Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Introdução:
Por esse artigo, pretendo demonstrar essa posição filosófica machista, mas – também
como um alívio intelectual (e uma fresta de esperança), apresentarei alguns filósofos que
lutavam por pautas femininas e algumas filósofas feministas – que ajudaram a humanidade a
superar (um pouco) a mácula do machismo impregnada desde seu fatídico passado. Por fim,
apresentarei algumas vertentes do feminismo atual e algumas mulheres importantes que lutaram
e que ainda lutam por espaço.
Avançando para a Revolução Francesa, vemos uma luta por igualdade, liberdade e
fraternidade. Mas, como foi lamentavelmente constatado pelas mulheres da época, esses ideais
não contemplavam demandas femininas. Nas palavras de Elisabeth Badinter:
Chegando ao século XIX, Nietzsche surge com um novo modo de ver o homem, a
cultura e a história, mas isso não muda a forma como a mulher é vista e tratada.
Por esse breve histórico, é possível observar que a mulher, desde o princípio do
pensamento filosófico, foi definida como alguém que deveria ser reprimido, educado e
subjugado. Sua função era circunscrita à reprodução. Com o desenvolvimento do mundo
1
“mulier taceat in ecclesia!” a mulher deve permanecer em silêncio na igreja!
2
“mulier taceat in politicis!” a mulher deve permanecer em silêncio na política!
3
“mulier taceat de muliere!” a mulher deve permanecer em silêncio sobre as mulheres!
capitalista e a necessidade de se aumentar o número populacional, seu papel aumentou para o
cuidado da família, visando a manutenção da vida da prole.
Alguns filósofos lutaram pelos direitos das mulheres, entre eles estão François Poullain
de la Barre (1647-1725), Marquês de Condorcet (1743-1794), Olympe Gouges (1748-1793) e
Mary Wollstonecraft (1759-1797).
De acordo com François Poullain de la Barre “tudo o que os homens escreveram sobre
as mulheres deve ser suspeito, pois eles são, ao mesmo tempo, juiz e acusado”. Porém, em um
momento que pouquíssimas mulheres conseguiam ser ouvidas, o posicionamento desses
homens a favor das causas feministas foi de extrema importância. François foi um filósofo que
denunciou injustiças e desigualdades sociais cometidas contra as mulheres. Em seus principais
livros – Sobre a igualdade dos dois sexos, Sobre a educação das mulheres e Sobre a educação
das mulheres – defendeu que a opressão feminina era decorrente de um processo de preconceito
cultural, que a educação era o único meio de conquista de autonomia para as mulheres e, ainda,
a igualdade condicional e intelectual entre homens e mulheres. Sua frase sobre se manter em
suspeição o que os homens escrevem sobre as mulheres foi a epígrafe inicia do livro de Simone
de Beauvoir, O Segundo Sexo.
Mulher, desperta. A força da razão se faz escutar em todo o Universo. Reconhece teus
direitos. O poderoso império da natureza não está mais envolto de preconceitos, de
fanatismos, de superstições e de mentiras. A bandeira da verdade dissipou todas as
nuvens da ignorância e da usurpação. O homem escravo multiplicou suas forças e teve
necessidade de recorrer às tuas, para romper os seus ferros. Tornando-se livre, tornou-
se injusto em relação à sua companheira. (Gouges, 1971)
Wollstonecraft é considerada uma das mães do feminismo, uma vez que seu livro
Thoughts on the education of daughters (“Pensamentos sobre a educação das filhas”),
publicados em 1787, foi um dos primeiros a discutir sobre a opressão estrutural feminina na
Europa e suas raízes – “Desafortunada é a situação das fêmeas, educadas de acordo com a
moda, mas deixadas sem fortuna alguma”. Ela defendia que as mulheres deveriam ter o mesmo
direito à educação que os homens e, além disso, que não estudassem apenas para se tornarem
“esposas ideais”.
Em 1972, Mary Wollstonecraft. publicou sua obra mais famosa, Reivindicação dos
direitos da mulher. O livro é considerado um dos fundadores do feminismo, e denuncia a
privação do acesso das mulheres a direitos básicos no século XVIII. Outros pontos importantes
da obra são a defesa do voto feminino e da igualdade de direitos no casamento – em especial
em relação a bens da esposa e tutoria dos filhos, em situações de divórcio. Nele a educação é
considerada a base para o fim das desigualdades e para isso a autora afirma a necessidade de
escolas mais livres, menos rígidas, que ensinassem aos dois sexos as tarefas domésticas.
O Movimento Feminista
A primeira onda (fim do século XIX até meados do século XX) foi caracterizada pela
reivindicação das mulheres de direitos que estavam sendo conquistados pelos homens. No
século XIX despontava o socialismo, com as lutas dos operários por diretos e participação
política – que não incluíam as mulheres. Esses eram os direitos exigidos pelas feministas desse
período: o voto, a participação política e na vida pública — o lugar da mulher sempre foi dentro
de casa. As feministas da primeira onda questionavam a imposição de papéis submissos e
passivos às mulheres. Essas mulheres ficaram conhecidas como “sufragistas”.
A teoria da primeira onda defendia que homens e mulheres eram iguais (moral e
intelectualmente) e deveriam ter oportunidades iguais. É um feminismo que prega igualdade.
A retórica predominante dessa onda é o liberalismo e o universalismo.
A segunda onda (entre 1950 e 1990) marcou o início dos estudo sobre a condição física
feminina e sua opressão. Isso possibilitou a construção de uma teoria-base, uma teoria raiz sobre
a opressão feminina. Assim esse feminismo ficou conhecido como feminismo radical (raiz,
início). Essa onda, discutiu a exploração feminina em dois quesitos: sexual e reprodutivo, e se
caracterizou pela luta por autonomia nesses quesitos. Assim, começa as discussões entre sexo
e gênero – aquele é definido como uma característica biológica; e este, uma construção social,
imposto à pessoa dependendo de seu sexo.
Essa onda foi marcada por grupos, como o The Redstockings e o New York Radical
Feminists, que protestam contra concursos de beleza visando demonstrar que estes
objetificavam as mulheres, presando mais pela aparência que pela inteligência.
Essas feministas pretendiam entender a origem da opressão e a justificativa para a
submissão feminina. Elas não alcançaram uma resposta satisfatível, mas perceberam que apesar
de todas as diferenças, havia algo que unia a todas a mulheres, indiscriminadamente: a opressão
com base no sexo. Assim, elas são as pioneiras na crítica à pornografia, à prostituição e na
denúncia quanto a exploração da mulher via maternidade e via casamento, e o uso do estupro e
da violência sexual enquanto ferramenta de manutenção do poder masculino.
A terceira onda, inicia nos anos 90 e é marcada por importantes marcos históricos –
como o fim da União Soviética, a queda do muro de Berlim, o fim das ditaduras na América
Latina – e econômicos – neoliberalismo e hiperconsumismo.
A liberdade de escolha de cada mulher começa a ser defendida indiscriminadamente, com a luta
contra a prostituição — típica da segunda onda — sendo silenciada. Outro foco é a apropriação
de termos misóginos e pejorativos contra mulheres, numa tentativa de se ressignificação desses
termos, retirando-lhes a conotação negativa.
E, finalmente, surge nessa onda a ideia de transversalismo em oposição ao
universalismo e ao particularismo - característicos, respectivamente, da segunda e da primeira
ondas. Isso está associado a ideia da empatia, ou seja, fazer o exercício de se colocar no lugar
do outro para entender, suas necessidades e seus pontos de vista.
• Feminismo radical: ou Radfem, surgiu nas décadas de 60 e 70, o nome vem de raiz (ou
início). Afirmam que a origem da opressão feminina está no patriarcado e nos papéis
sociais intrínsecos ao sistema de gênero. Retomam, de certa forma, o determinismo
biológico, e por isso são consideradas moralista e alinhadas a setores sociais mais
conservadores, muitas são chamadas transfóbicas. Elas defendem a destruição de
algumas estruturas ou situações sociais que geram benefícios para o homem – por
exemplo a prostituição –, para que haja uma real libertação feminina.
Principais nomes: Simone de Beauvoir, Shulamith Firestone, Sheila Jeffreys, Kate
Millett, Andrea Dworkin.
• Feminismo negro: chegou no Brasil durante a década de 80 juntamente com o
movimento negro. Ele existe, pois, é fato que as mulheres negras tem problemas além
das questões de gênero, ou seja, opressão dupla – por serem negras e mulheres. Elas não
consideram a opressão da mulher negra pior que a da mulher branca, porem a questão
da mulher negra deve ser discutida de forma diferente.
Principais nomes: Angela Davis, Audre Lorde e bell hooks. No Brasil, Lélia Gonzales
e Sueli Carneiro.
• Transfeminismo e Feminismo Queer: devido a exclusão que sofreram no feminismo
radical, essa vertente surgiu como forma de dar visibilidade as causas de pessoas que
possuem identidade de gênero diferente as do seu sexo biológico. Assim, essa os
teóricos dessa vertente acreditam que o gênero "mulher" é produzido e reprimido pelas
mesmas estruturas de poder das quais se busca emancipação. Assim, a aceitação de um
sistema binário de gêneros (masculino e feminino), ignorando categorias fora da matriz
heterossexual como dragqueens, travestis, transexuais e todas as identidades que não se
identificam binaridade normativa.
A inspiração teórica inicial foi a obra de Judith Butler, Gender Trouble (1990)
• Feminismo liberal: ou libfem, como é chamado, é pouco popular no Brasil. Os teóricos
dessa vertente afirmam que uma forma de assegurar a igualdade de gêneros é por meio
da criação de leis. Contrariando ao que é pregado pelo radfem, essa vertente afirma que
quando uma mulher decide seguir ou não um padrão de beleza, se prostituir ou ser uma
dona de casa, ela está pondo em prática sua liberdade - radfem acredita que isso é uma
condição que foi imposta a ela pela sociedade. É favorável à participação dos homens.
Principais nomes: Olympe de Gouges, Mary Wollstonecraft, Naomi Wolf, Betty
Friedman, John Stuart Mills.
• Feminismo interseccional: É uma corrente que acredita que a opressão não está ligada
apenas ao gênero, mas em um emaranhado entre gênero, raça e classe social. Afirma
que as mulheres experimentam a opressão em várias formas e em graus diferentes. E
que esses padrões estão interligados e unidos e são influenciados por um sistema social.
É uma vertente receptiva a homens, ao contrário das radfems que acreditam que os
homens são opressores por natureza. Busca conciliar as demandas de gênero com as de
outras minorias, considerando classe social, raça, orientação sexual, deficiência física.
Principais nomes: Kimberlé Crenshaw, Patrícia Collins, além das autoras mencionadas na
vertente do Feminismo Negro.
Conclusão:
As mulheres sempre tiveram seus direitos cerceados e a filosofia, assim como outras
ciências, forneceu argumentos que justificavam – ainda que de forma controversa e pouco
satisfatível – esse cerceio.
Ao longo da história, muitas foram as teorias levantada para tentar entender o motivo
da necessidade masculina de opressão e subjugação feminina. Uma dessas, acreditava que em
remotos tempos imperava um matriarcado e que, visando o seu fim, os homens instauraram o
patriarcado, oprimindo para não serem oprimidos. A teoria, apesar de pouco provável, é
interessante para nos mostrar o quão difícil é entender quando nos privam de direitos tão básicos
sem um motivo plausível que justifique essa punição.
Ainda que a opressão sofrida por mim seja mínima (ou nenhuma) não posso esquecer
da opressão sofrida pela minha irmã, amiga, vizinha, conterrânea, ou qualquer mulher que é
assassinada, estuprada, agredida, mutilada, violentada, vendida, enfim, oprimida das mais
diversas (e desumanas) formas que existe. Por que, enquanto nos afastamos em grupos
individualizados deixando de ser um movimento único, mulheres ainda morrem pelo fato de
serem mulheres.
Referências: