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Objetivos da Obra:
A obra tem o objetivo, em um primeiro momento, de fazer uma crítica aos intelectuais
ocidentais, tais como Deleuze e Foucault, para refletir sobre a prática discursiva do
intelectual pós-colonial e sobre a possibilidade de agenciamento do sujeito subalterno.
Ademais, procura, em sua obra, fazer apontamentos sobre a condição etnocêntrica
intrínseca à intelectualidade ocidental quando se trata de sua relação com a projeção da
alteridade. Outro ponto levantado é sobre a própria fala e do espaço para falar, nesse caso,
não seria a falta de uma voz, mas de um lugar/espaço de fala pelo subalterno. A autora
destaca o papel subalterno da mulher, que é duplamente calada na sociedade, como aquela
que não tem voz política ou não é ouvida, seja pela dominação imperial na divisão
internacional do trabalho ou pela dominação masculina na construção ideológica de
gênero.
Argumentos Principais do Autor:
Com trechos em que a autora destaca seus argumentos em favor de suas críticas a
determinados aspectos:
“Este texto se deslocará, por uma rota necessariamente tortuosa, a partir de uma crítica
aos esforços atuais do Ocidente para problematizar o sujeito, em direção à questão de
como o sujeito do Terceiro Mundo é representado no discurso ocidental. Ao longo deste
percurso, terei a oportunidade de sugerir que uma descentralização ainda mais radical do
sujeito é, de fato, implícita tanto em Marx quanto em Derrida. E recorrerei, talvez de
maneira surpreendente, ao argumento de que a produção intelectual ocidental é, de muitas
maneiras, cúmplice dos interesses econômicos internacionais do Ocidente. Ao final,
oferecerei uma análise alternativa das relações entre os discursos do Ocidente e a
possibilidade de falar da (ou pela) mulher subalterna. Usarei como exemplos específicos
o caso da Índia, discutindo, por fim, a situação extraordinariamente paradoxal da abolição
britânica do sacrifício das viúvas” (SPIVAK, 2010, p. 20).
“Assim, a tão difundida crítica ao sujeito soberano realmente inaugura um sujeito.
Argumentarei em favor dessa conclusão considerando um texto de dois grandes
expoentes dessa crítica: "Os intelectuais e o poder: conversa entre Foucault e Gilles
Deleuze"” (SPIVAK, 2010, p. 21).
“...que as redes de poder/desejo/interesse são tão heterogêneas que sua redução a uma
narrativa coerente é contraproducente - faz-se necessário, portanto, uma crítica
persistente; e, segundo, que os intelectuais devem tentar revelar e conhecer o discurso do
Outro da sociedade. Entretanto, ambos os autores ignoram sistematicamente a questão da
ideologia e seu próprio envolvimento na história intelectual e econômica” (SPIVAK,
2010, p. 21).
“O vínculo com a luta dos trabalhadores está localizado no desejo de acabar com o poder
em qualquer local de sua aplicação. Esse local se baseia aparentemente em uma simples
valorização de qualquer desejo destruidor de qualquer poder” (SPIVAK, 2010, p. 24).
“A reprodução da força de trabalho requer não apenas uma reprodução de suas
habilidades, mas também e ao mesmo tempo, uma reprodução de sua submissão à
ideologia dominante por parte dos trabalhadores, e uma reprodução da habilidade de
manipular a ideologia dominante corretamente por parte dos agentes de exploração e
repressão, de modo que eles também venham a prover a preponderância da classe
dominante "nas e por meio das palavras [par la parole]" (SPIVAK, 2010, p. 26-27).
Citações Destacadas:
“Quando Foucault considera a heterogeneidade difusa do poder, ele não ignora a imensa
heterogeneidade institucional que Althusser aqui tenta esquematizar. De maneira
semelhante, ao falar de alianças e sistemas de signos, o Estado e máquinas de guerra
(mille plateaux), Deleuze e Guattari estão revelando exatamente esse campo. Foucault
não pode, entretanto, admitir que uma elaborada teoria da ideologia reconheça sua própria
produção material na institucionalidade, assim como nos "instrumentos efetivos para a
formação e acumulação de conhecimento"” (SPIVAK, 2010, p. 27).
“A ideologia como "falsa consciência" (ser enganado) foi questionada por Althusser. Até
mesmo Reich sugeriu uma relação com as noções de vontade coletiva, em vez de uma
dicotomia entre decepção e desejo desenganado: "Devemos aceitar o grito de Reich: não,
as massas não foram enganadas; em um momento específico, elas realmente desejaram
um regime fascista"(IFD, p. 215) ” (SPIVAK, 2010, p. 28).
“Foucault articula um outro corolário da negação do papel da ideologia ao reproduzir as
relações sociais de produção: uma valorização não questionada do oprimido como sujeito,
o "ser objeto", como Deleuze admiravelmente ressalta: "estabelecer condições nas quais
os prisioneiros seriam capazes de falar por si mesmos". Foucault acrescenta que "as
massas sabem perfeitamente bem, claramente" - mais uma vez, aparece aqui a temática
de não ser enganado - "eles sabem muito mais do que [o intelectual] e certamente o dizem
muito bem" (FO, p. 206-207) ” (SPIVAK, 2010, p. 29).
"A realidade é o que realmente acontece numa fábrica, numa escola, nos quartéis, numa
prisão, numa delegacia de polícia" (FD, p. 212). Essa exclusão da necessidade da difícil
tarefa de realizar uma produção ideológica contra-hegemônica não tem sido salutar.
Acabou por auxiliar o empirismo positivista - o princípio justificável de um
neocolonialismo capitalista avançado – a definir sua própria arena como a da "experiência
concreta", "o que realmente acontece". De fato, a experiência concreta que garante o apelo
político de prisioneiros, soldados e estudantes é revelada por meio da experiência concreta
do intelectual, aquele que diagnostica a epísteme." Nem Deleuze, nem Foucault parecem
estar cientes de que o intelectual, inserido no contexto do capital socializado e alardeando
a experiência concreta, pode ajudar a consolidar a divisão internacional do trabalho” ”
(SPIVAK, 2010, p. 30).
Se este é, de fato, o argumento de Deleuze, sua articulação é problemática. Dois sentidos
do termo "representação" são agrupados: a representação como "falar por": como ocorre
na política, e representação como "re-presentação", como aparece na arte ou na filosofia.
Como a teoria é também apenas uma "ação", o teórico não representa (fala por) o grupo
oprimido. De fato o sujeito não é visto como uma consciência representativa (uma
consciência que "re-presenta" a realidade adequadamente). Esses dois sentidos do termo
representação - no contexto da formação do Estado e da lei, por um lado, e da afirmação
do sujeito por outro - estão relacionados, mas são irredutivelmente descontínuos. Encobrir
a descontinuidade com uma analogia que é apresentada como prova reflete novamente
uma forma paradoxal de privilegiar o sujeito." Visto que "a pessoa que fala e age (...) é
sempre uma multiplicidade"(SPIVAK, 2010, p. 31-32).