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Membro Externo: Prof.ª Dr.ª Elisabete Monteiro – UNISAL
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Membro Interno: Prof.ª Dr.ª Renata Sieiro Fernandes – UNISAL
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Orientadora: Prof.ª Dr.ª Norma Sílvia Trindade de Lima – UNISAL
Dedico este trabalho à minha mãe Maria Aparecida Fioretti Caires (in Memorian), pelo
amor eterno, pelo incentivo desde cedo ao estudo, e, sobretudo, pelas palavras que
constantemente me soam à memória e continuam a me constituir. Agradeço a você, mãe
querida, pela oportunidade de concretizar esta etapa e realizar mais um dentre tantos
outros sonhos.
AGRADECIMENTOS
À minha família, em especial à minha mãe, Maria Aparecida Fioretti Caires (in
memoriam), e ao meu pai Edson Roberto Caires, pelo incentivo constante, e pelas
palavras, que subjetivamente, tornaram-me a pessoa que hoje sou.
Aos meus amigos e familiares, em especial, à minha avó Dayse Cria Fioretti, por
estar sempre presente e pelo interesse em minhas atividades.
John Dewey
Resumo
Esta pesquisa busca problematizar a relação entre meio afetivo familiar e ambiente
escolar de crianças na faixa etária de três a seis anos de idade, matriculadas em uma
escola municipal de educação infantil de Campinas, bem como identificar os regimes de
verdades proeminentes nos espaços escolares e familiares dos participantes. O trabalho
se inicia com um estudo exploratório feito a partir de queixas recorrentes de professoras
sobre o comportamento de determinadas crianças. Num primeiro momento, foram feitas
entrevistas com as professoras e familiares, além da observação do comportamento das
crianças no cotidiano escolar e buscou-se analisar as produções artísticas, com base nas
técnicas psicopedagógicas propostas por Chamat (2004). O estudo bibliográfico pautou-
se em Vigotsky, Piaget e Wallon. Todavia, a partir dos dados coletados o trabalho é
reconduzido tanto em referencial metodológico quanto teórico, com o propósito de
ampliar as possibilidades de análise e reflexão e dar visibilidade às concepções infantis
sobre a família nas quais as crianças da referida escola se inserem. A pesquisa foi,
então, deslocada para um estudo de caso, em âmbito escolar, a partir da proposição do
desenho comentado e da brincadeira de faz de conta. Os dados obtidos nessa etapa
foram ancorados, sobretudo, à luz das concepções foucaultianas. Constatou-se que,
nesta realidade escolar, o modelo de educação infantil mostra-se desvinculado das
asserções infantis e carente de articulações construtivas com a família. Nesse entorno,
há a veiculação de práticas discursivas sobrecarregadas por estereótipos acerca da
criança e seu meio, que se evidenciam através dos diferentes modos de subjetivação
existentes nas ações escolares. O presente trabalho aponta para a necessidade de
mudanças na globalidade da instituição escolar analisada, tendo início pela
reflexibilidade sobre a prática pedagógica e reconhecimento da singularidade de cada
criança.
This research aims to analyze the relation between affective family environment and
school environment for children aged between three and six years old, enrolled in a
Campinas public preschool, and identify the regimes of prominent truths in school and
participants family. The work begins with an exploratory study from teachers recurring
complaints about of some children's behavior. At first, interviews with teachers and
family occur, the behavior of children in daily school was observed and we seek to
analyze the artistic productions based on psycho-pedagogical techniques proposed by
Chamat (2004). Here, the bibliographical study is guided by Vygotsky, Piaget and
Wallon. However, the data collected from the survey is renewed if both methodological
and theoretical referential in order to expand the possibilities of analysis and reflection
and give visibility to children's conceptions about the family in which the children of
this school are located. The work is then shifted to a case study in the school
environment, by proposing drawing and commented game of make-believe. The data
obtained in this step are anchored, particularly in Foucauldian concepts. It appears that
this school reality, the model of early childhood education is shown detached from the
infant and assertions devoid of constructive links with the family. In this environment,
there is the placement of discursive practices burdened by stereotypes about the child
and his environment, which is evident through the different modes of subjectivity in the
existing school actions. This work points to the need for changes in the whole of this
educational institution, starting by reflectivity on pedagogical practice and recognition
of the uniqueness of each child.
INTRODUÇÃO...............................................................................................................12
ANEXOS ......................................................................................................................139
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INTRODUÇÃO
A trajetória deste trabalho se inicia em dois mil e dez, momento em que assumi
o cargo de professora em um Centro Municipal de Educação Infantil, localizado na
cidade de Campinas. Logo que ingressei nesta escola, deparei-me com uma situação que
chamou muito a minha atenção: a preocupação das professoras com relação a algumas
crianças de suas turmas.
Primeiramente, as docentes mencionavam que, ao propor atividades, como, por
exemplo, um desenho, determinadas crianças rabiscavam a folha de papel e entregavam
com rapidez, dizendo que não sabiam fazer ou que já haviam terminado. Em outros
momentos, como, em uma roda de conversa, muitas se dispersavam, e ao invés de
atentarem para o que estava ocorrendo naquele momento, começavam a brincar com os
colegas do lado, ou então, com objetos que lhes estavam próximos.
Tais crianças, ou por não se interessarem pelo rol de atividades propiciado ao
grupo, ou por se mostrarem mais agitadas e inquietas que as demais, tornavam-se
motivo de grande preocupação, no que se refere ao seu próprio desenvolvimento, e ao
dos colegas que estavam sendo, de alguma forma, “atrapalhados” por eles. O grupo
docente, então, por meio de conversas constantes, era levado a acreditar que, de fato,
aquilo era uma situação prejudicial, e isso, aos poucos se tornara uma verdade absoluta
e praticamente imutável. Como um meio alternativo, certas vezes, buscava-se verificar
junto aos pais o que estava acontecendo.
As famílias eram assim convidadas a participar, não do contexto educativo em
si, mas de reuniões para contar e ouvir acerca do comportamento dessas crianças.
Muitas delas, ao longo destes anos, expuseram suas intimidades, pois enxergaram na
figura do professor, alguém a quem poderiam confiar seus segredos, principalmente, em
benefício de seus filhos.
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suas particularidades, vai se mostrar interessada por determinada ação dentro do espaço
pedagógico, independentemente da faixa etária atendida.
Nesse contexto surgem vários questionamentos, dentre os quais: Será que o
comportamento da criança está diretamente relacionado ao contexto familiar em que ela
vive? Será que, realmente há uma situação problemática no que se refere à disposição
das crianças em agrupamentos? A conduta pedagógica é capaz de englobar e respeitar
os interesses e a singularidade de cada uma delas?
A partir dessas indagações iniciamos a escrita de um projeto de pesquisa, com a
intenção de problematizar, e, principalmente, de poder, de alguma forma, contribuir
para a melhoria da realidade escolar mencionada. Essa busca incessante por respostas
culminou na pesquisa em questão. Trata-se de uma investigação de abordagem
qualitativa que se debruça sobre um tema de grande relevância nos dias atuais: o
contexto pedagógico e sócio afetivo de crianças, no âmbito da educação infantil.
Nosso trabalho buscou, sobretudo, compreender a relação entre o meio familiar e
o ambiente escolar, na educação infantil de crianças de três a seis anos, matriculadas em
uma escola da prefeitura de Campinas. Teve como objetivos principais: problematizar a
relação existente entre esses espaços, e identificar os regimes de verdade proeminentes
nos ambientes familiares e escolares das crianças participantes. Os propósitos
específicos foram: detectar as principais queixas escolares por meio de entrevistas com
as professoras; observar o comportamento da criança no cotidiano escolar; estabelecer
relações teóricas entre escola e meio afetivo familiar; questionar a relação afetiva da
criança com a família, por meio de conversas com os familiares e da descrição das
narrativas infantis, a partir do desenho comentado sobre a família e descrever, tanto os
desenhos produzidos pelas crianças, quanto à representação da dinâmica familiar
evidenciada durante a brincadeira de faz de conta.
O disparador deste estudo, certamente, foi o discurso das professoras, acometido
por queixas recorrentes acerca de determinadas crianças, com sinais sugestivos de um
processo educacional prematuro fadado ao fracasso. Essa constituição discursiva,
carregada, de ideais subjetivos foi o que nos instigou a realizar uma pesquisa que
pudesse contemplar a multiplicidade existente na díade escola de educação infantil e
família daquela comunidade escolar, buscando problematizar o porquê deste ambiente
se mostrar tão insatisfatório, segundo o relato das próprias professoras.
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das sete crianças que se mostraram interessadas em participar das atividades, além da
narração das brincadeiras, nos três dias em que a propusemos.
O segundo capítulo apresenta a temática “relação família e escola” por meio de
uma problematização que busca retratar a realidade vivenciada, no ano letivo de 2011
por uma das crianças desta instituição escolar. Conta com um levantamento
bibliográfico realizado por meio da base de dados da CAPES acerca das produções
acadêmicas nacionais dos últimos cinco anos, nos níveis de Mestrado e Doutorado,
paralelamente à indicação de alguns referenciais teóricos, de acordo com o assunto
abordado. Através de palavras-chaves como afetividade, desempenho escolar, família e
educação infantil foi possível localizar um total de nove trabalhos que puderam trazer
contribuições para nossa pesquisa.
O terceiro capítulo contempla diversos assuntos que se revelaram importantes
para o desdobramento do nosso trabalho. Inicia-se a partir de um breve entendimento
sobre o desenvolvimento humano, numa relação sobre o tema. Além de permitir a
explanação do conceito de infância e suas transformações ao longo dos anos, tanto no
seio familiar quanto na escola. Relacionam-se a isso, as concepções foucaultianas, de
forma a buscar um entendimento sobre os processos de subjetivação existentes e, que,
cotidianamente, se disseminam no processo de interação, na família, e principalmente,
no interior escolar. Busca uma compreensão das especificidades da instituição de
educação infantil, fazendo um comparativo com as escolas italianas de Reggio Emília.
Coloca a importância da apreensão dos sinais emocionais transmitidos pelas crianças e,
enfim, traz a brincadeira de faz de conta e o desenho livre como meios lúdicos pelos
quais as crianças são capazes de se expressarem simbolicamente. Este capítulo se
respalda em linhas de pensamento de diversos autores, com início nos pressupostos da
área da Psicologia, com Wallon, Vigotsky e Piaget até culminar com a teoria filosófica
de Foucault.
O quarto capítulo centra-se na discussão e análise dos dados que foram
coletados, tanto no estudo exploratório, quanto no estudo de caso. Permite uma
explicação analítica e crítica, sobretudo a partir de Foucault, da realidade até então
investigada na escola de educação infantil aqui analisada. Com isso, encaminha-nos
para uma reflexão sobre possíveis melhorias dos problemas ali verificados.
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CAPÍTULO I
O CENTRO DE EDUCAÇÃO INFANTIL E A SINGULARIDADE DE
SEUS SUJEITOS
rabiscadas com cores escuras tornaram-se desenhos coloridos, ainda pequenos, mas
notáveis.
Com base em inúmeras situações parecidas com essa, e, clamando pela urgência
em refletir como estão as crianças desta comunidade escolar, é que suscitamos a
vontade pelo trabalho ao qual nos propusemos. Desta maneira, a nossa pesquisa buscou
problematizar a relação entre ambiente escolar e afetividade familiar por meio de um
estudo que agrega duas instituições complementares: a família e a escola, além de
identificar os regimes de verdade veiculados através do discurso do adulto que fala
sobre a criança.
No decorrer do estudo, muitas indagações foram levantadas dentre elas: Qual a
percepção das professoras sobre o assunto? E dos pais? E o que pensam as crianças
sobre a dinâmica familiar na qual estão inseridas? A busca por estas e outras tantas
respostas foi capaz de instigar ainda mais a investigação sobre esse assunto.
A partir de então, buscamos realizar um estudo com crianças na faixa etária
entre três e seis anos de idade, matriculadas no Centro de Educação Infantil da cidade de
Campinas em que efetuamos nossas experiências. Em linhas gerais, este estudo partiu
da investigação sobre a afetividade no âmbito familiar e sua relação com a pré-
disposição das crianças em participar das atividades durante o cotidiano escolar, o que
culminou com a busca pela identificação dos regimes de verdades veiculados tanto no
ambiente da família quanto no da escola das crianças participantes.
região sudoeste da cidade de Campinas e mostra-se hoje singelo, com casas simples de
alvenaria. Contudo, a participação da comunidade pela busca de melhorias é sempre
ativa e, ao longo dos anos, tem demonstrado resultados positivos.
De acordo com dados do Projeto Político Pedagógico da escola, referente ao
ano letivo de 2012, o bairro surgiu a partir da venda de terras do dono de uma cerâmica
para os seus funcionários nas décadas 1970. Estes acabaram revendendo seus lotes a
pessoas, de outras cidades e estados que construíram suas casas. Nessa época, o bairro
não dispunha nem mesmo de saneamento básico ou rede de esgoto. Com o intuito de
realizar melhorias para a população, surgiu a Sociedade Amigos do Bairro.
Com o passar dos anos, verificou-se a necessidade de um lugar adequado para
a educação das crianças e saúde da comunidade. Para isso, a Sociedade Amigos do
Bairro solicitou à prefeitura a construção de um posto de saúde e de uma escola de
educação infantil que pudessem atender às especificidades do local ainda emergente.
O Sr. Cândido, dono de uma fábrica de cerâmica, por sua vez, doou à prefeitura
um de seus terrenos, que dificilmente conseguiria vender, uma vez que por ele passava
um pequeno córrego. A escola foi ali construída e inaugurada no dia 26 de outubro de
1980, com a presença do então prefeito Francisco Amaral, além de várias autoridades,
funcionários contratados para trabalhar no local, bem como da comunidade.
O contingente escolar localiza-se no bairro Jardim Capivari, bem como em seu
entorno, como o Jardim Campos Elíseos, São João, Ouro Verde e Vida Nova.
Atualmente, o bairro conta com uma boa infraestrutura, a qual inclui: posto de
saúde, escolas, supermercados, igrejas, associação de moradores, quadra poli esportiva,
campo de futebol, parque infantil, bazar, lojas e farmácias.
O Centro de Educação Infantil que estudamos atende cerca de trezentas e vinte
e cinco crianças de quatro meses a cinco anos e onze meses, em períodos parcial e
integral, e, a cada dia, recebe novas solicitações de matrícula, sobretudo, por intermédio
de mandado judicial. Possui um total de nove salas de aula, nos agrupamentos I (de 3
meses a 1 ano e 5 meses), II ( de 1 ano e 6 meses a 2 anos e 11 meses) e III ( de 3 anos a
5 anos e 11 meses), distribuídas, conforme tabela:
1
O conceito de disciplinarização aparece em Gore (1994), a partir das postulações de Foucault.
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Foucault tematiza também sobre os regimes de verdade. Encontramos esse assunto em Larrosa (1994) e Deleuze
(2013).
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educador retrata casos nos quais a família, por não possuir bases familiares tradicionais,
é simplesmente considerada a grande vilã.
O olhar deste, então, vem carregado por estereótipos sobre o que pensa a
respeito das crianças e de suas famílias. Tais pensamentos acabam sendo veiculados ao
longo dos dias e até mesmo no decorrer dos anos letivos. É como se não houvesse mais
soluções para determinadas crianças, uma vez que o contexto familiar no qual estão
inseridas é “desastrososo”.
Assim, não se considera que, às vezes, aquela criança que não está “dando
trabalho” também pode viver, em casa, situações muito difíceis. E ainda, que muitos dos
que carregam consigo a fama de serem agitados, ou de terem um comportamento
inapropriado, poderiam o ser da mesma maneira, mesmo que tivessem nascido em outra
família, seja esta nuclear, ou ainda, com poderes aquisitivos altos.
Existe no meio docente, o desejo de que as crianças se desenvolvam, aprendam
em interação, brinquem e se alimentem bem. Os aspectos relacionados tanto ao cuidado,
quanto à educação formal, caminham juntos. Por outro lado, idealiza-se que elas
permaneçam nos lugares, participem quando solicitadas e realizem suas atividades,
mesmo quando não querem, com empenho e capricho. Assim, ainda que, em
determinados períodos do dia, a disposição escolar se mostre progressista, há, no
percurso da dinâmica, a veiculação de atitudes e desejos que concernem à pedagogia
tradicional.
Gore (1994), mostra alguns exemplos que nos ajudam a entender sobre esse
assunto. Um deles refere-se às práticas de dispor as carteiras em círculos. Tal
organização se contrapõe à disposição tradicional da sala de aula, na qual os estudantes
sentam-se em fileiras, um atrás do outro, confrontam diretamente a nuca dos colegas e
encontram tão somente o olhar do professor. O círculo, ao contrário, permite uma
interlocução e uma participação maior dos discentes. Contudo, de nada adianta dispor
as crianças desta maneira, se a conduta do educador permanecer a mesma. Assim, essa
prática libertadora não servirá como ponto de partida para a busca da pedagogia
emancipatória.
Dinâmica da aplicação
-Predisposição para a tarefa
-Presença dos processos de recalque
-Envolvimento com a tarefa
-Presença de outros mecanismos
Desenho
-Maturidade cognitivas-Presença de afetividade
-Indicador de autoestima
-Como o sujeito se coloca geograficamente no papel
-Significantes e significado de seu desenho
-Como o sujeito se coloca afetivamente no contexto
-Indicador de envolvimento consigo mesmo e a aprendizagem
-Aspectos motores
Relato oral
-Função semiótica (elaboração significativa)
-Cognição: esquemas ou estruturas de pensamento
compatíveis com a idade
Níveis de aspiração
Indicadores de uma problemática emocional que impede o
vínculo com o conhecimento
Indicadores de uma problemática nas relações familiares
que impede ou “atrapalha” a aprendizagem
Comparação com a pareja educativa
A análise das produções buscou apoiar-se ainda em outros itens que foram
levantados e observados, de acordo com estudos de Chamat (2004), como:
representação harmônica das partes do corpo; omissão de alguma(s) parte(s) do corpo;
presença de sombreamento do rosto, corpo ou membros; assimetria grosseira das
extremidades; figura inclinada, pequena ou grande; aspectos da cabeça (pequena,
grande, etc.); características (ou ausência) dos órgãos do sentido (nariz, ouvido, boca,
olhos); representação dos membros do corpo (curtos ou compridos); presença de figuras
complementares (sol, lua, pessoas); aspectos que retratam alegria ou tristeza.
A partir desses elementos, conseguimos obter dados que puderam contribuir para
uma reflexão acerca dos próximos passos que iríamos realizar em nosso trabalho. A
título de elucidação, iremos relatar agora, uma das três entrevistas realizadas com as
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professoras, além da exposição de dois dos dez casos das crianças que faziam parte do
grupo de alunos indicados por suas professoras.
Sobre P.M.S. ela diz: “não se concentra durante as atividades, atrapalha a roda
de conversa, às vezes é agressivo com os colegas. Passa alguns finais de semana com o
pai, que parece não dar muita atenção a ele”.
E com relação à J.B.L.S. a professora relata que “a menina não tem pai” e
continua “o contexto familiar é difícil, a mãe troca de namorado com uma frequência
muito grande e apresenta para a criança como se fosse o pai dela. A menina quer
chamar a atenção, bate, arrasta a cadeira, não fica onde é para ficar, fala mal das outras
crianças, irrita a turma. A mãe passa uma imagem negativa do pai à criança, dizendo
que ele a abandonou e ela reproduz a fala da mãe”.
Como este trabalho não irá abarcar o contexto da educação especial, optamos
por focar a explanação, de caráter exemplificativo, desses dois últimos casos citados
pela professora E.R., a partir de então.
J.B.L.S. é uma menina, na época, com quatro anos que, na maior parte do
tempo, parece querer chamar a atenção, batendo nos colegas, arrastando cadeiras,
falando palavrões e provocando os amigos.
Apesar de mostrar-se inquieta durante a roda de conversa, demonstra estar
atenta ao que é falado, pergunta e participa ativamente. A professora indaga sobre o que
está acontecendo em casa, então, ela conta um pouco de sua nova perspectiva familiar
“vou morar com o R. (namorado da mãe) e meu irmão vai morar com a minha tia”.
No momento em que a professora propõe a ela a realização de uma atividade
de pintura e colagem de papel crepom, mostra-se interessada e, mesmo inquieta, faz
seus trabalhos com muito capricho. Durante as brincadeiras no parque, recorre à
professora várias vezes para fazer comentários sobre os colegas até que acaba, sem
querer, machucando um deles.
Nesse dia, o momento da refeição apresenta-se um tanto tumultuado. J.B.L.S.
corre para pegar a comida antes dos colegas. E, com o prato feito, enche a boca com o
alimento, come tudo e, ainda, repete.
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Ao ser realizada a entrevista com a tia, responsável pela menina, ela a descreve
como “terrível, agitada, uma criança que não para, que briga com o irmão maior e bate
nele”.
A mesma conta que a criança mora com ela, a avó e o irmão (por parte de
mãe). O pai do irmão de J.B.L.S. paga a pensão todo mês e acaba por sustentar a família
toda sozinho, inclusive a menina, fruto de outro relacionamento de sua ex-mulher. Esta,
contudo, não colabora no que se refere às despesas dos filhos e, até o momento, tem
relegado os cuidados destes, deixando-os por conta da tia. Em casa, as crianças somente
tomam o café da manhã e jantam, portanto, geralmente vão à escola sem almoçar.
A mãe trabalha como auxiliar de limpeza em um shopping em Campinas e o
namorado é segurança. “Eles trabalham num dia e folgam noutro”. Todavia, mesmo a
mãe sendo solicitada a comparecer à escola, diz que não tem tempo para ir. Com relação
ao pai, não fora possível localizá-lo. A mãe da menina pretende se mudar para outro
bairro com o namorado, mas ainda não sabe se irá levá-la junto com ela ou não. O
menino ficará sob os cuidados da tia, que ressalta que o namorado da mãe “não aceita as
crianças”.
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Durante o relato, a tia expõe ainda que o pai biológico da menina a abandonou
há cerca de dois anos e, desde então, nunca mais apareceu. Envolvido com o tráfico de
drogas, precisou deixar o país com medo de ser encontrado, tanto por policiais quanto
por outros traficantes. No final do ano, soubemos que o pai fora assassinado.
Observam-se muitas adversidades na vida afetiva e familiar desta criança. A
imagem passada a ela com relação ao pai é de grande negatividade, e, para suprir tal
carência, a mãe chegou a apresentar à criança o atual namorado como sendo o seu novo
“pai”.
Seu desenho representativo do eu “real” é repleto de cores, com olhos grandes,
sorriso largo e braços abertos. Como ela de fato parece ser: uma criança afoita, curiosa e
ativa.
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1. Amostra composta por sete crianças com idade entre três e seis anos que se
mostraram interessadas em participar do estudo.
Demartini (2005), afirma que há mais de vinte anos, já havia uma inquietação
que apontava para a incorporação de alguns sujeitos na elaboração dos projetos. A
autora cita Maria Isaura Pereira de Queiróz, que desde mil novecentos e setenta e seis já
afirmava que existia uma supremacia dos adultos em relação às crianças, aos jovens e
aos idosos. A educação, assim, é formulada a partir de uma dominação do adulto sobre
essas três categorias, dominadas.
No mundo atual, principalmente na sociedade ocidental, os adultos ocupam
funções de dominação, uma vez que são eles que definem os valores fundamentais da
educação, estruturando a imagem do homem idealizado pelos jovens e crianças. Nesse
sistema, há o estereótipo de que jovens, crianças e idosos estão segregados e devem se
curvar diante dos adultos, que, preponderantemente, exercem o poder. Diante de tal
esquema, o sentimento de impotência se acumula e a barreira estabelecida tende a
aumentar, excluindo-se a participação efetiva das categorias acima mencionadas.
Com base em tais informações, procuramos dialogar com essa classe de
interlocutores que se difere da dos adultos, de forma a propiciar momentos favoráveis
para a sua exposição oral infantil por meio de relatos sobre o desenho produzido, ou,
então, no contexto lúdico, pela brincadeira de faz de conta.
Para tanto, foi preciso levar em conta, além do relato, a experiência vivenciada
pelo grupo de crianças participantes, uma vez que
(...) é impossível tratar dos relatos de crianças pensando que todos eles são da
mesma natureza. A questão dessa heterogeneidade dos tipos de criança, do
tipo de infância vivenciado, é uma questão que o pesquisador sempre se deve
colocar. (DEMARTINI, 2005, p.5).
3
(...) O desenho seria um instrumento oferecido para que, sem tornar a escola de educação infantil um
espaço terapêutico em busca de fases do desenvolvimento psíquico ou mesmo de enquadramento de
crianças em padrões de normalidade, pudéssemos conhecer mais sobre os olhares e as concepções que as
crianças pequenas têm de seu universo, que é também por elas construído, vivenciado, imaginado,
desejado, desenhado. (GOBBI, 2005, p. 87).
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próprias concepções de vida. Falar sobre os pequenos denota muitas vezes, a evidência
de opiniões emolduradas por juízo de valores e convicções de verdades.
Há que se entender que, dependendo dos sujeitos que relatam, podem ocorrer
diferentes maneiras de se conceber a infância e o conceito de criança em si. É
importante levar em consideração também, o sentimento que está imbricado nas
relações, os diferentes meios vividos e a diversidade das situações existentes no
contexto em questão.
Geralmente, os professores já trazem consigo concepções divergentes à
realidade educacional nas quais profissionalmente, inserem-se e, ao se depararem com a
dificuldade em estabelecer uma prática pedagógica condizente com suas expectativas,
buscam problematizações que possam justificar o insucesso em suas vivências
pedagógicas.
De acordo com Gore (2005), o conteúdo dos discursos emergentes nas relações
escolares está carregado por relações de poder, que invocam determinadas noções de
verdade. São discursos que fazem com que determinadas coisas sejam mais valorizadas
do que outras.
Nesse sentido, temos muitos exemplos que aparecem nos discursos, a começar
pela educação infantil. Para muitos professores, a verdade institucionalizada é que a
criança quieta e participativa aprende mais. Essa posição revela o disciplinamento como
algo benéfico e perpetua os meios disciplinares existentes.
Muitos professores acreditam, por exemplo, que a família instituída nos moldes
nucleares é capaz de demandar melhores possibilidades aos seus filhos, ou seja, é como
se houvesse o estabelecimento de um regime de verdade, no qual instintivamente,
excluíssem-se, de antemão, todos aqueles que não vivem em uma situação familiar
considerada “adequada” para o seu desenvolvimento.
No decurso dos dias, posições como estas são repassadas a essas crianças, e
assim, subjetivamente eles vão se constituindo por verdades que poderiam ter sido
desmistificadas. A verdade até então emergente, aos poucos, interioriza-se no sujeito e o
engendra paulatinamente como pessoa. Assim, falar sobre alguém requer cautela, pois
implica em valores e conceitos, que podem ser difundidos, conforme a crença e aos
ideais do sujeito que enuncia.
A partir dessas problematizações, sentimos a real necessidade de conduzir o
campo de observação, prioritariamente, para a análise da narrativa infantil, de forma a
refutar os dados obtidos até então, durante o estudo exploratório.
Dessa maneira foi preciso verificar as marcas de cada criança, bem como seus
processos de socialização. E ainda, levar em consideração que muitas delas falam pouco
ou não falam nada, como explica Demartini (2005):
(....) A sociologia tem poucos estudos, mas tem alguns casos que são
exemplares de como os processos de socialização vivenciados vão se refletir
na construção de relatos, que são diferentes. Então temos as crianças que
falam, mas também temos processos de socialização que levam a não falar (a
criança se recusa a falar, ela não quer falar). É importante apreender esses
diferentes contextos e também aprender a trabalhar com aquilo que não é
dito, porque temos, principalmente no caso de crianças, esse contexto de
“pouca fala” (...). (DEMARTINI, 2005, p. 8).
Isso demanda uma grande sensibilidade por parte do pesquisador que necessitará
entender um contexto que se configura, muitas vezes, por “pouca fala”. Todavia, no
campo educacional, mesmo as crianças que falam pouco, de uma maneira ou de outra,
traduzem suas palavras, suas emoções. Esses pensamentos ou sentimentos poderão ser
observados, por exemplo, tanto nos relatos orais quanto em contextos lúdicos, nos quais
elas simplesmente estão brincando4.
4
Como já foi colocado anteriormente, têm-se os relatos das crianças que falam e das crianças que não
falam; mas também se tem a possibilidade de analisar a representação artística de crianças; chamou-me a
atenção, assistindo a um filme, o desempenho de criancinhas pequenas que trabalhavam nele; e era
impressionante a desenvoltura daquelas crianças de cinco, seis aninhos trabalhando no filme. Então, são
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as crianças que representam. Elas não só argumentam, mas representam, e a gente esquece, às vezes, que
a criança “está representando”. Assim, existe outra possibilidade que é a observação dos relatos e da
atuação das crianças que representam no teatro, no cinema, na televisão. (DEMARTINI, 2005, p. 12).
44
B.M.H.F. é uma menina, de cinco anos de idade, a qual relata ter desenhado o
pai e a mãe na casa onde moram. Ela não está na imagem, e diz: “é porque lá na minha
casa não tem lugar pra brincar”. E então, pergunto: “você está em que lugar?” e ela diz:
“eu fui para a chácara da minha avó e do meu avô”; e continua contando que, às vezes,
os pais vão juntos, quando não estão trabalhando, depois conclui a conversa dizendo “eu
gosto da minha família”.
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G.N.M. é uma menina e está com quatro anos. Durante a conversa, conta que
desenhou a mãe, o pai, “coração”, ela e um quintal. Então pergunto: “o que vocês estão
fazendo?” E ela responde: “eu tô brincando no escorregador”. Indago se é perto ou
longe do lugar onde moram e ela relata que é longe, mas que os pais a levam até lá para
brincar sempre.
Conclui a conversa dizendo que em sua casa moram: ela, a mãe, o pai, o
cachorro, a irmã e o passarinho, que gosta da família que tem, e que eles também
gostam dela.
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R.G.R.S. é um menino, na época, com cinco anos. Conta que registrou seu pai,
sua avó, sua irmã, ele e sua mãe. A mãe e a irmã limpam a casa e o pai trabalha,
enquanto isso, ele assiste a um desenho na televisão. Nesse dia, a sua mãe “está de
férias”. Conta que, quando o pai também está de férias, ele não permanece dentro de
casa, mas fica na rua. E continua “minha mãe também fica na rua, ela fala no telefone
com o namorado dela”. “Meu pai ainda mora com minha mãe, é que ele está esperando
terminar de construir a casa”. Afirma gostar de sua família, e também do namorado da
mãe, mesmo quando ele “puxa as minhas orelhas”, diz.
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J.F.C. é uma menina de seis anos de idade. Relata ter desenhado a prima M., a
mãe, o pai, a irmã, a tia e ela. Eles passeiam pelo bosque e observam os animais. Destas
pessoas, moram na mesma casa que ela apenas a mãe, o pai e a irmã. Com um olhar
muito contente, diz gostar de sua família. Quando saem juntos, comenta que vão a “um
monte de lugares”.
50
J.B.L.S. é uma menina de cinco anos de idade. Desenhou a tia, ela e o irmão.
Eles brincam de bola no quintal da casa da tia, onde mora. E então pergunto “e sua mãe
ela não está aí?” E ela diz que não. “Mas você gosta dela”? Responde, “sim”. E
continuo “e do seu pai, você gosta?” e ela diz, “sim, mas ele já morreu”, apesar disso,
afirma, com uma feição triste, que eles são felizes.
51
P.M.S. é um menino, está com cinco anos de idade. Descreve ter feito uma casa
e uma árvore, seu pai e sua mãe. Seus pais estão dentro da casa, olhando os pássaros.
Logo, diz que também está junto com ambos. Pergunto se eles sempre fazem isso e ele
responde que sim, e, com um pequeno sorriso diz gostar da família que tem. E finaliza
“meu pai não está morando com a minha mãe”.
52
Data: 20/08/2013
Participantes do sexo feminino: J.B.L.S., J.F.C., G.N.M. e B.M.H.F.
Participantes do sexo masculino: P.M.S., P.E.S.R., R.G.R.S.
Nesse momento, P.M.S. pega uma cesta grande e começa a guardar todas as
coisas e diz: “eu vou passear”. E então, R.G.R.S. fala: “nós vamos viajar lá pra praia”.
Eu questiono: “quem vai junto?”, e P.E.S.R. responde: “eu, o R.G.R.S. e a G.N.M.”.
Ainda pergunto o que eles são na brincadeira e P.M.S. pensativo responde: “eu sou o
cozinheiro, o R.G.R.S. é o vendedor e a G.N.M. é a mãe”.
O trio, então, separa-se dos demais e, carregando alguns itens vai do outro lado
da sala. As crianças sentam-se em cadeirinhas e fazem de conta que entram em um
ônibus. Logo, chegam ao seu destino e P.M.S. trata de fazer um bolo. Já na praia,
R.G.R.S. diz “eu vou nadar agora”, corre pela sala, mexendo os braços como se
estivesse realmente no mar.
J.F.C. e J.B.L.S. continuam a cuidar de suas “filhas”. P.E.S.R. e B.M.H.F. fazem
“comida”. Logo, as duas meninas, J.B.L.S. e J.F.C. juntam-se a eles para cozinhar
também. Em seguida, todas as crianças começam a arrumar a casa.
54
Data: 21/08/2013
Participantes do sexo masculino: R.G.R.S., P.M.S., P.E.S.R.
Participantes do sexo feminino: J.B.L.S. e G.N.M.
Eu pergunto: “o que vocês vão fazer lá?” e R.G.R.S. diz “nós vamos acampar”.
“E quem vai?”, continuo, e R.G.R.S. responde, citando o nome de todos os colegas que
estavam presentes neste dia. Enquanto isso, P.M.S. separa o que levar e pede ajuda aos
amigos para levar a “neném” (uma boneca).
Nesse momento, todo o grupo participa da mesma brincadeira. Eles discutem
em qual lugar da sala irão fazer o acampamento, até que decidem levar os brinquedos
para o outro lado do cômodo, depois, fazem de conta que estão indo de trem e, ao
chegar ao destino, montam um “restaurante”. Cada criança ajuda a levar um pouco de
coisa, uma leva uma cesta, outra leva o bebê, os pratos e até mesmo o fogão é
deslocado.
R.G.R.S. chama o garçom e muito bravo diz “garçom, o chão tá sujo!”. E ele
(P.E.S.R.), bastante sem graça responde “isso...”. E continua a servir as crianças que
estão sentadas à mesa. P.M.S. está no fogão cozinhando, e R.G.R.S. diz que também
quer ser o cozinheiro, mas começa a servir. P.E.S.R. não gosta e responde: “eu já sou o
garçom”.
Quando pergunto sobre quem são eles, P.M.S. me diz que são todos da família,
um é o pai, outro a mãe e assim por diante. E ainda, que estão trabalhando juntos, no
mesmo lugar.
Data: 22/08/2013
Participantes do sexo feminino: J.B.L.S, J.F.C., G.N.M.
Participantes do sexo masculino: P.M.S, P.E.S.R., R.G.R.S.
CAPITULO II
RELAÇÃO FAMÍLIA E ESCOLA: UM LEVANTAMENTO BIBLIOGRÁFICO
Muito tem se falado que, tanto a família quanto a escola podem exercer um
importante papel no desenvolvimento infantil, e que as relações afetivas entre
família/criança e escola/criança são estritamente necessárias em todo o percurso da
escolarização. Mas será que, tais fatores, de maneira inter-relacionada, são capazes de
assegurar a qualidade do ensino escolar, principalmente quando falamos da educação
infantil?
Tal etapa tem suas especificidades e a maneira como os envolvidos o conduzem
faz toda a diferença. A pesquisa bibliográfica nos possibilitou discorrer um pouco sobre
esse assunto, sobretudo, quando colocamos em evidência o trabalho com crianças
pequenas, a partir das ideias e concepções de educação dos pré-escolares de Reggio
Emilia, escola de educação infantil, localizada na Itália.
Também buscamos abordar outras questões que se referem à complexidade
humana no que tange às dimensões sociais e afetivas que nos compõem. A busca pela
explanação das estruturas humanas contemplou o estudo de teorias de diversos autores,
que, todavia, são capazes de interagirem entre si.
Além disso, fez-se um levantamento por meio da base de dados da CAPES
acerca das produções acadêmicas nacionais dos últimos cinco anos, nos níveis de
Mestrado e Doutorado. Através de palavras-chaves como afetividade, escola e família
foram localizados nove trabalhos que, de uma forma ou de outra, puderam contribuir
com a nossa pesquisa.
Começaremos, agora, nossa reflexão teórica em correlação com os trabalhos
acadêmicos encontrados durante o levantamento bibliográfico.
grupos sociais, que funciona como veículo de troca de informações, que se perpetuam
ao longo dos tempos e provocam mudanças. Nesse ambiente de permutas sociais, os
adultos são os principais responsáveis por transmitir entre as gerações os diversos
saberes da memória coletiva.
Pensando nisso, muitas escolas têm buscado aproximação dos os pais, com o
intuito de construir ações de envolvimento familiar. As famílias, ao participarem do
aprendizado de seus filhos, estão fazendo com que eles se sintam mais importantes, o
que se traduz em melhoras, principalmente, com relação ao comportamento escolar.
Rohenkohl (2009) defende a concepção de que um ambiente familiar saudável
tem grande relevância para a constituição do homem. A estudiosa desenvolveu uma
pesquisa de mestrado intitulada “Afetividade e conflito familiar: sua relação com
problemas de comportamento em pré-escolares”, pela Universidade do Vale do Rio dos
Sinos e traz como contribuição a mudança das famílias concomitante às transformações
sociais como: a globalização, as novas tecnologias, a cultura, o ingresso da mulher no
mercado de trabalho, a igualdade de direitos, a emancipação sexual, o divórcio, dentre
outras.
A pesquisa foi composta por dois eixos temáticos o primeiro: “Funcionamento
de famílias de baixa renda”, propôs-se a discutir sobre algumas questões acerca das
famílias nucleares e recasadas e trouxe uma revisão teórica sobre os relacionamentos
que se estabelecem nesta e naquela, em especial, de classes populares. Na segunda parte
do trabalho: “Afetividade e conflito familiar e problemas de comportamento em pré-
escolares”, Rohenkohl (2009) buscou compreender o nível de afetividade e conflito em
famílias de baixa renda e sua relação com os problemas de comportamento em crianças
pré-escolares, a partir da visão das mães e das professoras.
Para a pesquisadora, os dados revelaram a importância do grau de afetividade e
conflito entre os cônjuges e sua relação com os problemas de desenvolvimento infantil.
O nível socioeconômico e o contexto têm implicações na formação dessas famílias,
expressando-se na forma de educar os filhos e exercendo papel fundamental no
desenvolvimento de seus membros.
O delineamento dessa pesquisa traz uma importante reflexão. A autora se refere
ao fato de que, há mais de 22 anos, trabalhou em escolas como psicóloga e que, nesse
período, tanto o corpo docente quanto o grupo gestor acabava por atribuir situações de
fracasso escolar e problemas de comportamento à dinâmica vivenciada pelas famílias
63
desses educandos, como se essa fosse a principal causadora de tais situações. A escola,
nesse sentido, ao contrário de buscar um trabalho diferente, que pudesse mudar esse
contexto, eximia-se de seu compromisso para com a criança.
Rohenkohl (2009) afirma haver a necessidade de instrumentalizar os pais de
baixa renda a lidarem tanto com as dificuldades familiares quanto com seus filhos
pequenos e também de se preparar os professores que lidam com grupos sociais como
esses.
Faz-se saber que as atividades lúdicas, por serem livres de pressões e tensões
possibilitam a expressão cognitiva facilitando a livre expressão da dimensão afetiva. E
que o desenvolvimento psicológico está intrinsecamente relacionado ao conjunto dos
relacionamentos afetivos, sociais e morais que permeiam os ambientes escolares.
Assim, a escola não pode se destituir da responsabilidade de abordar em igual
importância todos os aspectos que compõem a totalidade do ser humano.
5
(...) Tais princípios se prolongaram no tempo, revestem-se, nos dias atuais, de uma forte preocupação
com a coerência entre os processos educativos que se dão na família e daqueles que se realizam na escola.
O que significa que a instituição escolar hodierna deve conceber seu trabalho educativo em conexão com
as vivências trazidas de casa pelo educando. Hoje mais do que nunca, o discurso da escola afirma a
necessidade e se observar a família para bem se compreender a criança, assim como para obter uma
continuidade entre as ações desses dois agentes educacionais. E o meio privilegiado para a realização
desses ideais pedagógicos será – ao menos no plano do discurso – o permanente diálogo com os pais.
(NOGUEIRA, 2006, p. 161).
66
Wallon (1979) afirma que tais grupos são de grande importância para a
aprendizagem social da criança, para o desenvolvimento de sua personalidade e
consciência de si própria. O interior familiar seria, assim, o ponto de partida para que
ela desenvolva essa percepção.
Por isso, a criança precisa se sentir segura, acolhida e protegida em seu entorno
social. E quando, pais e professores conseguem desenvolver um trabalho em conjunto,
são capazes de promover um ambiente sadio e significativo a ela. Todavia, no interior
68
dos portões das instituições de ensino é comum ouvirmos que qualquer dificuldade
verificada no meio familiar pode interferir negativamente no desenvolvimento escolar.
Por isso, a relevância de refletirmos sobre esse assunto, e como os professores
envolvidos com a educação escolar podem lidar com isso tudo.
A partir desse enfoque, emergem muitas indagações: Como ficam as crianças
que estão inseridas em um contexto familiar “não tradicional”? Elas conseguirão
participar ativamente das atividades propostas pela escola? Será que terão condições
para se desenvolver?
A busca por obras próximas ao tema de nossa pesquisa permitiu que
refletíssemos um pouco sobre essas questões e observássemos que abordamos um tema
da atualidade, que poderá nos encaminhar para novas descobertas posteriormente. E,
embora tenhamos encontrado algumas obras que se relacionassem com o assunto
estudado, nota-se a carência de pesquisas que se concentram, especificamente, no
âmbito da educação infantil.
Gobbi (2005) também se refere à dificuldade em encontrar estudos sobre
crianças pequenas, de zero a seis anos que pudessem contribuir com sua própria
pesquisa. Para ela, as produções acadêmicas sobre a infância, muitas vezes, encontram-
se distantes das formas de expressão que fazem parte do repertório cultural das crianças.
Em alguns casos, as produções sobre a infância se subordinam às questões políticas, ou
seja, às formas de implantação da legislação que nem sempre são benéficas aos
pequenos. Em outros, as pesquisas são feitas a partir de fontes documentais que
demonstram a criança vista de fora, e ainda, trazem práticas morais, voltadas
simplesmente ao assistencialismo6.
Nosso trabalho se insere nos estudos que caminham no sentido de afirmar a
importante posição da criança pequena, como um indivíduo social, sujeito criador e
produtor de sua própria cultura. Sendo assim, o conhecimento sobre seu
desenvolvimento global, sobretudo, acerca de sua realidade social, é um dever para que
6
Se os estudos que se voltam para as crianças de um modo geral são limitados, ao procurar a bibliografia
específica sobre os pequenos nas áreas de história e ciências sociais, com as quais o presente trabalho
pretende dialogar, o espanto foi bastante grande. Trata-se, como diriam os mais velhos, de procurar uma
agulha no palheiro, tamanha a dificuldade em encontrar estudos acadêmicos que contemplem as crianças
pequenas e bem pequenas, em que reside meu foco de pesquisa. Quanto aos pequenos e pequenas,
acostumamo-nos à sua ausência nas pesquisas e isso chega a parecer natural; é como se começassem a
existir apenas a partir de seu crescimento e, ouso dizer, de sua entrada no mundo dos alfabetizados, dos
escolarizados (...). (GOBBI, 2005, p. 72).
69
CAPÍTULO III
ENTRE AFETO E INTELIGÊNCIA: O EU E O OUTRO
Essa perspectiva nos possibilita entender que, na fase que inclui o período
sensório motor (que vai do nascimento aos dois anos, aproximadamente), ou, no pré-
operatório (que se estende dos dois anos aos seis anos, em média), a criança ainda
possui um “pensamento egocêntrico”. Ela não consegue efetivamente garantir-se de um
verdadeiro diálogo, uma vez que seu pensamento está centrado no “eu” 7.
Sisto (1996) acredita que a inteligência sensório-motora seja uma inteligência
de ação, de movimento, pois os esquemas reflexos transformam-se progressivamente
em esquemas e se coordenam em totalidades mais abrangentes. A criança ainda está
conhecendo suas possibilidades visuais, auditivas, táteis, de paladar e de odor e
integrando-as entre si.
É, assim, possível compreender que, ao nascer, ela dispõe de poucos reflexos
inatos, mas com o passar do tempo, o contato com o meio lhe permite aprender a lidar e
se relacionar cada vez mais com o mundo. Isso porque, ao adentrar um sistema de
permutas sociais, o organismo em amadurecimento desenvolve uma sequência de
capacidades locomotoras, sensoriais e sociais.
Piaget (2001) pressupõe que desde os primeiros anos de vida o bebê
desenvolve operações intelectuais. À medida que passa a se relacionar com os
elementos que o cercam, pode “elaborar o universo”, ou seja, intervir sobre ele mesmo.
7
O egocentrismo pode ser percebido na realização de qualquer tarefa coletiva, em que não há a
verdadeira cooperação, ou seja, ao realizar uma tarefa em grupo, na verdade, cada um realiza a sua
própria tarefa e não uma tarefa conjunta. Por exemplo, ao fazer um desenho em uma folha grande, cada
um faz o seu próprio desenho e não um desenho coletivo. Em função dessa característica, dessa
incapacidade de cooperar verdadeiramente, de se colocar no lugar do outro, muitas vezes os problemas
são resolvidos no “tapa” já que a criança não consegue ainda coordenar pontos de vista distintos. Por essa
incapacidade de se colocar no lugar do outro e de realizar tarefas conjuntas, ela não é capaz, ainda, de
uma verdadeira cooperação, a qual só se torna realmente possível no operatório-concreto. (MARQUES,
2001, p. 54).
72
8
As concepções de Vigotsky sobre o funcionamento do cérebro humano fundamentam-se em sua ideia de
que as funções psicológicas superiores são construídas ao longo da história social do homem. Na sua
73
Quando uma criança quer um objeto, ela estende a mão para tentar pegá-lo;
sem saber que o gesto que faz é entendido pelos adultos, pois tem um
significado. Aos poucos, ela internaliza isso e passa a apontar quando quer
algo que esteja longe de seu alcance. Dessa forma, “o movimento de pegar
transforma-se no ato de apontar.” (Ibidem: p. 74).
relação com o mundo, mediada pelos instrumentos e símbolos desenvolvidos culturalmente, o ser humano
cria as formas de ação que o distinguem de outros animais. Sendo assim, a compreensão do
desenvolvimento psicológico não pode ser buscada em propriedades naturais do sistema nervoso.
Vigotsky rejeitou, portanto, a ideia de funções mentais fixas e imutáveis, trabalhando com a noção de
cérebro como um sistema aberto, de grande plasticidade, cuja estrutura e modos de funcionamento são
moldados ao longo da história da espécie e do desenvolvimento individual. Dadas as imensas
possibilidades de realização humana, essa plasticidade é essencial: o cérebro pode servir a novas funções
criadas na história do homem, sem que sejam necessárias transformações morfológicas no órgão físico.
(OLIVEIRA, 1992, p.35).
74
evolutiva e tende a mudar conforme as necessidades. Por isso, é impossível pensar nela
se não no interior da sociedade:
Para Ariès (1981), a velha sociedade tradicional via mal a infância. Nos
primeiros anos de vida, havia resguardado um sentimento superficial, que o autor
76
denominou por “paparicação”. Passado esse período, a criança era logo misturada aos
adultos, partilhando seus trabalhos e jogos.
A passagem da criança pela família era muito curta, não havia razão para que
houvesse um despertar da sensibilidade, pois tal agrupamento não tinha funções
afetivas. Sua missão era, sobretudo, garantir a conservação dos bens, a proteção da
honra e assegurar a vida9.
Assim posto, a sociedade medieval não reconhecia o sentimento de infância, ou
seja, as particularidades que distinguiam a criança do adulto. Aquela era vista como um
adulto em miniatura, e muitas vezes, a falta de cuidados específicos levavam-na à morte
(muitas asfixiadas, ao dormir nas camas dos pais; ou mesmo eram perdidas ao se
misturarem aos adultos). “Assim que a criança superava esse período de alto nível de
mortalidade, em que sua sobrevivência era improvável, ela se confundia com o adulto.”
(ARIÈS, 1981, p. 157).
A partir do final do século XVII, houve uma mudança considerável nas
sociedades industriais. Os pequenos foram separados dos adultos, deixaram de aprender
diretamente no contato com eles, e, ganharam espaços de aprendizagens, agora, na
instituição escolar. Todavia, esse período é marcado pelo início de um processo de
enclausuramento, no qual ela era colocada em quarentena no colégio.
É entre os moralistas e educadores dessa época que vemos surgir outro
sentimento, na qual o apego às particularidades infantis não se exprimiam mais por
meio da distração e da brincadeira, mas sim, através do interesse psicológico e da
preocupação moral.
9
As trocas afetivas e as comunicações sociais eram realizadas, portanto, fora da família, num “meio”
muito denso e quente, composto por vizinhos, amigos, amos e criados, crianças e velhos, mulheres e
homens, em que a inclinação se podia manifestar mais livremente. As famílias conjugais se diluíam nesse
meio. Os historiadores franceses chamariam hoje de “sociabilidade” essa propensão das comunidades
tradicionais aos encontros, às visitas, às festas. É assim que vejo nossas velhas sociedades, diferentes ao
mesmo tempo das que hoje nos descrevem os etnólogos e das nossas sociedades industriais. (ARIÈS,
1981, p. 11).
77
Tem-se hoje, por exemplo, a tão falada crise da família – que inclui os
divórcios, o estresse proveniente da sobrecarga de trabalho, mães chefes de família,
além da falta de tempo para convivência com os filhos. Isso tudo requer das escolas que
ocorra uma extensão de seu tradicional papel de instrução acadêmica a fim de englobar
vários aspectos de assistência biopsicossocial.
À medida que as famílias se nuclearizaram, pais e mães passaram a trabalhar
fora de casa e a disporem de menos tempo para os filhos, num movimento que passou a
81
reduzir cada vez mais suas funções de transmissão cultural e social. O modelo
tradicional já não corresponde às condições de vida da maioria das famílias da
atualidade, além disso, as mulheres têm se dedicado cada vez mais ao mercado de
trabalho. Desta forma, a escolarização cresceu de modo sistemático, e tornou-se o
contexto central do desenvolvimento individual das crianças e jovens, assumindo
funções sociais e emocionais adicionais.
Ao verificarmos uma mudança no perfil da família e da escola na atualidade,
podemos concluir que estamos imersos em um novo panorama, fruto das inter-relações
entre as diversas sociedades contemporâneas. É preciso, pois, voltar nossos olhares e
tecer conhecimentos que sejam capazes de abranger e articular as múltiplas facetas que
existem hoje, Pois no interior desta gama de particularidades, perpetuam-se diferentes
modos de existência.
O início do século trouxe, com a Escola Nova, uma pedagogia centrada no aluno
em detrimento das concepções de ensino tradicionais. Esta nova perspectiva, envolve a
criança durante o processo ensino-aprendizagem, assim ativamente, esta se torna parte
integrante de suas próprias aprendizagens.
o constante diálogo com os pais passa a ser visto como o meio privilegiado
de se chegar a esses ideais pedagógicos. (NOGUEIRA, 1998, p. 100).
Bourdieu (apud NOGUEIRA & NOGUEIRA, 2002), aponta-nos para uma nova
concepção de escola e de educação. No lugar em que se via a igualdade de
oportunidades, passa-se a ver legitimação das desigualdades, nessa visão, a educação
assume um papel de manutenção dos privilégios sociais.
A escola não poderia ser considerada uma instituição que seleciona os mais
talentosos, mas um lugar no qual se ensina a gostar, a crer e a ter posturas e valores da
classe dominante, saberes estes, apresentados como universais.
(...) A escola teria assim, um papel ativo – ao definir seu currículo, seus
métodos de ensino e suas formas de avaliação – no processo social de
reprodução das desigualdades sociais. Mais do que isso, ela cumpriria o papel
fundamental da legitimação dessas desigualdades, ao dissimular as bases
sociais destas, convertendo-as em diferenças acadêmicas e cognitivas,
relacionadas ao mérito e dons individuais. (NOGUEIRA & NOGUEIRA,
2002, p. 19).
social não pode ser reduzido diretamente à sua posição de classe. Cada pessoa seria,
assim, o produto de múltiplas influências sociais e a escola precisaria desvincular-se de
uma classe social em específico para adquirir uma postura diferente.
É nesse sentido que a escola pode agir também no plano social, de acordo com
os ideais desejados, ou seja, se a intenção for continuar reproduzindo as inúmeras
desigualdades existentes, então, ela abstém-se de tentar contemplar as diferenças e
reforça o que se considera favorável para a legitimação dos valores hegemônicos
vigentes. E, evidentemente, a manutenção das desigualdades inicia-se pelo próprio
sistema educacional, de acordo com a veiculação das concepções ideológicas que se
impõem no interior da sociedade capitalista.
As relações da pessoa com ela mesma são construídas, ao longo dos dias, e,
normativamente e vão caracterizar o sujeito, de acordo com os saberes aceitos pela
sociedade na qual se insere e assim, do bojo dos saberes que são instituídos e
perpetuados, emerge o poder da norma.
Se assumirmos que os papéis desempenhados, geralmente, são padronizados,
então, deduziremos que, qualquer desvio da norma padrão pode estar relacionado a
alguma anormalidade inaceitável pela sociedade. A norma seria o elemento capaz de
permitir a comparação entre os sujeitos, e nesse sentido, encontrar possíveis desvios.
Sabemos que o sujeito é o produto dos saberes, dos poderes e da ética que se
estabelecem no meio em que este vive, ou seja, a transformação de indivíduo a sujeito
moral ocorre de acordo com o que cada um aprende e passa a ver de si próprio.
Portanto, para transformar os sujeitos e garantir a estabilidade e a legitimidade do
cenário social, as instâncias da sociedade se utilizam de meios diversos, como por
exemplo, a disciplinarização que garante a produção de corpos dóceis e obedientes.
De acordo com Veiga-Neto (2011), Foucault nos mostra que, a partir do século
XVII, surgem técnicas variadas que buscam a disciplinarização dos corpos e implicam
em resultados profundos e duradouros10.
A lógica do dispositivo panóptico, por exemplo, de que trata Foucault, baseia-se
em um espaço fechado (geralmente circular), dividido em celas, com uma torre ao
centro, da qual se visualizam todas as celas, sem deixar-se ver por elas. Assim, mesmo
que não haja ninguém ali, aqueles que estão nas celas sentem-se constantemente
vigiados, o que faz assegurar o exercício um “funcionamento automático do poder”
(FOUCAULT, 1989, p. 177). Esse dispositivo consegue, sobretudo, inverter o
“espetáculo”, ou seja, não é a multidão quem assiste, mas ela é quem está sendo
observada.
10
Tais técnicas tomam o corpo de cada um na sua existência espacial e temporal, de modo a ordená-lo em
termos de divisão, distribuição, alinhamento, séries (no espaço) e movimento e sequenciação (no tempo)
tudo isso submetido a uma vigilância constante. Foucault está falando aí de práticas disciplinares e de
vigilância como uma ação que institui e mantém tais práticas; ele está falando de disciplinamento e
panoptismo. (VEIGA-NETO, 2011, p.65).
88
11
Dado que cada um de nós nasce num mundo que já é de linguagem, num mundo em que os discursos já
estão há muito tempo circulando, nós nos tornamos sujeitos derivados desses discursos. Para Foucault, o
sujeito de um discurso não é a origem individual e autônoma de um ato que traz à luz os enunciados desse
discurso; ele não é o dono de uma intenção comunicativa, como se fosse capaz de se posicionar de fora
desse discurso para sobre ele falar. No caso, por exemplo, do discurso pedagógico. (VEIGA-NETO,
2011, p. 91).
89
“Isso equivale dizer que as práticas discursivas moldam nossa maneira de construir o
mundo, de compreendê-lo e de falar sobre ele” (VEIGA-NETO, 2011, p.93). Assim, os
próprios discursos podem nos mostrar um conjunto de regras capazes de condicionar os
sujeitos sociais num determinado momento histórico. Estes, não estão ancorados
fixamente em um único lugar, mas se distribuem pelo tecido social e, a partir disso, se
constroem as subjetividades.
(...) O mundo está coberto de signos que é preciso decifrar, e esses signos,
que revelam as semelhanças e as afinidades, são eles próprios formas da
similitude. Conhecer será, portanto, interpretar: ir da marca visível ao que se
diz através dela, e que, sem ela, permaneceria palavra muda, adormecida nas
coisas. (FOUCAULT, 2000, p.27).
12
Todas as práticas pelas quais o sujeito é definido e transformado são acompanhadas pela formação de
certos tipos de conhecimento e, no Ocidente, por uma variedade de razões, o conhecimento tende a se
organizado em torno de formas e de normas mais ou menos científicas. Há também uma outra razão
talvez mais fundamental e mais específica das nossas sociedades. Reside no facto de que uma das mais
importantes obrigações morais ser, para qualquer sujeito, o conhecer-se a si próprio (...). (FOUCAULT,
1993, p. 205).
90
O estudioso, diz que os sujeitos são constituídos por suas possibilidades de vida
e seus processos de subjetivação. A partir de então, surge a seguinte dúvida: será que é
possível constituir-se como sujeito a partir de si mesmo, de forma a ultrapassar a
barreira do saber e do poder?
Essa proposta exigiria uma superação das formas determinadas de saber e das
regras coercitivas de poder. As regras, agora, seriam facultativas, pois, produziriam os
modos de existência ou os estilos de vida como obras de arte.
Porém, a constituição dos modos de existência ou dos estilos de vida não são
somente estéticas, mas éticas. Dito de outro modo, a existência humana estaria regrada
por um conjunto de ações de cunho avaliativo, em função do modo de existência a qual
se impõe.
(...) Há coisas que só se pode fazer ou dizer levado por uma baixeza de alma,
uma vida rancorosa ou por uma vingança contra a vida. Ás vezes, basta um
gesto ou uma palavra. São os estilos de vida, sempre implicados, que nos
constituem de um jeito ou de outro. (Ibidem: p.130).
Esta figura humana de que trata Foucault (apud DELEUZE, 2013), é o homem o
qual é capturado pelas forças provenientes das instâncias de poder, que nos fazem ver e
falar sobre ele, suas condutas, suas atitudes, seus desvios. Para ele, é como se os sujeitos
estivessem a favor do poder, daquilo que se diz ou se faz dizer. Não se consegue
transpor essa linha, aprimorar os pontos de resistência e passar para o outro lado.
É preciso caminhar do lado oposto para que se cavalgue sobre essa linha que
está para além do saber e do poder. Ao saltá-la, a transgressão das formas de dominação
será um tanto mais possível.
Creio que cavalgamos tais linhas cada vez que pensamos com suficiente
vertigem ou que vivemos com bastante força. Essas são as linhas que estão
par além do saber (como elas seriam “conhecida?”), e são as nossas relações
com essas linhas que estão para além das relações de poder (como diz
Nietzche, quem gostaria de chamar isso de “querer dominar?”). Você diz que
elas já apareceram em toda a obra de Foucault? É verdade, é a linha do Fora.
O Fora, em Foucault, como em Blanchot, a quem ele toma emprestado esse
termo, é o que é mais longínquo que qualquer mundo exterior. Mas também é
o que está mais próximo do mundo interior. Daí a reversão perpétua do
próximo e do longínquo. O pensamento não vem de dentro, mas tampouco
espera do mundo exterior a ocasião para acontecer (...). (Ibidem: p.141).
Isso porque, além do domínio sobre si mesmo, o ato de governar os pares requer
um “equilíbrio de complementaridade e conflito entre as técnicas” capaz de assegurar os
processos pelos quais é possível engendrar as pessoas, fazendo com que elas próprias se
modifiquem.
É isso a subjetivação: dar uma curvatura a linha, fazer com que ela retorne
sobre si mesma. Teremos então os meios de viver o que de outra maneira
seria invisível. O que Foucault diz é que só podemos evitar a morte e a
loucura se fizermos da existência um “modo”, uma “arte”. É idiota dizer que
Foucault descobre ou reintroduz um sujeito oculto depois de tê-lo negado.
Não há sujeito, mas uma produção de subjetividade: a subjetividade deve ser
produzida, quando chega o momento, justamente porque não há sujeito. E o
momento chega quando transpomos as etapas do saber e do poder; são essas
etapas que nos forçam a colocar a nova questão, não se podia coloca-la antes.
A subjetividade não é de modo algum uma formação de saber ou uma função
de poder que Foucault não teria visto anteriormente; a subjetivação é uma
operação artista que se distingue do saber e do poder, e não tem lugar no
interior deles (...). (Ibidem: p.145).
13
Acreditar no mundo é o que mais nos falta; nós perdemos completamente o mundo, nos desapossaram
dele. Acreditar no mundo significa principalmente suscitar acontecimentos, mesmo pequenos, que
escapem ao controle, ou engendrar novos espaços-tempos, mesmo de superfície ou volume reduzidos. É o
que você chama de pietás. É ao nível de cada tentativa que se avaliam a capacidade de resistência ou, ao
contrário, a submissão a um controle. Necessita-se ao mesmo tempo de criação e povo. (DELEUZE,
2013, p. 222).
94
Mas, qual é afinal, o lugar da educação infantil? E que relação ela possui com o
ensino fundamental? Essas e tantas outras perguntas merecem destaque no sentido de
trazer à tona as especificidades concernentes aos programas que atendem às mais
variadas faixas etárias, em especial, as crianças pequenas.
Para Kuhlmann Jr. (2003), a polaridade entre as instituições assistencialistas e
educativas, aos poucos, tem sido superada. Desde o século passado, uma das prioridades
da educação infantil era atingir a condição de espaço educacional. Surgiram então,
95
várias propostas, que por sua vez, não eram capazes de alterar o bojo assistencialista
impregnado a tais instituições.
Quão distante do bebê que vai entrar na creche está a aquisição de conceitos
científicos! Por que não adotar uma postura de simplicidade no trato com ele
– o “simplesmente complexo”, como diz o titulo de um vídeo italiano sobre
esse trabalho pedagógico? Não apenas na Itália, mas também as creches
francesas pretendem trabalhar em estreita colaboração com as famílias,
oferecer à criança um local seguro e estimulante que lhe permita a plena
manifestação de seu potencial físico, afetivo e intelectual, a aprendizagem de
sua autonomia e de sua socialização, além de facilitar a sua integração à
escola maternal. Até mesmo naquele país, citado, Às vezes, como altamente
marcado pela pedagogia tradicional, encontra-se a sensatez de tratar com a
máxima atenção o acolhimento dos pequenos em um ambiente institucional,
valorizando e não secundarizando os aspectos relativos aos cuidados.
(Ibidem: p. 57-58).
Dessa forma, por que não pensar em uma educação infantil pautada em suas
especificidades ao invés de formular complexidades incoerentes a essa faixa etária?
Infelizmente, não é assim que acontece, e o que se vê é o uso de jargões como a
expressão “construtivista”, “interacionista”, dentre tantos outros, o que culmina na
adoção de um modismo que não se justifica e que vem na contramão do conhecimento
de outras concepções teóricas que eficientemente se entrelaçam na tentativa de
solucionar os tantos problemas da educação infantil.
De acordo com Kuhlmann Jr. (2003), o processo de conhecer, crescer e viver
das crianças, muitas vezes, se transforma em um processo burocrático, totalmente
controlado pelo adulto. A versão preliminar dos referenciais, por exemplo, não admite
momentos ociosos na instituição, e substitui a fantasia e a criação pela aquisição de
conhecimentos científicos, ou seja, a programação se vincula ao desenvolvimento
cognitivo da criança, de forma abstrata, desvinculada da família e da cultura.
14
O Referencial Pedagógico de Reggio Emília foi considerado neste estudo, um exemplo importante de educação
infantil. Assim, tanto a Discussão dos Dados quanto as Considerações Finais, ao apontar para a necessidade de
mudança na realidade escolar aqui estudada, parte de uma reflexão sobre a prática observada com relação à
teorização exposta sobre as escolas italianas, o que nos permitirá configurar os apontamentos então colocados.
100
Katz (1999), afirma que a maioria das escolas em Reggio Emília tem as classes
organizadas em grupos com idades mistas, oferecendo um ambiente mais próximo ao
familiar do que se fossem organizadas de forma homogênea. A maior parte das
atividades é realizada em grupos pequenos, ou seja, não há evidência de que a mesma
instrução seja dada a todos de uma única vez com o propósito de que a sala toda
produza um desenho ou qualquer outra atividade artística ao mesmo tempo.
Lá, as crianças assumem determinadas responsabilidades, como arrumar a mesa
antes e após as refeições, ajudar a equipe da cozinha, manter em ordem os materiais de
arte, dentre tantas outras coisas. Com essas tarefas reforçam a sensação de vida em
comunidade, e isso é ainda mais evidente por conta da participação frequente de todos
os envolvidos, em especial, dos pais.
101
porque o conhecimento é construído durante relações dialógicas, ele não pode ser
simplesmente transmitido verticalmente.
Nesse processo, educadores comprometidos em efetivar um ensino diferente que
se inicie das vontades e desejos das próprias crianças devem estar atentos aos sinais que
elas transmitem durante sua permanência na escola.
Conforme Oliveira (2008), uma pessoa pode apresentar, por exemplo, olhos
semicerrados, evitando olhar nos olhos dos interlocutores quando se sente ameaçada. Os
lábios podem apresentar-se contraídos, o tronco curvo, poucos gestos, movimentos
inseguros e grande tensão muscular. Algumas mensagens internas também podem ser
percebidas, como, por exemplo, dilatação da pupila, alterações dos batimentos
cardíacos, sudorese, distúrbio gastrointestinal, insônia, rubores fora de hora, dores de
estômago, risos ou choros, paralisação corporal.
As emoções são espelhadas pelo corpo, uma criança que possui transtornos
emocionais provavelmente não conseguirá atingir satisfatoriamente um
esquema corporal íntegro, o que irá prejudicá-la no contato com o mundo que
a cerca. (OLIVEIRA, 2008, p. 78).
assim consegue interagir positivamente com o mundo e com a sociedade. “Suas atitudes
se tornam mais descontraídas, com sorriso fácil, olhar direto, ventre sem bloqueios,
adequada tensão muscular nos braços e mãos, revelando qualidade do gesto” (Idem:
p.78).
É importante lembrar que, o desenvolvimento não ocorre em uma linha reta
ascendente. Em seu percurso existem comportamentos regressivos que podem estar
relacionados a alguma dificuldade vivenciada naquele momento, em específico. Há
situações mais difíceis de lidar, como a entrada da criança na escola, o nascimento de
um irmão, a morte de uma pessoa querida, etc. Assim, tanto os períodos de regressão,
quanto os períodos de progressão são importantes para o amadurecimento humano.
Esses sinais emocionais são constantemente transmitidos pelas pessoas com as
quais nos relacionamos, durante as relações interpessoais. A criança, contudo, tem
dificuldade em mascarar seus sentimentos, por isso, acaba enviando sinais emocionais
aos pais, aos professores e até mesmo a outras crianças.
São muitas vezes ‘pedidos de socorro’ que ninguém percebe como tal e ainda
por cima ela é muitas vezes criticada e castigada por eles. Alguns sinais são
muito evidentes, pois incomodam os que se encontram ao seu redor, mas
outros são invisíveis aos olhos de uma pessoa inexperiente ou indiferente.
(Ibidem: p.79).
Desta forma, durante o cotidiano escolar, o educador precisa estar atento aos
sinais emocionais que são transmitidos pelas crianças para melhor ajudá-las. Às vezes,
uma delas se recusa a fazer determinada tarefa, não é porque simplesmente não quer
participar, mas por sentir medo de não conseguir fazê-la, por se ver temerosa frente ao
fracasso.
como mecanismo de defesa, algumas tendem a dissimular o que estão sentindo, outras,
se tornam agressivas ou se retraem.
Infelizmente, a sociedade atual está centrada nos ideais de prestígio e
competição. As escolas, nesse contexto, buscam oferecer um ensino capaz de conceber
os melhores alunos. Para determinadas crianças, essa pressão se torna muito dolorosa e
então, elas acabam transmitindo sinais de que algo não está bem.
Por isso, é preciso que o contexto educativo esteja envolto por relações mais
serenas. É necessário ajudar as crianças a se exprimirem com confiança, ouvindo e
valorizando o que elas têm a dizer. Essa relação de segurança se estabelecerá aos
poucos, e isso será percebido durante o contato delas com o meio, através das
manifestações emocionais emitidas pelo próprio corpo.
Vejamos com um olhar mais atencioso como o educador pode observar e
ajudar a sua turma, principalmente, reorganizando as situações que envolvem o
ambiente escolar, de forma a caminhar para um contexto pedagógico permeado por
atividades que envolvam situações interessantes e motivadoras, como por exemplo, o
desenho e a brincadeira infantil.
Fica clara aqui a intenção de uma observação mais atenta, que possa,
porventura, ajudar a compreender e até mesmo superar dificuldades existentes. Todavia,
a estudiosa, pressupõe cautela na análise dos desenhos,
110
CAPÍTULO IV
DISCUSSÃO E ANÁLISE DOS DADOS
15
As reuniões, geralmente são feitas com todos os pais ao mesmo tempo pela professora da sala e têm a
duração de 1 hora e 50 minutos, e, acontecem uma vez por semana.
113
Esses assuntos são também importantes, mas é preciso que essas reuniões
tenham foco em uma questão fundamental: a qualidade da educação oferecida a essas
crianças.
É necessário que os discursos dos educadores se direcionem para a dissolução
dos problemas existentes, pois, muitas vezes, esses se traduzem tão somente em um rol
de colocações que trazem à tona a problemática da suposta ocultação do afeto familiar
e, consequente, culpabilidade da família pelos desajustes escolares. É preciso ir além
das postulações, refletir e buscar respostas pertinentes que possam colaborar para a
melhoria dos serviços prestados.
Será que essas famílias, realmente, estão negligenciando carinho, atenção e amor
aos seus filhos? Será que as crianças estão desmotivadas porque estão com problemas
em casa? E qual o papel da escola no que se refere ao atendimento àquelas crianças que
fogem do “padrão da normalidade”?
O que realmente acontece, muitas vezes, é a subordinação dos pequenos com
relação à figura do professor, que por si só já ocupa uma posição de superioridade, pois
é o único adulto ali presente. O poder que é capaz de exercer sobre as crianças é ainda
maior devido ao fato de que subjetivamente, estabelece regimes de verdade, através de
seus próprios discursos, impondo regras e estabelecendo limites.
De um modo geral, a autoridade do professor diz respeito a uma ordem
normativa que regula o comportamento social. Assim, o poder sustenta a autoridade
vigente, já que sujeita os seres individuais através da coerção e da repressão. Ao
contrário de se colocar a favor dos interesses daqueles que a ele estão sujeitados,
geralmente, têm a finalidade de repreender, expor os problemas e tentar remodelar
atitudes e comportamentos, sempre que necessário.
As práticas pedagógicas, quase sempre, estão assentadas em bases
metodológicas que agem a favor da remodelação e da transformação das subjetividades.
De acordo com Larrosa (1994), “(...) é como se a educação, além de construir e
transmitir uma experiência ‘objetiva’ do mundo exterior construísse e transmitisse
também a experiência que as pessoas têm de si mesmas e dos outros como ‘sujeitos’”. É
como se o meio educativo mostrasse aos estudantes o que é ser uma pessoa, assim como
o que eles são, em particular.
Isso porque, mesmo sutilmente, certos educadores traçam seus preceitos e
normas que as crianças precisam conhecer e obedecer, modelam seus hábitos, e
114
doutrinam uma série de valores porque não os considera apropriado para o contexto
vigente. É no momento em que se objetivam determinados aspectos do ser individual,
que ocorre a manipulação institucionalizada de cada um, ou seja, é no interior dessa
articulação ente saber e poder que é possível agir no interior dos sujeitos.
É nesse sentido que o sujeito pedagógico pode ser analisado não somente do
ponto de vista da “objetivação”, mas, sobretudo, da “subjetivação”. Ainda que seja na
educação infantil, principalmente, com as crianças pequenas, o ambiente escolar pode,
por meio de inúmeras estratégias e instrumentos, atuar na “interioridade” e transformar
a “experiência de si”. Dito de outro modo, qualquer atividade realizada, seja uma
assembleia, uma roda de conversa, uma brincadeira dirigida, dependendo da forma
como é conduzida, pode modificar as relações que o sujeito estabelece consigo mesmo.
Segundo o autor a pedagogia não é neutra, mas um espaço possível de
transformação dos sujeitos, de uma maneira particular, porque é capaz de produzir
relações reflexivas que atuam na remodelação da experiência de si.
115
(...) Foucault analisou muito bem o projeto ideal dos meios de confinamento,
visível especialmente na fábrica: concentrar; distribuir no espaço; ordenar no
tempo; compor no espaço-tempo uma força produtiva cujo efeito deve ser
superior à soma das forças elementares (...). (Idem: p. 223).
Oliveira (2008), diz que a agressão pode ser resultado de alguma frustração.
“Pode se exteriorizar pela palavra, por ataques verbais, gestos, agressão física, mímicas
pejorativas, falta de ação, olhar.” (Idem: p.8). Assim, o educador deve estar sempre
atento a esses sinais, pois determinadas emoções podem prejudicar o desenvolvimento
da criança, e é relevante, tomá-los como pressupostos de que algo precisa ser feito, a
começar pelo redirecionamento de sua prática.
Não há como propor, por exemplo, a mesma atividade a todos ao mesmo
tempo. Nesta escola, as turmas são mistas, há crianças pequenas de 3 anos interagindo
com outras maiores, de 5 ou 6 anos, por exemplo. Portanto, fazer com que todos
desenhem, pintem ou colem as bolinhas de papel crepom dentro do desenho da árvore
irá talvez, distrair algumas delas por determinado período de tempo. Outras se recusarão
a fazer e se dispersarão rapidamente e essa dispersão e recusa de fazer determinada
atividade não significa que ela tenha dificuldade, mas simplesmente que não está
motivada ou disposta a realizá-la.
A prática pedagógica deve caminhar no sentido de compreender a diversidade
existente, ou seja, é preciso trabalhar a partir da singularidade de cada um, de modo a
respeitar as características pessoais e possibilitando avanços no desenvolvimento. Isto
significa que todos são diferentes e que cada criança aproveita o que é vivido no
contexto educativo de forma diferenciada.
Nas salas de agrupamento III do período da tarde, analisadas em nosso estudo,
não foi verificado algo que se familiarizasse com um trabalho em projetos, que partisse
essencialmente do grupo de crianças e que fosse elaborado, de forma coletiva, ao longo
do ano. E esse tipo de atividade é o que dá liberdade às crianças, sem contar a
importância dos direcionamentos no uso das ferramentas, dos materiais e das técnicas
utilizadas durante as representações gráficas e visuais.
Apesar de o Projeto Político Pedagógico deste Centro de Educação Infantil
contemplar as múltiplas linguagens, o seu planejamento é anual, feito logo no início do
ano, na primeira Reunião Pedagógica, antes mesmo de os educadores terem contato com
as crianças e seus familiares. Em 2012, o enfoque fora acerca dos Contos Clássicos,
Folclore e Datas Comemorativas. Já em 2013 contemplou-se, além das Datas
Comemorativas, um trabalho envolvendo a decoração das festas de aniversariantes, que
ocorreram em todos os meses. Sobressaem-nos então algumas indagações: será que
essas temáticas escolhidas pelos educadores, professores e monitores, foram agradáveis
119
que também estava junto com ambos. Com um pequeno sorriso disse gostar da família
que tem. E finalizou “meu pai não está morando com a minha mãe”.
Os dois casos em questão, foram classificados pela professora E.R. como
crianças que, por conta do contexto familiar nos quais estavam inseridas, não
conseguiam ter o mesmo desenvolvimento educacional de outros alunos, quando
comparado com os demais. Sobre P.M.S. ela diz: “não se concentra durante as
atividades, atrapalha a roda de conversa, às vezes é agressivo com os colegas. Passa um
final de semana com o pai, que parece não dar muita atenção a ele”. E com relação à
J.B.L.S. “a menina não tem pai, o contexto familiar é difícil, a mãe troca de namorado
com uma frequência muito grande e apresenta para a criança como se fosse o pai dela.
A menina quer chamar a atenção, bate, arrasta a cadeira, não fica onde é para ficar, fala
mal das crianças, irrita a turma. A mãe passa uma imagem negativa o pai à criança, que
ele a abandonou e a criança reproduz a fala da mãe”.
No decorrer das entrevistas, ouvimos as concepções do adulto, seja ele, o
professor ou o familiar, que falou a respeito dos pequenos, mas é preciso reconhecer que
a criança tem o seu jeito particular de ser e de agir. Assim, entender a individualidade de
cada sujeito, isentá-lo da proposição de condutas que culminarão com a remodelação
das subjetividades, é um grande desafio a ser conquistado pelos adultos, responsáveis.
Quando entrevistamos a tia de J.B.L.S., a mesma disse, se referindo à menina: “é
terrível, agitada, uma criança que não para. Briga com o irmão maior, bate nele”.
Enquanto que a mãe de P.M.S. contou que se separou do pai, e que, quando P.M.S.
passava o final de semana com ele, voltava extremamente agitado e triste. Há alguns
meses havia consultado a criança com uma psicóloga, que o diagnosticou com
depressão. Desde então, passou este a tomar medicamentos para controle.
Se acreditarmos que todas essas afirmações são de fato verdadeiras, teremos que
essas crianças estão fatidicamente perdidas, e que desde a educação infantil o seu
destino desastroso, está, então, traçado. Mas será que a escola não consegue interferir
positivamente nestes tantos discursos?
Todas essas falas acabam por criar imagens estereotipadas acerca dessas
crianças. Será que o fato de elas terem uma estrutura ou uma condição familiar que não
corresponde aos modelos tradicionalmente aceitos, leva-as a estarem fadadas ao
fracasso? Será mesmo que não há nada que se possa fazer?
125
Por vezes, alguns deles se empenham na tarefa de conseguir verbas juntos aos
setores políticos; agendam reuniões com a Secretária da Educação, quando há
necessidade (como por exemplo, na falta de funcionários); dão ideias e sugestões nas
Reuniões de Conselho. Em contrapartida, em outros momentos, ao verem que algo não
anda bem, buscam a imprensa como referência, o que acaba por expor os problemas
locais a toda a população, por meio de reportagens sensacionalistas veiculadas pela
mídia local.
No ano de 2013 os educadores se depararam, algumas vezes, com a mídia em
frente à escola: uma vez para reclamar contra a violência (um sequestro de uma
funcionária na porta da creche), outra para alertar sobre um surto de ratos e a última,
para protestar contra os agentes de educação infantil que paralisaram o atendimento
devido à escassez de profissionais. Situações como essas, acabam por acentuar ainda
mais o embate que porventura possa existir, entre pais e educadores.
Acreditamos que é preciso caminhar a favor do fortalecimento do vínculo entre
família e escola. A comunidade precisa estar unida e engajada no mesmo propósito, ou
seja, o de proporcionar um ambiente sadio, acolhedor e alegre a essas crianças. De nada
adianta travar uma luta, em que educadores se encontram de um lado e familiares do
outro. Talvez o caminho mais curto para isso seja tentar trazer esses pais diariamente
para o interior escolar, propor mais atividades em conjunto e mostrar a eles o quanto
podem fazer a diferença na vida de seus filhos.
De acordo com Gandini (1999), essa parceria entre crianças, pais, professores,
conselheiros educacionais e comunidade é primordial. Isso ocorre nos espaços das
escolas italianas os quais são cuidadosamente organizados para que ocorra a
possibilidade de interação entre educadores e comunidade. “O espaço reflete a cultura
das pessoas que nele vivem de muitas formas e, em um exame mais cuidadoso, revela
até mesmo camadas distintas dessa influência cultural” (GANDINI, 1999, p.150). Essas
instituições são agradáveis e em seu interior, harmônicas. Isso se revela nos móveis, nas
cores das paredes, nas plantas verdes e saudáveis e em vários outros detalhes especiais.
A nossa realidade, ao contrário, se emoldura num espaço corriqueiro. Apesar dos
esforços da equipe em adquirir brinquedos e materiais novos para as crianças, fazendo
uso da verba escolar, o prédio em si, não possui uma estrutura física capaz de abarcar
espaços diferenciados. A arquitetura escolar disponibiliza aos alunos, suas respectivas
salas de aula, uma biblioteca, um refeitório, banheiros e dois parques (um interno e
127
outro externo). Não há tantos recursos físicos, principalmente quando chove, e algumas
salas ficam repletas de água, devido às más condições do prédio, que é antigo. Há
alguns anos, encaminhou-se à prefeitura de Campinas um projeto arquitetônico com o
intuito de redefinir a estrutura física desta unidade escolar, mas o mesmo ainda não foi
autorizado.
Não há dúvidas da necessidade de uma intervenção, tanto com relação à
estrutura física, às concepções das famílias, e, principalmente dos educadores
envolvidos. Apoiar os pais e educá-los no sentido de proporcionar mais afeto e dar mais
estímulos intelectuais às suas crianças e também tornarem-se parceiros efetivamente, da
escola; propiciar programas de formação continuada aos profissionais da educação, e
orientar as instituições a elaborar programas educacionais mais adequados. Conceber
essas intenções seria um pontapé inicial para uma mudança positiva na realidade aqui
estudada.
Para isso é preciso que haja uma mudança de paradigmas, de acordo com o que
estamos vivendo. As visões reducionistas, presentes nas análises e nos diálogos dos
educadores precisam ser reelaboradas para que continuemos na busca por compreensões
que beneficiem a criança. Cabe à educação, o papel de colocar em movimento essas
contradições, de forma a tentar superá-las e, a partir disso, criar possibilidades para que
o sujeito consiga progredir ao longo de certas estruturas que são dadas como
verdadeiras ou que se constituíram como tal ao longo do tempo.
(...) Assim, se quisermos que o sujeito desde sempre aí cumpra sua dimensão
humana, devemos educa-lo para que ele possa atingir ou construir sua própria
autoconsciência, de modo a reverter aquelas representações distorcidas que o
alienavam; só assim ele será capaz de contrapor efetivamente à opressão e à
exclusão e, em consequência, conquistar a soberania. (VEIGA-NETO, 2011,
p.110).
Nota-se, portanto, que esta crise da educação suscita, a cada dia, novas
discussões, sobretudo com relação aos recorrentes processos de subjetivação, de forma
tal que se consiga transgredir as variadas formas de resistência e sobrepor um saber-agir
pedagogicamente renovado.
128
CONSIDERAÇÕES FINAIS
transformar não é apenas o que professor faz ou o que sabe, mas, fundamentalmente,
sua própria maneira de ser em relação ao seu trabalho”. (LARROSA 1994, p.49-50).
Entende-se que a transformação da práxis está totalmente relacionada à própria
transformação do educador.
O professor precisa ter a clareza de que os modos de subjetivação veiculados não
podem caminhar no sentido de continuar estabelecendo um padrão relacionado ao
binômio normal/anormal, e colocando como parâmetro de normalidade, os corpos
dóceis, aqueles que são considerados “os bons alunos”.
Notamos, nesta pesquisa, que aqueles que fogem do padrão da homogeneidade,
acabam se tornando motivo de preocupação entre os adultos envolvidos, e nesse
cenário, os discursos se direcionam a favor da correção do suposto mau comportamento.
Assim, por meio da disciplinarização, busca-se homogeneizar as crianças que,
eminentemente, se distinguem entre si.
É preciso se destituir das verdades que cerceiam a produção de sujeitos
padronizados e capazes de obedecer às regras impostas. O discurso não pode
simplesmente se encaminhar para a remodulação das características interiores de cada
um, e consequente engendramento de atitudes, valores e interesses massificadores.
Cabe ponderar que essas atuações subjetivas, que são expressas pelos diferentes
modos de subjetivação, e reforçadas pelas forças existentes, inculcam em uma produção
humanística totalmente padronizada. Por que não referenciar as diferenças das crianças?
Ou criar meios para que isso possa ainda mais se expandir no meio escolar?
É imprescindível ampliar as estruturas físicas e humanas escolares, de forma a
abarcar a diversidade ali existente e, ainda, dar plenitude para sua explanação.
Compreender a subjetividade humana é induzir que todos diferem e que, é a
partir dessa diferença que se abrirão novas possibilidades de se elaborar outros meios,
mais eficazes de se trabalhar com a educação, sobretudo quando falamos de crianças de
3 a 6 anos de idade.
É possível afirmar, nesse contexto, que o comportamento não se relaciona
estritamente à vivência familiar dessas crianças. Embora algumas delas possuam
problemas familiares, sociais, econômicos e mesmo afetivos, isso não é um fator
determinante para o interesse em participar ou não das atividades escolares.
As experiências observadas se relacionam, sim, às formas de vivências
oportunizadas no próprio ambiente escolar. O que acontece é que transmissão de sinais
132
emocionais nas crianças menores é muito mais perceptível, de tal forma, se elas não
estão satisfeitas com determinada situação que lhe são propostas, isso se evidenciará,
em suas próprias atitudes.
Assim, as crianças menores, por ainda não terem passado por um processo de
“remodelamento da própria alma”, são mais suscetíveis de se desvincularem de certos
padrões instituídos como únicos e verdadeiros. Elas ainda estão livres de certos
preceitos.
Foucault (apud VEIGA-NETO, 2011) afirma que a fabricação dos corpos é
anterior ao que acontece intrinsecamente nos indivíduos. Primeiro institui-se a
disciplina, as regras e aos poucos, tenta-se trabalhar a subjetividade através das palavras
e enunciações, fato este que vemos se difundir por todos os cantos dessa instituição
escolar.
As vivências na educação infantil estão sempre atreladas ao tempo em que são
administradas e, às regras que envolvem atitudes comportamentais. Geralmente, as
atividades formais se realizam a partir de um modelo previamente elaborado pelo
adulto. Por que não dar liberdade às crianças para que escolham o que querem fazer e
quanto tempo querem despender com aquilo?
O adulto não deve subjugá-las, é necessário entender que as aprendizagens
precisam estar relacionadas aos seus interesses, às suas vontades. E ao invés de assumir
um papel de simples transmissor de conceitos constituídos socialmente, voltados para a
manutenção dos interesses da classe dominante, desempenhar o papel de mediador
construtivo, capaz de oferecer situações criativas à sua turma.
Conclui-se, a partir dessas concepções, a urgência de um novo olhar voltado
para além das necessidades proeminentes da educação infantil. Um ambiente escolar
remodelado que atenda às necessidades individuais dessa faixa etária, com atividades
pedagógicas diversificadas e prazerosas para as crianças, tal qual o das escolas italianas
de Reggio Emília. Reflexão constante sobre a prática pedagógica, diálogos frequentes
entre a equipe docente, participação ativa da família, e, sobretudo, o respeito à
individualidade de cada uma das crianças. Esses são fatores importantes, já existentes
nas escolas italianas, e, que precisam fazer parte também do contexto escolar aqui
estudado, assim como de todo o Brasil, uma vez que são itens que ensejam o despertar
da qualidade, nesse nível de ensino.
133
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YIN, Robert. Estudo de caso: planejamento e métodos. 2ª Ed. Porto Alegre. Editora:
Bookmam. 2001.
139
ANEXOS
I. Identificação
1. Formação:
2. Tempo de docência:
2. Você acha que há alguma relação entre o ambiente familiar e a forma como a
criança se desenvolve durante a sua permanência na escola?
I. Identificação
1. Nome:
2. Data de nascimento:
3. Grau de parentesco:
4. Profissão:
I. Identificação
1. Criança:
2. Data de nascimento:
3. Idade em 2012:
1. Características físicas/pessoais:
2. Estética e asseio:
3. Oralidade e vocabulário:
III. Observação
a) Em sala de aula
b) No parque
c) No refeitório
1. Alimenta-se bem?
2. Sabe utilizar os talheres adequadamente?
3. Como é este momento (é calmo, agitado, etc.)?
I. Identificação
4. Você acredita que há como interferir nestas situações? Como? Sim, até certo
ponto. Porque essa interferência é muito limitada, só conseguimos interferir aqui
dentro da escola. Se a família estivesse em sintonia, houvesse relação entre
escola e o que é feito em casa seria mais proveitoso. Não adianta falar uma
linguagem aqui e outra em casa.
2. As crianças participam das atividades? Se não, por quê? Sim. Tem alguns
que não porque se recusam (uns vinte por cento).
2. Você acha que há alguma relação entre o ambiente familiar e a forma como
a criança se desenvolve durante a sua permanência na escola? Total, ela
demonstra o que ela vive em casa, no tratamento com os amigos, durante as
atividades. Quando não participa, se agita, parece ser um retrato de que ela não é
ouvida em casa e quer ser ouvida na escola.
3. Há algo que poderia ser feito para melhorar? Sim, já se tentou fazer
procurando trazer a família, assistir vídeo de passeio, foram tentativas frustradas
(as que precisam vir não vêm). Precisa ser feito um trabalho de conscientização
da comunidade de valorização da vida escolar dessas crianças.
148
I. Identificação
1. Criança: J.B.L.S.
4. Sexo: feminino.
2. Estética e asseio: Às vezes, as roupas parecem largas. Na roda, certo dia, uma
criança afirmou que não queria ficar perto dela porque ela não tomava banho. Observei
que as roupas e as sandálias realmente não estavam limpas.
III. Observação
a) Em sala de aula
3. Sabe ouvir (momentos de leitura)? Quer falar, participar de tudo. Afoita, fala
gritando. Deita-se no chão quando precisa ouvir, se dispersa em determinados
momentos que exigem atenção.
5. Quais atividades lhe despertam mais interesse? Gosta de fazer atividades que
envolvem letramento, mostrando-se muito caprichosa.
b) Parque
1. Brinca (sozinho ou com os colegas)? Brinca com os colegas, contudo está sempre
recorrendo à professora para fazer comentários sobre seus colegas, parece não conseguir
interagir muito bem.
c) Refeitório
1. Alimenta-se bem? Sim, briga com os colegas porque quer fazer o seu prato antes
dos demais (mostra estar com muita fome).
2. Sabe utilizar os talheres adequadamente? Sim, alimenta-se bem. Come tudo que
colocou no prato.
I. Identificação
1. Criança: P.M.S.
4. Sexo: masculino
III. Observação
a) Em sala de aula
3. Sabe ouvir (momentos de leitura)? Dificilmente, por se tratar de uma criança tão
ativa. Não consegue ficar parado, se levanta, entra debaixo das cadeiras, “cutuca” os
colegas, chuta, bate.
b) Parque
c) Refeitório
1. Alimenta-se bem? Não. É tão agitado que não consegue ficar parado para se
alimentar. Por exemplo, pega uma maça, faz que é uma bola e começa a chutá-la,
acaba machucando as outras crianças. A comida que põe no prato lá fica, até que
resolve jogar no lixo. Brinca com a comida que está no prato. Entra debaixo da mesa,
corre pelo refeitório.
I. Identificação
1. Nome: M.J.S.L.
1. Quantas pessoas moram na casa, junto à criança? Tia, avó e o irmão. J.B.L.S. até
o momento está morando com a mãe, que se mudou no último final de semana para a
casa do namorado R.
2. Quem fica com a criança no horário oposto ao de aula? Fica com a tia de manhã e
à noite (até que ela mude de casa, se mudar, a tia ainda não sabe). A cuidadora leva e
busca na escola todos os dias.
3. Como são os fins de semana? Domingo a mãe não trabalha, nem aos feriados.
Nesses dias, fica com a criança. Nos dias em que a mãe está trabalhando, a criança fica
com a vizinha, que cuida dela ou fica com a tia.
A tia relata que o pai do menino (irmão de J.B.L.S.) é quem paga a pensão e acaba
“sustentando” toda a casa. A menina perguntava muito do seu pai biológico, que não é o
mesmo pai do irmão. O pai de J.B.L.S. está foragido da polícia porque vende drogas, é
traficante. A família dele mora no Paraguai, ele abandonou a menina. A mãe, agora, vai
morar no Satélite Íris com o novo namorado, este não aceita as crianças, que não são
seus filhos. Ele já tem uma filha de outro relacionamento, a qual a mãe proibiu ele de
vê-la. Quando a mãe de J.B.L.S. se mudar para o bairro Satélite Íris, o menino, irmão
dela, não vai querer ir morar com ela; ao mesmo tempo em que também não quer morar
com o pai, quer ficar na casa da tia. Para a tia, a menina permaneceria até o final do ano
somente na creche, depois iria morar com a mãe. A tia acha muito cuidar de duas
crianças e ainda da avó que teve AVC e toma remédios.
1. Como você descreve esta criança? A tia a descreve como “terrível”, agitada, uma
criança que não para. Briga com o irmão maior, bate nele.
3. O que gosta menos: Nada, comenta que a professora não gosta de menina e a coloca
de lado, assim como fazia com o irmão dela.
1. Como você descreve a sua relação com a escola? Participa, sempre que solicitada
comparece à escola. É uma pessoa muito presente na vida dessas crianças.
2. De que forma você participa da vida escolar desta criança? Em quais momentos
procura participar? Conversa com eles, ensina o que é certo e o que é errado, não gosta
de colocar de castigo, não gosta de bater, quer o melhor para eles.
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I. Identificação
1. Nome: A.S.
1. Quantas pessoas moram na casa, junto à criança? Mãe, avó, tio, sobrinha (17
anos) A mãe está procurando uma casa para morar sozinha com o filho.
2. Quem fica com a criança no horário oposto ao de aula? A avó, pois os pais
trabalham o dia todo.
3. Como são os fins de semana? Um final de semana fica com a mãe e o outro com o
pai (isso foi um acordo judicial)
1. Como você descreve esta criança em casa? Agitado (contudo, ora a mãe fala que
com ela é mais calmo, ora diz que está agitado). Culpa a agitação do mesmo à falta de
contato com o pai, refere-se que quando vai chegando próximo do horário do pai ligar o
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menino torna-se muito agitado, o mesmo acontece quando chega o final de semana em
que irá para a casa do pai.
1. Para você qual a função do Centro de Educação Infantil para a criança? Educar
e dar autonomia, liberdade para que se desenvolva.
2. O que mais gosta na escola: O filho aprende muitas coisas importantes, gosta muito
desta escola. Tanto que tirou ele da escola onde trabalha, paga perua para que estude ali.
1. Como você descreve a sua relação com a escola? Boa, atende suas necessidades. A
mãe participa das reuniões, tem procurado parceria com a escola.
2. De que forma você participa da vida escolar desta criança? Em quais momentos
procura participar? Reunião de pais, agenda reuniões para conversar e esclarecer
assuntos, principalmente, informar como anda o tratamento do menino.
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Obs. O menino frequentou a creche onde a mãe trabalha. Contudo, a equipe tinha muita
queixa, com relação ao comportamento dele. A mãe, desconfiada de agressões, acabou
tirando o menino de lá.
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Ciente: __________________________
Nome:___________________________
RG:_____________________________