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EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA ___

VARA DA FAZENDA PÚBLICA DA COMARCA DA CAPITAL – XX

Ação n° XXXXXXXXXXXXXX

AUTOR, devidamente qualificado nos autos em epigrafe, vem,


respeitosamente a presença de Vossa Excelência apresentar
CONTRA RAZÕES A APELAÇÃO pelos fundamentos a seguir
expostos.

O apelante sustenta a legalidade da incidência do ICMS sobre a


TUSD. Para tanto lança mão de uma série de argumentos, tais como
a ofensa ao principio da igualdade tributária, a impossibilidade de
desvinculação das atividades de geração e de distribuição; a
transformação do produto energia elétrica através da mudança do
nível de tensão que é oferecida a energia elétrica.

O apelante menciona ainda que o STJ teria definido o tema, citando,


contudo, um julgado do TJ/SC a respeito da matéria.

Aliás, a jurisprudência do STJ a respeito do assunto é


diametralmente contrária à pretensão do apelante, senão vejamos:

AgRg no REsp 1135984 / MG SEGUNDA TURMA


Ministro HUMBERTO MARTINS DJe 04/03/2011.
TRIBUTÁRIO. ICMS. DISTRIBUIÇÃO DE ENERGIA
ELÉTRICA. "SERVIÇO DE TRANSPORTE DE
MERCADORIA". INEXISTÊNCIA DE PREVISÃO
LEGAL. CIRCULAÇÃO DE MERCADORIA NA
TRANSMISSÃO DA ENERGIA ELÉTRICA. NÃO
OCORRÊNCIA. SÚMULA 166/ST3 - PRECEDENTES -
SÚMULA 83/STJ
1 - Inexiste previsão legal para a incidência de
ICMS sobre o serviço de "transporte de energia
elétrica", denominado no Estado de Minas Gerais
de, TUST (Taxa de Uso do Sistema de Transmissão
de Energia Elétrica) e TUSD (Taxa de Uso do
Sistema de Distribuição de Energia Elétrica).
2 - "Embora equiparadas às operações mercantis,
as operações de consumo de energia elétrica têm
suas peculiaridades, razão pela qual o fato gerador
do ICMS ocorre apenas no momento em que a
energia elétrica sai do estabelecimento do
fornecedor, sendo efetivamente consumida. Não se
cogita acerca de tributação das operações
anteriores, quais sejam, as de produção e
distribuição da energia, porquanto estas
representam meios necessários à prestação desse
serviço público." (AgRg no REsp 797.826/MT, Rel.
Min. Luiz Fux, Primeira Turma, julgado em
3.52007, DJ 21.6.2007, p. 283).
3 - O ICMS sobre energia elétrica tem como fato
gerador a circulação da "mercadoria", e não do
"serviço de transporte" de transmissão e
distribuição de energia elétrica. Assim sendo, no
"transporte de energia elétrica" incide a Súmula
166/ST3, que determina não constituir "fato
gerador do ICMS o simples deslocamento de
mercadoria de um para outro estabelecimento do
mesmo contribuinte''.

Quanto ao argumento de que o acolhimento da pretensão da autora


importaria em ofensa ao princípio da igualdade tributária, já que,
hipoteticamente, empresas que atuam no mesmo ramo poderiam
adquirir energia elétrica com preço menor — sem a incidência de
ICMS sobre a TUSD este não convence.

Não se pode, a pretexto de salvaguardar um princípio constitucional


(igualdade tributária) ofender expressamente outro princípio
constitucional (legalidade tributária).
Ora, se a cobrança do ICMS é inconstitucional — como reconhecido
na sentença -, em hipótese nenhuma a cobrança em questão pode
ser convalidada a pretexto de prestigiar a igualdade tributária.

A verdade é que a citada igualdade tributária seria melhor observada


se a incidência do ICMS sobre os encargos de distribuição fosse
igualmente afastada para os consumidores cativos de energia
elétrica, onde a TUSD encontra-se embutida na fatura de energia
elétrica.

Quanto ao segundo ponto, dizer inaceitável a desvinculação


econômica da geração e da distribuição é negar o óbvio e ir contra
expressa disposição legal, visto que a Lei 9.648/98, em seu art. 9°,
expressamente prevê a divisão daquelas atividades, podendo
inclusive ser exercidas por empresas completamente diversas.

Se os fornecedores da geração e da distribuição não são os mesmos,


evidente que há, sim, desvinculação econômica, pois os pagamentos
por tais atividades são feitos a pessoas jurídicas distintas, conforme
os documentos de fls. 78 a 129, implicando em obrigações
completamente diversas e independentes destes fornecedores. A
posição do réu é ilegal e ilógica.

Quanto à mudança de tensão, novamente não assiste razão ao réu.


Conforme o contrato de compra e venda de energia às fls. 60/85 e
as notas fiscais fatura das fls. 78/103, a fornecedora de energia
(COMERC COMERCIALIZADORA DE ENERGIA ELÉTRICA LTDA.) não é
obrigada a fornecer a energia em determinada tensão. Esta é uma
obrigação da concessionária, conforme o contrato de uso do sistema
de distribuição às fls. 87/95, o qual na sua cláusula sexta diz
claramente que é de responsabilidade da CELESC entregar a energia
na freqüência de 60 Hertz e na tensão de 13,8 Kv.

Sendo tal obrigação alheia ao fornecedor de energia (COMERC), não


se pode falar em transformação da "mercadoria" energia elétrica. E
querer fazer uma analogia em prejuízo do contribuinte como quer o
réu ao afirmar que há 'praticamente, uma transformação da
"mercadoria" energia elétrica', é pretender querer cobrar imposto
sem previsão legal.

A Constituição Federal prevê a incidência tributária do ICMS —


Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços de transporte
interestadual e intermunicipal e de comunicação de forma exaustiva,
não permitindo que as legislações estaduais prevejam a incidência
deste imposto sobre outros fatos que não os nela previstos, que são
as operações envolvendo circulação de mercadoria, e prestação de
serviço onerosamente de transporte interestadual e intermunicipal e
de comunicação.

Como a Constituição Federal de 1988 e a Lei Complementar n°


87/1996 apenas dispõem sobre a incidência do ICMS sobre a
aquisição de energia elétrica como mercadoria, o uso da rede básica
de transmissão e distribuição de energia elétrica, que passou a
ser, realizado separadamente do seu fornecimento de acordo com o
novo sistema, deixou de se enquadrar na sua hipótese de incidência.

Desconsiderar tais limites e diferenças contratuais nas relações que


envolvem a aquisição de energia elétrica como mercadoria, e o uso da
rede básica de distribuição de energia elétrica, ofende ao tratamento
normativo disposto nas leis n° 9.074195, 9.648/98 e 10.848/02 que
separaram totalmente as operações de geração e comercialização de
energia elétrica das operações relacionadas à sua transmissão e
distribuição, bem como o disposto na Lei Complementar n° 87/96 que
regula este tributo.
A TUSD sequer pode ser incluída na base de cálculo do ICMS pela Lei
Complementar n° 87/1996 como algo que compõe o preço da
mercadoria, já que de forma alguma a mesma constitui seguro, juro,
desconto condicional, frete ou despesa paga, recebida ou creditada
entre o vendedor e o comprador da energia.

A TUSD não pode ser considerada um serviço de transporte ou frete,


como pretendem alguns.

O transporte pressupõe a identidade entre a coisa confiada ao


transportador a aquela entregue ao destinatário, mesmo que se trate
de bem fungível. E ver o Código Civil de 2002, cujas definições, ex vi
do art. 110 do CTN, balizam a compreensão que se deve ter do art.
155, Il, da Constituição, que atribui aos Estados competência para a
instituição do ICMS:

Código Civil
Capitulo XIV - Do transporte
Seção I - Disposições gerais
Art, 730. Pelo contrato de transporte alguém se
obriga, mediante retribuição, a transportar, de um
lugar para outro, pessoas ou coisas.
Seção III - Do transporte de coisas
Art. 743. A coisa, entregue ao transportador, deve
estar caracterizada pela sua natureza, valor, peso
e quantidade, e o mais que for necessário para que
não se confunda com outras,
devendo o destinatário ser indicado ao menos pelo
nome e endereço.
Art. 744. Ao receber a coisa, o transportador
emitirá conhecimento com a menção dos dados
que a identifiquem, obedecido o disposto em lei
especial. (...)"

Ou seja, embora as vendas de energia entre os agentes do sistema


(geradores, importadores, comercializadores e consumidores livres)
sejam contratadas em bases bilaterais, o fato é que os geradores e
os importadores lançam a energia num sistema único integrado pelas
empresas de transmissão e de distribuição, de onde a retiram os
interessados (consumidores).

Isto porque a energia gerada (e adquirida pelo consumidor) é


colocada na Rede Básica que integra o SIN - Sistema Interligado
Nacional, juntamente com a energia de todas as outras geradoras,
servindo a todos os consumidores, sejam industriais, rurais ou
residenciais.
Em virtude deste fato, a energia recebida pelo consumidor não é
necessariamente a mesma que foi colocada no sistema pela
geradora. Assim, como não há forma de individualizar a energia que
foi adquirida pelo autor e carregá-la até sua sede, não se pode falar,
em absoluto, em serviço de transporte.

Por outro lado, a energia elétrica, embora considerada mercadoria


para efeitos legais, não é objeto de transporte, entendido este no
sentido que lhe dá o Código Civil. O que se tem, efetivamente, é um
fluxo de elétrons que passa por um cabo condutor (e não que se leva
por um condutor). Não há condutor transportando energia, mas
apenas a rede de transmissão mantendo o direcionamento da
corrente elétrica. Ou seja, não há transporte físico de mercadoria,
mas, sim, um fluxo de elétrons (trata-se de conceito correlato à
ciência física, e não de um conceito jurídico).

É preciso esclarecer que os elétrons não se deslocam, apenas


transmitem a energia de um para outro elétron, possibilitando o
fluxo de energia, não um transporte da mesma. Isso o que decorre
das características físicas da energia elétrica, onda eletromagnética
que não se estoca e que circula pelos condutores à velocidade de
300.000 km por segundo.

Não há, assim, nenhuma garantia de que a energia recebida por um


desses atores (um consumidor livre, por exemplo) seja aquela
produzida pelo gerador com quem mantém contrato.

Por tais motivos, o serviço relativo àqueles contratos não pode ser
confundido com serviço de transporte, posto que não se caracteriza
como tal, mesmo porque não há coisa corpórea a ser transportada,
mas, sim, um fluxo continuo de energia que deve ser mantido e
direcionado o tempo todo em que os condutores estão sendo
utilizados.
Em outras palavras, o que se contrata são quantidades de energia,
que são liberadas nas linhas de transmissão e de distribuição e
apreendidas por cada agente no limite da demanda que lhe é
autorizada pelo sistema.

Na hipótese de utilização acima desse padrão, o fornecimento é


automaticamente interrompido pelo disjuntor, para os adquirentes
alimentados em baixa tensão, ou são cobradas multas pela
extrapolação do consumo, para os adquirentes alimentados em alta
tensão.

Disto tudo conclui que o serviço prestado não é de transporte, mas


apenas a cessão de disponibilidade dos meios para o direcionamento
da energia elétrica.
Esclarecedora, a esse respeito, a consulta formulada por geradora de
energia elétrica a IVES GANDRA DA SILVA MARTINS A hipótese de
imposição do ICMS nas operações com energia elétrica:
Peculiaridades nas operações Interestaduais. In Revista Tributária e
de Finanças Públicas. São Paulo: RT, n. 39, p. 237-254, jul./ago.
2001. p. 238-239.
É conferir:

"Pelos critérios adotados no Setor Elétrico


Brasileiro, o Gerador, ao colocar sua unidade de
geração em funcionamento, deve providenciar um
contrato de conexão com a concessionária de
Transmissão/Distribuição, no qual o gerador
assume o compromisso de entregar a energia na
qualidade estabelecida pelo Poder Concedente
(representado pela ANEEL). Se a usina estiver
conectada na Rede Básica celebra, também, um
contrato de uso do Sistema de Transmissão com o
Operador Nacional do Sistema (ONS), caso
contrário, o contrato de uso é celebrado com a
concessionária local. Em assim procedendo, o
Gerador tem a garantia de que a energia
disponibilizada pela sua usina tem trânsito
garantido no submercado ao qual está conectado.
Deverá assinar, também, o Acordo de Mercado, o
que lhe garante usufruir dos benefícios da
operação otimizada do Sistema Elétrico. O Gerador
poderá, então, comercializar a energia assegurada
por seu parque gerador hidráulico (montante
fixado pela ANEEL) e a disponibilidade líquida de
seu parque térmico. O comprador, por sua vez, ao
firmar um contrato de compra e venda de energia
com o Gerador, assina, também, o contrato de uso
do Sistema de Transmissão com o ONS para ter a
garantia de que as quantidades contratadas serão
disponibilizadas no ponto de conexão. (—) Vê-se,
então, que é impossível identificar qual é a origem
da energia que está suprindo determinado
comprador, já que todos os geradores entregam a
energia ao Sistema Elétrico e os compradores
recebem a energia deste mesmo sistema. O
Gerador receberá pela energia contratada
independentemente do nível de geração de suas
usinas. Pode vender até o limite de sua energia
assegurada, o qual é estabelecido, como direito,
pela ANEEL. Isto é, o Gerador vende um direito e
não um produto físico efetivo. Ao obter o direito,
tem como contrapartida a obrigação de gerar de
acordo com o programado pelo ONS. (...) No caso
da energia elétrica é possível identificar
fisicamente quanto foi produzido e quanto foi
entregue ao Sistema, que não são
necessariamente iguais, mas não é possível
identificar qual a produção de cada usina que foi
entregue a determinado comprador. A energia
para atender o contrato que assinamos com a
empresa industrial, por exemplo, poderá estar
sendo fisicamente gerada pela geradora do
Estado, ou por qualquer outra geradora de outro
Estado que esteja conectada ao Sistema."

Os esclarecimentos técnicos dão conta da impossibilidade de


considerarem-se a TUSD como remuneração de um contrato de
transporte, donde se depreende a impossibilidade de cobrança do
ICMS discutido também a este título.

Sob o prisma da constitucionalidade, o réu insiste na


constitucionalidade da exigência do ICMS sobre a TUSD. Para tanto
cita o art. 34, § 9° do ADCT, tentando induzir ao entendimento de
'que a TUSD faz parte do preço da energia elétrica. Tal situação só é
verdadeira para os consumidores que adquirem a energia elétrica
diretamente das distribuidoras de energia elétrica e não dos
consumidores que, como o autor, adquire a energia diretamente das
empresas geradoras, pagando para as distribuidoras apenas pelo uso
do sistema de distribuição.

Também alega a possibilidade de incidência com base nos Convênios


ICMS 117/2004 e 135/2005. Porém, cumpre destacar que o CONFAZ
só tem competência para promover a celebração de convênios, para
efeito de concessão ou revogação de isenções, incentivos e
benefícios fiscais do imposto de que trata o inciso II do art. 155 da
Constituição, de acordo com o previsto no § 2°, inciso XII, alínea "g",
do mesmo artigo e na Lei Complementar n.° 24, de 7 de janeiro de
1975, não tendo competência para instituir ou determinar nova
incidência tributária.

O Supremo Tribunal Federal já asseverou em diversos julgamentos o


entendimento de que, salvo a competência do CONFAZ supra
mencionada, o § 8° do art. 3 da ADCT permitiu que este Conselho
estabelecesse convênios com função normativa meramente
suplementar, com o único propósito de eliminar lacunas que possam
ter deixado de ser tratadas por lei complementar:
"TRIBUTÁRIO. EXPORTAÇÃO DE CAFÉ EM GRÃO.
ICMS. BASE DE CÁLCULO. QUOTA DE
CONTRIBUIÇÃO DO IBC. DL 406/68, ART. 2, § 8°.
CONVÊNIO ICM 66/88, ART. 11, EDITADO SOB A
INVOCAÇÃO DO ART. 34, § 8°, DO ADCT.
PRINCÍPIO DA IMUNIDADE TRIBUTÁRIA
RECÍPROCA.

A COMPETÊNCIA DELEGADA AOS ESTADOS, NO


ART. 34, § 8°, DO ADCT, PARA FIXAÇÃO, POR
CONVÊNIO, DE NORMAS DESTINADAS A REGULAR
PROVISORIAMENTE O ICMS, LIMITA-SE PELA
EXISTÊNCIA DE LACUNAS NA LEGISLAÇÃO.

SE A BASE DE CÁLCULO EM REFERÊNCIA JÁ SE


ACHAVA DISCIPLINADA PELO ART. 2, § 8°, DO DL
406/68, RECEPCIONADO PELA NOVA CARTA COM
O CARÁTER DE LEI COMPLEMENTAR, ATÉ ENTÃO
EXIBIDO (ART. 34, § 5°, DO ADCT), NÃO HAVIA
LUGAR PARA A NOVA DEFINIÇÃO QUE LHE DEU O
CONVÊNIO ICM 66/88 (ART. 11), VERIFICANDO-
SE, NO PONTO INDICADO, ULTRAPASSAGEM DO
LINDE CRAVADO PELA NORMA TRANSITÓRIA E
CONSEQUENTE INVASÃO DO PRINCÍPIO
CONSTITUCIONAL DA LEGALIDADE TRIBUTÁRIA.

ACERTADO ENTENDIMENTO DO ACÓRDÃO


IMPUGNADO, SUFICIENTE PARA RESPALDAR SUA
CONCLUSÃO, DISPENSANDO-SE, POR ISSO, O
EXAME DA TESE DA IMUNIDADE TRIBUTÁRIA,
SEM PREJUÍZO DO REGISTRO DE SUA ABSOLUTA
IMPERTINÊNCIA, JÁ QUE NÃO SE ESTÁ DIANTE DE
EXIGÊNCIA FISCAL DIRIGIDA A QUALQUER DOS
ENTES DE DIREITO PÚBLICO BENEFICIÁRIOS
DESSA LIMITAÇÃO AO PODER DE TRIBUTAR.

NÃO-CONHECIMENTO DO RECURSO, COM


DECLARAÇÃO DA INCONSTITUCIONALIDADE DO
ART. 11 DO CONVÊNIO ICM 66/88, DE 14 DE
DEZEMBRO DE 1988. (STF - RE n.° 149.922/SP -
Relator Ministro Ilmar Gaivão J. 23/02/1994 - DJU
9/04/1994, p. 9.733)"

Assim, apesar de o CONFAZ não ter competência para legislar acerca


da incidência do ICMS sobre a energia elétrica, por tal matéria já ter
sido regulada pela lei complementar n.° 87/96 que regulou
exaustivamente as hipóteses de incidência deste imposto, as
legislações d.e diversos Estados têm incorporado o referido convênio
com suas modificações, dando suporte à pretensão dos respectivos
Fiscos, seja por meio de alterações em suas leis, seja por meio de
nova exegese daquela preexistente.

O Estado de Santa Catarina foi um destes Estados que alterou o seu


Regulamento de ICMS, mais especificadamente em seu Anexo 6,
para abarcar as alterações destes convênios, passando a exigir a
cobrança de ICMS sobre a transmissão e distribuição de energia por
meio de alteração legislativa.

Destaca-se que tal exigência tributária não se trata de ICMS


incidente sobre o valor da mercadoria (energia elétrica), pois os
consumidores livres já pagam o ICMS sob esta rubrica ao comprar a
energia das comercializadoras. Neste caso está sendo cobrada ICMS
sobre um contrato de transmissão de energia, além do ICMS sobre a
energia (mercadoria) efetivamente adquirida pelo contribuinte.

Como a discussão sobre a incidência ou não do ICMS sobre a TUSD é


relativamente nova, não há muitos julgados sobre a matéria. Acerca
do mérito desta questão, dos Tribunais pátrios, encontramos apenas
acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais decidindo
pela não incidência de ICMS sobre .a TUSD. Veja-se a ementa do
acórdão prolatado no dia 09/11/2006 na Apelação Cível n°
1.0024.05.643182-8/002 da Comarca de Belo Horizonte de relataria
do Desembargador Darcio Lopardi Mendes:

"EMENTA: ICMS - BASE DE CÁLCULO - TARIFA


PELO USO DO SISTEMA DE DISTRIBUIÇÃO -
ENCARGOS DE CONEXÃO - DESCABIMENTO. A
base de cálculo do ICMS é formada pelo valor da
operação relativa à circulação da mercadoria ou
pelo preço do respectivo serviço prestado,
hipótese na qual não se enquadra a tarifa de uso
do sistema de distribuição nem os encargos de
conexão. A tarifa pelo uso do sistema de
distribuição não é paga pelo consumo de energia
elétrica, mas pela disponibilização das redes de
transmissão de energia. Assim, como os encargos
de conexão, não se pode admitir que a referida
tarifa seja incluída na base de cálculo do ICMS,
uma vez que estes não presumem a circulação de
mercadorias ou de serviços. A base de cálculo do
ICMS deve se restringir à energia consumida, não
abrangendo as tarifas de uso pelo sistema de
transmissão e de distribuição de energia elétrica."
Do corpo deste acórdão podemos perceber que a razão de decidir
pela não incidência do ICMS na TUSD adotada pelo nobre
Desembargador Relator é a mesma acima defendida. Veja-se:

"Nota-se que a tarifa pelo uso do sistema de


distribuição não é paga pelo consumo de energia
elétrica, mas pela disponibilização das redes de
transmissão de energia. Assim, como os encargos
de conexão, não se pode admitir que a referida
tarifa seja incluída na base de cálculo do ICMS,
uma vez que estes não se identificam com o
conceito de mercadorias ou de serviços.
A tarifa pelo uso dos sistemas de distribuição
(TUSD), conforme anteriormente afirmado, é
cobrada do apelante pelo uso ou possibilidade do
sistema de distribuição de energia elétrica da
CFLCL. A referida tarifa constitui serviço, uma vez
que não a transferência de mercadoria se
subsume à energia elétrica, o que já é
devidamente tributado. Em se tratando de serviço
não restrito a transporte interestadual ou
intermunicipal, base econômica para a incidência
do ICMS, nem de comunicação, não há de se falar
em inserção desta tarifa na base de cálculo do
citado tributo. No que concerne aos encargos de
conexão (CCD), o mesmo raciocínio há de ser
aplicado. Por óbvio, não se pode argüir a inserção
da última tarefa na base de cálculo do imposto,
porque eles revelam-se serviços, que não se
relacionam a transporte ou comunicação,
conforme já defendido. Disponibilizar o uso da
rede difere-se de fornecer energia, porque o uso
da rede não significa circulação de mercadorias ou
serviços. Sendo assim, a base de cálculo do ICMS
deve se restringir à energia consumida, não
abrangendo as tarifas de uso pelo sistema de
transmissão e de distribuição de energia elétrica.
Pela não incidência do ICMS sobre o TUSD,
escreve Leandro Paulsen in Direito Tributário:
Constituição e Código Tributário à Luz da Doutrina
e da Jurisprudência, 8 a edição, Ed. Livraria do
Advogado, p. 394: "Transmissão e distribuição de
energia elétrica. 'As linhas de transmissão e de
distribuição são meios necessários para a
propagação do campo elétrico gerado na fase de
geração de energia elétrica, produzindo efeitos nos
elétrons livres existentes na fiação da residência
do consumidor. Nesse passo, inexistindo qualquer
prestação de serviço de transporte nas linhas de
transmissão e distribuição, concluímos que a
atividade praticada pelas concessionárias não se
subsume ao aspecto material do ICMS. Portanto
as receitas auferidas pelas concessionárias de
transmissão e distribuição a título de encargos de
conexão e uso da rede não devem fazer parte da
base de cálculo do ICMS incidente sobre a
prestação de serviço de transporte intermunicipal
e interestadual' (Neto, horário Villen. A Incidência
do ICMS na Atividade Praticada pelas
Concessionárias de Transmissão e Distribuição de
Energia Elétrica. RET no 32, jul/ago/03, p. 41)
"Não-incidência sobre a TUSD e a TUST. "... como
a Constituição e a Lei Complementar no 87/96
provêem a incidência do ICMS sobre o efetivo
fornecimento de energia, no novo modelo setorial,
não se enquadra na hipótese de incidência desse
imposto (disponibilizar uso da rede é diferente de
fornecer energia). [...] Enquanto a Constituição
Federal e a legislação complementar
determinarem que o ICMS incide sobre o efetivo
fornecimento de energia e que a sua base de
cálculo é o preço da operação da qual decorrer a
saída (operações internas ou a entrada (operações
interestaduais) da energia, as tarifas de uso dos
sistemas de distribuição e de transmissão não
serão passíveis de incidência desse imposto
estadual' (Saliba, Luciana Goulart F.; Rolim, João
Dárcio. Não-incidência do ICMS sobre as Tarifas de
Uso dos Sistemas de Distribuição (TUSD) de
energia elétrica. RDDT 122/50, nov/05)"

Portanto, a conclusão do referido acórdão foi no sentido de que,


como o ICMS só incide sobre as hipóteses constitucionalmente
qualificadas, e entre elas não está o uso do sistema de distribuição, é
evidente que não pode incidir sobre este o referido imposto.

Já o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, analisando a


matéria em Agravo de Instrumento interposto pela Fazenda do
Estado de São Paulo, contra decisão monocrática que deferiu pedido
de tutela antecipada pelo qual consumidor livre postulou a suspensão
da incidência do ICMS sobre a Tarifa de Uso do Sistema de
Distribuição -TUSD - de energia elétrica, em sede de cognição
perfunctória, desproveu o recurso por entender presente a
verossimilhança da alegação e o perigo de demora. Veja-se a ementa
do julgado:

"TUTELA ANTECIPADA. TRIBUTÁRIO. TARIFA DE


USO DO SISTEMA DE DISTRIBUIÇÃO - DEMANDA
RESERVADA. NÃO - INCIDÊNCIA DE ICMS.
Pretendida declaração de inexistência de relação
jurídico - tributária quanto à exigibilidade de ICMS
sobre demanda reservada de energia Presença de
verossimilhança da alegação - hipótese de
incidência do ICMS restrita às I operações
relativas à circulação de mercadorias e sobre
prestações de serviços de transporte interestadual
e intermunicipal e de comunicação' (art 155, inciso
II da Constituição Federal) e perigo de demora
Tuteia antecipada concedida Recurso desprovido.
(Agravo de Instrumento no 682.046-5/2-00 -
Relator Desembargador Nogueira Diefenthaler -
Julgado em 13/08/2007)"

Não poderíamos deixar de mencionar o fato do réu se abster de


analisar a questão da ilegalidade da incidência do ICMS na TUSD sob
a ótica dos componentes da TUSD. Conforme colocado na exordial, a
TUSD é composta de uma série de subsídios, taxas e contribuições
que não são, de forma alguma, fatos geradores do ICMS.

A ilegalidade da cobrança do ICMS sobre a TUSD fica evidente ao


constatarmos que o ICMS está incidindo na verdade sobre:
PRO1NFRA -Programa de Incentivo ás Fontes Alternativas de Energia
Elétrica (subsidio); CCC - Conta de Consumo de Combustíveis
(subsídio); TFSEE - Taxa de Fiscalização de Serviços de Energia
Elétrica; e outros tantos listados na exordial.

Mesmo na hipótese da incidência do ICMS sobre a TUSD ser


considerada legal pelo Poder Judiciário - o que só se admite a título
de argumentação - deve ser expurgada sua cobrança sobre todos os
componentes da TUSD que não representem a remuneração pelo uso
do sistema de distribuição.

Assim, pode-se concluir que inexiste previsão na Constituição Federal


para a cobrança de ICMS sobre a TUSD na forma disposta no
Convênio ICMS n° 117/2004, alterado pelos Convênios ICMS n° 59 e
135 de 2005, e nem na legislação estadual que seguiu tais
disposições conveniais, sendo inconstitucional a exigência de ICMS
sobre a TUSD.
Diante do exposto, pugna pela improcedência do apelo, mantendo
integra a decisão recorrida.

Pede deferimento.

Cidade e data

Advogado.

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