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1.

Têm os tribunais judiciais competência para tramitar o processo de


inventário de ALECRIM?

Desde o dia 1 de janeiro de 2020, está em vigor a Lei nº 117/2019, de 13 de


setembro, que alterou o Código de Processo Civil na matéria de processo de inventário.
Esta Lei revogou o Regime Jurídico do Processo de Inventário, aprovado em anexo à Lei
nº 23/2013 de 5 de março (artigo 10º Lei nº 117/2019, de 13 de setembro).
Reside então a questão em saber se esta Lei se aplica a um processo (novo)
instaurado após esta data? A resposta, afirmativa, está prevista no artigo 11º da mesma
lei em que:

«Artigo 11º Aplicação no tempo

1 - O disposto na presente lei aplica-se apenas aos processos iniciados a partir da data da
sua entrada em vigor, bem como aos processos que, nessa data, estejam pendentes nos
cartórios notariais mas sejam remetidos ao tribunal nos termos do disposto nos artigos 11.º a
13.º;

2 - O regime jurídico do processo de inventário, aprovado em anexo à Lei n.º 23/2013, de 5


de março, continua a aplicar-se aos processos de inventário que, na data da entrada em vigor
da presente lei, estejam pendentes nos cartórios notariais e aí prossigam a respetiva
tramitação;»

O art. 1083º CPC dita que a competência para tramitar os processos de inventário
cabe aos «tribunais judiciais ou nos cartórios notariais» (nº 1 e 2), porém, será da
exclusiva competência dos tribunais judiciais os casos previstos no 1083º/1 CPC.
Quanto à alínea a) deste, é-nos dito que «O processo de inventário é da competência
exclusiva dos tribunais judiciais: a) Nos casos previstos nas alíneas b) e c) do n.º 2 do
artigo 2102.º do Código Civil». Por remissão deste artigo para o 2102º CC, temos
portanto que «2 - Procede-se à partilha por inventário: b) Quando o Ministério Público
entenda que o interesse do incapaz a quem a herança é deferida implica aceitação
beneficiária; c) Nos casos em que algum dos herdeiros não possa, por motivo de ausência
em parte incerta ou de incapacidade de facto permanente, intervir em partilha realizada
por acordo.». Assim, tendo em conta este artigo, será então da competência dos
tribunais judiciais a tramitação deste processo (deserdação de Geórgia por Florindo). É
de igual importância salientar que se o processo for instaurado no cartório notarial sem
a concordância de todos os interessados, o mesmo é remetido para o tribunal judicial
se tal for requerido, até ao fim do prazo de oposição, por interessado ou interessados
diretos que representem, isolada ou conjuntamente, mais de metade da herança
(1083º/3 CPC).

Quanto à competência territorial, o critério de determinação está previsto no art.


72º-A CPC, que trata da competência em rezão do território no que toca à matéria
sucessória, ou seja, « Em matéria sucessória é competente o tribunal do lugar da
abertura da sucessão.» sendo que «A sucessão abre-se no momento da morte do seu

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autor e no lugar do último domicílio dele.» (2031º CC), sendo este, o «lugar da sua
residência habitual» (82º/1 CC).

Em suma, será então competente a Comarca de Braga, mais concretamente o Juízo


Local Cível da Barcelos (será «Local Cível» e não de «Família e Menores» visto que se
trata de um processo especial).

2. Pronuncie-se quanto à legitimidade das pessoas indicadas para


requerer o inventário de ALECRIM.

A legitimidade em matéria de processo de inventário está prevista no artigo


1085º CPC. Da análise deste artigo verifica-se que é mais ampla a legitimidade para
intervir (nº2) do que para requerer (nº1).

Neste caso em concreto, por se tratar da legitimidade para requerer, devemos


atender ao nº1 deste artigo, nomeadamente a alínea a) em que «Têm legitimidade
para requerer que se proceda a inventário e para nele intervirem, como partes
principais, em todos os atos e termos do processo:
a) Os interessados diretos na partilha e o cônjuge meeiro(…)», bastando a redação
até este ponto, pois a situação prevista na restante alínea não se verifica, ou seja, só
há interessados diretos na partilha. Relativamente à alínea b) também não será
aplicável pois a herança não foi deferida a «(…) menores, maiores acompanhados ou
ausentes em parte incerta.»

No 2101º/1 CC está previsto quem pode exigir a partilha, ou seja, quem pode
requerer inventário. «Qualquer co-herdeiro ou o cônjuge meeiro tem o direito de
exigir partilha quando lhe aprouver».

Resta então saber quem é então herdeiro, neste caso:

→ B - é cônjuge, ou seja, será herdeiro independentemente do regime de bens


(exceto se houver convecção antenupcial de renuncia a herdeiro). Não é então
cônjuge meeiro, mas é herdeiro legitimário.
→ C - é descendente, sendo portanto herdeiro legitimário (2157º CC) e goza de
preferência na classe dos sucessíveis (2133º/1/a) CC).
→ D - é descendente, sendo portanto herdeiro legitimário (2157º CC) e goza de
preferência na classe dos sucessíveis (2133º/1/a) CC).
→ F - é descendente, sendo portanto herdeiro legitimário (2157º CC) e goza de
preferência na classe dos sucessíveis (2133º/1/a) CC).

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Porém, não cumpre os pressupostos da vocação sucessória (não pode aceitar a
herança nem existia à data da abertura da sucessão, é pré-falecido - 2032º CC).
Porém, F deixa 2 filhos sobrevivos (H e G). Cumpre então verificar se estão
cumpridos os requisitos para o direito de representação (serem descendentes do
herdeiro falecido, este herdeiro não pode aceitar a herança e, sendo em linha reta,
que seja a favor dos descendentes de filho do autor da sucessão- 2039º e ss e
2042º CC).

No entanto, é-nos dito que G fora deserdada por F. Porém isso não implica que
não possa suceder na herança do avô A, mas somente na herança do pai F, pois só
é incapaz em relação a este (2166º e 2043º CC).

→ G - será herdeira, tanto pelo direito de representação, como testamentária


(2030º/2 CC)
→ E - não tem legitimidade, pois não é, como cônjuge do sucessor, interessada
direta na partilha. Os bens recebidos por sucessão não integram os bens
comuns do casal (1722º/1/b) CC).
→ J - não terá legitimidade para requerer, porém pode intervir, pois trata-se de
um credor da herança (1085º/2/b) CPC).

3. Admita, por mera hipótese, que DIONÍSIO foi declarado indigno de


suceder a ALECRIM em ação judicial, e que esse facto não constava
do processo aquando da citação dos interessados. Quid iuris?

A incapacidade por indignidade está prevista nos artigos 2034º e ss CC. Os


efeitos da indignidade, previstos no 2037º CC, prevê que, quando esta declarada,
leva ao não chamamento do indigno e «a devolução da sucessão ao indigno é
havida como inexistente, sendo ele considerado (…) possuidor de má fé dos respetivos
bens.». Indica ainda o 1097º/2/c) CPC que «O requerimento inicial apresentado pelo
cabeça de casal deve: c) Identificar os interessados diretos na partilha, os respetivos
cônjuges e o regime de bens do casamento, os legatários e ainda, havendo
herdeiros legitimários, os donatários», ou seja, D não deveria ter sido identificado
na partilha.

Dá-se que, ao não ter interesse direto, não terá consequentemente legitimidade
para requerer o processo de inventário (1085º/1/a) CPC).

«Se o processo prosseguir, o juiz, se verificar que o exercício de funções de cabeça de


casal cabe ao requerente e que este prestou compromisso de honra válido, procede à sua
designação e ordena a citação de todos os interessados diretos na partilha» (1100º/2/a)
CPC). Porém, podem os interessados diretos, no prazo de 30 dias a contar da sua
citação, impugnar a legitimidade dos interessados citados (1104º/1/b) CPC), sendo que
esta faculdade pode também «ser exercidas, com as necessárias adaptações, pelo

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requerente do inventário ou pelo cabeça de casal, contando-se o prazo, quanto ao
requerente, da notificação referida no n.º 3 do artigo 1100.º e, quanto ao cabeça de
casal, da citação efetuada nos termos da alínea b) do n.º 2 do mesmo artigo.» (1104º/2
CPC). Caso esta oposição seja deduzida, são notificados os interessados, podendo
responder, em 30 dias, aqueles que tenham legitimidade para se pronunciar sobre a
questão suscitada (1105º/1 CPC)- contraditório. Isto levará portanto a uma certidão de
sentença judicial da indignidade.

4. Refira se a questão levantada na alínea anterior pode ser resolvida


no processo de inventário, e se este processo deve ser suspenso até
que essa questão seja decidida. Justifique.

Caso haja oposição, «A questão é decidida depois de efetuadas as diligências


probatórias necessárias, requeridas pelos interessados ou determinadas pelo juiz, sem
prejuízo do disposto nos artigos 1092.º e 1093.º» (1105º/3 CPC). O juiz deve
determinar a suspensão da instância se «(…)na pendência do inventário, forem
suscitadas questões prejudiciais de que dependa a admissibilidade do processo ou a
definição de direitos de interessados diretos na partilha que, atenta a sua natureza ou a
complexidade da matéria de facto que lhes está subjacente, não devam ser
incidentalmente decididas.», sendo que, neste caso, o juiz remete as partes para os
meios comuns, logo que se mostrem relacionados os bens (1092º/1/b) e nº 2 CPC).
Porém, este artigo não se aplicará, pois os requisitos não estão verificados, sendo a
prova a certidão da sentença judicial da indignidade. Caberá assim ao juiz determinar
se a instância irá suspender ou não (1091º/2 CPC), sendo que está em causa uma
questão prejudicial de que depende a admissibilidade do processo. «Enquanto durar a
suspensão só podem praticar-se validamente os atos urgentes destinados a evitar dano
irreparável; a parte que esteja impedida de assistir a estes atos é representada pelo
Ministério Público ou por advogado nomeado pelo juiz.» (275º/1 CPC).

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