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FACULDADE DE TECNOLOGOA MODULO PAULISTA

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO


PÓS-GRADUAÇÃO EM EM ESTÉTICA E HISTÓRIA DA ARTE

SOELI APARECIDA PIROZI BENTO

VIVÊNCIAS ESTÉTICAS E ARTÍSTICAS NA EDUCAÇÃO INFANTIL

SÃO PAULO
2016

SOELI APARECIDA PIROZI BENTO


II

VIVÊNCIAS ESTÉTICAS E ARTÍSTICAS NA EDUCAÇÃO INFANTIL

Monografia apresentada à Faculdade de


Tecnologia Modulo Paulista como requisito
parcial para obtenção do título de Especialista
em História e Estética da Arte

Orientador: Prof. Me. Enésio Marinho da Silva

SÃO PAULO
2016
III

SOELI APARECIDA PIROZI BENTO

VIVÊNCIAS ESTÉTICAS E ARTÍSTICAS NA EDUCAÇÃO INFANTIL

Monografia apresentada à Faculdade de


Tecnologia Modulo Paulista como requisito
parcial para obtenção do título de Especialista
História e Estética da Arte

Orientador: Prof. Me. Enésio Marinho da Silva

Banca Examinadora

Aprovado:

Orientador: Prof. Me. Enésio Marinho da Silva

Professor revisor: Enésio Marinho da Silva Junior


IV

RESUMO

Esta monografia apresenta um trabalho de estudo bibliográfico e prático sobre o ensino


de artes na educação infantil. O intuito foi mostrar possíveis trabalhos simples e ricos
que podem aprimorar a prática do educador na busca de uma aprendizagem
significativa que envolve um trabalho com todas as formas de artes desde o berçário. A
análise crítica e reflexiva sobre a prática pedagógica e os textos metodológicos
possibilitaram um trabalho real, que foi aplicado em sala de aula ao longo do ano letivo.
O presente trabalho tratou sobre as questões da importância da arte desde a primeira
infância, as explorações possíveis dentro dos espaços escolares e as possibilidades de
um trabalho que desperta o imaginário e a criatividade, trazendo consigo diversas
propostas e fotos de materiais usados com crianças pequenas. Para finalizar, o trabalho
traz uma reflexão sobre a organização e exploração dos espaços escolares como
facilitadores da aprendizagem infantil.

PALAVRAS-CHAVE: Arte na primeira infância; experiências estéticas na educação


infantil; espaços facilitadores de aprendizagem.
.
V

ABSTRACT

This monograph presents a bibliographic study and practical work on arts education in
early childhood education. The aim was to show how it’s possible, simple and rich work
with arts to improve the practice of educators in the pursuit of a meaningful learning that
involves working with all forms of arts since the first years of education. The critical and
reflective analysis of the pedagogical practice and methodological texts allowed a real
work, which was applied in the classroom throughout the school year. This study
addressed the questions of the importance of art from early childhood, the possible
exploits within the school spaces and possibilities of a work that awakens the
imagination and creativity, bringing with it a number of proposals and materials like the
photos used with babys and children. Finally, the work presents a reflection on the
organization and operation of school spaces as facilitators of early learning.

KEY-WORDS: Art in early childhood; aesthetic experiences in early childhood education;


facilitators of learning spaces.
VI

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO...................................................................................................................1
CAPÍTULO 1: A arte na primeira infância......................................................................3
CAPÍTULO 2: Explorações e experiências estéticas: as expressões de bebês e
crianças através da arte..................................................................................................9
CAPÍTULO 3: O espaço escolar como facilitador da criatividade e imaginação....20
CONSIDERAÇÕES FINAIS.............................................................................................26
1. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS........................................................................29
1

INTRODUÇÃO

O trabalho de artes é essencial para o desenvolvimento humano. De acordo com


a legislação vigente, ele é obrigatório em toda a educação básica, ou seja, do 0 aos 17
anos. Assim, pretendemos neste trabalho, entender como se dá a aprendizagem em
artes na educação infantil e conhecer práticas pedagógicas capazes de enriquecer o
trabalho em sala de aula e nas áreas que compõem a escola como um todo.
Acreditamos que na educação infantil, a criança aprende pela vivência e não
pela memorização, desta forma, o trabalho com artes precisa ser experimentado e
apreciado para que seja significativo e capaz de ampliar os conhecimentos infantis.
Bebês e crianças exploram seu ambiente de diversas formas e são capazes de
interagir e transformar objetos de acordo com os estímulos que recebem e das
propostas planejadas pelos educadores.

1. OBJETIVOS

1.1 OBJETIVO GERAL

 Analisar como se dão as vivências estéticas e artísticas na Educação Infantil.

1.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS

 Compreender a visão dos professores de Educação Infantil sobre a concepção


de Artes

 Refletir sobre as diversas linguagens exploradas pelos bebês e crianças nas


escolas de Educação Infantil.

 Problematizar as ações dos professores no ensino de Artes para além do


desenho pronto.

 Entender como se dá a aprendizagem em artes para bebês e crianças.


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JUSTIFICATIVA

Esta monografia surge como uma perspectiva de entender e aprimorar a


aprendizagem de crianças pequenas. A cada dia, fica claro a importância de explorar a
arte como um todo em um trabalho de sensibilizar o olhar da criança para o mundo.

Justifica-se a escolha deste tema como um levantamento, um questionamento e


até uma provocação frente as concepções de arte educação perpetuadas por muitos
anos apenas no campo da pintura. Aqui, propõe-se ampliar esta visão para que
professores de Educação Infantil possam compreender e explorar as grandes
possibilidades que as Artes são capazes de nos oferecer para que a criança tenha uma
vivência que a leve a uma aprendizagem significativa.

É importante que se verifique a escuta e as vozes das crianças e bebês na


sensibilidade e nas experiências do dia-dia. A escuta que vai além do falar, a escuta
que exige um olhar atento do professor e lhe permite uma interação plena de qualidade.

Ao trabalhar com educação infantil, temos a certeza de que este público é


essencial para garantirmos uma qualidade do ensino como um todo. Neste contexto, o
tema se faz imprescindível para auxiliar os profissionais da educação nas suas
indagações da educação artística que trabalha para o desenvolvimento integral das
potencialidades e habilidades dos bebês e crianças dentro das unidades de Educação
Infantil.
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PROBLEMA

Por muitos anos, o ensino de artes esteve limitado ao desenho. Sempre


sentados e com um desenho impresso no computador ou feito nos antigos
mimeógrafos. Era considerado um aluno bom em artes, aquele que pintasse sempre
dentro dos limites pré-estabelecidos, preferencialmente com o lápis sempre no mesmo
sentido para não haver conflito no desenho.
O estético, ligado ao belo, era sempre levado como um desenho perfeito que
respeitasse todos os espaços. Este tipo de linguagem está superado e hoje é visto
apenas como passatempo. A linguagem artística é muito mais ampla e pode e deve ser
trabalhada desde os bebês nas explorações do mundo.
No presente trabalho, propomos uma visão da vivência que vai além do desenho
pronto e explora as diversas formas de conhecimento do corpo e da imaginação que a
criança pode ter.
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CAPÍTULO 1: A arte na primeira infância

A educação infantil de 0 a 3 anos no Brasil é muito marcada pelas creches,


vinculadas a mulher trabalhadora que precisa deixar suas crianças em um lugar seguro
para que sejam cuidadas. Neste contexto criou-se divisão entre cuidar e educar.
Enquanto as mães pobres trabalhadoras iam trabalhar e deixavam seus filhos para
serem cuidados pela a assistência social, as famílias com uma condição social melhor,
deixavam seus filhos em espaços que priorizavam o educar, em um sentido ligado mais
ao desenvolvimento do intelecto.
O atendimento em creches e pré-escolas só é garantido pela constituição a partir
de 1988, onde se reconhece que a Educação Infantil é dever do Estado. O documento
traz mudanças importantes na percepção da educação de crianças pequenas e na
superação da visão puramente assistencialista. A partir daí, creches e pré-escolas
passam a construir novas identidades, reafirmadas e solidificadas com a Lei de
Diretrizes de Bases da Educação Infantil de 1996 que evidencia a mobilização de
esforços por guardar, proteger e assegurar à criança direitos básicos que, muitas
vezes, devido à situações precárias de vida acabam sendo negligenciados, mas que
têm sido reivindicadas há anos por vários segmentos da população.
Legalmente hoje, falamos que Educar e Cuidar são indissociáveis em toda a
educação básica, ou seja, dos 0 aos 17 anos. Do ponto de vista legal, a Educação
Infantil é a primeira etapa da Educação Básica e tem como finalidade o
desenvolvimento integral da criança de zero a cinco anos de idade em seus aspectos
físico, afetivo, intelectual, linguístico e social, complementando a ação da família e
comunidade. (LEI n٥ 9394-96, art. 29)
O trabalho do professor deve levar em conta o tempo da criança, pensando em
cada especificidade que esta carrega e como fazer para lhe proporcionar estímulos
capazes de desenvolverem ao máximo suas capacidades. Desde o início da vida
escolar, bebês e crianças tem o direito de se desenvolverem como cidadãos na
plenitude da palavra.
A proposta pedagógica para a educação infantil é entendida como um “conjunto
de práticas que buscam articular as experiências e saberes das crianças com os
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conhecimentos que fazem parte do patrimônio cultural, artístico e tecnológico” (Brasil,


2013 p. 86). Estas práticas são desenvolvidas por meio das relações sociais que
meninos e meninas experimentam e vivenciam no espaço escolar que transcende a
vivência familiar.

A compreensão de como bebês e crianças aprendem está na base do fazer


pedagógico e determina as escolhas feitas pelos docentes e demais
educadoras e educadores de bebês e crianças. As concepções que orientam a
proposição deste currículo integrador afirmam o processo de aprendizagem
como uma construção pessoal intermediada pela relação com o meio sócio-
histórico-cultural e em interação com os pares, com os adultos e com os
elementos da cultura com os quais interage, processo em que reconstrói para si
as capacidades presentes nessas interações.
A aprendizagem é, portanto, um processo complexo e dinâmico que deve ser
potencializado nos espaços institucionais dedicados à Educação a partir das
oportunidades de vivências múltiplas que considerem as diversas infâncias, as
vozes e os tempos dos sujeitos de aprendizagem e suas construções culturais
no encontro com a sociedade, os conhecimentos e a cultura. (São Paulo, 2015
p. 35)

Antigamente entendia-se que a criança aprendia de tanto ver, repetir e decorar,


hoje, este pensamento está superado e neste trabalho propomos o conceito da
aprendizagem pela vivência. É no experimentar o mundo que bebês e crianças se
desenvolvem e se apropriam dos conhecimentos. Neste sentido, o trabalho com as
diversas artes vai para além do obrigatório na educação infantil, ele é parte essencial
do desenvolvimento global de todas as crianças em uma perspectiva de aprendizagem
significativa.
O trabalho de artes com bebês e crianças, se faz importante no sentido de
despertar a sensibilidade e aguçar a imaginação infantil. Deleuze diz que “Alguém só se
torna marceneiro tornando-se sensível aos signos da madeira e médico tornando-se
sensível aos signos da doença”, nesse ponto levantamos a provocação, como tornar-se
um artista? Seria por uma sensibilidade as belezas do mundo?
O ensino de artes é obrigatório em toda a educação básica. A Lei de Diretrizes
de Bases da Educação Nacional n° 9394/96, em seu artigo 26, parágrafo 2° diz que
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O ensino de arte constituirá componente curricular obrigatório, nos diversos


níveis da educação básica, de forma a promover o desenvolvimento cultural
dos alunos. A arte é um patrimônio cultural da humanidade, e todo ser humano
tem direito ao acesso a esse saber.

O ensino de artes na educação básica ressalta o desenvolvimento artístico


desde a primeira infância, quando o bebê ingressa a vida escolar ainda antes de
completar seu primeiro ano de vida. Arte é essencial para o ser humano no interpretar
do mundo. Como conteúdo arte representa o melhor trabalho do ser humano (Barbosa
2003)
No dia a dia a escola pode proporcionar experiências que vão desde a fala,
observação, interação, movimento, criação e exploração. O olhar atento do professor é
essencial para entender as melhores estratégias para o ensino de artes a bebês e
crianças.
Uma atividade de visita a um museu por exemplo pode ser uma atividade
desastrosa se a criança não tiver maturidade para entender a exposição. Uma
exposição que não pode tocar em nada não é um bom lugar para levar crianças que
ainda não compreendem os códigos sociais das várias instâncias em que convivemos.
Todas as experiências são válidas para aguçar o desejo artístico, mas é preciso pensar
na maneira de oferecê-las, como no exemplo acima: Quais lugares devemos visitar com
as crianças.
Extrapolar os limites da sala de aula é muito rico e atualmente existe um leque
diversificado de exposições pensadas para crianças a partir do primeiro ano de vida.
São apresentações teatrais, shows, exposições culturais, tudo já direcionado para o
público pequeno.
É sabido que o ensino de artes é importante, mas sobretudo, convidamos o leitor
a pensar na aprendizagem significativa e intencional de artes para bebês e crianças no
sentido de ampliar os horizontes em momentos experimentados e apreciados com
prazer.

A magia, gerada na Alquimia da intuição, do olhar cuidadoso para cada


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aprendiz, no saber fazer, se revela na criação de situações de aprendizagem


significativa. Para construir esses momentos o educador terá de ser guloso em
seu desejo de ensinar, paciente na oferta e na espera de quem acredita e confia
no outro e amoroso no compartilhar de saberes. Como um pesquisador, ele
ensina porque quer saber mais de sua arte. E aprende a ensinar ensinando,
pensando sobre esse ensinar. E assim, ensinando, também aprende.
(MARTINS, PICOSQUE, GUERRA, 1998, p. 129)

É no ensinar/aprender que o educador se encontra, se descobre e redescobre e


a arte tem esse charme natural de dar sentido e significado as práticas infantis. A magia
do aprender acontece de forma natural quando é facilitada por um ambiente preparado
e pensado para o desenvolvimento das atividades artísticas. As atividades lúdicas
auxiliam diretamente no desenvolvimento da expressividade da criança.
Cada som, cada linha, gesto e cor são capazes de expressar o sentimento da
criança e precisam ser valorizadas e exploradas pelo professor. É tarefa do educador
sensibilizar a bebês e crianças para a apreciação, valorização e produção artística nas
áreas de música, teatro, artes visuais e dança.
Os estudos sobre a educação estética, a estética do cotidiano, complementando
a formação artística dos alunos, bem como, o encaminhamento pedagógico-artístico
que tem por premissa básica a integração do fazer artístico, a apreciação da obra de
arte e sua contextualização histórica são preconizados nos PCNs (1998, p.31)
A educação infantil é capaz de despertar toda a arte da criança no sentido mais
amplo possível da palavra. Bebês e crianças gostam de descobrir e inventar diversos
modos de interagir com o meio.
As artes visuais são facilmente exploradas em ambientes externos e internos,
com pinturas que vão além do sulfite A4, o bebê e a criança podem explorar chãos,
paredes, caixas, tanques de areia, podem pintar deitados, sentados e até mesmo em
pé. Os materiais podem variar entre tinta caseira que pode ir a boca, giz, lápis, carvão,
gravetos, e muitos outros que a imaginação e a criatividade do professor pode criar e
explorar.
Na área musical, a exploração pode ser feita em parques sonoros, com
instrumentos musicais, cantigas de roda, batuques em baldes, exploração dos sons
corporais como bater palma, bater pé, em uma infinita teia de ideias de espaços
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acústicos diferenciados.
No campo da dança e do teatro, a descoberta do corpo pode ser trabalhada por
meio de apreciação e experimento, com músicas de diversos ritmos, levando bebês e
crianças e mudarem seu ritmo de acordo com a entonação da música e da batida. Na
experimentação do corpo na contação e reprodução de histórias.
A rede de ensino de artes na educação infantil pode ser extensa e bem bordada,
mas depende de uma organização didática intencional e pré-elaborada rica em detalhes
que tornem a aprendizagem significativa e prazerosa para crianças tão pequenas.
A formação de professores é essencial no trabalho com crianças da educação
infantil, especialmente porque nesta idade não há um especialista para esta
modalidade. Na educação infantil, o ensino de artes é entendido como parte integrante
de todo o ensino, não podendo ser desvinculado dos demais momentos em que bebês
e crianças estão aprendendo.
É por meio das artes que a criança experimenta, vivencia e interage com o
mundo. O desenvolvimento está diretamente ligado com a aprendizagem de artes e
assim, a formação que possibilita ao profissional da educação essa visão apurada e a
construção de atividades que estimulação essa aprendizagem é essencial e parte
integrante da educação infantil.

Aprender passa a ser sinônimo de vivenciar e atribuir um sentido ao vivido.


Sendo assim, aprender não ocorre de forma única, igual para todos e ao
mesmo tempo. Isso significa que bebês e crianças aprendem quando estão por
inteiro nas interações que estabelecem com as coisas, as pessoas, os objetos
ao seu redor, tanto os fenômenos da natureza como os objetos criados pelos
seres humanos (quando observam, exploram, investigam, descobrem, ouvem,
imitam, inventam). Aprendem com seu corpo, sua mente e suas emoções. (São
Paulo, 2015 p. 37)

Assim, quanto mais curiosas as crianças forem e mais aprendizados


experimentarem por meio de ambientes previamente pensados e criados, mais as
crianças serão capazes de desenvolver sua criatividade e interpretação do mundo em
que vivem.
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Nos momentos de aprendizagem, o olhar atento do professor é essencial para


perceber se alguma criança não participou por medo, timidez ou alguma limitação.
Nessa percepção cabe ao educador, o estímulo e auxílio para que todos participem e
se desenvolvam com qualidade.
Entender bebês e crianças como sujeitos e considerar suas especificidades é
essencial na garantia de qualidade do ensino de artes. A participação também é
incentivada quando o adulto conversa com bebês e crianças para estabelecer um
momento de confiança que é mais emocional que verbal. Pelo tom da voz, pelo respeito
aos tempos da criança, o professor consegue criar um ambiente seguro e facilitador da
aprendizagem em que todos se sintam motivados e participem ativamente de todas as
propostas estéticas e artísticas propostas.
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CAPÍTULO 2: Explorações e experiências estéticas: as expressões


de bebês e crianças através da arte

Desde muito pequenas crianças devem ser mediadas na construção de uma


visão de mundo que priorize suas vivências e experiências. Proporcionar a criança a
maior quantidade de experiências é essencial para que ela encontre o prazer da
aprendizagem em artes.
Bebês e crianças não podem se limitar a aprendizagem apenas relacionadas ao
desenho. O movimento do corpo, as experiências táteis, a massa de modelar, o
encontro com a música, são essenciais para o desenvolvimento global na educação
infantil.

Em nosso sistema educacional, tudo se orienta para o estudo que, na maioria


dos casos, significa apenas a aquisição de conhecimentos. No entanto, bem
sabemos que o simples conhecimento não é suficiente para nos fazer feliz. A
educação unilateral, em que se dá a máxima importância à acumulação do
saber, tem descuidado de muitas coisas também importantes, de que as
crianças necessitam para se adaptarem, adequadamente, ao mundo. As
manifestações artísticas, iniciadas nos primeiros anos de vida, podem significar
para nossos filhos a diferença que existe entre indivíduos adaptados e felizes e
outros que, apesar de toda a capacidade, continuam, às vezes, desequilibradas
e encontram dificuldades e suas relações com o próprio ambiente.
(LOWENFELD, 1954 p. 19)

Aprender é vivenciar, explorar, interagir e se apropriar de novos saberes e


sabores. O trabalho de artes na educação infantil está intrinsicamente ligado ao
desenvolvimento da criança de maneira a assegurar a manifestação de seus desejos,
interesses e curiosidades. Na participação das propostas artísticas, o lúdico entra em
cena e a criança se sente livre para expressar o que está sentindo.
Para uma criança a descoberta do mundo se dá por meio de ressignificações.
Suas expressões artísticas são capazes de demonstrar suas interações e explorações
de mundo. A apropriação de uma pintura no chão, na parede, na areia, com objetos
diversos como carvão, gravetos, pedras e até utensílios domésticos como buchas e
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lixas podem significar uma conquista plena do trabalho do corpo em todas as suas
possibilidades.
Com crianças, especialmente as mais pequenas, é preciso abrir o leque de
possibilidades estéticas na aprendizagem de artes. A pintura de desenhos prontos, feita
sempre com giz ou lápis sentado na mesa, nada mais é do que um momento de
disciplina do corpo. Pintar dentro dos limites pré-estabelecidos e sempre na mesma
posição, com os mesmos recursos, não pode ser considerado um trabalho efetivamente
artístico, pois a criança ao invés de explorar suas potencialidades e conhecer o mundo
por meio da arte, ela é limitada a um pequeno mundo em que deve respeitar um limite
planejado de silêncio e ordem.
A criança pequena ao receber um desenho pronto, mesmo que de um
personagem ou objeto que ela conhece e aprecia, tende a pintar todo o desenho e logo
o que já estava posto desaparece, fazendo com que perca o interesse rapidamente.
Com bebês e criança, entendemos que eles podem muito mais, é preciso oportunizar
às crianças experiências diversificadas de desenhos, ampliar seu repertório, oferecer
diferentes gravuras, fotos, obras de arte, livros e outras para garantir a ampliação do
repertório pela construção de boas referências para assim o desenho fazer sentido para
elas no intuito de a cada dia melhorar a qualidade estética do mesmo.
Neste capítulo, pretendemos mostrar experiências estéticas desenvolvidas com
crianças de 0 a 3 anos, discutir e entender essas práticas para exemplificar o trabalho
com artes na primeira fase da educação infantil.
A criança na fase maternal tem o prazer em descobrir o mundo, e essa
descoberta se dá no dia a dia com diferentes recursos e oportunidades de criação. Nem
sempre o adulto precisa estar em cima, é importante que o professor crie um ambiente
que possibilite a imaginação e deixe a criança criar livremente.
Aqui pretendemos mostrar e discutir experiências estéticas em todas as grandes
categorias de artes, teatro, música, dança e artes plásticas com crianças de 0 a 3 anos,
em uma vivência de um CEI da prefeitura de São Paulo.
Na linguagem teatral, com crianças pequenas, as professoras de uma turma de
Berçário II, com bebês de idade entre um e dois anos, as professoras criaram uma
proposta de despertar a criatividade e as diferentes significações com objetos do
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cotidiano que poderiam ser usados de acordo com a imaginação das crianças. Pedaços
de pano entregue em uma atividade com uma proposta artística teatral, podem virar
inúmeras possibilidades, crianças exploraram os panos tornando-os cachecol, outras
criaram brincadeiras ligadas a passar embaixo, em cima do pano, alguns reproduziram
um pano que cobre uma criança, como em um embalo que a mãe lhe dá, outros até
mesmo preferiram limpar as mesas, é nesse momento que os professores observam,
registram e interagem para entender e escutar as crianças. Um pedaço de pano que
pode não parecer nada para adultos, em um pequeno trabalho, foi significado e
ressignificado diversas vezes com infinitas possibilidades de interação. Os panos foram
trabalhados ao longo do mês, panos diferentes, em ambientes diversos e com
propostas amplas, criaram uma gama de atividades como as descritas abaixo:
Figura 1: Criança com um pedaço de pano, transformando-o em um cachecol

Foto: Soeli Aparecida Pirozi Bento

Figura 2: Momento em que as crianças usaram panos para embalar bonecas

Foto: Soeli Aparecida Pirozi Bento

Figura 3: Neste momento, a professora amarrou os panos e as crianças brincaram de puxar uma a outra.
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Foto: Soeli Aparecida Pirozi Bento

Figura 4: Proposta da professora: amarração dos panos em um corredor para que as crianças
inventassem maneiras de passar (em cima, embaixo)

Foto: Soeli Aparecida Pirozi Bento

O Brincar é uma linguagem da educação infantil e está diretamente ligada a


apropriação do conhecimento artístico. No ato do brincar tudo ganha um novo
significado e o aprender brincante assume a essência da criação de papéis, temas e
enredos. O corpo é estimulado e o resultado são crianças capazes de explorar o mundo
e sentir os sabores através de suas expressões artísticas.
Atividades como as descritas acima fazem parte do brincar e imaginar em que o
professor proporciona diversas aprendizagens a partir de um mesmo material (no caso,
pedaços de pano). O trabalho com artes vai além do pintar um desenho impresso no
computador, e esta concepção que pretendemos expandir, explorar e exemplificar.
Nas artes visuais, podemos explorar o trabalho em diferentes ambientes e com
diversos materiais. Entender o desenho da criança como um momento de prazer e
expressão de sentimentos sobre o mundo possibilita ampliar a visão de mundo do
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educando. A experiência que realiza, ao dirigir e controlar os movimentos dos traçados


das linhas, dá-lhe grande confiança. Traçar riscos num pedaço de papel, em uma lousa
ou outro objeto, em qualquer direção, significa para a criança alegria, felicidade e
contribui principalmente para o domínio de uma função de suma importância: a
coordenação dos movimentos.
Para compreendermos o verdadeiro significado dos rabiscos infantis, devemos
nos esforçar para nos colocarmos no lugar das crianças. Quando uma criança está
absorta em seus rabiscos, não tem tempo sequer para olhar à sua volta.
As garatujas infantis são tão diferentes entre si quanto as próprias crianças.
Algumas tem o traçado firme, outras desenham pequenos círculos, riscos retos, e cada
tipo de desenho traduz sua própria criação da personalidade artística. Assim, a ação de
borrar, rabiscar e garatujar proporciona à criança uma importante oportunidade para
sua expressão de sentimentos.
Muitas unidades escolares possuem paredes e muros que podem ser lavados e
nos quais as crianças podem pintar livremente, e as escolas podem criar outros
espaços mais como colar papel pardo na parede e meses para que a criança
experimente diversas formas de pintura na vertical.
Figura 5: Atividade coletiva de pintura com as mesas viradas na vertical dando liberdade para as crianças
pintarem em pé ou sentadas.

Foto: Márcia Fonseca Nascimento

Figura 6: explorando o desenho no chão com giz de cera em um momento individual.


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Foto: Soeli Aparecida Pirozi Bento

Figura 7: Atividade de pintura e colagem. A professora desenhou o corpo no chão, e depois as crianças
pintaram e colaram as partes do corpo no desenho. Atividade com tinta, lápis e colagem.

Foto: Marcia Fonseca Nascimento

O cotidiano infantil é repleto de expressões artísticas. Essas expressões são


instrumentos da criança na sua linguagem com o próprio corpo e o mundo ao redor. O
grande diferencial no trabalho de artes na educação infantil, está ligado a
intencionalidade do profissional. O professor propõe atividades com a intencionalidade
de provocar, despertar e incentivar o desenvolvimento artístico. É nesse sentido que os
professores carecem de formação para criarem um ambiente capaz de explorar todas
as áreas de artes que são responsáveis pelo desenvolvimento das crianças pequenas.

Em se tratando de escola, é necessário atentar para como a criança se


aproxima e age em relação ao aspecto estético e artístico do conhecimento,
essas observações ajudarão o professor a saber o que e como propor
experiências e situações que façam avançar as percepções e observações das
crianças, bem como seus repertórios de saberes. (PONTES, p. 45)
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O escutar, ver e entender as crianças no ambiente escolar é indispensável para


a aprendizagem em artes. Cabe ao profissional da educação na sala de aula e nos
demais ambientes de aprendizagem, se atentar as necessidades da criança para criar
as melhores estratégias no ensino de artes. O Ensino deve ser prazeroso e significativo
para ter valia para a criança pequena.
O ato criador da criança se desenvolve no individual e no coletivo, por isso é
importante que o professor proporcione atividades coletivas, como desenhos coletivos,
expressões em que as crianças possam participar junto com os demais colegas para
construírem juntas uma obra da turma.
No trabalho com crianças tão pequenas, o professor deve se atentar com
cuidado para proporcionar as experiências mais diversas a fim de conseguir despertar
nos bebês e crianças um olhar diferenciado e rico para as culturas produzidas no
mundo.

Naturalmente, as crianças entram em contato com o mundo sensível,


agindo sobre ele com afeto, cognição, motricidade; e constroem para si um
repertório perceptivo de formas, cores, texturas, sabores, gestos e sons,
atribuindo a este mundo, sentidos e organizações diferentes. O professor deve
considerar essas significações já construídas e colocar o desafio de construir
outras, inclusive as estéticas. (PONTES, 2001 p. 38)

A criança está inserida em um mundo que produz cultura, que cria elementos
artísticos e que devem ser levados em consideração nos planejamentos pedagógicos.
Desde muito pequenos a visita a teatros e exposições que sejam adequados a faixa
etária podem agir como formadores de uma criança que se relaciona com a cultura e
cria um repertório extenso capaz de entender e admirar, no seu tempo, diferentes
formas de expressão artísticas.
A linguagem artística da música e da dança são muito trabalhadas com crianças
pequenas. É essencial no trabalho com bebês e crianças, desenvolver momentos de
dança e proporcionar a experiência de vivenciar diferentes estilos musicais. A dança é a
arte do movimento. Para dançar, não é necessário haver sempre música, sons
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corporais e do ambiente podem ritmar uma dança, mas aqui neste trabalho, vamos nos
atentar a dança com a música e a linguagem corporal ritmada.
Na escola, a dança permite a criança, evoluir o domínio do seu corpo,
desenvolver e aprimorar movimentos, descobrir novos espaços, explorar a lateralidade,
equilibrio e superar limitações.
O momento da dança implica em uma atividade que vai além da imitação de
gestos propostos pelo professor. Quando pensamos em dança, temos que ter em
mente que a criança é livre para explorar o seu corpo e criar diferentes formas de
explorar os ritmos. Assim como o desenho no papel sentado sempre a mesa é uma
forma de disciplinar o corpo, também a dança, em que o aluno é sempre refém da
imitação o é.
É importante ter a figura do professor junto na dança, mas sempre respeitando a
criança e sua maturidade. Alguns alunos têm prazer em imitar o professor, outros
preferem criar suas próprias coreografias, assim, o professor não deve criticar ou proibir
o aluno de dançar conforme sua imaginação.
É difícil imaginar que uma criança que ouça uma música alegre não tenha
vontade de dançar, é nato do ser humano se movimentar com o som. O trabalho com
música aguça os sentidos do nosso corpo como a visão, o tato e principalmente a
audição.
Não existe idade mínima para trabalhar a dança, mesmo bebês que ainda não
andam, experimentam a música e se movimentam no ritmo. Muitos tentam bater
palmas e movimentar os pés, com um trabalho sequencial que priorize as danças e as
músicas, bebês e crianças pequenas são capazes de criar coreografias simples e
representa-las. Abaixo pegamos como exemplo um trabalho desenvolvido com turmas
a partir dos 11 meses nos berçários II do Centro de Educação Infantil de um CEU da
Cidade de São Paulo que tem já em seu currículo apresentações de dança ao longo do
ano.
Desde o ingresso no CEI, as crianças frequentam os espaços do teatro e da sala
de dança. A visita semanal a estes espaços, repletos de musicalidade, são
importantíssimos para um trabalho que pretende desenvolver a criança como um todo,
em que ela é capaz de se apresentar para uma grande audiência sem ter medo do
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palco ou das cortinas. A sala de dança, repleta de espelhos, possibilita que a criança
veja seu próprio corpo e se comunique com ele.

Figura 8: bebês com idades que variam entre 6 meses e um ano visitam pela primeira vez o teatro. Na
visita os professores fizeram uma proposta de cantar e interagir com a cortina (abre e fecha) levando as
crianças para conhecer e participar do espaço

Foto: Márcia Fonseca Nascimento

Figura 9: Bebês e crianças na sala de dança. Como a sala é grande, há a interação de várias turmas na
atividade.

Foto: Márcia Fonseca do Nascimento

Figura 10: Apresentação de final de ano. Os alunos dançaram para os pais a música I’m a Believer da
banda Smash Mouth do Filme Sherek. As crianças para a apresentação se fantasiaram de Fionas de
Shereks em alusão ao filme.
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Foto: Márcia Fonseca do Nascimento

Este trabalho desenvolvido ao longo do ano letivo, trabalhou tanto a linguagem


musical quanto a dança e o teatro. No dia a dia a prática pedagógica com crianças
pequenas deve permear todas as linguagens de artes. Nesta faixa etária não é possível
pensarmos em um trabalho artístico que privilegie apenas o desenho. O desenho é tão
importante quanto a música, a dança e o teatro.
A música contribui na educação tornando o ambiente mais agradável e alegre,
ajuda na socialização das crianças e até acalma dependendo da intencionalidade do
profissional.
A música pode ser trabalhada de infinitas maneiras. Além do prazer que a
música traz, ela auxilia os alunos que são tímidos a vencer a inibição e participar das
propostas com os colegas.
A escola é um local privilegiado para a aprendizagem musical e na educação
infantil ela é essencial no processo criativo das crianças. Quanto mais cedo a criança
tiver acesso a um repertório musical amplo e diferenciado, maiores serão as chances
dela compreender e assimilar a música no seu contexto histórico e social. Por isso é
importante também, que o professor se atente a uma aprendizagem intencional na
linguagem artística musical.
A intencionalidade se dá na busca ampla de repertório, no sentido da pesquisa,
da compreensão e da oferta para as crianças. Os bebês e crianças estão aptos para
ouvir diversos tipos de gêneros musicais que podem e devem ser trabalhados com
cuidado. O acompanhamento com instrumentos musicais, e/ou material não estruturado
como latas e caixas ajudam na proposta rítmica para que a criança entenda a estrutura
da música.
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Figura 8: Proposta coletiva musical em que as crianças e a professora batiam em uma caixa plástica
ritimando a música cantada pela professora.

Foto: Soeli Aparecida Pirozi Bento

Figura 9: Crianças fora da sala, em espaço aberto criando música a partir de brinquedos de
instrumentos musicais.

Foto: Soeli Aparecida Pirozi Bento

Na música o professor pode explorar também os sons que o corpo produz como
palmas, bate o pé, mão na perna, na barriga, na boca, a infinidade de sons que o corpo
produz é um rico caminho de autoconhecimento e aprimoramento musical.
O trabalho com música permite que bebês e crianças desenvolvam o senso
rítmico e a coordenação motora, fatores importantes também para o processo e
aquisição de leitura e escrita
21

CAPÍTULO 3: O espaço escolar como facilitador da criatividade e


imaginação

Mais do que um espaço físico, a escola representa uma concepção pedagógica


histórica. A cada dia de aula, o espaço se altera e suas experiências são traduzidas
e criam um retrato da educação.
O espaço para aprendizagem precisa ser acolhedor. Assim como o artista
prepara seu cenário, o professor precisa preparar o ambiente para receber o aluno
e tornar o espaço um facilitador da aquisição e construção de conhecimentos. Além
dos materiais, é preciso oferecer ricas experiências que oportunizam a
aprendizagem.

Pensar o ensino de arte é também pensar o processo de poetizar,


fruir e conhecer arte. Percebendo e analisando seus recursos e
resultados e compreendendo os seus conceitos e contextos na
perspectiva do próprio universo. (MARTINS, PICOSQUE e
GUERRA, 1998, p. 153)

Dentro da escola, muitos são os espaços que podem ser explorados para a
aprendizagem artística. As explorações dos espaços escolares facilitam a
criatividade e a imaginação dos educandos que podem explorar, interagir e criar.
No espaço escolar, é imprescindível que o aluno reconheça seus traços. Quanto
mais exposições das manifestações artísticas das crianças, mais estes se sentiram
pertencentes dos espaços.
Nas paredes o professor pode colocar fotos de atividades dos alunos, expor
desenhos coletivos e individuais, expor objetos criados com reciclagem, argilas e
até massinhas. O importante é que a criança possa se sentir pertencendo daquele
espaço e criadora de cultura.
Colar figuras de personagens prontos para decorar a sala podem não ter o
mesmo significado e valor para a criança quanto ver seu trabalho exposto. Cada
vez que colocamos o trabalho das crianças em um local que elas vejam, é
importante pensar em uma organização estética, penduradas de maneira
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harmônica e organizada. A exposição deve mostrar o cuidado do professor com o


processo criativo dos alunos. Se encher a parede com babados ou fundos muito
coloridos, isso pode esconder a produção da criança, e a proposta das paredes é
que elas se comuniquem com a criança e expressem as suas produções. A criança
precisa se identificar com esse espaço que deve estar na altura dos olhos deles. No
trabalho com crianças muito pequenas, ao expor na altura das crianças, é
importante ter o cuidado para que a criança possa interagir, sem estragar sua obra.
Um pedaço plástico por cima das obras sem tampar as produções, é um recurso
interessante e dá conta de proteger os trabalhos, sem impedir que as crianças os
aprecie.
Pensar o espaço da sala de aula e da escola como um todo é trazer vida ao
ambiente escolar. Não é possível entender a escola como um conjunto de paredes.
A produção das crianças e suas marcas vão se tornando signos do que vamos
concretizando.
O cenário da aula de artes não é apenas a sala de aula, artes pressupõe um
convite a exploração. Conhecer jardins, pátios, parques e todos os espaços que a
escola possui são primordiais na descoberta e abrem oportunidades de olhar e
escutar pelos olhos do pensamento, do sentimento, da percepção e da imaginação.

Todas as informações visuais internas e externas são possibilidades de


investigação para a formação em arte. Observar a organização e a
desorganização do mundo pode trazer inúmeros elementos a serem estudados.
Aspectos relativos à natureza, desde sua mais ampla expressão até sua
selvageria, também são ricos em referências e materiais. (BARBIERI, 2012 p.
21)

O ensino de arte está diretamente ligado a intencionalidade do processo na


criação e organização dos espaços. O professor que analisa seus recursos é capaz
de criar propostas que desenvolvem a criança como um ser global. Segundo
Barbieri, “o trabalho do professor se assemelha ao do artista, porque ambos lidam
com a possibilidade de criar novos sentidos”. O professor cria seu planejamento,
organiza o espaço interage, transforma, proporciona e se relaciona com o aprendiz.
23

As crianças são curiosas, elas são chamadas a interagir com aquilo que lhes
desperta o interesse, e é tarefa do educador escutar a criança para entender as
atividades que lhe aguçam a participar. A medida que vamos percebendo a
necessidade da criança, vamos esculpindo nossa aula com base nos interesses e
necessidades dos bebês e crianças.
No espaço escolar, por mais barreiras que o espaço e o tempo possam criar, é
sempre possível inovar. É necessário que o educador esteja atento a gama de
atividades que podem ser oferecidas dentro e fora da sala de aula para criar
propostas interessantes e atrativas para a faixa etária dos alunos.
Em muitos momentos, atividades simples como manuseio de massinhas são
excelentes para desenvolver o tato e a sensibilidade das crianças. O que
pretendemos trabalhar neste capítulo são ações variadas que um espaço escolar
pode proporcionar para ampliar e dar sentido no repertório artístico infantil.
Experiência aqui é entendida como o ato de experimentar. Ninguém quer
experimentar todos os dias feijão e arroz, não que feijão e arroz seja ruim, é muito
bom, mas nós queremos experimentar todos os sabores que a natureza pode nos
oferecer. Dentro da sala de aula, os professores não podem dar aos alunos apenas
uma forma de arte todos os dias. O desenho, por exemplo, por mais gostoso que
seja, não pode ser todo dia com o mesmo tempero. Imagine uma escola em que
todos os dias, depois da refeição os alunos desenham com giz de cera na folha de
sulfite. Nessa escola, podemos dizer que há um trabalho intencional artístico?
Nessa metáfora proposta, podemos imaginar a criança comendo todos os dias
arroz e feijão com o mesmo tempero e na mesma quantidade, uma hora, ela enjoa.
Quão mais gostoso é cada dia ter algo novo para experimentar, novos sabores,
novos temperos, novas formas de preparar. Até pode ter feijão todos os dias da
semana, mas um dia pode ser feijão branco, no outro preto, carioca, com linguiça,
sem nenhum tipo de carne, com farinha, o desenho, assim como o feijão com arroz
é repleto de preparos, desenhos com diferentes texturas, materiais e em diferentes
espaços mantém na criança o interesse pela arte visual sempre aguçado.
Quando organizamos o espaço para a atividade, uma pergunta que o professor
pode e deve fazer sempre é: este espaço me dá vontade de interagir?
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A seguir vamos mostrar exemplos de salas e espaços preparados para receber


crianças pequenas, pensado na interação e na construção de conhecimento que
ela teria naquele ambiente. São atividades simples que podem ser feitas em
qualquer sala de aula ou pátio escolar.

Figura 10: Sala de aula com caixas e banheiras para as crianças interagirem como a imaginação
permitisse.

Foto Soeli Aparecida Pirozi Bento

Nesta atividade simples, qualquer sala pode ser espaço de criação. A proposta
foi disponibilizar as caixas e as banheiras da própria escola para as crianças
interagirem. Muitos logo entraram na banheira por já conhecerem, outros
exploraram as caixas colocando na cabeça, entrando e saindo das caixas,
experimentando esconderijos e novos significados para os materiais disponíveis.

Figura 11: Sala de aula com bexigas penduras.

Foto Soeli Aparecida Pirozi Bento


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Nesta outra proposta, também com material de fácil acesso, as crianças


entraram na sala com bexigas penduradas por toda a sala. Assim elas puderam
sentir as bexigas e interagir com elas, batendo, puxando e algumas vezes até
estourando. Nessa atividade é importante que o professor esteja muito atento ao
movimento dos alunos para que nenhum deles coloque restos de bexigas na boca.
Figura 12: Sala de aula com elásticos

Foto: Márcia Fonseca do Nascimento

Nesta atividade, a proposta foi trabalhar a brincadeira indígena cama de gato.


Um trabalho de artes ligado ao conhecimento e exploração da cultura indígena de
acordo com a LEI 11.645/08. A professora fez uma adaptação da brincadeira que é
brincada com barbantes presos a mão e os prendeu nas paredes, assim as
crianças ao explorar os elásticos, podiam criar diferentes formas.
Para Barbieri (1998 p. 49) “O espaço tem intenção. Ele orienta a ação. Ao
entrarmos em um espaço bagunçado, ele nos convida de determinada maneira. Um
lugar cuidado, preparado, nos convida de outro jeito”. O espaço criado, pensado e
organizado para estimular o corpo e a imaginação são lúdicos, possibilitam a
criação de jogos, de brincadeiras e despertam o lado brincante criativo das
crianças.
A questão não se reduz a compra de brinquedos, como vimos nas figuras
anteriores, é possível explorar e criar atividades artísticas interessantes com
poucos recursos. Dentro das salas, o professor pode colocar músicas no ambiente
para eles criarem novos significados rítmicos.
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É preciso organizar o espaço de maneira que as crianças possam se sujar, se


expressar e criar sem tantas restrições. O ambiente previamente imaginado e
elaborado faz com que o professor precise intervir menos durante a atividade. Em
um trabalho com tinta, por exemplo, se o professor forrar o chão, provavelmente ele
terá menos problemas caso caia tinta no chão. Em um trabalho com giz de cera, se
ele disponibilizar giz de diferentes cores em quantidade suficiente para todos, ele
terá menos problemas de conflitos na sala. Neste sentido, que o planejamente do
professor, e a prévia organização do espaço são essenciais para o trabalho com
artes, em especial com crianças de 0 a 3 anos.
Além de planejar o espaço, o professor precisa pensar no tempo. Cada idade,
cada grupo escolar tem seu próprio tempo de concentração. As crianças vão
aumentando gradativamente seu tempo de interação com a atividade ao longo da
vida escolar. Por isso, o espaço bem organizado, também perpassa pelo tempo que
ela irá destinar aqueles objetos dispostos.
Quando pensamos em educação de 0 a 3 anos, por vezes nos vimos gastando
horas para planejar, elaborar e organizar o espaço em que por fim as crianças
brincam 15 minutos. É importante que o profissional da educação entenda que
foram ricos 15 minutos, que na próxima podem ser 20, 25, mas eles vão depender
também da sensibilidade do professor, que pode criar e recriar novas propostas
neste mesmo espaço capazes de despertar cada vez mais o interesse da criança.
Na educação infantil, o espaço deve ser criado de maneira que a criança não
precise ficar todo o tempo sentada. Uma atividade planejada de meia hora com
crianças de 3 anos o tempo todo sentadas, pode estar fadada ao insucesso. As
crianças nesta faixa etária podem e devem se locomover, seja para pegar um giz
na mesa do lado, seja para mostrar sua produção para um colega ou professora.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS

O trabalho de artes na educação infantil é indissociável do trabalho do professor


polivalente. Apesar da faixa etária não contar com um professor especialista, formado
em artes, não é possível pensar o desenvolvimento de crianças e bebês sem levar em
conta a aprendizagem artística.
A criatividade e a descoberta do corpo são aprimoradas e trabalhadas em uma
pedagogia intencional preparada e pensada na perspectiva de criar um ambiente lúdico
capaz de proporcionar uma aprendizagem significativa e prazerosa.
A importância da arte desde a primeira infância inclui a preparação da sensibilidade
das crianças para apreciar as belezas do mundo. É neste sentido que um bom trabalho
artístico fará toda a diferença para a criança ao longo de toda sua trajetória escolar.
A criação artística está presente em toda a história humana, nos influencia e nos
torna intérpretes do mundo. Proporcionar esta vivência aos alunos, é passar a
simplicidade, a clareza, a profundidade, a simpatia e a leveza do mundo.
O professor, quando assume uma postura artística, coloca em pauta os
movimentos da criança em um processo de aprendizagem autônoma de ideias e
expressões. É capturar a singularidade do movimento expresso e interpreta-lo dando
significado as criações das crianças.
Educar é interagir, é agir com o outro, o que indica necessariamente um foco na
significação e na valorização dos convívios, na fala, na observação, no acolhimento e
no acalento com crianças pequenas.
Ao propor um trabalho com foco em crianças de 0 a 3 anos, indicamos situações de
aprendizagens que requerem um conhecimento do chão da sala, dos espaços das
paredes, das necessidades de cada educando segundo sua faixa-etária tão singular e
repleta de especificidades. Acreditamos ser importante que o professor questione sua
rotina e construa um olhar apurado sobre as relações cotidianas. Estranhar o natural
estimula a criatividade, a inovação, o agir e o refletir. E assim, é possível ir além do que
já se propôs no ensino de bebês e crianças da educação infantil.
Analisando cuidadosamente o trabalho dos professores de educação infantil, suas
experiências estéticas e o processo de criação das atividades, procuramos mostrar
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saídas fáceis e acessíveis para o trabalho de artes com crianças pequenas. Cada
experiência aqui relatada, teve o intuito de dar voz ao profissional de educação infantil
no trabalho de artes.
O grande desafio para um trabalho com qualidade está na organização dos tempos
e espaços como facilitadores da aprendizagem. As atividades precisam ser elaboradas
com o tempo que lhes é dado em uma proposta que permita que as crianças explorem
os espaços, criem e se desenvolvam. Não é possível, por exemplo, planejar uma
atividade de 30 minutos para bebês com menos de 1 ano. O tempo está diretamente
ligado a qualidade da atividade. Caso o profissional não tenha em mente um
planejamento minuncioso, ele acabará ficando frustrado ao ter criado uma atividade que
aparentemente não lhe rendeu os frutos que ele imaginou.
As paredes da escola também são importantes no trabalho. A criança que
reconhece sua criação na parede, vai trabalhar cada dia mais para aprimorar a
qualidade estética daquilo que os professores expõem. As paredes falam, e nessa
perspectiva, o trabalho do professor também está refletido no ambiente em que ele cria.
Pensar em um trabalho estético, não é, necessariamente, pensar em uma sala bonita,
em que todos os desenhos foram impressos no computador em alta qualidade. Uma
sala com uma proposta estética, passa principalmente pela estética do trabalho dos
alunos que devem estar sempre expostos em uma altura que a criança tenha acesso
para visualizar e tocar.
O trabalho com artes visuais e com desenho é muito rico e deve ser trabalhado
frequentemente. Entendemos que o trabalho vai muito além de uma atividade em que a
criança fica sentada em uma cadeira, debruçada em uma mesa, pintando na folha A4
um desenho impresso pelo professor. O desenho e a criação da criança implicam em
memórias, observação e imaginação e podem ser explorados em diferentes ambientes
e espaços da escola, com materiais diversos.
Uma aprendizagem de artes significativa, além de necessária para o
desenvolvimento humano, é também uma aprendizagem alegre, que transmite a
felicidade do corpo e da mente. As brincadeiras de roda, de música, de dança e teatro
trazem toda a inocência e a imaginação em momentos que bebês e crianças ganham
liberdade para se expressar de forma global e encantadora.
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Todo o trabalho com artes, requer do profissional da educação um constante


buscar pela formação. A aprendizagem é contínua e faz parte do processo de
investigação e planejamento que o professor tem para sua aula. O ensino de artes tem
muitas camadas e exigem uma forte pesquisa, leitura e aprofundamento teórico.
O professor que faz a diferença, é aquele que no trabalho da sala de aula, é
cuidadoso com o planejamento, com a qualidade e com as experiências que pretende
proporcionar. O desenvolvimento estético vem de todos os sons que escutamos, de
todas as visões que temos. O fato é que a formação em artes das crianças é feita por
meio de vivências e são estas que pretendemos privilegiar e problematizar. É nossa
responsabilidade desafiar as crianças à pesquisa e a investigação, a descobrirem seus
horizontes e ampliarem seus repertórios. Podemos ser professores que fazem a
diferença na arte, na fantasia e em situações que nos levam para dentro de nós
mesmos.
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BARBIERI, Stela. Interações: Onde está a arte na infância? Ed. Edgard Bluter. São
Paulo, 2012

BRASIL, Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Básica. Ministério da


Educação. Brasília, 2013

BRASIL, Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil. Ministério da


Educação. Brasília, 1998

FIGUEREDO, Lenita Miranda de. História da Arte para Crianças. Ed. Cengage
Learning. 2º ed. São Paulo, 2011

LOWENFELD, Viktor. A criança e sua arte. Ed. Mestre Jou. São Paulo, 1954

MARTINS, PICOSQUE, GUERRA. Miriam Celeste, Gisa, Maria Terezinha Telles.


Didática do Ensino de Arte: A língua do Mundo. Ed. FTD, São Paulo, 1998

PONTES, Gilvânia. A PRESENÇA DA ARTE NA EDUCAÇÃO INFANTIL: olhares e


intenções. Trabalho apresentado como dissertação de mestrado para a UFRN. Natal
2001. Disponível em http://www.ufrgs.br/gearte/dissertacoes/dissertacao_gilvania.pdf
pesquisado em 17/05/16

SÃO PAULO, Currículo Integrador da Infância Paulista. Secretaria Municipal de


Educação, São Paulo, 2015

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