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Introdução à Teoria Feminista

Apresentação
O campo de estudos feministas vem se constituindo nas últimas cinco décadas dentro das ciências
sociais e humanas. Este campo, primeiramente concernente à mulher e, posteriormente, ao gênero,
é fruto do movimento social de mulheres que, no século XX, especialmente nos anos 30 e 40,
forneceu as bases para a legitimação e construção de um novo campo de estudos.

No processo de institucionalização dos estudos feministas, há alianças com perspectivas diferentes


e não-unívocas, constituindo teorias e conceitos em um campo não unificado de pensamento, o
que resultou em um diálogo com diversidade teórica, como o marxismo, o estruturalismo, a
psicanálise, o pós-estruturalismo, constituindo-se em uma multiplicidade de reflexões de influências
distintas e conflitantes. A história do feminismo é marcada por essa multiplicidade e, para
compreendê-la, é preciso entender as diferentes fases da discussão feminista ao longo dos últimos
dois séculos.

Nesta Unidade de Aprendizagem, você vai aprender a história do movimento intelectual do


feminismo e as diferentes perspectivas teóricas e conceituais desse campo.

Bons estudos.

Ao final desta Unidade de Aprendizagem, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

• Identificar as diferentes perspectivas que formam cada onda feminista.


• Analisar as influências teóricas que compuseram o campo intelectual feminista.
• Discutir as formulações conceituais e epistemológicas dos estudos feministas.
Desafio
No debate feminista contemporâneo, há uma ênfase na reflexividade sobre o lugar de fala e as
diferentes posições dos sujeitos, considerando as críticas de sujeitos historicamente
subalternizados que possuíram pouco ou nenhum espaço para falar de si, seja nas mídias ou na
academia.

Você faz parte de um grupo de pesquisa que realiza estudos sobre gênero e sexualidade. Sua
pesquisa é sobre a vulnerabilidade vivenciada por pessoas trans e precisa realizar entrevistas,
utilizando o método história de vida. No processo de busca por possíveis interlocutores, você
recebe muitas negativas, até que uma ativista mulher trans informa que estão cansados de
responder às pesquisas realizadas por pessoas cis (pessoas que possuem identidade de gênero
coerente com o sexo designado ao nascer), enquanto as próprias pessoas trans (pessoas que
possuem identidade de gênero diferente do sexo designado ao nascer) não estão na academia
produzindo conhecimento e chamando a atenção para a invisibilidade e exclusão em diferentes
espaços. Você observou que as críticas apontadas dizem respeito aos atuais debates do ativismo
trans sobre representatividade e lugar de fala.

A partir dessa experiência, tomando como base o debate do sujeito no feminismo, pense em um
projeto que proporcione ao grupo de pesquisa uma avaliação e ações para contornar a situação
colocada pela pessoa trans. Com o objetivo de analisar as críticas presentes na epistemologia
feminista, responda a seguinte questão: Em linhas gerais, quais ideias você proporia em seu
projeto?
Infográfico

As nuances ao longo do desenvolvimento do movimento intelectual e político feminista produziu


múltiplas abordagens teóricas e práticas para a compreensão da realidade das mulheres e das
relações sociais de gênero. Em razão da multiplicidade de perspectivas e sujeitos, a metáfora de
ondas tornou-se um recurso metodológico para descrever esse desenvolvimento. A divisão em
ondas é utilizada para se evidenciar os objetivos perseguidos em cada uma delas e a periodização
mais frequente divide o movimento em três ondas ou "gerações".

No Infográfico a seguir, você vai ver como são dividas as três gerações do feminismo.
Conteúdo do livro
O feminismo, influenciado pelos ideais de igualdade e liberdade, constituiu-se em uma importante
mobilização para a conquista de direitos, para o fim da discriminação e para a denúncia da opressão
vivida pelas mulheres. Atuando em diversas frentes, na busca da garantia de direitos legais, como o
direito ao voto e à propriedade; constituição igualitária do casamento; questionamento do poder
patriarcal na família; direito ao divórcio; direito à autonomia e integridade do corpo feminino,
ligados aos direitos reprodutivos; proteção à violência doméstica e sexual; direitos trabalhistas,
como a busca por igualdade salarial entre homens e mulheres, licença-maternidade.

A constituição deste campo de lutas possibilitou transformar temas e problemas do movimento em


objetos de análise decorrentes do diálogo da teoria feminista com a Sociologia, a Antropologia, a
Política, a História e a Filosofia. Deste modo, ao se lançar um olhar de gênero às questões
relacionadas à saúde, à política, à educação, ao trabalho, à família, à religião, à violência, às ciências,
à cultura, à identidade, ao corpo, à sexualidade e às tecnologias produtivas e reprodutivas,
evidencia-se que estas questões são marcadas por relações de dominação e poder com base nas
relações de gênero.

No capítulo Introdução à Teoria Feminista, base teórica desta Unidade de Aprendizagem, você vai
ver a trajetória da formação intelectual do feminismo desde a década de 60, conhecendo as críticas
internas e desdobramentos conceituais e epistemológicos.

Boa leitura.
Introdução à
Teoria Feminista

Gabriela Felten da Maia


Introdução à teoria
feminista
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

 Identificar as diferentes perspectivas que formam cada onda feminista.


 Analisar as influências teóricas que compuseram o campo intelectual
feminista.
 Discutir as formulações conceituais e epistemológicas dos estudos
feministas.

Introdução
O feminismo, como movimento intelectual e político, possui pelo me-
nos dois séculos de existência, em um contexto euro-estadunidense. A
constituição de um campo de lutas foi acompanhada por escritos de
diferentes mulheres ao longo da história. Porém, foi somente a partir
do pós-Segunda Guerra Mundial que surgiu um campo de estudos e
pesquisas nas universidades.
O surgimento desse campo foi influenciado pelas reflexões realizadas
ao longo da história do movimento feminista. Os questionamentos às
instituições e às relações que reproduziam a subordinação da mulher
se tornaram objeto de elaboração conceitual e teórica. A questão era:
se esse comportamento não é natural, como ainda se mantinha? Um
marco importante do movimento foi a publicação do livro O Segundo
Sexo, de Simone de Beauvoir, em 1949, que demonstra as raízes culturais
da desigualdade entre homens e mulheres e da inferioridade da mulher.
Neste capítulo, você vai estudar os debates teóricos e as críticas que
produziram inflexões teóricas ao longo da trajetória do pensamento
feminista, bem como o desenvolvimento dos diferentes conceitos e
abordagens teóricas que formam a diversidade da teoria feminista.
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Trajetória do pensamento feminista


A denominada segunda onda do feminismo surgiu após a Segunda Guerra,
fortalecendo-se especialmente nas décadas de 1960 e 1970, impulsionada por
movimentos de contestação intelectual e política que, na França, culminaram na
manifestação de maio de 1968. Essa fase surgiu com maior destaque nos Estados
Unidos, com base na busca pela igualdade e na denúncia sobre a opressão da mulher,
e na França, discutindo a invisibilidade da experiência feminina e a valorização
das diferenças entre homens e mulheres, conforme lecionam Narvaz e Koller
(2006). Nesse momento, surgiu o movimento feminista brasileiro, associado
aos movimentos de oposição à ditadura militar e de redemocratização do país.
A partir do projeto político que acompanhava o movimento feminista
desde a primeira onda, surgiu um projeto intelectual, a teoria feminista, com
o objetivo de não apenas denunciar, mas produzir conhecimento. Esse projeto
visava ao desenvolvimento de estudos e pesquisas que buscassem compreender
e explicar a segregação a que a mulher historicamente foi submetida, o que
constituiu a invisibilidade desta como sujeito — inclusive como sujeito da
ciência, conforme salientam Meyer (2004) e Louro (1997).
Dentro dessa perspectiva, o pensamento feminista passou a não só reivin-
dicar a cidadania e a igualdade das mulheres, mas também promover uma luta
contra valores sexistas e androcêntricos presentes nas instituições sociais, na
esfera privada e nas relações cotidianas, que perpetuavam as desigualdades
entre os sexos. A clássica frase de Simone de Beauvoir “não se nasce mulher,
torna-se mulher” expressou a ideia central discutida pelo feminismo: a des-
naturalização do ser mulher.
Agora, não se tratava mais de abordar a opressão masculina, mas o porquê
de a diferença sexual ser causa e explicação da desigualdade entre homens e
mulheres. A questão era pensar como a sociedade se organiza e hierarquiza as
relações a partir da diferença sexual. Nesse sentido, como argumenta Louro
(1997), não importa observar a diferença entre os sexos, como um dado bio-
lógico, mas a forma como essas características biológicas são representadas
e valorizadas — isto é, a construção social sobre o sexo.
Como destaca Sorj (2004, p. 144):

Recortando a sociedade em suas diferentes esferas de sociabilidade, o sexismo,


machismo, ou androgenismo, como se queira chamar, é um padrão cultural
que associa ao masculino um valor superior e desvaloriza tudo aquilo que é
ligado ao feminino, em particular, às mulheres. Esse valor cultural não seria
superado com a mera justiça distributiva. A violência doméstica, o assédio
sexual, a baixa participação das mulheres na esfera político-institucional etc.
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não são apenas consequências das desigualdades econômicas. Pelo contrário,


mereceriam um reconhecimento específico, como expressões da dominação
de gênero, e consequentemente teriam de ser tratados de maneira diferenciada.

O avanço do debate sobre a manutenção das relações de opressão tam-


bém mostrou as diferenças dentro do próprio movimento. Essas concepções
divergentes vinham de feministas lésbicas, negras, de outras regiões, como
o Sul Global (América Latina, Sul da Ásia, África e Oriente Médio), que rei-
vindicavam o seu espaço no movimento, questionando a relação deste com as
questões raciais e de classe, as sexualidades não heterossexuais, o colonialismo
e o imperialismo, por exemplo. Para essas mulheres, o pensamento feminista
não contemplava as diferenças entre as mulheres, centrando-se nas vivências
de mulheres brancas, de classe média e intelectualizadas. Com isso, passou-se
a questionar o caráter normativo e universalista do movimento.
A partir dos anos 1980, as críticas às noções universalista e unitária da categoria
mulher passaram a compor o movimento feminista e a reivindicar a incorporação
de outras temáticas, como as questões raciais e étnicas, nos questionamentos da
estrutura da sociedade e também do feminismo “tradicional” branco. Emergiram
contundentes críticas de mulheres não brancas desencantadas com os modelos e
discursos tradicionais, desenvolvidos pelas feministas brancas de classe média.
Como pontua Caldwell (2000), para essas feministas, a explicação da
opressão de mulheres apenas pelo enfoque de gênero não explicaria as cone-
xões entre o sexismo e outras formas de discriminação. Por isso, exigiam que
as noções sobre “ser mulher” e a explicação da subordinação levassem em
conta raça, etnia, classe e sexualidade. Essas mulheres passaram a utilizar a
sua própria experiência de exclusão e discriminação para desenvolver suas
formas de conceituar gênero e feminismo. Com isso, surgiu uma importante
discussão sobre a interseccionalidade, bem como debates sobre o lugar de fala
como uma crítica epistemológica da e à teoria feminista.
Essas críticas, ao desafiarem os paradigmas desenvolvidos pela segunda
onda, impactaram a teoria feminista da década de 1990. Os questionamentos
colocados por mulheres que se consideravam não contempladas pela discussão
feminista transformaram a luta pela igualdade em uma valorização da dife-
rença — a diferença dentro da diferença. Se as categorias de raça, sexualidade
e classe antes eram recortes dentro de uma identidade maior — a categoria
mulher — e marcavam as especificidades do ser mulher dentro do feminismo,
a partir do reconhecimento da diferença, essa identidade maior perdeu sua
centralidade para essas categorias, que passaram a ter maior autonomia.
Assim, constituiu-se um debate presente até hoje sobre o que significa ser mu-
lher, qual é o lugar político/teórico do sujeito no campo feminista e quem são seus
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próprios sujeitos, conforme elabora Maluf (2007). Surgiu uma maior preocupação
com a desessencialização da questão de gênero e das identidades de mulheres,
resultando no destaque da “diferença” na teoria feminista. Esse período marcou
o surgimento de uma nova geração de estudiosas feministas, agrupadas no que
se convenciona chamar de terceira onda do feminismo, quando emergiram os
estudos de gênero, para algumas, ou o pós-feminismo, para outras.
O pós-feminismo, influenciado pelas teorias pós-estruturalistas, espe-
cialmente pelo pensamento de Michel Foucault e de Jaques Derrida, buscava
desconstruir e desestabilizar a categoria de gênero, enquanto categoria fixa
e imutável presente nas gerações anteriores. Sua crítica dizia respeito ao uso
de gênero como um conceito que descreve o modo como o social e a cultura
agem sobre corpos sexuados. Segundo Scott (1995), as feministas da terceira
geração compreendiam gênero como uma categoria relacional e política,
enfatizando que a sociedade não só constitui modos de ser e de sentir, mas
também o modo como o corpo e, portanto, o sexo, aparece.
Essa desconstrução da noção de gênero acarretou importantes mudanças
epistemológicas, substituindo os impasses dos estudos de mulheres que, ao
focarem apenas na situação, na condição e na posição das mulheres, não pa-
reciam conseguir responder aos desafios do pensamento feminista, conforme
aponta Machado (2013). Ao revisar a oposição binária masculino-feminino,
no pós-feminismo, passou-se a problematizar também a unidade interna da
categoria mulher, enfatizando que existem diferentes mulheres, com diferentes
experiências e discursos. Como escreve Machado (1992, p. 25), essa geração
“[...] rejeitava a possibilidade de se compreender o feminino num mundo
puramente feminino, pois o feminino se definia em relação ao masculino”. A
terceira onda feminista criticava a universalidade da diferença entre os gêneros,
postulando a existência de uma multiplicidade de diferenças: diferenças entre
homens e mulheres e entre mulheres e mulheres. Daí a crítica ao essencialismo
e universalismo do sujeito do feminismo.

O livro Mulheres, raça e classe, de Angela Davis, é um importante material que permite
refletir sobre a relação entre a origem dos direitos das mulheres e a luta empreendida
pelas mulheres brancas mais abastadas e as trabalhadoras no contexto antiescravagista.
A leitura é indicada para se perceber as diferenças e as aproximações que produziram
contradições e tensionamentos no interior dos feminismos, hoje discutidos por meio
do conceito de interseccionalidade.
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Perspectivas feministas
Ao final da década de 1960, foram desenvolvidas nos Estados Unidos e na
Inglaterra três correntes do pensamento feminista, o feminismo liberal, o
socialista e o radical —, que buscam explicar de formas diferentes as origens
e causas da opressão e os mecanismos necessários para acabar com ela. Em-
bora divergentes, essas perspectivas compartilham vários pressupostos, ao
problematizarem que a existência da subordinação feminina não é natural,
mas um dado cultural e histórico, que varia em função da época e do lugar,
conforme elabora Piscitelli (2002).

As feministas liberais consideram que a subordinação da mulher se dá em razão da


socialização e da discriminação, que têm por base a diferença sexual, o que motiva
lutas por direitos iguais. Já as feministas socialistas e radicais consideram que a raiz da
subordinação das mulheres é estrutural, de modo que somente políticas e reformas
sociais não seriam suficientes para mitigá-la.

Algumas vertentes do feminismo socialista, seguindo as argumentações


de Friedrich Engels no livro As origens da família, a propriedade privada e o
Estado, afirmam que a opressão sexual teve origem no momento do surgimento
das classes sociais baseadas na propriedade privada. Para esse pensamento
feminista, a estrutura de classes implica em uma divisão desigual do trabalho,
por ter por base o sexo. Nesse sentido, a opressão seria superada apenas no
momento em que fosse instaurada outra forma de organização social, em uma
sociedade sem classes, como o socialismo, conforme leciona Piscitelli (2002).
Contudo, algumas vertentes dessa perspectiva do feminismo criticam essas
premissas ao mostrarem que as mudanças na organização social em alguns
países socialistas não alteraram o quadro das relações entre os sexos, persis-
tindo as hierarquias de gênero. Para essas pensadoras, a opressão feminina
está relacionada com a associação entre patriarcado/capitalismo, de modo que
produção e reprodução são igualmente determinantes, de acordo com Piscitelli
(2002). De acordo com Saffioti (1992, p. 194), essa perspectiva do feminismo:
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[...] ou só admite o patriarcado enquanto puramente ideologia, ou define o


patriarcado enquanto organização social de gênero relativamente autônoma,
convivendo, de maneira subordinada, com a estrutura de classes. Nesta última
acepção são intercambiáveis os termos “patriarcado” e “opressão da mulher” [...].

Por outro lado, o feminismo radical compreende as causas da desigualdade e


da opressão das mulheres, ao longo do tempo e das culturas, como resultado do
modo como os seres humanos se reproduzem. Para essa perspectiva, a condição
das mulheres está relacionada à reprodução, pois, sendo o único ser humano
capaz de gerar uma vida e amamentar, a mulher ficaria parte do período de
desenvolvimento do bebê em função de seus cuidados, o que a torna prisioneira
da biologia e a força a uma dependência dos homens. O corpo feminino, então,
torna-se o centro de onde derivam as características que autorizam e concentram
a dominação masculina, conforme descreve Piscitelli (2002).
Essas feministas, de acordo com Piscitelli (2002), consideram que os critérios
definidos pelo pensamento influenciado pelo marxismo para a exploração são
pouco adequados para o feminismo. Para essas autoras, seguindo o pensamento
marxista, a classe, por exemplo, determinaria condições objetivas de exploração
e opressão, definindo as mulheres como oprimidas e opressoras, na medida em
que, segundo esse critério objetivo, as mulheres brancas de classe média não po-
deriam ser consideradas oprimidas. Contudo, as feministas radicais afirmam que
a opressão inclui todas as mulheres, de modo que a opressão deveria ser definida
de modo diferente. Por isso, consideram a legitimidade das teorias subjetivas da
opressão, em detrimento das teorias “objetivas”, conforme leciona Piscitelli (2002).

Piscitelli (2002) destaca que a ideia do feminismo de que o pessoal é político indica que a
política envolve muito mais do que a esfera pública e está relacionada a qualquer relação
de poder, de modo que o cotidiano da vida das mulheres seria o espaço para se mapear
a dominação. Nesse sentido, o conceito de patriarcado foi politizado e trabalhado como
um regime de dominação universal, estando presente ao longo do tempo e das culturas,
explicitando a subordinação das mulheres e as relações homem-mulher dela resultantes.

Embora o conceito de patriarcado faça parte das formulações weberianas, a


produção feminista raramente apresentava alguma relação com essas formulações.
A conceituação weberiana, conforme Machado (2000), considera o patriarca-
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lismo um conceito historicamente referido, mas que sofre algum esvaziamento


ao ser moldado como um conceito típico-ideal (parâmetro). Ele se refere a uma
forma, na maioria das vezes, econômica e familiar, em que a dominação é centrada
em apenas uma pessoa, o patriarca. Esse conceito em Weber se refere a um tipo
de dominação em que a autoridade é exercida pelo senhor, cujo domínio circuns-
creve o espaço familiar e doméstico, sendo essa autoridade legitimada por regras
hereditárias fixas. Essa dominação implicaria em uma divisão sexual, considerada
natural, conforme lecionam Castro e Lavinas (1992) e Machado (2000).
O conceito de patriarcado, desse modo, possui delimitações históricas
claras, tornando-se apropriado somente em períodos em que é possível en-
contrar essa ação típico-ideal. De acordo com Castro e Lavinas (1992), esse
conceito se mostrou presente em períodos em que havia determinados tipos
de dominação na forma do Estado. Diante do exposto, parece certo afirmar
que a razão pela qual feministas radicais e marxistas não utilizam o conceito
weberiano de patriarcado se deve ao fato de a dominação patriarcal nas socie-
dades contemporâneas não corresponder a esse padrão político e econômico
apontado por Weber, conforme leciona Saffioti (2004).
Para Saffioti (1992), o conceito de patriarcado weberiano é problemático
ao se vincular apenas ao esquema de dominação, e não ao esquema de domi-
nação–exploração, que, para a autora, constitui faces de um mesmo processo.
As diferentes perspectivas do feminismo, conforme argumentações da autora,
ao apresentarem acepções diferenciadas de patriarcado, demonstram a não
univocidade do uso do conceito. As diferentes filiações ora situam o patriarcado
no domínio da política, ora no campo econômico.

Saffioti (1992) usa o conceito de dominação–exploração, ou exploração-dominação, por


considerar que o processo de sujeição de uma categoria social possui duas dimensões:
a da dominação e a da exploração. Nesse sentido, a autora considera capitalismo e
patriarcado como um único processo, em que tanto as condições materiais quanto
os corpos das mulheres estruturam a sua subordinação, por meio do controle da sua
sexualidade e da sua capacidade reprodutiva.

Para Machado (2000, documento on-line), a utilização do conceito de


patriarcado pelo feminismo tem configuração teórica marxista, e não tanto
weberiana, e possui acepções e denominações diferenciadas, como “[...] uma
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forma de ‘dominação e exploração’, ou ‘sistema de opressão da mulher’ ou


‘relações sociais de reprodução organizadas na família e que designam à
mulher o trabalho reprodutivo’”. Nesse contexto, as teóricas feministas en-
tendem patriarcado como um conceito historicamente referido e denunciam
a sua constituição social e cultural, o que caracteriza um sistema ou uma
forma de dominação, não se referindo apenas a relações patriarcais. O uso
desse conceito pelo pensamento feminista é importante em diversos sentidos:

 permite assinalar características que sustentam o sexismo;


 mostra que a subordinação feminina, longe de ser natural, é um fenô-
meno histórico e contingente;
 possibilita pensar em uma origem ou um tempo em que teria começado
a história da opressão das mulheres, de modo que, se teve um início,
pode ter um fim.

Estudos sobre a mulher


A compreensão do patriarcado a partir dessas correntes do feminismo proporcio-
nou condições para o desenvolvimento dos estudos sobre a mulher. Esses estudos
argumentavam que a dominação masculina excluiria as mulheres da história,
da política e da produção de conhecimento. Com base nessas argumentações,
produziu-se um corpo de dados sobre a situação da mulher, consolidando um
campo de estudos que passou a revisar e questionar tradições disciplinares e,
inclusive, vários dos conceitos e categorias utilizados pelo próprio pensamento
feminista, como o conceito de patriarcado, conforme leciona Piscitelli (2002).
Essas críticas indicavam que o patriarcado, como categoria de análise,
referia-se a um sistema político trans-histórico e transcultural, que, por sua
generalidade, ancorava a dominação masculina na diferença biológica entre
homens e mulheres, tornando-se um conceito essencializante. Por isso, com o
decorrer do tempo, as hipóteses explicativas das origens da opressão da mulher
foram sendo questionadas e abandonadas, de modo que o conceito perdeu seu
estatuto de conceito para se tornar uma referência de dominação masculina.
Com as críticas à categoria patriarcado como um conceito, surge outra
abordagem para pensar as relações hierárquicas e os processos de subordinação:
o gênero. Foi em 1975, com a publicação do ensaio O tráfico de mulheres:
notas sobre a economia política do sexo, de Gayle Rubin, antropóloga estadu-
nidense, que o conceito de gênero foi introduzido no pensamento feminista e
no debate sobre as causas das desigualdades entre homens e mulheres. Rubin,
no marco do debate sobre natureza, cultura, origem e causas da opressão e
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da subordinação da mulher, elabora o conceito de sistema de sexo/gênero.


Por meio desse conceito, a autora questiona “[...] uma série de arranjos pelos
quais a matéria-prima biológica do sexo humano e da procriação é moldada
pela intervenção humana, social” (RUBIN, 1993, p. 5), ou seja, as relações
sociais que convertem fêmeas em mulheres.
Para discutir o que são essas relações que transformam a mulher em uma
mulher oprimida, a autora realiza uma leitura crítica de Lévi-Strauss e Freud.
Rubin considera que esses autores descrevem e discutem a domesticação da
mulher, sob outros nomes, embora eles próprios não observem seus trabalhos
sob esse ponto de vista. Nesse sentido, o objetivo de O tráfico de mulheres: notas
sobre a economia política do sexo é desenvolver uma definição mais apropriada
do sistema sexo/gênero por meio da leitura desses autores, procurando descrever
parte da vida social que seria lócus da opressão das mulheres e de minorias sexuais.

O sistema sexo/gênero, conceito cunhado por Gayle Rubin (1993), consiste no conjunto
de dispositivos pelos quais uma sociedade transforma a sexualidade biológica em
produtos da atividade humana e por meio dos quais essas necessidades sexuais são
transformadas, satisfeitas. Desse modo, gênero seria uma divisão dos sexos imposta
socialmente e produto das relações sociais da sexualidade (RUBIN, 1993, p. 11). Essa
formulação procurava distinguir e separar sexo — vinculado à biologia, visto como
natural e imutável – e gênero — dimensão que enfatiza a construção histórica, social
e cultural, arbitrária e variável, vinculado ao sexo biológico. Assim, esse conceito se
apresenta como um avanço à categoria mulher e uma alternativa possível ao conceito
de patriarcado, de acordo com Piscitelli (2002).

Conforme Piscitelli (2016), o ensaio proposto por Rubin (1993) apresenta


dois deslocamentos importantes no debate feminista da época:

 primeiro, ao pensar nas construções sociais da mulher em termos de


sistemas culturais, afasta-se de análises feministas que se limitavam a
analisar a realidade das mulheres sem procurar considerar a totalidade
desses sistemas culturais;
 segundo, pela importância dada às realidades empíricas diversas, para
compreender as formas como o sistema sexo/gênero opera relações de poder.
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Nos anos finais da década de 1980, os pressupostos desse sistema sexo/


gênero passaram a ser questionados, em razão da oposição entre sexo e gênero
realizada por essa teorização. Feministas consideravam que esse sistema
conferia fixidez e unidade às identidades de gênero, ao formular a existência
de uma base biológica imutável que divide os seres humanos em dois sexos e,
por conseguinte, em dois gêneros. O conceito de gênero, então, é ressignificado
e complexificado pelas feministas pós-estruturalistas, e as noções de corpo,
sexo e sexualidade representaram importantes mudanças epistemológicas nos
estudos feministas. Passou-se a problematizar vertentes que tratam o corpo
como uma entidade biológica universal, revisando a ideia binária de dois sexos
e dois gêneros, conforme aponta Meyer (2004).
Michel Foucault foi um dos pensadores que proporcionou maior interlo-
cução com a teoria feminista, principalmente por suas análises sobre como
aprendemos a nos reconhecer como sujeitos de sexualidade. Tais análises
destacam a relação poder/saber/corpo, mostrando como os sujeitos e corpos
são produzidos nas e pelas relações de poder. Do mesmo modo, segundo Ma-
chado (2013), a desconstrução derrideana instigou um processo analítico da
desconstrução de gênero e radicalização da ideia de desnaturalização biológica
de categorias como homem e mulher, promovendo uma ruptura radical entre
a noção biológica de sexo e a noção social de gênero.
A novidade dessa noção de gênero em relação à proposição de Simone de
Beauvoir dizia respeito a levar às últimas consequências a proposta de indagar
sobre as relações entre o sexo biológico e a construção da categoria social de
mulher. Conforme Meyer (2004), os estudos inseridos nessa linha de discussão
questionavam as perspectivas que tratavam o corpo como entidade biológica,
que justificam e explicam as diferenças entre homens e mulheres, ou como
superfície por meio da qual a cultura opera para inscrever diferenças (mantendo
a relação dicotômica entre sexo e gênero). Nessa perspectiva, encontramos duas
importantes autoras feministas que influenciaram a constituição do conceito
de gênero: Joan Scott e Judith Butler.
Em 1986, Joan Scott (1995), historiadora americana, analisou o conceito
de gênero na história, por meio de seu artigo “Gênero: uma categoria útil
de análise histórica”. Ao pensar o conceito de gênero como uma categoria
para a história e, portanto, para as ciências sociais, a autora dialogou com
autores pós-estruturalistas, com o objetivo de compreender e elucidar o
caráter relacional, transversal e variável dessa categoria. Assim, trabalhou
com a noção de poder de Foucault, rejeitando as proposições do conceito
de patriarcado, em que o poder social é visto como unificado, coerente e
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centralizado, conforme leciona Scavone (2008). Gênero, então, passou a ser


entendido como uma relação política que ocorre em um campo histórico e
discursivo, segundo Meyer (2004).

A discussão sobre o conceito de gênero, desde a terceira onda feminista, com a intro-
dução da perspectiva pós-estruturalista, rompeu a dualidade natureza e cultura ao
indicar que o sexo não pode ser pensado como anterior à cultura ou aos processos
de significação que lhe dão sentido como entidade biológica fixa e permanente. Para
acompanhar essa discussão, sugere-se a leitura do capítulo “Corpos que pesam: sobre
os limites discursivos do ‘sexo’”, da filósofa Judith Butler, publicado no livro O corpo
educado: pedagogias da sexualidade, de Guacira Lopes Louro.

Epistemologia feminista e as críticas ao sujeito


no feminismo
Conforme leciona Sorj (1992), nas últimas décadas, os estudos feministas têm
procurado reestruturar a tradição das ciências sociais e formular um projeto
de emancipação das mulheres. Tais estudos se apoiam na experiência de
mulheres e na crítica às teorias sociais, consideradas omissas quanto à con-
sideração das relações de gênero como parte da explicação da organização
social. A constituição do pensamento feminista destaca três elementos críticos
que marcam as teorias sociais modernas, conforme descrito a seguir.

 Universalidade da categoria gênero — pressupõe a existência de uma


experiência comum das mulheres, compartilhada coletivamente por meio
das culturas e da história. Portanto, a condição feminina é marcada pela
biologia, e a opressão da mulher remete às necessidades de controle
da sexualidade feminina (dando origem ao conceito de patriarcado).
 Busca pela identificação de um sujeito com interesses e identidades
próprios — constituiu-se em torno da posição das mulheres nas socie-
dades patriarcais.
 Construção de uma utopia emancipatória das mulheres.
12 Introdução à teoria feminista

Piscitelli (2002) destaca que as mulheres, enquanto coletividade, têm seu


reconhecimento político ligado à ideia de que a unidade entre elas ultrapassa
as suas diferenças. Nesse sentido, o feminismo radical, ao promover uma
identidade coletiva, busca, a partir da utilização da categoria mulher, uma
unidade, uma história comum de opressão feminina. Essa corrente sustenta
que as mulheres — apesar das diferenças de classe, raça, sexualidade e na-
cionalidade — são oprimidas pelo fato de serem mulheres. Essa categoria se
fundamenta em uma base biológica para explicar a subordinação da mulher
e as relações de diferença e hierarquização nas relações de gênero. Em torno
desse debate proposto pelo feminismo radical, foi construído o capital político
sobre o sujeito no feminismo e a categoria mulher.
A composição dos estudos sobre as mulheres acompanhou as discussões em
torno da diferença sexual como causa para as formas de segregação impostas
às mulheres, na medida em que essa diferença confere distintas posições
aos homens e às mulheres na ciência, na política e no social. Nesse sentido,
pesquisadoras buscaram incluir as mulheres nas investigações realizadas pela
antropologia, sociologia, história. A constituição de um campo de estudos
das mulheres visava a dar visibilidade à participação destas na história e à
marginalização da produção feminina.
Como pontua Mariano (2016), a construção do objeto da sociologia e a consti-
tuição do sujeito do conhecimento sociológico, ao mesmo tempo que desnudaram
muitos fenômenos da sociedade moderna, também contribuíram para a ocultação
de alguns sujeitos, como as mulheres e outros grupos em desvantagens sociais.
A marginalização das mulheres e outros grupos na produção do conhecimento
não é uma tradição inaugurada pela sociologia, pois tem ocorrido historicamente
nas ciências humanas e naturais. Trata-se de uma tradição filosófica ocidental,
influenciada pelos princípios das filosofias do Iluminismo, em que há a noção
de um sujeito social universal, livre, autônomo e racional.
Os projetos feministas da primeira e da segunda onda (pelo menos, inicialmente)
se apropriaram desses princípios do Iluminismo e da modernidade na busca por
construir explicações sobre as causas da subordinação da mulher e na formulação
de um projeto emancipatório, conforme leciona Sorj (1992). A crítica feminista
ligada a abordagens desconstrucionistas de gênero avançou, demonstrando os
limites do projeto da modernidade no que tange à emancipação das mulheres, ao
questionar as tendências totalizadoras e universalizantes das propostas feministas.
Passou-se, então, a questionar os próprios pressupostos que constituem a ciência
moderna, conforme apontam Sorj (1992) e Sardenberg (2002).
Para a crítica marxista, o sujeito do conhecimento está relacionado a um
grupo particular de indivíduos, uma classe social específica: a burguesia.
Introdução à teoria feminista 13

Para os marxistas, os grupos situados em posições opostas pelo sistema de


dominação têm pontos de vista diretamente opostos. Pensadoras feminis-
tas marxistas, indo além dessas contribuições do marxismo, apontaram as
limitações da categoria classe social para explicar a posição de sujeitos e a
constituição de identidades ou consciência. Conforme as críticas feministas,
a categoria classe social pressupõe a existência de um sujeito universal no
interior de cada classe. O sujeito do liberalismo, portanto, além de pertencer
à classe dominante, também é masculino, conforme expõe Mariano (2005).
As feministas a muito têm questionado os parâmetros científicos definidores
de quem pode ou não ser sujeito do conhecimento. Os avanços nos debates
em torno da categoria gênero constituiu essa categoria como uma importante
ferramenta de análise sobre o impacto das ideologias na estruturação do
mundo social e intelectual, possibilitando a construção das bases de uma
epistemologia feminista. Portanto, enquanto categoria de pensamento e de
construção de conhecimento, o gênero possibilitou demonstrar que o conhe-
cimento não está imune ao viés patriarcal: o sujeito das ciências tem sido o
homem branco, heterossexual e burguês. A crítica feminista, ao questionar o
androcentrismo, revela que a universalidade esconde sua particularidade, de
modo que o pensamento não é neutro do ponto de vista do gênero, da classe
e da raça, conforme elaboram Mariano (2005) e Sardenberg (2002).

Simone de Beauvoir, com seu livro O segundo sexo, foi uma das precursoras da crítica
ao sujeito, afirmando que existem no mundo social aqueles que ocupam a posição
sem uma marcação, seja sexual ou racial, e aqueles que são definidos e marcados por
sua diferença, designados como “o outro”.

Ao desafiarem a universalidade, a neutralidade e a unidade do sujeito


moderno, as feministas colocavam em evidência que a noção de sujeito
estava marcada por particularidades, expondo que o termo homem se
refere ao homem, ser corpóreo, sexuado, conforme expõe Mariano (2005).
As críticas feministas à modernidade promoveram a desconstrução e o
descentramento da noção de sujeito masculino universal, destacando o
caráter opressivo e normativo dessa noção, que tornava ausentes e invisíveis
mulheres e outros grupos.
14 Introdução à teoria feminista

Essas críticas revelaram que os valores do Iluminismo, como igualdade e


liberdade, embora tenham servido de base para reivindicações dos movimentos
feministas na busca da emancipação da mulher, também tenderam a apagar
as diferenças. Assim, o feminismo, ao buscar construir um sujeito político
feminista, por meio de uma unidade entre as mulheres, produziu uma grande
narrativa da opressão da mulher. Dessa forma, esse movimento construiu um
conceito universal — a mulher universal — e apontou o binarismo masculino-
-feminino como organizador da sociabilidade humana.

Algumas abordagens feministas passaram a criticar que o sujeito do feminismo e as experi-


ências de análise sobre a condição da mulher provinham da experiência social de mulheres
brancas, ocidentais, heterossexuais e de classes dominantes, conforme abordado no início
deste capítulo. Nesse contexto, feministas latino-americanas, de países de Terceiro Mundo,
das ex-colônias, negras e lésbicas colocaram em questão a categoria mulher, denunciando
que a unidade entre as mulheres constituía hierarquias, subordinações e exclusões, conforme
leciona Mariano (2005). Para compreender mais a fundo esse debate, sugere-se a leitura
da obra de Djamila Ribeiro, filósofa brasileira, intitulada O que é lugar de fala. A partir do
diálogo com autoras feministas negras, esse diálogo tem sido uma importante referência
introdutória para a discussão sobre o sujeito nos feminismos e as tensões que esse tema
tem produzido ao longo do tempo na constituição das diferentes vertentes.

CALDWELL, K. L. Fronteiras da diferença, raça e mulher no Brasil. Revista Estudos Femi-


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Dica do professor
O gênero tem sido uma importante categoria de análise social. Sua recente transformação teórica
apresenta desdobramentos importantes para a compreensão dos processos históricos e sociais de
produção de pessoas como generificadas.

Simone de Beauvoir e Judith Butler são duas autoras referência nesse debate. Cada uma em sua
época colocou em discussão as formas como se constituem pessoas como marcadas por um gênero
ou outro.

Na Dica do Professor, você vai conhecer o debate de Butler sobre performatividade.

Aponte a câmera para o código e acesse o link do vídeo ou clique no código para acessar.
Exercícios

1) A compreensão sobre o porquê da subordinação das mulheres foi possível a partir da criação
de uma ferramenta conceitual que situava a opressão sustentada por uma estrutura de
poder que hierarquiza as relações entre homens e mulheres existente em diferentes lugares
e ao longo da história e das culturas. Assinale a alternativa correta que indica a qual conceito
se refere:

A) Gênero

B) Sexismo

C) Androcentrismo

D) Patriarcado

E) Machismo

2) Henrietta Moore, antropóloga britânica, afirma que:

[...] uma grande quantidade de novas evidências etnográficas a respeito da diversidade de


sentidos assumidos pelas categorias “mulher” e “homem”, em diferentes contextos culturais,
demonstra claramente que as diferenças biológicas entre os sexos não podem constituir uma base
universal para definições sociais. Em outras palavras, não se pode afirmar que as diferenças
biológicas determinam construções de gênero e, por conseguinte, não pode existir um sentido
unitário ou essencial atribuível à categoria “mulher” ou à categoria “homem” (Moore 1988: 7).

[...]A noção de sexo, assim como o conceito de gênero, é construída dentro de um conjunto de
sentidos e práticas sociais: portanto, não pode ser um fato pré-social (1987: 31). A conclusão a
que chegam Yanagisako e Collier é que se reconhecemos que o conceito ocidental de sexo é
socialmente construído, não podemos argumentar que este modelo particular de sexo “biológico”
constitui em toda parte o “material cru” das construções de gênero, nem podemos argumentar
que ele forneça em toda parte a base para a compreensão dos processos de reprodução humana.

O trecho acima é do texto Compreendendo sexo e gênero, em que a autora discute, a partir
dos estudos antropológicos, a noção de sexo da cultura ocidental. Com base na discussão
acima, a alternativa correta é:

A) Sexo compõe a base universal e essencial para atribuir sentido às categorias mulher e homem,
determinando, assim, as construções de gênero.
B) O conceito de sexo, como o conhecemos, é histórico e socialmente construído, fruto de um
contexto social próprio da cultura ocidental.

C) A diferença de gênero parte do reconhecimento das diferenças nas aparências físicas.

D) A diferença anatômica é a causa das diferenças e desigualdades das relações sociais de


gênero.

E) A evidência da diferença sexual constitui a base para as construções dos significados e para a
organização social das relações de gênero.

3) O feminismo possui uma história de pelo menos dois séculos no contexto euro-
estadunidense. Por isso, para descrever a história do pensamento político e social feminista,
utiliza-se a metáfora das ondas, a fim de evidenciar os objetivos perseguidos em cada uma
delas. Diante do exposto, assinale a alternativa correta que explica a segunda onda:

A) A busca por igualdade política entre os sexos foi marcada por lutas contra a subordinação das
mulheres por meio de movimentos pela garantia de direitos civis e políticos, como o direito ao
voto, à propriedade e o acesso à educação.

B) Marcado por visões que reivindicavam diversas definições sobre o feminismo, questiona-se
os modelos e discursos tradicionais do pensamento feminista, como noções universalista e
unitária da categoria mulher.

C) Surge o conceito de gênero, quando se procura produzir um conhecimento sobre a diferença


sexual, desenvolvendo-se estudos e pesquisas que buscam compreender como as sociedades
organizam e hierarquizam as relações com base na diferença entre os sexos.

D) Há uma valorização da diferença dentro da diferença na teoria feminista, considerando as


especificidades do ser mulher em diferentes contextos, incorporando a interseccionalidade
para o debate do sujeito no feminismo.

E) Desloca-se o foco da denúncia da dominação masculina para a explicação do porquê da


diferença entre homens e mulheres, focando no modo como as relações sociais entre os
sexos são construídas.

4) Michel Foucault e Jacques Derrida são importantes influências da terceira onda feminista ter
empreendido um processo de desconstrução da categoria gênero. As contribuições dessas
perspectivas formaram um novo campo de discussão, promovendo inflexões teóricas
importantes. Considerando essas transformações, é correto afirmar que:
A) As perspectivas da década de 60 problematizam a divisão entre noção de sexo como
biológico e gênero como construção social, afirmando que esta distinção, ao constituir uma
divisão binária dos corpos em dois sexos e dois gêneros, mantinha o caráter fixo, imutável e
ahistórico da diferença sexual.

B) O sistema sexo/gênero possibilitou a análise da subordinação das mulheres e das


desigualdades de gênero, influenciando o debate pós-estruturalista no feminismo quando
separa o sistema em duas instâncias: a biológica e a cultural.

C) Nos anos finais da década de 80, os pressupostos do sistema sexo/gênero passaram a ser
questionados em razão da oposição entre sexo e gênero realizada por essa teorização.

D) Para as discussões feministas da década de 80, sexo descreve os aspectos biológicos,


enquanto gênero compreende a construção social sobre as diferenças entre homens e
mulheres.

E) Nessa discussão feminista, sexo opõe-se à normatividade, pois é um dado da natureza e


anterior às normas culturais, existindo, portanto, antes de qualquer ação que procure produzir
os corpos desta ou daquela maneira.

5) O debate sobre o sujeito no feminismo e a constituição de um conhecimento feminista


perpassa toda a trajetória intelectual da teoria feminista e proporciona a formação das
diferentes perspectivas e os conceitos desenvolvidos em cada época.

Essa discussão epistemológica feminista sobre o sujeito mulher perpassa a segunda e a


terceira geração, empreendendo uma crítica ao sujeito do iluminismo. Considerando os
debates sobre essa crítica, assinale a alternativa correta.

A) As críticas à categoria mulher, empreendidas na terceira onda, no interior do feminismo,


indicam que esta categoria, ao configurar-se em uma busca por uma experiência comum de
opressão, produziu hierarquias, subordinações e exclusões, ao não tomar outros marcadores
como constituintes das experiências de subordinação.

B) A noção de sujeito marcada pelo ideal da razão, livre e pertencente ao espaço político, foi
problematizado pelas feministas porque escondia as desigualdades e opressões de gênero,
classe e raça que perpassam as relações sociais e, especificamente, as mulheres enquanto
sujeito.

C) A terceira geração de feministas demonstra que a constituição do sujeito político feminista foi
produzido a partir da ideia de uma unidade entre as mulheres, construindo um universal que
destacava apenas a diferença entre os sexos, mas a mulher como um ser essencializado,
coerente e unitário.
D) Na busca de reconhecimento política para as mulheres, o feminismo, durante as décadas de
60 e 70, construiu uma identidade que conferisse uma unidade, uma história comum de
opressão entre as mulheres, por meio da utilização da categoria “mulher”, tomando a biologia
como critério que une as mulheres enquanto coletividade.

E) A terceira geração de teóricas feministas tem enfatizado as “diferenças de intersecções


múltiplas” entre e dentro das mulheres, indicando que ser mulher é uma categoria histórica e
heterogeneamente construída, sempre em relação com outras categorias (como raça, etnia,
classe, orientação sexual, idade, religião, nacionalidade, etc.) que se modificam e modificam o
que é ser mulher.
Na prática
Cultura do estupro diz respeito à tolerância social à violência sexual, incentivando-a e legitimando.
A Marcha das Vadias foi criada em resposta a essa cultura.

A Marcha das Vadias é um movimento de mulheres que saem às ruas, desde 2011, com seus
corpos cheio de dizeres para denunciar a cultura do estupro e a violência contra as mulheres. Ao
longo dos anos, as pautas da Marcha foram ampliadas, adequando-se às questões e especificidades
de cada sociedade no que tange à luta feminista.

Neste Na Prática, você vai conhecer como a discussão da marcha se relaciona de com um debate
que perpassa as diferentes gerações feministas.

Conteúdo interativo disponível na plataforma de ensino!

Conclui-se que os protestos e os debates em arenas públicas, quando colocam em evidência o


corpo feminino, anunciam que embora ser mulher não é mais exclusivamente definido pela biologia,
é no corpo que ainda se manifesta a opressão e as formas de resistência a ela.
Saiba +
Para ampliar o seu conhecimento a respeito desse assunto, veja abaixo as sugestões do professor:

Quem pode falar? (Grada Kilomba)


Confira o texto de Grada Kilomba, intelectual do feminismo negro, discutindo aspectos importantes
da discussão sobre o lugar de enunciação e de construção de sujeitos no feminismo.

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Descolonização, feminismos e condição queer em contextos


africanos
O artigo aborda, a partir de um deslocamento geopolítico do feminismo, práticas teóricas outras.
Veja a seguir a discussão sobre uma jovem geração de intelectuais que tem problematizado as
normas sexuais e de gênero desde uma posição da fratura colonial.

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Cartografias de si no feminismo da diferença: Amelinha, Gabriela,


Norma
A terceira onda do feminismo é marcado pelo feminismo da diferença. Essa fase emerge de
diferentes formas em cada país e o artigo aborda, as experiências de três militantes brasileiras,
desde o período da ditadura quando emerge o feminismo no Brasil. Confira o artigo a seguir para
conhecer um pouco da história do feminismo no país.
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