos e apoiados pela autoridade civil
e eclesiástica. Trata-se de um livro de
denúncia social e de realismo impac-
tante, no qual o autor não quis criar
uma obra de arte, mas encontrar um
estilo e um tom potentes de revolta.
Outras obras importantes de
Icaza foram En las calles (1935);
Cholos (1937); El chulla Romero y
Flores (1958); Atrapados y el jura-
mento (1972); Seis relatos (1952); En Fonte: biografiasyvidas.com.
la casa chola (1959); Viejos cuentos (1960), Barranca grande (1981).
Em Huasipungo, os índios são descritos como vítimas de um sistema
social que os oprime; no entanto, são apresentados pelo autor sem com-
placência ou generosidade. Para Joset (1987), a análise de Icaza superou a
de Alcides Arguedas no sentido de que a ganância dos brancos não passou
de uma consequência de um mal mais profundo. Dessa forma, o autor
criou personagens coletivos: a massa indígena, os capitalistas estrangeiros
e seus representantes nacionais.

“Como os índios de Raza de bronce, os de Huasipungo são extermi-


nados num massacre final, abençoado pelo pároco. A revolta de Alci-
des Arguedas era desesperada, a de Jorge Icaza, ao contrário, baseia-
-se na esperança de uma sociedade melhor.” (JOSET, 1987, p. 70).

– 176 –
A principais tendências da narrativa do século XX

Figura 6.15 – Índios

Fonte: Shutterstock.com/Everett Historical.

Figura 6.16 – Huasipungo, de Jorge Icaza

Fonte: Losada S.A.

– 177 –
Literatura Hispano-Americana

A forma como Icaza narrou os fatos demonstrou que ele se baseava


na esperança de uma sociedade melhor, apesar de ter sido extremamente
brutal em sua denúncia. Muitos críticos afirmaram que seus romances
eram “exageradamente brutais, sangrentos, aterradores – mas a realidade
denunciada era brutal, sangrenta, aterradora” (JOSET, 1987, p. 71).
Ciro Alegría (1909-1967) nasceu Figura 6.17 – Ciro Alegría
no Peru e foi escritor, político e jor-
nalista. Foi aluno de Cesar Vallejo e,
ainda jovem, entrou na luta política
como membro da Aliança Popular. Em
vida, publicou as obras La serpiente
de oro (1935); Los perros hambrientos
(1939); La leyenda del nopal (1940);
El mundo es ancho y ajeno (1941); Las
aventuras de Machu Picchu (1950);
Duelo de caballeros (1950). Depois de
sua morte, sua mulher – a poetisa Dora
Varona – compilou, editou e publicou
vários manuscritos inéditos do marido.
El mundo es ancho y ajeno é con-
siderada sua obra mais importante.
Nela, observamos os índios sendo
expulsos de suas terras por um fazen-
deiro apoiado pelo governo. O intuito
da denúncia social é trabalhado por Fonte: biografiasyvidas.com.
meio de uma preocupação artística evidente e construtiva. De acordo com
Joset (1987), Alegría descreve a vida em uma aldeia indígena idealizada
demais, defendendo a ideia de que o índio só pode viver na terra que ama –
transferi-lo para outro lugar e integrá-lo à força em um mundo capitalista
seria uma injustiça criminosa.
Os índios são massacrados ou dispersados por um “vasto mundo” e
“estranho” para eles. Para López (c2017, s/p),
El gran mérito de la obra reside en la buena síntesis de denuncia
social y dignidad artística del autor. Hay un equilibrio magistral
entre el arte y el elemento sociopolítico de esta novela “social”. No

– 178 –
A principais tendências da narrativa do século XX

cae Ciro Alegría en la prédiga política y ostenta calidad artística


en su tratamiento del tema social. Esta categoría estética da en la
novela eficacia real al tema social. Es una de las grandes novelas
del indio andino.

A obra teve várias edições, foi traduzida para muitos idiomas e foi o
primeiro romance peruano de destaque universal. Mario Vargas Llosa, ao
comentar sobre a literatura de seu país, afirmou que “El mundo es ancho
y ajeno constituye el punto de partida de la literatura narrativa moderna
peruana y su autor nuestro primer novelista clásico.” (CIRO…, 2016).
Figura 6.18 – El mundo es ancho y ajeno, de Ciro Alegría

Fonte: freddymolina.com.br.
“Com menos poder do que Jorge Icaza, com menos violência
do que Cesar Vallejo, mas com mais delicadeza, Ciro Alegría dá
ao índio sua dignidade de homem.” (JOSET, 1987, p. 72).

– 179 –
Literatura Hispano-Americana

Enfim, a obra apresenta vários aspectos interessantes, como o fato


de os índios sempre ouvirem que precisavam ir para outro lugar porque
o mundo é vasto. Vasto, porém, estranho. Então optavam por morrer e
defender suas terras, pois não havia alternativa. Para onde ir? Todos os
caminhos eram sangrentos. A mensagem é admirável: “Luchar hasta el
final aunque nos cueste la vida.” (EL MUNDO…, [2011?]).

Da teoria para a prática


Neste capítulo, observamos alguns traços da literatura do equatoriano
Jorge Icaza, que foi um importante escritor da narrativa indigenista do
século XX ao lado de Alcides Alguedas e de Ciro Alegría. Dessa forma,
uma sugestão de trabalho em sala de aula, é a análise da obra intitulada
Huasipungo (1934).
Após a leitura completa do livro, é possível levantar as seguintes
reflexões:
a) Buscar a biografia do autor.
b) Pesquisar o significado da palavra Huasipungo, de origem quíchua.
c) Descrever as personagens Don Alfonso Pereira, Julio Pereira,
Mr. Chappy “Gringo”, Doña Blanca Chanique, Doña Lolita,
Policarpio, Andrés Chiliquinga, Jacinto Quintana e Cunshi.
d) Fazer um pequeno resumo da história.
e) Criar um vídeo sobre as principais características do enredo.
f) Compartilhar o vídeo sobre o livro nas redes sociais.
g) Trocar informações e interagir com outros usuários.
h) Adicionar mensagens sobre Huasipungo.

Síntese
Neste capítulo, observamos as principais tendências narrativas do
século XX na literatura hispano-americana, que pode ser dividida em três

– 180 –
A principais tendências da narrativa do século XX

temáticas fundamentais: narrativa regionalista ou da terra, cujos temas são


a natureza; narrativa da revolução mexicana, com a temática centrada nos
problemas políticos; e narrativa social ou indigenismo.
Na narrativa regionalista ou da terra, vimos algumas características
das obras La vorágine, de José Eustasio Rivera; Don Segundo Sombra, de
Ricardo Güiraldes; e Doña Bárbara, de Rómulo Gallegos.
Na narrativa da revolução mexicana, percebemos que os romances
são um testemunho dos acontecimentos no México entre 1910 e 1920. As
obras abordadas brevemente foram Los de abajo, de Mariano Azuela; La
sombra del caudillo, de Martín Luis Guzmán e Tropa vieja, de Francisco
Luis Urquizo.
Por fim, na narrativa social ou indigenismo os romances que se desta-
caram foram Raza de bronce, de Alcides Arguedas; Huasipungo, de Jorge
Icaza; El mundo es ancho y ajeno, de Ciro Alegría.

Atividades
1. Leia o parágrafo a seguir, extraído da obra La vorágine, de
José Eustasio Rivera, e explique as características do estilo
vigoroso, preciso e metafórico que o autor utiliza ao narrar
a relação entre Arturo Cova e Alicia. Como sabemos, tal
romance tem como temática a selva devastadora, no entanto,
a natureza selvagem cede um espaço para a atmosfera de
extremo sentimentalismo:
La quimera que persigo es humana, y bien se que de ella
parten los caminos para el triunfo, para el bienestar y para
el amor. Han pasado los días y se va marchitando mi juven-
tud sin que mi ilusión reconozca su derrota. Mi corazón es
como una roca cubierta de musgo, dónde nunca falta una
lágrima. Yo he llorado por mis aspiraciones engañadas,
por mis sueños desvanecidos, por lo que o fui y nuca seré…
(RIVERA, 1938, p 24).

– 181 –
Literatura Hispano-Americana

Figura 6.19 – Roca cubierta de musgo

Fonte: Shutterstock.com/Bridget Calip.

2. Dentro da narrativa regionalista ou da terra, encontramos a figura


do escritor Rómulo Gallegos, cujas qualidades foram expressas
na exposição dos conflitos e das singularidades da terra e do
homem venezuelano, o que o torna o mais categorizado escritor
de seu país e um dos mais representativos do romance hispano-
-americano. Faça uma pesquisa sobre sua biografia e obra e
registre suas impressões.
3. O filme La sombra del caudillo, baseado na obra de Martín Luis
Guzmán, dirigido por Julio Bracho e produzido em 1960, foi
uma forte recriação dos eventos históricos corridos na época
pós-revolucionária. Um dia antes de sua estreia, os militares
fecharam os cinemas e levaram todos os filmes existentes do tra-

– 182 –
A principais tendências da narrativa do século XX

balho de Bracho. A estreia aconteceu somente em 25 de outubro


de 1990, 30 anos depois. De acordo com esses dados, faça uma
pesquisa e responda: por que o filme foi censurado pelo exército
mexicano durante tantos anos?
Figura 6.20 – La sombra del caudillo

Fonte: filmaffinity.com.

4. Na obra El mundo es ancho y ajeno, de Ciro Alegría, encontra-


mos no capítulo intitulado ¿Adónde? ¿Adónde? o discurso de

– 183 –
Literatura Hispano-Americana

Benito Castro para os comuneros de Rumi. Leia o fragmento e


registre suas impressões sobre a temática:
Cuando la ley da tierras, se olvida de lo que va a ser la suerte
de los hombres que están en esas tierras. La ley no los pro-
tege como hombres. Los que mandan se justificarán diciendo:
“Váyanse a otra parte, el mundo es ancho”. Cierto, es ancho.
Pero yo, comuneros, conozco el mundo ancho donde nosotros,
los pobres, solemos vivir. Y yo les digo con toda verdá que pa
nosotros, los pobres, el mundo es ancho pero ajeno. Ustedes lo
saben comuneros... En ese mundo ancho, cambiamos de lugar,
vamos de un lao pa otro buscando la vida. Pero el mundo es
ajeno y nada nos da, nada, ni siquiera un güen salario, y el hom-
bre muere con la frente pegada a una tierra amarga de lágri-
mas. (ALEGRIA, 1978, p. 168).

– 184 –
7
A nova narrativa
hispano-americana

Neste capítulo, abordaremos o súbito interesse internacio-


nal pela narrativa hispano-americana que surgiu nos anos 1960:
o fenômeno boom. Os maiores representantes desse fenômeno
são o colombiano Gabriel García Márquez, o argentino Julio Cor-
tázar, o mexicano Carlos Fuentes e o peruano Mario Vargas Llosa.
Veremos as características das narrativas, como o tratamento
do tempo de maneira não linear, a utilização de várias perspec-
tivas ou vozes narrativas, a ênfase na história e na política, o
rompimento das barreiras entre o fantástico e o cotidiano, entre
outras. E observaremos que o boom não foi uma geração, uma
tradição ou uma escola literária; foi um acordo entre os protago-
nistas sobre uma nova possibilidade de expressão – houve uma
comunicação entre os envolvidos, a leitura mútua de suas obras
e a troca de ideias.
Literatura Hispano-Americana

7.1 O boom hispano-americano


Nos anos 1960 ocorreu um grande fenômeno no campo político que
interferiu positivamente na literatura hispano-americana: a Revolução
Cubana. O êxito de Cuba frente aos Estados Unidos, potencializado pela
difusão e pelo alcance da televisão fez que o mundo olhasse para a Amé-
rica Latina. E esse olhar não se voltou apenas para as práticas e para as
utopias revolucionárias, foi inevitável um impacto imediato e decisivo no
mundo das letras, um cenário propício para que o mundo descobrisse que
o “subcontinente dos ditadores” também era capaz de produzir livros de
alto valor literário.
É evidente que, desde 1940, o reconhecimento estava emergindo
aos poucos, por meio de autores que escreviam seus nomes na chamada
nova narrativa hispano-americana e que inseriam em seus romances
as descobertas dos movimentos anteriores, como o Modernismo e as
vanguardas. Além disso, muitos já estavam publicando suas obras na
Europa e nos Estados Unidos. Contudo, as obras não conseguiam atra-
vessar as fronteiras e eram lidas apenas por pequenos grupos. De acordo
com Costa (2001, p. 2):
Quase todos os escritores já vinham publicando seus romances na
América Latina e Europa antes do boom. Contudo, eram obras que
não alcançavam uma difusão massiva e eram conhecidas apenas
por um pequeno círculo de leitores. Assim, antes dos anos 60, as
obras de Cortázar, Asturias, Onetti ou Borges apenas alcançavam
edições de 2.000 exemplares, que permaneciam por longos anos
em livrarias sem que se esgotassem. No momento do boom, as
mesmas obras alcançaram tiragens de 20.000 exemplares anuais e
com bastante frequência se esgotavam, o que exigia duas ou três
edições ao ano.

Dessa forma, a importância cubana no mundo serviu como uma espé-


cie de ponte para possibilitar a leitura e a compreensão da literatura que já
vinha sendo feita há aproximadamente 20 anos: “Con la nueva atención
que Latinoamérica despierta a los ojos del mundo con el advenimiento de
la Revolución en Cuba, este mercado europeo y estadunidense, antes ape-
nas incipiente, abre de vez las puertas a la literatura hispanoamericana.”
(SOUZA; SILVA, [2016], p. 46). Dentro dessa perspectiva, entre 1961 e
1962 foram publicados os livros La muerte de Artemio Cruz, de Carlos

– 186 –
A nova narrativa hispano-americana

Fuentes; Rayuela, de Cortázar; La ciudad y los perros, de Vargas Llosa; e,


em 1967, Cien años de soledad, de Gabriel García Márquez.

Figura 7.1 – Boom

Fonte: Shutterstock.com/Aleksandr Andrushkiv.

Esses autores promoveram uma verdadeira inovação nos romances e


transgrediram na forma da linguagem utilizada em seus textos. Assim, o
reconhecimento internacional da narrativa hispano-americana recebeu o
nome de boom: “La década de los sesenta fue dadivosa: generó un grupo
de obras excepcionales que habían comenzado a fraguarse mucho antes.
Eran todas obras narrativas” (RODRÍGUEZ, 2004, p. 143). E Vargas
Llosa (2006a, p. 9) expressa que “os anos sessenta foram de (re)conheci-
mento da América Latina, pois o subcontinente passou a figurar no centro
da atualidade graças à Revolução Cubana, às guerrilhas e aos mitos que
elas puseram em circulação”.
Todavia, se pesquisarmos mais a fundo, encontraremos várias dis-
cussões em torno desse evento: por exemplo, se o boom foi um chamado
meramente editorial, uma resposta ao mercado. Em outras palavras, alguns
críticos acusaram os autores envolvidos de fazerem parte de uma organi-

– 187 –
Literatura Hispano-Americana

zação com contatos secretos com editoras para que tivessem o sucesso já
garantido: uma estratégia de marketing. López (c2017, s/p) afirma que
Aún cuando no es claro cuándo comienza y termina exactamente
el fenómeno, se ubica dentro de él a un grupo selecto de escritores,
quienes en algún momento fueron acusados de ser parte de una
mafia con contactos secretos con las editoriales, de forma tal que
tuvieran el éxito asegurado.

Quase todos os autores se mudaram para a Europa e lá encontraram


um mercado editorial muito ativo, o que facilitou a repercussão interna-
cional de suas obras. As polêmicas enfatizaram que o trabalho e o nome
dos autores hispano-americanos foram apreciados em âmbito internacio-
nal devido, também, à grande divulgação das editoras, com cada livro
chegando a vender milhares de exemplares.
Nesse sentido, o chamado boom da narrativa hispano-americana
foi visto por alguns exclusivamente como um fenômeno da sociedade
de consumo:
El éxito del Boom empieza a partir de la percepción del mercado
editorial de que había público lector afuera de Latinoamérica para
la literatura de esos rincones de América. Dentro de esos esfuer-
zos juegan papel importante la agente literaria española Carmen
Balcells y la editorial, también española, Seix Barral. Estos nom-
bres, principalmente, ayudan sobremanera a impulsar e interna-
cionalizar la narrativa hispanoamericana en los idos de los 1960.
(SOUZA; SILVA, [2016], p. 46)

Embora o boom hispano-americano tenha sido um fenômeno de mer-


cado e alcançado sucesso nas vendas, o tempo mostrou que as acusações
eram injustas e que a qualidade narrativa e a estética de Mario Vargas
Llosa, Julio Cortázar, Gabriel García Márquez e Carlos Fuentes não obe-
deciam a qualquer estratégia de publicidade. Mostrava, então, um reco-
nhecimento das páginas mais notáveis da história da literatura – havia
qualidade literária: “El éxito estruendoso que pasa a tener la literatura his-
panoamericana en los sesenta jamás sería posible sin la estupenda calidad
literaria de las obras maestras de aquellos momentos.” (SOUZA; SILVA,
[2016], p. 46).
Deixando de lado o número de cópias vendidas, foi reconhecido que
as novidades técnicas e estruturais que ocorreram no boom já estavam a

– 188 –
A nova narrativa hispano-americana

caminho desde épocas anteriores. Isso significa que houve uma prepara-
ção na qual os autores dominaram e exploraram ao máximo a linguagem
literária que elevou o prestígio e a notabilidade da literatura hispano-ame-
ricana. O talento atribuído aos escritores foi, sem dúvida, o que proporcio-
nou essa visibilidade internacional e fez surgir traduções em uma grande
quantidade de idiomas.
O termo boom significa explosão; após esse reconhecimento, muitos
críticos afirmaram com veemência que não se tratava de uma explosão
de escritores, mas sim de uma explosão de leitores, uma vez que estes se
expandiram em um número sem precedentes para receber a ficção his-
pano-americana pela primeira vez: “El éxito es total y el público descu-
bre unas excelentes novelas, muy complejas en fondo y forma, pero que
además recuperan el placer de contar y escuchar historias” (EL MODER-
NISMO…, c2013).
Além do talento e da qualidade literária na reestruturação da maneira
de escrever romances, a revolução cubana, como dissemos, foi o fio con-
dutor que influenciou e “preparou o terreno” para a explosão da literatura
hispano-americana. Foi, na verdade, um conjunto; o contexto histórico foi
a presença da revolução cubana e o desejo de mudança, de transgressão
no fazer literário:
Hay un hilo conductor que será determinante: la Revolución
Cubana. La Revolución Cubana influyó en la definición, podría-
mos decir ideológica, que al menos inicialmente unificó los mati-
ces políticos que podían existir entre la intelectualidad latinoame-
ricana durante los años 60. (GARCIA; SERRÃO, 2013, p. 12)

Há várias declarações de críticos que defendem a ideia de que se de um


lado a Revolução Cubana ajudou a impulsionar o boom da literatura latino-
-americana com o reconhecimento de inúmeros autores latino-americanos,
de outro lado a contribuição dos escritores mais conceituados dessa fase foi
fundamental para legitimar o processo revolucionário em Cuba:
Para muitos, o que motivou o boom, a nível comercial, além da
qualidade literária das obras, foi o impulso das editoras (sobretudo
europeias) e a irrupção da Revolução Cubana, que motivou inúme-
ros leitores, pelo mundo afora, a conhecer a literatura, a cultura e a
história latino-americanas. (COSTA, 2001, p. 134)

– 189 –
Literatura Hispano-Americana

Todas as especulações sobre a observação do boom geradas com certa


desconfiança, agressividade e ironia, como fenômeno que carregava múl-
tiplos significados, tiveram historiadores, polemistas, defensores e difa-
madores. Segundo Rodríguez (2004, p. 143), o boom hispano-americano,
“como toda irrupción, padeció de los rigores de la polémica.”. Durante
algumas décadas, as polêmicas ocuparam o tempo e os estudos de muitos
críticos, mas hoje todos têm certeza de que a narrativa hispano-americana
brilhou por sua própria qualidade. Em resumo, estamos diante de uma
nova arte que já ocupa lugar preeminente no cenário mundial.

O boom definitivamente colocou a América Latina no


centro das atenções da literatura mundial, o que abriu
caminho para a difusão de novos autores e obras.
Figura 7.2 – Boom

Fonte: Shutterstock.com/FullRix.

É necessário ressaltarmos que o boom não foi uma geração, uma tra-
dição ou uma escola literária; foi um acordo entre os protagonistas sobre
uma nova possibilidade de expressão. Houve uma comunicação entre os
envolvidos, a leitura mútua de suas obras e a troca de ideias. Segundo
Rodríguez (2004, p. 143), “años de innovaciones, de obras desconcertan-
tes, de experimentalismos formales, de pungentes cuestiones teóricas no
podían inadvertirse en la creación literaria de America.”.

– 190 –
A nova narrativa hispano-americana

Em entrevista realizada em 1967 e publicada no livro


Entrevistas escogidas, com seleção, prólogo e notas de
Jorge Coagila, Mario Vargas Llosa afirmou que
existia de fato uma grande amizade entre os escri-
tores do boom e que isso era o seu ingrediente
mais notável. Confessou que a maior parte dos
escritores do boom mantinha uma relação pes-
soal de verdadeira camaradagem e que as opi-
niões literárias desses escritores eram-lhe muito
úteis. Contudo, não existia uma homogeneidade
no que se referia a critérios estéticos e artísticos,
cada um tinha seus próprios temas e técnicas.
(COAGUILA, 2004, p. 49)
Figura 7.3 – Entrevistas escogidas, de Jorge Coaguila

Fonte: Tierra Nueva Editores.

– 191 –
Literatura Hispano-Americana

Mencionamos a relação de amizade entre os renomados escritores do


grupo, Carlos Fuentes, Mario Vargas Llosa, Gabriel García Márquez e Julio
Cortázar, que se reuniam na Espanha, onde viviam quase todos os escrito-
res. Sua última reunião foi na comemoração do Natal de 1971; depois desse
encontro, houve uma separação devido ao caso Padilla (primeira grande
ruptura dos intelectuais latino-americanos com a Revolução Cubana, até
então apoiada por todos) e por causa do desentendimento pessoal entre os
grandes amigos Gabriel Garcia Márquez e Mario Vargas Llosa.
Segundo Garcia e Serrão (2013, p. 12),
uno de los desencadenantes del fin del llamado Boom y de la esci-
sión política, literaria y afectiva de su intelectualidad en bandos
amargos e irreconciliables, fue un hecho concreto ocurrido en
Cuba en 1971, que trascendió como el caso Padilla, y que hizo
bullir el mundo cultural de la isla.

Com base nos apontamentos de Silva (c2018), vejamos as principais


características do boom hispano-americano:

Principais características

22 O tratamento do tempo de uma maneira não linear.

22 A utilização de várias perspectivas ou vozes narrativas.

22 Um grande número de neologismos e jogos de palavras.

22 O tratamento de cenários rurais e urbanos.

22 A ênfase na história e na política.

22 O questionamento da identidade regional e nacional.

22 O rompimento das barreiras entre o fantástico e o cotidiano.

Fonte: Silva (c2018).

– 192 –
A nova narrativa hispano-americana

Figura 7.4 – Livro

Fonte: Shutterstock.com/Tomertu.

7.2 Composição do boom


Como já citamos, os maiores representantes do boom hispano-ameri-
cano foram os autores Mario Vargas Llosa, Julio Cortázar, Carlos Fuentes
e Gabriel García Márquez.

7.2.1 Mario Vargas Llosa


Figura 7.5 – Mario Vargas Llosa
Fonte: viajento.com.

– 193 –
Literatura Hispano-Americana

Mario Vargas Llosa (1936-) nasceu em Arequipa, no Peru, e atual-


mente vive entre Londres (Inglaterra), Paris (França), Madri (Espanha)
e Lima (Peru). É jornalista, dramaturgo, ensaísta, crítico literário, pro-
fessor e um dos mais importantes escritores da atualidade com extensa
produção literária que inclui peças teatrais, ensaios, memórias e, sobre-
tudo, romances.
Mudou-se para Paris na década de 1960 e ao longo dos anos lecionou
em diversas universidades americanas e europeias. Em uma incursão ao
mundo da política, candidatou-se à presidência do Peru em 1990, mas
perdeu a eleição para Alberto Fujimori. Foi vencedor de grandes prêmios,
como Biblioteca Breve, Cervantes, Príncipe de Astúrias, PEN/Nabokov e
Grinzane Cavour. Em 2010, recebeu o prêmio Nobel de Literatura:
Fabulador de sua própria história de vida e das circunstâncias
sociais, políticas e artísticas que o rodeiam, fabulador da cultura da
América Latina e, particularmente, dos dilemas peruanos, Mario
Vargas Llosa é, como se sabe, um consagrado narrador que se
notabiliza também pelo pensamento crítico e teórico, pelas contro-
vertidas posições políticas, pela atividade jornalística, enfim, pelos
variados perfis que o distinguem como intelectual. (MILTON,
2004, p. 211)

La ciudad y los perros (1962) deu início ao boom hispano-americano


e o fez ganhar notoriedade literária e se consagrar internacionalmente. A
obra foi premiada em 1962 pela Biblioteca Breve e, em 1963, pela crítica.
No romance, Vargas Llosa critica a sociedade peruana por meio da denún-
cia do machismo e da violência de um colégio militar de Lima. Segundo
Joset (1987, p. 90), “as paixões, as intrigas, as misérias da cidade grande
peruana refletem-se no microcosmo do Colégio Leoncio Prado, onde um
grupo de alunos se une para reagir por todos os meios ao sistema repres-
sivo que os esmaga.”.
A expressão los perros refere-se aos alunos do primeiro ano do Colé-
gio Militar. Josef (1989) afirma que a obra constitui a iniciação na vida,
tendo como elemento principal a violência bruta que faz sucumbir os mais
fracos. Como os jovens de todo o Peru e de todas as camadas sociais
estudam nessa instituição, a realidade peruana é refletida entre o mundo
do adolescente e o mundo dos conflitos dramáticos e dos questionamentos
morais sobre autenticidade, responsabilidade e heroísmo.

– 194 –
A nova narrativa hispano-americana

O romance tem caráter biográfico, pois experiências pessoais servi-


ram como base para a narrativa. Durante a infância, Vargas Llosa acredi-
tou que o pai havia morrido, pois a família não quis admitir o divórcio.
Anos depois, mudou-se para Lima e conheceu o pai, com quem a mãe
voltou a se relacionar. Aos 14 anos de idade, o pai fez que Llosa ingres-
sasse no Colégio Militar Leoncio Prado, no qual o autor estudou por
dois anos.
Vejamos um trecho da obra traduzida para o português:

[…]

Esqueceu a casa da avenida Salaverry, em Magdalena Nueva,


onde viveu até a noite em que chegou a Lima pela primeira vez,
e a viagem de 18 horas no carro, a sucessão de lugarejos em ruí-
nas, areais, vales minúsculos, às vezes o mar, campos de algo-
dão, povoados e areais. Ia com o rosto colado à janela e sentia o
corpo roído pela excitação: “Vou ver Lima.” De vez em quando,
a mãe o puxava para ela, murmurando: “Richi, Ricardito.” Ele
pensava: “Por que está chorando?” Os outros passageiros dor-
mitavam ou liam e o motorista cantarolava o mesmo estribilho,
hora após hora. Ricardo resistiu por toda a manhã, a tarde e o
começo da noite, sem desviar os olhos do horizonte, esperando
que as luzes da cidade surgissem de surpresa, como uma pro-
cissão de tochas. O cansaço aos poucos lhe adormecia os mem-
bros, embotava os sentidos; no escuro, ele se repetia entre den-
tes: “Não vou dormir.” E, de repente, alguém o sacudia com
doçura. “Já chegamos, Richi, acorde.” Estava no colo da mãe,
a cabeça apoiada em seu ombro, sentia frio. Lábios familiares
roçaram sua boca e ele teve a impressão de que, durante o sono,
convertera-se num gatinho. Agora o carro avançava devagar,
via vagas casas, luzes, árvores e uma avenida mais comprida
que a rua principal de Chiclayo. Tardou alguns segundos a per-
ceber que os outros passageiros haviam descido. O motorista
cantarolava já sem entusiasmo. “Como será”, pensou. E sentiu,
de novo, uma ansiedade feroz, como três dias antes, quando a

– 195 –
Literatura Hispano-Americana

mãe, chamando-o de lado para que a tia Adelina não os ouvisse,


disse: “Teu pai não estava morto, era mentira. Acaba de voltar
de uma viagem muito longa e está nos esperando em Lima”.

[…]

Fonte: Vargas Llhosa (1963, p. 15).

Figura 7.6 – La ciudad y los perros, de Mario Vargas Llosa

Fonte: www.estandarte.com.

Suas obras são intensas e profundas, criticam e abordam temas sociais,


lutam pela liberdade individual e mostram a realidade opressiva do Peru.
Segundo Josef (1989), o consenso universal reconhece a importância de
sua literatura, que expressa uma cultura e uma cosmovisão, como mostra a
quantidade de traduções que a torna um dos fenômenos mais importantes
do gênero. A técnica de Vargas Llosa é complexa, “maneja habilmente o
diálogo e a ação, é profundo observador, com sentido da ordem e estru-

– 196 –
A nova narrativa hispano-americana

turação. Emprega o monólogo interior, a mudança de foco narrativo, o


flashback, que rompe a continuidade linear” (JOSEF, 1989, p. 276).
Vejamos quais são suas obras:

Narrativa

22 Los jefes (1959)

22 La ciudad y los perros (1963)

22 La casa verde (1966)

22 Los cachorros (1967)

22 Conversación en la catedral (1969)

22 Día domingo (1971)

22 Pantaleón y las visitadoras (1973)

22 La tía Julia y el escribidor (1977)

22 La guerra del fin del mundo (1981)

22 Historia de Mayta (1984)

22 ¿Quién mató a Palomino Molero? (1986)

22 El hablador (1987)

22 Elogio de la madrastra (1988)

22 Lituma en los Andes (1993)

22 Los cuadernos de don Rigoberto (1997)

22 La fiesta del Chivo (2000)

22 El paraíso en la otra esquina (2003)

22 Travesuras de una niña mala (2006)

22 El sueño del celta (2010)

22 Fonchito y la luna (2010)

– 197 –
Literatura Hispano-Americana

22 El héroe discreto (2013)

22 El barco de los niños (2014)

22 Cinco esquinas (2016)

Ensayo

22 Bases para una interpretación de Ruben Darío (1958)

22 Carta de batalla por Tirant lo Blanc (1969)

22 García Márquez: historia de un deicidio (1971)

22 Historia secreta de una novela (1971)

22 La orgía perpetua: Flaubert y Madame Bovary (1975)

22 Entre Sartre y Camus (1981)

22 Contra viento y marea (1983)

22 Botero: la suntuosa abundancia (1984)

22 La verdad de las mentiras (1990)

22 A writer’s reality (1991)

22 George Grosz: un hombre triste y feroz (1992)

22 El pez en el agua (1993)

22 Desafíos a la libertad (1994)

22 La utopía arcaica: José María Arguedas y las ficciones del indige-


nismo (1996)

22 Making Waves (1996)

22 Cartas a un joven novelista (1997)

22 Nationalismus als neue Bedrohung (2000)

22 El lenguaje de la pasión (2001)

22 Diario de Irak (2003)

– 198 –
A nova narrativa hispano-americana

22 La tentación de lo imposible (2005)

22 Dictionnaire amoureux de l’Amérique latine (2005)

22 Israel-Palestina. Paz o Guerra Santa (2006)

22 El viaje a la ficción (2008)

22 Sables y utopías (2009)

22 Investidura como doctor “honoris causa” del Excmo. Sr. D. Mario


Vargas Llosa (2010)

22 Lección magistral y acto de investidura como académico de honor del


Excmo. Sr. D. Mario Vargas Llosa (2011)

22 Testigos del olvido. [Crónicas, Mario Vargas Llosa, Sergio Ramírez,


Laura Restrepo…] (2011)

22 Una lama de Bilbao. [Testimonios de Mario Vargas Llosa y Mauricio


Wiesenthal] (2011)

22 La civilización del espectáculo (2012)

Teatro

22 Kathie y el hipopótamo (1983)

22 La señorita de Tacna (1983)

22 La Chunga (1990)

22 El loco de los balcones (1993)

22 Ojos bonitos, cuadros feos (2000)

22 Obra reunida (2006)

22 Las mil noches y una noche (2009)

22 Los cuentos de la peste (2015)

Fonte: Mario… (2016).

– 199 –
Literatura Hispano-Americana

Figura 7.7 – Livros

Fonte: Editora Contemporânea/Alfaguara

Estas três obras parecem formar parte de um primeiro grupo de nar-


rativas de Llosa: La ciudad y los perros (1962), La casa verde (1965) e
Conversación en La Catedral (1959). A segunda etapa de sua narrativa se
distingue pelo humor negro, como em Pantaleón y os visitantes (1973), ou
retratando-se em sua história, como em La tía Julia y el escribidor (1977),
na qual narra os episódios de seu primeiro casamento e seus começos
literários: aos 19 anos, Vargas Llosa se casou com Julia Urquidi, irmã da
mulher de seu tio materno, 14 anos mais velha que ele.
La guerra del fin del mundo (1981) é um retorno ao estilo da compo-
sição épica de sua primeira etapa e narra a Guerra de Canudos que ocorreu
no Brasil em 1896. Na última parte de seu trabalho narrativo estão mistu-
rados romances com temática política, como Historia de Mayta (1984) e
Lituma nos Andes (1993); e erótica, como Elogio de la madrasta (1988).
Seu romance mais recente é Cinco esquinas, publicado em 2016.
Contudo, como sua obra é vasta, citaremos brevemente alguns de seus
livros para conhecermos melhor o trabalho desse importante escritor: Traves-
suras de una niña mala (2006), El héroe discreto (2013) e Cinco esquinas.
Travesuras de una niña mala é uma história de amor que ocorre em
lugares como Lima, Paris, Londres, Tóquio e Madri. Na capa do livro há
a seguinte pergunta: “Qual é a verdadeira face do amor?”. Essa indagação

– 200 –
A nova narrativa hispano-americana

leva o leitor a conhecer a personagem Lily, a menina má que faz travessu-


ras, troca de nome, aparece sem aviso, tem mil faces e sempre incomoda a
vida organizada e sossegada de Ricardo, um jovem tradutor que se muda
para Paris e é completamente apaixonado por ela. Na história, vemos que
o amor não tem definição:

[…]

“Eu me apaixonei por Lily feito um bezerro, a forma mais


romântica de se apaixonar – também se dizia queimar feito um
tição –, e naquele verão inesquecível me declarei três vezes a
ela. A primeira, depois da matinê de domingo, no balcão do
Ricardo Palma, aquele cinema que ficava no Parque Central de
Miraflores, e ela me disse que não, porque ainda era muito nova
para ter namorado. A segunda, na pista de patinação inaugu-
rada justamente naquele verão perto do Parque Salazar, e ela
também não me aceitou, precisava pensar, porque, por mais que
gostasse um pouquinho de mim, seus pais lhe pediram para não
arrumar namorado antes de terminar o quarto ano e ela ainda
estava no terceiro. E a última, poucos dias antes da grande con-
fusão, no Cream Rica da Avenida Larco, enquanto tomávamos
um milk-shake de baunilha, e ela, é claro, disse outra vez que
não, para que ia dizer que sim se já parecíamos namorados do
jeito que estávamos. Não nos colocavam sempre juntos na casa
da Marta, quando jogávamos verdade ou consequência? Não
nos sentávamos juntos na praia de Miraflores? Ela não dançava
comigo mais do que com qualquer outro garoto, nas festas? Para
que, então, ia dar formalmente um sim se todo Miraflores já nos
considerava namorados? Com sua pinta de modelo, olhos escu-
ros e marotos e uma boquinha de lábios carnudos, Lily era a
coqueteria em forma de mulher.”

[…]

Fonte: Vargas Llosa (2006, p. 9).

– 201 –
Literatura Hispano-Americana

Figura 7.8 – Travesuras de la niña mala, de Mario Vargas Llosa

Fonte: Alfaguara.

No romance El héroe discreto, Vargas Llosa demonstra um grande


domínio da linguagem em diálogos que prendem a atenção e personagens
que transmitem autenticidade. A história tem como personagem Felícito
Yanaqué, dono de uma empresa de transportes chamada Narihualá, em
Piura, na região norte do Peru. É casado com Gertrudis e pai de dois filhos,
Miguel e Tiburcio. No entanto, ele gosta de momentos de felicidade juve-
nil em visitas a sua amante, Mabel.
Certo dia, surpreende-se ao encontrar uma carta anônima presa à
porta de sua casa. Trata-se de uma chantagem que diz que sua família e
sua empresa serão protegidas somente mediante um pagamento mensal.
Como assinatura, um tosco desenho de uma pequena aranha. Felícito lem-

– 202 –
A nova narrativa hispano-americana

bra do código de conduta ensinado pelo pai: “Nunca se deixe pisar por
ninguém, filho. Este conselho é a única herança que posso lhe deixar.”
Vejamos um fragmento traduzido para o português:

[…]

“Em lugar de assinatura, a carta tinha um tosco desenho de algo


que parecia uma aranhinha.

Don Felícito leu-a algumas vezes mais. Estava escrita em uma


letra sinuosa e cheia de manchas de tinta. Ele se sentiu surpreso
e divertido, com a vaga sensação de que se tratava de uma
brincadeira de mau gosto. Amassou a carta junto com o enve-
lope e fez menção de jogá-la na lixeira da esquina do ceguinho
Lucindo. Mas se arrependeu e, alisando-a, guardou tudo no
bolso. Havia uma dúzia de quarteirões entre a sua casa, na rua
Arequipa, e seu escritório, na avenida Sánchez Cerro. Dessa vez
não os percorreu preparando a agenda de trabalho do dia, como
fazia sempre, mas remoendo na cabeça a carta da aranhinha.
Devia levá-la a sério? Ir à polícia e denunciar? Os chantagistas
anunciavam que iam entrar em contato com ele para explicar as
“modalidades de pagamento”. Não seria melhor esperar que o
fizessem antes de se dirigir à delegacia? Talvez tudo aquilo não
passasse de um gracejo de algum desocupado que queria fazê-
-lo passar um mau pedaço. Nos últimos tempos a delinquência
havia aumentado em Piura, é verdade: ataques a casas, assaltos
nas ruas, até sequestros que, diziam, as famílias de branquinhos
de El Chipe e Los Ejidos pagavam por baixo dos panos. Ele
estava desconcertado e indeciso, mas pelo menos de uma coisa
tinha certeza: por nenhuma razão e em nenhum caso daria um
centavo a esses bandidos. E, mais uma vez, como tantas outras
em sua vida, Felícito se lembrou das palavras do pai antes de
morrer: “Nunca se deixe pisar por ninguém, filho. Este conselho
é a única herança que posso lhe deixar.” Ele seguiu esse con-
selho, nunca deixou que o pisassem. E com seu meio século e

– 203 –
Literatura Hispano-Americana

pouco nas costas, já estava velho demais para mudar de hábitos.


Estava tão absorvido nestes pensamentos que cumprimentou
rapidamente, com um gesto, o recitador Joaquín Ramos e aper-
tou o passo; normalmente parava um pouco para trocar umas
palavras com aquele boêmio impenitente, que devia ter passado
a noite em algum boteco e só regressava para casa agora, com
os olhos frágeis, seu eterno monóculo e puxando a cabrita que
chamava de sua gazela.”

[…]

Fonte: Vargas Llosa (2013, p. 11).

Figura 7.9 – El héroe discreto, de Mario Vargas Llosa

Fonte: Alfaguara.

– 204 –
A nova narrativa hispano-americana

Cinco esquinas conta a história de duas amigas, Marisa e Chabela,


que, de repente, têm uma relação sexual. A partir de então, tornam-se
amantes e os maridos Quique e Luciano nem desconfiam. Como pano
de fundo, há o retrato da sociedade peruana durante os últimos meses da
ditadura de Fujimori e Montesinos, que expõe a corrupção e o terrorismo
acobertados pelo jornalismo sensacionalista, a imprensa marrom.
Vamos ler o primeiro parágrafo do romance, quando as duas ami-
gas acabam passando a noite juntas por causa do toque de recolher
imposto pelo governo do Peru como forma de combate às ameaças de
grupos terroristas:

“Tinha acordado ou continuava sonhando? Aquele calorzinho


no peito do pé direito continuava lá, uma sensação estranha
que arrepiava todo o seu corpo e lhe revelava que não estava
sozinha naquela cama. As lembranças vinham à sua cabeça em
tropel, mas iam se organizando como palavras cruzadas preen-
chidas lentamente. Depois do jantar elas tinham ficado alegres e
um pouco altas com o vinho, passando do terrorismo aos filmes
e às fofocas sociais, quando, de repente, Chabela olhou o reló-
gio e imediatamente se levantou, pálida: “O toque de recolher!
Meu Deus, não vai dar mais tempo de chegar a La Rinconada!
Como passou o tempo!”. Marisa insistiu que ficasse e dormisse
com ela. Não havia problema, Quique tinha ido a Arequipa para
uma reunião da diretoria no dia seguinte cedo na cervejaria, elas
eram donas do apartamento no Golfe. Chabela ligou para seu
marido. Luciano, sempre tão compreensivo, disse que não se
preocupasse, ele se encarregaria de que as duas meninas fossem
pontualmente esperar o ônibus do colégio. Que Chabela ficasse
mesmo na casa de Marisa, era bem melhor que ser parada na
rua por uma patrulha, se infringisse o toque de recolher. Mal-
dito toque de recolher. Mas, claro, o terrorismo era pior.”

[…]

Fonte: Vargas Llosa (2016, p. 7).

– 205 –
Literatura Hispano-Americana

Figura 7.10 – Cinco esquinas, de Mario Vargas Llosa

Fonte: Alfaguara.

Por meio da leitura dos fragmentos, podemos observar que Mario


Vargas Llosa tem uma maneira peculiar de focalizar a realidade, consti-
tuindo uma importante contribuição para a narrativa hispano-americana.
Seus heróis, na verdade anti-heróis, têm grandeza romântica, mas ignoram
propósitos sociais ou morais.

Figura 7.11 – Julio Cortázar


7.2.2 Julio Cortázar
Julio Cortázar (1914-1984) nas-
ceu em Bruxelas, na Bélgica, mas
passou a infância em Buenos Aires,
por isso é considerado um escritor
argentino. Foi professor, tradutor,
Fonte: diariodocentrodomundo.com.br.

– 206 –
A nova narrativa hispano-americana

militante e escritor e denunciou em suas obras os horrores dos anos difí-


ceis na Argentina.
Mudou-se para Paris em 1951, onde publicou regularmente suas cole-
tâneas de contos e romances: Bestiário (1951), La armas secretas (1959)
e Final de juego (1956), sob o título de Cerimonias (1968), História de
cronopios y de famas (1963) e Rayuela (1963), sendo esta sua obra mais
conhecida e que teve grande sucesso, vendendo 5 mil cópias no mesmo
ano. Com essa publicação, tornou-se o escritor mais importante do boom
hispano-americano.
Vejamos quais foram suas obras:

22 Presencia (1938)
22 La otra orilla (1945)
22 Bestiario (1951)
22 Final del juego (1956)
22 Las armas secretas (1959)
22 Los premios (1960)
22 Historias de cronopios y famas (1962)
22 Todos los fuegos el fuego (1966)
22 62, modelo para armar (1968)
22 Rayuela (1963)
22 La vuelta al día en ochenta mundos (1967)
22 Último round (1968)
22 Pameos y meopas (1971)
22 Prosa del observatorio (1972)
22 Libro de Manuel (1973)
22 Octaedro (1974)
22 Silvalandia (1975)
22 Alguien que anda por ahí (1977)
22 Un tal Lucas (1979)
22 Queremos tanto a Glenda (1980)

– 207 –
Literatura Hispano-Americana

22 Deshoras (1982)
22 Los autonautas de la cosmopista (1983)
22 Salvo el crepúsculo (1984)
22 Argentina, años de alambradas culturales (1984)
22 Divertimento (1986 – póstumo)
22 El examen (1986 – póstumo)
22 Imagen de John Keats (1996 – póstumo)
22 Papeles inesperados (2009 – póstumo)

Fonte: Julio… (2015).

Figura 7.12 – Livros

Fonte: Shutterstock.com/LeicherOliver.

Em sua narrativa há a presença do fantástico para mostrar a comple-


xidade da existência, ao mesmo tempo em que está ancorada no cotidiano.
Segundo Joset (1987), seu ponto de partida é um elemento perturbador,
muitas vezes mínimo, da vida, do dia a dia. Assim, são reveladas ao leitor
as obsessões de um grupo, de um casal, de um indivíduo do qual se desco-
bre o gênio maléfico. O mistério torna-se horrivelmente natural.

“A morte e o nada, o tempo e o absurdo tecem seus fios de


maneira insidiosa. Cortázar segue esses fios e os desenrola

– 208 –
A nova narrativa hispano-americana

minuciosamente. Recoloca todas as questões fundamentais:


Em que o homem se fundamenta? Através do que se supera?
Existe uma verdade do “eu”? Que é que se esconde sob um
destino aparentemente absurdo?” (JOSET, 1987, p. 92).

Rayuela é uma narrativa introspectiva, um monólogo interior que


conta a história de Horácio Oliveira de um modo que joga com a subjeti-
vidade do leitor e tem múltiplos fins. De acordo com López (c2017), “Cor-
tázar rompe toda pauta convencional de linealidad narrativa y sugiere que
el lector haga una incursión personal en el libro. Propone lo que la inves-
tigación linguística y literaria ha llamado desconstrucción del texto.”.
Nessa obra, o autor expõe uma leitura em dobro: a convencional e a que
salta determinados capítulos, permitindo várias leituras orientadas, como
ele próprio adverte: “a su manera este libro es muchos libros.”.
Figura 7.13 – Rayuela, de Julio Cortázar

Fonte: Alfaguara.

– 209 –
Literatura Hispano-Americana

Vejamos um dos fragmentos mais comentados da obra e talvez o mais


lido, que trata da descrição de uma boca, tomada de amor, através da ino-
vação linguística e da preocupação estética das imagens. A tradução para
o português é de Fernando Castro Ferro. Sugerimos, também, que você
ouça no YouTube a leitura do fragmento na voz do próprio Julio Cortázar,
em espanhol.

[…]

“Toco a tua boca, com um dedo toco o contorno da tua boca, vou
desenhando essa boca como se estivesse saindo da minha mão,
como se pela primeira vez a tua boca se entreabrisse e basta-me
fechar os olhos para desfazer tudo e recomeçar. Faço nascer, de
cada vez, a boca que desejo, a boca que a minha mão escolheu e
te desenha no rosto, uma boca eleita entre todas, com soberana
liberdade eleita por mim para desenhá-la com minha mão em
teu rosto e que por um acaso, que não procuro compreender,
coincide exatamente com a tua boca que sorri debaixo daquela
que a minha mão te desenha.

Tu me olhas, de perto tu me olhas, cada vez mais de perto e,


então, brincamos de ciclope, olhamo-nos cada vez mais de
perto e nossos olhos se tornam maiores, aproximam-se, sobre-
põem-se e os ciclopes se olham, respirando indistintas, as
bocas encontram-se e lutam debilmente, mordendo-se com os
lábios, apoiando ligeiramente a língua nos dentes, brincando
nas suas cavernas, onde um ar pesado vai e vem com um
perfume antigo e um grande silêncio. Então, as minhas mãos
procuram afogar-se nos teus cabelos, acariciar lentamente a
profundidade do teu cabelo enquanto nos beijamos como se
tivéssemos a boca cheia de flores ou de peixes, de movimentos
vivos, de fragrância obscura. E se nos mordemos, a dor é doce;
se nos afogamos num breve e terrível absorver simultâneo de
fôlego, essa instantânea morte é bela. E já existe uma só saliva

– 210 –
A nova narrativa hispano-americana

e um só sabor de fruta madura, e eu te sinto tremular contra


mim, como uma lua na água.”

[…]

Fonte: Cortázar (2011, p. 7).

Nesse fragmento percebemos que o ritmo da linguagem de Cortázar


lembra constantemente a oralidade e a origem da história. Portanto, mui-
tos críticos recomendam que sua obra seja lida em voz alta, pois dessa
maneira surge outro significado. Sugerimos a leitura das obras que repre-
sentam o absurdo, o caos e o problema existencial por meio de uma nova
técnica para alcançar a visão de uma nova realidade – mais mágica e tam-
bém mais humana.

7.2.3 Carlos Fuentes


Figura 7.14 – Carlos Fuentes
Fonte: CC BY 2.0/Abderrahman Bouirabdane.

– 211 –
Literatura Hispano-Americana

Carlos Fuentes (1928-2012) nasceu na cidade do Panamá e foi escri-


tor, romancista, ensaísta e diplomata mexicano. Atuou como delegado no
México e embaixador de seu país na França e lecionou nas universida-
des Princeton e Columbia, Harvard e Cambridge. Escreveu mais de 20
romances, vários contos e ficou conhecido por seus ensaios sobre política
e cultura.
Durante sua carreira literária, ganhou diversos prêmios e distinções,
entre os quais o Prêmio Miguel de Cervantes, o Prêmio Nacional de Lite-
ratura, o Cervantes e o Prêmio Príncipe de Astúrias. Vejamos quais foram
suas obras:

Novela
22 La región más transparente (1958)
22 Aura (1962)
22 La muerte de Artemio Cruz (1962)
22 Cambio de piel (1967)
22 Zona sagrada (1967)
22 Cumpleaños, Joaquín Mortiz (1969)
22 Terra Nostra (1975)
22 La cabeza de la hidra (1978)
22 Una familia lejana (1980)
22 Gringo viejo (1985)
22 Cristóbal Nonato (1987)
22 La campaña (1990)
22 Diana o la cazadora solitaria (1994)
22 La edad del tiempo (1994 – obras completas)
22 Los años con Laura Díaz (1999)
22 Los cinco soles de México. Memoria de un milenio (2000)
22 Instinto de Inez (2001)
22 La silla del águila (2003)
22 La voluntad y la fortuna (2008)

– 212 –
A nova narrativa hispano-americana

22 Adán en Edén (2009)

Teatro
22 Todos los gatos son pardos (1970)
22 El tuerto es rey (1970)
22 Los reinos originarios (1971)
22 Orquídeas a la luz de la luna (1982)
22 Ceremonias del alba (1991)
22 Varia invención: Voluptuario (1996)
22 En esto creo A/Z (2002)

Ensayo
22 La nueva novela hispanoamericana (1969)
22 Casa con dos puertas (1971)
22 Tiempo mexicano (1971)
22 Cervantes o la crítica de la lectura (1976)
22 Valiente mundo nuevo. Épica, utopía y mito en la novela hispanoamericana (1991)
22 El coloquio de invierno (1992)
22 El espejo enterrado (1992)
22 Geografía de la novela (1993)
22 Tres discursos para dos aldeas (1993)
22 Nuevo tiempo mexicano (1994)
22 Por un progreso incluyente (1997)
22 Retratos en el tiempo (1998)
22 Todo encuentro o descubrimiento es mutuo (plaquette) (1998)
22 Viendo visiones (2003)
22 Contra Bush (2004)

22 La gran novela latinoamericana (2011)

Cuento
22 Los días enmascarados (1954)

– 213 –
Literatura Hispano-Americana

22 Las buenas conciencias (1959)


22 Cantar de ciegos (1964)
22 Agua quemada (1981)
22 Constancia y otras novelas para vírgenes (1990)
22 Tierra firme (1990)
22 El naranjo o los círculos del tiempo (1993)
22 La frontera de cristal (1995)
22 Todas las familias felices (2006)
22 Cuentos naturales (2007)
22 Cuentos sobrenaturales (2007)
22 Carolina Grau (2011)

Fonte: Carlos… (2012).

Figura 7.15 – Livros

Fonte: Shutterstock.com/AlexeiLogvinovich.

La muerte de Artemio Cruz, publicado em 1962, fez parte do boom


hispano-americano e indaga sobre o sentido da condição humana. Nele, o
leitor participa da longa agonia do personagem, um empresário mexicano
de 71 anos de idade que, em seu leito de morte, lembra o fato de ter aban-
donado o posto de combatente revolucionário para se tornar um milio-
nário corrupto. Segundo López (c2017), “en su lecho de muerte, durante

– 214 –
A nova narrativa hispano-americana

su último medio día en el mundo, el anciano y enfermo Artemio Cruz


recuerda: no siempre fue ese triste saco de huesos y fermentos corporales;
alguna vez fue joven, osado, vigoroso. Y tuvo ideales, sueños, fe.”.
A narração é construída pelo emprego de três formas nominais (eu,
tu, ele) com as quais Fuentes inova sua linguagem com níveis de tempo,
espaço e consciência superpostos. Tal confusão nas múltiplas vozes se
assemelha à confusão causada no percurso da revolução mexicana e as
consequências que essa guerra trouxe para o México pós-revolucionário.
Dessa forma, por meio da reconstrução pessoal do moribundo – que, ao
reviver seu passado, procura um sentido para sua vida e sobretudo para
sua morte – há a exposição do pessimismo em relação à política mexicana.
O trecho a seguir, com tradução de Carlos Nougué para o português,
poderá servir de exemplo dessas múltiplas vozes:

[…]

“Deverás acreditar na noite e aceitá-la sem a ver, acreditar sem


reconhecê-la, como se fosse o Deus de todos teus dias: a noite…
Agora estarás pensando que bastará fechar os olhos para tê-la.
Sorrirás, apesar da dor que volta a insinuar-se, e tratarás de
estender um pouco as pernas. Alguém te tocará a mão, mas não
responderás a essa carícia? atenção? angústia? cálculo? porque
terás criado a noite com teus olhos fechados e do fundo desse
oceano de tinta navegará até ti um baixel de pedra que será ale-
grado em vão pelo sol do meio-dia, quente e sonolento: mura-
lhas espessas enegrecidas, levantadas para defender a Igreja dos
ataques dos índios e também para unir a conquista religiosa à
conquista militar. Avançará para teus olhos fechados, com o
rumor crescente de seus pífaros e tambores, a tropa rude, isabe-
lina, espanhola, e atravessarás sob o sol a ampla espanada com
a cruz de pedra no centro e as capelas abertas, a prolongação
do culto indígena, teatral, ao ar livre, nas esquinas. No alto da
igreja levantada no fundo da esplanada, as abóbadas de tezon-
tle repousarão sobre os esquecidos alfanjes mudéjares, sinal de

– 215 –
Literatura Hispano-Americana

mais um sangue superposto ao dos conquistadores. Avançarás


até a fachada do primeiro barroco, ainda castelhano, mas já rico
em colunas de vides profusas e claves aquilinas: a fachada da
Conquista, severa e agradável, com um pé no mundo velho,
morto, e outro no mundo novo que não começava aqui, mas
também do outro lado do mar: o novo mundo chegou com eles,
com uma fronte de muralhas austeras para proteger o coração
sensual, alegre, cobiçoso. Avançarás e penetrarás na nave do
batel, onde o exterior castelhano terá sido vencido pela pleni-
tude, macabra e sorridente, deste céu índio de santos, anjos e
deuses índios. Uma só nave, enorme, correrá até o altar folheado
a ouro, sombria opulência de rostos mascarados, lúgubre e fes-
tivo rezar, sempre recompensado, com essa liberdade, a única
concedida, de decorar um templo e enchê-lo com o sobressalto
tranquilo, a resignação esculpida, o horror ao vazio, aos tempos
mortos (…) Caminharás, na conquista de teu novo mundo, pela
nave sem um espaço livre: cabeças de anjos, vides esparrama-
das, florações policrômicas, frutos redondos, vermelhos, captu-
rados entre trepadeiras de ouro, santos brancos fixados, santos
de olhar assombrado, santos de um céu inventado pelo índio à
sua imagem e semelhança: anjos e santos com o rosto de sol e
lua, com a mão protetora das colheitas, com o dedo indicador
dos cães guias, com os olhos cruéis, desnecessários, alheios, do
ídolo, com o semblante rigoroso dos ciclos. Os rostos de pedra
atrás das máscaras rosa, bondosas, ingênuas, mas impassíveis,
mortas, máscaras: cria a noite, enche de vento o velame negro,
fecha os olhos Artemio Cruz…”

[…]

Fonte: Fuentes (2007, p. 31).

– 216 –
A nova narrativa hispano-americana

Figura 7.16 – La muerte de Artemio Cruz, de Carlos Fuentes

Fonte: Alfaguara.

Com esse fragmento, percebemos que Carlos Fuentes aborda os


momentos finais do personagem aproximando-o da morte de maneira nos-
tálgica. Artemio Cruz considera suas lembranças sob um ponto de vista
moral e pensa nas escolhas que poderiam ter sido feitas e mudado sua
vida – de tudo o que foi e do que poderia ter sido: “A vida é vista como um
meio de transição: origina-se na da morte, que tem nas entranhas mater-
nas a sua cova, e volta a ela quando chega o seu fim” (FAVIANO, 2012).
Dessa maneira, indo ao encontro da morte, Artemio Cruz busca algo que
nunca teve: o sentido da vida.

– 217 –
Literatura Hispano-Americana

7.2.4 Gabriel García Márquez


Figura 7.17 – Gabriel García Márquez

Fonte: CC BY 2.0/Jose Lara.

Gabriel García Márquez (1927-2014) nasceu em Aracataca, na


Colômbia, foi autor de alguns dos maiores romances do século XX e mes-
tre do realismo mágico hispano-americano. Tornou-se um dos escritores
mais admirados e traduzidos no mundo. Ganhou vários prêmios, como o
Nobel de Literatura e o Prêmio Internacional Neustadt de Literatura, e con-
quistou grande notoriedade enquanto tentava imitar a maneira como sua
avó materna contava histórias na infância (GARCIA MÁRQUEZ, 2017).
Em sua obra, o jornalismo e a literatura, seus dois trabalhos, encon-
traram-se muitas vezes, como nas histórias Relato de un náufrago (1955)
e Noticia de un secuestro (1996).

– 218 –
A nova narrativa hispano-americana

Você sabia?
Quando perguntaram a Gabriel García Márquez qual o segredo que
o transformou no último grande contador de histórias do século XX,
ele disse que “apenas” tentava imitar o tom com que sua avó materna
lhe contava episódios dos mais fantásticos sobre sua família e pessoas
próximas ou da comunidade onde nasceu, na cidadezinha de Araca-
taca, Norte da Colômbia. O detalhe, ressaltou o Nobel de literatura
de 1982, que ela fazia isso sem alterar um só traço do rosto.
Fonte: Gonçalo Junior (2014).

As obras de Garcia Márquez expõem um mundo extraordinário e


fazem que seus personagens vivam aventuras imprevisíveis e quase sem-
pre inexplicáveis. Outra característica do autor é fazer seus personagens
se tornarem reais, seres de carne e osso, e não uma imitação. Segundo
López (c2017), “eso hace que sus personajes sean seres de carne y hueso
y no prototipos o esquemas (...) que finalmente cada personaje esté solo,
viviendo su aventura impredecible y casi siempre inexplicable.”.
Vejamos quais são suas obras:

22 La hojarasca (1955)
22 El coronel no tiene quien le escriba (1961)
22 La mala hora (1962)
22 Los funerales de la Mamá Grande (1962)
22 Cien años de soledad (1967)
22 Isabel viendo llover en Macondo (1968)
22 La novela en América Latina: Diálogo (junto a M. Vargas Llosa) (1968)
22 Relato de un náufrago (1970)
22 La increíble y triste historia de la cándida Eréndira y de su abuela desalmada (1972)
22 Ojos de perro azul (1972)
22 El negro que hizo esperar a los ángeles (1972)
22 Cuando era feliz e indocumentado (1973)

– 219 –
Literatura Hispano-Americana

22 Chile, el golpe y los gringos (1974)


22 El otoño del patriarca (1975)
22 Todos los cuentos de Gabriel García Márquez: 1947-1972 (1975)
22 Crónicas y reportajes (1976)
22 Operación Carlota (1977)
22 Periodismo militante (1978)
22 De viaje por los países socialistas (1978)
22 La tigra (1978)
22 Crónica de una muerte anunciada (1981)
22 Obra periodística (1981)
22 El verano feliz de la señora Forbes (1981)
22 El rastro de tu sangre en la nieve (1981)
22 El secuestro: Guión cinematográfico (1982)
22 Viva Sandino (1982)
22 El amor en los tiempos del cólera (1985)
22 La aventura de Miguel Littín, clandestino en Chile (1986)
22 Diatriba de amor contra un hombre sentado: monólogo en un acto (1987)
22 El general en su laberinto (1989)
22 Notas de prensa, 1961-1984 (1990)
22 Doce cuentos peregrinos (1992)
22 Del amor y otros demonios (1994)
22 Cómo se cuenta un cuento (1995)
22 Me alquilo para soñar (1995)
22 Noticia de un secuestro (1996)
22 Por un país al alcance de los niños (1996)
22 La bendita manía de contar (1998)
22 Por la libre: obra periodística (1974-1995) (1999)
22 Vivir para contarla (2002)
22 Memoria de mis putas tristes (2004)

22 Yo no vengo a decir un discurso (2010)

Fonte: Gabriel… (2015).

– 220 –
A nova narrativa hispano-americana

Figura 7.18 – Livros

Fonte: Shutterstock.com/hxdbzxy.

Cien años de soledad, publicada em 1967, obra que Gabriel García


Márquez levou mais de um ano para escrever, teve sucesso imediato, esgo-
tando a primeira edição em poucos dias. É uma verdadeira obra-prima não
somente da literatura hispano-americana, mas também da literatura uni-
versal. Foi incluída na lista dos cem melhores livros de todos os tempos.
Foi escrita durante o exílio de Gabriel García Márquez no México e
conta a história da família Buendía ao longo de sete gerações em Macondo,
uma pequena vila que acaba enterrada e destruída por guerras e pelo pro-
gresso. O autor expõe a família Buendía com o estigma da solidão. A pri-
meira geração é a de José Arcadio Buendía e Úrsula, que se casam cheios
de presságios e medos por serem primos, porque há na região o mito
de que a família pudesse ter rabo de porco. No entanto, é evidente que
esse romance ultrapassa a simples história de uma família obcecada pelo
incesto. A ação é vasta, de numerosas peripécias, na qual o sobrenatural, o
mágico e o fantástico se sobressaem: “Aparições de espectros, alquimia,
reversibilidade do tempo, peste da insônia e do esquecimento, bestiário
fantástico são apenas alguns dos elementos desse mundo sobrenatural.”
(JOSET, 1987, p. 94).
Dessa forma, a narrativa apresenta eventos fantásticos, situação que
para os personagens não é anormal. Eles convidam o leitor para entrar em

– 221 –
Literatura Hispano-Americana

um mundo no qual as coisas mais improváveis também são possíveis, sem


ter de buscar explicações. Isso se enquadra dentro do movimento literário
chamado realismo mágico.
Vejamos um fragmento que descreve a peste da insônia e do esque-
cimento que flagelou Macondo por um tempo significativo, com tradução
de Eric Nepomuceno:

[…]

“Uma noite, na época em que Rebeca se curou do vício de comer


terra e foi levada para dormir no quarto das outras crianças, a
índia que dormia com eles acordou por acaso e ouviu um estra-
nho ruído intermitente no canto. Sentou-se alarmada, pensando
que tinha entrado algum animal no quarto, e então viu Rebeca
na cadeira de balanço, chupando o dedo e com os olhos fosfo-
recentes como os de um gato na escuridão. Pasmada de terror,
perseguida pela fatalidade do destino, Visitación reconheceu
nesses olhos os sintomas da doença cuja ameaça os havia obri-
gado, a ela e ao irmão, a se desterrarem para sempre de um
reino milenário no qual eram príncipes. Era a peste da insônia.

Cataure, o índio, não amanheceu em casa. Sua irmã ficou, por-


que o coração fatalista lhe indicava que a doença fatal haveria
de persegui-la de todas as maneiras até o último lugar da terra.
Ninguém entendeu o pânico de Visitación. “Se a gente não voltar
a dormir, melhor”, dizia José Arcadio Buendía, de bom humor.
“Assim a vida rende mais”. Mas a índia explicou que o mais temí-
vel da doença da insônia não era a impossibilidade de dormir,
pois o corpo não sentia cansaço nenhum, mas sim a sua inexorá-
vel evolução para uma manifestação mais crítica: o esquecimento.
Queria dizer que quando o doente se acostumava ao seu estado
de vigília, começavam a apagar-se da sua memória as lembranças
da infância, em seguida o nome e a noção das coisas, e por último
a identidade das pessoas e ainda a consciência do próprio ser, até
se afundar numa espécie de idiotice sem passado. José Arcadio

– 222 –
A nova narrativa hispano-americana

Buendía, morto de rir, considerou que se tratava de mais uma das


tantas enfermidades inventadas pela superstição dos indígenas.
Mas Úrsula, por via das dúvidas, tomou a precaução de separar
Rebeca das outras crianças.

Ao fim de várias semanas, quando o terror de Visitación pare-


cia aplacado, José Arcadio Buendía encontrou-se uma noite
rolando na cama sem poder dormir. Úrsula, que também tinha
acordado, perguntou-lhe o que estava acontecendo e ele respon-
deu: “Estou pensando outra vez em Prudencio Aguilar”. Não
dormiram um minuto sequer, mas no dia seguinte se sentiam
tão descansados que se esqueceram da noite ruim. Aureliano
comentou assombrado na hora do almoço que se sentia muito
bem, apesar de ter passado a noite no laboratório, dourando um
broche que pensava dar a Úrsula no dia do seu aniversário. Não
se alarmaram até o terceiro dia, quando na hora de deitar se
sentiram sem sono, e deram conta de que estavam há mais de
cinquenta horas sem dormir.

– As crianças também estão acordadas – disse a índia com a sua


convicção fatalista. – Uma vez que a peste entra em casa, nin-
guém escapa.

Haviam contraído, na verdade, a doença da insônia. Úrsula, que


tinha aprendido da mãe o valor medicinal das plantas, preparou, e
fez todos tomarem, uma beberagem de acônito, mas não consegui-
ram dormir, e passaram o dia inteiro sonhando acordados. Nesse
estado de alucinada lucidez não só viam as imagens dos seus pró-
prios sonhos, mas também uns viam as imagens sonhadas pelos
outros. Era como se a casa se tivesse enchido de visitas. Sentada na
cadeira de balanço, num canto da cozinha, Rebeca sonhou que um
homem muito parecido com ela, vestido de linho branco e com
o colarinho da camisa fechado por um botão de ouro, trazia-lhe
um ramo de rosas. Acompanhava-o uma mulher de mãos deli-
cadas que separou uma rosa e pôs no cabelo da menina. Úrsula
entendeu que o homem e a mulher eram os pais de Rebeca, mas
ainda que fizesse um grande esforço para reconhecê-los, confir-

– 223 –
Literatura Hispano-Americana

mou-se a certeza de que nunca os havia visto. Enquanto isso, por


um descuido que José Arcadio Buendía não se perdoou nunca, os
animaizinhos de caramelo fabricados em casa continuavam sendo
vendidos no povoado. Crianças e adultos chupavam encanta-
dos os deliciosos galinhos verdes da insônia, os refinados peixes
rosados da insônia e os ternos cavalinhos amarelos da insônia, de
modo que a alvorada de segunda-feira surpreendeu todo o povo-
ado de pé. No princípio, ninguém se alarmou. Pelo contrário,
alegraram-se de não dormir porque havia então tanto o que fazer
em Macondo que o tempo mal chegava. Trabalharam tanto que
logo não tiveram nada mais que fazer, e se encontraram às três da
madrugada com os braços cruzados, contando o número de notas
que tinha a valsa dos relógios. Os que queriam dormir, não por
cansaço, mas por saudade dos sonhos, recorreram a toda sorte de
métodos de esgotamento. Reuniam-se para conversar sem trégua,
repetindo durante horas e horas as mesmas piadas complicando
até os limites da exasperação a história do galo capão, que era
um jogo infinito em que o narrador perguntava se queriam que
lhes contasse a história do galo capão e quando respondiam que
sim, o narrador dizia que não havia pedido que dissessem que
sim, mas se queriam que lhes contasse a história do galo capão, e
quando respondiam que não, o narrador dizia que não lhes tinha
pedido que dissessem que não, mas se queriam que lhes contasse
a história do capão, e quando ficavam calados o narrador dizia
que não lhes tinha pedido que ficassem calados, mas se queriam
que lhes contasse a história do galo capão, e ninguém podia ir
embora porque o narrador dizia que não lhes tinha pedido que
fossem embora, mas se queriam que lhes contasse a história do
galo capão, e assim sucessivamente, num círculo vicioso que se
prolongava por noites inteiras.

Quando José Arcadio Buendía percebeu que a peste tinha inva-


dido a povoação, reuniu os chefes de família para explicar-lhes
o que sabia sobre a doença da insônia, e estabeleceram medi-
das para impedir que o flagelo se alastrasse para as outras
povoações do pantanal. Foi assim que se tiraram dos cabritos

– 224 –
A nova narrativa hispano-americana

os sininhos que os árabes trocavam por papagaios, se puseram


na entrada do povoado, à disposição dos que desatendiam os
conselhos e as súplicas dos sentinelas e insistiam em visitar a
aldeia. Todos os forasteiros que por aquele tempo percorriam
as ruas de Macondo tinham que fazer soar o sininho para que
os doentes soubessem que estavam sãos. Não se lhes permitia
comer nem beber nada durante a sua estada, pois não havia
dúvidas de que a doença só se transmitia pela boca, e todas as
coisas de comer e de beber estavam contaminadas pela insônia.
Desta forma, manteve -se a peste circunscrita ao perímetro do
povoado. Tão eficaz foi a quarentena, que chegou o dia em que a
situação de emergência passou a ser encarada como coisa natu-
ral e se organizou a vida de tal maneira que o trabalho retomou
o seu ritmo e ninguém voltou a se preocupar com o inútil cos-
tume de dormir.

Foi Aureliano quem concebeu a fórmula que havia de defendê-


-los, durante vários meses, das evasões da memória. Descobriu-
-a por acaso. Insone experimentado, por ter sido um dos primei-
ros, tinha aprendido com perfeição a arte da ourivesaria. Um dia,
estava procurando a pequena bigorna que utilizava para lami-
nar os metais, e não se lembrou do seu nome. Seu pai lhe disse:
“bigorna”. Aureliano escreveu o nome num papel que pregou
com cola na base da bigorninha: “bigorna.” Assim, ficou certo
de não esquecê-lo no futuro. Não lhe ocorreu que fosse aquela a
primeira manifestação do esquecimento, porque o objeto tinha
um nome difícil de lembrar. Mas poucos dias depois, descobriu
que tinha dificuldade de se lembrar de quase todas as coisas do
laboratório. Então, marcou-as com o nome respectivo, de modo
que bastava ler a inscrição para identificá-las. Quando seu pai
lhe comunicou o seu pavor por ter-se esquecido até dos fatos
mais impressionantes da sua infância, Aureliano lhe explicou
o seu método, e José Arcadio Buendía o pôs em prática para
toda a casa e mais tarde o impôs a todo o povoado. Com um
pincel cheio de tinta, marcou cada coisa com o seu nome: mesa,
cadeira, relógio, porta, parede, cama, panela. Foi ao curral e

– 225 –
Literatura Hispano-Americana

marcou os animais e as plantas: vaca, cabrito, porco, galinha,


aipim, taioba, bananeira. Pouco a pouco, estudando as infini-
tas possibilidades do esquecimento, percebeu que podia chegar
um dia em que se reconhecessem as coisas pelas suas inscrições,
mas não se recordasse a sua utilidade. Então foi mais explícito.
O letreiro que pendurou no cachaço da vaca era uma amostra
exemplar da forma pela qual os habitantes de Macondo estavam
dispostos a lutar contra o esquecimento: Esta é a vaca, tem-se
ordenhá-la todas as manhãs para que produza o leite e preciso
ferver para misturá-lo com o café e fazer café com leite. Assim,
continuaram vivendo numa realidade escorregadia momenta-
neamente capturada pelas palavras, mas que de fugir sem remé-
dio quando esquecessem os valores da letra escrita.”

[…]

Fonte: García Márquez (2017, p. 51-56).

Figura 7.19 – Cien años de soledad, de Gabriel García Márquez


Fonte: Editora Record.

– 226 –
A nova narrativa hispano-americana

Nota-se, nesse fragmento, o interessante episódio que afligiu os


habitantes de Macondo: a peste da insônia se alastrou como uma doença
transmissível e a evolução terrível foi o esquecimento. Quando as pes-
soas se acostumam a ficar acordadas por dias sem se sentirem cansadas,
a memória começa a se apagar gradualmente. Foram inúmeras tentativas
para solucionar esse problema, mas o que deu fim ao tormento foi uma
espécie de poção mágica trazida por Melquíades, que tirou de dentro de
sua maleta de objetos indecifráveis um frasco com o líquido que acendeu
novamente a luz da memória.

Da teoria para a prática


Selecionamos a obra Memoria de mis putas tristes, de Gabriel García
Márquez, para um trabalho de análise em sala de aula. Optamos pela ver-
são em português; no entanto, recomendamos que seja feita a leitura no
idioma original. Este é o início do romance:
No ano de meus noventa anos quis me dar de presente uma noite
de amor louco com uma adolescente virgem. Lembrei de Rosa
Cabarcas, a dona de uma casa clandestina que costumava avisar
aos seus bons clientes quando tinha alguma novidade disponível.
Nunca sucumbi a essa nem a nenhuma de suas muitas tentações
obscenas, mas ela não acreditava na pureza de meus princípios.
Também a moral é uma questão de tempo, dizia com sorriso
maligno, você vai ver. (GARCÍA MÁRQUEZ, 2005, p. 7)

Assim começa uma história de amor entre um homem de 90 anos


e uma menina de 14 anos chamada Delgadina. Não estamos falando de
pedofilia, pois, ao se encontrar com a moça, o velho desenvolve uma rela-
ção muito diferente da qual tinha imaginado. Pela primeira vez, percebe o
que é dormir com uma mulher sem a necessidade de sexo e esse fato muda
seu modo de vida e suas atitudes.
A casa renascia de suas cinzas e eu navegava no amor de Delga-
dina com uma intensidade e uma felicidade que jamais conheci
em minha vida anterior. Graças a ela enfrentei pela primeira
vez meu ser natural enquanto transcorriam meus noventa anos.
Descobri que minha obsessão por cada coisa em seu lugar, cada
assunto em seu tempo, cada palavra em seu estilo, não era o
prêmio merecido de uma mente em ordem, mas, pelo contrário,

– 227 –
Literatura Hispano-Americana

todo um sistema de simulação inventado por mim para ocultar a


desordem da minha natureza. Descobri que não sou disciplinado
por virtude, e sim como reação contra a minha negligência; que
pareço generoso para encobrir minha mesquinhez, que me faço
passar por prudente quando na verdade sou desconfiado e sempre
penso o pior, que sou conciliador para não sucumbir às minhas
cóleras reprimidas, que só sou pontual para que ninguém saiba
como pouco me importa o tempo alheio. Descobri, enfim, que o
amor não é um estado da alma e sim um signo do zodíaco. (GAR-
CÍA MÁRQUEZ, 2005, p. 74)

De acordo com esses dados e após a leitura da obra completa, insti-


gue as seguintes reflexões:
a) a solidão na velhice;
b) o louvor à vida;
c) o amor que nos faz humanos.
Figura 7.20 – Memoria de mis putas tristes, de Gabriel García Márquez

Fonte: Editora Record.

– 228 –
A nova narrativa hispano-americana

Síntese
O reconhecimento internacional da narrativa hispano-americana
recebeu o nome de boom. Os autores envolvidos nesse fenômeno promo-
veram uma verdadeira inovação nos romances e transgrediram na lingua-
gem utilizada. Citamos brevemente as características literárias de Mario
Vargas Llosa, Julio Cortázar, Carlos Fuentes e Gabriel García Márquez.
Vimos que Mario Vargas Llosa nasceu no Peru e atualmente vive entre
Londres, Paris, Madri e Lima. É jornalista, dramaturgo, ensaísta, crítico lite-
rário, professor e um dos mais importantes escritores da atualidade.
Julio Cortázar nasceu na Bélgica, mas passou a infância em Buenos
Aires, por isso é considerado um escritor argentino. Rayuela é sua obra
mais conhecida e de grande sucesso, com 5 mil cópias vendidas no mesmo
ano. Com sua publicação, tornou-se o escritor mais importante do boom
hispano-americano.
Carlos Fuentes nasceu na cidade do Panamá e foi escritor, roman-
cista, ensaísta e diplomata mexicano. Atuou como delegado no México,
embaixador de seu país na França e lecionou nas universidades Prince-
ton e Columbia, Harvard e Cambridge. La muerte de Artemio Cruz foi o
romance com o qual se integrou ao boom.
Por fim, vimos que Gabriel García Márquez nasceu na Colômbia, foi
autor de alguns dos maiores romances do século XX e mestre do realismo
mágico hispano-americano. Tornou-se um dos escritores mais admirados
e traduzidos no mundo.

Atividades
1. Pesquise mais dois autores do boom que não foram citados e
escreva um resumo sobre vida e obra.
2. Carlos Fuentes foi um escritor mexicano, considerado um dos
maiores romancistas em língua espanhola. Ao lado de Mario
Vargas Llosa, Gabriel García Márquez e Julio Cortázar, foi um
expoente do boom hispano-americano. Diante disso, faça uma
pesquisa e escreva a biografia desse famoso autor.

– 229 –
Literatura Hispano-Americana

3. A obra A guerra do fim do mundo, de Mario Vargas Llosa, publi-


cada em 1981, é frequentemente comparada à obra Os sertões,
de Euclides da Cunha, publicada em 1902. O tom principal é
quase jornalístico, uma vez que o romance é baseado em fatos
da guerra de Canudos. De acordo com esses dados, leia as duas
obras e faça um paralelo sobre suas semelhanças.
Figura 7.21 – La guerra del fin del mundo, de Mario Vargas Llosa

Fonte: Alfaguara.

4. Leia o artigo intitulado “6 coisas que você não sabia sobre Gabriel
García Márquez (e que vão te inspirar)” e registre suas impres-
sões. O texto está disponível no site HuffPost Brasil (<http://
www.huffpostbrasil.com/2017/03/06/5-coisas-que-voce-nao-
sabia-sobre-gabriel-garcia-marquez-e-que_a_21874760>).

– 230 –
8
Tendências
contemporâneas

A literatura hispano-americana encontrou sua expressão


própria depois do fenômeno chamado boom. Muitos editores
aproveitaram esse fato com o lançamento constante de roman-
ces, uma vez que o caminho nos anos 1980 estava aberto para a
proliferação de novos autores e de novos títulos. Todavia, seria
impossível simplificar e abordar todas as variantes da narrativa
dessa época. Assim, escolhemos alguns autores e alguma obras
para entendermos as tendências contemporâneas: Isabel Allende,
Laura Esquivel, Manuel Puig, Alfredo Bryce Echenique e
Ricardo Piglia.
Veremos, então, algumas características dessas obras, com
uma linguagem menos formal e mais acessível ao leitor, o aban-
dono da complexidade narrativa, a inovação literária, a aborda-
gem de temas que levam ao questionamento da efemeridade da
vida e a presença inquestionável da morte, o respeito às diferen-
Literatura Hispano-Americana

ças, a reprodução do cotidiano, a descrição de conteúdos de cunho sexual,


a violência, a política, entre outros.

8.1 Pós-boom
O boom colocou a América Latina no centro das atenções da literatura
mundial, pois o fenômeno proporcionou a disseminação de novos autores
e de novos títulos nos anos 1980. Contudo, são numerosas as tendências
que surgiram nas últimas décadas e não podemos classificá-las – seria algo
muito simplista de nossa parte. O que podemos afirmar com exatidão é o
fato de que a literatura hispano-americana encontrou sua expressão pró-
pria, “Converteu-se em expressão autêntica de uma literatura que é instru-
mento de indagação vivencial e busca de raízes, indicando sua maturidade
criadora” (JOSEF, 1989, p. 293).
Observamos que muitos autores e a universalização das temáticas
propiciaram a expansão da literatura hispano-americana, elevaram-na a
uma categoria universal e afirmaram sua existência própria. Quase todos
os temas e as características dos anos anteriores continuaram vigentes,
mas podemos perceber o abandono das narrativas de caráter complexo
e o surgimento de obras mais acessíveis para o leitor, por meio de uma
linguagem menos formal. Para López (c2017, s/p),
el autor asume su papel de comunicador en una sociedad regida
por los mass media, desplaza su producto estético de un punto cen-
tral y privilegiado y lo sitúa al mismo nivel que otras comunica-
ciones, como el cine, la televisión, el cómic, el pop, lo camp o el
kitsch, de cuyos lenguajes y técnicas se aprovecha.

Nesse contexto, podemos citar muitos autores e obras: Isabel Allende


com a obra La casa de los espíritus (1982); Laura Esquivel, Como agua
para chocolate (1989); Manuel Puig, com Boquitas pintadas (1969) e El
beso de la mujer araña (1976); Alfredo Bryce Echenique, com Un mundo
para Julius (1970), La vida exagerada de Martín Romaña (1981); Jorge
Ibargüengoitia, com Los conspiradores (1981), Las muertas (1977), Anto-
nio Skármeta, com El cartero de Neruda (1985); Luis Sepúlveda, com El
viejo que leía novelas de amor (1988); Ángeles Mastretta, com Arráncame
la vida (1985); Ricardo Piglia, com Plata quemada (1997), entre outros.

– 232 –
Tendências contemporâneas

8.2 Isabel Allende


Isabel Allende (1942-) nasceu em Lima (Peru), mas é considerada uma
escritora chilena. Desde 1988 vive na Califórnia, nos Estados Unidos, e em
2003 obteve a cidadania do país. É uma das escritoras mais lidas e impor-
tantes da literatura hispano-americana e as vendas de seus livros alcança-
ram 70 milhões de exemplares que já foram traduzidos para 35 idiomas.
Aos 75 anos de idade, Allende publicou seu recente sucesso chamado
Más Allá del invierno (2017), no qual explora o tema da emigração, a iden-
tidade atual da América, a esperança no amor e as novas oportunidades.
Com mais de 20 publicações, entre memórias, romances, teatro e contos,
recebeu vários prêmios, como o Nacional de Literatura do Chile (2010),
a Medalha Presencial da Liberdade (2014), o Hans Christian Andersen
de Literatura (2011), o Prêmio Ciudad de Alcalá de las Artes y las Letras
(2011), o Prêmio Carl Sandburg Estados Unidos (2013), entre outros.
La casa de los espíritus é sua obra mais famosa e com reconheci-
mento de público e de crítica. A narrativa resultou no filme A casa dos
espíritos (1993), com Meryl Streep, Winona Ryder e Antonio Bandeiras.
Em 1995, lançou o livro autobiográfico intitulado Paula, dedicado a sua
filha que morreu aos 28 anos de idade, vítima de uma doença neurológica.
Outras obras que se destacaram foram Eva Luna (1985); Cuentos de
Eva Luna (1989); De amor y de sombra (1984). As crônicas familiares
misturadas a política também foram temas de suas obras.

Leia um trecho da entrevista com a escritora Isabel Allende:


“Depois da morte da minha filha, tudo ficou escuro”,
publicada em 2016 e traduzida para o português:
“Paula” é um livro de memórias sobre a morte da sua filha;
“A Casa dos Espíritos” era uma carta ao seu avô mori-
bundo. O trabalho ajuda-a a superar estas tragédias?
Foi curativo. “A Casa dos Espíritos” foi uma tentativa de recuperar o
mundo que eu perdera no exílio – a minha família, o meu passado,
o meu avô – e acho que o consegui. Estará para sempre nesse livro.
Depois da morte da minha filha, tudo ficou escuro. Toda a cor desa-
pareceu da minha vida. Todos os dias pareciam iguais. Ela passou

– 233 –
Literatura Hispano-Americana

um ano em coma e cuidei dela em casa. Um mês depois, a minha


mãe devolveu-me 180 cartas que eu lhe escrevera ao longo desse ano,
e comecei a escrever. Foi muito duro, mas também curativo, porque
pude depositar naquelas páginas tudo o que acontecera e isso permi-
tiu-me voltar a ver em meu redor. Os meus netos estavam a nascer.
Eu tinha um marido que me amava. Havia vida por todo o lado.
Parece muito confortável ao tornar pública a sua vida privada.
Quando escrevi “Paula”, a minha mãe disse, “Escreveste tanto
sobre a tua vida íntima, estás tão vulnerável”. Respondi-lhe, “Mãe,
não fico vulnerável pelas verdades que conto, mas pelos segredos
que escondo”. A minha vida não é diferente da de ninguém. Não
fiz nada tão horrível que não possa ser dito e, quando partilho, os
outros partilham comigo. É uma troca de histórias e de emoções.
Fonte: Harvard Business Review (2016a).
Continue lendo: <https://www.dinheirovivo.pt/entrev-
istas/entrevista-a-isabel-allende-2-a-parte>.
Figura 8.1 – Isabel Allende

Fonte: CC BY 2.0/Paal Leveraas.

– 234 –
Tendências contemporâneas

Isabel Allende publicou seu primeiro romance aos 40 anos de idade.


Antes disso, trabalhou como jornalista, apresentadora de programas de
televisão, professora e administradora de uma escola. É atualmente uma
grande ativista social e uma das feministas mais inspiradoras da América
Latina. Sua vida é repleta de acontecimentos, como o golpe militar chi-
leno, encabeçado por Augusto Pinochet, em 1973, motivo pelo qual se
mudou com a família para Caracas; a morte da filha Paula; várias viagens
marcantes, entre elas quando foi à Índia e decidiu abrir a Fundação Isabel
Allende para proteger as mulheres da fome, das doenças e da violência;
sem contar que passou por várias separações e por muitos recomeços.
Sua história é interessante: tornou-se escritora ao receber um telefo-
nema sobre o estado de saúde de seu avô. Como não conseguiu regressar
ao Chile para se despedir dele no leito de morte porque estava exilada na
Venezuela, teve a ideia de escrever uma carta, o que acabou se tornando
um livro de grande sucesso. Superstição ou disciplina, a partir desse fenô-
meno começou a escrever livros na mesma data em que havia começado
La casa de los espíritus: 8 de janeiro.

Não julgo que tenha feito uma escolha. Não disse, “Vou ser escri-
tora”. Aconteceu. Eu vivia na Venezuela como refugiada política,
depois do golpe militar no Chile, e não consegui arranjar trabalho
com jornalista. Trabalhava numa escola e sentia que tinha tantas
histórias dentro de mim, mas não tinha uma válvula de escape para
elas. Então, a 8 de janeiro de 1981, recebemos um telefonema a
dizer que o meu avô, no Chile, estava a morrer, e eu não podia
regressar para me despedir. Comecei a escrever uma carta para lhe
dizer que me lembrava de tudo o que me tinha contado. O meu
avô era um grande contador de histórias. Ele morreu – não chegou
a receber a carta – mas eu continuei a escrever na cozinha todas as
noites, depois do trabalho. Um ano mais tarde, tinha 500 páginas
de algo que não era, obviamente, uma carta. Tornou-se “A Casa dos
Espíritos”. O livro foi publicado e teve muito êxito, pavimentando
o caminho para os meus outros livros, mas não me despedi logo do
meu emprego, porque aquilo não me parecia um percurso profis-
sional. Parecia-me antes um milagre que acontecera por acaso.
Fonte: Harvard Business Review (2016b).

– 235 –
Literatura Hispano-Americana

Obras de Isabel Allende

Novela
22 La casa de los espíritus (1982)
22 De amor y de sombra (1984)
22 Eva Luna (1987)
22 El plan infinito (1991)
22 Hija de la fortuna (1998)
22 Retrato en sepia (2000)
22 La ciudad de las bestias (2002)
22 El reino del dragón de oro (2003)
22 El bosque de los pigmeos (2004)
22 El Zorro: Comienza la leyenda (2005)
22 Inés del alma mía (2006)
22 La isla bajo el mar (2009)
22 El cuaderno de Maya (2011)
22 El juego de Ripper (2014)

22 El amante japonés (2015)

22 Más allá del invierno (2017)

Relatos
22 La gorda de porcelana (1984)

22 Cuentos de Eva Luna (1990)

Autobiográficos
22 Paula (1994)
22 Afrodita (1997)
22 Mi país inventado (2003)

22 La suma de los días (2007)

– 236 –
Tendências contemporâneas

Teatro
22 El embajador (1971)
22 La balada del medio pelo (1973)

22 La casa de los siete espejos (1975)

Fonte: Isabel… [c2018?].

Figura 8.2 – Livros

Fonte: Shutterstock.com/Sensay.

Na obra La casa de los espíritus, Isabel Allende se preocupou em dar


seu testemunho diante da repressão no Chile, recriando momentos que se
tornaram marcantes na história do país desde o fim do século XIX até o
assassinato do tio, Salvador Allende, e a instauração da ditadura de Pino-
chet. Ao mesmo tempo, é uma crônica familiar com memórias da infância
que habitaram a antiga casa de seus avós.
São três protagonistas, três gerações de mulheres: Clara, a filha
Blanca e a neta Alba. Na história, Clara teve muitos encontros com as
feministas do mundo. Vejamos sua impressão a respeito desses momentos:

[…]

Às vezes Clara acompanhava sua mãe e duas ou três de suas


amigas sufragistas em visitas a fábricas, onde subiam em caixo-

– 237 –
Literatura Hispano-Americana

tes para arengar às operárias, enquanto, a distância prudente,


os capatazes e patrões observavam, zombeteiros e agressivos.
Apesar de sua pouca idade e completa ignorância das coisas do
mundo, Clara percebia o absurdo da situação e descrevia em
seus cadernos o contraste entre sua mãe e suas amigas, com casa-
cos de pele e botas de camurça, falando de opressão, igualdade
e direitos a um grupo triste e resignado de trabalhadoras, com
toscos aventais de algodão cru e as mãos vermelhas de frieira.
Da fábrica, as sufragistas se dirigiam a confeitaria da Praça das
Armas para tomar chá com bolinhos e comentar os progressos
da campanha, sem que essa distração frívola as afastasse nem
um segundo de seus inflamados ideais. Outras vezes sua mãe
levava-a às comunidades marginais e aos cortiços, aonde chega-
vam com o carro carregado de alimentos e roupa que Nívea e as
amigas costuravam para os pobres. Também nessas ocasiões, a
menina escrevia com assombrosa intuição que as obras de cari-
dade não eram capazes de mitigar essa monumental injustiça.

[…]

Fonte: Allende (2005, p. 91).

Figura 8.3 – La casa de los espíritus, de Isabel Allende


Fonte: Editorial Sudamericana.

– 238 –
Tendências contemporâneas

Dessa forma, por meio da tomada de consciência das mulheres da


narrativa, há a denúncia das potencialidades reprimidas e da passividade
do sexo feminino. Expressa a condição da mulher e a percepção sobre as
transformações de seu papel subordinado em uma sociedade masculina,
patriarcal. Enfim, La casa de los espíritus é um livro completo, que aborda
a história política do Chile, a saga da família Trueba e a representação da
mulher por meio da progressiva emancipação feminina desde 1905 até o
fim dos anos 1970.

8.3 Laura Esquivel


Figura 8.4 – Laura Esquivel

Fonte: CC BY 3.0.

Laura Esquivel (1950-) nasceu na Cidade do México, é escritora e


deputada mexicana, mas foi professora de uma escola para crianças e se
especializou em teatro infantil. É conhecida internacionalmente pelo livro
Como agua para chocolate, publicado em 1989 e traduzido para mais
de 35 idiomas. A história foi levada ao cinema, em 1992, por seu marido
Alfonso Arau.
Tanto o livro como o filme foram bem recebidos em vários países.
Muitos estudiosos classificam sua obra com as características do realismo

– 239 –
Literatura Hispano-Americana

mágico. Como agua para chocolate é “una historia de amor desde los
fogones de una cocina conquistó al público y a la crítica, que habló, no ya
de realismo mágico al modo de los Cien años de soledad de García Már-
quez, sino de la magia de la literatura o la literatura mágica al referirse a
esta obra.” (LAURA…, c2018).

Obras
22 Mi negro pasado (2017)
22 El diario de Tita (2016)
22 A Lupita le gustaba planchar (2014)
22 Escribiendo la nueva historia (2013)
22 Malinche (2006)
22 Tan veloz como el deseo (2001)
22 El libro de las emociones (2000)
22 Estrellita marinera (1999)
22 Íntimas suculencias (1998)
22 La ley del amor (1995)

22 Como agua para chocolate (1989)

Fonte: Laura… (c2018).

Figura 8.5 – Livros


Shutterstock.com/Roman
Motizov.
Fonte:

– 240 –
Tendências contemporâneas

Na narrativa Como agua para chocolate, observamos a importância


da gastronomia. Em função dos sentimentos da protagonista, há uma forte
conexão entre o ato de cozinhar e suas lembranças. Os 12 capítulos são
intitulados com os meses do ano e receitas que podem ser culinárias ou
não, pois em uma delas se ensina a preparar fósforos. Como exemplo,
vamos apreciar um fragmento do primeiro capítulo:

Tortas de Navidad

I. Enero

INGREDIENTES:

1 lata de sardinas

½ chorizo

1 cebolla

orégano

1 lata de chiles serranos

10 teleras

Manera de hacerse:

La cebolla tiene que estar finamente picada. Les sugiero ponerse


un pequeño trozo de cebolla en la mollera con el fin de evitar el
molesto lagrimeo que se produce cuando uno la está cortando.
Lo malo de llorar cuando uno pica cebolla no es el simple hecho
de llorar, sino que a veces uno empieza, como quien dice, se
pica, y ya no puede parar. No sé si a ustedes les ha pasado pero
a mí la mera verdad sí. Infinidad de veces. Mamá decía que
era porque yo soy igual de sensible a la cebolla que Tita, mi tía
abuela.

Dicen que Tita era tan sensible que desde que estaba en el vien-
tre de mi bisabuela lloraba y lloraba cuando ésta picaba cebolla;

– 241 –
Literatura Hispano-Americana

su llanto era tan fuerte que Nacha, la cocinera de la casa, que


era medio sorda, lo escuchaba sin esforzarse. Un día los sollo-
zos fueron tan fuertes que provocaron que el parto se adelan-
tara. Y sin que mi bisabuela pudiera decir ni pío, Tita arribó a
este mundo prematuramente, sobre la mesa de la cocina, entre
los olores de una sopa de fideos que estaba cocinando, los del
tomillo, el laurel, el cilantro, el de la leche hervida, el de los
ajos y, por supuesto, el de la cebolla. Como se imaginarán, la
consabida nalgada no fue necesaria, pues Tita nació llorando
de antemano, tal vez porque ella sabía que su oráculo determi-
naba que en esta vida le estaba negado el matrimonio. Contaba
Nacha que Tita fue literalmente empujada a este mundo por un
torrente impresionante de lágrimas que se desbordaron sobre la
mesa y el piso de la cocina.

En la tarde, ya cuando el susto había pasado y el agua, gracias


al efecto de los rayos del sol, se había evaporado, Nacha barrió
el residuo de las lágrimas que había quedado sobre la loseta
roja que cubría el piso: Con esta sal rellenó un costal de cinco
kilos que utilizaron para cocinar bastante tiempo. Este inusitado
nacimiento determinó el hecho de que Tita sintiera un inmenso
amor por la cocina y que la mayor parte de su vida la pasara
en ella, prácticamente desde que nació, pues cuando contaba
con dos días de edad, su padre, o sea mi bisabuelo, murió de
un infarto. A Mamá Elena, de la impresión, se le fue la leche.
Como en esos tiempos no había leche en polvo ni nada que se
le pareciera, y no pudieron conseguir nodriza por ningún lado,
se vieron en un verdadero lío para calmar el hambre de la niña.
Nacha, que se las sabía de todas todas respecto a la cocina – y
muchas otras cosas que ahora no vienen al caso – se ofreció a
hacerse cargo de la alimentación de Tita.

[…]

Fonte: Esquivel (1989, p. 5).

– 242 –
Tendências contemporâneas

Figura 8.6 – Como agua para chocolate, de Laura Esquivel

Fonte: Editorial Salvat.

Cozinhar e alimentar servem como uma metáfora para os sentimen-


tos da personagem Tita e também como um elo entre os amantes. Isto é,
cozinhar não é apenas cozinhar, é o modo de expressar emoções, e todas
as pessoas que experimentam sua comida sentem a mesma coisa que a
protagonista – de tristeza até paixão. Apesar de seu amor por Pedro, Tita
está condenada a ficar solteira porque há uma tradição da família que exige
que a filha mais nova cuide da mãe até a morte. Trata-se de uma verdadeira
“novela mexicana” com veia dramática e problemas complexos.

– 243 –
Literatura Hispano-Americana

Laura Esquivel transforma Como agua para chocolate em trilogia


CIDADE DO MÉXICO – Mais de 25 anos depois da publicação
de “Como água para chocolate”, Laura Esquivel decidiu transfor-
mar o romance em uma trilogia. A escritora mexicana anunciou
que o segundo livro será “O diário de Tita”, uma série de capítulos
desconhecidos da vida de Tita de la Garza, jovem de mão cheia
na cozinha a quem a mãe obriga a permanecer solteira para tomar
conta dela e que acaba vivendo um caso secreto com o cunhado.
Fonte: AP (2016).
Continue a leitura: <https://oglobo.globo.com/
cultura/livros/laura-esquivel-transforma-como-
-agua-para-chocolate-em-trilogia-19336553>.

A obra Como agua para chocolate inicia com o nascimento de Tita


de la Garza e acompanha sua vida durante a Revolução Zapatista, no
México, nas primeiras décadas do século XX. O livro menciona especi-
ficamente os exércitos de Pancho Villa, já que a ação acontece no norte.
Vale a pena mencionarmos o significado do título: “como água para cho-
colate” (bebida preparada com água e cacau) é uma expressão idiomá-
tica que quer dizer “em ponto de ebulição”. Assim, com a leitura do
livro, observamos que a paixão de Tita por Pedro a deixava “como água
para chocolate”.

8.4 Manuel Puig


Manuel Puig (1932-1990) nasceu em General Villegas, município da
província de Buenos Aires, foi escritor e também se dedicou ao cinema.
Sua narrativa é caracterizada por uma linguagem coloquial de fácil enten-
dimento, com a utilização da polifonia literária e do monólogo interior.
Essa habilidade para reproduzir a fala cotidiana é o resultado de uma
observação minuciosa do comportamento humano com forte tom melo-
dramático: “Había escrito Puig que la muerte es lo peor porque provoca
que la gente te olvide, en su caso, hubo un período de silenciamiento en
torno a su obra.” (NEHUÉN, 2017).

– 244 –
Tendências contemporâneas

Seu trabalho foi reconhecido quando Figura 8.7 – Manuel Puig


escreveu o segundo romance, intitulado
Boquitas pintadas, em 1969, em formato
de folhetim com 16 partes. Teve milha-
res de exemplares vendidos e inúmeras
traduções, sendo adaptado para o cinema
em 1974 por Leopoldo Torre Nilsson. No
entanto, a história causou uma impres-
são negativa no general Villegas, uma
vez que se tratava de uma forte crítica à
classe média da Argentina. A publicação
foi vista como uma interferência na vida
privada de alguns cidadãos, pois as situ-
ações narradas poderiam ser facilmente
identificadas pelas pessoas em Villega.

Fonte: CC BY 3.0.
O romance The Buenos Aires Affair
(1973) foi censurado pelo governo. Além
da proibição oficial, Manuel Puig recebeu
ameaças, por telefone, do grupo de vigi-
lantes conhecido como Triple. Por esse
fato, foi forçado a se mudar para o México e deixar definitivamente a
Argentina. A obra acontece em Buenos Aires, nos anos 1970, e narra even-
tos políticos obscuros do país. Enquadra-se no gênero policial, em uma
linguagem cinematográfica na qual cita diálogos tirados de clássicos de
Hollywood e usa marcações de ambientes como se estivesse elaborando
um script. Dessa forma, mantém atual o desconforto ao tratar de temas
como sexo, violência e política.

Obras de Manuel Puig


Novela
22 La traición de Rita Hayworth (1968)
22 Boquitas pintadas (1969)
22 The Buenos Aires affair (1973)

– 245 –
Literatura Hispano-Americana

22 El beso de la mujer araña (1976)


22 Pubis angelical (1979)
22 Maldición eterna a quien lea estas páginas (1980)
22 Sangre de amor correspondido (1982)
22 Cae la noche tropical (1988)

22 Humedad relativa 95% (inconclusa) (1965-1966)

Teatro
22 Bajo un manto de estrellas (1983)
22 El beso de la mujer araña (1983, versión teatralizada)
22 La cara de villano (1985)

22 Recuerdos de Tijuana (1985)

Fonte: Manuel… (2013).

Figura 8.8 – Livros de Manuel Puig

Fonte: Booket/Planeta de Libros.

Puig residiu em vários lugares (Roma, Nova Iorque, Londres, Esto-


colmo, algumas cidades do México, Rio de Janeiro) porque na Argentina

– 246 –
Tendências contemporâneas

se sentia pouco valorizado como escritor e excluído por ser homossexual.


Segundo López (c2017), “aunque desde la pubertad se asumió como
homosexual, escribió y militó respecto a este tema, llegando a declarar
que algo tan banal como la sexualidad no puede definir la identidad de una
persona.”. Foi fundador da Frente de Liberación Homosexual, em 1971,
com o sociólogo e historiador Juan José Sebreli, o advogado e escritor
Blas Matamoro e o poeta Néstor Perlongher:
Puig fue uno de los fundadores del Frente de Liberación Homo-
sexual, heredero del Grupo Nuestro Mundo, que luchaba por la
liberación homosexual y se encontraba formado por personas gais
que compartían una mirada revolucionaria y de izquierdas e inten-
taban conseguir cambios de diversa índole en la sociedad de aquel
momento. (SOLO LITERATURA, 2017, s/p)

O romance El beso de la mujer araña, publicado em 1976, foi incluído


na lista dos cem melhores romances de língua espanhola do século XX pelo
jornal El mundo. Essa história também foi censurada pela ditadura militar
argentina, mas foi adaptada para o cinema brasileiro, em 1985, pelo diretor
Héctor Babenco. Em 1981, Manuel Puig se mudou para o Rio de Janeiro para
que a narrativa se transformasse em filme e foi por meio da repercussão d’O
beijo da mulher aranha que o escritor alcançou a notoriedade mundial. Sonia
Braga, Raul Julia e Willian Hurt fizeram parte do elenco. O livro também foi
adaptado para o teatro e se tornou uma comédia musical na Broadway.

Resenha do filme O beijo da Mulher Aranha, de Hector Babenco


Do interior da cela, em O Beijo da Mulher Aranha, nasce o
relacionamento entre dois homens: o homossexual alienado
Luis Molina (William Hurt) e o bruto politicamente enga-
jado Valentin (Raul Julia). O que se põe ao centro é a liga-
ção, o entendimento, a convivência difícil de imaginar.
O segundo deixa passar despercebido o que o primeiro, atra-
ído e apaixonado, enxerga com facilidade: eles completam-
-se com suas diferenças, no pouco espaço da cela.
Valentin é um jornalista revolucionário preso pelos ditadores no
Brasil dos anos 80. Eram, na vida real, os dias finais do regime.
Na obra, a repressão segue a todo vapor – como indica o olhar
do jornalista, pela pequena abertura no alto da parede, enquanto
observa a chegada de novos companheiros espancados ao presídio.

– 247 –
Literatura Hispano-Americana

Ao se voltar à cela, vê apenas Molina – igualmente as his-


tórias contadas por seu novo amigo, sobre antigos fil-
mes repletos de estilo, propositalmente falsos e exagerados
segundo o olhar do imaginativo e delicado homossexual.
O Beijo da Mulher Aranha começa com um movimento de câmera
que atravessa a cela, por paredes, sombras, fotos de velhas atrizes
e de um mundo regado às celebridades que contrapõem o espaço
bruto e palpável, uma masmorra aos ainda vivos como Valentin.
A obra, com exceção das movimentadas sequências finais nas ruas
de São Paulo, não tem realismo. Prefere um universo à parte,
como se as personagens – apesar do olhar de Valentin – sempre
embarcassem em sonhos, na necessidade de não estar onde estão.
Não para por aí: Babenco ou leva ao inferno do irrealismo, nos
confins escuros de uma cela na qual até o sexo é ocultado, ou
prefere os sonhos à base da fotografia em tons mofados, em
um tempo de guerra – a ocupação alemã na França durante a
Segunda Guerra Mundial – no qual o amor vence a politicagem.
[…]
Fonte: O BEIJO… ([c2018?]).
Continue a leitura: <https://palavrasdecinema.com/2016/07/17/o-
-beijo-da-mulher-aranha-de-hector-babenco>.

El beso da la mujer araña conta a história de dois prisioneiros que


vivem na mesma cela na Argentina durante o terceiro governo de Juan
Domingo Perón: um político e um homossexual. Valentín Arregui é mili-
tante de uma organização revolucionária e Molina é um homossexual
acusado de corrupção de menores. Ambos vivem uma relação complexa,
alimentada pela história de fantasias e de filmes narrados por Molina, que
os fazem explorar os limites dos papéis e das convenções sociais. Vamos
observar um fragmento da narrativa, com tradução de Gloria Rodríguez,
que revela a paixão de Molina por um homem casado e heterossexual:

[…]

− E ele sabe o que você sente por ele?

− É lógico, eu falei tudo, quando tinha esperança de convencê-lo


de que entre nós dois... fosse acontecer alguma coisa. Mas nunca

– 248 –
Tendências contemporâneas

aconteceu nada. Não houve maneira de convencê-lo. Eu implorei,


nem que fosse uma única vez na vida... mas nunca quis. E depois
eu tinha vergonha de insistir, me conformei com sua amizade.

− Mas segundo você disse, ele não andava muito bem com a
mulher.

− Passaram uma temporada meio brigados, mas ele no fundo


gosta dela, e o que é ainda pior, a admira porque ganha mais
que ele. E um dia me disse uma coisa que quase morri, era o dia
dos pais, e eu queria lhe dar alguma coisa de presente […], e
perguntei se queria um pijama, e aí foi um desastre.

− Continua, não me cria suspense.

− Disse que não usava pijama, que dormia sempre nu. E dorme
em cama grande com a mulher. Aquilo foi a morte. Mas houve
um momento em que parecia que iriam se separar, e aí criei ilu-
sões! Você nem imagina…

[…]

Fonte: Puig (1981, p. 61).

Figura 8.9 – Filme O beijo da mulher aranha


Fonte: Europa Filmes.

– 249 –
Literatura Hispano-Americana

É interessante notarmos o fato de que Manuel Puig aborda a impor-


tância da cultura gay no fazer literário, assim como em sua própria vida.
Há muitos estudos de gênero acerca de sua obra e que problematizam
toda essa questão. Nesse contexto, ressaltamos o olhar de Fiorini (2016)
quando diz que Molina é a mulher dentro de um homem. No entanto,
a pessoa não nasceu mulher, mas tornou-se (para parafrasear a frase de
Simone de Beauvoir) uma Sherazade que conta filmes todas as noites para
não morrer de loucura e de abandono e uma Penélope que tece e destece
suas memórias sentimentais à espera do Ulisses que nunca chegará.

8.5 Alfredo Bryce Echenique


Alfredo Bryce Echenique (1939-) Figura 8.10 – Alfredo Bryce Echenique
nasceu em Lima (Peru) e desenvolveu
uma narrativa na qual a realidade e a fic-
ção se mesclam, uma vez que usualmente
recorre a experiências próprias para con-
figurar as histórias. Em 1957, ingressou
na Universidade de San Marcos, onde se
formou no curso de Direito; depois estu-
dou Literatura e obteve o título de dou-
tor. Morou em vários lugares e lecionou
nas universidades de Nanterre, La Sor-
bona, Vincennes, Montpellier, Yale, Aus-
tin, Puerto Rico e outras. Também deu
palestras e participou de conferências na
Argentina, na Bulgária, no Canadá, em
Cuba, na Espanha, nos Estados Unidos, Fonte: CC BY 3.0/Universidad
na França, na Itália, no México, no Peru Internacional de Andalucía.
e na Suécia.
Sua obra foi traduzida para diversos idiomas. Publicou contos,
romances, ensaios e recebeu muitos prêmios, como o Prêmio Casa de las
Américas, em 1968, por Huerto cerrrado; o Prêmio Nacional de Litera-
tura, em 1972, por Un mundo para Julius; o Prêmio Nacional de Narra-
tiva de España, em 1988, por Reo de nocturnidad; o Prêmio Planeta, em

– 250 –
Tendências contemporâneas

2002, por El huerto de mi amada; o Prêmio FIL de Literatura en Lenguas


Romances, em 2002; entre outros.

Obras de Alfredo Br yce Echenique

Novelas
22 Un mundo para Julius (1970)
22 Tantas Veces Pedro (1977)
22 La vida exagerada de Martín Romaña (1981)
22 El hombre que hablaba de Octavia de Cádiz (1985)
22 La última mudanza de Felipe Carrillo (1988)
22 Dos señoras conversan (1990)
22 No me esperen en abril (1995)
22 Reo de nocturnidad (1997)
22 La amigdalitis de Tarzán (1999)
22 El huerto de mi amada (2002)
22 Las obras infames de Pancho Marambio (2007)
22 Dándole pena a la tristeza (2012)

Cuentos
22 Huerto cerrado (1968)
22 La felicidad ja já (1974)
22 Todos los cuentos, Mosca Azul, Lima (1979)
22 Magdalena peruana y otros cuentos (1986)
22 Goig (1987)
22 Cuentos completos (1995)
22 Guía triste de París (1999)

22 La esposa del rey de las curvas (2009)

Autobiográficos
22 A vuelo de buen cubero (1977)

– 251 –
Literatura Hispano-Americana

22 Crónicas personales (1987)


22 Permiso para vivir (Antimemorias I) (1993)
22 Doce cartas a dos amigos (2003)

22 Permiso para sentir (Antimemorias II) (2005)

Artículos y ensayos
22 A trancas y barrancas (1996)
22 La historia personal de mis libros (2000)
22 Crónicas perdidas (2002)
22 Entrevistas escogidas (2004)
22 Entre la soledad y el amor (2005)

22 Fonte: Alfredo… ([c2018?]).

Figura 8.11 – Livro

Fonte: Shutterstock.com/robert_s.

– 252 –
Tendências contemporâneas

Seu primeiro romance foi publicado em 1970, intitulado Un mundo


para Julius, que alcançou um grande sucesso. De inspiração biográfica,
há um retrato irônico da oligarquia de Lima, enfatizando temas como o
luxo, a hipocrisia, o racismo, a divisão das classes sociais, entre outros
aspectos. O protagonista Julius é um menino sensível, triste, melancólico
e que cresce tentando encontrar seu lugar no mundo.
Há a descrição de sua infância por meio do contato com pessoas
superficiais e vazias, como as impressões registradas em relação à mãe,
uma peruana de origem inglesa educada na Inglaterra, incapaz de sentir
ou manter qualquer relação afetiva: “Por otra parte, Julius crecerá rodeado
de otro mundo bien distinto: la sección servidumbre ejerció siempre una
extraña fascinación sobre Julius, la fascinación de no lo toques, amor; por
ahí no se va, darling.” (UN MUNDO..., c2018).
Figura 8.12 – Un mundo para Julius, de Alfredo Bryce Echenique

Fonte: Booket/Planeta de Libros.

– 253 –
Literatura Hispano-Americana

A obra La vida exagerada de Martín Romaña, publicada em 1981, é


o terceiro romance de Echenique e ganhou grande destaque pelo público
e pela crítica. O protagonista, Martín Romaña, narra em primeira pessoa
seus amores e suas experiências durante uma viagem a Paris. Tem o pro-
pósito de se tornar escritor, no entanto várias situações absurdas e exage-
radas provocam risos no leitor. Para Molina (c2018), “no hay un solo capí-
tulo en el que Bryce Echenique no nos arranque una sonrisa, cuando no
una carcajada, llegando a reírse de todo, incluso de las cosas más serias, y
empleando para ello un humor fino y sutil”.
Figura 8.13 – La vida exagerada de Martín Romaña, de Alfredo Bryce Echenique

Fonte: Editorial Anagrama.

Como pudemos constatar, a obra de Alfredo Bryce Echenique é


vasta, rica e instigante. Apesar de todo o reconhecimento literário, torna-
-se importante mencionarmos o fato de que o autor se envolveu em escân-

– 254 –
Tendências contemporâneas

dalos relacionados a plágios de artigos de jornal. Foi condenado a pagar


uma multa de mais de 50 mil dólares pelo plágio de 16 textos pertencentes
a 15 autores. Até hoje Bryce nega e tenta provar sua inocência, alegando
que os artigos foram publicados em seu nome sem sua autorização.

8.6 Ricardo Piglia


Figura 8.14 – Ricardo Piglia

Fonte: CC BY 3.0/Guilhermo Ramos.

Ricardo Piglia (1941-2017) foi um dos mais importantes escritores


argentinos e lecionou Literatura na Argentina e na Universidade de Prince-
ton, nos Estados Unidos. Sua obra foi traduzida para mais de 15 idiomas e
ganhou diversos prêmios literários, como o Iberoamericano de Letras José
Donoso (2005); o Prêmio Rómulo Gallegos (2011); e o Prêmio Casa de las

– 255 –
Literatura Hispano-Americana

Américas (2012). Publicou textos de ficção, de não ficção e escreveu rotei-


ros para o cinema – fez também uma parceria com Hector Babenco. Sua
narrativa é considerada pelos críticos literários como metaficção, devido
às inovações ligadas à própria trama dos romances.
Seu primeiro livro, La invasión (1967), levou seis anos para ser con-
cluído e o projetou na literatura nacional e internacional. Em 1980, publicou
Respiración artificial, considerado pela crítica como um dos dez romances
mais importantes. Escreveu também La ciudade ausente (1992), na qual
retrata uma Buenos Aires tragicamente transformada e desfigurada, e Plata
quemada (1997), que conta uma história real de um assalto a banco que,
além de ser uma obra premiada, virou filme dirigido por Marcelo Piñero.

Obras de Ricardo Piglia

Novela
22 Respiración artificial (1980)
22 La ciudad ausente (1992)
22 Plata quemada (1997)
22 Blanco nocturno (2010)

22 El camino de Ida (2013)

Relato
22 La invasión (1967)
22 Jaulario (1967)
22 Nombre falso (1975)
22 Prisión perpetua (1988)
22 Cuentos morales (1995)
22 El pianista (2003)

Ensayo
22 Crítica y ficción (1986)

– 256 –
Tendências contemporâneas

22 Formas breves (1999)


22 Diccionario de la novela de Macedonio Fernández (2000)
22 El último lector (2005)
22 Teoría del complot (2007)
22 Antología personal (2014)
22 La forma inicial (2015)
22 Las tres vanguardias (2016)
22 Los diarios de Emilio Renzi (2015-2017)

Fonte: Ricardo… (2017).

Figura 8.15 – Livro

Fonte: Shutterstock.com/Matt Gibson.

A obra Plata quemada obteve grande sucesso e foi lançada no Brasil


em 1998. Baseia-se em uma história real ocorrida entre 27 de setembro de
1965 e 6 de novembro de 1965, quando a quadrilha formada por Malito,
Gaucho Dorda, Cuervo Mereles e Nene Brignone assalta um banco em
San Fernando, província de Buenos Aires, e foge para Montevidéu, de
onde pretende chegar ao Brasil. Os assaltantes não conseguem fugir da
polícia mesmo estando envolvidos com políticos e policiais.
Essa história central é permeada pelo entrecruzamento de outros
relatos, como o uso de drogas pesadas, a passagem por prisões e mani-

– 257 –
Literatura Hispano-Americana

cômios, a relação homossexual entre dois personagens etc. Vejamos um


fragmento, com tradução de Rosa Freire d’Aguiar, que se tornou um ver-
dadeiro escândalo – a queima do dinheiro roubado:

[…]

Depois, a certa altura se soube que os delinquentes estavam quei-


mando cinco milhões de pesos que lhes restavam do assalto à Prefei-
tura de San Fernando, de onde, como é sabido, levaram sete milhões.
Começaram a jogar notas de mil em chamas pela janela. Do pos-
tigo da cozinha conseguiram que o dinheiro queimado voasse
para a quina da parede. Pareciam vagalumes, as notas queimando.

Um murmúrio de indignação fez a multidão rugir.

− Estão queimando.

− Estão queimando o dinheiro.

Se o dinheiro é a única coisa que justificava as mortes e se fizeram


o que fizeram por dinheiro e agora o queimam, isso quer dizer
que eles não têm moral, nem motivações, que agem e matam
gratuitamente, pelo gosto do mal, por pura maldade, são crimi-
nosos natos, criminosos insensíveis, desumanos. Indignados, os
cidadãos que observavam a cena davam gritos de horror e ódio,
como num conciliábulo de bruxos da Idade Média (segundo os
jornais), não podiam suportar que diante de seus olhos se quei-
massem cerca de quinhentos mil dólares numa operação que
paralisou de horror a cidade e o País e que durou exatamente
quinze intermináveis minutos, que é o tempo que se leva para se
queimar essa quantia astronômica de dinheiro, essas notas que
por motivos alheios à vontade das autoridades foram destruí-
das sobre uma placa que no Uruguai se chama “patona” e que
é usada para remover a brasa nas grelhas das churrasqueiras.
Numa folha de lata “patona” foram queimando o dinheiro e os
policiais ficaram imóveis, estupefatos, porque o que se podia
fazer com criminosos capazes de tamanho despropósito. As

– 258 –
Tendências contemporâneas

pessoas indignadas se lembraram na mesma hora dos caren-


tes, dos pobres, dos habitantes do campo uruguaio que vivem
em condições precárias e das crianças órfãs para quem aquele
dinheiro teria garantido um futuro. Salvando uma só criança
órfã eles teriam justificado suas vidas, estes cretinos, disse uma
senhora, mas são ruins, têm má índole, são uns animais, disse-
ram aos jornalistas as testemunhas, e a televisão filmou e depois
repetiu durante o dia todo a transmissão daquele ritual, que o
jornalista da TV Jorge Foister chamou de ato de canibalismo.

[…]

Fonte: Piglia (1998, p. 147).

Figura 8.16 – Plata quemada, de Ricardo Piglia

Fonte: Companhia das Letras.

– 259 –
Literatura Hispano-Americana

É possível notarmos que o título da obra faz referência a um dos


momentos cruciais da história. Encurralados em um apartamento em
Montevidéu, três assaltantes (o quarto conseguiu fugir sem deixar rastro)
sem perspectivas ou esperanças decidem participar de um tiroteio cerrado
com a polícia, uma vez que a rendição é pior que a morte. Percebe-se que
o dinheiro – 5 milhões de pesos – é o agente causador de todas as mortes e
o fato de queimarem as cédulas e jogarem o papel em chamas pela janela
mostra o rompimento definitivo entre a loucura e a sanidade.

Da teoria para a prática


O romance El beso da la mujer Figura 8.17 – Filme O beijo da mulher aranha
araña (1976), do escritor argentino
Manuel Puig, tornou-se peça de tea-
tro e deu origem ao filme O beijo
da mulher aranha, com direção de
Hector Babenco, em 1985. O enredo
se sustenta basicamente no diálogo
entre dois prisioneiros em uma cela
na Argentina. Os personagens são
Molina, um homossexual preso por
manter relações com menores, e
Valentín Arregui, torturado e con-
denado por atividades em um grupo
revolucionário.
Diante desse contexto, sugeri-
mos a leitura do livro e a apreciação
do filme. Após o conhecimento do
enredo, instigar a seguinte reflexão:
a partir dos delírios cinematográficos Fonte: Europa Filmes.
de Molina e do sofrimento físico de Valentín, aos poucos ocorre a aproxi-
mação dos personagens. E, dentro desse processo de transferência e iden-
tificação, as diferenças vão sendo eliminadas, assim como o preconceito e
o medo recíproco, para dar lugar à solidariedade, ao respeito, à dignidade
e à amizade.

– 260 –
Tendências contemporâneas

Síntese
Neste capítulo, apresentamos brevemente alguns autores e algumas
obras para entendermos as tendências contemporâneas: Isabel Allende
com a obra La casa de los espíritus (1982); Laura Esquivel, Como agua
para chocolate (1989); Manuel Puig, com Boquitas pintadas (1969) e
El beso de la mujer araña (1976); Alfredo Bryce Echenique, com Un
mundo para Julius (1970), La vida exagerada de Martín Romaña (1981);
e Ricardo Piglia, com Plata quemada (1997).
Muitas obras e escritores emergiram depois do fenômeno chamado
boom hispano-americano e seria impos-
sível fazermos uma abordagem completa Figura 8.18 – Más allá del invierno,
e esmiuçada. Nossa recomendação é que de Isabel Allende
você busque, pesquise, leia e aprecie toda a
riqueza e o encanto que essa literatura pro-
cura proporcionar a seus leitores.

Atividades
1. A escritora chilena Isabel Allende
publicou em 2017 a obra Más allá
del invierno, com o título baseado
em uma frase de Albert Camus
que diz “en medio del invierno
aprendi por fin que había en mí
un verano invencible”. Depois
da leitura completa da obra,
escreva suas impressões a partir
da seguinte indagação: como o
verão prevalece durante o inverno Fonte: Vintage Español.
de nossas vidas?
2. Laura Esquivel, autora do livro Como agua para chocolate,
utilizou essa expressão popular para intitular seu trabalho
publicado em 1989. Leia a obra e escreva o porquê da escolha
desse título.

– 261 –
Literatura Hispano-Americana

3. “Mi literatura nace de un empacho de asombro. El escritor es


un ser sorprendido.” é uma frase do escritor Alfredo Bryce
Echenique em uma entrevista para Maria Luisa Páramo, em
Madri e disponível on-line (<https://webs.ucm.es/info/especulo/
numero2/bryce.htm>). Faça a leitura completa e registre suas
impressões, argumentando sobre a arte do fazer literário.
4. O escritor peruano Alfredo Bryce Echenique produziu muitos
livros interessantes ao longo de sua carreira. Leia um fragmento
da resenha de Permiso para vivir, de Alfredo Bryce Echenique,
disponível no site Poema del alma:
En esta obra, Bryce Echenique deja al descubierto su perfil más
sensible, autocrítico y reflexivo, aunque también se permite hacer
uso del humor y apelar al romanticismo. Permiso para vivir es un
material de gran riqueza narrativa cuya trama le brinda al lector
la posibilidad de acercarse, aunque sólo sea desde las páginas de
este libro, al mundo interior de un afamado escritor que, a fuerza
de talento, ha logrado trascender a escala internacional. Si la idea
les resulta interesante y sienten curiosidad por saber cómo ha que-
rido retratarse Alfredo Bryce Echenique, no dejen de leer ni este
atractivo trabajo literario ni Permiso para sentir, la obra que da
continuidad a sus memorias. (PORTO, 2010, s/p).

A partir dessa afirmação, notamos que o título da obra, Permiso


para vivir, expressa a necessidade de existir uma autorização
para desfrutar a vida. Faça a leitura completa da obra e registre
sua impressão sobre esse curioso título.

– 262 –
Gabarito
Literatura Hispano-Americana

1. Introdução e Conceitos Básicos Sobre


a Literatura Hispano-Americana
1. O adjetivo hispano-americano faz referência aos países ameri-
canos nos quais se fala espanhol e às pessoas originárias desses
países. Por exemplo, o Peru é um país hispano-americano, mas
não o Brasil, cuja língua oficial é o português.
O adjetivo latino-americano faz referência aos países ameri-
canos nos quais se fala uma língua de origem latina, ou seja,
românica – espanhol, português ou francês – e às pessoas desses
países. Por exemplo, podemos usar esse termo para nos referir
ao Brasil.
2. Resposta pessoal. No entanto, é importante enfatizar a riqueza
de obras e de autores presentes na literatura hispano-americana.
Do ponto de vista cultural, podemos perceber que está repleta de
experiências, de culturas múltiplas e de diferentes visões de vida
que foram lidas, pensadas e reiteradas por artistas e intelectuais,
em todos os lugares e momentos da história.
3. Resposta pessoal. Exemplos: Rubén Darío; José Martí; Alejo
Carpentier; Manuel Puig; Ernesto Sábato, entre outros.
4. Resposta pessoal. O romance Cinco esquinas mostra Lima, nos
anos 1990, cercada por atos de terrorismo, propina, apagões,
sequestros e assassinatos. Os personagens Luciano, Quique,
Chabela e Marisa pertencem a uma pequena elite social e eco-
nômica e, mesmo assim, sofrem com os problemas que o país
enfrenta – mas em vários trechos fica evidente que eles também
se beneficiam da corrupção do governo.

2. Das origens ao Barroco


1. Resposta pessoal. Deve ser observado o fato de que Cristóvão
Colombo descreveu os índios como pessoas inocentes, que não

– 264 –
Gabarito

conheciam o cristianismo e deveriam ser convertidas, segundo a


crença dos europeus.
2. Reposta pessoal. O filme aborda a vida repleta de aventuras
de Álvar Núñez Cabeza de Vaca. Alguns exemplos podem ser
citados: sobrevive a um naufrágio; Cabeza de Vaca e mais três
homens chegam à região da Flórida, onde são capturados e
escravizados pelos nativos; foge nu, descalço e com fome até o
México; começa a curar milhares de indígenas que passam a res-
peitá-lo como xamã; com o sucesso das curas, os indígenas lhe
fornecem abrigo, alimento e proteção; explora o território hoje
ocupado pelo México; volta à Espanha dez anos depois; publica
o livro Naufrágios; retorna à América e é nomeado governador
da província do Rio da Prata; aporta em terras brasileiras e, com
250 homens e 26 cavalos, inicia sua jornada pelo Sertão.
3. Podemos destacar algumas características presentes no frag-
mento da poesia intitulada Amor importuno, como tensão voca-
bular, dualidade de sentimentos (Y aun irracional parece/Este
rigor, pues se infiere,/Si aborrezco a quien me quiere/¿qué haré
con quien aborrezco?), jogos de antíteses (mal/bien; gustoso/
disgustado; amor/aborrecimento) etc. Sobre a importância de
Sóror Juana, vários aspectos podem ser abordados, como o fato
de ter sido a pioneira na história da literatura hispano-americana;
abrir caminho para a participação da mulher como poeta e escri-
tora; ter sonetos de amor que acompanham a delicadeza de seus
sentimentos; receber o apelido Décima musa, que demonstra a
expressão adequada para sua busca intelectual; e as metáforas
brilhantes que enaltecem sua representação literária.
4. Resposta pessoal. Neste soneto, podemos perceber que a temá-
tica abordada por Carlos de Sigüenza y Góngora, no Soneto del
triunfo parténico, é o louvor à Virgem Maria, no qual externa
toda a sua religiosidade, considerada a mais genuína manifesta-
ção da cultura barroca.

– 265 –
Literatura Hispano-Americana

3. Século XIX: do Romantismo ao Realismo


1. Reposta pessoal. Exemplos: Ricardo Palma, Cirilo Villaverde,
Vicente Riva Palacio, Gertrudis Gómez de Avellaneda, José Joa-
quín Ortiz.
2. Alternativa C.
3. No mês de julho de 1850, o jovem Martín Rivas chega à casa de
Don Dámaso, na capital do Chile, Santiago. Malvestido e sem
dinheiro, tem o objetivo de estudar para se tornar um advogado
bem-sucedido.
4. Alternativa E.

4. O século XX e o Modernismo
1. No poema Divagación, de Rubén Darío, vemos a presença do
cosmopolitismo, na opção de receber a cultura por meio de seus
ecos da França. Quando o poeta diz preferir a Grécia da França
à Grécia dos próprios gregos, por exemplo, mostra que a cultura
grega é recebida pelo olhar francês.
2. Resposta pessoal. O poema Anagke foi escrito em Valparaíso,
em 1887, e publicado pela primeira vez no diário La Época, em
Santiago do Chile. A publicação do livro Azul foi em 1888. O
poema apresenta três partes: a primeira contém 68 versos e dis-
corre sobre a felicidade da pomba; a segunda parte, com apenas
2 versos, mostra a pomba sendo devorada por um gavião; e a
terceira tem 8 versos, nos quais o bom Deus medita sobre o fato
de que, quando criou pombos, não deveria ter criado gaviões.
3. Resposta pessoal. Exemplo o poema Tristíssima nox:
Noche de soledad. Rumor confuso
hacer el viento surgir de la arboleda,
donde su red de transparente seda
grisácea araña entre las hojas puso.

– 266 –
Gabarito

Del horizonte hasta el confín difuso


la onda marina sollozando rueda
y, con su forma insólita, remeda
tritón cansado ante el cerebro iluso.

Mientras del sueño baja el firme amparo


todo yace dormido en la penumbra,
sólo mi pensamiento vela en calma,

como la llama de escondido faro


que con sus rayos fúlgidos alumbra
el vacío profundo de mi alma.
Fonte: Casal (1892).
4. Resposta pessoal. Exemplos: Ángel de Estrada; Amado Nervo;
Ricardo Jaimes Freyre; Leopoldo Lugones; Julio Herrera y
Reissig; Manuel José Othon; Luis Gonzaga Urbina; Clemente
Palma; Enrique Gómez Carrillo; Rafael Arévalo Martinez;
Pedro Prado; Guillermo Valencia; Tomás Carrasquilla; Arturo
Borja; José Enrique Rodo; Manuel Díaz Rodriguez; Eloy Fariña
Núnez, entre outros.

5. A poesia do século XX: Vanguarda


1. Resposta pessoal. Nesse movimento, os poemas adquiriram
musicalidade por meio de repetições e anáforas, paralelismos
sintáticos, sobreposições. A pontuação ou a falta dela são usa-
das para aumentar a expressividade do verso. O uso exagerado
da metáfora também é uma característica importante e que atrai
todos os sentidos.
2. Resposta pessoal. Destacar que o Criacionismo colocou o artista
como um pequeno Deus (ou semideus), no qual a arte já não
tentava imitar a natureza, mas almejava criar novos universos.
3. A redução da poesia a seu elemento primordial: o emprego da
metáfora, a eliminação de frases medianas, os nexos e os adje-

– 267 –
Literatura Hispano-Americana

tivos inúteis, assim como a abolição dos trabalhos ornamentais.


Em outras palavras, as formas tradicionais perderam o signifi-
cado, como a estrofe, a rima, o ritmo, a sintaxe, entre outras,
dando lugar à metáfora por meio de construções imagéticas.
4. Resposta pessoal. Podemos destacar no poema os seguintes
temas: a cidade destruída, o cotidiano, o aborrecimento, a
angústia, a solidão, a nostalgia do “eu” poético, a morte, a dor
e a desintegração.

6. As principais tendências da
narrativa do século XX
1. Resposta pessoal. Muitos estudiosos conferem à obra de Rivera
o uso excessivo de sentimentalismo. Escrita em prosa, La vorá-
gine tem cadência de poema. O uso da metáfora na frase “Mi
corazón es como una roca cubierta de musgo, donde nunca falta
una lágrima,” comprova a dramaticidade em uma atmosfera de
paixão e de lirismo.
2. Resposta pessoal. Destacar que Rómulo Gallegos foi um impor-
tante escritor e político venezuelano, nascido em Caracas.
3. Sugestão de resposta disponível no site Relatos y historias
en Mexico:
Sin embargo, en el cine nacional nunca se había permitido una
historia que hiciera la mínima crítica al ejército mexicano; por
ello, el 17 de octubre de 1960 la influyente asociación mili-
tar Legión de Honor solicitó al entonces Secretario de Gober-
nación, Gustavo Díaz Ordaz “revisar” de manera privada la
película La Sombra del Caudillo, pues de acuerdo a los mili-
tares denigraba “a la Revolución, presentando sólo aspectos
negativos e inmorales, pero nada de los ideales y la nobleza de
nuestro movimiento armado de 1910 a 1914”. A esta petición
se unió el entonces Secretario de la Defensa Nacional, Agustín
Olachea Avilés, quien pidió que se le hicieran las “rectificacio-

– 268 –
Gabarito

nes respectivas en virtud de que (la Legión de Honor) la consi-


dera denigrante para la Revolución Mexicana… con objeto de
que no se permita la exibición de la mencionada película en la
forma como está filmada”.
Disponível em: <http://relatosehistorias.mx/nuestras-historias/
por-que-el-film-la-sombra-del-caudillo-fue-censurado-por-el-
-ejercito-mexicano>. Acesso em: 24 fev. 2018.
4. Resposta pessoal. Sugerimos destacar que esse fragmento jus-
tifica o título da obra. Há a exposição da realidade de Benito
de Castro, que oferece sua sabedoria por ter conseguido contato
com o mundo dos brancos. O mundo é vasto para todos, menos
para os índios – os que nele se aventuram logo sucumbem.

7. A nova narrativa hispano-americana


1. Resposta pessoal. Exemplos: Juan Rulfo, Guillermo Cabrera
Infante, Juan Carlos Onetti, entre outros.
2. Sugerimos alguns sites para a pesquisa, como eBiografia
(<https://www.ebiografia.com/carlos_fuentes>); Biogra-
fias y vidas (<https://www.biografiasyvidas.com/biografia/f/
fuentes.htm>); Instituto Cervantes (<http://www.cervantes.
es/bibliotecas_documentacion_espanol/biografias/praga_car-
los_fuentes.htm>).
3. Resposta pessoal. Sugerimos a leitura do artigo intitulado “A
vez e a voz do sertanejo em A guerra do fim do mundo”, de
Marcos Vinícius Scheffel, disponível em <http://www.uel.br/
pos/letras/terraroxa/g_pdf/vol21/TRvol21k.pdf>.
4. Resposta pessoal. No artigo estão seis curiosidades sobre o
escritor que conseguiu falar sobre amor, evocando a solidão: 1.
A crença no poder duradouro do amor; 2. A reinvenção como
escritor; 3. A luta para fazer o que gostava; 4. A inspiração em
Falkner e Mark Twain; 5. A rivalidade com Mário Vargas Llosa;
6. A paixão por borboletas amarelas.

– 269 –
Literatura Hispano-Americana

8. Tendências contemporâneas
1. Resposta pessoal. Isabel Allende responde essa questão em uma
entrevista: “abriendo el corazón. El libro presenta a tres perso-
nas que están pasando por momentos de largo invierno en sus
vidas. Una chica guatemalteca que escapa de la violencia de su
país; Richard, que lleva 20 años encerrado en su propio invierno,
y Lucía, que a pesar de haber sufrido tanto, sigue abierta a corres
riesgos. Los tres se juntan en una aventura que les lleva a descu-
brir que, si abren su corazón, pueden disfrutar del alegre verano
que todos llevamos dentro.”.
(JUÀREZ, C. R. Isabel Allende: Un verano eterno con nuevo
libro y nuevo amor. American Way Magazine, c2018. Disponí-
vel em: <https://americanwaymagazine.com/es/isabel-allende>.
Acesso em: 12 mar. 2018.).
2. Como agua para chocolate é um ditado popular mexicano que
apresenta o estado em que a água deve estar para preparar o
chocolate: fervendo. Quando conhecemos a história de Tita, a
impressão que temos é a de que a protagonista tem muitas razões
para se sentir, de forma literal, como na expressão que dá o título
ao livro.
3. Resposta pessoal. É importante abordar que o fazer literário,
para Alfredo Bryce Echenique, nasce do espanto, pois é a única
maneira de responder à angústia, ao medo, ao tédio que a reali-
dade produz.
4. Resposta pessoal. O título da obra Permiso para vivir, de Alfredo
Bryce Echenique, instiga a reflexão sobre o que seria a aprova-
ção para viver a vida. Na verdade, o autor também se refere à
permissão de contar suas múltiplas peripécias a sua maneira.

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Referências
Literatura Hispano-Americana

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A obra procura traçar um breve panorama da literatura hispano-americana,
abarcando períodos e temáticas que formam a sua história, do século XVI até a
atualidade. No terreno específico da criação literária, há a presença de autores
que nos revelam as verdadeiras faces dessa produção, como Julio Cortázar,
Gabriel Garcia Márquez, Mario Vargas Llosa, Carlos Fuentes, Pablo Neruda,
Jorge Luis Borges, Isabel Allende, Manuel Puig, Ricardo Piglia, entre outros.
São abordados os temas centrais e as características mais importantes de tex-
tos significativos, proporcionando um contato mais estreito com cada escritor:
desde a preocupação com a figura do indígena, até temas mais urbanos, como
a solidão, o ciúme, a inveja, as crises existenciais e de identidade, a violência,
a morte, os conflitos intelectuais, a política e, sem dúvidas, o amor.
Dessa forma, por meio da leitura interpretativa, o leitor notará que o presente
estudo cumpre o propósito de oferecer e apresentar o melhor da prosa e da
poesia hispano-americana. E mais: abre um caminho notável para o encontro
de visões e de vozes que povoam o imaginário dos falantes da língua espanho-
la nos países da América.

ISBN 978-85-53370-30-6

9 7885 53 3 7030 6

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