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CADERNO NACIONAL DA

UNIDADE CLASSISTA
Política, Organização e Formação
NÚMERO

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CADERNO NACIONAL DA UNIDADE CLASSISTA  POLÍTICA, ORGANIZAÇÃO E FORMAÇÃO

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Apresentação
CADERNO NACIONAL DA UNIDADE CLASSISTA  POLÍTICA, ORGANIZAÇÃO E FORMAÇÃO

A UNIDADE CLASSISTA é uma jovem corrente sindical e operária, fun-


dada em novembro de 2012, com o objetivo de servir como instrumento
de ação dos comunistas e seus aliados no movimento sindical e, mais re-
centemente, no movimento de luta por moradia. Não obstante, já estamos
presentes na direção de importantes sindicatos, na construção de oposi-
ções sindicais e ocupações urbanas, com boas perspectivas de crescimento.

Entendendo a necessidade de sistematizar os principais aspectos do


nosso acúmulo político para consolidar esse processo, a Coordenação
Nacional da Unidade Classista apresenta aos seus militantes e simpati-
zantes este documento, que se divide em duas partes: a primeira reúne
a Declaração Política do Congresso de Fundação (2012), a Declaração
Política e as Resoluções do I Encontro Nacional (2015); a segunda é for-
mada por um panorama da experiência classista no Brasil e um texto
sobre a nossa posição no movimento sindical internacional.

Esperamos que o material aqui disponível contribua para difundir as


orientações políticas e organizativas que construímos coletivamente,
além de introduzir temas de caráter formativo, no sentido de tornar
mais sólida nossa ação em cada frente de luta e aprofundar nossa inser-
ção junto ao proletariado.

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SUMÁRIO

Parte 1 ......................................................................................... 6
DECLARAÇÕES POLÍTICAS E RESOLUÇÕES

1) Declaração Política do I Congresso Nacional da UNIDADE CLASSISTA ..... 7


2) Declaração Política do I Encontro Nacional da Unidade Classista ............ 13
3) Resoluções do I Encontro Nacional da Unidade Classista .......................... 15

a. Introdução ................................................................................................. 15
b. Mulheres Trabalhadoras ......................................................................... 16
c. O Movimento Sindical ............................................................................. 17
d. A Unidade Classista e as Centrais Sindicais ........................................ 19
e. Organização e funcionamento da Unidade Classista ........................ 22
f. Bandeiras de Luta .................................................................................... 24

Parte 2 ...................................................................................... 26
TEXTOS DE FORMAÇÃO

1) Apanhado Histórico do Movimento Sindical e Operário ............................ 27

Marx e as bases da concepção sindical comunista ................................ 27


Lenin e a tarefa dos comunistas no movimento operário .................... 29
O Movimento Operário no Brasil ............................................................... 31
SOBRE NOSSA ENTRADA NA CUT ............................................... 47

2) O quadro atual do sindicalismo mundial ..................................................... 63


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CADERNO NACIONAL DA UNIDADE CLASSISTA  POLÍTICA, ORGANIZAÇÃO E FORMAÇÃO

Parte 1
Declarações Políticas
e Resoluções
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Declaração Política do I Congresso
Nacional da UNIDADE CLASSISTA

A crise sistêmica do capitalismo revela claramente a natureza, os proble-


mas e debilidades desse sistema, bem como confirma as tendências ge-
rais de concentração e centralização do capital no plano mundial. Ao
mesmo tempo, e também como decorrência das tendências do sistema, cresce
o processo de proletarização das camadas médias e do campesinato e aumenta
a pobreza, ampliando o fosso entre proprietários e proletários.
Estamos, hoje, diante de uma violenta ofensiva do capital para precarizar
as condições de trabalho, reduzir os salários e tentar retirar dos trabalhadores
os poucos direitos que lhes restam. Para isso, cada vez mais as sociedades se
fascistizam, assim como a pobreza e os movimentos políticos e sociais que se
antepõem à ordem são criminalizados.
As guerras imperialistas são parte deste projeto. Deixaram de ser confli-
tos pela hegemonia entre potências capitalistas. Estas se uniram para promover
guerras de rapina contra os povos, constituindo um consórcio imperialista que
partilha o mundo num processo de ampliação da dominação e da exploração,
em que os que mais sofrem são os trabalhadores e os que se salvam são frações
da burguesia nativa. Infelizmente, esta ofensiva se dá ainda sem a consolidação
de um polo de resistência proletária no âmbito mundial, em que pesem todas as
manifestações populares, dispersas e difusas, em todo o planeta.
A correlação de forças nos é desfavorável. Ainda sofremos o impacto da con-
trarrevolução na União Soviética e no Leste Europeu e da degeneração de muitos
partidos ditos de esquerda e de setores hegemônicos do movimento sindical. Com
a queda da URSS e das outras experiências de construção do socialismo no Les-
te Europeu, as burguesias em toda a parte vieram tirar os poucos direitos que ha-
viam sido obrigadas a assegurar aos trabalhadores, como expressão de suas lutas.
Os governos do capital se utilizam de fundos públicos para aumentar a
sua acumulação, com a transferência de gigantescos recursos financeiros para
“salvar” e alavancar as grandes empresas. Impõem drásticos cortes orçamen-
tários nas áreas sociais, praticam a renúncia fiscal e estimulam o consumismo,

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CADERNO NACIONAL DA UNIDADE CLASSISTA  POLÍTICA, ORGANIZAÇÃO E FORMAÇÃO

endividando cada vez mais as famílias dos trabalhadores.


Mais do que nunca, vão-se as ilusões na possibilidade de se reeditar go-
vernos de base social-democrata, lastreados em um pacto de desenvolvimento
entre a classe trabalhadora e os capitalistas, voltado para a distribuição da renda
e para avanços sociais, abrindo espaço para uma evolução gradual da sociedade
no rumo do socialismo, na lógica do reformismo. Tampouco se pode crer que
será possível avançar para o Socialismo cumulativamente, a partir de peque-
nas conquistas dos trabalhadores. Somente com muita luta os trabalhadores ar-
rancarão qualquer conquista, por menor que seja, e marcharão no caminho da
construção revolucionária do Socialismo.
O jogo da democracia burguesa é cada vez mais de cartas marcadas, com res-
trições crescentes à participação dos partidos comprometidos com o Socialismo. As
eleições, em geral, se transformam em meras disputas de estilos de administrar a
crise, ainda que surjam contraposições em alguns países. A luta de massas, em todas
as suas formas, continuará sendo a principal arma de que dispõe o proletariado.
Os trabalhadores enfrentam as mais duras batalhas. Na Europa resistem, fa-
zendo greves e manifestações unificadas contra os planos da burguesia de saída da
crise às custas do sangue da classe trabalhadora.  Há ainda luta nos EUA, na Ásia,
na África e na América Latina, onde as populações enfrentam terríveis planos do
capital para a superação da crise, sem prejuízo dos lucros e interesses burgueses.
Assim, a ofensiva do capital provoca o acirramento da luta de classes e suscita, em
contrapartida, uma intensa mobilização dos trabalhadores, permitindo que o ce-
nário da história se abra para futuras transformações políticas e sociais, colocada
a necessidade da alternativa socialista. Reafirmamos nosso compromisso interna-
cionalista, levantando bem alto a bandeira da solidariedade de classe e impulsio-
nando a organização unificada dos trabalhadores além das fronteiras nacionais.
Todo esse quadro aponta para o surgimento e o fortalecimento de novas
formas de organização e luta, as quais poderão fazer com que o movimento sin-
dical e operário, hoje majoritariamente domesticado pelo capital, seja sacudido
por fortes ventos vindo de baixo, varrendo dirigentes conciliadores, recolocando
o sindicato no trilho da luta de classes. É fundamental, assim, que o movimento
sindical se engaje fortemente, em conjunto com outros movimentos sociais, nas
lutas anticapitalistas que tenham como objetivo, no caminho da construção con-
tra-hegemônica do ideário socialista e comunista, a materialização do bloco re-
volucionário do proletariado e a construção das bases materiais para a revolução.

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PARTE 1  DECLARAÇÕES POLÍTICAS E RESOLUÇÕES

No Brasil, a ordem do capital se mantém com o imenso poder da bur-


guesia monopolista, internacionalizada, associada subalternamente às grandes
corporações, a oligarquia industrial e financeira que tem como base os países
desenvolvidos (no que Lênin classificou como Imperialismo), coligada a grupos
nacionais, em sua maioria, de menor porte.  A democracia de fachada necessita
da cooptação de lideranças sindicais e populares, para o apassivamento dos tra-
balhadores. Para tal, também se ameniza a pobreza absoluta, ao mesmo tempo
em que se intensifica a exploração dos trabalhadores. Em nosso país, nunca os
banqueiros, as empreiteiras, o agronegócio e os monopólios tiveram tanto lucro.
A política econômica e a política externa do Estado brasileiro estão a serviço
do projeto de fazer do Brasil uma grande potência capitalista internacional, nos
marcos do imperialismo. Este projeto, reforçado pelo relativo crescimento obser-
vado pelo Brasil nos últimos 10 anos, trouxe para o mercado uma nova leva de
consumidores que, alavancados pela oferta de crédito, adquirem bens de consu-
mo e se sentem “incluídos”, fazendo com que questões como os direitos sociais e a
garantia de emprego sejam deixados em segundo plano. Esta é a base material da
hegemonia conservadora, de caráter apassivador, de que desfruta, hoje, a burgue-
sia brasileira, uma hegemonia que se espelha, com clareza, no terreno eleitoral.
O Brasil está passando por um processo de avanço monopolista que vive
um momento crucial. A ameaça de a crise bater à nossa porta exige um salto
de qualidade, com o aumento da mais valia e a adoção de mais medidas libe-
ralizantes. Para fugir da crise – na ótica do capital e de seus representantes no
governo -, é fundamental facilitar as condições para o capital se reproduzir, re-
duzindo o custo do trabalho, desonerando a folha de pagamento, renunciando
a impostos e retomando a privatização.
O avanço monopolista por que passa o Brasil vem levando a uma forte trans-
formação do papel do Estado, fortalecido para garantir recursos aos grandes gru-
pos privados e cada vez mais precarizado no que diz respeito à oferta de serviços
públicos em geral, muitos dos quais vêm sendo privatizados de forma crescente.
Como instrumento dessa transformação e como decorrência dela, o funcionalis-
mo público vem sofrendo também grande precarização nas condições de trabalho,
com o aviltamento dos salários e a utilização da terceirização em escala crescente.
O recente pacote econômico anunciado pelo governo, envolvendo imensos
recursos para obras de infraestrutura, é parte deste esforço. Ele consolida e apro-
funda a opção pelo grande capital e amplia de maneira acelerada o processo de

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privatização da economia brasileira. Mais uma vez fica demonstrado o caráter de


classe do governo Dilma: enquanto endurece as negociações com os trabalhado-
res públicos, abre os cofres do governo, através do mecanismo da dívida inter-
na e via BNDES, para os empresários adquirirem o próprio patrimônio público.
O “espetáculo do crescimento”, prometido por Lula em sua primeira posse
e assegurado pelos seus governos, é fomentado ainda pelos recursos incalcu-
láveis dos fundos de pensão de estatais, dirigidos por ex-sindicalistas cutistas
que se sofisticaram na administração do capital. O mais vergonhoso é que a
CUT e outras centrais pelegas, que deveriam estar ao lado dos trabalhadores,
defendem as medidas privatizantes, o que demonstra a completa degeneração
do sindicalismo chapa branca e pelego no Brasil.
Dentro em breve estaremos diante da maior ameaça aos trabalhadores das
últimas décadas: a proposta de flexibilização para baixo de direitos trabalhistas,
que em breve o governo enviará ao Congresso Nacional. Para criar ilusões, o pro-
jeto será apresentado pelo simbólico Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, com o
aval de Lula e de um Ministro do Trabalho de sobrenome Brizola. Como o pro-
jeto tramitará num Congresso Nacional hegemonizado pelo capital, a emenda
será pior que o soneto, à semelhança do que aconteceu com o Código Florestal.
O “Acordo Coletivo de Trabalho com Propósito Específico”, caso aprovado,
consagrará o grande objetivo dos empresários, de que “o acordado prevaleça so-
bre o legislado”, como se houvesse “livre negociação” entre a forca e o enforcado.
Ao invés da redução da jornada de trabalho e do fim das horas extras,
generaliza-se o Banco de Horas, que desestabiliza o tempo livre do trabalhador,
pois esse ficará à disposição do capital de acordo com os picos de produção. No
lugar do aumento real de salários, prevalece a Participação nos Lucros, que não
incide sobre as verbas salariais, é isenta de encargos sociais e não se incorpora
aos salários. Além disso, a lógica do “associado” coopta a classe trabalhadora na
sua subjetividade, abafando o antagonismo de classe. Infelizmente, neste caso,
a ação dos poucos setores combativos do sindicalismo brasileiro é equivocada,
pois nada fazem para desconstruir o pano de fundo perverso relacionado ao
aumento dos “ganhos” da PLR, que de fato representa a intensificação da ex-
tração da mais valia. No setor de serviços, a débil organização sindical facilita
a precarização e o desrespeito aos mais elementares direitos dos trabalhadores.
A vigência destes “acordos específicos” inviabilizará campanhas salariais e
greves unificadas e esmorecerá o espírito de classe entre os trabalhadores. Que-

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PARTE 1  DECLARAÇÕES POLÍTICAS E RESOLUÇÕES

rem levar os conflitos para serem conciliados dentro das empresas, ambiente
favorável para a pressão e a chantagem contra os trabalhadores.
Outro objetivo do projeto é a implantação no Brasil do modelo norte-a-
mericano de sindicato por empresa, propício à conciliação de classe.
Este projeto é o ponto alto dos recentes ataques do governo aos trabalha-
dores, já materializados na desoneração generalizada da folha de pagamentos
na indústria, no projeto de nova contrarreforma da previdência e na correria
para aprovar a lei de greve no serviço público, medidas que contam com o apoio
explícito ou o silêncio cúmplice das centrais sindicais oficiais, correias de trans-
missão do capital entre os trabalhadores.
Retiram-se direitos consagrados e ainda querem que os trabalhadores acre-
ditem que a única possibilidade de seus interesses serem atendidos depende do
crescimento da economia capitalista e dos vultosos lucros que daí derivam. É a ve-
lha e surrada cantilena de “deixar primeiro crescer o bolo para depois distribuir”.
Como consequência da forte hegemonia de que as ideias e políticas neoli-
berais desfrutaram, principalmente na década de 90 e parte da década passada,
e refletindo a fragmentação e a fragilização da classe trabalhadora em geral,  o
atual sindicalismo, com poucas exceções no âmbito mundial, foi cooptado e
estatizado pela ordem burguesa, seja na aceitação da ordem capitalista / liberal,
seja na proposição de ações e medidas para a suavização das condições de ex-
ploração, abrindo mão, definitivamente, da perspectiva socialista.
A precária articulação internacional entre os trabalhadores mostra a neces-
sidade de fortalecer a FSM (Federação Sindical Mundial) que vem se recuperan-
do do esvaziamento dos anos 90 do século passado, como é prova o combativo
e expressivo último Congresso da Federação, realizado em 2011, na cidade de
Atenas, onde esteve presente uma delegação de sindicalistas do PCB, hoje funda-
dores da Unidade Classista. A FSM, hoje, tem um papel primordial na deflagração
do movimento grevista na Europa, contra as medidas de austeridade dos gover-
nos que jogam a conta da crise do capitalismo para os trabalhadores pagarem.
Chegou o momento de dizer basta! Basta de alianças com a classe que se apo-
dera dos meios sociais de produção e da riqueza socialmente construída. Basta de
pagar a conta da crise e de fazer sacrifícios para os capitalistas saírem de suas crises;
basta de ver o trabalho de muitos se transformando na riqueza e poder de poucos.
Devemos ampliar e aprofundar ações voltadas para o fortalecimento da or-
ganização e da consciência de classe dos trabalhadores, no sentido da construção

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CADERNO NACIONAL DA UNIDADE CLASSISTA  POLÍTICA, ORGANIZAÇÃO E FORMAÇÃO

e aprofundamento dos mecanismos necessários ao desenvolvimento da luta con-


tra-hegemônica. É tarefa premente para UNIDADE CLASSISTA contribuir na or-
ganização dos trabalhadores da cidade e do campo, dos setores privado e público.
Dessa forma, além de priorizar a organização dos trabalhadores nos locais
de trabalho, é necessário lutar junto aos jovens, mulheres, negros, desempregados,
aposentados, terceirizados e demais movimentos populares, articular suas lutas e
movimentos, contribuindo na construção de uma frente anticapitalista e anti-im-
perialista que possa organizar grandes jornadas de lutas capazes de unificar a classe
trabalhadora e preparar o eixo central da estrada revolucionária rumo ao Socialismo.
Neste momento crucial para os trabalhadores e a humanidade,  torna-
se  inadiável a consolidação e institucionalização da UNIDADE CLASSISTA,
um instrumento de ação dos comunistas brasileiros no movimento sindical e
operário para contribuir no resgate do sindicalismo classista.

Rio de Janeiro, 18 de novembro de 2012

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Declaração Política do I Encontro
Nacional da Unidade Classista

Organizar, lutar, vencer!

O mundo passa por uma situação agitada devido ao mais recente processo
de crise do sistema capitalista, deflagrado em 2008. Os governos a ser-
viço do capital em vários países têm levado a cabo os chamados planos
de “austeridade” – que na verdade são medidas para fazer que a burguesia não
seja afetada e os trabalhadores paguem a conta com desemprego, arrocho salarial
e retirada de direitos. Tais movimentações não se realizam sem a resistência do
proletariado, que reage com protestos e greves diversas, enquanto as classes do-
minantes impõem o aumento da repressão. No Brasil a situação não é diferente,
como tragicamente ficou explícito no caso da brutalidade do Estado contra os
professores do Paraná – governado por Beto Richa (PSDB). Ao mesmo tempo,
ocorrem demissões em massa no setor automobilístico, construção civil e outros.
O cenário acima é reforçado pelas últimas iniciativas tanto do governo Dil-
ma (PT), como do Congresso e do STF. O Projeto de Lei 4330 tem apoio da maio-
ria dos deputados no intuito de remover as últimas garantias para que as terceiri-
zações da força de trabalho se multipliquem no país; as Medidas Provisórias 664
e 665 expressam a determinação da presidenta e seu ministro de ouro, Joaquim
Levy, buscando restringir o auxílio doença, pensão por morte, abono salarial e
seguro desemprego; por fim, a mais alta corte de justiça brasileira, a partir da
Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1923, deliberou que a gestão da educa-
ção, saúde e cultura podem ser feitas por Organizações Sociais (OSs), o que na
prática é uma forma de privatização e contratação de profissionais sem concurso.
Nessa conjuntura, mais de 100 delegados, de 17 unidades federativas, re-
uniram-se em São Paulo entre os dias 4 e 7 de junho com o objetivo de analisar
a realidade e fortalecer a intervenção da Unidade Classista enquanto uma ferra-
menta de organização e luta dos trabalhadores do campo e da cidade. Avaliou-
se que o quadro atual do movimento sindical ainda é de hegemonia de centrais
e direções pelegas e governistas, ligadas à CUT, Força Sindical (ambas filiadas à

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CADERNO NACIONAL DA UNIDADE CLASSISTA  POLÍTICA, ORGANIZAÇÃO E FORMAÇÃO

Confederação Sindical Internacional, fundada para se contrapor ao movimento


comunista), além de outros agrupamentos.
Contudo, desde 2013 abriu-se um período de intensificação dos enfrenta-
mentos diretos entre trabalhadores e patrões, em alguns casos por fora dos sindi-
catos e mesmo contra os burocratas incrustados nas estruturas sindicais. Foram os
casos das greves dos trabalhadores da Comlurb e do Comperj no Rio de Janeiro.
Nesse sentido, a Unidade Classista entende a necessidade fundamental de superar
a fragmentação no campo combativo do movimento sindical, expresso hoje na se-
paração entre as duas Intersindicais e a Conlutas, para consolidar uma alternati-
va classista e unitária para os trabalhadores em suas tarefas imediatas e históricas.
Deste modo, defendemos a construção de um Encontro Nacional da Clas-
se Trabalhadora (ENCLAT) de baixo para cima, ou seja, não a partir de acordos
de cúpulas, mas sim a partir das bases e fóruns regionais de luta. Para fortalecer
este caminho, devemos aprofundar cada vez mais a unidade de ação com as
Intersindicais e a Conlutas onde for possível. Devemos estar junto ao proleta-
riado, lado a lado em suas batalhas contra os capitalistas e seus intermediários,
como o Estado burguês e o peleguismo sindical.  É hora de redobrar esforços na
organização por locais de trabalho e moradia, fomentando a contraofensiva dos
trabalhadores aos ataques até hoje sofridos! NENHUM DIREITO A MENOS,
AVANÇAR NA LUTA POR NOVAS CONQUISTAS!

Coordenação Nacional da Unidade Classista


São Paulo, 4 a 7 de junho de 2015

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Resoluções do I Encontro
Nacional da Unidade Classista

A ofensiva do capital, a resistência dos trabalhadores


e a experiência com mais de vinte anos de hegemonia petista
no movimento sindical colocam na ordem do dia a construção
da unidade do campo classista e independente dos governos.

a. Introdução
1) O I Encontro Nacional da Unidade Classista ocorre numa conjuntura de
muitas turbulências. Pode-se constatar que a crise capitalista internacional ain-
da não foi revertida. Suas consequências se revelam no persistente desempre-
go, ataque aos salários, às condições de trabalho, aos direitos dos trabalhadores
(apelidados convenientemente de “planos de austeridade”) e na deterioração
das condições sociais observadas na Europa e América do Norte, fruto das me-
didas aplicadas pelos governos a serviço do capital. No Brasil, o ciclo hegemô-
nico do Partido dos Trabalhadores começa a se desfazer em meio a uma série
de graves denúncias de corrupção, que vão muito além do governo federal, atin-
gindo mesmo as principais instituições do regime, suas ramificações estaduais e
municipais. Ao mesmo tempo, o agravamento da situação na economia obriga
as diversas frações da classe dominante a defender seus interesses particulares,
mas se unificando em torno do objetivo comum de aprofundar a exploração ca-
pitalista e despejar as consequências da crise nos ombros da classe trabalhadora.

2) Várias iniciativas do fragilizado governo Dilma, do Congresso e do STF con-


firmam o que dissemos acima. Num momento difícil para os trabalhadores,
em que a construção civil, o setor siderúrgico e o setor automobilístico fazem
demissões em massa, quando muitas pequenas e microempresas fecham suas
portas, as votações do PL 4330 e das MPs 664/665 não deixaram dúvidas sobre
as intenções desse governo e do Congresso Nacional. Enquanto o projeto da

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CADERNO NACIONAL DA UNIDADE CLASSISTA  POLÍTICA, ORGANIZAÇÃO E FORMAÇÃO

terceirização foi aprovado com os votos da base aliada (exceto PT/PC do B)


e da oposição de direita, as medidas provisórias do plano de ajuste fiscal do
governo foram aprovadas pela mesma base aliada, incluindo dessa vez os votos
favoráveis do PT e PC do B. No caso das MPs, o PSDB jogou para a plateia, vo-
tou contra apesar de apoiar as medidas de arrocho, deixando o desgaste político
da aprovação para os partidos governistas. Por sua vez, o STF, julgando a Ação
Direta de Inconstitucionalidade nº 1923, decidiu que a gestão de escolas, uni-
versidades, hospitais, museus e outras autarquias, podem ser entregues para as
denominadas Organizações Sociais, as famigeradas OS’s, permitindo, assim, a
contratação de professores e funcionários sem concurso público.

3) A partir de março de 2015 ocorreram manifestações massivas capitaneadas


pelas oposições conservadoras. Com forte apoio midiático, esses atos abri-
ram espaço inclusive para a extrema direita. Os motes dessas mobilizações
foram o combate à corrupção e pelo impeachment, com alvos principais que
eram claramente o PT e o governo Dilma, associando-os aos comunistas. O
congresso, governos estaduais, prefeituras, os partidos da base do planalto e
da base reacionária foram visivelmente poupados. Não se ouviram críticas
ao ajuste fiscal. Por outro lado, a iniciativa do PT e PC do B, secundados por
MST/UNE/CUT/CTB, de sair em defesa do governo, resultou em manifesta-
ções minúsculas no dia 13 de março.

4) O quadro atual, portanto, indica a combinação de crise política, social e eco-


nômica, com um governo fraco, desgastado desde os primeiros meses do seu
mandato. Por sua vez, legislativo e judiciário não gozam de melhor prestígio, es-
tando muito próximos do governo no quesito popularidade. Assim, aumentam
os tensionamentos para impor o arrocho, tendo essas instituições que apelar
para a repressão, como se verificou no caso do massacre contra os protestos de
professores e servidores paranaenses.

b. Mulheres Trabalhadoras
5) As trabalhadoras têm sido duramente atingidas por este conjunto de medidas
restritivas de direitos. Hoje, as mulheres representam 52% da força de trabalho, mas

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PARTE 1  DECLARAÇÕES POLÍTICAS E RESOLUÇÕES

40% deste universo trabalham em situação precária. Cerca de 15% trabalham em


serviço doméstico, que só recentemente conquistou alguns direitos trabalhistas.

6) O PL 4330 atinge frontalmente as mulheres, pois a maioria das trabalhadoras


são terceirizadas. Atualmente, apesar de sua inserção no mercado de trabalho,
a massa salarial das mulheres representa 60% da massa salarial dos homens. E a
situação se agrava se compararmos o salário das mulheres negras com o salário
dos homens brancos. Por isso, lutamos por salário igual para trabalho igual.

7) A restrição às pensões por morte também afeta as mulheres, pois muitas


perdem seus maridos em acidentes de trabalho. Outro grande obstáculo é o não
cumprimento da lei que estabelece a obrigatoriedade das empresas com mais de
30 trabalhadoras terem creches, ou realizarem convênios com creches existen-
tes, ou reembolsarem o valor pago a creches privadas. Lutamos pelo direito a
creches para as crianças das trabalhadoras e dos trabalhadores, pois o cuidado
das crianças não é uma obrigação somente das famílias.

c. O Movimento Sindical
8) Se na sociedade o ciclo hegemônico do PT começa a fazer água, no movimento
sindical algo correspondente acontece com a CUT, braço petista no sindicalismo.
Desde a segunda metade dos anos noventa a CUT se consolidou como a princi-
pal central sindical do país, deixando em segundo plano a Força Sindical e uma
multiplicidade de agrupamentos menores do movimento sindical, à esquerda e
à direita. Essa hegemonia foi construída com base no prestígio adquirido desde
a sua fundação, em 1983, quando, encabeçando as lutas e liderando oposições
sindicais combativas, ganhou a direção de grandes sindicatos em todo o país.

9) Bem antes da chegada do PT ao governo com a eleição de Lula, a Articulação


Sindical, corrente política majoritária nesse partido e na CUT, começa, ainda
nos anos noventa, um processo de acomodação e colaboração com o patronato.
São desse período iniciativas como o banco de horas, negociações de parcerias
com as empresas, as câmaras setoriais, todas elas priorizando os acordos em
detrimento das greves e mobilizações. Foi emblemática, nesse sentido, a filiação

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CADERNO NACIONAL DA UNIDADE CLASSISTA  POLÍTICA, ORGANIZAÇÃO E FORMAÇÃO

à CIOLS1 no IV Congresso da CUT em setembro de 1991. A partir de 2003,


com o governo Lula, esse curso se intensificou. Muitos quadros oriundos do
sindicalismo cutista foram alçados a cargos na máquina administrativa e man-
datos parlamentares, fenômeno que reforçou a estreita colaboração da central
com o governo, passando a funcionar quase como um departamento de RH das
empresas ou do ministério do trabalho.

10) A tendência desse sindicalismo de resultados, cujo pioneirismo pertence à


Força Sindical, foi além da CUT. Diversas outras congêneres adotaram a mesma
linha, se aliando a correntes políticas burguesas dominantes nos estados e muni-
cípios. Uma sopa de letrinhas que se distancia cada vez mais da base, elas vêm se
mantendo na direção dos sindicatos e federações através de expedientes antide-
mocráticos, poder econômico e muitas vezes da prática do banditismo sindical.

11) Por sua vez, a resistência à esquerda contra esse processo de adaptação e colabo-
ração de classes, vulgo peleguismo, se deu de forma débil e fragmentada. As inicia-
tivas, em sua maioria a partir do rompimento de correntes que atuavam no interior
da CUT, enfrentaram um período bastante adverso, mantendo-se organizadas em
pequenas oposições, poucos sindicatos e entidades de servidores públicos. A fun-
dação da CONLUTAS e das INTERSINDICAIS foram expressão desse processo.

12) A situação que poderíamos definir como de uma certa apatia do movimen-
to sindical, começa a sofrer mudanças ainda no primeiro governo Dilma, onde
já se verificam os efeitos de uma política econômica voltada para proteger os
interesses do capital diante da crise internacional aberta em 2008. Com o es-
gotamento da política de ampliação do consumo através do crédito e das deso-
nerações fiscais para empresas, o crescimento econômico inicia uma trajetória
de queda, logo as empresas começam a endurecer as negociações salariais e a
intensificar a rotatividade da mão de obra.

13) Nesse contexto é que observamos um retorno das lutas: são os funcionários

1
CIOLS (Confederação Internacional das Organizações dos Sindicatos Livres), atual CSI (Confederação Sin-
dical Internacional): fundada em 1949 pela social democracia com o intuito de dividir o movimento operário
e se contrapor aos sindicatos ligados ao movimento comunista.

18

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PARTE 1  DECLARAÇÕES POLÍTICAS E RESOLUÇÕES

públicos, trabalhadores da construção civil, rodoviários, metroviários, profes-


sores, metalúrgicos, garis – uma infinidade de categorias retomam o caminho
das greves2. Em muitos casos essas greves acontecem apesar, ou mesmo, contra
as direções sindicais, assim os trabalhadores começam a vivenciar um novo ci-
clo de aprendizado e experiência na luta sindical e política após duas décadas
de hegemonia incontestável do colaboracionismo de classes. Neste sentido, é
muito importante que os sindicatos aglutinem na luta e representem também
os terceirizados e desempregados.

d. A Unidade Classista e as Centrais Sindicais


“Mas sustentamos a luta contra a aristocracia operária
em nome das massas operárias e para colocá-las ao nosso lado,
sustentamos a luta contra os chefes oportunistas e social-chauvinistas
para ganhar a classe operária. Seria tolice esquecer esta verdade
mais que elementar e evidente. E é essa, precisamente,
a tolice cometida pelos comunistas alemães ‘de esquerda’,
que deduzem do caráter reacionário e contrarrevolucionário
dos chefetes dos sindicatos que é necessário ...sair!!!,
criar formas de organização operária novas, inventadas!!!
Uma estupidez tão imperdoável, que equivale
ao melhor serviço que os comunistas podem prestar à burguesia.”
Lenin, Esquerdismo, doença infantil do comunismo.

14) A nossa corrente sindical, desde a sua fundação, em novembro de 2012,


indicou com firmeza a necessidade de rompimento com o colaboracionismo de
classes: “Chegou o momento de dizer basta! Basta de alianças com a classe que se
apodera dos meios sociais de produção e da riqueza socialmente construída. Basta
de pagar a conta da crise e de fazer sacrifícios para os capitalistas saírem de suas
crises; basta de ver o trabalho de muitos se transformando na riqueza e poder de
poucos.” 3 Nesses quase três anos de vida deu seus primeiros passos, ainda que

2
Segundo o DIEESE: foram 446 greves em 2010; 554 em 2011; 873 em 2012 e cerca de 2.000 em 2013.
3
Declaração política do I Congresso da Unidade Classista.

19

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CADERNO NACIONAL DA UNIDADE CLASSISTA  POLÍTICA, ORGANIZAÇÃO E FORMAÇÃO

sem muita organicidade, muitas vezes até de forma improvisada e descoordena-


da, mas efetivamente foram passos importantes que nos colocaram novamente
no cenário das lutas dos trabalhadores e das suas organizações sindicais. Nossa
presença em diretorias ou chapas de oposição, nas campanhas salariais e greves
pelo país, passou a ter uma visibilidade que anteriormente não tínhamos. Em
algumas categorias somos referência e nos tornamos interlocutores qualifica-
dos frente às demais forças do movimento sindical. Temos plena consciência de
que há muito por fazer, não abrimos mão de nosso balanço autocrítico, mas não
estamos partindo do zero. Ocupamos espaços e acumulamos experiências que
nos permitem seguir fortalecendo a Unidade Classista enquanto uma corrente
sindical de organização e luta dos trabalhadores brasileiros.

15) A partir desse patamar é que devemos estabelecer nossas relações com as
demais forças do movimento, especialmente com as centrais sindicais e corren-
tes que atuam no campo da independência de classe e das lutas dos trabalhado-
res contra a exploração capitalista.

16) Segundo os dados do índice de representatividade do Ministério do Tra-


balho4, enquanto as cinco maiores centrais abarcam 77% dos trabalhadores, os
23% restantes dividem-se entre o conjunto de sindicatos não filiados a qualquer
central (maior parte) e as demais centrais. O peso efetivo das Intersindicais e da
Conlutas frente ao universo sindical brasileiro ainda é muito pequeno. Menor
ainda se considerarmos qualquer uma delas em separado. Ou seja, quando a
situação objetiva dos trabalhadores aponta para a necessidade de uma ampla
unidade da classe para enfrentar os ataques do patronato e do governo, as orga-
nizações que se dispõem a travar esse combate, além de pouco representativas,
estão divididas. Temos plena convicção de que os trabalhadores, nesse movi-

4
O Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) publicou, na última sexta-feira (18), os índices de representativi-
dade de cada Central Sindical referente a 2014. O índice foi apurado com base na quantidade de trabalhadores
filiados aos sindicatos de cada central até o dia 31 de dezembro de 2013. De acordo com os índices de representa-
tividade, a Central Única dos Trabalhadores (CUT) registrou, com 34,39%, vindo em seguida a Força Sindical,
com 12,59%; a União Geral dos Trabalhadores (UGT), com 11,92%; a Central de Trabalhadores e Trabalhado-
ras do Brasil (CTB), com 9,33%; e a Nova Central Sindical de Trabalhadores (NCST) com 8,01%. Fonte: http://
www.brasil.gov.br/economia-e-emprego/2014/07/ministerio-divulga-representatividade-das-centrais-sindicais

20

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PARTE 1  DECLARAÇÕES POLÍTICAS E RESOLUÇÕES

mento de retomada da luta e da participação sindical, podem muito rapidamen-


te compreender a necessidade da unidade e batalhar por esse objetivo.

17) Mesmo reconhecendo que hoje, levando em conta as categorias onde temos
participação ativa, seja em diretorias ou oposições, assim como, nas lutas em
curso no país, nossa maior proximidade em termos de ações e bandeiras de luta
se dê com as Intersindicais e a Conlutas, consideramos que a adesão a qualquer
uma delas não se justificaria. Ainda que nossa corrente valorize muito estas
relações, temos convicção de que a divisão atual entre elas dificulta bastante
o avanço das lutas. Dessa forma, ao aderir, estaríamos jogando para segundo
plano a batalha pela unidade dos trabalhadores, questão de importância estra-
tégica nesse momento de reconstrução do movimento sindical brasileiro.

18) A nossa reivindicação de um ENCLAT, construído de baixo para cima, a


partir dos fóruns regionais de luta, que unifique as Centrais e demais agrupa-
mentos sindicais do campo da independência de classe e da luta anticapitalista,
é uma necessidade premente e estratégica da classe trabalhadora brasileira. No
sentido de fortalecer essa possibilidade, devemos estreitar relações com as In-
tersindicais, a Conlutas e demais organizações deste campo, construindo, onde
for possível, a unidade nas lutas e contra os pelegos. A Unidade Classista conti-
nuará atuando na base dos sindicatos que sejam representativos das suas catego-
rias, independente de filiação a qualquer Central Sindical, mas isso não significa
a menor concessão ou composição de chapas com direções sindicais a serviço
do capital. Pelo contrário, redobraremos nossos esforços para arrancar os tra-
balhadores das garras do sindicalismo economicista e subalterno ao patronato.

19) A definição pelo internacionalismo proletário, um dos pilares da fundação


da nossa corrente, necessita ser cada vez mais levado à prática, como resposta
coerente aos planos de exploração capitalistas e as agressões imperialistas em
todo o mundo. Reafirmamos nosso compromisso com a FSM5, enquanto ins-

5
“A precária articulação internacional entre os trabalhadores mostra a necessidade de fortalecer a FSM (Fede-
ração Sindical Mundial) que vem se recuperando do esvaziamento dos anos 90 do século passado, como é prova
o combativo e expressivo último Congresso da Federação, realizado em 2011, na cidade de Atenas, onde esteve
presente uma delegação de sindicalistas do PCB, hoje fundadores da Unidade Classista.” Declaração política do
I Congresso da Unidade Classista, 11/2012.

21

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CADERNO NACIONAL DA UNIDADE CLASSISTA  POLÍTICA, ORGANIZAÇÃO E FORMAÇÃO

trumento de organização e luta dos trabalhadores a nível internacional.

e. Organização e funcionamento da Unidade Classista


20) A forma de organização interna da nossa corrente do movimento sindical
e operário e o seu funcionamento são questões da maior importância. Elas es-
tão intimamente ligadas à nossa política e a ela deve ser subordinada. Como o
nosso objetivo é construir algo além das fronteiras partidárias, não podemos
simplesmente replicar a forma organizativa vigente no PCB. O movimento de
massas obviamente é muito mais amplo e fluido, abarcando inúmeras correntes
de opinião. É nesse movimento que vamos estabelecer relações e colocar nossas
bandeiras de luta e propostas de ação. A partir delas é que podemos aglutinar
os trabalhadores, ainda que não concordem com tudo aquilo que defendemos.
Mesmo tendo compreensões distintas sobre vários temas, caso tenham acordo
com a questão principal para aquele momento, seja organizando uma greve,
disputando a CIPA ou participando da eleição sindical, estarão em condições
de trabalhar conosco na Unidade Classista.

21) Esse é o tipo de organização que necessitamos na base das categorias em que
atuamos, ela surge e se consolida de acordo com os embates da luta de classes e da
disputa sindical. Seu funcionamento precisa ser flexível, as condições concretas
e os objetivos é que vão determinar sua forma organizativa, a periodicidade das
reuniões e etc. Podemos chamá-los de Comitês de Base da Unidade Classista.
De acordo com a região ou estado onde atuam, esses comitês podem se agru-
par em plenárias, estas, por sua vez, elegem uma coordenação. Nesta fase inicial
da nossa construção cada comitê de base, para ser reconhecido como tal, deve-
rá contar com ao menos três trabalhadores, ainda que de categorias diferentes.

22) A partir dessas coordenações, vamos necessitar de um funcionamento mais


regular e permanente, pelo menos uma reunião mensal, porque caberá a esses
organismos apoiar e articular as diversas frentes da sua região ou estado. Além
disso, fica sob sua responsabilidade o contato com a coordenação nacional e o
encaminhamento das suas diretivas, sem as quais a UC se tornaria uma mera
colcha de retalhos. Cabe à Coordenação Nacional: elaborar as orientações ge-

22

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PARTE 1  DECLARAÇÕES POLÍTICAS E RESOLUÇÕES

rais quanto às prioridades políticas/ organizativas e participação em frentes,


plenárias unitárias, etc.; organizar campanhas centralizadas; dar assistência nos
estados; constituir uma Comissão Permanente de Eleições Sindicais; impulsio-
nar a criação de um corpo jurídico militante; organizar coordenações nacionais
por ramo; implementar políticas de comunicação interna, finanças, cadastro de
militantes, agitação e propaganda, bem como formação sindical.

23) A Coordenação Nacional deve ser composta por 11 militantes com expe-
riência e reconhecimento sindical, distribuídos nas seguintes secretarias: políti-
ca, organização, finanças, comunicação, formação, gênero, movimento popular,
geracional, luta antirracista, expansão sindical e relações internacionais;

24) A Coordenação Estadual deve ser formada quando houver, no mínimo, 3


comitês de base no respectivo estado. A estrutura mínima de secretarias deve
contemplar: política, organização, finanças e comunicação. A estrutura máxi-
ma, análoga à CN, será de dez membros, excetuando-se a secretaria de relações
internacionais. As Comissões Provisórias deverão ser formadas por 3 militantes
que se encarregarão do contato com a CN e da organização das plenárias locais
enquanto houver menos de 3 comitês de base no estado.

25) As instâncias deliberativas da Unidade Classista ficam assim definidas, em


ordem decrescente: Congresso Nacional, Encontro Nacional, Coordenação Na-
cional, Plenária Nacional, Comissão Executiva Nacional, Congresso Estadual,
Encontro Estadual, Coordenação Estadual, Plenária Estadual, Coordenação do
Comitê de Base, Comitê de Base. As decisões devem ser tomadas a partir da
busca máxima possível pelo consenso.

26) Todo esse esforço organizativo tem o objetivo de consolidar a UC nas cate-
gorias que consideramos prioritárias. Essa definição se dá a partir do seu peso
econômico-social, sua capacidade de mobilização e da sua localização na estru-
tura de produção e circulação. Considerando esses aspectos, nossa prioridade
é a construção de comitês de base nos seguintes ramos, hierarquizados abaixo:

1 – Metal-mecânico / Siderurgia /
Mineração (Metalúrgicos e Mineiros);

23

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CADERNO NACIONAL DA UNIDADE CLASSISTA  POLÍTICA, ORGANIZAÇÃO E FORMAÇÃO

2 – Transportes (Ferroviários, Metroviários,


Rodoviários, Aeroviários, Marítimos);
3 – Petróleo / Energia (Petroleiros e Eletricitários);
4 – Educação (profissionais da educação
do ensino fundamental, médio e superior);
5 – Construção Civil;
6 – Bancários;
7 – Correios;
8 – Telecomunicações.

27) Além disso, devemos ampliar nosso campo de intervenção. Ainda que o mo-
vimento sindical seja a principal trincheira do conflito capital x trabalho na atual
conjuntura, não devemos subestimar o fato de que as lutas dos trabalhadores vão
além deste terreno. Portanto, a Unidade Classista deve atuar também em outros
setores importantes, como a luta por moradia, movimentos populares de bairro/
favela e juventude trabalhadora – para o que precisamos estar em permanente
articulação com a União da Juventude Comunista (UJC), inclusive para o tra-
balho de agitação, propaganda e organização dos estudantes de escolas técnicas.

f. Bandeiras de Luta
28) Face aos ataques do governo Dilma e do Congresso, a serviço do patronato,
contra direitos duramente conquistados pelos trabalhadores, elencamos nossas
principais bandeiras de luta para esse período:

1 – Redução da Jornada sem redução de salário.


2 – Garantia de estabilidade no Emprego.
3 – Fim do fator previdenciário.
4 – Luta contra todas as formas de terceirização.
5 – Não à redução de direitos, abaixo as MPs 664 e 665.
6 – Pelo salário mínimo do DIEESE.
7 – Reestatização das empresas privatizadas,
sob controle dos trabalhadores.
8 – Salário igual para trabalho igual.

24

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PARTE 1  DECLARAÇÕES POLÍTICAS E RESOLUÇÕES

9 – Garantia de creches para


os filhos dos trabalhadores e trabalhadoras.
10 – Defesa do SUS público e de qualidade.
11 – Mais Salários em vez de PLR.
12 – Pela Petrobrás 100% Estatal.
13 – Contra o Plano de Proteção
ao Emprego (PPP) do Governo Dilma.

NENHUM DIREITO A MENOS,


AVANÇAR NA LUTA POR NOVAS CONQUISTAS!

25

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CADERNO NACIONAL DA UNIDADE CLASSISTA  POLÍTICA, ORGANIZAÇÃO E FORMAÇÃO

Parte 2
Textos de formação
26

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1
Apanhado Histórico do
Movimento Sindical e Operário

“A emancipação da classe operária deve ser


obra da própria classe operária”. Karl Marx

Marx e as bases da concepção sindical comunista


Comecemos pelo olhar daquele que traz os elementos fundantes do sindica-
lismo classista que pretendemos construir. Para Marx “se os sindicatos são indispen-
sáveis às guerrilhas quotidianas entre capital e trabalho, não são menos importantes
como um meio organizado para abolição do próprio sistema do trabalho assalaria-
do”6. Mas se ele destacava a importância dos sindicatos como “centros organizadores
da classe proletária”, também intervinha com veemência quando estes enclausura-
vam-se nas estreitas fronteiras do corporativismo e se afastavam da luta política.
Já nas resoluções da I Internacional (1866, Genebra), sob o título de “Con-
dições atuais”, Marx apontava:

“Até o presente, os sindicatos atenderam com demasiada exclu-


sividade às lutas locais e imediatas contra o capital. Todavia,
não se compenetram totalmente de sua força para atacar o sis-
tema de escravidão do salariato e o modo de produção atual.
Neste caso, mantiveram-se demasiadamente afastados dos mo-
vimentos gerais sociais e políticos”7.

E em seguida, na mesma resolução, pronunciava-se sobre o a necessida-


de futura dos sindicatos:

6
LOSOVSKI, 1989.
7
LOSOVSKI, 1989.

27

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CADERNO NACIONAL DA UNIDADE CLASSISTA  POLÍTICA, ORGANIZAÇÃO E FORMAÇÃO

“Além de seus fins primitivos, os sindicatos devem aprender des-


de já a atuar de maneira mais consciente, como eixos da organi-
zação da classe proletária, pelo interesse superior de sua eman-
cipação total. Deverão apoiar todo movimento político e social
que se encaminhe diretamente a este fim.”8

Com a ação de Marx, a Associação Internacional de Trabalhadores (A.I.T.)


reuniu de vez os partidos e os sindicatos, o que acirrou as divergências no inte-
rior da Internacional. Uns eram de opinião que ela deveria agrupar somente os
sindicatos, outros que ela só deveria se compor de partidos políticos. A I Interna-
cional – composta por bakuninistas, blanquistas, proudhonianos, trade-unistas
e marxistas – desagregou-se devido a irreconciliáveis divergências ideológicas e
políticas (que também ocasionavam divergências de organização), e pelo golpe
irreparável da queda da Comuna de Paris.9 A II Internacional (1889), também
conhecida como Internacional Socialista, traz uma diversidade de posições que
não podem ser menosprezadas para o entendimento da realidade do movimen-
to operário da época. Para uma melhor compreensão, o professor marxista Ed-
gard Carone, coloca a necessidade de se caracterizar as fases da II Internacional:

“1) de 1889-1895, período do crescimento da burguesia euro-


peia, com a consequente ampliação numérica e organizativa do
operariado; domina a ideia de que há mudança gradativa, ‘ na-
tural ‘ do movimento operário, o que levaria à extinção do regi-
me da burguesia; 2) a crise de 1893 já está superada em 1895, a
prosperidade econômica e a alta dos preços fazem pensar que a
classe burguesa teria condições de sobreviver durante muito tem-
po, é o momento em que Bernstein formula a teoria revisionista;
3) a revolução Russa de 1905 anuncia nova fase revolucionária
e aparecem lideranças mais radicais na Alemanha (Karl Liebk-
necht, Rosa Luxemburgo), nos Países Baixos (Pannekoek), Na
Rússia (Lenin) e os anarco-sindicalistas na França e na Itália.”10

8
Idem.
9
MARX, 1986.
10
CARONE, 1993.

28

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PARTE 2  TEXTOS DE FORMAÇÃO

Dos vários congressos da II Internacional apresentado na obra de Carone, nos


interessa destacar o I Congresso Internacional Operário Socialista (tendência marxis-
ta), em 1889, Paris. Organizado por membros sindicais das organizações socialistas de
Paris (Jules Guesde, Gabriel Deville, Paul Lafargue e outros), contou com a presença
de cerca de 200 delegados pertencentes a sindicatos ou partidos socialistas. Descreve:

“O maior número de congressista vem da França e da Alema-


nha, países onde as respectivas organizações estão mais conso-
lidadas: da Alemanha vem August Bebel, Eduardo Bernstein,
Clara Zetkin, Vollmar e dezenas de outros. Também compare-
cem delegados da Alsácia-Lorena, Inglaterra (que se divide entre
os dois congressos), Argentina (grupos socialistas de Buenos Ai-
res), Áustria, Bélgica, Boêmia, Bulgária, Dinamarca, Espanha,
Estados Unidos, Finlândia, Holanda, Itália, Noruega, Polônia,
Romênia, Rússia (Lavrov, Plekhanov), Suécia e Suíça.”11

A 1ª Guerra (1914-1918) conduz à bancarrota ideológica e política da


Internacional Socialista. Em fevereiro de 1919 ocorre a Conferência de Berna
(conferência da “Internacional Amarela”), convocada com o objetivo de restau-
rar a II Internacional.12

Lenin e a tarefa dos comunistas no movimento operário


Impulsionada pela Revolução de outubro de 1917, ocorre em março de
1919 o congresso da III Internacional, denominado de I Congresso da In-
ternacional Comunista. Este aprova uma resolução condenando as tentativas
dos socialistas de direita de levar a conferência a aprovar uma resolução com
a qual a Internacional Socialista encobriria a intervenção armada dos impe-
rialistas contra a Rússia Soviética.13 No II Congresso da Internacional Comu-

11
Idem.
12
“Kautsky e Bersntein, nas suas intervenções, procuravam que a conferência condenasse o bolchevismo e a
revolução socialista na Rússia”. (LENIN, 1980).
13
LENIN, 1980.

29

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CADERNO NACIONAL DA UNIDADE CLASSISTA  POLÍTICA, ORGANIZAÇÃO E FORMAÇÃO

nista, em agosto de 1920, o Comitê Executivo da I.C. cria uma Seção Sindical
(chamada de “Internacional Sindical Vermelha”), o que serviu de ponto de
partida para a diferenciação política nos sindicatos revolucionários, aqueles
solidamente conquistados pelos comunistas, daqueles em que se estabelece-
ram as burocracias sindicais, conciliando posições com patrões e governos. A
III Internacional foi dissolvida em 1943.
É também em Lenin, o grande artífice da revolução russa, que podemos
observar a importância da construção de um leito comum, indissociável, das
lutas do movimento operário e o movimento político revolucionário. No ano de
1900, a edição nº 1 do Iskra publica escritos de Lenin sobre o assunto:

“Em todos os países houve um período em que o movimento ope-


rário e o socialismo existiram isoladamente, seguindo caminhos
distintos, e em todos os países esta separação debilitou o socia-
lismo e o movimento operário; em todos os países, somente a
união do socialismo e do movimento operário criou uma sólida
base tanto para um como para o outro. Em cada país, porém,
esta união do socialismo com o movimento operário foi obtida
durante todo um processo histórico, seguindo um caminho par-
ticular, de acordo com as condições de lugar e de tempo.” 14

Com a precisão de quem já mirava seu alvo “lá onde a vista não alcança”,
ele deu direção firme e clara para as tarefas dos revolucionários da época:

“Nossa missão principal e fundamental consiste em promover o


desenvolvimento político e a organização política da classe ope-
rária. Quem relega esta incumbência a segundo plano e a ela não
subordina todas as tarefas parciais e as diferentes formas de luta,
toma um caminho errado e inflige grave dano ao movimento.”15

14
LENIN, 1979.
15
LENIN, 1979.

30

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PARTE 2  TEXTOS DE FORMAÇÃO

O Movimento Operário no Brasil


A partir da segunda metade do XIX 16 o movimento operário brasileiro
começa a se organizar para enfrentar as duras condições de vida e trabalho. José
Antonio Segatto nos relata estas primeiras experiências:

“ ...as primeiras formas de organização foram as Associações de


Socorro Mútuo, com fins assistenciais e de ajuda mútua em ca-
sos de doença, acidentes e velhice, etc. Algumas delas ultrapas-
saram o assistencialismo e começaram a reivindicar melhores
condições de vida e trabalho, como foi o caso da Imperial Asso-
ciação Tipográfica Fluminense que, em 1858, dirigiu a primeira
greve de tipógrafos no país, por aumento de salários”; as “formas
de organização foram se desenvolvendo e evoluindo para a for-
mação das Uniões e Ligas Operárias que, por sua vez, no início
do século, deram origem aos sindicatos”.

Com o avanço das lutas do proletariado, ao lado das organizações sindi-


cais começam a surgir as organizações políticas. A este respeito, segundo As-
trojildo Pereira,

“...no Brasil o socialismo encontra-se em estado embrionário.


Cresce mais nas províncias do Sul, São Paulo e Rio Grande do Sul,
graças à imigração italiana e alemã. Em Santos existe a União
Operária, um partido operário social-democrata. Em 1895 um
grupo de intelectuais fundou o Centro Socialista de orientação
social-democrata por seu caráter... Os mais em vistas da social-
democracia brasileira são os senhores Silvério Fontes, Sóter de
Araújo, Carlos Escobar, Esperidião de Médicis, Mariano Garcia,

16
O Brasil da época possuía capital bancário e comercial, as indústrias instaladas [em 1850] totalizavam 72,
produzia-se tecidos de algodão, bebidas, cigarros, velas, chapéus, existiam algumas fundições e construção
naval que utilizavam energia mecânica, a partir daí , foi se multiplicando e modernizando. (SEGATTO, 1981).

31

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CADERNO NACIONAL DA UNIDADE CLASSISTA  POLÍTICA, ORGANIZAÇÃO E FORMAÇÃO

Ciro Costa, Benedito Ramos e outros”. Astrojildo aponta Sil-


vério Fontes como o propagandista do Centro Socialista, que
fazia artigos baseados na “Interpretação marxista da história,
no determinismo econômico e na doutrina da luta de classes”.17

Entre 1900 e 1920 ocorrera um grande número de lutas e greves. Em


1906 acontece, no Rio de Janeiro, o I Congresso Operário Brasileiro, onde duas
tendências se defrontam, a “anarco-sindicalista” (com maior bancada) e o “so-
cialismo reformista”. Fruto do congresso, organiza-se em 1908 a Confederação
Operária Brasileira (COB). Nos anos de 1913 18 e 1920 realizam-se o II e III
Congressos Operários, mas a COB não vai adiante.
De 1917 a 1920 há uma grande onda grevista sob direção e hegemonia anar-
co-sindicalista (negavam a luta política e o partido revolucionário), porém as vi-
tórias alcançadas não ficaram à altura das lutas e as conquistas não conseguiram
ser mantidas. Mas o proletariado brasileiro, atento ao caminho da Revolução de
1917, compreende a necessidade da organização do proletariado em partido polí-
tico para a disputa, enquanto classe, do poder político. Em 1922 é fundado o PCB.
No período de 1922 a 1930 ocorreram embates entre comunistas e anar-
quistas. Os comunistas atuavam com o objetivo de transformar os sindicatos em
organizações unitárias e de massa. Em 1923 os comunistas estiveram à frente da
greve dos gráficos, São Paulo, que durou mais de um mês. No ano de 1925, os
comunistas do PCB apresentam a proposta de sindicatos por indústria e ramo
de produção - “todos os operários e todos os empregados de uma empresa devem
ser membros de um só sindicato”.
Também pela ação dos comunistas, foi fundada em 192719 a Federação
Sindical do Rio de Janeiro e no mesmo ano aprovada a proposta da criação

17
PEREIRA, A. “Silvério Fontes, Pioneiro do Marxismo no Brasil”, in: KOVAL, 1982.
18
“Por iniciativa da Federação Operária do Rio de Janeiro, constitui-se uma comissão reorganizadora da COB
com encargo de convocar um novo congresso sindical nacional. Para veículo de propaganda e preparação do
congresso, a comissão organizadora fez reaparecer, a 1º de janeiro de 1913, o órgão da COB, A Voz do Tra-
balhador, que se publicou desde então como quinzenário, atingindo a sua tiragem até 4000 exemplares, cifra
considerável para época”. (PERREIRA, 1976).
19
É deste ano também, como reposta patronal e do governo, a “Lei anti-operária” que torna inafiançável o
“ato criminoso” de “provocar suspensão de trabalho por meio de ameaças ou violências” e autoriza o governo
a fechar entidades e jornais operários. (Nota do autor).

32

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PARTE 2  TEXTOS DE FORMAÇÃO

da CGT (Confederação Geral dos Trabalhadores); em 1928 é formado o Bloco


Operário Camponês (BOC); e no ano de 1929 é fundada a CGT (Confederação
Geral dos Trabalhadores do Brasil), que elege como seu primeiro secretário o
operário comunista e vereador, Minervino de Oliveira.20
No início do anos 30, o movimento operário movimenta-se para exigir
o cumprimento imediato das promessas do programa da “Aliança Liberal” e
multiplicam-se as greves. Em 1932 o PCB passou passa a defender a atuação
nos sindicatos oficiais através das “oposições sindicais”, mas em resistência ao
atrelamento manteve os sindicatos dirigidos fora da estrutura sindical oficial.
O ano de 1935 é de intensa movimentação política: com hegemonia dos
comunistas é fundada a Confederação Sindical Unitária do Brasil (CSUB); no
mesmo ano também ocorre a fundação da Aliança Nacional Liberadora (ANL),
uma frente popular e democrática de caráter anti-imperialista e antifascista; em
reação, o governo decreta a “Lei de Segurança Nacional” que dissolve a CSUB
e coloca na ilegalidade a ANL; ainda em novembro de 35 o levante da ANL é
derrotado e uma dura repressão recai sobre o movimento sindical.21
Vale a pena lembrar a política “bifronte” aplicada por Getúlio Vargas no
período que antecedente o Estado Novo. Esta política pode ser resumida em
concessão de direitos sociais e repressão: de 1932 à 1934 ele decretou a jornada
de trabalho de 8 horas no comércio e na indústria, proibiu o trabalho noturno
para mulheres, regulamentou o trabalho de menores e o direito de férias de
algumas categorias de trabalhadores; criou o salário mínimo e os primeiros ins-
titutos de aposentadoria; na outra ponta, repressão e controle das organizações
operárias: criou a “Lei de Sindicalização”, que exigiu a participação de repre-
sentante do governo nas assembleias, proibiu desenvolvimento de atividades
políticas, vetou a filiação a organizações internacionais e proibiu a criação de
centrais sindicais. E os sindicatos que não cumprissem as determinações pode-
riam ter suas diretorias destituídas e substituídas por interventores.
Em novembro de 1937 instaura-se o “Estado Novo”22, os sindicatos são co-

20
SEGATTO, 1981.
21
CARONE, 1974.
22
Entre 1936 /37 o PCB já desenvolvia campanha denunciando o golpe que vinha sendo preparado por
Getúlio, militares liderados por Góes Monteiro e Gaspar Dutra, os Integralistas e lideranças estaduais.
(CARONE,1974).

33

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CADERNO NACIONAL DA UNIDADE CLASSISTA  POLÍTICA, ORGANIZAÇÃO E FORMAÇÃO

locados nas mãos dos interventores e o movimento sindical tem um forte refluxo.
Instaura-se um regime de ditadura aberta e os movimentos de oposição conforme
suas proporções eram rapidamente eliminados com métodos policiais impiedosos,
que desrespeitavam os direitos mais elementares. De 1938 até início de 1942 a atua-
ção política do PCB torna-se bastante limitada, chegando a quase desaparecer.23
De 1942 a 1943 o Brasil entra na guerra contra o nazifascismo e o PCB
se reorganiza na Conferência da Mantiqueira. Em 1944 o movimento operário
começa a renascer e aos poucos vai se recompondo. “Gradualmente, as direções
pelegas vão sendo substituídas por líderes combativos e representantes da classe.
As greves ressurgem com grande intensidade e em grande número em vários pon-
tos do país, aumentando significativamente em 1945”.24 Em abril deste ano, toma
a dianteira e junto com lideres não comunistas (um total de 300, de 3 estados
da federação) propõe a criação do Movimento Unificado dos Trabalhadores
(MUT), uma espécie de intersindical que tinha por objetivos não só a unidade
dos trabalhadores, mas também a inserção dos sindicatos e do movimento ope-
rário na política geral. Era classificado como ‘organização de agentes moscovi-
tas’ no Diário Carioca em 14/ 03/1946.25
O desenvolvimento das lutas e a unidade sindical levam à realização de vários
congressos sindicais (em SP, RJ, MG, dentre outros). Em 1946 é realizado, no Rio
de Janeiro, o Congresso Sindical dos Trabalhadores do Brasil (cerca de 2400 delega-
dos), criando a Confederação dos Trabalhadores do Brasil (CTB) e elegendo como
seu secretário geral Roberto Morena (líder sindical e dirigente comunista). Ainda em
46, o governo proíbe a existência do MUT e, ao tempo, decreta a intervenção e sus-
pensão de eleições sindicais. Em 1947, sob os auspícios da “Guerra Fria”, o governo
Dutra fecha a Confederação dos Trabalhadores do Brasil e caça o registro do PCB.
Em 1948 os comunistas esboçam uma autocrítica da tática, e propõem uma
nova linha política com o “Manifesto de Janeiro de 1948” (este ganha versão mais

23
SEGATTO, 1981.
24
No plano da organização surgem grupos independentes como a União Trabalhista Democrática, dos Carris
Urbanos de São Paulo, a União dos Trabalhadores Intelectuais, dos jornalistas paulistas, O Movimento Unitá-
rio Sindical, dentre outras. (SEGATTO, 1981).
25
“Bom indicador deste contexto é o relato de uma conversa entre o Embaixador norte-americano William D.
Pawley com o general Alcindo Souto (do Gabinete Militar de Dutra) e o chefe de polícia, em janeiro de 1947,
quase as vésperas do cancelamento do registro do PCB (documento 832.000 B/1-347, National Archives,
Wasington...).” Idem.

34

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PARTE 2  TEXTOS DE FORMAÇÃO

radical com o “Manifesto de Agosto de 1950”). O de 48 caracterizava-se pela crí-


tica à “sistemática contenção da luta das massas proletárias em nome da colabora-
ção operário patronal e da aliança com a ‘burguesia progressista’, assim como pela
pouca atenção dada às lutas dos trabalhadores rurais contra o latifúndio, que sig-
nificava a subestimação na prática da massa camponesa como principal aliado do
proletariado”.26 Ocorrem mudanças na linha sindical, levando a campanhas contra
o imposto sindical e pela criação de entidades desvinculadas da estrutura sindical.
Dos anos 50 vale destacar: a retomada das atividades entre os trabalhado-
res rurais, dando continuidade ao trabalho de formação de ligas camponesas
iniciados em 1945/46, em vários estados; a eleição para a Câmara Federal do lí-
der sindical comunista Roberto Morena, em outubro de 1950; outras atividades
de massa, como a campanha pelo monopólio estatal do petróleo, contra o envio
de soldados para a Coreia, pela paz mundial, contra a carestia, etc.
A volta de Vargas ao poder, a liberalização dos sindicatos e o avanço do
movimento operário levam os comunistas a nova alteração da política sindi-
cal. Com isso, passam a formar chapas unitárias para concorrer às eleições sin-
dicais. No livro de Boris Koval, “História do Proletariado Brasileiro – 1857 a
1967”, temos os detalhes:

“Na resolução do Pleno do CC do PCB, realizado em junho de


1952, ‘Sobre a Unidade e Organização da Classe Operária’, foram
traçadas medidas concretas visando melhorar o trabalho do Parti-
do nos sindicatos. A resolução salienta que a principal tarefa con-
sistia em conseguir a unidade combativa e sólida da classe ope-
rária: ‘Um sindicato em cada ramo da indústria, um centro sin-
dical nacional unificado filiado à Federação Sindical Mundial.”27

A reorientação sindical contribuiu efetivamente para o fortalecimento dos


comunistas e de suas posições nos sindicatos, ampliando sua influência no mo-
vimento operário. Porém, ainda permanecem vários elementos da linha política
geral, levando muitos militantes a adotar uma atitude de distância dos sindica-
tos, federações e uma certa resistência com relação à unidade sindical.

26
PRESTES, 1980.
27
Suplemento da “Novos Rumos” de 1959, in KOVAL, 1982.

35

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CADERNO NACIONAL DA UNIDADE CLASSISTA  POLÍTICA, ORGANIZAÇÃO E FORMAÇÃO

Os frutos da nova postura dos comunistas no movimento sindical são co-


lhidos já em 1953, entre eles a importante greve ocorrida em São Paulo, “da qual
participaram 300 mil operários de várias categorias (têxteis, metalúrgicos, mar-
ceneiros, gráficos e outras) e que durou 26 dias”. “Estavam lançadas aí as bases
para a formação do PUI – Pacto de Unidade Intersindical, que chegou a contar
com 100 entidades sindicais e que, em 1954, dirigiu uma greve geral contra a
carestia, na qual se envolveram 1 milhão de trabalhadores.”28
Ainda em 1953, o movimento sindical convocou a I Conferência Nacio-
nal de Lavradores e Trabalhadores Agrícolas, que lança um manifesto assina-
do por cerca de 500 dirigentes sindicais, por dirigentes camponeses e algumas
personalidades. Do evento resultou uma comissão nacional coordenadora do
movimento camponês e uma importante lista de reivindicações. Em 1954, a II
Conferência Nacional de Lavradores e Trabalhadores Agrícolas resulta na fun-
dação da União de Lavradores e Trabalhadores Agrícolas do Brasil (ULTAB) e
na Campanha Nacional pela Reforma Agrária. A ULTAB, embora registrada
como entidade de caráter civil, agia como sindicato, lutando pela sindicalização
rural e dirigindo lutas de posseiros, arrendatários e assalariados.
Em 1960 é criado o Pacto de Unidade de Ação (PUA), com os marítimos,
portuários e ferroviários. É realizada uma greve exigindo a equiparação de sa-
lários. Uma greve geral é deflagrada em agosto de 1961 para garantir a posse de
Jango. Foi formado o Comando Geral de Greve (CGG). O PCB e a esquerda do
PTB vencem na CNTI.
Em julho de 1962, o CGG convoca uma greve contra a indicação de um mi-
nistro conservador. Ela é vitoriosa e conquista o 13º salário. Em agosto do mesmo
ano é fundado o Comando Geral dos Trabalhadores (CGT), fruto da aliança entre
comunistas e trabalhistas. Ainda em setembro de 62 uma greve geral pressionou o
Congresso pela antecipação do plebiscito. Este daria a vitória ao presidencialismo.
Em dezembro de 1963 é criada a CONTAG: fortalecia-se o movimento camponês.
No dia 13 de Março de 1964 ocorre o grande Comício na Central do Bra-
sil, Rio de Janeiro, com cerca de 200.000 pessoas, pelas reformas de base. As eli-
tes conservadoras reagem com a Marcha da Família, com Deus, pela Liberdade.
Em 1º de abril de 1964 o golpe empresarial-militar instaura intenso e longo
período de repressão. Seriam 20 anos sob o tacão da ditadura. As ocupações mi-

28
SEGATTO, 1981.

36

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PARTE 2  TEXTOS DE FORMAÇÃO

litares e as intervenções atingiram cerca de duas mil entidades sindicais em todo


o país. Suas direções foram cassadas, presas e exiladas. A desarticulação, repres-
são e controle dos sindicatos foram acompanhados de nova política de arrocho
salarial, da lei antigreve nº 4.330 e do fim do regime de estabilidade no emprego.
A ditadura passou a se utilizar de práticas de tortura, assassinatos e censura,
acabando com a liberdade de expressão, organização e manifestação política. 29
Apesar das dificuldades de registro à época, de acordo com Costa, “pelos
dados de Boris Kowal, pode-se afirmar que a greve mais importante em 1964
foi a dos sapateiros do Rio de Janeiro, que durou três semanas; mas foram regis-
trados também greves menores em Pernambuco, São Paulo, Rio Grande do Sul
e Rio Grande do Norte. ‘Durante os oito meses após o primeiro de abril ocor-
reram no Brasil cerca de 20/30 greves, com total de 40/50 mil participantes’.”30
“A primeira grande manifestação do proletariado ocorreu em setembro de
1965 quando, sob a liderança dos comunistas, estiveram em greve os metalúrgi-
cos do Rio de Janeiro, reivindicando aumento de salário.”31
Em 1966 aumenta de forma expressiva o descontentamento com o regime.
Agitam-se os trabalhadores portuários da Baixada Santista, os funcionários públicos
do antigo Estado da Guanabara, dentre outros. Ao final deste ano, “a luta de greves
adquiriu um caráter de massas. Foi sobretudo grande a greve dos operários das plan-
tações de cana-de-açúcar e usinas do Nordeste do Brasil.”32 Mas, a pesar das lutas, o
governo impõe a lei nº 5.107 que acaba com a estabilidade no emprego e cria o FGTS.
No ano de 1967 cria-se o Movimento Intersindical Anti-arrocho (MIA). Par-
ticiparam os sindicatos dos metalúrgicos de São Paulo, Santo André, Guarulhos,
Campinas e Osasco, que buscavam unir forças para derrotar o arrocho salarial.
As lutas grevistas de caráter econômico ganhavam contornos de luta po-
lítica, visto que desafiavam a legislação de exceção da ditadura empresarial-
militar. E, embora movimento sindical tenha feito brava resistência, o mesmo
sofreu grande declínio durante o primeiro governo militar. Segundo Sandoval,
“para os anos de 1964/65 estiveram em greve 657.760 grevistas e, em 1966/67,
ocorreu uma diminuição do movimento grevista para patamares dos anos

29
Paragrafo extraído da contribuição dos camaradas, Dorival Sazan e Marlene Soccas, membros do PCB -
Criciúma/SC, à Tribuna de Debates da Conferência Nacional de Politica e Organização de 2016.
30
COSTA, p. 183.
31
KOWAL, in: COSTA, p.184.
32
Idem.

37

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CADERNO NACIONAL DA UNIDADE CLASSISTA  POLÍTICA, ORGANIZAÇÃO E FORMAÇÃO

40, começo dos anos 50, com média de três mil trabalhadores por greve.”33
Vale apena ainda destacar, do período 64 a 68, talvez as mais importan-
tes lutas realizadas pela classe operária, ambas em 68, “as greves de Contagem
(MG) e Osasco (SP), dois movimentos que representaram, ao mesmo tempo, o
ponto mais alto da luta dos trabalhadores contra a ditadura no período e o iní-
cio de um longo refluxo na luta operária que se estendeu por cerca de 10 anos.”34
Em 13 dezembro de 68, o Ato Institucional nº 5 (AI-5) suspende os di-
reitos políticos, fecha o congresso, proíbe manifestações políticas, implanta a
censura e aumenta, ainda mais, a repressão armada. A partir de 1969, os movi-
mentos de protestos dos trabalhadores eram noticiados apenas pela imprensa
clandestina dos partidos de esquerda. Em 14 de fevereiro deste ano, o Ministé-
rio do Trabalho interveio em mais de uma centena de sindicatos.
A conjuntura econômica do país também influenciou no declínio das lu-
tas sindicais. Conforme Costa, “entre os anos 1969-1973 registrou-se as maiores
taxas de crescimento do PIB, o que pode ter contribuído também para arrefecer
o ânimo da classe operária, principalmente se levarmos em conta a ofensiva
propagandista do governo em relação aos seus êxitos econômicos.”35
Em meio à ditadura, na medida do possível, as lutas dos trabalhadores, que
ganharam as mais variadas formas (operação tartaruga, recusa de fazer horas ex-
tras, falta organizada ao trabalho, greve por atraso de pagamento, etc.), contri-
buíram de maneira fundamental para a formação da consciência operária. Isto
é, dificilmente haveria o êxito histórico das greves do ABC paulista em 78/79,
sem esse longo, difícil e perigoso exercício de rebeldia. As greves metalúrgicas
estão umbilicalmente ligadas à dedicação, ao sacrifício e ousadia de trabalhadores
e militantes anônimos que no interior das fábricas preparavam as bases futuras.
No livro, “A política Salarial no Brasil (1964-1985)”, Edmilson Costa nos
traz um rico depoimento de um dos personagens mais ativos na época, o meta-
lúrgico Lucio Belantani36, que nos ajuda a compreender como foi tecida a orga-
nização no interior da maior fábrica transnacional do país. Conta ele:

33
SANDOVAL, Salvador. “Os trabalhadores param”, Ed. Ática, 1994, São Paulo. in: COSTA, p.185.
34
COSTA, p. 186.
35
COSTA, p. 194.
36
Era secretário político do Comitê de Empresa (que coordenava as células comunistas no interior da Volks,
composto por seis operários) e membro do Comitê Estadual do PCB/SP. (COSTA, p. 191/192).

38

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PARTE 2  TEXTOS DE FORMAÇÃO

“Entrei para a Volks em 1964 e já havia alguns companheiros co-


munistas, mas não existia um trabalho organizado. Mas fomos
discutindo e construindo um trabalho mais efetivo, procurando
inserir o Partido na classe operária. Nosso trabalho foi crescendo
e terminou servindo de exemplo para que o Partido elaboras-
se uma linha política, sintetizada no Plano de Construção nas
Grandes Empresas (Placonp). Ou seja, com o trabalho que de-
senvolvíamos na fábrica, o Partido dava uma reposta concreta a
todas as outras forças do acerto da linha política de concentrar o
trabalho na classe operária, apesar das imensas dificuldades.”37

“Em 1970 e 1971 chegamos a ter, como militantes, pagando regularmente


suas mensalidades (0,5% do salário), cerca de 150 companheiros só na Volks.
Todos recebiam a Voz Operária e em alguns momentos chegamos a distribuir
cerca de 300 jornais na fábrica. Além disso, tínhamos organização de base em
outras grandes empresas como a Willys, Motores Perkins, Chrysler, entre ou-
tras, além de gente em Santo André e São Caetano.”38
“Um fato curioso é que nossa organização na Volks era maior que a orga-
nização do Partido no município. Então resolvemos nos estruturar como Co-
mitê de Empresa, sob assistência direta do Comitê Central.”39
Lúcio lembra ainda, e com orgulho, de uma das ações que mais lhe marcou a
memória: foi no lançamento do milionésimo carro da Volks, episódio que deixou
a repressão furiosa. “Nós fizemos um jornal com denúncia, contendo inclusive
muitas informações sigilosas da empresa, pois no trabalho que desenvolvíamos
chegamos a ter como militantes gente da gerência. Como a Volks revistava os
trabalhadores na entrada e na saída, orientadas pela polícia (naquele período já
sentíamos que a polícia estava querendo nos identificar), levamos cerca de 10 mil
jornais, ao longo de uma semana, embrulhado em sacos plásticos dentro das mar-
mitas. No dia combinado, toda a organização do Partido40 panfletou a empresa

37
COSTA, p. 192.
38
Idem.
39
Idem.
40
“Nos meses de julho e agosto de 1972, a repressão prendeu os principais dirigentes da organização de base
do PCB na Volks.” (COSTA, p.199).

39

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CADERNO NACIONAL DA UNIDADE CLASSISTA  POLÍTICA, ORGANIZAÇÃO E FORMAÇÃO

em menos de 10 minutos. Colocamos o material nos banheiros, vestiários, nos


ganchos, nas esteiras rolantes.”41
Recuperar a memória das lutas daquele período nos permite relacionar o
processo de acumulação de forças na clandestinidade e a explosão das greves em
78/79, além de “quebrar o mito difundido por certos setores da esquerda, pouco
conhecedores da história, de que o movimento operário atual começou em 1978.”42
A partir de 74 iniciou-se mais abertamente a retomada das lutas. A maior
greve foi a dos motoristas de ônibus de São Paulo, dirigida por militantes do
PCB. Em matéria publicada na Voz Operária, lia-se: “No dia 2 de maio a cidade
de São Paulo foi parcialmente paralisada por uma greve de motoristas e cobra-
dores das empresas particulares. Esse movimento teve profunda repercussão,
pois milhares de operários não puderam ir ao trabalho.”43
Um protesto pela morte de Vladimir Herzog (jornalista e militante do
PCB), em setembro de 1975, foi a primeira grande manifestação pública des-
de a implantação do AI-5. Realizaram-se várias assembleias no Sindicato dos
Jornalistas, com a presença de várias entidades sindicais, para organizar uma
manifestação de protesto contra as arbitrariedades do regime.
Em janeiro de 1976 foi morto o operário metalúrgico Manoel Fiel Filho,
militante do PCB. O II Exército alegou novamente, assim como no caso Herzog,
suicídio por enforcamento. No mesmo ano, durante um comício no 1º de maio
na cidade de Volta Redonda (RJ), organizado pelo regime, trabalhadores que
marcharam até o local da concentração carregando faixas e cartazes contra a
política salarial foram violentamente reprimidos.
No ano de 77, as lutas tiveram um caráter mais político que sindical, pois
tiveram mais mobilizações voltadas à defesa das liberdades democráticas e dos
direitos humanos do que temáticas sindicais.
O período era de aceleração da inflação e os reajustes obtidos nos dissídios
eram praticamente nulos. Tal situação, fez com que no dia 12 de maio de 1978 ti-
vesse início a greve que se tornaria histórica. A esta altura os trabalhadores se mos-
travam reanimados e estavam criadas as condições para que o movimento operário
se tornasse o principal interlocutor político dos trabalhadores. Abre-se uma nova

41
COSTA, p. 193.
42
COSTA, p. 194.
43
Voz Operária, nº 112, junho – 1974 in: COSTA, p.202.

40

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PARTE 2  TEXTOS DE FORMAÇÃO

fase para as lutas operárias e começa a se romper as regras impostas pela ditadura.
“A partir da greve na Scania estava rompido o ciclo do medo que reduzia as
manifestações operárias a lutas isoladas e sem repercussão social, tanto que o movi-
mento grevista se espalhou pela região como um rastilho de pólvora, posteriormen-
te para o Estado de São Paulo e em seguida para todo o País, rompendo na prática
a legislação arbitrária e a política de arrocho salarial.”44 Outras categorias, incluindo
setores do serviço público e camadas médias urbanas também fazem greve. “No
final de 1978, 539.037 trabalhadores de 19 categorias cruzam os braços no Brasil.”45
Após serem surpreendidos pelo movimento operário com paralisações
dos trabalhadores dentro das fábricas, empresários e governo preparam uma
resposta. A Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (FIESP) envia uma
circular aos seus associados46, cujo objetivo verdadeiro era colocar os grevistas
para fora das fábricas, tornado assim mais fácil a repressão policial. Dentre as
principais recomendações estão:

“Forçar os operários a ficarem fora das fábricas, suspendendo os


que entrassem e não trabalhassem; em nenhuma circunstância,
pagar os dias parados com paralisações; e em última instância,
dispensar um certo número de pessoas por justa causa, junta-
mente com o responsável pela área paralisada; pedir ao traba-
lhador que execute alguma tarefa (a negativa caracterizará um
ato de insubordinação). Essa atitude gera insegurança no pes-
soal. Geralmente, depois os empregados ou o sindicato pedirão a
sustação das dispensas, propondo a volta ao trabalho.”47

E meio à reação da ditadura empresarial-militar, um fato marcante impri-


me nova dinâmica aos conflitos no ABC, “trata-se da comemoração do Primei-
ro de Maio, no Estádio da Vila Euclides: cerca de 150 mil pessoas participaram

44
COSTA, p. 216-217.
45
MOREIRA ALVES, M.H. “Estado e oposição no Brasil, 1964-1984”, Ed. Vozes, 1984, Rio de Janeiro, in:
COSTA, P.217.
46
Tal documento foi para nas mãos do sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo do Campo, que o publicou
em seu jornal, a Tribuna Metalúrgica. (COSTA, p. 218).
47
“Tribuna Metalúrgica, novembro de 1978, citado em John Humphrey, ‘Controle Capitalista e Luta Operária
na Indústria automobilística Brasileira”, Vozes, 1982, p. 179.’ in: COSTA, p. 218.

41

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CADERNO NACIONAL DA UNIDADE CLASSISTA  POLÍTICA, ORGANIZAÇÃO E FORMAÇÃO

do evento, possivelmente a maior assembleia operária já realizada no País, para


a qual acorreram não só metalúrgicos, mas trabalhadores de várias categorias,
entidades da sociedade civil, partidos de oposição, etc.”48
Após as greves no ABC as lutas se espalham pelo país e assalariados dos mais
diversos ramos e categorias organizam greves como arma contra patrões e gover-
nos. Segundo Edmilson Costa, “a greve dos metalúrgicos desencadeou uma das
maiores ondas de greve da história do país Mais de 3 milhões de trabalhadores
participaram das ações de greves desencadeadas em 15 dos 23 Estados do País.”49
As jornadas de lutas contribuíram para mudar a fisionomia política do país
destravando a luta para o conjunto da população, conforme nos mostra Sandoval:

“Por volta do final de 1979, os trabalhadores haviam feito mais


avanços que seus adversários. Embora os ganhos políticos fos-
sem moderados, o movimento operário havia testado sua força;
outros segmentos da classe trabalhadora assumiram uma nova
militância, à medida que as greves se espalharam das regiões
metropolitanas para o interior “50

O movimento sindical sai vitorioso das lutas de 79, porém, um certo


triunfalismo das lideranças sindicais, somado a uma mudança no panorama
internacional (recessão econômica generalizada em quase todos os países cen-
trais) leva a uma quadra de maiores dificuldades e derrotas no ano seguinte:
“Além da greve dos metalúrgicos do ABC, ocorreram também, em 1980, outras
importantes como a dos 240 mil trabalhadores rurais do Nordeste, 110 mil pro-
fessores primários e secundários do Rio de Janeiro e 12 mil portuários de Santos.
Em 1980, ocorreram apenas 50 greves, com um total de 664.700 participantes.”51
As lutas contra a ditadura estavam na ordem do dia das organizações po-
pulares. A década de 198052 foi marcada pelo ascenso do movimento sindical e

48
COSTA, p. 222.
49
Idem.
50
COSTA, p. 224.
51
COSTA, p. 231.
52
Afora os dois primeiros anos, onde houve fortíssima recessão, levando o país a taxas de crescimento negati-
vas pela primeira vez nas últimas quatro décadas. O que levou o movimento operário a um acentuado refluxo.

42

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PARTE 2  TEXTOS DE FORMAÇÃO

popular, retomada das batalhas estudantis e das grandes manifestações de mas-


sas, expressando uma nova correlação de forças no país.53
O PCB encontrava-se muito enfraquecido no interior dos movimentos
populares e sindical (onde, em especial, sua política de conciliação de classes
imposta pela maioria do Comitê Central à época foi amplamente questiona-
da). Os trabalhadores, pressionados pela carestia, se encontravam em ambiente
propício à radicalização do discurso e das ações na direção do enfrentamento
contra o governo e os patrões, não da conciliação. Daí o espaço cada vez menor
dos comunistas no interior do movimento sindical e nos embates sociais.

“Assim, no decurso da derrota da ditadura e da transição demo-


crática, o Partido não se afirmou como organização de massas,
nem esteve na vanguarda das principais lutas e greves operárias
no decorrer dos anos 1980, apesar de ter tido importante parti-
cipação em inúmeras lutas sindicais, a exemplo da atuação no
Sindicato dos Bancários do Rio de Janeiro e outros.”54

A débil inserção dos comunistas nos movimentos acabaria por fragilizar


sua intervenção política, em que pese a relevância nas articulações institucio-
nais da esquerda e do campo democrático. O movimento sindical mais comba-
tivo se reaglutinava em torno, principalmente, das lideranças surgidas com as
greves do ABC, em fins da década anterior.
Em agosto de 1981, na colônia de férias do Sindicato dos Têxteis de SP, em
Praia Grande, foi organizada a primeira Conferência Nacional da Classe Traba-
lhadora (CONCLAT), que aprovou a formação da comissão para criar a Central
Única dos Trabalhadores – a Comissão Pró-CUT. Contudo, a unidade não durou
muito tempo. Quando da preparação da conferência seguinte, a Comissão se di-
vidiu em duas tendências: uma, liderada pelo PCB55, defendia que as condições
históricas ainda não estavam dadas para a criação da CUT, enquanto a outra,

53
Vale ressaltar que a reorganização e o avanço do movimento sindical se davam na sequência das lutas
anti-ditadura atrasaria, por alguns anos, a adoção da chamada “reestruturação produtiva”, mecanismos de
aprofundamento da exploração sobre os trabalhadores.
54
F.D.R., 2014.
55
Esta frente era denominada Unidade Sindical, e pelo PCB participava de sua coordenação o camarada Ivan
Pinheiro, na época, presidente do Sindicato dos Bancários do Rio de Janeiro.

43

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CADERNO NACIONAL DA UNIDADE CLASSISTA  POLÍTICA, ORGANIZAÇÃO E FORMAÇÃO

liderada pelo recém-criado Partido dos Trabalhadores (PT), afirmava o oposto.


O movimento sindical ficaria cindido em duas posições majoritárias56:
o grupo que seguia a posição petista organizaria, em 1983, o 1º Congresso
Nacional da Classe Trabalhadora (CONCLAT), em São Bernardo do Campo
(SP), dando origem à CUT no dia 28 de agosto. Por sua vez, o grupo do qual o
PCB fazia parte57, organizou-se em torno da Coordenação Nacional da Classe
Trabalhadora (CONCLAT), que, em 1986, se transformaria em Central Geral
dos Trabalhadores (CGT).
Cresciam as correntes que participavam da construção do PT e do de-
nominado “novo sindicalismo”. Eram forças políticas representativas de uma
socialdemocracia tardia no Brasil, radicalizadas na época, mas que passariam
por um processo de “transformismo” em direção a posições francamente refor-
mistas dos anos 1990 em diante.
Nos anos de 1983 e 1984, o Brasil presenciou as maiores mobilizações de
massas até então ocorridas no país, em torno da campanha pelas eleições dire-
tas para presidente da República, a maior delas no Rio de Janeiro, reunindo um
milhão de pessoas na Av. Presidente Vargas.
Premidos pela “Legalidade do PCB”, em 1985, a política dos comunistas
de transição democrática, “defendia a necessidade de um ‘pacto político-social’
entre o novo governo e as forças políticas e sociais interessadas, ‘para facilitar e
acelerar a democratização do país e a ultrapassagem da crise econômica’. Em 8
de maio do mesmo ano, o partido reconquista a legalidade após quase quarenta
anos da cassação da legenda.”58
Os comunistas atuavam na CGT tentando torná-la um polo unificador
das lutas sindicais, porém, as tensões internas se agudizavam. A “tensão se esta-
beleceu entre os setores mais tradicionais do sindicalismo, aliados dos partidos
de esquerda atuantes na CGT, e um novo bloco que foi se formando conhecido
como sindicalismo de resultados, que, defensor da economia de mercado, anti-
comunista e pragmático, divergia tanto do sindicalismo de contestação da CUT,

56
As duas tendências passaram a disputar a hegemonia do movimento sindical nacional, cujo embate se daria,
nos anos posteriores, entre a concepção da unicidade e do pluralismo sindical.
57
O PCB, que optou por estruturar aliança com os setores mais moderados e atrasados politicamente, viu, aos
poucos, o prestígio conquistado na luta contra a ditadura se esvair.
58
F.D.R., 2014.

44

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PARTE 2  TEXTOS DE FORMAÇÃO

como de seus parceiros de esquerda dentro da CGT. Este tinha como nomes
de proa Antônio Rogério Magri (eletricitários de São Paulo) e Luís Antônio de
Medeiros (metalúrgicos de São Paulo).”59
Magri60 e Medeiros61 atuaram como sustentáculos da política de arrocho do
governo Sarney, fizeram coro com os reacionários na Constituinte e tentaram sa-
botar as lutas unitárias dos trabalhadores — como a greve geral de agosto de 87.
Após Congresso (Extraordinário) do PCB realizado em 1987, sem promo-
ver alterações na estratégia da “via da democracia de massas para o socialismo”,
o conjunto do partido é atingido por uma crise, “expressa na estagnação do con-
tingente de militantes, na perda de inserção no movimento sindical, na pobreza
dos resultados eleitorais e na ineficiência dos instrumentos partidários.”62
Os anos de 1987 e 1988 foram marcados pelas batalhas na Assembleia Na-
cional Constituinte. A chamada “Constituição Cidadã” consolidou a institucio-
nalização do Estado democrático burguês no Brasil, em linhas gerais, moldado
segundo os interesses do “Centrão”, deixando intactos o latifúndio e os grupos
monopolistas associados ao imperialismo.
Porém, a crescente pressão do movimento sindical (ver quadro abaixo) e
popular ao longo dos anos 80 fez a burguesia brasileira se curvar, em parte, e
garantiu importantes conquistas de direitos trabalhistas com destaque para a
redução da jornada de trabalho de 48h para 44h semanal; o direito de greve;
liberdade sindical; o abono de férias; férias remuneradas com acréscimo de 1/3
do salário; o décimo terceiro salário para os aposentados; o seguro-desemprego;
a licença-maternidade de 120 dias para as trabalhadoras (antes eram 90 dias)
e aos homens a licença-paternidade de cinco dias; os direitos trabalhistas dos
empregados urbanos foram estendidos para os rurais.

59
http://www.fgv.br/cpdoc/acervo/dicionarios/verbete-tematico/central-geral-dos-trabalhadores-do-brasil-cgtb
60
Antonio Rogério Magri começou na vida sindical em meados da década de 70. Ganhou destaque na direto-
ria do Sindicato dos Eletricitários de S. Paulo depois que fez o curso de formação do ICT (Instituto Cultural
do Trabalho) sucursal do IADESIL (Instituto Americano para o Desenvolvimento do Sindicalismo Livre), que
era dirigido e financiado por um órgão tripartite composto pelo Pentágono, pela AFL-CIO e por representan-
tes de grandes empresários. (Revista Debate Sindical nº 39, 2001).
61
Luiz Antonio Medeiros começou no sindicalismo em 1981, participando na chapa de Joaquinzão. Aderiu ao
sindicalismo americano e ganhou confiabilidade para substituir Joaquim dos Santos Andrade, o Joaquinzáo,
na presidência do sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo.
62
F.D.R., 2014.

45

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CADERNO NACIONAL DA UNIDADE CLASSISTA  POLÍTICA, ORGANIZAÇÃO E FORMAÇÃO

EVOLUÇÃO DAS GREVES


ANO GREVE GREVISTAS
1982 147 695.930
1983 330 3.187.130
1984 443 1.616.790
1985 676 6.071.214
1986 1.267 8.254.140
1987 1.052 12.047.00
Fonte: DESEP. Indicadores obtidos através da imprensa, sindicatos, Ministério do Trabalho e DIEESE

Garantiram-se importantes direitos sociais como o acesso universal à saú-


de pública através do Sistema Único de Saúde (SUS); o sufrágio universal, direto
e secreto, com valor igual para todos; direito de voto dos analfabetos; o direito
de voto aos jovens a partir dos 16 anos; o sistema pluripartidário; o direito às
comunidades descendentes de quilombolas à propriedade sob as áreas ocupa-
das por seus antepassados; a demarcação de reservas indígenas; a seguridade
social, dentre outros. E também estabeleceu o monopólio estatal da exploração
do subsolo, do minério, do petróleo, dos recursos hídricos, do gás canalizado,
das comunicações e do transporte marítimo.
No segundo congresso, realizado entre os dias 27 de abril e 1º de maio de
1989, Magri com apoio de Medeiros, apelando para as práticas de banditismo sin-
dical, “tomam de assalto” e vencem a eleição para a direção da entidade derrotan-
do o então presidente, o Joaquinzão. No mesmo ano, posicionaram-se a favor de
Collor já no primeiro turno das eleições. Medeiros chegou a colocar as peruas de
som do sindicato à disposição da campanha de Collor nas portas das fábricas. De-
pois, Magri é nomeado por Collor para o Ministério do Trabalho e Previdência.

46

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Sobre nossa
ENTRADA NA CUT

C om as eleições 1989, a vitória de Collor e a derrota da frente “Democrá-


tica Popular”, encabeçada por Lula, instaurou-se uma nova conjuntura.
Tem início a implementação do projeto neoliberal no Brasil: as privati-
zações, desregulamentações no mercado de trabalho, abertura comercial, des-
regulamentação financeira e a chamada “reestruturação produtiva”, levam a um
vertiginoso aumento do desemprego, rebaixamento de salários, aumento da in-
formalidade nas relações de trabalho, perdas de direitos etc. Tal situação impac-
tou fortemente a classe trabalhadora (em suas dimensões objetiva e subjetiva)
e, ao longo da maior parte dos anos 90, o sindicalismo se viu em uma fase de
grande defensiva. Surge aí a proposta apresentada pela tendência Articulação
Sindical (corrente de Lula), de um “sindicalismo propositivo”.
No segundo semestre de 1990, os comunistas do PCB que ainda atuavam
enquanto Unidade Sindical na CGT realizaram um Ativo Sindical na cidade de
Praia Grande – SP, onde dão novo rumo à atuação na frente sindical. O evento
ganha um caráter histórico, como nos conta o camarada Carlos Arthur, o Boné,
que na época era Diretor do Sindicato dos Bancários do Rio:

“A mesa do Ativo inicialmente estava sendo coordenada por mem-


bros do CC (da turma liquidacionista) que eram favoráveis a per-
manência na CGT63. Os militantes sindicais destituíram os ‘cege-
tistas’ da mesa, derrotaram as posições atrasadas que campeavam
no partido, e decidiram pela saída da CGT e a entrada na CUT.”64

63
Naquela altura a CGT já se mostrava um espaço inviável para os comunistas, visto que não nos permitia
construir uma unidade de ação com o sindicalismo combativo, todo ele na CUT.
64
Relato feito em entrevista realizada pela UC ao camarada Boné em 08/03/16.

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CADERNO NACIONAL DA UNIDADE CLASSISTA  POLÍTICA, ORGANIZAÇÃO E FORMAÇÃO

Ainda no final de 90, em reunião ordinária, o CC do PCB referenda a nova


tática para atuação sindical. No ano de 91 ocorre novo Ativo Sindical que reformu-
la nossa ação: passamos a usar a denominação “Unidade e Luta” e atuar na CUT.
Nesta época, no interior da CUT, surgia a proposta apresentada pela ten-
dência Articulação Sindical (corrente de Lula), de um “sindicalismo proposi-
tivo”. “A nova estratégia foi apresentada pela primeira vez na Reunião Plenária
Nacional da CUT em 1990. A frase de Meneghelli é emblemática nessa revira-
volta: ‘É preciso deixar de dizer apenas não e começar a dizer sim, apresentando
propostas alternativas’. Esta posição foi reafirmada no IV CONCUT realizado
em 1991. Dava-se assim uma mudança na concepção sindical e na estratégia
que a CUT vinha desenvolvendo desde a sua fundação.”65
Apesar de inúmeras discordâncias entre várias tendências de oposição ao
campo majoritário, a Articulação, existia no IV CONCUT um ponto comum,
todos apontavam a “democracia interna” como o principal problema da CUT
naquele momento. Ainda no Cecut de São Paulo as correntes divulgaram um
documento conjunto destacando: “A CUT deve ser unitária, pluralista e demo-
crática. Não pode ser monopólio de uma corrente. Por isso, deve haver propor-
cionalidade em todas as suas instancias, garantindo a unidade e a representação
de todas as correntes do campo dos trabalhadores. O estatuto deve mudar no
rumo da democratização, e não no contrário”.66
Também no IV CONCUT, outro tema ganha contorno relevante: a filiação
da CUT a uma das três centrais sindicais mundiais existentes na época, a CIOSL
(Confederação Internacional das Organizações Sindicais Livres), a CMT (Confe-
deração Mundial do Trabalho) e a FSM (Federação Sindical Mundial). O debate
se dava em momento de fortalecimento do capitalismo e o refluxo das lutas revo-
lucionárias no mundo, com profundas mudanças como a crise do socialismo e a
falência dos países do Leste Europeu, o processo de unificação capitalista em vá-
rios continentes, o novo patamar da disputa interimperialista no planeta, os avan-
ços tecnológicos da chamada “terceira revolução industrial”67. Todo esse quadro

65
Revista Sociologia Política, nº13, Curitiba,1999. (http://dx.doi.org/10.1590/S0104-44781999000200018)
66
Revista Debate Sindical nº9, 1991.
67
Denominação usada para as alterações ocorridas nos diversos setores produtivos frutos do advento da mi-
croeletrônica, do Chip. A mudança do “modelo fordista-taylorista” (americano) de produção, para o “modelo
toyotista” (japonês).

48

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PARTE 2  TEXTOS DE FORMAÇÃO

seria responsável por fragilizar ainda mais a participação e influência dos comu-
nistas brasileiros (que defendiam a filiação a FSM) na conjuntura política nacional.
No Brasil, as mudanças citadas e a forte ofensiva ideológica da burguesia
fazem florescer concepções político-sindicais conciliatórias, que abandonam an-
tigas bandeiras e formas de luta e menosprezam a própria independência de classe
dos trabalhadores. Daí a filiação a uma central sindical mundial defendida pela
Articulação68, com predileção pela CIOSL, central mundial que mais se identifica
com os objetivos dos países capitalistas desenvolvidos, imperialistas. Desde a sua
fundação defende abertamente a chamada “livre iniciativa”, endeusa a democra-
cia burguesa e combate as ideias marxistas. Até hoje o seu estatuto condena a “luta
de classes”. A filiação a CIOSL só foi aprovada em reforma estatutária em 1992.
Em março de 1991, um congresso realizado no Memorial da América
Latina, São Paulo, marcou a fundação da Força Sindical, sustentada principal-
mente pelo Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo, presidido por Medeiros.
Se fizeram presentes ao congresso, representantes do patronato, membros do
governo Fernando Collor e diversos sindicalistas formados pelo ICT (Instituto
Cultural do Trabalho)69, instituição que se projetou durante a ditadura militar
disseminando o peleguismo nos sindicatos brasileiros.
Com uma política de filiação bastante suspeita e agressiva70, a Força Sindical
desde o início procurou se diferenciar do sindicalismo “de esquerda”, autoprocla-
mando-se “moderna, democrática, independente, apartidária e pluralista”. Seu cres-
cimento ameaçou a hegemonia da CUT em certas categorias e engrossou as fileiras
de um sindicalismo pragmático, defensor do neoliberalismo e atrelado ao governo.
No mesmo ano, em agosto de 91, entrava em sua fase terminal a primeira expe-
riência de construção de socialismo, simbolizando o fim não apenas do sistema polí-
tico-econômico da URSS, mas de todo um modelo de construção socialista, que mar-
cou a cultura política dos comunistas, socialistas, classistas e trabalhadores engajados

68
Uma das críticas das correntes contrárias a filiação a uma central mundial é que a CUT passou a depender
excessivamente dos recursos financeiros de entidades internacionais. As operações envolvendo dólares sem-
pre foram nebulosas. Há informações de que só em 1989 conseguiu aprovar no exterior quatro “projetos de
cooperação” no valor de 9,7 milhões de dólares. (Revista Debate Sindical nº8, 1991).
69
Sobre ICT ver nota 55.
70
É sabido que a Força Sindical, desde seu início, foi fartamente irrigada com liberações de recursos do Fundo
de Amparo ao Trabalhador (FAT), o que propiciou combustível para as ações de cooptação na base do velho
peliguísmo sindical.

49

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CADERNO NACIONAL DA UNIDADE CLASSISTA  POLÍTICA, ORGANIZAÇÃO E FORMAÇÃO

ao longo do século XX. Todo esse quadro seria responsável por fragilizar ainda mais a
participação e influência dos comunistas brasileiros na conjuntura política nacional.
O movimento comunista internacional entrava também em crise, diver-
sos partidos comunistas convocavam congressos extraordinários e, em muitos
casos, com pauta única: mudar ou acabar com os PCs, capitulando diante da
ofensiva da burguesia mundial e da propaganda de direita. No Brasil, em 1992,
a tentativa de um “golpe liquidacionista” no PCB é enfrentada e barrada pelo
“Movimento Nacional em Defesa do PCB”, cujo manifesto apontava:

“Queremos a renovação pela esquerda, reafirmando que o Parti-


do continua uma organização comunista. Queremos um partido
que seja um instrumento qualificado para contribuir na direção
das lutas sociais no Brasil, com inserção viva nas fábricas, no
campo, nos bancos, nos escritórios, no comércio, no movimen-
to comunitário, nas escolas secundárias, nas universidades. Um
partido educado na perspectiva da revolução social e política e
na transformação radical da sociedade brasileira, por isso pro-
fundamente vinculado ao socialismo.” 71

A ofensiva neoliberal empurrou o movimento sindical para posições cada


vez mais recuadas. Diante deste quadro adverso se gestou dentro das organi-
zações socialistas e operárias um intenso debate sobre qual deveria ser a estra-
tégia mais adequada para enfrentar a nova situação. Porém, a CUT adere um
“participacionismo ativo” que exigia a apresentação de propostas, consideradas
“realistas”, que poderiam até ser aceitas nos “fóruns tripartites”.
Até então as negociações estavam assentadas na mobilização dos traba-
lhadores e eram utilizadas para divulgar e agitar a plataforma da CUT. Dois
grandes exemplos desta “nova linha” foram as negociações realizadas durante o
governo Collor e durante o governo FHC.
Também, na mesma época, surge a proposta de ‘contrato coletivo’. “Nesse
campo, a direção da CUT fez sérias concessões à ideologia neoliberal já hegemônica
na sociedade brasileira. Em 1990, Meneghelli, ao defender o seu modelo de contrato

71
F.D.R., 2014.

50

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PARTE 2  TEXTOS DE FORMAÇÃO

coletivo, chegou a afirmar que ‘não se deveria ter discutido a redução da jornada
de trabalho na Constituição. Deveria se discutir sim, entre as partes, entre o capi-
tal e o trabalho. A única constituição detalhista que existe no mundo é a nossa’.” 72
Tal visão desarmava os trabalhadores na sua luta em defesa dos direitos sociais
e trabalhistas presentes na Constituição, uma vez que estavam ameaçados pelas pro-
postas de reformas constitucionais de cunho neoliberal, apresentadas pelo governo.
“A chamada livre contratação coletiva seria ‘a forma de ação sindical mais
propensa a se adaptar ao neoliberalismo [...] [Ela] faz apelo à ideologia do con-
trato entre partes supostamente livres e iguais, fragmenta o coletivo de classe
em setores, é refratária à regulamentação estatal’. Ao contrário, ‘o sindicalismo
que busca a unificação da luta reivindicativa dos trabalhadores assalariados em
torno da defesa da implantação e ampliação de direitos sociais e trabalhistas [...]
é, em princípio, antagônico à ideologia e à política neoliberal’.”73
Grande parte dos líderes sindicais, vão incorporando em seus discursos
teses neoliberais: a abertura comercial “inevitável”, o “inevitável” enxugamento
das empresas como condição para manter a “competitividade” no mercado in-
ternacional. Tratava-se agora só de negociar para que estas medidas “inevitáveis”
atingissem menos os trabalhadores. O Sindicato dos Metalúrgicos de São Ber-
nardo defendeu a importação de equipamentos destinados à “modernização” das
montadoras às custas do emprego de seus operários. Também defendeu (como
ainda hoje faz) a redução de impostos das montadoras, exigindo a renúncia fiscal
desse setor do grande capital monopolista. Passam a defender as teses apresenta-
das pela câmara setorial, as mesmas que sustentam a política fiscal neoliberal.74
A transição75 de “um sindicalismo de oposição para um sindicalismo de
participação” não se deu por completa (ao menos ainda na década de 90), visto
que se aguçavam as contradições, e o crescimento do movimento popular, a

72
Revista Sociologia Política, nº13,1999.
73
Idem.
74
Idem.
75
“O mesmo fenômeno se operou nas centrais sindicais internacionais mais próximas da Articulação Sindical. ‘A
CFDT, central sindical francesa de origem católica e próxima do Partido Socialista, adotou na década de 1980 uma
linha mais moderada [...] Segundo a nova linha da CFDT, o sindicalismo não poderia apenas denunciar o patrona-
to, mas deveria também reconhecer a legitimidade do empresário e apresentar propostas às empresas. Orientada
por essa concepção conciliadora e propositiva [...] passou a fazer crítica à noção de luta de classes, às ‘ações cen-
tralizadas’ – as greves gerais e passeatas de protesto [...] Seu discurso passou a valorizar as reivindicações realistas,
[...] a ‘livre contratação na base’ [...] e o ‘fortalecimento da sociedade civil’.” (Revista Sociologia Política, nº13, 1999).

51

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CADERNO NACIONAL DA UNIDADE CLASSISTA  POLÍTICA, ORGANIZAÇÃO E FORMAÇÃO

exemplo do MST, acabou contribuindo para reavivar as posições mais críticas,


dentre as quais a dos comunistas, no interior da CUT, levando a central a assu-
mir posições abertamente contrárias às políticas liberalizantes.
Em 1995 e 1996, o processo de reconstrução revolucionária do PCB ratificava
a estratégia socialista da Revolução brasileira, conclamando a retomada do interna-
cionalismo proletário, a reconstrução da unidade na luta dos trabalhadores, e orien-
tando a “retomada do trabalho nos movimentos organizados dos trabalhadores, dos
estudantes e nas comunidades”, indicando “a necessidade de dedicação à luta direta
das massas contra as políticas neoliberais, incluindo nela a participação dos desem-
pregados, dos trabalhadores precarizados e daqueles que se situavam à margem do
processo produtivo (os ‘excluídos’) na construção do movimento revolucionário.”76
Os avanços das lutas apontavam para um maior acirramento dos conflitos
de classe, e as forças políticas de esquerda que se opunham ao neoliberalismo
ensaiaram a retomada nas mobilizações de massa.
Ponto alto desta nova fase de resistência foi a manifestação de 17 de abril de
1997, a chamada “Marcha dos 100 Mil” (que levou 70 mil a Brasília), onde con-
vergiram as várias campanhas e frentes de luta: foi o dia de entrega das milhões de
assinaturas colhidas pela campanha “Contra a Privatização da Companhia Vale do
Rio Doce (CVRD)”; foi dia da chegada da memorável marcha do MST, que per-
correu 3 mil quilômetros com cerca de 2 mil participantes; foi o dia de lutas uni-
ficado o movimento sindical combativo contra o neoliberalismo, dentre outros.
O ato em Brasília foi o maior protesto contra as políticas neoliberais realizado
durante os anos 90. Ela serviu de coroamento, via movimento de massas, do processo
de maior unidade dos setores de oposição. A CUT, MST e outras entidades popula-
res passaram até cogitar a convocação de uma greve geral para o segundo semestre.
Mas os avanços, ainda não significavam que a luta dos trabalhadores já havia
superado a fase de defensiva, uma inversão na correlação de forças. Tanto foi que,
o governo FHC, a exemplo do neoliberalismo no mundo, continuou sua ofensiva.
Com a aprovação da reeleição, FHC radicalizou suas iniciativas de retro-
cesso na área social (reajuste do salário mínimo abaixo da inflação, reformas
administrativa e da previdência77 e contrato temporário), de aviltamento da so-

76
F.D.R., 2014.
77
Vale lembrar o triste episódio da reforma da previdência: Na ocasião, o setor majoritário da CUT, a Articu-
lação, apostou todas as suas fichas no famigerado acordo com o governo FHC.

52

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PARTE 2  TEXTOS DE FORMAÇÃO

berania (privatização da CVRD) e de ataques à democracia (restrições ao Judi-


ciário, desqualificação de setores e personalidades oposicionistas). Com a sub-
missão descarada do Legislativo, sem cortar artigos constitucionais, o governo
procurou mexer na legislação trabalhista:

PRINCIPAIS PROPOSTAS SOBRE A LEGISLAÇÃO


TRABALHISTA NO CONGRESSO NACIONAL (1995 - 2000)

NORMA TIPO DE INICIATIVA SÍNTESE DO CONTEÚDO DA NORMA

Lei 9.601/98 Projeto de Lei de iniciativa Flexibiliza o uso do contrato de trabalho


do Poder Executivo por prazo determinado, e também flexibiliza as
jornadas de trabalho, criando bancos de horas.

MP 1539 Medida provisória, Regulamenta o dispositivo constitucional


editada pelo que prevê a participação dos trabalhadores
Poder Executivo nos lucros e resultados das empresas.

MP 1709 Medida provisória, Permite a contratação por trabalho parcial


editada pelo de até 25 horas semanais, reduzindo-se
Poder Executivo proporcionalmente o salário.

MP 1726 Medida provisória, Permite a suspensão temporária dos contratos


editada pelo de trabalho, prazo durante o qual o trabalhador
Poder Executivo fará cursos de capacitação e será remunerado
pelo Fundo de Amparo ao Trabalhador.

PL 3.003/97 Projeto de Lei de iniciativa Extingue o imposto sindical compulsório


do Poder Executivo e regulamenta a contribuição confederativa.

PEC 623/98 Proposta de Emenda Determina o fim da unicidade sindical,


Constitucional a extinção do imposto sindical compulsório e o fim
do Poder Executivo do poder normativo da Justiça do Trabalho.

PEC 24/99 Proposta de Emenda Extingue a figura do juiz classista na Justiça do


Constitucional Trabalho.

Projeto de Lei Projeto de Lei de iniciativa Cria Comissões de Conciliação Prévia


4.694/98 do Poder Executivo nos locais de trabalho.

Projeto de Lei Projeto de Lei de iniciativa Dispõe sobre o procedimento sumaríssimo


4.693/98 do Poder Executivo no processo trabalhista, para dissídios individuais cujo
valor não exceda quarenta vezes o salário mínimo
vigente na data do ajuizamento da reclamação.
Fonte: http://lasa.international.pitt.edu/Lasa2000/VonBulow

53

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CADERNO NACIONAL DA UNIDADE CLASSISTA  POLÍTICA, ORGANIZAÇÃO E FORMAÇÃO

Nos seus oito anos de mandato, FHC foi responsável por uma brutal re-
gressão nas relações de trabalho, provocou os maiores estragos em toda história
da vida republicana. O desemprego bateu recordes (ver gráfico abaixo), entre
“1995 e 2000, o volume de desempregados cresceu 155,5%, com a incorporação
de 7 milhões de novos desempregados (de 4,5 para 11,5 milhões de pessoas)”78,
os salários foram corroídos79, avolumou-se a chaga da informalidade e houve
um feroz ataque à legislação trabalhista.

DESEMPREGO - TAXA MÉDIA ANUAL (%)


EVOLUÇÃO 1985-2003

Fonte: brasilfatosedados.wordpress.com

Num cenário de brutal desemprego, os sindicatos não tiveram força para


garantir a manutenção — e, muito menos, a elevação — do poder aquisitivo.
Vingou a “livre negociação” entre a forca e o enforcado!
O estudo do Dieese é taxativo: “A renda do trabalho não acompanhou, ao
longo desse período, os ganhos de produtividade da economia. Nem mesmo

78
Revista Debate Sindical nº 44, 2002.
79
Ainda como ministro da Fazenda de Itamar Franco, FHC apresentou um projeto pondo fim a política sa-
larial vigente há 30 anos, que garantia a indexação dos salários. Sem esta legislação de proteção, a renda dos
assalariados ficou a mercê da dinâmica do mercado.

54

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PARTE 2  TEXTOS DE FORMAÇÃO

manteve o poder de compra dos que vivem de salários. Ao contrário, apesar


de alguns momentos de recuperação, o saldo do período é de diminuição do
poder aquisitivo de todos os que têm no trabalho sua fonte de renda. O salário
mínimo, importante instrumento distributivo e de regulação do mercado de
trabalho, atingiu os mais baixos patamares de sua história”.80

EVOLUÇÃO DO SALÁRIO MÍNIMO (EM R$)


EM VALORES DE 2011 (CORRIGIDOS PELA INFLAÇÃO)

Fonte: Estudo DIEESE 70 anos do salário mínimo/Arte G1

Por sua vez, o PCB, em março de 2005, no seu XIII Congresso, rompe defi-
nitivamente com as ilusões acerca de alianças com setores progressistas de uma
pretensa “burguesia nacional”, afirmando categoricamente o caráter classista
da sua linha política. Em janeiro de 2006, realiza Conferência Sindical Nacio-
nal em Praia Grande (Santos-SP), onde anuncia o rompimento de sua partici-
pação nos fóruns da CUT, por entender que esta entidade tornara-se um braço

80
Revista Debate Sindical nº 44, 2002.

55

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CADERNO NACIONAL DA UNIDADE CLASSISTA  POLÍTICA, ORGANIZAÇÃO E FORMAÇÃO

governamental, passando a promover ampla retenção dos conflitos de classe.81


A partir daí, os comunistas da Unidade Classista/ PCB, passam a dedicar-
se à construção da Intersindical – instrumento de organização e luta da classe
trabalhadora – propondo o debate com o movimento sindical de corte classista
e com os setores combativos do sindicalismo brasileiro, sobre os desafios coloca-
dos na perspectiva da constituição de um Bloco Revolucionário do Proletariado,
organizador da revolução brasileira. A construção do Bloco está ligada ao pro-
cesso de afirmação da hegemonia proletária no interior da sociedade brasileira.
Mesmo a crise econômica internacional, em 2008, não tendo ainda atin-
gido o Brasil no mesmo nível das economias centrais, os ataques aos trabalha-
dores não foram menores. As demissões, a alta rotatividade da força de trabalho
como forma de reduzir salários e direitos, as terceirizações e as mudanças na
legislação trabalhista continuaram a se aprofundar, com os argumentos oportu-
nistas de que são medidas “necessárias para fazer frente e defender a economia
brasileira da crise internacional”.
Neste cenário de ataques aos direitos o movimento sindical se mostrava
muito dividido e fragmentado. Vale lembrar que no dia 31 de março de 2008,
foi publicada em edição extraordinária do Diário Oficial da União a Lei nº
11.648/200882, que reconhecia formalmente as centrais sindicais e traçava, em
linhas gerais, suas atribuições e seu financiamento. Entretanto, este quadro, era
resultado da dinâmica do movimento sindical brasileiro nas últimas três déca-
das. Vejamos ao lado um resumo83 desta movimentação:

81
Neste período, do bojo da CUT surgiram duas experiências organizativas dos trabalhadores no país: a Inter-
sindical e a Conlutas: A Intersindical foi fundada pelos setores que romperam com a CUT no seu 9º Congresso
Nacional, em 2006, com intuito de atuar como um instrumento de organização e luta dos trabalhadores. Parti-
ciparam de sua fundação a Unidade Classista/PCB, a ASS e algumas correntes do PSOL. A Conlutas foi fundada
majoritariamente pelo PSTU e algumas outras correntes do PSOL. (http://csunidadeclassista.blogspot.com.br/se-
arch?updated-min=2010-01-01T00:00:00-08:00&updated-max=2011-01-01T00:00:00-08:00&max-results=50)
82
Projeto de Lei da Câmara nº 88, de 2007 (nº 1.990, de 2007, na Casa de origem) dispõe sobre o reconhe-
cimento formal das centrais sindicais para os fins que especifica, altera a Consolidação das Leis do Trabalho
- CLT, aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943, e dá outras providências.
83
O resumo reflete apenas as entidades registadas no Ministério do Trabalho e Emprego (TEM), o que não é
o caso da Intersindical, de Conlutas e outras correntes e organizações de trabalhadores.

56

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PARTE 2  TEXTOS DE FORMAÇÃO

ANO EVENTO FORÇAS POLÍTICAS

1983 Fundação da Central Única Uma parte do movimento que realizou a Conclat
dos Trabalhadores (CUT). funda a Central Única dos Trabalhadores (CUT), em 1983.
A CUT Foi liderada por sindicalistas ligados ao PT.

1986 Fundação da Central Geral A CGT foi fundada pelos setores sindicalismo tradicional
dos Trabalhadores (CGT) e sindicalistas ligados ao PCB, PCdoB, MR8 tendo como base
um programa de defesa da unidade sindical e de ação.

1991 Fundação da Força Sindical (FS) Fundada por representantes do sindicalismo de resultado,
defendendo livre negociação e as políticas neoliberais.

1995 Fundação da Central Autônoma A CAT foi fundada com o propósito de se


dos Trabalhadores (CAT) ser uma representação da CLAT e CMT no Brasil.

1997 Fundação da Social Fundada basicamente por sindicalistas dissidentes da FS.


Democracia Sindical (SDS)

2005 Fundação da Nova Deu-se pelo chamado de algumas Confederações


Central Sindical dos de trabalhadores, sendo a Confederação Nacional dos
Trabalhadores (NCST) Trabalhadores da Indústria (CNTI), a principal expoente.

2006 Central Geral Refundada por sindicalistas do MR8 (atual Partido Pátria Livre)
dos Trabalhadores que reivindicavam a CGT (Central) que se fundem com a Central Brasileira
do Brasil (CGTB) dos Trabalhadores e Empreendedores (CBTE), mantendo a sigla.

2007 Fundação da União Geral Formada pela unificação Confederação Geral dos Trabalhadores (CGT),
dos Trabalhadores (UGT) Social Democracia Sindical (SDS), Central Autônoma
de Trabalhadores (CAT) e um grupo de sindicatos independentes.

Fundação da Central Fundadas por sindicalistas do PCdoB, do PSB,


dos Trabalhadores e algumas FETAG’s (Federação de Trabalhadores
Trabalhadoras do Brasil (CTB) na Agricultura) e sindicatos independentes.

2008 Central dos Sindicatos Formada por sindicalistas ligados


Brasileiros (CSB) ao PMDB, PDT, PSB e profissionais liberais.
Fonte: Elaborada com dados coletados do DIAP e do Sirt/MTE

A grosso modo, tínhamos, de um lado um campo abertamente governista,


formado por centrais sindicais pelegas e neopelegas (CUT, Força Sindical, UGT,
CTB e NCST), cuja lealdade ao governo estava fortemente assentada na repartição
do imposto sindical para as centrais, as “legalmente reconhecidas” pelo Estado. Es-
tas centrais, durante a crise, foram cúmplices e participantes ativas dos ataques pro-
movidos pelo capital contra os trabalhadores, ao assinarem acordos que rebaixavam
direitos, como salários, em nome da manutenção dos empregos. Em termos quan-
titativos este campo constituía ampla maioria do movimento sindical brasileiro.
De outro lado, um campo antigovernista formado pela Intersindical, pela
Conlutas, e por organizações sindicais independentes, que munidos de uma

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CADERNO NACIONAL DA UNIDADE CLASSISTA  POLÍTICA, ORGANIZAÇÃO E FORMAÇÃO

concepção classista e combativa, que buscavam fazer o enfrentamento aos ata-


ques perpetrados pelo capital e seu governo de plantão, e reorganizar o movi-
mento da classe. Setor claramente minoritário do sindicalismo brasileiro.
Ainda no ano 2008, no II Encontro Nacional da Intersindical, em São Pau-
lo, após um profundo debate sobre a pertinência ou não de se criar uma Central
Sindical naquele momento, precipitou-se uma fissura tendo como questão cen-
tral a continuidade da Intersindical ou a unificação com a Conlutas. Correntes
do PSOL optaram pela unificação com a Conlutas, o que redundou na convoca-
ção de um Congresso, para junho do mesmo ano, na cidade de Santos.
O Congresso de Santos teve como resultado principal a unificação de corren-
tes do PSOL que se reivindicavam Intersindical com a Conlutas, e com a retirada
dessas correntes, juntamente com a Unidos pra Lutar e o Movimento Avançando
Sindical (MAS). O fracasso nas tentativas de unificação tinham causas que ultra-
passavam o Congresso, e evidenciavam as contradições na concepção de uma Cen-
tral Classista, da metodologia de sua construção e de condução do processo em si.
A Unidade Classista, a ASS e independentes optaram por reforçar a Inter-
sindical como instrumento de organização e luta dos trabalhadores. Particular-
mente a UC se contrapôs à concepção de central sindical e popular defendida
pela Conlutas, pela necessidade de uma organização que pudesse disputar a
intervenção dos trabalhadores enquanto classe, no centro das relações de ex-
ploração, no centro da contradição capital-trabalho. Dizíamos:

“O maior patrimônio do movimento operário é a sua unidade.


Mas essa unidade não pode ser construída burocraticamente.
Promover essa unidade de ação é responsabilidade dos setores
que se reivindicam de vanguarda. Nós da UC estamos dispostos
a participar de todas as discussões necessárias à construção da
unidade de ação e de programa capazes de nortear o caminho
para a efetiva criação da Central Sindical Classista, uma central
autônoma frente ao governo e ao patronato, que tenha centro
nas organizações sindicais da classe trabalhadora. A construção
dessa central não pode ser fundada por mero ato de vontade.
Sua concepção tem que ser debatida a fundo entre as organiza-
ções da classe e não pode se submeter apenas às disputas entre
partidos e correntes. A Central surgirá como uma construção

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PARTE 2  TEXTOS DE FORMAÇÃO

da luta dos trabalhadores em nosso país, juntamente com a sua


vanguarda, organizada na unidade de ação.”84

O III Encontro Nacional da Intersindical ocorreu nos dias 13, 14 e 15 de


novembro de 2010, em Campinas. Participaram cerca de 500 delegados, de 20
estados, representando mais de 60 ramos de atividade. Os participantes debate-
ram a conjuntura nacional, a reorganização do movimento dos trabalhadores e
um plano de ação para o próximo período.
A Unidade Classista expôs sua posição política em todas as mesas. Fizeram
pronunciamentos, também, a ASS, a Consulta Popular e a Resistência Popular. Os
grupos de discussão dos ramos de atividade se dividiram em metalúrgicos, servido-
res públicos, químicos, urbanitários, construção civil, vestuário e calçados, vigilantes
e trabalhadores em comunicação. Houve, ainda, reunião de professores com vistas
ao congresso da Confederação Nacional dos trabalhadores em Educação (CNTE).
Como prioridade ação, já para o primeiro trimestre de 2011, decidiu-se tomar
a iniciativa de propor junto a outras organizações do movimento sindical e popular
dispostas a lutar, a organização de um “Dia Nacional de Lutas”, com o objetivo de
alavancar um processo das intensas mobilizações contra os ataques que iriam se in-
tensificar no próximo período. O III Encontro também ressaltou a necessidade da
unidade de ação entre todas as organizações do campo de oposição ao capital e ao
governo, como pressuposto para a futura unificação orgânica da classe trabalhadora.85
Conforme diagnosticado no III Encontro da Intersindical, os reflexos da
crise econômica mundial teriam um impacto direto nas lutas do ano vindouro.
Afirmávamos que “a dívida que o Estado na Europa tenta colocar na conta dos
trabalhadores logo chegará ao Brasil. Reformas, arrocho, maior intensificação
dos ritmos de trabalho são as propostas dos patrões com o apoio dos governos
que nos esperam em 2011.”86
De fato, estudo do DIEESE87, divulgado em 29/11/2012, nos confirmou o
que presenciávamos nas lutas: o número de greves no Brasil em 2011 chegou a

84
http://csunidadeclassista.blogspot.com.br/search?updatedmin=2010-01=01-00T00:00:08-00:&updated-max-
2011-01-01T00:00:00-08:00&max-results=50
85
http://csunidadeclassista.blogspot.com.br/2010/11/intersindical-realiza-existoso-encontro.html
86
http://csunidadeclassista.blogspot.com.br/2010/11/seguir-ampliando-intersindical.html
87
http://www.dieese.org.br/balancodasgreves/2011/estPesq63balGreves2010_2011

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CADERNO NACIONAL DA UNIDADE CLASSISTA  POLÍTICA, ORGANIZAÇÃO E FORMAÇÃO

554, crescimento de 24% sobre o ano anterior (446), era o maior número desde
1997 (631). O número de trabalhadores envolvidos atingiu aproximadamente
1,6 milhão em 2010 e 2 milhões em 2011. Tomando 1997 e 2011 como referên-
cias, o Dieese afirma que esses dois períodos “delimitam um intervalo de 15
anos marcado pela relativa estabilidade do número de greves em baixo patamar”.
Em 2011, a maioria das greves (58,7%) ocorreu no setor público – 60,3%
no ano anterior. Foram 325 paralisações, sendo 145 (26,2%) no funcionalismo
estadual, 109 (19,7%) no municipal e 33% (6%) no federal. As estatais tiveram
29 movimentos (5,2%). Das 227 greves no setor privado, 41% do total (39,5% em
2010), 131 (23,6%) foram feitas na indústria e 91 (16,4%) no comércio. Um dos
destaques, acrescenta o instituto, foram as greves dos trabalhadores na construção
civil, “especialmente nas grandes obras de infraestrutura e na região Nordeste”.88
No campo do sindicalismo classista consolidou-se uma divisão, fruto das
contradições do Congresso de Santos em 2008 (com reflexos ainda hoje), no to-
cante às concepções distintas sobre a construção e o papel de uma Central Clas-
sista. Passaram a existir duas Intersindicais: além da Intersindical – Instrumen-
to de Organização e de Luta dos Trabalhadores (UC + ASS + Independentes),
passou a existir a Intersindical – Central da Classe Trabalhadora89 (Correntes
do PSOL que não aderiram a Conlutas + MAS + Independentes).
A situação instalada gerou dificuldades ainda maiores para a construção
da uma unidade de ação entre o sindicalismo combativo, pois na prática, as
disputas pelas estruturas sindicais na base, criam arestas e animosidades, colo-
cando em 2º plano a construção unitária da luta.
A Unidade Classista, que até aquele momento atuava na construção da Intersin-
dical – Instrumento de Organização Luta dos Trabalhadores, viu-se diante do desafio
de aprofundar seu papel de força política unificadora de um campo sindical classis-
ta e de enfrentamento ao capitalismo. Para tanto, entendeu ser, no momento, neces-
sário que a UC ganhasse musculatura e passasse a ser uma corrente do movimento
sindical e operário em condições de maior protagonismo na cena sindical nacional.
É com este intuito que o Comitê Central do PCB, reunido em São Paulo, em
10 de junho de 2012, decide pelo realinhamento de nossa tática na frente sindical

88
Idem.
89
Com intuito de buscar um reconhecimento formal junto ao MTE, em março de 2014, é realizado na cidade
de São Paulo um Congresso Nacional que marca sua fundação oficial.

60

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PARTE 2  TEXTOS DE FORMAÇÃO

e resolve: “formalizar, institucionalizar e fortalecer nossa corrente sindical Uni-


dade Classista; tornar a Unidade Classista independente em relação a qualquer
articulação intersindical hoje existente; e tratar as duas atuais Intersindicais como
parceiras nas mesmas condições, sem vínculos orgânicos com qualquer delas, in-
teragindo também com outras correntes classistas com vistas à unidade de ação.”90
Dando consequência prática ao realinhamento sindical, os comunistas
da Unidade Classista realizaram em novembro de 2012 no Rio de Janeiro, um
Congresso de fundacional da UC, com intuito de dar ciência de nossa “nova
fase” ao movimento sindical em geral, e de reunir os militantes sindicalistas
para reorientá-los sobre a nova tática para a construção na frente sindical.

90
http://pcb.org.br/portal2/2990

61

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CADERNO NACIONAL DA UNIDADE CLASSISTA  POLÍTICA, ORGANIZAÇÃO E FORMAÇÃO

Referências Bibliograficas:

 MARX, Karl. & Engels, Friedrich. “Crítica ao Programa de Gotha”,


in: Obras Escolhidas, Vol. 2, Ed. Alfa-Ômega, 1986, São Paulo.
 CARONE, Edgard. “A II Internacional – Pelos seus congressos (1889-1914)”,
Ed. Edusp, 1993, São Paulo.
 CARONE, Edgard. “A Segunda República”, Ed. DIFEL, 1974, São Paulo.
 COSTA, Edmilson. “A política Salarial no Brasil (1964 – 1985)”,
Ed. Boitempo, 1997, São Paulo.
 KOVAL, Boris. “História do Proletariado Brasileiro -1857 a 1967”,
Ed. Alfa- Ômega, 1982, São Paulo.
 SEGATTO, José Antonio. “Breve História do PCB”,
Ed. LECH Ltda., 1981, São Paulo.
 LOSOVSKI, A. “Marx e os Sindicatos - O Marxismo Revolucionário
e o Movimento Sindical”, Ed. Anita Garibaldi, 1989, São Paulo.
 LENIN, V.I. “O trabalho do partido entre as massas”,
Ed. LECH Ltda., 1979, São Paulo.
 LENIN, V. I. “Obras Escolhidas” - Vol. 3,
Ed. Alfa-Ômega, 1980, São Paulo.
 PCB Uma história de Luta, 1980-2013,
Fundação Dinarco Reis (FDR), Rio de Janeiro, 2014.
 PERREIRA, Astrojildo. “Formação do PCB
(Partido Comunista Brasileiro) 1922-1928”, Ed. Prelo, 1976, Lisboa.
 PRESTES, Anita Leocádia. “A que herança os comunistas devem renunciar?”,
Ed. Oitenta, 1980, Porto Alegre.
 www.csunidadeclassista.blogspot.com.br
 www.diap.org.br
 www.dieese.org.br
 www.pcb.org.br

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2
O quadro atual do
sindicalismo mundial

E m outubro de 2015, no simpósio de 70 anos da Federação Sindical Mun-


dial, realizado em São Paulo, a Unidade Classista deu um passo à frente
em sua participação nas relações sindicais internacionais e deu início ao
processo de filiação à FSM. Sem querer simplificar a descrição atual do movi-
mento sindical no mundo, grosso modo, ou o sindicalismo é de confronto com
o capitalismo ou é de colaboração de classes. Esta segunda opção, atualmente,
hegemoniza o movimento sindical e subdivide-se basicamente duas vertentes.
Uma de clara parceria política e ideológica com o capitalismo, como um
braço sindical do neoliberalismo, a serviço da preservação da ordem vigente.
Em sintonia com o capital globalizado, submete sua estrutura e sua base ao
ideário patronal. É o chamado “sindicalismo de resultados”.
A outra vertente é um sindicalismo de perfil socialdemocrata. O chamado
“sindicato cidadão” traz no seu discurso um apelo à negociação, às câmaras
setoriais, estimula o diálogo em fóruns apropriados aos programas econômicos
para gerir o capital. Tem a intenção de manter o capitalismo intocável, concla-
ma uma espécie de modernização e, para tal fim, prescinde da mobilização.
Visa acomodar-se dentro da ordem política dominante.
Já o movimento sindical classista e de combate ao capitalismo, embora
venha crescendo, ainda se encontra exíguo na atual quadra de rebaixamento
das perspectivas da classe trabalhadora, que ainda se encontra anestesiada pelo
neoliberalismo. E a hegemonia do sindicalismo de colaboração de classes refle-
te uma arquitetura internacional do sindicalismo.
Em novembro de 2006, na Áustria, foi criada a Confederação Sindical In-
ternacional. A CSI é fruto da fusão de duas antigas confederações mundiais: a
Confederação Internacional das Organizações Sindicais Livres (Ciosl), que já
representava o casamento da socialdemocracia europeia com o tradeunionismo
dos EUA, e a democrata cristã Confederação Mundial do Trabalho (CMT).
Criada em 1949, a Ciosl nasceu no bojo da guerra fria para domesticar a
luta de classes. O seu estatuto pregava “o combate ao comunismo”. Após dividir

63

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CADERNO NACIONAL DA UNIDADE CLASSISTA  POLÍTICA, ORGANIZAÇÃO E FORMAÇÃO

a Federação Sindical Mundial, central unitária fundada em 1945, ela cumpriu


um papel histórico desprezível: apoiou o cerco capitalista ao bloco soviético e a
Cuba, foi cúmplice de guerras imperialistas na Coréia e no Vietnã, estimulou e
financiou os golpes no Brasil, Chile, Argentina. Já a CMT, originária da Confe-
deração dos Sindicatos Cristãos (CISC), criada em 1920 com apoio do Vaticano
e dos partidos democratas cristãos, sempre teve menor expressão no sindicalis-
mo e nunca se dispôs a discutir qualquer unidade orgânica.
Com o fim do bloco socialista e da bipolaridade entre URSS e EUA, a
Ciosl teve visível crescimento das filiações, tornando-se a maior central mun-
dial. Já a CMT se manteve estagnada e a Federação Sindical Mundial (FSM)
sofreu o golpe da dissolução do bloco soviético e com suas próprias limita-
ções. O anticomunismo, tão funcional para a sobrevivência da Ciosl no pas-
sado, deixou de ser a sua principal bandeira.
Em 2002, a Ciosl defendeu a ação da Confederação dos Trabalhadores da
Venezuela (CTV) que se somou ao patronato e ao governo Bush na tentativa
frustrada de golpe contra o presidente Hugo Chávez. Já em abril de 2003, enviou
à OIT uma queixa formal contra o governo de Cuba por “violações da liberdade
sindical”. A mentirosa queixa foi prontamente rechaçada pela Central dos Tra-
balhadores de Cuba (CTC).
O programa aprovado no congresso de fundação da CSI reafirma a ve-
lha intenção de “humanizar” a globalização, de priorizar a atuação em órgãos
multilaterais – como o FMI, BM e OMC – e de reforçar a negociação tripartite
entre o capital, governos e trabalhadores. O programa prega abertamente o “de-
senvolvimento de um novo modelo de globalização”, e a “democratização dos
órgãos financeiros mundiais”, visando que estes reconheçam “a primazia dos
direitos humanos sobre as regras econômicas”.
A CSI (na prática, uma nova fase de consolidação do reformismo sindical)
tem como atual presidente, eleito em maio de 2014, João Antonio Felício, ex
-presidente da CUT. No Brasil, além da CUT, a Força Sindical, a UGT e a NCST
também são filiadas a CSI.
Nossa perspectiva histórica de um movimento sindical classista e anti-impe-
rialista nos coloca, portanto, nas fileiras da FSM, legítima herdeira da “Internacional
Sindical Vermelha”. Este é o único campo de organização internacional dos trabalha-
dores que condiz com a linha política que deu origem e norteia a Unidade Classista.
A Federação Sindical Mundial foi fundada em Paris, em 3 de outubro de

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PARTE 2  TEXTOS DE FORMAÇÃO

1945. É a organização sindical internacional mais antiga em funcionamento. A


FSM detém o status consultivo no âmbito da Organização Internacional do Tra-
balho e desempenhou um papel crucial para o estabelecimento da Convenção
87. Tem uma Representação Permanente na Organização nas Nações Unidas,
em Nova Iorque, na FAO, em Roma e na UNESCO, em Paris.
Segue a linha do movimento sindical classista, lutando contra o capital e
o imperialismo, por uma sociedade sem exploração do homem pelo homem.
Atualmente congrega noventa milhões de membros distribuídos em 126 países.
De 1945 a 1953 a sede da FSM esteve em Paris, França. Em 1953-1956,
em Viena, Áustria. Em 1956-2005, a FSM se estabeleceu em Praga, República
Tcheca. Desde janeiro de 2006, a sede da FSM encontra-se em Atenas, Grécia.
Durante a sua trajetória, a FSM teve um papel central nas lutas contra o
apartheid e o racismo, lutou contra o colonialismo, contra a política do governo
dos EUA, a OTAN, Israel e seus aliados; contra a barbárie do capitalismo. Esteve
à frente na conquista de todos os direitos trabalhistas e sindicais.
A ação da FSM é rica em nível central, regional e setorial. Tem como ob-
jetivo unir as forças da classe trabalhadora na luta de classes; para unir os traba-
lhadores, sem importar a sua ideologia, religião, língua, gênero; unir as pessoas
simples na luta contra a exploração capitalista e contra o imperialismo.
A FSM é guiada pelos seguintes princípios básicos, os quais compartilhamos:

 FUNCIONAMENTO DEMOCRÁTICO -
eleições para todos os órgãos, em todos os níveis.

 ORIENTAÇÃO INTERNACIONALISTA.

 LUTAR PELA PAZ E A AMIZADE ENTRE OS POVOS -


contra as guerras imperialistas.

 DEFENDER O DIREITO DE CADA POVO,


de cada classe trabalhadora de decidir por si mesmos,
sobre o seu presente e futuro.

 OS RECURSOS NATURAIS de cada país pertencem ao povo


e aos trabalhadores do país. A FSM opõe-se à privatização.

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CADERNO NACIONAL DA UNIDADE CLASSISTA  POLÍTICA, ORGANIZAÇÃO E FORMAÇÃO

 UNIDADE DA CLASSE TRABALHADORA – Aliança


social com os camponeses pobres, os trabalhadores por
conta própria, os intelectuais, as populações indígenas.

 ENVOLVER OS JOVENS, AS MULHERES


E OS TRABALHADORES migrantes na vida,
ação e administração dos sindicatos.

 PRIORIDADE AOS TEMAS de seguridade e saúde para os


trabalhadores, a qualidade de vida e o entorno em geral.

 PROMOVER A LUTA contra as empresas transnacionais,


a organização internacional e a solidariedade
da classe trabalhadora.

 DIREITO DE TODOS OS TRABALHADORES


à saúde, à educação e à seguridade social, públicas e gratuitas.
A melhoria contínua dos padrões de vida, salários e pensões,
seguindo as conquistas científicas e o progresso técnico.

 A FSM, SENDO UMA ORGANIZAÇÃO


SINDICAL CLASSISTA, reforça a crítica, a autocrítica
e a camaradagem entre dirigentes e afiliados.

 LUTA PELAS LIBERDADES SINDICAIS


E DEMOCRÁTICAS, contra a violência de Estado,
o autoritarismo e a perseguição a sindicalistas.
Contra o neofascismo e o racismo.

 DEFENDE O DIREITO à greve e todos os direitos sindicais.

 COMBATE O ARRIVISMO, O ELITISMO,


a manipulação e a corrupção das consciências.

 ORGANIZA SEMINÁRIOS E FORMAÇÃO SINDICAIS.

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CADERNO NACIONAL DA UNIDADE CLASSISTA  POLÍTICA, ORGANIZAÇÃO E FORMAÇÃO

Coordenação Nacional
Alcides Junior (PE), Caio Andrade (RJ), Cássio Canhoto (SP),
Emerson Carvalho (MG), Giovanni Frizzo (RS), José Rodrigues (PI),
Marta Jane (GO), Roberto (CE), Rockeiro (SP)

CONTATOS

Sudeste
Caio – (21) 97673-2097
Emerson – (32) 99107-7222
Rockeiro – (11) 98675-5975

Sul
Giovanni – (51) 99728-1121

Nordeste
Roberto – (85) 99674-0247

Centro Oeste
Marta – (62) 99627-5780

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