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CARREIRA DOCENTE

NO ENSINO ARTÍSTICO
ESPECIALIZADO
ÁREA DA MÚSICA
Que Regulação?

José Manuel Andrade Coutinho

Provas destinadas à obtenção do grau de Mestre em


Administração Educacional

INSTITUTO SUPERIOR DE EDUCAÇÃO E CIÊNCIAS


Abril de 2011
INSTITUTO SUPERIOR DE EDUCAÇÃO E CIÊNCIAS
Unidade Cientifico—Administração Educacional

Provas no âmbito do Segundo Ciclo de Estudos em Administração Educacional

CARREIRA DOCENTE NO ENSINO ARTÍSTICO ESPECIALIZADO—ÁREA DA MÚSICA

QUE REGULAÇÃO?

Dissertação para a obtenção do grau de mestre em Administração Educacional

Autor: José Manuel Andrade Coutinho


Orientador: Professora Doutora Cecília de Almeida Gonçalves

Abril 2011
Carreira Docente no Ensino Artístico Especializado—Área da Música
Que Regulação?

Aos meus Pais,

à Elsa,

à Inês e à Joana.

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Que Regulação?

AGRADECIMENTOS

Para além da dedicação e do esforço pessoal investidos neste trabalho, contribuíram para
que chegasse a “bom porto”, a Sandra Garcia, o João Sena, o Joaquim Pires, onde partilhamos
alguns receios e inquietudes, mas sobretudo ideias, trabalhos, mas o mais importante: a Amizade
que ficou mesmo depois de cada um partir para a sua “ilha” de investigação.

Aos Professores que me proporcionaram novos conhecimentos.

À minha família pelos momentos em que estive menos presente.

À Amiga Joana que me incentivou nos momentos em que a dúvida se instalava.

Às individualidades que aceitaram partilhar o seu conhecimento.

À Professora Ana Patrícia Almeida, pelo apoio, pelas ideias e sobretudo pela confiança que
depositou neste trabalho.

Finalmente, à Professora Doutora Cecília de Almeida Gonçalves, pela paciência,


generosidade e disponibilidade com que me orientou.

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Carreira Docente no Ensino Artístico Especializado—Área da Música
Que Regulação?

RESUMO

A presente investigação tem como objectivo estudar a carreira docente do ensino artístico
especializado público, área da música e o modo como tem sido influenciada a sua regulação,
analisando a participação dos vários grupos de intervenientes: docentes, sindicatos e Tutela.

O ponto de partida deste estudo, na perspectiva das políticas públicas em educação, foi a
“Experiência Pedagógica de 1971”, que integrou o ensino artístico (música e dança) no ensino
regular.

Posteriormente, a aplicação da legislação que criou as condições para a integração dos


professores das escola públicas de Música numa carreira docente foi analisada, nomeadamente o
Decreto-Lei nº 310/83, de 1 de Julho, (que os integrou nas carreiras docentes dos respectivos níveis
do ensino e que criou, entre outras medidas; Quadros Transitórios); o Decreto-Lei nº 234/97, de 3
de Setembro, que integrou nos Quadros de Nomeação Definitiva os professores em funções com
mais de cinco anos de serviço docente; e finalmente o Decreto-Lei nº 69/2009, de 20 de Março,
último diploma que estabeleceu o regime de concursos e a subsequente integração dos docentes nos
quadros dos estabelecimentos públicos do ensino artístico especializado da área da Música.

Através desta investigação foi possível concluir que a regulação de controlo exercida pela
Tutela tem sido predominante, tendo havido, em certas fases do processo, uma regulação conjunta
com a colaboração de docentes (designadamente através das direcções das escolas) e de um
sindicato.

A regulação autónoma por parte das escolas nesta matéria verificou-se, na maior parte dos
casos, contra a legislação vigente, mas não tendo nunca sido apresentadas, por parte dos docentes,
propostas alternativas concretas para este tipo de ensino, apesar dos seus discursos recorrentes sobre
as especificidades do ensino da música.

Palavras chave: Políticas Educativas, Regulação, Ensino Artístico Especializado de Música,


Carreira Docente.

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Carreira Docente no Ensino Artístico Especializado—Área da Música
Que Regulação?

ABSTRACT

The purpose of the present investigation is to study the specialized public artistic teaching
career, music branch, and how its regulation has been influenced, analysing the various groups of
participants: teachers, unions and tutelage.
The starting point of this study, through an educational public policies perspective, was the
analysis of the 1971 Teaching Experiment, which placed the artistic education (music and dance) in
the regular educational system.
Followed to this, the establishment of the legislation that allowed the teachers from public
music schools to integrate teaching careers was analysed, particularly the 310/ 83 Act (July 1st)
which integrated teachers on specific educational levels and created transitory staffs, among other
measures; the 234/ 97 Act (September 3rd) which regulated that teachers with more than five years
of active teaching should be integrated in Permanent Staffs; and finally the 69/ 2009 Act (March
20th) which established rules for public tender and the subsequent integration of teachers in the Staff
of public artistic schools specialized in Music education.
With this investigation I was able to conclude that tutelage regulation control has been
predominant, and in certain steps of the process, teachers and unions were able to participate in a
joint regulation (specifically through schools’ board of directors).
The schools’ self-regulation on this matter has been, for the most part, against the
established legislation. Unfortunately, teachers have never tried to change the new rules for this
specific range of education or even to present and publish them, despite their recurrent speeches on
the specifications of Music education.

Key words: Educational Policies, Regulation, Specialized Artistic Education, Teacher


Career.

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Que Regulação?

ÍNDICE

Introdução ...................................................................................................................... pág. 9


Parte I—Problemática, Enquadramento Teórico e
Metodologia da Investigação..................................................................... pág. 14
1. Políticas Educativas para o EAE no séc. XX ....................................................... pág. 14
1.1. De 1919 até à actualidade............................................................................ pág. 14
1.2. Situação actual ............................................................................................. pág. 18
2. A Regulação da Carreira Docente do EAE público área da Música desde a
Experiência Pedagógica de 1971 até ao presente ................................................ pág. 23
2.1 Noção de Regulação..................................................................................... pág. 23
2.2 Regulação e Políticas Educativas................................................................. pág. 25
2.3. A Regulação da Carreira Docente do EAE público desde a Experiência
Pedagógica de 1971 até ao presente............................................................ pág. 29
3. Metodologia da Investigação................................................................................. pág. 33
3.1. Introdução ................................................................................................... pág. 33
3.2. Fundamentação Metodológica .................................................................... pág. 34
3.2.1. Investigação Quantitativa ou Investigação Qualitativa....................... pág. 34
3.2.2. Investigação Qualitativa—Estudo de Caso......................................... pág. 36
3.2.3. Técnica de recolha de dados ............................................................... pág. 37
3.2.4. Análise dos dados................................................................................ pág. 39
3.2.5. Caracterização dos Participantes e Guiões de Entrevista.................... pág. 42
3.2.6. Guião da Entrevista aos Docentes....................................................... pág. 43
3.2.7. Guião da Entrevista ao Jurista............................................................. pág. 46
3.2.8. Guião da Entrevista ao Sindicalista .................................................... pág. 47
Parte II—Apresentação e Análise de Dados............................................................ pág. 48
1. Música/Professor do EAE – Formação Inicial e Contínua ................................ pág. 48
1.1. Formação Inicial .......................................................................................... pág. 48
1.2. Formação Contínua (EAE público).............................................................. pág. 50
2. Carreira Docente do EAE área da Música: Que Regulação?............................ pág. 52
2.1. Da “Experiência Pedagógica de 71” até à publicação do Decreto-Lei nº 234/1997,
de 3 de Setembro............................................................................................ pág. 52
2.1.1. A Experiência Pedagógica de 1971 .................................................... pág. 52

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2.1.2. O Decreto-Lei nº 310/83, de 1 de Julho.............................................. pág. 55


2.1.3. O Decreto-Lei nº 344/90, de 2 de Novembro ..................................... pág. 59
2.1.4. O Decreto-Lei nº 234/97, de 3 de Setembro ....................................... pág. 61
2.2. Situação Actual ............................................................................................ pág. 67
2.3. A Carreira Docente nas Escolas de Música do EPC.................................... pág. 69
3. Conclusões............................................................................................................... pág. 72
4. Considerações Finais.............................................................................................. pág. 78
5. Referências Bibliográficas..................................................................................... pág. 80
5.1. Fontes Internet.............................................................................................. pág. 83
6.2. Fontes (Legislação) ...................................................................................... pág. 85
7.3. Outras Fontes ............................................................................................... pág. 87
6. Siglas........................................................................................................................ pág. 88
7. Índice dos Quadros ................................................................................................ pág. 89
8. Anexos ..................................................................................................................... pág. 90
Entrevista com Jurista .......................................................................................... pág. 93
Entrevista com Docente I................................................................................... pág. 119
Entrevista com Docente II.................................................................................. pág. 127
Entrevista com Sindicalista................................................................................ pág. 136
9. Quadro das Categorias e Sub-categorias de Investigação................................ pág. 144

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“La musique nous enseigne qu’il n’existe rien qui ne contienne son parallèle ou son
contraire. Même si elle est incapable de régler le moindre problème, elle peut nous
apprendre à réfléchir. C’est une école de vie.”
Daniel Barenboïm

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INTRODUÇÃO

A Dissertação que ora se apresenta tem como finalidade estruturar uma investigação no campo
da Administração Educacional, no domínio do Ensino Artístico Especializado (EAE) área da
música, com especial enfoque na Carreira Docente (CD) e na sua regulação.

Este sub-sistema de ensino não tem tido da parte da Tutela a atenção merecida, não por falta de
legislação - que tem sido abundante - mas por falta de coerência do regulador que, ao querer
exercer essa função tutelar, o não tem feito com base em políticas educativas estruturadas, de
modo a haver uma progressão qualitativa do ensino, tanto nos aspectos pedagógicos como
administrativos.

Nos meus vinte anos de experiência como docente e nos cargos de direcção desempenhados
em escolas deste tipo de ensino tenho assistido à enumeração continuada dos problemas que
afectam o EAE, seja no ensino público ou no Ensino Particular e Cooperativo (EPC),
nomeadamente a aplicação a este ensino da legislação produzida para o ensino regular, não
atendendo às especificidades daquele, designadamente no que diz respeito aos professores/músicos
e à criação de uma carreira que seja compatível com estas duas vertentes: ensino e músico
executante.

Não havendo nos Quadros de Nomeação Definitiva (QND) das escolas públicas de música
docentes em número suficiente para o preenchimento das vagas, as escolas têm tido necessidade de
recorrer a professores contratados por anos lectivos, sem garantia de renovação do seu vínculo
contratual, preenchendo desta forma lugares de efectiva necessidade. Esta instabilidade causa
grande perturbação na continuidade da acção pedagógica, nomeadamente no que diz respeito aos
instrumentos, em que as aulas são individuais e onde cada professor estabelece uma estratégia
específica para cada aluno, que não deve estar sujeita a constantes alterações. Mesmo noutras
disciplinas, como a Formação Musical ou a História da Música, que são colectivas e com um
programa estruturado, esta instabilidade causa grande prejuízo na aprendizagem.

Carvalho refere que:

“Um dos aspectos assinalados pela maioria dos estudos diz respeito à estabilidade
profissional, sobretudo, do corpo Docente; de facto, nenhum estabelecimento de ensino pode levar a

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cabo projectos coerentes de acção, se o seu pessoal mudar constantemente ou estiver sujeito a situação
de instabilidade. Um clima de segurança e de continuidade é uma condição essencial ao desenvolvimento
organizacional das escolas” (Carvalho, 1992 e Friedman, 1991 citados por Nóvoa, 2001, p.27). “No
entanto, esta característica não deve ser confundida com uma espécie de imutabilidade, uma vez que a
existência de certas margens de mobilidade pode constituir um factor de incentivo e inovação”. (idem).

Sublinhe-se que os docentes pertencentes aos QND dos seis conservatórios públicos são,
neste momento, uma minoria em comparação com os docentes contratados. Os quadros de escola,
estão criados, assim como a respectiva regulamentação dos concursos de acesso. No entanto, estes
concursos não foram ainda realizados, talvez porque há um número considerável de docentes
contratados que ainda não realizaram profissionalização.

Como veremos mais à frente neste trabalho, esta situação é bem diferente da dos docentes
do ensino particular e cooperativo, que beneficiam da lei geral de trabalho, passando a fazer parte
do quadro de escola após o período probatório, ou seja, adquirem um vínculo laboral e uma
progressão na carreira com regras menos burocratizadas que no ensino público, assim como o
acesso a acções de formação que devem ser proporcionadas obrigatoriamente pela entidade
patronal.

Esta diferença entre a estrutura de carreira dos docentes do ensino público e do ensino
privado do EAE de música, faz com que haja uma “discriminação” negativa dos docentes do ensino
público. De facto, estes professores exercem as mesmas funções, estão sujeitos às mesmas cargas
horárias e ao cumprimento dos mesmos planos de estudo. As escolas de música privadas com
paralelismo pedagógico ou com autonomia não são alternativa ao ensino público, fazem parte da
“rede”, uma vez que as escolas públicas são seis e as privadas 941 com financiamento para o ano
lectivo 2008/2009. Assim sendo, não há uma razão objectiva para esta diferenciação na estrutura da
carreira docente.

Desde a criação do primeiro conservatório em Portugal - o Conservatório em Lisboa, por


Decreto de D. Maria II de 1835, que foi posteriormente integrado no Conservatório Geral de Arte
Dramática criado em 1836 - que os problemas se sucedem, tendo tido desde então um tratamento
menor por parte da Tutela. Almeida Garrett teve mesmo de defender o (seu) Conservatório, sempre
que os seus inimigos atacavam a instituição, chegando a proferir: “Se há defeitos na instituição,

1 Dados da ANQ em 1 de Outubro de 2008

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(conservatório) emendem-nos, mas não (o) destruam, que é de bárbaros; não o caluniem, que é de loucos” (Viana,
1984, p.40).

Já no séc. XX, depois de uma época algo conturbada vivida no Conservatório Nacional e
restantes escolas públicas na década de 70 e início da década de 80, em parte causadas pela
“Experiência Pedagógica de 71” e pelas “convulsões” sociais provocadas pela “Revolução de 25 de
Abril” em 1974, foi publicado o Decreto-Lei nº 310/83, de 1 de Julho, com o objectivo de iniciar
uma reforma de estruturação de todo o ensino artístico. Essa estruturação, no que diz respeito ao
ensino básico e secundário de música veio integrar os respectivos docentes num quadro transitório,
estando prevista uma série de medidas legislativas, no sentido de concretizar a integração destes
docentes na carreira existente.

No que diz respeito à carreira docente do EAE público, o Decreto-Lei nº 310/83, de 1 de


Julho, determinou que os professores em funções à data da sua publicação fossem integrados num
quadro que, apesar de transitório, veio melhorar significativamente o vínculo laboral de cerca de
uma centena de professores, até então contratados anualmente.

Essas medidas não foram concretizadas, tendo sido necessários catorze anos para ser
publicada nova legislação (o Decreto-Lei n.º 234/97, de 3 de Setembro), que veio proporcionar uma
segunda integração dos docentes que entretanto tinham sido contratados, desta vez num quadro de
nomeação definitiva e vinculados ao Estatuto da Carreira Docente (ECD) em vigor.

No entanto, este decreto teve um âmbito restrito de aplicação, uma vez que só resolveu a
situação dos docentes que cumprissem as condições nele previstas. Posteriormente, e para
possibilitar a abertura dos quadros e respectivos concursos, foi necessário criar os grupos e
subgrupos de docência para as diversas disciplinas. Assim, foi publicada a Portaria nº 693/98, de 3
de Setembro, reconhecendo esta no seu preâmbulo que as habilitações do ensino artístico
vocacional se encontravam fixadas em legislação “dispersa e desactualizada”, uma vez que havia
docentes no sistema portadores de habilitações diversas que importava definir, habilitações essas
que se tinham ido acumulando por falta de regulamentação atempada, impedindo que os professores
das escolas públicas pudessem aceder à profissionalização e a acções de formação.

Recentemente e para resolver de novo a situação dos docentes contratados, foi publicada
toda a legislação necessária para acesso aos quadros: o Despacho nº 13020/2008, de 8 de Maio que
veio dispensar a profissionalização aos professores com mais de 40 anos de idade e com dez ou
quinze anos de serviço docente efectivo e que estivessem em funções no ano lectivo de 2008/2009;

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o Aviso nº 22490/2007, de 28 de Agosto, que foi publicado na sequência deste despacho e que veio
proporcionar a última acção de profissionalização aos docentes do EAE público, não abrangidos
pelo despacho anterior; e o Decreto-Lei nº 69/2009, de 20 de Março, que veio estabelecer as regras
do concurso de acesso ao quadros de escola criados pela Portaria nº 551/2009, de 26 de Maio,
rectificada pela Portaria nº 1266/2009, de 16 de Outubro. Apesar deste conjunto legislativo, há de
novo um impasse, uma vez que não se realizou ainda abertura dos concursos, permanecendo em
regime de contrato a maioria dos docentes.

É dentro do contexto histórico e actual atrás brevemente descrito que esta investigação se
justifica.

É seu objectivo estudar os modos de regulação que têm sido preponderantes na construção
da carreira docente dos professores do EAE no ensino público de música2.

Para o efeito, definiram-se os seguintes objectivos:

1—Compreender a evolução das políticas educativas no domínio do EAE área da música, em


matéria de carreira docente.

2—Descrever e caracterizar a CD do EAE nas escolas públicas e privadas de música.

3—Compreender como se desenvolveu e tem sido regulado a CD do EAE na área de música


público desde 1971.

A questão central formulada para alcançar estes objectivos foi: “Como se desenvolveu a
regulação da CD do EAE público, na área da música desde 1971”

O ano de 1971 foi escolhido porque, nessa data, deu-se início a uma reforma do ensino da
música que, tendo sido inovadora a nível pedagógico, não foi acompanhada, como se esperaria,
duma alteração da situação dos docentes, designadamente através da criação de uma verdadeira
carreira ou da sua integração numa existente3.

Da questão central enunciada derivam as seguintes questões:

Q1-Quais os normativos que regularam a Carreira Docente do EAE desde a “Experiência


Pedagógica de1971” até aos nossos dias, no ensino público?

2
O presente trabalho ocupa-se apenas da carreira docente do EAE, básico e secundário, área música, não se debruçando
sobre as carreira docentes do nível superior nem de outras áreas artísticas.
3
Os docente do ensino especializado público não estavam integrados numa “verdadeira” carreira, mas distribuídos por
duas categorias fixas: os professores de 1ª categoria leccionavam o nível dito superior das disciplinas que possuíam este
nível (piano, violino, violoncelo, canto e composição) e os professores de 2ª categoria leccionavam todas as outras.

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Q2-Quais as diferenças entre a situação do pessoal docente do ensino público e do ensino


privado?

Q3-Como e por quem foi/é regulada a CD no EAE público: Tutela, Conservatórios


Públicos, Sindicatos?

A presente dissertação organiza-se em duas partes:


--Na primeira parte é apresentado o caso estudado e a sua problemática, é feito o
enquadramento teórico e apresentada a metodologia da investigação.
--Na segunda parte faz-se a apresentação dos dados e a sua análise, apresentando-se as
conclusões e algumas considerações gerais.

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PARTE I- PROBLEMÁTICA, ENQUADRAMENTO TEÓRICO E METODOLOGIA DA

INVESTIGAÇÃO

1. POLÍTICAS EDUCATIVAS PARA O EAE NO SÉC. XX.

O Conservatório de Lisboa foi, até aos anos 70 do séc. XX, o único estabelecimento de
ensino público na área das Artes do Espectáculo, sendo na legislação regulamentadora deste
estabelecimento que foram igualmente definidas as políticas educativas para aquela área.

Assim, a análise destas políticas terá que ser feita em grande parte com base na análise dos
documentos legais referentes ao Conservatório de Lisboa.

1.1. DE 1919 ATÉ À ACTUALIDADE

Embora tenha havido uma reforma no início do séc. XX (1901), penso ser mais importante
começar esta análise histórica pela reforma de 1919, como é conhecida, porque alargou o ensino da
música a todos os instrumentos e incluiu disciplinas de formação geral, sendo, pois uma reforma
mais abrangente.

Em Maio de 1919, José Viana da Mota é nomeado por Leonardo Coimbra, então ministro da
instrução, director do Conservatório de Lisboa (Archer, et al, 1998, p.25) e Luís de Freitas Branco
director da Secção de Música. Estes dois importantíssimos músicos levaram à prática uma reforma,
talvez a mais importante na história desta instituição. A reforma foi inspirada pela experiência de
Viana da Mota, que tinha estudado e ensinado na Alemanha e na Suíça, e que “importou” de certa
forma o modelo dos conservatórios destes países. Era entendimento deste grande pedagogo que um
futuro músico não poderia ter formação unicamente na área musical. Assim, o aluno, para além de
estudar música a nível superior em todos os instrumentos, deveria completar a sua formação com
um leque mais alargado de disciplinas musicais e com disciplinas de formação geral. Refira-se que
as habilitações para o ingresso no Conservatório era o 1º ciclo do ensino básico (a antiga 4ª classe) e
que nem todos os instrumentos estavam incluídos no nível designado superior.

Em 1930 o futuro “Estado Novo” implementa uma nova reforma com o Decreto nº
18881/1930, de 25 de Setembro, visando cortes drásticos no orçamento do Conservatório,
reduzindo-se a cinco as áreas com um ciclo designado superior: (Violino, Violoncelo, Piano, Canto

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e Composição) e suprimindo todas as disciplinas de formação geral, (Francês, História e


Geografia), e até algumas da área da música (Leitura de Partitura e Regência de Orquestra).

Este modelo vai manter-se até 1971, ano em que é introduzido, na secção de Música do
Conservatório Nacional, um novo plano de estudos ao abrigo da “Experiência Pedagógica de 71”
(EP), reforma nunca homologada pelo Ministério da Educação (ME) e que só é regulamentada nos
anos noventa pela Portaria nº 370/1998, de 29 de Junho.

Lê-se no seu preâmbulo (Portaria nº 370/1998, de 29/06) que os planos de estudo da


“Experiência Pedagógica de 71” foram adoptados pelas outras escolas públicas e pelas escolas
particulares. Refere-se também que os referidos planos de estudo (da EP) nunca foram oficializados
nem se definiram as condições para a sua certificação. Foram necessários vinte e seis anos para se
reconhecer uma experiência pedagógica que veio recuperar o ideário de Viana da Mota, pois a
grande maioria dos instrumentos voltavam a ter um nível superior de estudos (embora este nível
nunca tivesse chegado a funcionar). Esse reconhecimento permitiu às pessoas que tinham terminado
os planos de estudo (musicais) da EP, ficarem detentores de habilitação própria para ingresso no
Quadro de Nomeação Definitiva, criado pelo Decreto-Lei nº 234/97, de 3 de Setembro.

A “Experiência Pedagógica de 1971”, obedeceu também a algumas directivas e


recomendações internacionais, que aconselhavam o paralelismo dos estudos artísticos com os
estudos gerais, com a grande vantagem de incluir o ensino vocacional no sistema geral de ensino,
até aqui separado deste. Os estudos artísticos musicais oferecidos pelos conservatórios, formaram
praticamente todos os profissionais à época.

Temos assim, uma regulação transnacional aplicada ao ensino vocacional da música, mas
que não foi completamente realizada até hoje. Não abrangeu todo o território e as escolas não foram
dotadas de estruturas materiais, (escolas devidamente equipadas) nem estruturas humanas
(professores devidamente habilitados e em número suficiente para cobrir as necessidades).

A “Experiência Pedagógica de 1971” recupera de certa forma o modelo de ensino integrado


implementado por Viana da Mota, em que se adquirem os conhecimentos artísticos e gerais no
mesmo estabelecimento de ensino.

Esta experiência iniciada no Conservatório Nacional foi de certo modo inovadora, mas
verificaram-se várias falhas pedagógicas e administrativas, designadamente naquilo em que o
Estado também falha, muitas vezes noutras áreas: nos meios logísticos. O regime integrado (ensino

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geral mais ensino especializado) no mesmo edifício exige condições que não existiam no Convento
dos Caetanos (tanto à data da EP como ainda hoje).

A Escola de Música do Conservatório Nacional funciona actualmente no referido Convento


dos Caetanos onde em 1836 foi instalado o Real Conservatório de Arte Dramática e onde o
Conservatório de Música criado em 1835 foi integrado, edifício já na época adaptado para a
instalação de uma escola (Conservatório). Em 1947 foram feitas grandes obras de beneficiação,
tendo sido dotado com uma biblioteca e um museu de instrumentos, tornando-se um espaço que
“respirava” arte, decorado com centenas de obras entre as quais pinturas, mobiliário, esculturas, etc.

No discurso de comemoração da reabertura do Conservatório após as referidas obras, Ivo


Cruz, o então director, profere um discurso em que enaltece a obra, agradece sobretudo a bondade
do “Governo do País” em efectuar estes melhoramentos que são completados com diversas peças de
arte, desde pintura e escultura a tapeçaria e mobiliário. Ao convidar os presentes a visitar as
instalações, salienta: “...a decoração e o mobiliário com que enriquecemos as salas e as vastas galerias deste
edifício foram condicionados ao sentido espiritual de uma Escola de Arte”. E continua:

“Nestas quatro galerias que circundam o que foi o antigo claustro do Convento dos Caetanos, criou-se uma
atmosfera diferente e, em cada uma delas, podem os moços artistas receber através da imagem visual a lição dos
estilos.” (Cruz, 1947, p.8)

Foi neste espírito que o CN se manteve como escola de arte até ao ano lectivo de 1971/72,
ano em que se inicia a EP e em que o edifício é “invadido” por algumas centenas de alunos do 2º
ciclo em diante, sem qualquer preparação cultural para o espaço da sua nova escola, não tendo esta
“nova escola” sido minimamente adaptada para os receber. Gerou-se o caos, para além da quase
destruição física do edifício e do seu conteúdo a reforma ficou descredibilizada. Das centenas de
alunos que integraram a experiência pedagógica, poucos foram aqueles que concluíram na
totalidade os planos de estudo (planos de estudos integrados—ensino geral e ensino da música).

No que diz respeito à carreira docente, esta reforma não veio alterar a situação de vínculo
contratual da maioria dos professores do EAE de música. O regime de contrato vigorou para estes
docentes (dos dois conservatórios públicos Lisboa e Porto) até 1983.

Neste ano surge uma reforma com a alteração das políticas educativas e da regulação de
controlo, pelo Decreto-Lei nº 310/83, de 1 de Julho, que veio dividir o ensino vocacional da música
e da dança nos níveis básico, secundário e superior. No que diz respeito à Música foram criadas a
Escola de Música de Lisboa mais tarde designada de Escola de Música do Conservatório Nacional,

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em Lisboa (EMCN) e a Escola de Música do Conservatório do Porto, bem como as Escolas


Superiores de Música, posteriormente ligadas aos Institutos Politécnicos daquelas cidades. Saliente-
se que esta reordenação veio definir claramente o papel de cada escola, ficando a EMCN e
Conservatório do Porto com os cursos dos 2º e 3º ciclos do ensino básico e cursos secundários.

O Decreto-Lei nº 310/83, de 1 de Julho, veio ainda, no que diz respeito ao ensino básico e
secundário de música (e dança), promover um currículo integrado, (as componentes da parte
académica e da artística no mesmo currículo), que pode ser frequentado na mesma escola se esta
possuir condições físicas para receber os dois tipos de ensino, ou em regime articulado (entre duas
escolas, uma da componente académica outra da componente artística), prevendo-se ainda que as
disciplinas musicais fossem frequentadas independentemente das da escola regular (regime que
passou a ser informalmente designado de “supletivo”).

Houve uma forte resistência ao “310”4, assim como várias tentativas de uma regulação
autónoma por parte das escolas de música, nomeadamente em Lisboa, que sem o devido suporte
legal, culminou numa acção da Inspecção Geral de Educação (IGE) realizada em 1990, a qual durou
cerca de três anos e cujo processo final atingiu as cinco mil páginas manuscritas. Gonçalves refere
“o levantamento de um inquérito, com consequências disciplinares, numa escola5 onde se verificou uma produção
“delirante” de normas locais” (Gonçalves, 2001, p.2).

Essa regulação autónoma visou sobretudo os docentes e a sua reclassificação para níveis de
remuneração que não correspondiam à sua situação e as consequências foram negativas para a
instituição EMCN, vindo o Estado mais tarde cobrar aos docentes as verbas recebidas
indevidamente.

Do ponto de vista pedagógico, os Despachos nº 42/SEAM/84, de 4 de Maio e 72/SEAM/84,


de 26 de Novembro, não foram aceites, uma vez que esta regulamentação indicou o novo nível
terminal para os novos cursos secundários, à época denominados complementares, equivalentes ao
12º ano, ou seja, esta legislação retirou definitivamente a possibilidade de haver um retrocesso na
“despromoção” de que se queixaram as escolas que tinham “perdido” o “ensino superior”.

Em 1990 surge o Decreto-Lei nº 344/90, de 2 de Novembro, que vem apresentar uma


reforma de todo o sistema de ensino artístico para os níveis básico e secundário. No que diz respeito
à CD do EAE público, propôs pela primeira vez uma carreira específica para os docentes, mas por

4
Por razões de economia do presente trabalho não é possível desenvolver os motivos que levaram a esta forte
resistência.
5
A EMCN. (nota do autor)

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 17


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Que Regulação?

causa de algumas ideias subjacentes, (sobretudo pela forma como o horário lectivo teria de ser
organizado) não obteve da parte dos professores uma reacção positiva e porque do lado da Tutela
não foram produzidos os diplomas necessários, a sua implementação nunca se efectivou.

1.2. SITUAÇÃO ACTUAL

O XVIII Governo Constitucional, que tomou posse a 26 de Outubro de 2009, no seu


programa para 2009-2013, faz uma única referência ao ensino artístico dizendo que irá concluir a
“reforma do ensino artístico”6, não especificando nenhuma área em particular. Não é também
esclarecedor quanto às suas intenções de abordagem desta componente de extrema importância para
o desenvolvimento humano, “(...) Numa palavra, sem a educação artística, cujos objectivos, são justamente, a
formação do homem completo” (Perdigão, 1981). O que mais uma vez parece demonstrar a pouca
atenção que tem sido dada às Artes em geral e ao ensino da Música em particular7.

É unânime a necessidade de se fazer uma reforma do actual sistema, até porque na ausência
continuada de políticas e de uma regulação de controlo eficiente nesta área, a regulação autónoma
foi preponderante, feita (quase) sempre à luz da lei e permitindo ultrapassar alguns dos problemas,
uns mais correntes, outros bem mais complexos.

Para se inteirar da realidade do EAE, o gabinete da Ministra da Educação (ME)


encomendou, em 2006, um “Estudo de Avaliação do Ensino Artístico” coordenado pelo Professor
Domingos Fernandes, cujo relatório final foi apresentado em Fevereiro de 2007.

É referido na sua introdução que:

“... a investigação histórica ajudou a compreender o que se poderá designar por uma certa
paralisia, ou mesmo demissão, que vem tolhendo há anos a administração e que a tem impedido de
exercer plenamente as suas responsabilidades no domínio do ensino artístico especializado” (p.7).

O mesmo relatório refere a quantidade exagerada de legislação que torna o sistema


ingovernável, considerando que “...um esforço de racionalização da legislação, ainda que apenas se limitasse a
expurgar a actual lei dos seus variados e dispersos regimes de excepção, ambiguidades e até aspectos contraditórios,
tornaria o presente sistema mais governável.” (idem, p.17).

6
In Programa do XVIII Governo Constitucional.
7
Não é de estranhar portanto, que o anterior governo (XVII Governo Constitucional) só tenha apresentado as políticas
educativas para este sub-sistema de ensino dois anos após a sua tomada de posse.

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 18


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Que Regulação?

Baseando-se nas recomendações deste “Relatório”, o ME introduziu legislação em Julho de


2008, por via de dois despachos: o Despacho nº 17932/2008, de 3 de Julho e o Despacho nº
18041/2008, de 4 de Julho. Estes diplomas vêm introduzir alterações de fundo no EAE de música a
partir do ano lectivo 2008/2009, nomeadamente a alteração ao cálculo dos contratos de patrocínio
das escolas do EAE do EPC da área da música (Despacho nº 17932/2008), sendo o mesmo
atribuído por aluno e correspondente ao nível de estudos que frequenta8; o outro diploma atrás
mencionado vem regular as matrículas no regime “supletivo”, para os dois níveis de ensino (básico
e secundário).

Ao fazê-lo, o ME não terá planeado a sua implementação, criando constrangimentos no


processo de matrículas já em curso9 e uma mais vez as alterações são de ordem administrativa com
a finalidade de diminuir custos, visto que o número de alunos tenderá a diminuir.

Embora o discurso político seja o de alargar o ensino vocacional a um maior número de


alunos, na prática verifica-se uma forte regulação de controlo sobretudo ao nível do secundário, em
que os alunos que frequentem o regime “supletivo” terão de se matricular em todas as disciplinas
(nº 8 do Despacho nº 18041/2008, de 4 de Julho). Ou seja, para além da carga horária da escola do
ensino regular que pode, consoante as áreas, ir até às 25 horas semanais, os alunos terão um
acréscimo entre treze a quinze horas, consoante o curso de instrumento ou canto, para a componente
artística área da música10.

Era intenção inicial do ME acabar com o regime “supletivo” sobretudo no nível secundário,
mas devido à forte contestação por parte das escolas, não só dos professores mas também das
associações de estudantes e encarregados de educação, esta foi a solução encontrada para reduzir a
frequência no nível secundário. No entanto, e no seguimento da contestação já referida, o ME
enquanto não reformula o plano de estudos deste nível, tem vindo a criar regimes de excepção, que
obrigam à matrícula somente a quatro disciplinas, permitindo a frequência das três disciplinas
principais, instrumento, formação musical e classe de conjunto e uma outra disciplina do plano de
estudos. E é precisamente no regime “supletivo” que se constata a maior afluência de alunos que
escolhem a música como via profissional, entrando nas escolas superiores e universidades.

8
Até à publicação deste despacho, o cálculo era feito mediante a apresentação pelas escolas do número de alunos em
cada nível de ensino, de um mapa do pessoal docente e não docente e era atribuída uma percentagem por cada nível de
ensino. (explicação bastante simplificada, uma vez que não cabe nos objectivos da presente investigação pormenorizar
este aspecto).
9
A legislação foi apresentada às escolas em Julho e o processo de matrículas tinha sido iniciado na segunda quinzena
de Maio.
10
Este incremento da carga horária pode vir a condicionar seriamente a frequência do nível secundário.

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 19


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Que Regulação?

Nesta reestruturação inicial, as escolas do EPC, são confrontadas também com alterações
profundas, nomeadamente no que diz respeito ao financiamento. A nova legislação, (Despacho nº
17932/2008, de 3 de Julho) não só estabelece as novas regras de financiamento, como reforça a
obrigatoriedade de as escolas do ensino regular constituírem turmas dedicadas a alunos que
frequentem o regime articulado. É para este regime que a tutela quer canalizar os apoios,
aumentando assim o número de alunos a frequentar o ensino da música. Esta situação é de algum
modo mais favorável às famílias, pois a frequência neste regime é gratuita.

O “Relatório” recomenda também a implementação do ensino integrado, que é o regime do


Conservatório de Braga. No entanto, este regime nunca foi avaliado, de forma a comprovar ou não a
eficácia que lhe é atribuída, havendo para além da referida escola pública, outra do ensino particular
e cooperativo que ministra este regime em exclusividade. Os Conservatórios do Porto e de
Coimbra, após a instalação em novos edifícios, puderam entretanto também instituir este regime. A
EMCN, apesar de se manter nas mesmas instalações, decidiu também introduzir o “integrado”. Ora,
no presente, como algumas escolas públicas não terão ainda condições físicas para albergarem os
dois ensinos, a alternativa de momento é o regime articulado, em que o aluno frequenta a
componente geral na escola do ensino regular, articulando com a escola de música todo o processo
avaliativo.

O regime articulado foi introduzido no sistema educativo português nos anos 80 e é uma
aproximação ao sistema francês do “l’Enseignement à horaire aménagé”. O regime articulado
consiste na articulação entre as escolas do ensino regular e as escolas de música, proporcionando
aos alunos deste regime um currículo que integra as componentes académica e a artística (já
referido anteriormente).

Ao “importar-se” este regime, não se teve em conta a realidade nacional, sobretudo nos
grandes centros urbanos e dando o exemplo da cidade de Lisboa, onde só existem cinco escolas do
ensino vocacional, (duas públicas e três privadas), para algumas centenas de escolas do ensino
regular. Com estas condicionantes o sistema não pode funcionar correctamente, em virtude da
grande quantidade de alunos espalhados pelas mais diversas áreas geográficas, não se conseguindo
assim uma verdadeira articulação pedagógica, pela impossibilidade de se constituírem turmas
homogéneas e pela distância que os alunos têm de percorrer. Em urbes mais pequenas o sistema
será mais eficaz, dado a proximidade das escolas.

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 20


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Que Regulação?

Também as muitas dúvidas e sobretudo, a falta de informação, tanto por parte dos
encarregados de educação, como por parte das escolas do ensino regular, foram condicionantes para
que houvesse mais alunos neste regime. A Portaria n.º 1550/2002, de 26 de Dezembro, ao
condensar alguma legislação dispersa, veio esclarecer as dúvidas relativas ao Regime Articulado,
nomeadamente nas regras de constituição de turmas nas escolas do ensino regular (Nº II, artigos 19º
a 22º). Apesar de existir legislação que tem vindo a regular o regime articulado, esta foi
sistematicamente ignorada pelos Conselhos Executivos (das escolas do ensino regular) e quando os
encarregados de educação manifestavam a intenção de matricular os seus educandos neste regime, a
elaboração dos horários para estes alunos não obedecia ao disposto na referida portaria, sendo as
escolas de música obrigadas a recorrer à tutela para que fosse cumprida a legislação.

No ano lectivo 2008/2009, foram assinados, de acordo com a legislação, os primeiros


protocolos entre escolas para uma maior vinculação ao processo de organização escolar destes
alunos. Neste aspecto, a tutela ouviu as pretensões das escolas de música, que há muito
manifestavam a necessidade de haver uma regulação mais forte para resolver este problema. Nesse
sentido, publicou a Portaria nº 691/2009, de 25 de Junho, que vem aprovar os cursos Básicos de
Música e Dança e respectivos planos de estudo.

Refira-se que nas escolas do EPC garante-se a gratuitidade do ensino no regime articulado,
como nas escolas públicas. Já no regime supletivo a comparticipação é aproximadamente de 50%,
funcionando o contrato de patrocínio como uma forma de “cheque ensino”. No entanto, e em
termos de regulação de controlo, as escolas particulares são mais controladas dos que as públicas,
devendo fazer prova várias vezes, no ano lectivo, do cumprimento de todos os requisitos legais, sob
pena de lhes ser suspenso o respectivo contrato de patrocínio e retirado o paralelismo pedagógico
ou a autonomia, consoante os casos.

Assiste-se, assim, neste momento, a uma reforma cujo efeito poderá ser a curto prazo, o de
acabar com o nível secundário em regime supletivo dos cursos do EAE área da Música, por ser
quase impossível cumprir as cargas horárias dos dois tipos de ensino, caso não haja uma reforma do
plano de estudos.

Esta política educativa na área artística parece evidenciar uma “não vontade” de se fazer
uma verdadeira reforma. O ME olha para um passado em que se demitiu da sua qualidade de
regulador, esquecendo e quase marginalizando este subsistema de ensino e agora, salientando só os
aspectos negativos (que são na sua maioria causados pela sua falta de regulação) não valoriza os
aspectos positivos e as estratégias desenvolvidas pelas escolas que garantiram o sistema a

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 21


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Que Regulação?

funcionar, pelo menos durante quatro décadas, propondo medidas que parecem não ter em devida
conta todas as implicações que poderão ter sobre o sistema do EAE, área da música.

No que diz respeito às repercussões que estas medidas terão sobre o pessoal docente,
(nomeadamente se se mantiver a obrigatoriedade da frequência de todas as disciplinas do nível
secundário para os alunos do regime “supletivo” ou se este regime for completamente abolido,
dando a Tutela preferência aos regimes de frequência integrado e articulado) haverá sem dúvida
muitas escolas, sejam elas públicas ou do EPC, a dispensar docentes, vendo estes goradas as
expectativas que depositaram na sua carreira, correndo mesmo o risco de não encontrar um posto
trabalho alternativo, uma vez que estas medidas afectarão a grande maioria das escolas.

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 22


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Que Regulação?

2. A REGULAÇÃO DA CARREIRA DOCENTE DO EAE PÚBLICO ÁREA DA MÚSICA,

DESDE A EXPERIENCIA PEDAGÓGICA DE 1971 ATÉ AO PRESENTE.

2.1. NOÇÃO DE REGULAÇÃO

Os primeiros indícios que nos revelam a organização de uma sociedade foram encontrados
na região situada entre os rios Tigre e Eufrates, território ocupado no período que medeia entre o
séc. IV e o séc. III a. C., pela civilização suméria, onde actualmente se situa o Iraque.

Esta civilização terá sido a primeira a desenvolver um sistema de escrita que impulsionou as
várias vertentes da actividade humana, tanto física como intelectual, tais como: “o governo e a política,
a educação e a literatura, a filosofia e a moral, o direito e a justiça, e mesmo a agricultura e a medicina” (Kramer,
1963, p.9). Foi também criado o primeiro código de leis, com o objectivo de regular a sociedade.

A história mostra-nos que na medida em que as civilizações foram evoluindo, o Homem


teve de encontrar formas de organização para as diversas actividades criadas, com a finalidade de
suprir as suas necessidades. À medida que essas actividades foram evoluindo, foi aumentando o seu
grau de complexidade, gerando assim a necessidade de criar sistemas organizativos cada vez mais
complexos.

Assim, segundo Lieber:

“Sistema é, portanto, uma forma lógica de apreensão da realidade. Ao se formular sistemas,


não se busca um “reflexo” do mundo real, mas sim a descrição ou destaque daqueles “traços” da
realidade, cujo conjunto permite a percepção de uma condição de ordem e a proposição de uma forma
operativa voltada para um dado objectivo” (Lieber, Teoria de Sistemas).

Estas sociedades (o conjunto das organizações) por seu lado, necessitam de quem as lidere e
“Para viverem em paz, os homens cedem o seu poder a um único soberano e cria-se a figura do Estado” (Kunzler,
2004). Os modelos de governação ou sistemas políticos representados pelas diversas instituições,
que no seu todo constituem o Estado, têm o papel de regular a sociedade. Assim, os sistemas
políticos, pela sua regulação, reduzem a complexidade do ambiente (mundo real para Lieber)
mantendo uma certa ordem social, dado que as decisões tomadas pelo Estado serão ou deverão ser
cumpridas por todos os cidadãos.

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 23


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Que Regulação?

É esta “obediência” à regra que mantém a ordem social indispensável ao equilíbrio das
instituições. Mas as regras quando são definidas não são imutáveis, uma vez que foram definidas
pela actividade humana, sendo um produto desta (Reynaud, 2004, p.31). Alterar uma regra pode ser
uma tarefa difícil e não se intentam alterações sem esperar resistência ou mesmo uma “réplica” i.é.,
uma regra semelhante ou ainda mais constrangedora à que se quer alterar. Nalguns casos, a
mudança tem de seguir os procedimentos previstos, que são longos e dispendiosos a nível de
energia (humana), por exemplo a votação de uma lei ou a simples assinatura de um decreto (idem,
p.31).

É a regulação que “permite ao sistema, através dos seus órgãos reguladores, identificar as perturbações,
analisar e tratar as informações relativas a um estado de desequilíbrio...” (Barroso, 2005, p.728), já que a
regulação é a “acção de manter o equilíbrio, de assegurar o funcionamento correcto de um sistema complexo”
(Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea).

Para que os sistemas complexos (organizações) se possam tornar operacionais há que criar
mecanismos de regulação, mecanismos esses que, segundo Reynaud se focalizam nas noções da
regra e da regulação (Colin, 1997). Também para Reynaud “a criação de regras é como um desafio social,
que gera conflitos por vezes violentos entre diferentes grupos de interesse, a regra é, pois um constrangimento e não
um hábito” (2004, pp.18-19). Meuret define a regulação de uma política (pública) como o conjunto
dos dispositivos e mecanismos disponíveis para que ela (regulação) atinja o fim para que foi
definida (2001).

As regras provenientes de um órgão do Estado com competências numa determinada área


visam a regulação e, sobretudo, o controlo da actividade de um determinado grupo social por ele
tutelado (por exemplo, nas áreas da saúde, da educação, etc.) são de facto um constrangimento, uma
vez que impõem aos diversos actores uma forma de agir sem deixar margem para “improvisos” ou
criatividade na sua acção (Reynaud, 1988, p.6), também denominada de regulação top-down (do
topo para a base).

No entanto, esse mesmo grupo de actores também se regula por regras auto-produzidas,
resultando numa regulação autónoma (idem, p.6), em que os intervenientes ajustam o
funcionamento da organização tanto às necessidades pontuais como às mais previsíveis, usufruindo
de uma certa liberdade, mesmo que limitada.

Pode acontecer haver uma negociação na produção das regras entre os diversos grupos de
interesse, sejam estes representantes da organização (por exemplo, a entidade patronal) ou dos

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“trabalhadores”11 (por exemplo, os sindicatos), sendo estes consultados sobre um certo número de
regras a implementar, ou sendo estas negociadas directamente entre as partes, daí resultando uma
regulação conjunta (idem, p.15). Reynaud sublinha que apesar deste modo de regulação resultar de
uma negociação, não deixa de ser uma regulação de controlo, uma vez que esta vem do exterior,
logo não se poderá confundir com a regulação autónoma que é gerada no interior (idem).

O Estado-Nação tem sido, pela sua posição hierárquica, o principal responsável por todo o
processo de criação de regras (constrangimentos), que resultam numa regulação fortemente
centralizada e controladora da acção, não deixando espaço de manobra para uma regulação mais
autónoma em que os actores deveriam ter um papel de maior intervenção na definição das ditas
regras.

No entanto, o paradigma desta regulação de controlo tem vindo a ser de alguma forma
alterado, pelo “novo” papel a desempenhar pelo Estado-Nação.

Ao Estado regulador que pela autoridade dominava e impunha de certa maneira as suas
regras, sucedeu um Estado que não deixando de regular, passou a negociar com a diversidade de
actores que “actuam no palco” da sociedade. “A regulamentação racional legal dominante do Estado, imposta
hierarquicamente com base na sua legitimidade enquanto Estado – Providência, foi substituída pela necessária
negociação a múltiplas «vozes»” (Gonçalves, 2007, p.61). Reynaud refere que “o que caracteriza o Estado
moderno, são cada vez menos as relações de subordinação com os sujeitos” privilegiando-se agora as “relações
de troca e de negociação entre as regulações de controlo e regulações autónomas” (Reynaud, 2004, p.200).

2.2. REGULAÇÃO E POLÍTICAS EDUCATIVAS

A regulação das políticas públicas pode definir-se como um “objectivo de consagrar,


simbolicamente, um outro estatuto à intervenção do Estado na condução” destas (Barroso, 2005, p.727). Como
já foi referido, o acto de regular é também um ajuste da acção a determinados fins, nomeadamente
na regulação da acção educativa.

O Estado (pela via do governo em funções) é detentor de “poder” sobre as suas organizações
e tem legitimidade nomeadamente no ensino, “para introduzir “regras” e “constrangimentos” no mercado ou
na acção social” (Barroso, 2003, p.64). O conceito de regulação é transversal às sociedades em geral,

11
Aqui o termo “trabalhador” é aplicado a todos aqueles que dentro da organização não têm poder de decisão per si,
mas por via dos seus representantes, já que toda a estrutura desenvolve um trabalho produtivo, logo todos serão
trabalhadores.

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já que estas estão subordinadas a vários organismos estatais com alguma autonomia que regulam os
vários sectores chave (por exemplo, a energia, a banca e a educação). Delvaux compara duas
formas de regulação (a de controlo e a autónoma), ao controlo do trânsito: no caso em que os
semáforos regulam a travessia do cruzamento pelo cumprimento estrito da regra, não é deixada
qualquer margem de (regras de controlo) liberdade ao utilizador, uma vez que foram utilizados
sistemas inibidores de infracção; no caso da rotunda e apesar de igualmente ter de cumprir regras
(as regras de prioridade), cada utilizador tem uma certa autonomia de decisão, contribuindo para
uma melhor fluidez do trânsito (regulação autónoma) (Delvaux, 2001). Assim, uma regulação
autónoma implica a livre iniciativa aos actores, o que lhes permite contribuírem para um melhor
desempenho da organização, como será o caso da Escola.

Outras formas de regulação emergem para os estados nacionais, não só dos compromissos
de uma pertença a organizações supra-nacionais (como por exemplo, a União Europeia) mas
também de um fenómeno actualmente marcante para as sociedades: a chamada “globalização”, que
tem provocado como que uma contaminação entre os estados, com modelos sociais que ao terem
sucesso nos países de origem, são aplicados a outros, nem sempre com as devidas adaptações.
Como os modelos nacionais estão esgotados e os governos estão conscientes deste facto tentam
com novas políticas, nomeadamente as educativas, suprir as lacunas existentes, adoptando-se
exemplos de políticas educativas de outros países, com vista à obtenção de soluções rápidas que os
ajudem a ultrapassar as dificuldades (incompetências) e validando as opções tomadas (Walford,
2001, p.179, citado por Barroso, 2006)

Todos os países são, uns mais do que outros, influenciados por esta forma de regulação
transnacional. Portugal é um exemplo dessa forte influência, porque sendo um país periférico fica
como que “refém” da regulação transnacional oriunda dos países mais centrais, com mais poder a
nível das decisões e pela sua relevância financeira. É também o resultado da já citada estrutura
supra-nacional, a União Europeia, que não sendo explicitamente um poder de decisão, controla e
regula pelas regras, (veja-se por exemplo, os programas de financiamento às políticas educativas).
Refiram-se ainda as inúmeras organizações que a nível mundial regulam, com mais ou menos
subtileza os mais diversos assuntos internos de cada país, através de programas de cooperação,
sendo de facto os responsáveis por uma regulação transnacional.

Em Portugal e até à Revolução de Abril de 1974, o acto regulador era exercido com as
características de um regime autoritário e de cariz ditatorial. No período que se segue, assiste-se a
uma instabilidade em todas as estruturas da sociedade, provocada pelas “convulsões” da mudança

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do regime de cariz fascista para uma democracia, onde os vários partidos dos diversos quadrantes
políticos se debatem, não só para ocuparem um lugar de destaque na “cena” política como para
impor a sua ideologia e influenciar a sociedade agora em mudança. Mudança essa que é feita “...de
forte participação social, por vezes espontânea e radical, mas quase sempre instrumentalizada pelas vanguardas
partidárias, empenhadas em eliminar (ou esconder) os vestígios do passado anti-democrático e em disputar a primazia
na definição de um modelo futuro”. (Barroso, 2003, p. 66). No entanto, assiste-se a uma grande evolução
“durante as décadas de 80 e 90 do século passado, fruto das mudanças políticas, económicas e culturais que se fizeram
sentir, a redefinição do papel do Estado, adquire uma grande centralidade.” (Almeida, 2007, p.20).

Nos domínios das políticas públicas da educação em Portugal destaca-se a Lei de Bases do
Sistema Educativo (Lei nº 46/86, de 14 de Outubro), que aparece de certa forma, para restabelecer a
ordem no ensino e “recuperar o poder e o controlo do Estado e sua administração sobre a educação” (Barroso,
2003, p.68).

Destinado a regulamentar a administração e gestão das escola públicas, o Decreto-Lei n.º


115-A/98, de 4 de Maio, vem introduzir, mesmo que “timidamente” um novo conceito de
regulação, em nome duma autonomia que não chegou no imediato a ser completamente
concretizada.

Com efeito, o Decreto-Lei nº 115-A/98, de 4 de Maio, vem criar um novo órgão de decisão
dentro da escola, a Assembleia de Escola, composta por representantes dos vários actores
intervenientes no processo educativo: os docentes (até aproximadamente 50%); o pessoal não
docente; os alunos (do nível secundário); os pais e encarregados de educação; a autarquia;
interesses económicos e culturais locais. “Contudo esta representação é minoritária e o recrutamento dos
representantes dos pais faz-se essencialmente junto de grupos sociais reduzidos (classe média) e em particular de pais
e mães que são professores”. (Barroso, 2003, p.81). O Decreto-Lei n.º 75/2008, de 22 de Abril, vem de
alguma forma corrigir esta condição minoritária quando no seu n.º 3 do Artigo 12º diz: “O número de
representantes do pessoal docente e não docente, no seu conjunto, não pode ser superior a 50% da totalidade dos
membros do conselho geral”. Assim, acredita-se que haverá garantias de uma maior equidade nas
tomadas de decisões.

Mas este último diploma vem trazer alterações profundas no funcionamento das escolas,
nomeadamente quanto ao modo como é escolhido o director, que passa a ser eleito pelo conselho
geral após concurso documental, substituindo a sua eleição pelo pessoal docente e não docente,
pelas representações dos estudantes do nível secundário e representantes dos pais e encarregados de
educação. Barroso, num parecer sobre o Projecto de Decreto-Lei nº 771/2007-ME – «Regime de
autonomia, administração e gestão...» (DL n.º 75/2008, de 22/04) refere: “(...) a autonomia” tem sido uma ficção, na

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medida em que raramente ultrapassou o discurso político e a sua aplicação esteve sempre longe da concretização
efectiva das suas melhores expectativas” e “A retórica sobre a autonomia das escolas aparece assim como um
leitmotif para o reforço dos instrumentos de controlo estatal da gestão naquilo que alguns autores designam por uma
governação de “mão de ferro em luva de veludo” (Barroso, 2008).

Apesar desta conclusão para o caso específico destas disposições legais, há autores que
consideram que o Estado tende a transferir mais responsabilidade para a escola. Assim, a actual
tendência do Estado é cada vez mais o de avaliar o resultado final das políticas que define para cada
sector,

Lessard, et al citado por Barroso refere:

“O Estado não se retira da educação. Ele adopta um novo papel, o do Estado regulador e
avaliador que define as grandes orientações e os alvos a atingir, ao mesmo tempo que monta um sistema
de monitorização e de avaliação para saber se os resultados desejados foram, ou não, alcançados”.
(Lessard, et al 2002, citado por Barroso, 2005, p.732)

O Estado, sem deixar de financiar a educação, delega a gestão da educação nas direcções
das escolas, nas associações de pais e nas autarquias, vindo posteriormente “cobrar” a estes actores
o sucesso ou o insucesso dos resultados. Continuam os mesmos autores:

“Se, por um lado, ele continua a investir uma parte considerável do seu orçamento em
educação, por outro, ele abandona parcialmente a organização e a gestão quotidiana, funções que
transfere para os níveis intermediários e locais, em parceria e concorrência com actores privados
desejosos de assumirem uma parte significativa do “mercado” educativo”. (idem)

Mas no momento em que se vive uma crise financeira a nível global há inevitavelmente uma
crise social nos estados mais fragilizados. A tendência desse mercado é ficar mais selectivo, e os
seus “clientes”, que são maioritariamente pertencentes à classe média, estão a ficar
descapitalizados, com um significativo aumento da carga fiscal e a redução de salários no sector
público. Ora, se as famílias perdem recursos, o mercado tende a desaparecer. Há uma diminuição de
alunos que frequentam o ensino privado transferindo-se para as escolas públicas, onde
paradoxalmente o ME está a reorganizar o parque escolar reduzindo o número de estabelecimentos
de ensino, ficando as escolas com excesso de alunos e a consequente inflação das turmas.

Com a nova organização da escola introduzida pelo Decreto-Lei nº 75/2008, de 22 de Abril,


esta tende a tornar-se numa “arena política” onde os conflitos de interesses tanto individuais como
colectivos irão influenciar a vida escolar com base na conflitualidade e na consequente luta pelo

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poder (Costa, 2003, p.73). De facto, tanto o modelo de avaliação de desempenho como o poder de
decisão que é conferido ao conselho geral podem ser dois factores de divisão na escola, em que os
diferentes actores lutam cada vez mais pelos seus interesses, em detrimento do interesse público que
é contribuir para um ensino de qualidade, criar condições para uma escola mais dinâmica e geradora
de saber.

Voltando às políticas educativas em que o Estado transfere algumas das suas competências,
importa citar o Decreto-Lei n.º 144/2008, de 28 de Julho, que começa no seu preâmbulo por afirmar
que o Programa do XVII Governo prevê lançar novas políticas educativas locais e de políticas
sociais de proximidade, assentes numa efectiva transferência de competências para as autarquias.
Este diploma descentraliza para os municípios, entra outras, a responsabilidade de gestão do pessoal
não Docente do ensino básico estendendo-a ao 2º e 3º Ciclos.

Em síntese, o novo paradigma da regulação passa a ser a de um estado mais avaliador das
políticas que define, regulando mais pelos resultados da acção educativa levada a cabo por todos os
agentes do que propriamente através da sua intervenção directa nos processos educativos.

2.3. REGULAÇÃO NO EAE PÚBLICO DESDE A EXPERIÊNCIA PEDAGÓGICA DE

71 ATÉ AO PRESENTE.

Como é referido no já citado relatório o ensino artístico, o Estado demitiu-se das suas
obrigações de regulador no que diz respeito ao ensino artístico especializado. No entanto, essa
demissão pode ser interpretada de duas formas: (i) ou como uma incapacidade de compreensão dos
problemas deste tipo de ensino, protelando a sua resolução; (ii) ou por ter outras prioridades, face à
necessidade de “investir” em reformas no ensino genérico, ou em medidas pontuais, para dar
solução a problemas também eles pontuais.

Mas sempre que a situação económica o justifica, a Tutela “lembra-se” que o ensino
artístico existe, precisamente para efectuar cortes no orçamento destinado ao seu funcionamento.
Recuando à segunda década do séc. XX, com a instabilidade política e o descontentamento geral,
reuniram-se as condições para que os opositores ao regime parlamentar organizassem a denominada
Revolução Nacional de 28 de Maio de 1926, pondo assim termo à 1ª República.

Desenvolveu-se então um sistema político ditatorial que vem criar constrangimentos à


sociedade, sendo a educação o meio privilegiado para veicular a mensagem da nova ordem política.

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 29


Carreira Docente no Ensino Artístico Especializado—Área da Música
Que Regulação?

Se os Decretos nº 5546/1919, de 9 de Maio e o nº 6129/1919, de 25 de Setembro,


introduzem uma reforma significativa no ensino da Música, em 1930, três anos antes de ser
declarado o “Estado Novo”, é publicado o Decreto nº 18461/30, de 14 de Junho, legislação que
funde os dois Conservatórios de Música e Teatro, iniciando-se:

“...em plena ditadura nacional, uma nova reforma do Conservatório de Lisboa, o qual, desde a
publicação do Decreto de 22 de Maio de 1911, é constituído por duas instituições organicamente
separadas entre si, uma destinada ao ensino da arte dramática, e outra destinada ao ensino musical”
(Gomes, 2002, p.127).

É dito no seu preâmbulo que esta medida vem criar condições económicas favoráveis a um
melhor desempenho da organização, uma vez que tanto a nível de recursos humanos como
financeiros haverá uma economia significativa, devendo a medida ser aplicada de imediato, uma
vez que servirá de base à reforma pretendida. Para a referida reforma, o mesmo decreto cria uma
comissão para elaborar, com carácter de urgência, uma proposta que de algum modo viesse trazer
uma nova política de funcionamento do Conservatório, agora instituição única incorporando a arte
musical e a arte dramática, política essa baseada em critérios de “estreita economia” (Decreto nº
18461/30, de 14 de Junho).

Dos trabalhos da referida comissão nasce o Decreto nº 18881/1930, de 25 de Setembro, que


vem precisamente introduzir as alterações pedidas pelo legislador, reduzindo-se os planos
curriculares em relação à reforma de 1919 e economizando-se nos custos de funcionamento em
“20.235$00”, (verba significativa para a época). Foram, entre outras alterações, suprimidas
disciplinas consideradas dispensáveis, com o argumento que na “instrução artística, o essencial não é
ensinar muito, mas ensinar bem” (preâmbulo DL 18881/1930, de 25/09)

Esta nova ordem política utiliza formas de regulação de forte controlo sem deixar margens
de manobra aos restantes actores. Nos anos 60 os movimentos estudantis começaram a abalar a
“falsa” estabilidade vivida até então e num estado onde a liberdade de expressão não era consentida,
a censura foi uma das formas de repressão utilizada para defesa da unidade da Nação.

Nas sequência das reformas propostas por Veiga Simão, interessa realçar em termos de
regulação a Experiência Pedagógica (EP) de 1971 aplicada no CN, que surge num momento de
viragem na atitude do ainda Estado Novo. Esta reforma insere o ensino das artes no ensino geral e
vem introduzir uma estrutura, no caso do ensino da música, onde o percurso é vertical abrangendo
os ciclos geral, complementar e superior. No entanto, esta “experiência não chegou a concretizar-se na

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 30


Carreira Docente no Ensino Artístico Especializado—Área da Música
Que Regulação?

totalidade” (Gonçalves, 2001, p.25), como já referi: a falta de legislação regulamentadora determinou
a não implementação da experiência na totalidade e o seu insucesso. No que diz respeito à carreira
docente esta EP veio criar ainda mais instabilidade, uma vez que o número de professores
contratados aumentou consideravelmente, em virtude do alargamento do plano de estudos, ter sido
substancial, sobretudo no que diz respeito a alguns instrumentos que passaram a ter um professor
especialista (casos do trompete, do trombone, da tuba, do saxofone e do fagote, entre outros).12

No hiato que mediou entre o fim da EP e a aplicação do Decreto-Lei nº 115-A/98, de 4 de


Maio, há três momentos que merecem ser realçados: o primeiro, já referido, foi a reforma
introduzida pelo Decreto-Lei nº 310/83, de 1 de Julho, o segundo o Decreto-Lei nº 344/90, de 2 de
Novembro e finalmente o Decreto-Lei nº 234/97, de 3 de Setembro.

De facto, o Decreto-Lei nº 310/83, de 1 de Julho, introduz, a nível de regulação de controlo


novas regras no funcionamento das instituições, tanto a nível pedagógico (com a inclusão do EAE
no sistema de ensino, sendo feita a divisão dos respectivos níveis básico, secundário e superior),
como a nível da carreira docente, com a integração dos professores nas carreiras docentes dos
diferentes níveis de ensino em quadros transitórios.

O Decreto-Lei nº 344/90, de 2 de Novembro, vem introduzir um novo conceito de estatuto


para os professores, criando a figura do Professor - concertista e o de Professor - compositor.
Mesmo que a legislação não seja explicita nos termos e condições em que este estatuto seria criado,
há de facto uma nova abordagem na concepção do docente do EAE de música extensível também
ao EPC.

O Decreto-Lei nº 234/97, de 3 de Setembro, teve como único objectivo integrar os docentes


em regime de contrato num quadro de nomeação definitiva.

No entanto, e na sequência da aprovação deste diploma, a Tutela sugeriu mais uma vez às
escolas públicas da área da música13, que apresentassem um projecto de legislação que desse
continuidade ao processo de criação dos quadros docentes e à respectiva carreira. Mais uma vez as
direcções das seis escolas do EAE público uniram esforços e no ano de 2000 foi concluído e
apresentado um projecto de lei que vinha, entre outras medidas, possibilitar que cada escola
escolhesse os seus professores pela via dos concursos locais. O ME não deu andamento à pretensão
das escolas.

12
Havia alguns instrumentos de sopro pertencentes à mesma “família” que eram leccionados por um único docente.
13
À semelhança do que tinha acontecido com o Decreto-Lei nº 234/97 de 3/9, que foi proposto pelo conjunto das
escolas públicas.

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 31


Carreira Docente no Ensino Artístico Especializado—Área da Música
Que Regulação?

A aplicação do Decreto-Lei nº 115-A/98, de 4 de Maio nas escolas do EAE público, traduz-


se pelo fim do regime de instalação que perdurava desde 1983, passando as direcções das escolas a
Comissão Executiva Instaladora até à conclusão do processo de eleições para os novos órgãos então
criados: Assembleia de Escola e Comissão Executiva. Verificou-se também uma maior abertura dos
centros de formação em aceitar os docentes do EAE público pertencentes ao quadro, nas acções de
formação que organizavam, permitindo que estes pudessem iniciar o processo de avaliação.

As escolas do EAE públicas já praticavam na sua gestão uma autonomia, de alguma maneira
consentida pela tutela, motivada talvez pela incapacidade desta em perceber as diferenças entre este
tipo de ensino e o dito ensino geral. “É de facto inegável que as escolas do ensino especializado da música
apresentam algumas características que as distinguem das do ensino regular e que podem ter consequências no modo
como se organizam e são geridas” (Gonçalves, 2001, p.7).

Uma dessas características, mencionadas por Gonçalves, era a possibilidade que as escolas
tinham de escolher os seus docentes: ou por convite em função da relevância do seu currículo, ou
por concurso local. No caso da EMCN, por exemplo os candidatos a professor de instrumento ou
canto prestavam uma prova artística e duas provas práticas de docência. Para as restantes
disciplinas, os candidatos prestavam unicamente as duas provas de docência.

Esta possibilidade “marginal” ao sistema manteve-se até à publicação do Decreto-Lei nº


69/2009, de 20 de Março e legislação subsequente, que veio regulamentar a admissão aos quadros,
a qual passa a ser feita por concurso nacional.

A regulação de controlo no que diz respeito à carreira docente do EAE público, resume-se
pois, aos seguintes diplomas: o Decreto-Lei nº 310/83, de 1 de Julho (cria os quadros transitórios e
integra os professores do EAE nas carreiras docentes dos respectivos níveis); o Decreto-Lei nº
344/90, de 2 de Novembro, (prevê as categorias de professor - concertista e professor - compositor);
o Decreto-Lei nº 234/97, de 3 de Setembro (cria os quadros de nomeação definitiva); a Portaria nº
693/98, de 3 de Setembro (cria os grupos de docência e as habilitações); Decreto-Lei nº 69/2009, de
20 de Março (define as regras para o ingresso no quadro de escola); e a Portaria nº 1266/2009, de
16 de Outubro (estipula os lugares de quadro para cada grupo disciplinar).

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3. METODOLOGIA DA INVESTIGAÇÃO

3.1. INTRODUÇÃO
“A investigação em ciências sociais segue um procedimento análogo ao do pesquisador de
petróleo. Não é perfurando ao acaso que este encontrará o que procura”. (Quivy, 2008, p.15).

Assim é a investigação em ciências sociais, onde é preciso planificar o projecto de


investigação, começando pela escolha do tema a investigar, a identificação do objectivo dessa
investigação, a escolha da metodologia que se irá utilizar, a selecção dos instrumentos de pesquisa,
a análise dos dados recolhidos com apresentação de toda a informação relevante e, finalmente, o
“produto” final em forma de dissertação, “de modo que quem o lê perceba o que se quer dizer e fique em
condições, se for necessário, de voltar aos mesmos documentos para retomar o tema por sua conta” (Eco, 1998, p.
32)

Logo que todo o plano de trabalho esteja delineado, é imprescindível encetar contactos com
os indivíduos e instituições que irão fornecer ao investigador o material de estudo, para assim, se
estabelecerem os protocolos de participação nas suas várias fases, devendo estas ficar bem
clarificadas, evitando constrangimentos durante a fase de investigação.

Assim, pretende-se que uma investigação nos ajude a encontrar respostas e soluções para o
problema em estudo, sendo o objectivo final produzir novos conhecimentos sobre o “caso”
investigado.

Para tal, terá o investigador de encontrar uma abordagem metodológica adequada à


perspectiva teórica que suporta a investigação que irá fazer, uma vez que “a teoria ajuda à coerência dos
dados e permite ao investigador ir para além de um amontoado pouco sistemático e arbitrário de acontecimentos”.
(Bogdan & Biklen, 1994, p.52), referindo também os mesmos autores que “toda a investigação se
baseia numa orientação teórica”, podendo mesmo dizer-se que não há ciência sem uma boa teoria.

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 33


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Que Regulação?

3.2. FUNDAMENTAÇÃO METODOLÓGICA

3.2.1. INVESTIGAÇÃO QUANTITATIVA OU INVESTIGAÇÃO QUALITATIVA

O investigador em Ciências Sociais dispõe de duas abordagens de investigação: a abordagem


quantitativa e a abordagem qualitativa. A escolha de uma destes perspectivas de investigação
deverá ter em conta os resultados que se querem obter. Assim, o investigador tem de escolher a
perspectiva que seja mais adequada à sua investigação, sabendo “a priori” que tanto o método
qualitativo como o método quantitativo têm características diferentes:

“A investigação quantitativa é aquela em que se recolhem e analisam dados quantitativos sobre


variáveis.
A investigação qualitativa evita a quantificação. Os investigadores qualitativos fazem registos
narrativos dos fenómenos que são estudados mediante técnicas como a observação participada e
entrevistas não estruturadas” (Fernández, P. S. & Díaz, P. S., 2002; pp. 9-76-78).

Analisando a afirmação destes autores podem-se retirar algumas diferenças importantes


destes dois métodos de investigação, (i) a investigação quantitativa tem características de medição
controlada, (ii) é consistente e os dados são objectivos, e (iii) é orientada para o resultado
generalizado. A investigação qualitativa tem características opostas, na medida em que (i) se baseia
na observação naturalista sem controlo, (ii) o seu resultado não é generalizável, (iii) é orientada para
o processo. A investigação qualitativa é construída usando vários instrumentos de recolha de dados
como a observação, as entrevistas não estruturadas e o questionário. (idem)

No quadro abaixo, estão sintetizadas algumas vantagens e desvantagens destes dois métodos
de investigação:

Tabela-2. Vantagens e inconvenientes dos métodos Qualitativos vs Quantitativos


Métodos Qualitativos Métodos Quantitativos
Tendência para “comunicar com” os sujeitos do estudo Tendência para “se servir dos” sujeitos do estudo

Limita-se a perguntar Limita-se a responder


Comunicação mais horizontal...entre o investigador e os
investigados...maior naturalidade e habilidade de estudar os
factores sociais num cenário natural.
São fortes em termos de validade interna, sendo no entanto débeis São débeis em termos de validade interna-quase nunca se
em validade externa: o que se obtém não é generalizável. sabe se medem o que queremos medir-, no entanto são fortes
em validade externa: o que se obtém é generalizável.
Perguntam aos quantitativos: Quão particularizáveis são os vossos Perguntam aos qualitativos: são os vossos resultados
resultados? generalizáveis?
Quadro—1—Extraído de Fernández, P. S. & Díaz, P. S., (2002; pp.9-76-78), traduzido do Castelhano

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 34


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Após uma referência genérica das abordagens disponíveis, é importante analisar mais
especificamente a investigação qualitativa, justificando a opção pela escolha desta abordagem de
investigação, que pareceu a mais adequada ao tipo de estudo que se realizou.

Na investigação qualitativa utiliza-se uma abordagem interpretativa, naturalista e holística do


mundo. Os seus objectos de estudo são os valores, as crenças, as representações, os hábitos, as
atitudes e opiniões dos indivíduos no seu contexto social. Nesta área, os objectos e questões são
abordados no seu contexto natural, tentando compreender-se ou interpretar-se os fenómenos em
estudo relativamente ao significado que os indivíduos lhes dão.

Bogdan e Biklen (1994, pp.47-51), referem cinco características da investigação qualitativa:

1—Na investigação qualitativa a fonte directa de dados é o ambiente natural, constituindo o


investigador o instrumento principal. Os investigadores introduzem-se no meio que pretendem
investigar, na tentativa de uma melhor compreensão das questões em estudo. Os métodos de recolha
de dados são os mais variados, desde o simples bloco de notas até a gravações áudio e vídeo. Todos
os dados recolhidos são sempre complementados com a informação obtida através do contacto
directo.

2—A investigação qualitativa é descritiva. Os dados recolhidos são em forma de palavras ou


imagens e não de números. Os resultados escritos da investigação contêm citações feitas com base
nos dados para ilustrar e consubstanciar a apresentação. Os dados incluem também as transcrições
de entrevistas, as notas recolhidas no “campo”, fotografias, gravações áudio e vídeo, documentação
pessoal, memorandos e outros registos oficiais. (...) A abordagem da investigação qualitativa exige
que o mundo seja examinado com a ideia de que nada é trivial, que tudo tem potencialidade para
constituir uma pista que nos permita estabelecer uma compreensão mais esclarecedora do nosso
objecto de estudo.

3—Os investigadores qualitativos interessam-se mais pelo processo do que simplesmente pelos
resultados ou produtos. A ênfase qualitativa no processo tem sido particularmente útil na
investigação educacional, ao clarificar a “profecia auto-realizada”, a ideia de que o desempenho
cognitivo dos alunos é afectado pelas expectativas dos professores (Rosenthal e Jacobson, 1968,
citados por Bogdan e Biklen (1994, pp.47-51).

4—Os investigadores qualitativos tendem a analisar os seus dados de forma indutiva. Não
recolhem os dados ou provas com o objectivo de confirmar ou infirmar hipóteses construídas

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 35


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previamente; ao invés disso, as abstracções são construídas à medida que os dados particulares
foram recolhidos e se vão agrupando.

5—O significado é de importância vital na abordagem qualitativa. Os investigadores que fazem


uso deste tipo de abordagem estão interessados no modo como diferentes pessoas dão sentido às
suas vidas. Por outras palavras, os investigadores qualitativos preocupam-se com aquilo que se
designa por perspectivas participantes (Erickson, 1986; ver também Dobbert, 1982), para uma
perspectiva ligeiramente diferente, centrando-se em questões como: “Quais as conjecturas que as
pessoas fazem sobre as suas vidas? O que consideram ser “dados adquiridos”.

A questão central da presente investigação é compreender como se desenvolveu a regulação


da CD do EAE público desde 1971. Assim, a estratégia de investigação mais adequada para o
presente trabalho é a investigação qualitativa, uma vez que se pretendia um contacto directo com
alguns dos participantes no processo, o investigador procurou ter uma visão holística do problema,
utilizando para isso vários métodos de recolha de dados, como as entrevistas e a análise documental
de origem variada (ofícios, legislação, pareceres de especialistas, relatórios oficiais) tendo validado
algum conhecimento empírico sobre a questão central. O “caso” estudado não se repetirá, sobretudo
nas mesmas condições e características, logo os seus resultados não são generalizáveis.

3.2.2. INVESTIGAÇÃO QUALITATIVA—ESTUDO DE CASO

Na investigação em Ciências Sociais podem utilizar-se diversas estratégias de pesquisa, em


função do estudo a fazer. Essas estratégias de pesquisa podem ser: experimental; do tipo “survey”;
pesquisa histórica; análise documental e estudo de caso.

Em função das questões de investigação e quando estas apontam para explicar o “como e o
porquê” de um certo fenómeno social contemporâneo e em que o investigador tem pouco, ou
nenhum controlo sobre este fenómeno, mais o método do estudo de caso se justifica (Yin, 2009,
p.4-13).

É referido pelo mesmo autor, que um Estudo de Caso é uma pesquisa empírica que deve ser
utilizada quando: (i) se se pretende investigar um fenómeno contemporâneo dentro do seu contexto
real; (ii) em que as fronteiras entre o fenómeno e o contexto não são claramente evidentes; (iii) e
múltiplas fontes de evidências podem ser utilizadas.” (Yin, 2005). Estes estudos podem ainda

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 36


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incidir sobre uma organização (ou grupo social) ao longo de um determinado período de tempo, em
que há um relato do seu desenvolvimento (Bogdan & Biklen, 1994, p.90).

Sendo o objectivo do presente trabalho estudar a Carreira Docente do EAE, este caracteriza-
se como um “Estudo de Caso” em que se fez pesquisa histórica, análise documental e recolha de
dados com recurso ao inquérito por entrevista.

O método de investigação utilizado é o método qualitativo. Trata-se, pois, de um exercício


de pesquisa com a finalidade de responder a um determinado problema, produzindo assim um novo
conhecimento sobre uma determinada realidade social que é a Carreira Docente no EAE público
área da Música, e que necessita de urgente atenção. Como já foi referido, até aqui a ausência de
quadro de escola nas escolas públicas do ensino EAE e a sucessiva contratação de docentes, origina
climas de instabilidade pedagógica, tornando difícil a governança das escolas públicas.

3.2.3. TÉCNICAS DE RECOLHA DE DADOS

Para a recolha de dados em Ciências Sociais podem-se utilizar vários instrumentos: os


inquéritos, que recolhem informação oralmente, em forma de entrevista, ou por via escrita, em
forma de questionário; as observações, geralmente directas, em que o investigador está presente no
“objecto” a observar; e a análise documental. Assim, estes instrumentos fornecem-nos “um quadro de
análise para a identificação das técnicas de recolha de dados utilizadas no contexto das metodologias qualitativas”,

(Lessard-Herbert, et al 2005, p.25).

Para efeitos do presente trabalho, os instrumentos para a recolha de dados foram a análise
documental e as entrevistas.

O “corpus” documental analisado foi constituído por documentação oficial do ME, ofícios e
pareceres de um Sindicato, as entrevistas e a legislação aplicável a este tipo de ensino.

A entrevista é definida por vários investigadores como uma conversa entre o investigador e o,
ou os “investigados”, previamente acordada com o entrevistado e estruturada do ponto de vista das
perguntas a fazer. Bogdan & Binklen referem que em investigação qualitativa, as entrevistas podem
ser utilizadas de duas formas: podem constituir a estratégia dominante para a recolha de dados ou
podem ser utilizadas em conjunto com a observação participante, análise de documentos e outras
técnicas (1994, p.134).

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A entrevista poderá ser estruturada ou não. Nas entrevistas estruturadas, as perguntas estão
formuladas de modo a obter-se a informação exacta do que se investiga, não havendo liberdade do
entrevistado em “divagar” sobre o tema. A entrevista não estruturada permite uma maior liberdade
ao investigador para incluir, ao longo da conversa, outras perguntas que surjam no seguimento do
discurso, que tende a ser mais “solto” por parte do entrevistado.

Neste estudo, as entrevistas foram elaboradas segundo a forma semi-estruturada, que é outra
das opções de construção deste instrumento de recolha de dados A entrevista está “orientada para a
resposta não considera de modo absoluto a ordem de aparição das informações no desenvolvimento do processo”
(Lessard-Hérbert, Goyette et Boutin, 2005, p.162). As entrevistas realizadas tiveram como
objectivo encontrar algumas respostas junto dos entrevistados para a compreensão das questões e
dos problemas que afectam a carreira docente do EAE público.

As entrevistas foram registadas em suporte informático para melhor tratamento posterior e


facilitar a sua transcrição. Foram realizadas de acordo com a disponibilidade dos entrevistados e em
locais à sua escolha: no caso do Jurista, este disponibilizou a sua residência, os docentes foram
entrevistados na escola onde leccionam e o sindicalista no seu local de trabalho.

Na entrevista ao Jurista, e dado o seu conhecimento dos problemas do EAE nas várias
vertentes, a conversa deambulou por vezes em aspectos conexos ao tema que estava a ser tratado,
mas como todas as problemáticas se interligam e é difícil falar-se de um aspecto sem referir outro,
acabei por ter material “precioso” para analisar, mas nem todo se revelou pertinente para o tema
aqui estudado. A entrevista ao Docente I, apesar de alguns factos já não estarem tão presentes na
memoria do entrevistado, revelou-se um contributo muito útil para este trabalho. O Docente II, em
virtude do seu percurso por várias direcções da EMCN, forneceu-me dados de extrema importância,
nomeadamente no que ao Decreto-Lei nº 234/97, de 3 de Setembro, diz respeito, uma vez que fez
parte do grupo de trabalho, integrado pelas direcções das escolas públicas, que elaborou o projecto
do diploma.

A qualidade das gravações, permitiu fazer transcrições fidedignas daquilo que foi dito pelos
entrevistados e assim obter os dados relevantes para análise.

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 38


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3.2.4. ANÁLISE DOS DADOS

Bardin questiona; “O que é a análise de conteúdo actualmente?, respondendo que ele é “Um conjunto de
Instrumentos metodológicos cada vez mais subtis em constante aperfeiçoamento, que se aplicam a «discursos»
(conteúdos e continentes) extremamente diversificados”. (Bardin, 2008, p.11)

Após a fase inicial de recolha de dados, há necessidade de os inventariar e classificar de


forma a poderem ser analisados com coerência. Para tal, há que codificar o material recolhido,
sendo que “A codificação corresponde a uma transformação”. (idem, p.129). Estabelecem-se categorias de
codificação para melhor interpretação do conteúdo recolhido pelos instrumentos utilizados.

No presente trabalho, procedeu-se a uma análise de conteúdo das entrevistas, com base na
perspectiva de que à medida em que os dados vão sendo lidos, “repetem-se ou destacam-se certas
palavras, frases, padrões de comportamento, formas dos sujeitos pensarem e acontecimentos (...) “sendo” estas
palavras ou frases categorias de codificação”. (Bogdan, Biklen 1994, p.221).

Para validar os dados recolhidos e posteriormente analisados recorre-se à triangulação


desses mesmos dados. Araújo, et al, (2009, p.19) citando Yin, (1984) refere que “A necessidade de
triangulação surge da necessidade ética para confirmar a validade dos processos. Em estudos de caso, isto pode ser
feito utilizando várias fontes de dados” (Araújo, et al, 2009, p.19) citando Yin (1984). Assim, para uma
melhor credibilização das interpretações feitas pelo investigador, este deverá utilizar protocolos de
triangulação. Denzin (1984) citado por Araújo, et al, (2009, p.19) identificou quatro tipos de
triangulação:

(i)triangulação das fontes de dados, em que se confrontam os dados provenientes de diferentes


fontes;

(ii)triangulação do investigador, em que entrevistadores/observadores diferentes procuram detectar


desvios derivados da influência do factor “investigador”;

(iii)triangulação da teoria, em que se abordam os dados partindo de perspectivas teóricas e


hipóteses diferentes;

(iv)triangulação metodológica, em que para aumentar a confiança nas suas interpretações o


investigador faz novas observações directas com base em registos antigos, ou ainda procedendo a
múltiplas combinações “inter-metodológicas” (aplicação de um questionário e de uma entrevista
semi-estruturada, etc, etc).

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 39


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A validação dos dados é importante para que outros investigadores possam chegar às
mesmas conclusões, utilizando os mesmos instrumentos de pesquisa. No entanto, por o presente
trabalho ser um estudo de caso de carácter qualitativo, as conclusões dizem respeito apenas ao
contexto investigado, não podendo ser generalizáveis, (como já referi).

Para proceder à análise de conteúdo, utilizei a Triangulação das fontes de dados, recolhidos
nas entrevistas, na legislação e na documentação. Para as entrevistas, elaborou-se uma grelha de
categorização segundo as questões de investigação. Assim, oito grandes categorias foram
encontradas e organizadas da seguinte forma: quatro categorias analisadas por período de tempo
que se pretende investigar; uma para a Actualidade; uma para a Carreira Docente; uma categoria
para análise do EPC; e finalmente uma última categoria – Sindicalista - que é transversal às
restantes nos diversos períodos de tempo.

Na categoria Experiência Pedagógica de 1971, foi meu objectivo identificar o que levou à
sua implementação, quais as linhas orientadoras e as alterações entretanto introduzidas; na categoria
Decreto-Lei nº 310/83, de 1 de Julho, saber a sua origem e os pressupostos que levaram à sua
elaboração e pormenores da aplicação; na categoria Decreto-Lei nº 344/90, de 2 de Novembro,
perceber a origem e os pressupostos; na categoria Decreto-Lei nº 234/97, de 3 de Setembro, em
primeiro lugar saber a sua origem, quais os resultados da aplicação e consequências para o futuro,
bem como saber quais os pressupostos, o nível de participação e o papel desempenhado pelos vários
actores; na categoria Actualidade, saber como se está a processar o provimento dos quadros das
escolas; na categoria carreira docente, perceber se houve progressão dos docentes e que tipo de
formação foi oferecida; na categoria EPC fazer uma análise comparativa dos estatutos dos seus
docente em relação aos docentes do ensino público; e, por, fim na categoria Intervenção Sindical,
perceber qual o papel desempenhado pelas estruturas representantes dos docentes na defesa dos
seus interesses.

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 40


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Quadro das Categorias, Subcategorias e respectivos códigos:

Categorias Sub-Categorias Siglas

Origem EP-O
Experiência Alteração e Percepção EP-AP
Pedagógica
Linhas Orientadoras/Pressupostos EP-LoP
Origem 310-O
Quadro/Contratações 310-QC
Decreto Lei nº 310/83 Aplicação 310-A
Origem/Pressupostos 310-OP
Horário Lectivo 310-HL
Decreto Lei nº 344/90 Origem/Pressupostos 344-OP
Origem 234-O
Quadros/Contratação 234-QC
Pressupostos/Docentes 234-PD
Pressupostos/Sindicatos 234-PS
Pressupostos/Tutela 234-PT
Decreto Lei nº 234/97 Participação/Docentes 234-PaD
Participação/Sindicatos 234-PaS
Participação/Tutela 234-PaT
Papel/Docentes 234-PpD
Papel/Sindicatos 234-PpS
Papel/Tutela 234-PpT
Actualidade Quadros Concursos Actu-QC

Carreira Docente Progressão/Formação CD-PF


Legislação do Ensino
Particular e Análise da Legislação AL-EPC
Cooperativo
Habilitações-Quadros H-Q
Habilitações-Problemática H-P
Categorias-Sindicalista Quadros-Concursos 69-QC

Concursos Públicos 69-CP

Quadro-2-Categorias e Sub – Categorias de Investigação

Para melhor compreensão dos extractos das entrevistas, adoptei a seguinte codificação: para
os docentes aparecerá em cada citação (entr. D, I ou II, 2, 3) em que os dígitos informam o número
da respectiva página da transcrição; para o Jurista será (entr. J, 1, 2, 3); finalmente para o
sindicalista (entr. S, 1, 2).

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 41


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Que Regulação?

3.2.5. CARACTERIZAÇÃO DOS PARTICIPANTES E GUIÕES DE ENTREVISTA

Os participantes neste estudo foram: (i) um professor do EAE público, a exercer funções em
escolas do EAE de música durante a introdução da EP de 1971; (ii) um professor que conta com
mais de vinte e seis anos de serviço, cuja carreira foi abrangida pela reforma introduzida pelo
Decreto-Lei nº 310/83, de 1 de Julho; (iii) Ao nível da Tutela o Jurista que contribuiu para a
redacção final deste diploma; (iv) Uma associação sindical que apoiou os docentes em momentos
chave de negociação com a Tutela.

A todos estes participantes foi realizada uma entrevista semi-estruturada, com base em
guiões estruturados a partir das questões de pesquisa e que a seguir se apresentam.

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Que Regulação?

GUIÕES DE ENTREVISTA

Guião utilizado na entrevista aos docentes:

Bloco Objectivos Tópicos


Bloco I Informar sobre o enquadramento da
entrevista.
Esclarecer sobre o tema do trabalho e
Informar sobre o objectivo da
sobre o destino da entrevista.
Justificação da entrevista e entrevista.
Apurar o protagonismo do entrevistado
motivação do entrevistado Sublinhar a importância do
na problemática em estudo.
contributo do entrevistado.
Garantia de confidencialidade.
Bloco II Formação académica e profissional; -Recolher dados pessoais e
Obter informações sobre os dados dados relevantes para a percepção da profissionais.
pessoais e profissionais motivação profissional.
Bloco III -Relação laboral entre a escola, a
Perceber se com a integração do Direcção e o docente;
Experiência Pedagógica 1971 EAE no ensino geral, os docentes de -Vínculo do docente à escola;
Inovação e percepção sobre as música poderiam ter começado a -Progressão na carreira;
inovações delinear uma carreira adequada às -Funções em cargos de coordenação;
suas especificidades. -Relação laboral com os docentes não
vinculados;
- Houve alguma tentativa de criação de
uma carreira docente com a Exp.
Pedagógica de 1971?
Bloco IV
-Mudanças verificadas com a
introdução da Exp. Pedagógica de
1971;
Perceber se com a introdução do
-Aspectos positivos da Exp. Pedagógica
EAE no ensino geral, os docentes de
Experiência Pedagógica 1971 de 1971;
música sentiram algumas mudanças a
Inovação e percepção sobre as -Que alteração foi sentida nas
nível das condições de trabalho,
inovações. condições de trabalho com a
quais os aspectos positivos da EP,
Experiência Pedagógica de 1971;
quais os resultados práticos .
-Resultados a longo prazo desta
experiência pedagógica na carreira
docente;

Bloco V Averiguar que contributos foram -Participação na construção da carreira


pedidos aos docentes e a reacção docente;
Experiência Pedagógica 1971 destes perante o desafio de -Efeitos práticos dessa participação;
Participação dos Docentes. contribuírem para a construção da -Consequências negativas e positivas
sua carreira. das medidas adoptadas.
Bloco VI Perceber o envolvimento dos -Como teve conhecimento da
professores, assim como a vontade preparação deste Dec. Lei?
destes em contribuírem para a -Houve discussão do documento?
Decreto Lei 310/83 participação elaboração de um documento final -Foi pedido o contributo dos docentes
dos Docentes que fosse consensual. para a sua elaboração?
-Esses contributos (caso tenham
havido) foram tidos em conta para o
documento final?

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Que Regulação?

Bloco VII -Que alterações foram introduzidas na


carreira pelo “310”?
-Como foi recebido o “310” pelo corpo
Docente?
Decreto Lei 310/83 -Este Dec. Lei previa um conjunto de
Alterações e percepção sobre as Perceber que alterações foram legislação para a sua completa
alterações introduzidas com o Dec. Lei 310 e aplicabilidade. O facto de não ter sido
perceber s efeitos dessas alterações. publicada poderá ter desvirtuado o seu
objectivo?
-A partir da implementação do “310” os
professores tiveram acesso à carreira
docente com todos os seus direitos e
deveres?
Bloco VIII -Após a publicação e implementação do
“310” houve alguma iniciativa da parte
dos docentes para a criação de uma
carreira docente adaptada à
Depois do Dec. Lei 310/83 Perceber se houve alguma iniciativa especificidade do professor de música?
Participação dos Docentes. dos docentes em alterar a situação da -Os docentes fizeram propostas à tutela
sua carreira. para que se produzisse uma alteração da
realidade?
-O corpo docente envolveu-se em
bloco, ou foi uma iniciativa das
direcções?
Bloco IX -O D.L. 344/90 foi previamente
discutido com os Docentes?
-Foi pedido às escolas algum contributo
Perceber que receptividade tiveram para o seu texto final?
Elaboração do Dec. Lei 344/90 algumas iniciativas da tutela perante -O Dec. Lei 344/90, previa no nº 2 do
Participação dos Docentes e as escolas e como foi acolhido o Dec. Artº. 34º a criação de estatutos
percepção sobre as inovações Lei 344/90. especiais para os docente,
nomeadamente Prof. Concertista e Prof.
Compositor: Como foram aceites estas
alterações?
Bloco X -Como surgiu o Dec. Lei 234/97?
-Foi uma proposta do ME?
-Ou foi uma proposta dos docentes?
Perceber como surge o D.L 234/97, -Houve discussão do projecto?
quem o propôs, que contributo foi -Correspondeu às necessidades dos
dado pelas escolas e pelo corpo docentes?
Dec. Lei 234/97 docente. -Em virtude de haver tantos Docentes a
Origem e participação contrato e com habilitações diversas
foram acautelados todos os casos?
-As organizações sindicais deram
algum contributo?
-Se houve propostas de alteração, estas
foram consideradas na versão final?

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Que Regulação?

Bloco XI -Foram criados os quadros de escola


como a legislação previa?
-O Dec. Lei 234 resolveu a situação de
No seguimento do “234” saber se uma parte do corpo docente e os
Dec. Lei 234/97 toda a legislação foi cumprida e se restantes como ficaram vinculados à
Inovação e percepção sobre as houve uma continuidade no processo escola?
inovações e o desenvolvimento de criação dos quadros de escola. -Houve legislação posterior para
futuro. concluir o processo de integração dos
Professores numa carreira docente de
acordo com a sua especificidade de
ensino?
-Qual a situação actual?
Quadro-3 Guião de entrevista aos docentes.

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Que Regulação?

Guião utilizado na entrevista ao Jurista:

Blocos Objectivos Tópicos


Bloco I Informar sobre o enquadramento da
entrevista. Esclarecer sobre o tema do trabalho e
Informar sobre o objectivo da qual o destino da entrevista.
Justificação da entrevista e entrevista.
Apurar o protagonismo do entrevistado
motivação do entrevistado Sublinhar a importância do
na problemática em estudo.
contributo do entrevistado.
Garantia de confidencialidade.
Bloco II Formação académica e profissional; Recolha de dados pessoais e
dados relevantes para a percepção da profissionais;
Dados pessoais e profissionais motivação profissional. Formação Académica.

Bloco III Perceber como surge este diploma e a


Decreto Lei 310/83 -O que está na origem do Dec. Lei 310
justificação política
Origem
Bloco IV
Perceber quais os objectivos da -Que linhas orientadoras foram definidas
Decreto Lei 310/83
tutela. pela tutela?
Linhas orientadoras
Bloco V -No documento final são apresentados
em dez pontos os pressupostos e
objectivos do “310”. Destes dez pontos
Decreto Lei 310/83 Apreender a evolução da redacção do só cinco fazem parte do preâmbulo de
Pressupostos e Objectivos texto do Dec. Lei. um ante-projecto apresentado aos
docentes. A sua redacção não estava
concluída ou houve alguma razão
especial para que assim fosse?
Bloco VI Perceber se os docentes foram -Houve consulta aos docentes dos
consultados sobe este projecto de conservatórios sobre o texto do “310”?
Decreto Lei 310/83 diploma. Como foi acolhido pelos professores a
Participação dos Docentes possibilidade de integrarem um quadro
estável, embora transitório?
Bloco VII -Por que razão não foi publicada
legislação que desse continuidade ao
Saber qual razão não porque foi
Dec. Lei 310/83 quadro transitório no sentido da criação
publicada a legislação prevista para
Quadros de Pessoal Docente dos quadros de escola e estabelecimento
dar continuidade à reforma prevista
das regras de acesso a esses quadros?
Quadro-4-Guião de entrevista ao Jurista

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Que Regulação?

Guião utilizado na entrevista ao Sindicalista:

Blocos Objectivos Tópicos


Bloco I Informar sobre o enquadramento da Esclarecer sobre o tema do trabalho e qual
entrevista. o destino da entrevista.
Justificação da entrevista e Informar sobre o objectivo da entrevista. Apurar o protagonismo do entrevistado na
motivação do entrevistado Sublinhar a importância do contributo problemática em estudo.
do entrevistado.
Garantia de confidencialidade.
Bloco II -Recolha de dados pessoais e
Recolher informações sobre formação profissionais;
académica e profissional; dados -Formação Académica.
Dados pessoais e profissionais relevantes para a percepção da -Funções que desempenha e desde
motivação profissional e para o cargo quando?
que desempenha.

Bloco III -Há memória de o sindicato ter sido


informado ou consultado sobre a redacção
Saber se o Sindicato desempenhou um final do Dec. Lei 310/83?
Carreira e período anterior à papel activo na construção de uma -Na ausência de legislação posterior a este
publicação do Dec. Lei 310. carreira Docente para o EAE. Dec. Lei o sindicato teve alguma iniciativa
junto da tutela para salvaguardar os
interesses profissionais dos docentes do
EAE público?
Bloco IV -Como é que esta organização sindical tem
apoiado as iniciativas dos docentes do
EAE?
-Apesar destes Docentes representarem
uma minoria, têm estes conseguido
juntamente com o sindicato resolver junto
Participação dos Sindicatos. Perceber que apoios o sindicato tem da tutela os problemas laborais,
Apoio Sindical aos Docentes do dado aos docentes do EAE. nomeadamente a questão da carreira
EAE. Docente?
-Tem o sindicato apresentado, tanto aos
Docentes como à tutela propostas nesta
área?
-O sindicato tem conhecimento de outras
iniciativas dos Docentes do EAE para
regularizar a relação laboral, ou seja,
iniciativas para a criação de uma carreira
Docente que atenda às especificidades do
EAE?
Bloco V Perceber a envolvência do sindicato nas -O Dec. Lei 234/97 foi uma iniciativa dos
iniciativas da tutela e dos docentes docentes apoiada pelo sindicato?
Quadro -Que iniciativas o sindicato tomou junto
Decreto Lei 234/97 da tutela em apoio a este diploma legal?
Bloco VI Perceber as iniciativas do sindicato no -O sindicato tem desenvolvido alguns
que se refere à criação de um quadro. esforços no sentido de ajudar os docentes
Iniciativas sindicais a ultrapassar os problemas criados pela
falta de vínculo aos quadros de escola?
Quadro-5-Guião de Entrevista ao Sindicalista

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PARTE II—APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS DADOS

1. MÚSICO/PROFESSOR DO EAE – FORMAÇÃO INICIAL E CONTÍNUA

1.1. FORMAÇÃO INICIAL

Ser “profissional” significa ser-se especialista em determinada área, resultando daí um modo
de vida e de subsistência a nível financeiro.

Para o exercício de uma profissão, o “profissional” tem de possuir um saber especializado,


que foi obtido através de uma formação e que lhe forneceu os instrumentos teóricos e práticos que
deverá dominar obrigatoriamente. O profissional tem de afirmar-se perante a sociedade exercendo a
sua actividade pelo bem comum e nunca por interesses pessoais (Dias, 2008).

Ser professor “profissional” implica uma dedicação preponderante ao ensino. No entanto,


está na tradição dos professores dos conservatórios, para além desta actividade, serem músicos
profissionais, pertencendo a formações artísticas permanentes ou integrando ocasionalmente
agrupamentos de câmara, ou orquestras ou ainda desenvolvendo uma carreira como solistas.

Esta dualidade de músico/professor “resulta da interacção e do cruzamento de múltiplos factores,


sociais, culturais, estáticos, formativos, profissionais e individuais, que têm, como pano de fundo, determinadas
concepções do que é ser-se músico e das condições do exercício das profissões artísticas” (Vasconcelos, 2000,
p.145).

Os conservatórios de Lisboa e Porto foram, durante grande parte do séc. XX, as únicas
escolas públicas que ministraram o EAE. Os seus professores, nomeadamente no conservatório de
Lisboa, eram na sua maioria membros da então Orquestra Sinfónica da Emissora Nacional, para os
instrumentos de cordas, ou pertencentes às bandas de música militares mais importantes, para os
instrumentos de sopro. As competências reconhecidas a estes profissionais enquanto tal não se
poderão pôr em causa. No entanto, a sua formação pedagógica/científica era inexistente:
transmitiam o seu conhecimento do mesmo modo como o tinham recebido, ou seja, de forma
empírica, sem bases científicas ou pedagógicas. Vasconcelos refere também que “Os músicos eram
contratados para o desempenho destas funções (lectivas) pela excelência e visibilidade, real ou simbólica, do seu
desempenho artístico - musical, mais do que ser portador de formação pedagógica” (2000, p.147). Com a
inexistência, no ensino, da vertente pedagógica - didáctica do instrumento, também não se podia

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 48


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exigir a estes músicos/professores que tivessem conhecimentos científicos aplicáveis à sua


especialidade.

Esta vertente começou a ser ministrada no ensino superior, aquando do aparecimento das
escolas superiores de Música, Lisboa e Porto na segunda metade da década de 80 e a disciplina da
pedagogia do Instrumento iniciou-se em 1993 na Secção Autónoma de Comunicação e Arte
(licenciatura em música) da Universidade de Aveiro14. Como já foi atrás mencionado, as acções de
profissionalização foram implementadas para estes docentes muito mais tarde, já na passagem para
o séc. XXI.

Referiu-se também que a primeira acção de profissionalização foi realizada ao abrigo da


Portaria nº 916/98, de 20 de Outubro para os docentes do ensino público e do Ensino Particular e
Cooperativo (EPC). Esta acção abrangeu um número reduzido de docentes em relação ao esperado,
em virtude do curto espaço de tempo que mediou entre a publicação do aviso de abertura e o início
propriamente dito da acção. Muitos dos docentes não terão conseguido reunir em tempo útil toda a
documentação necessária à candidatura, sobretudo os pertencentes ao EPC15.

Uma segunda acção foi realizada em 2003, desta vez dedicada exclusivamente aos docentes
do EPC, que desta vez foi mais participada do que da anterior. No entanto, poderá ter havido falta
de informação e divulgação por parte das direcções de algumas escolas, porque a Associação de
Estabelecimentos de Ensino Particular (AEEP) e as direcções regionais, informaram
atempadamente as escolas das datas em que se iria realizar o concurso, as escolas por razões várias
não propuseram mais docentes. Uma das razões poderá ter sido por exemplo, os professores que
frequentassem a profissionalização terem direito a uma redução do horário lectivo, facto que iria
implicar a contratação de professores para as horas remanescentes, onerando o orçamento das
escolas.

Finalmente, a última acção de profissionalização realizou-se no biénio 2008/2010,


exclusivamente para os docentes do ensino público (Aviso nº 22490/2008, de 26 de Agosto).

Apesar de os sucessivos governos se empenharem em resolver esta lacuna na formação dos


docentes do EAE público, havia ainda em 2008 um número considerável de docentes com
experiência comprovada e sem acesso à profissionalização. Este facto é reconhecido no Despacho

14
Fonte da Universidade de Aveiro (2011).
15
Estes têm o dever profissional de validarem anualmente as declarações de tempo de serviço passadas pela escola ou
escolas onde leccionem e enviá-las posteriormente às direcções regionais competentes, para sua homologação. São estes
documentos que comprovam os anos de serviço necessários para o processo de admissão ao concurso.

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 49


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Que Regulação?

nº 13020/2008, de 8 de Maio, que no seu preâmbulo reconhece a existência (continuada), no ensino


público, de um número significativo de professores do EAE das áreas da música e da dança,
possuidores de conhecimentos técnico/científicos “adequados à docência” assim como uma
importante experiência profissional, que se viram privados ao longo dos anos de conseguirem
aceder às acções de profissionalização. Assim, este diploma vem nos números 1 a 3 definir a
dispensa de profissionalização aos docentes do ensino público e reconhecer a sua competência
profissional.

No que diz respeito a habilitações profissionais, estas obtiveram-se inicialmente na


Universidade de Aveiro, primeira instituição de ensino superior a criar o grau de licenciatura para o
EAE, com estágio integrado. Actualmente, há instituições de ensino superior que oferecem no 2º
ciclo de estudos (grau de mestre) um estágio profissional, com a finalidade de dotar os profissionais
da música de um complemento que os habilita também para o ensino.

1.2. FORMAÇÃO CONTÍNUA (EAE PÚBLICO)

A aprendizagem ao longo da vida é um tema que tem sido discutido em várias cimeiras
europeias, nomeadamente na cimeira que se realizou na capital portuguesa e que ficou conhecida
pela “Cimeira de Lisboa 2000”. Aí se debateu a coesão social, o emprego, os seus constrangimentos
e soluções para o futuro, assim como uma estratégia para implementar os mecanismos para a
“Europa do Conhecimento”, ou seja uma Europa competitiva sobretudo apoiada fortemente pelas
novas tecnologias da informação. Das conclusões desta cimeira foi aprovado o programa “Educação
e Formação 2010”.

Num relatório elaborado em Março de 2004, dirigido ao Conselho Europeu sobre o


programa “Educação e Formação 2010”, é referida a importância da formação docente e como esta
formação deverá tornar a profissão de professor mais atractiva e aliciante. Para isso devem os
estados membros:

“sempre que necessário e nos termos da legislação e práticas nacionais, implementar acções para
tornar mais atractiva a profissão de docente e de formador, inclusive tomando medidas destinadas a atrair
e reter os melhores talentos, inclusive oferecendo condições de trabalho aliciantes e uma carreira
adequadamente estruturada e com boas perspectivas de evolução.”16

16
Relatório "Educação e Formação para 2010" A Urgência das reformas necessárias para o sucesso da Estratégia de
Lisboa, Bruxelas (2004).

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 50


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Que Regulação?

No ensino, há muito que as Tecnologias de Informação e Comunicação, vulgarmente


chamadas de TIC, são uma importante ferramenta de trabalho e com a aplicação destas novas
tecnologias surge um novo paradigma para a educação em todas as suas especialidades, com a
necessidade de realização de acções de formação para todos os intervenientes no acto educativo,
nomeadamente no EAE em geral.

As acções de formação têm contribuído para essa aprendizagem, mas para os docentes do
EAE público (área da música), as acções de formação específicas à sua especialidade têm sido
escassas. É certo que aprender a trabalhar com as novas tecnologias e direccioná-las para a sala de
aula é importante, saber como se elabora um projecto educativo de escola também é de grande
utilidade, mas há que considerar todo o trabalho que um professor/músico realiza na preparação de
uma apresentação pública. Essa preparação implica pesquisas a vários níveis: análise musical das
obras a interpretar, investigação ao nível do compositor, adaptação das suas características de
instrumentista à obra, à tipologia da sala, ao agrupamento que vai integrar e o tempo de preparação.
As diversas escolas de música, sejam elas públicas ou do EPC, organizam anualmente diversos
cursos de aperfeiçoamento, ministrados por professores tanto nacionais como estrangeiros de
qualidade reconhecida e até ao presente a participação dos docentes nestes eventos não foi ainda
reconhecida como formação17.

Na contabilização de todo este trabalho deverá ser encontrado um mecanismo, no sentido de


serem atribuídos créditos válidos para a progressão na carreira. Será necessário uma maior
organização e exigência dos docentes, para, quer por iniciativa exclusiva das escolas, quer em
colaboração das organizações sindicais, negociar com o ME formas de validar este tipo de
“aprendizagem”.

17
Exceptua-se o Instituto Gregoriano de Lisboa, que em associação com um centro de formação para professores, tem
vindo a proporcionar acções de formação específicas para o EAE, área da música. Pode-se considerar um exemplo de
regulação autónoma que vem ao encontro das necessidades reais dos docentes.

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 51


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Que Regulação?

2. CARREIRA DOCENTE DO EAE, ÁREA DA MÚSICA: QUE REGULAÇÃO?

2.1. DA “EXPERIÊNCIA PEDAGÓGICA DE 71” ATÉ À APLICAÇÃO DO DECRETO-


LEI Nº 69/2009, DE 20 DE MARÇO.

2.1.1. A EXPERIÊNCIA PEDAGÓGICA DE 1971

Na primeira década de 60 do séc. XX viveram-se, a nível académico, tempos de contestação


estudantil que começavam a abalar o regime autoritário de índole fascista denominado “Estado
Novo” instalado no poder desde 1933, no seguimento do golpe militar (Revolução Nacional)
perpetrado em 28 de Maio de 1926, que pôs termo à Primeira República.

Nos finais da década de sessenta e início da década de setenta, o regime, fragilizado com o
desaparecimento do seu ideólogo em 1969, começou a sofrer pressões internas e externas, para “Por
um lado, conceder o acesso de todos à educação, por outro, Portugal pelos acordos que tinha firmado no exterior,
nomeadamente com a EFTA e OCDE, era pressionado para a prática de políticas que conduzissem à modernização do
país”. (Vieira, 2003, p.30) Nesse sentido o Professor Veiga Simão, Ministro da Educação em
funções à época, idealiza uma reforma do ensino, que será apresentada ao país pelo sucessor de
António de Oliveira Salazar, o Professor Marcello Caetano. Este, num discurso radiofónico,
proferido a 17 de Janeiro de 1970, declara conduzir “a grande e decisiva batalha da educação” (Machado
1973, p.6), citado por Stoer (1973, p.793).

A Reforma de Veiga Simão, como é conhecida, foi apresentada pelo próprio no ano de
1971, desta vez na televisão, e focava as opções reformadoras do ensino. O Projecto do Sistema
Escolar e as Linhas gerais da Reforma do Ensino Superior, passou a lei em 1973, (Lei nº 5/1973,
de 25 de Junho), não antes de ter sido amplamente debatido publicamente e largamente apresentado
à nação, como refere Rita Pinto Leite:

“Bastará dizer que se tornou necessário imprimir 50.000 exemplares de cada um daqueles
projectos, sem contar com a larga difusão que a imprensa deu ao seu texto integral. Pode afirmar-se que
aqueles textos programáticos foram entregues à Nação Inteira”. (Leite 1973, p. x. citado por Stoer 1983,
p. 803).

Esta Reforma que estava em preparação foi posta em prática mesmo antes de ser transposta
para lei. Ela é abrangente, contemplando também o ensino artístico, sendo nomeada em 1971, pelo
Ministério da Educação Nacional, uma comissão com a finalidade de reestruturar esta área do

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 52


Carreira Docente no Ensino Artístico Especializado—Área da Música
Que Regulação?

ensino que se encontrava desactualizada desde 1930. Denominava-se então por Comissão
Orientadora da Reforma do Conservatório Nacional (CORCN) e foi presidida pela Drª. Madalena
de Azeredo Perdigão.

Nessa reforma, embora tal não esteja explícito na Lei nº 5/1973, de 25 de Junho, prevê-se a
criação de três tipos de liceus, cada um com a sua especialidade, a saber: “Liceu Clássico, Liceu Técnico
e Liceu Artístico” (Gomes, 2002, p.153). Os liceus artísticos englobariam os conservatórios e
ministrariam a área da música, assim como outras áreas de expressão artística, com equivalência ao
actual 12º ano. Ficaria, assim, inserida a aprendizagem das artes no ensino geral, à semelhança de
outros países europeus. No entanto, esta medida não chegou a ser implementada.

Entre 1972 e 1974 uma extensão da Escola Francisco Arruda foi incluída no CN ao abrigo
da “Experiência Pedagógica de 1971”. Esta experiência começou de modo atribulado, por não ter
havido o planeamento necessário para adequar as instalações ao aumento significativo de alunos e à
introdução do novo plano de estudos que a “Experiência Pedagógica” propunha. A sua execução
teve várias falhas importantes, como por exemplo, o facto de a legislação de suporte à “reforma”
nunca ter sido publicada, o que implicou a não oficialização dos seus planos de estudo. Para
implementar esta “reforma” que recuperava de certa forma a estrutura da reforma de 1919 de Viana
da Mota e Luís de Freitas Branco, houve necessidade de recrutar novos docentes, não só para as
novas disciplinas que foram introduzidas, também para aquelas que estavam desprovidos de
professor, pois havia alguns instrumentos, como já foi referido, que não tinham docente
especialista.

Dos docentes que à época da “Experiência Pedagógica” ensinavam no CN, poucos eram os
que estavam vinculados ao quadro, permanecendo os restantes a contrato, situação em que se
encontravam não só os recentemente admitidos, mas como alguns dos professores mais antigos. O
clima que se vivia no CN não era o melhor, em virtude da insegurança laboral e indefinição
pedagógica. Assim, instalou-se a desmotivação e com a alteração do quadro político verificado com
o 25 de Abril de 1974, a “reforma” ficou ainda mais fragilizada. A Comissão Orientadora da
Reforma do Conservatório Nacional apresentam a demissão e a regulação autónoma passou a
dominar as escolas do CN, como aconteceu com as escolas em geral: “Um movimento social muito
diversificado e descentrado que punha em causa a lógica reformista do Estado antecipou-se aos seus desígnios e
consumando as mudanças independentemente dos normativos”. (Barroso, 2003, p.66)

Após uma ausência de autoridade face aos movimentos auto-denominados de


revolucionários e progressistas que tomaram conta de grande parte das estruturas nacionais, a tutela

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 53


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Que Regulação?

regula gradualmente, na tentativa de legitimar as novas formas de gestão escolar saídas dos
plenários e eleitas democraticamente por toda a comunidade escolar. O Decreto-Lei nº 221/74, de
27 de Maio, é exemplo dessa tentativa, quando no seu preâmbulo considera urgente o apoio das
iniciativas democráticas para a estabilização dos órgãos de gestão da escola e para que estes sejam
representativos de toda a comunidade escolar, mesmo que outras medidas possam ser tomadas no
sentido de regularizar “a vida académica nos diversos níveis de ensino”. Legitima assim os órgãos
eleitos democraticamente, transferindo temporariamente para as escolas o poder de regulação.

Também no CN, após a demissão da CORCN, a regulação autónoma exerceu-se com base
em comissões mistas de docentes e alunos, eleitas anualmente. No entanto, e apesar de o poder de
regulação estar do lado das comissões, estas não conseguiram criar as condições de vínculo dos
professores a um quadro de escola e à criação de uma carreira docente. Se havia uma integração do
ensino artístico no ensino geral, seria normal que os professores das áreas artísticas viessem a ter as
mesmas condições que os restantes professores das áreas académicas, o que não aconteceu.

No que diz respeito ao horário lectivo, o Decreto-Lei nº 18881/30, de 25 de Setembro,


define no seu art. 25º a carga horária em 12 horas semanais para os professores da secção de Música
podendo haver, em caso de necessidade, lugar à leccionação de até mais 6 horas suplementares por
semana em regime de acumulação, sendo-lhes “atribuída uma gratificação proporcional ao número de horas
em excesso...”. (Este horário de 12 horas manter-se-á durante a Experiência Pedagógica de 1971 e até
à publicação do Decreto-Lei nº 310/83, de 1 de Julho).

Em 1977 é criada nova comissão de reestruturação do CN abrangendo todas as escolas, com


a finalidade de se elaborar uma proposta de profunda reforma do ensino artístico. A escola de
música, tendo uma opinião contrária às decisões tomadas pelos restantes membros da comissão,
apresenta um projecto de reforma só para a área da música, visando a sua autonomia. No ano de
1978, todos os contratos de docentes não pertencentes ao quadro são revogados, tendo sido aberto,
no ano seguinte, concurso de acesso para o preenchimento das vagas, concurso esse em que os
docentes foram readmitidos na quase totalidade.

O Ministério da Educação, vendo a impossibilidade de governança das comissões, nomeia,


durante dois anos consecutivos, gestores para exercerem uma regulação de controlo, de modo a
viabilizar a continuidade do Conservatório Nacional. Findo este período, e com a demissão do
último gestor, dá-se nova alteração na regulação do CN, com a nomeação de uma nova comissão de
reinstalação da instituição, composta pelas comissões directivas das quatro escolas que co-

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 54


Carreira Docente no Ensino Artístico Especializado—Área da Música
Que Regulação?

habitavam no edifício dos Caetanos. Após um ano de trabalhos, é concedida a tão esperada
autonomia à Secção de Música do Conservatório Nacional, com a finalidade de ser elaborada mais
uma proposta de reforma para o ensino da música, tendo inclusivamente sido destacado um Jurista
para o devido apoio técnico. Desse trabalho resultou o Decreto-Lei nº 310/83, de 1 de Julho.

2.1.2. O DECRETO-LEI Nº 310/83, DE 1 DE JULHO.

Os docentes do EAE público viveram sempre em permanente clima de instabilidade


laboral18. Os professores com vínculo aos quadros foram sempre uma minoria em relação aos
contratados. Quando a “Experiência Pedagógica de 71” foi implementada, os professores
contratados à época só foram vinculados com o Decreto-Lei nº 310/1983, de 1 de Julho e foi
também esta a primeira legislação que veio criar uma situação de estabilidade ao corpo docente das
quatro escolas públicas do EAE que existiam à época no continente. (Os conservatórios de Aveiro e
Coimbra só passaram a escolas públicas em 1985 e 1986, respectivamente).

Não sendo objectivo deste trabalho fazer uma análise aprofundada do Decreto-Lei nº
310/1983, de 1 de Julho, será no entanto necessário dar-lhe alguma atenção no que diz respeito às
alterações que introduziu na vinculação dos docentes. Assim, pode ler-se no artigo 1º, que o
objectivo do diploma é reestruturar o ensino das várias artes ministradas no CN, (e escolas afins)
uma vez que o seu estatuto ainda se rege pela reforma de 1930, com algumas alterações pontuais.
Refere que o regime de Experiência Pedagógica, instituído em 1971, veio reorganizar os planos de
estudos, actualizando-os, tentando também integrar o ensino das artes no ensino geral, criando ao
mesmo tempo as escolas de Dança, Cinema e Educação pela Arte, estando esta última vocacionada
para a formação de professores. Salienta também os resultados positivos desta experiência, mas o
enfoque é para os “diversos factores que condicionaram e diminuíram o seu alcance”, tais como as instalações
precárias e a dificuldade de gestão da instituição, em virtude da ineficácia das estruturas
administrativas e pedagógicas.

Assim, considera-se que a solução para estes problemas terá de passar pela definição do
estatuto dos diversos tipo de ensino e do estatuto do pessoal docente do EAE público. Tendo o
ensino especializado, sido integrado nos diversos níveis do ensino geral, os seus docentes foram
integrados nas carreiras docentes dos respectivos níveis, com os mesmos direitos e obrigações dos

18
Refira-se que esta situação era comum a toda a classe de professores do ensino básico e secundário.

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 55


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Que Regulação?

seus pares. Embora para isso fosse necessário produzir regulamentação complementar ao diploma
(o que só muito tardiamente se veio a verificar).

Este importante documento reformador e também regulador, veio impor alguma ordem na
(des)regulação que reinava então no CN. Este é extinto enquanto instituição de ensino e substituído
por cinco novas escolas, de Música e Dança de níveis básico e secundário e três de nível superior:
Dança, Música, Cinema e Teatro, posteriormente integradas no Instituto Politécnico de Lisboa. No
Porto criou-se uma escola superior de música, hoje denominada Escola Superior de Música e Artes
do Espectáculo, integrando o ensino do Teatro e Cinema, bem como uma escola de nível básico e
secundário de música (Escola de Música do Porto, posteriormente designada Conservatório de
Música do Porto).

Na definição de um estatuto para o ensino das artes, apontam-se os seguintes princípios:

I- “Inserção no esquema geral em vigor para os diferentes níveis de ensino”; II- “Criação
das áreas vocacionais da música e da dança integradas no ensino geral preparatório e
secundário”; III- “Integração no ensino superior politécnico do ensino profissional, ao mais alto
nível técnico e artístico”.

Estes três princípios foram levados à prática, no geral. No entanto, houve aspectos em que a
sua aplicação não se concretizou em virtude da falta de publicação de legislação que viria
regulamentar aquele diploma, como é o caso por exemplo, da criação dos quadros de escola e do
acesso às acções de formação. De facto, esta lacuna veio de certa forma desvirtuar a concretização
de muitos dos objectivos da reforma, pois:

“...obviamente que não veio completar o sistema e portanto deixa-o sempre «coxo», sempre
sujeito mais uma vez às contestações todas; é claro que as contestações que se arrastaram durante 30
anos e provavelmente ainda se arrastam...” (entr. J, 22)

A contestação aqui referida pelo Jurista tem origem na “despromoção” do CN a uma escola
de nível básico e secundário, “perdendo” um pseudo estatuto superior. De facto, os cursos
superiores ministrados não conferiam grau académico nem estavam vinculados a nenhuma
instituição de ensino superior, não deixando no entanto, de ser a habilitação máxima (pelo menos a
nível de instrumento e composição) que se podia obter, até à criação das escolas superiores de
música e à introdução, nas universidades, das licenciaturas nestas áreas.

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 56


Carreira Docente no Ensino Artístico Especializado—Área da Música
Que Regulação?

Esta não aceitação da parte das escolas de música, de nível básico e secundário (Lisboa e
Porto) e a regulação autónoma que daí resultou, veio criar constrangimentos ao “...processo de
preparação e publicação dos diplomas regulamentadores previstos no Decreto-Lei nº 310/83” (Gonçalves, 2001,
p.31) impedindo assim, a reforma de prosseguir a sua acção natural, como previsto no diploma.

Essa falta de continuidade legislativa resultou da “incapacidade de o Ministério da Educação


proceder à regulamentação da reforma” (idem), o que veio, por exemplo, impedir a profissionalização
dos professores em exercício, a realização dos concursos e a posterior criação dos quadros de
escola, porque os quadros transitórios criados no conservatórios públicos deveriam ser substituídos
por quadros efectivos, em que os docentes pudessem progredir e ter acesso à carreira.

O horário lectivo foi também alvo de contestação, apesar de o diploma ser explícito no art.
art. 31º, tendo ficado aqui também previsto o alargamento das 12 até às 18 horas, mas agora sem
qualquer remuneração adicional, (nº 4 do art. 32º) para os docentes que cumprissem os requisitos de
entrada no Quadro Transitório previsto na Secção III—Regime de transição de pessoal.

Acerca do horário lectivo o Jurista salienta:

“...o que se dizia aqui é que eles conservavam o seu direito às 12 horas, no entanto podia ser
atribuído até 18 horas por necessidade de serviço, ou seja, apontava-se até às 18 horas semanais de
serviço Docente ou equiparadas, só podendo ser consideradas horas extraordinárias as que excedam
aquele número (18h). Bom, isto tinha que ver com quê? Isto tinha que ver com não criar um fosso muito
grande entre os novos contratados, que eram contratados com base nas 22 horas e os que já lá estavam
com base em 12 horas e se dessem 13 ou 14 já estavam a receber horas extraordinárias, isso não era
justo, até às 18 horas podia ser-lhes distribuído sem ganharem mais”. (entr. J, 14).

No entanto, e no caso da EMCN, as sucessivas comissões instaladoras optaram sempre por


atribuir aos docentes contratados 18 horas lectivas, em vez das 22 horas. Questionado sobre se “terá
havido uma interpretação «peculiar» da legislação”, o Jurista considera que:

“Não houve interpretação nenhuma, os professores estavam todos em pé de guerra com aquilo
tudo...” (com a “despromoção” do CN a escola básica/secundária). “...Está a ver, mas foi uma coisa que
não teve uma base de equiparação nem aquilo nem aqueloutro, ou seja criou-se uma situação de
excepção de especificidade do ensino artístico. As 18 horas é porque são artistas, é por isso, é por isso,
não podem ter 20 ou 22 porque são artistas, só podem ter 18...”. (entr. J, 15)

Mas esta polémica do horário lectivo de 18 horas semanais, terá sido objecto de
regulamentação por via de um despacho que é citado pelo Jurista: “...e depois houve um despacho, quer

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 57


Carreira Docente no Ensino Artístico Especializado—Área da Música
Que Regulação?

dizer que reduziu para as 18 horas, mas que não se baseava em coisa nenhuma, quer dizer, uma coisa arbitrária”
(entr. J, 9). Este despacho terá vindo “dar cobertura a práticas locais desenvolvidas na exploração de zonas de
incerteza decorrentes da incapacidade de o Ministério da Educação proceder à regulamentação da reforma”
(Gonçalves, 2001, p.31). A referida legislação foi o Despacho nº 167/ME/89, de 23 de Outubro, que
veio “validar” a regulação autónoma que então se praticava nas escolas públicas do EAE.

Poder-se-á deduzir que pelo menos após a entrada em vigor da primeira legislação que
estabelece o Estatuto da Carreira Docente (Decreto-lei nº 139-A/90, de 28 de Abril), os docentes
contratados do EAE público deveriam ter cumprido um horário lectivo de 22 ou 20 horas, em
função do nível de ensino ministrado, uma vez que a reforma de 1983 tinha integrado os professores
do ensino especializado nas carreiras docentes correspondentes aos níveis ensino ministrados.

Criaram-se também novos planos curriculares de música para os níveis básico e secundário
e os poucos docentes que restavam no quadro do CN bem como os que estavam em regime de
contrato anual foram integrados num quadro transitório, desde que cumprissem as disposições
finais e transitórias do Decreto-Lei n.º 310/83, de 1 de Julho, (artigos 29º e 46º), remetendo-se
sempre a respectiva regulamentação para diplomas posteriores. Regulamentação essa que, para
algumas matérias, nunca existiu ou tardou em ser implementada, como já se disse, nomeadamente a
profissionalização dos docentes, que só foi possível realizar pela primeira vez, de forma
generalizada, após a publicação da Portaria nº 916/98, de 20 de Outubro, tendo sido realizadas mais
duas acções, como já atrás referi.19

Ainda no que diz respeito à vinculação dos docentes nas escolas públicas do EAE de música
e após o Decreto-Lei nº 310/83, de 1 de Julho, só em 1997, por via do Decreto-Lei nº 234/97, de 3
de Setembro, proposto à tutela pelo conjunto das escolas públicas, se voltaram a vincular os
docentes que não cumpriam os requisitos da legislação anterior e os docentes que nesse hiato de
catorze anos tinham estado em regime de contrato e que eram inevitavelmente a maioria.

Esta situação de instabilidade laboral e ausência de vínculo à escolas manteve-se até 1997,
apesar de ter havido da parte da organização sindical FENPROF, tentativas de dar continuidade ao
“310”:

“...a partir dos anos 90 (...) tínhamos conseguido que os professores de Educação Musical no
chamado ensino regular (que) eles fossem considerados bacharéis entrando com grau superior, o que
não foi acompanhado por uma indefinição por parte do Ministério, isto é, (...) esta medida não abrangeu

19
Houve uma profissionalização que abrangeu docentes em funções à data da publicação do “310” e que tinham
entretanto completado os anos de serviço necessários.

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 58


Carreira Docente no Ensino Artístico Especializado—Área da Música
Que Regulação?

os professores das escolas vocacionais...de música, o que fez com que durante algum tempo nós
tivéssemos essa situação, que a todos nós parecia dificilmente justificável em termos de progressão na
carreira e em termos de vencimento e até em termos de ingresso nos quadros. A situação dos professores
de educação musical nas escolas do 2º ciclo era bastante mais sólida e bastante mais sustentada que os
professores das escolas vocacionais...” (entr. S, 1, 2)

Os docentes de Educação Musical que leccionavam no 2º ciclo, (à excepção dos que eram
portadores de licenciatura em ciências musicais), tinham as mesmas habilitações que os docentes do
EAE público, uma vez que lhes era exigido o 12º ano de qualquer área científica ou humanística e o
8º grau de qualquer curso de música, sendo assim eram considerados portadores de habilitação
suficiente para leccionar a disciplina no 2º ciclo. O conjunto destas habilitações foi considerado
equivalente ao grau de bacharel, ficando assim criada uma situação de desigualdade e talvez de
injustiça, uma vez que os professores do EAE público estariam melhor habilitados e melhor
preparados para leccionar nas suas escolas do que os docentes que leccionavam a componente de
música no ensino geral. No EAE havia professores com os cursos superiores de instrumento,
composição e cursos gerais do Decreto-Lei nº 18881/30, de 25 de Setembro, e ainda com os cursos
da “Experiência Pedagógica de 1971” (componente musical), para além da experiência da prática
de música de câmara e integrados em orquestras. Esta habilitação não é somente académica, traduz-
se em mais competências ao nível prático e científico, uma vez que estão direccionados para ensinar
nas escolas do EAE público. Por isso falta esclarecer porque é que não puderam, também estes,
serem considerados bacharéis para prosseguimento de estudos e integrados num quadro de
nomeação provisória, devendo a Tutela ter criado as condições para que estes professores pudessem
completar a sua formação, tanto académica como profissional.

No entanto, entre estes dois momentos20, surgiu o Decreto-Lei nº 344/90, de 2 de


Novembro, com uma proposta de alguma forma inovadora para a criação de um estatuto específico
para os Docentes do EAE público.

2.1.3. O DECRETO-LEI Nº 344/90, DE 2 DE NOVEMBRO

O Decreto-Lei nº 344/90, de 2 de Novembro, é mais um diploma que refere a necessidade de


reestruturação do ensino artístico, considerando que este se encontra há “várias décadas, de forma

20
Entre a aplicação do Decreto-Lei nº 310/83 de 1/07 e a publicação do Decreto-Lei nº 234/97, de 3/09.

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 59


Carreira Docente no Ensino Artístico Especializado—Área da Música
Que Regulação?

reconhecidamente insuficiente, incompatível com a situação vigente na maioria dos países europeus”. A referência
aos países europeus, é feita no sentido de realçar a necessidade de reforçar no ensino geral o ensino
das artes, como acontece em muitos desses países.

E era nesta vertente que este diploma poderia ter sido aplicado, uma vez que a ausência da
componente artística (Música) no primeiro ciclo do ensino básico, é realmente uma lacuna que se
verifica há várias gerações. Os docentes das escolas públicas do EAE de música podem dar um
contributo alargado numa escola que se deseja mais voltada para a comunidade, contributo esse,
que ao ser articulado com as escolas de primeiro ciclo da área de intervenção da escola do EAE de
música, iria possibilitar a um maior número de alunos a descoberta das artes musicais. É neste
contexto que o Decreto-Lei nº 344/90, de 2 de Novembro, vem também propor a criação da figura
do professor itinerante21, promovendo um ensino musical de qualidade. O diploma prevê ainda as
figuras de “professor – concertista” e de “professor – compositor”.

O Decreto-Lei nº 344/90, de 2 de Novembro, refere ainda a “participação alargada dos sectores


interessados...”, mas não parece ter havido um debate consistente com as escolas públicas, pelo
menos no que diz respeito à EMCN e aos seus docentes: “eu julgo que não houve, julgo que não houve
grande (entusiasmo), eu já era professora e julgo que não” (entr. D II, 4). Houve, de facto, uma reunião geral
de professores em que o projecto de Decreto-Lei foi apresentado pela Comissão Instaladora em
funções à época, em que:

“as pessoas tiveram opiniões e até gostavam da carreira de concertista, não com o modelo que
lá estava previsto (...) na ideia sim, na possibilidade, (mas) não no modelo que estava a ser proposto que
tinha implicações de horário de trabalho e remuneratórios, etc. Mas de facto a ideia em si acolheu
alguma satisfação da parte das pessoas” (entr. D II, 5).

Este diploma não vinha resolver o problema dos professores das escolas públicas. Na
conversa com o Jurista sobre este Decreto-Lei refere: “O que é que este decreto adiantou? Nada!”, remete
depois para os comentários do Conselho Nacional de Educação (CNE), que elaborou um parecer
onde considera “...o projecto pouco realista do Governo” (cf. Parecer do CNE: 10/89).

O parecer do CNE propôs algumas alterações ao projecto de lei, tendo dois dos seus
conselheiros apresentado uma declaração de voto. António Teodoro declara abster-se da votação
“por considerar que tanto os projectos de diploma em apreciação como o parecer do relator não ajudam a desfazer a

21
O professor itinerante teria o seu horário lectivo repartido por várias escolas.

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Que Regulação?

larga polémica que presentemente existe entre os professores dos diferentes ramos do ensino artístico”. Considera o
projecto do Governo “um documento simultaneamente excessivo, por palavroso em demasia, e vago, por não
concretizar opções em aspectos fundamentais”. Por seu lado, Fraústo da Silva, entre outras considerações
refere que o “projecto de decreto-lei é desnecessariamente longo, confuso e mistura aspectos de uma lei de bases
com meras disposições regulamentares que se prevêem no artigo 37º (...) ou outras de efeitos práticos duvidosos...”
(idem).

Em resumo e no que diz respeito ao corpo docente para as escolas públicas do EAE de
música, este diploma dedica-lhe unicamente três artigos: o art. 33º remete para o Decreto-Lei nº
344/89, de 11 de Outubro, a formação e qualificação dos professores, de acordo, com o nível de
ensino ministrado; o art.º 34, refere que o professor especializado do ensino artístico poderá apoiar
uma ou mais escolas do 1º e 2º ciclos, (professor itinerante) em condições a definir pelo ME. Como
já foi referido, propõe a criação de estatutos especiais para algumas áreas de docência do ensino
artístico, (professor - concertista e professor - compositor), excluindo assim, os professores de
formação musical e das disciplinas ditas teóricas; e finalmente, no art. 35º, há uma referência à
criação de lugares de quadro para os docentes que leccionem educação artística nos 2º e 3º ciclos,
não explicitando claramente qual o modelo de quadro, nem o tipo escola em que o mesmo seria
aplicado.

A ausência de regulamentação verificou-se também após a publicação do Decreto-Lei nº


344/90, de 2 de Novembro, não se tendo efectivado a aplicação imediata das suas medidas. No
entanto, a Portaria nº 691/2009, de 23 de Junho, faz referência ao “344/90”, quando regulamenta a
frequência do EAE de música (nas escolas públicas e privadas) nalgum do seu articulado.

2.1.4. O DECRETO-LEI Nº 234/97, DE 3 DE SETEMBRO

Em 28 de Outubro de 1995 toma posse o XIII Governo Constitucional e o ME, pelo


Secretário de Estado da Educação, propõe às escolas públicas a elaboração de um documento que
fosse não só consensual, mas que satisfizesse as necessidades reais dos docentes do EAE público da
área da música, documento esse que teve como base algumas ideias de um decreto lei da autoria do
anterior governo, mas vetado pelo Presidente da República.

Da proposta dos docentes nasce o Decreto-Lei nº 234/97, de 3 de Setembro, que vem


integrar os professores cerca de catorze anos após a publicação do Decreto-Lei nº 310/83, de 1 de
Julho. Este diploma vem criar um Quadro de Nomeação Definitiva (QND), integrando também os

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 61


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Que Regulação?

docentes do Quadro Transitório, (Decreto-Lei 310/83), os docentes que contassem cinco ou mais
anos de serviço e fossem portadores de habilitação própria adquirida em Portugal, ou habilitação
estrangeira devidamente reconhecida, assim como os docentes com sete ou mais anos de serviço
com habilitação estrangeira não reconhecida.

Na entrevista com o Docente II, este descreve como se iniciou a discussão para se chegar ao
texto final que possibilitou a aprovação pela Tutela do Decreto-Lei nº 234/97, de 3 de Setembro:

“O “234”partiu de uma iniciativa das escolas públicas que se reuniram e em situação de novo
governo, tínhamos estado dez anos sob governo “cavaquista”, (...) e quando entrou o novo governo, com
o Dr. Guilherme de Oliveira Martins (Secretário de Estado), foi possível sermos ouvidos e foi possível
fazer uma proposta das escolas, e portanto isto na sequência de um anterior, não sei se era um decreto se
era um despacho, não chegou a sair, (...) proposto ainda pelo anterior governo e que quando nos foi
proposto, (ao qual) nós claramente dissemos que não.” (entr. D II, 6).

A proposta para o texto do projecto de decreto-lei foi elaborada exclusivamente pelas


escolas “...Foi possível fazer uma proposta das escolas e a proposta avançou sempre por via das escolas (...) Até ao
processo final, até à sua aprovação” (entr. D II, 6), sendo o papel do sindicato de simples concordância,
“só no fim (...) o sindicato perguntou às escolas, de facto concordou e apoiou essa proposta” (entr. D II, 5). No
entanto o Sindicalista refere:

O “...que se pode dizer (é) que o 234/97 reproduz no essencial as propostas que as escolas
fizeram, que as escolas fizeram suportadas pelo sindicato, e aqui depois há questões formais, as escolas
podem apresentar projectos mas quem negoceia é o sindicato, de facto fui eu próprio que negociei isso.
Claro que tinha a preocupação de acompanhar as posições das escolas e eu penso que o projecto “234”
incorpora boa parte das preocupações das escolas na altura.” (entr. S, 3, 4)

Não sendo uma afirmação contraditória sobre o papel do sindicato em todo este processo,
não deixa de ser curiosa a forma como tenta chamar a si a responsabilidade das negociações com o
ME, quando o Docente II afirma peremptoriamente que a acção sindical se resumiu a concordar
com as propostas das escolas de música.

O “234” possibilitou, dentro de certas condições, a entrada de um grande número de


docentes que se encontravam em regime de contratação, “em função dos anos de serviço, em função de
outros decretos que já tinham saído para outras situações e portanto isto não se pode legislar exactamente como nós
queremos”, apesar de terem sido salvaguardado o maior número de situações,

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 62


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Que Regulação?

“e portanto obviamente os professores com menos de cinco anos de serviço não foram
integrados, mas todas as situações mesmo com habilitações mais antigas entre estrangeiras e não se
conseguiu negociar todos os casos e integrar todos aqueles que tivessem as situações que se
considerou.” (entr. D II, 4)

Mas foi mais uma medida pontual para resolver a situação do momento, não tendo sido,
contudo essa a intenção, pois:

“Aquele (Dc. Lei) era pontual, mas atrás dele (após a sua aplicação) teriam de ser definidas
outras questões da carreira, que outras condições seriam necessárias fazer e depois a parte pedagógica
mais directamente ligada à prática educativa, que também estaria implicada nisso e infelizmente esse
processo não foi continuado...” (entr. D II, 5)

Esta falta de continuidade legislativa pode vir a provocar actualmente um vazio de


professores pertencentes aos quadros de escola, uma vez que à medida que estes se aposentam, as
vagas deixadas são extintas e os docentes contratados não são integrados. Os quadros “esvaziados”
do seu potencial humano que são os professores, podem dar argumentos à Tutela no sentido de
extinção das escolas públicas, com a possibilidade de reforçar a rede existente de escolas do EPC,
alargando assim o seu financiamento, deixando o seu papel de regulador para passar a ser o
avaliador.

O Decreto-Lei nº 234/97, de 3 de Setembro, vem integrar definitivamente os docentes numa


carreira, quando no art. 2º determinou que os docentes do ensino especializado da música que se
enquadrassem no referido diploma, ficassem subordinados a todo o Estatuto da Carreira dos
Educadores de Infância e dos Professores dos Ensinos Básico e Secundário, (ECD) aprovado pelo
Decreto-Lei nº 139-A/90, de 28 de Abril. Isto quer dizer que todos os direitos e obrigações se lhes
aplicariam: (i) o direito à respectiva progressão na carreira; (ii) a obrigatoriedade de cumprir os
requisitos para o processo de avaliação em vigor; (iii) e também o respectivo horário lectivo, isto é,
20 ou 22 horas consoante o nível de ensino ministrado.

Mas o ECD poderá não ter sido aplicado em todas as escolas no que diz respeito ao horário
lectivo. Por exemplo a Comissão Executiva em funções na EMCN, manteve as 18 horas lectivas, no
sentido de não criar grandes diferenças entre os docentes que leccionavam todos os níveis de
ensino, (caso dos professores de instrumento) e os que só leccionavam o nível secundário (caso dos
professores de Canto e das disciplinas denominadas “teóricas”: História da Música, Acústica e
Análise e Técnicas de Composição). Mantendo as 18 horas desta componente, a mesma comissão
executiva efectuou as reduções da componente lectiva previstas no artº. 79º do Decreto-Lei nº 139-

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A/90, de 28 de Abril, pelas vinte horas e não pelas 18 horas, uma vez que este horário lectivo era já
uma excepção à legislação em vigor. Este princípio foi aplicado de acordo com a tutela (Of.
DSRH/PD2 de 6/8/01).

No entanto, houve um grupo de docentes que entendeu interpor requerimento, apoiados no


Despacho nº 17656/98, de 13 de Outubro, no sentido de lhes serem processadas duas horas
semanais de serviço docente extraordinário. O referido despacho diz no nº 2: “A componente lectiva dos
professores referidos no número anterior (professores contratados a partir do ano lectivo 1998-1999) é de dezoito horas
semanais, conforme fixado no nº 4 do artigo 32.º do Decreto-Lei nº 310/83, de 1 de Julho”. Mas o que realmente
está fixado no nº 4 do artigo 32.º do Decreto-Lei nº 310/83, de 1 de Julho, é que os docentes do QT
que leccionem nas escolas de Música e Dança possam alargar a componente lectiva até às 18 horas,
(sublinhado meu) sem que esse acréscimo seja contabilizado como horário extraordinário.

Os docentes que apresentaram requerimento pertenciam ao QND e vinculados ao ECD, em


conformidade com o Decreto-Lei nº 234/97, de 3 de Setembro.

Esta polémica terá sido originada por um ofício da Federação Nacional dos Professores
(FENPROF) (FP-166/98) dirigido à Escola de Dança do CN, na sequência de uma reunião tida com
a Secretaria de Estado da Administração Educativa em que alegadamente terá havido:

“concordância do Ministério da Educação quanto ao Seguinte: 1-O Despacho nº 17656/98, de


13/10/98, mantêm-se em vigor. Por isso o horário dos professores (da área artística) das Escola de
Música e Dança dos Conservatórios é de 18 horas (excepto nos casos em que exista legislação mais
favorável). As reduções da componente lectiva previstas no artº 79º do ECD são calculadas nessas 18
horas” (Ofício nº FP-166/99).22

No entanto, esta informação não terá sido confirmada pelo ME, nem as escolas visadas,
nomeadamente a EMCN, foram notificadas para proceder de acordo com a suposta directiva.

Os requerimentos dos docentes foram encaminhados para a Direcção Regional competente e


despachados favoravelmente, como provam os ofícios da DSRH/PD nº. 17675, de 9/05/2000. No
entanto, e havendo dúvidas por parte da comissão executiva da EMCN nos despachos exarados da
direcção regional, esta procedeu de acordo com o previsto no artº. 166 do Código de Procedimento
Administrativo e recorreu da decisão interpondo um recurso hierárquico, solicitando ao mesmo
tempo uma reunião de carácter urgente com a Tutela. Dessa reunião, em que estiveram presentes o
Ministro da Educação e o respectivo Secretário de Estado, resultou uma informação deste para a

22
Ofício da FENPROF dirigido à Escola de Dança do Conservatório Nacional.

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 64


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Que Regulação?

Direcção Regional, em que informa e confirma a sua presença numa reunião com o Sr. Ministro (da
Educação) em que também participou a direcção da EMCN em 26/05/2000. Após ter sido
examinada a questão dos referidos requerimentos e seu conteúdo, o Secretário de Estado tomou a
decisão de revogar um despacho proferido a 24/05/2000. Dá também indicações para que a
Direcção Regional, após tomar conhecimento desta nova directiva, esclareça a escola como
proceder à redução da componente lectiva. (cf. Info. do SEAE de 26/05/2000)

Sobre este assunto, o SEAE já tinha proferido um despacho em 23/03/2000, concordando


com uma proposta exarada na Informação Nº. 25- SEAE/EP/2000, de 3 de Março, onde se lê que se
aplicam aos Docentes do EAE as disposições do ECD aprovado pelo Decreto-Lei nº 139-A/90, de
16 de Abril, mas uma vez que o horário lectivo neste sub-sistema de ensino tem sido de 18 horas,
foi opção do ME de o manter, de modo a não criar constrangimentos às escolas na gestão do
pessoal docente. Sublinha no entanto a “excepcionalidade” da situação uma vez que se aplica
unicamente à componente lectiva e a mais nenhuma outra disposição do ECD. As restantes
deduções deverão ser feitas de acordo conjugando os artigos 77º e 79º do ECD. (cf. Info. nº
25/SEAE/EP/2000, de 3/03). Este parecer teve o acordo do SEAE em 23/03/2000.

Analisando as datas, o ofício da CE da EMCN, remetendo à DREL os primeiros


requerimentos dos docentes no sentido de lhes serem abonadas as duas horas semanais de serviço
extraordinário datam de 27/04/2000, tendo sido enviada a respectiva resposta à EMCN a
09/05/2000. No entanto deverá ter havido um pedido anterior e enviado directamente pelo
requerente à DREL, do qual não encontrei registo na EMCN. Só assim se justifica o despacho do
SEAE em 23/03/2000.

Como poderá a direcção regional ter deferido favoravelmente os requerimentos dos


docentes, após o despacho contrário do SEAE?

Poder-se-á eventualmente presumir que havendo à época uma presença significativa de


“delegados sindicais” na estrutura da DREL, estes tenham seguido orientações recebidas da sua
organização laboral, defendendo os interesses pessoais dos docentes e exercendo uma regulação
autónoma que os poderia vir a prejudicar no futuro pela atribuição indevida de horas
extraordinárias, a ser devolvidas posteriormente.

Esta forma de regulação autónoma é prejudicial para o bom funcionamento das instituições,
porque na ausência de concordância superior, escrita (suporte legal), a tutela vem com toda a

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 65


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Que Regulação?

legitimidade, pelas vias legais, “pedir contas” aos autores e instaurar processos disciplinares a todos
os presumíveis beneficiados pelas medidas tomadas.

Refira-se, a título de exemplo, a acção inspectiva realizada à EMCN em 1990, em que o


apuramento dos factos durou cerca de três anos. No relatório final foram previstas penalizações que
abrangiam praticamente todos os docentes, tanto do Quadro Transitório como contratados, o
Conselho Pedagógico, as Comissões Instaladoras e os Conselhos Administrativos, pela subida de
letra remuneratória sem o respectivo suporte legal. Pode ler-se na pág. 5098, 6.2 desse relatório
(conclusões):

“Que seja instaurado procedimento disciplinar aos elementos que fizeram parte de Conselhos
Administrativos por, no exercício desta funções, terem atribuído ao pessoal letras de vencimento de valor
superior ao que por lei lhe era devido e pelo consequente processamento de vencimentos por excesso.”
(Relatório Final IGE-18/01/93, 6.2, fl. 5098 a 5100)

Actualmente o horário lectivo do docentes do EAE público é de 22 horas lectivas, como


consta no Ofício Circular nº B08028474V de 21/05/2008, que mais uma vez remete para o artigo
77º do ECD, repondo assim a legalidade sem qualquer equívoco e não permitindo qualquer outra
interpretação.

Era intenção da Tutela, após ter publicado o Decreto-Lei nº 234/97, de 3 de Setembro,


proceder à criação dos quadros de escola, (art. 3º). No entanto, e apesar de o conjunto das escolas
públicas do EAE de música, ter dado mais uma vez o seu contributo com uma proposta de
legislação que previa a constituição dos quadros e as respectivas regras de acesso, a tutela optou por
uma política de “ausência de política”.

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 66


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Que Regulação?

2.2. SITUAÇÃO ACTUAL

Passados treze anos a situação não sofreu alteração, ou seja “Neste momento aqui (EMCN) já é o
dobro, mais do dobro” (entr. D II, 5) de professores contratados, embora a legislação já tenha sido
publicada, nomeadamente o Decreto-Lei nº 69/2009, de 20 de Março, que define a admissão aos
quadros de escola definidos pela Portaria nº 551/2009, de 26 de Maio e actualizada pela Portaria nº
1266/2009, de 16 de Outubro. Contudo, o processo de abertura dos concursos ainda não foi
iniciado.

A este respeito refere o Docente I:

“A situação actual? Não sei descrever muito bem, mas creio que há um quadro de escola, aliás
do QND acho que passei sem dar por isso, mas passei. No entanto os concursos para esse quadro ainda
não foram realizados e há para quem está à espera de concorrer, nomeadamente professores que cá
trabalham há vários anos, têm profissionalizações feitas o ano passado, (2009) que creio que não estão
homologadas, embora tenham sido feitas com autorização do Ministério, com reduções de horário e na
ESML...” (entr. D I, 6)

A actual situação descrita pelos dois docentes entrevistados demonstra a instabilidade


vigente, não se sabendo o que irá acontecer:

“Numa situação bem mais angustiante do que os anteriores contratados, porque se eu entendo o
que se passa, é que por exemplo professores que fizeram concurso para ensinarem nesta escola, prova de
concerto e alguns fizeram provas pedagógica, não têm nenhuma (segurança)...” (entr. D I, 6)

De facto, os concursos previstos são só documentais, sendo um dos requisitos o tempo de


serviço. Tendo em conta também a possibilidade de serem opositores docentes de outras escolas
com mais anos de serviço e ao abrigo da mobilidade de pessoal, os professores contratados poderão
ser excluídos. Se por ventura não fizeram a acção de profissionalização anunciada pelo Aviso nº
22490/2008, de 26 de Agosto, não serão sequer admitidos ao processo de concurso.

O concurso de acesso à profissionalização em serviço teve como finalidade permitir que os


docentes que ainda não tivessem este complemento profissional, o pudessem adquirir, para assim
estarem de acordo com o que é pedido na legislação criada para o ingresso nos quadros de escola.
No seu nº 3 pode ler-se: “O presente concurso será o último a possibilitar o acesso à realização da
profissionalização em serviço aos docentes das escolas públicas do ensino artístico especializado da

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música e da dança...”, depreendendo-se que os docentes que não reúnam todas as condições
previstas para admissão ao processo de concurso não poderão continuar a leccionar. Isto porque,
estando a leccionar há menos de seis anos e não tendo tido acesso à profissionalização (mesmo
detentores do grau de mestre), não poderão ser opositores ao concurso de acesso ao quadro de
escola.

“...Estamos aqui outra vez numa situação de injustiça por força dos atrasos de tempo nas decisões que não
sabemos muito bem o que vai acontecer” (entr. D II, 8). A Tutela tem dificuldade em tomar decisões em
tempo útil e em pôr em prática medidas que resolvam os problemas no EAE. Reformas tardias, que
não foram desenvolvidas e devidamente avaliadas; legislação que não tem continuidade; medidas
que ao não terem a abrangência necessária vêem criar injustiças:

“...assim que abrir o quadro (este) pode criar mais injustiças também, porque não podem
concorrer professores não profissionalizados é o que está previsto na portaria, e muito dos nossos
professores que aqui estão há mais de cinco anos, neste momento não vão poder (concorrer) se não
tiverem a profissionalização feita.” (entr. D II, 8)

Estas injustiças são o oposto daquilo que a Constituição da República Portuguesa (CRP) diz
no nº 2 do artigo nº 58º: Para assegurar o direito ao trabalho, incumbe ao Estado promover entre
outras medidas “A formação cultural e técnica e a valorização profissional dos trabalhadores.” (alínea c).

Os docentes em regime de contrato e que são profissionalizados aguardam a abertura do


respectivo concurso para poderem integrar os quadros de escola. Os restantes ficam numa situação
de indefinição (porque não lhes foi proporcionada a possibilidade de obter a respectiva
profissionalização) com fortes probabilidades de terem de abandonar a profissão docente.

As alterações introduzidas pela Lei nº 12-A/2008, de 27 de Fevereiro, vêem ainda mais


reforçar o clima de instabilidade vivido nas escolas do EAE públicas, sendo os docentes
considerados no novo modelo de vínculo “Trabalhadores com Contrato de Trabalho em Funções
Públicas por Tempo Indeterminado”. Isto significa, que (conjugação do nº 4 do art. 5º e o nº 8 do
art. 6º) os respectivos serviços podem proceder à reorganização dos mapas de pessoal e proceder à
“cessação das relações jurídicas de emprego público constituídas por tempo determinado ou
determinável de que não careça...”, i.é., quando numa escola do EAE público, não se consiga em
determinado ano alunos para um instrumento específico, a administração procederá em
conformidade com a lei, podendo dispensar o docente, sendo este colocado eventualmente em
situação de mobilidade especial que pode significar o fim do vínculo à função pública.

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Que Regulação?

2.3. CARREIRA DOCENTE NO ENSINO PARTICULAR E COOPERATIVO (EPC)

Até aqui este trabalho tem sido dedicado à análise da carreira, (ou à falta dela), dos
professores do EAE das escola públicas. Parece-me pertinente fazer uma comparação ainda que
muito breve, com a situação dos docentes das escolas do EAE do EPC, que têm o mesmo tipo de
formação académica e profissional e ministram os mesmos planos de estudo dos docentes das
escolas públicas.

Estas escolas, cerca de cem actualmente, regem-se pelo Decreto-Lei nº 553/80, de 21 de


Novembro. Podem ser criadas por entidades a título individual ou por pessoas colectivas, para
funcionar necessitam de ter autorização definitiva de leccionação e podem funcionar em regime de
paralelismo pedagógico ou de autonomia pedagógica, de acordo com as condições descritas na
Secção II daquele diploma.

Uma vez que ministram o EAE em áreas geográficas, na sua maioria, onde não existem
escolas públicas, o ME pode celebrar com estas contratos de patrocínio. Com efeito apenas existem,
no continente, seis escolas públicas, estando estas sediadas nas grandes cidades: Braga, Porto,
Aveiro, Coimbra e Lisboa, onde se encontram a EMCN e o Instituto Gregoriano. É pois, pertinente
a existência de um tão grande número de estabelecimentos para este tipo de ensino, de modo a
abranger todos aqueles que queiram estudar música como complemento de formação ou pretendam
vir a ser profissional na área.

O perfil destas escolas varia em função da região do país em que está situada. Há escolas
com um corpo docente estável há vários anos, sobretudo as que estão nas grandes cidades, ou nas
suas imediações. Há outras instaladas em zonas nas regiões do interior, que têm um corpo docente
mais instável e com horários parciais, pagando as escolas um “preço” elevado pela interioridade,
uma vez que para além do salário o professor receberá nalguns casos subsídio de deslocação, verba
esta que não está prevista no contrato de patrocínio celebrado com o ME.

No que diz respeito aos docentes é no art. 45º do Decreto-Lei nº 553/80, de 21 de


Novembro, que se definem as condições de contratação e os seus deveres e direitos, remetendo-se
para o Contrato Colectivo de Trabalho (CCT) e para a lei geral de trabalho tudo o que no diploma
seja omisso. Mas independentemente do número de horas contratualizadas e desde que não seja em
regime de acumulação, os docentes ganham vínculo à escola após os 180 dias do período
probatório. Há, no entanto, disciplinas e cursos de instrumento, mesmo nas escolas de grande

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dimensão, que não conseguem um horário completo e aí os docentes terão de leccionar noutra ou
noutras escolas de modo a perfazer as 22 horas. A partir daí, considera-se regime de acumulação,
não sendo esse tempo contabilizado para efeito de progressão, carecendo os docentes de autorização
anual da tutela para poderem leccionar neste regime.

A admissão dos professores é feita segundo critérios adoptados por cada escola, mas todos
deverão ser portados das habilitações previstas na Portaria nº 693/98, de 3 de Setembro. A sua
progressão é regulamentada através de três tabelas salariais e depende da avaliação de desempenho
docente, cujo modelo foi também aprovado em CCT, tendo havido nalguns casos escolas que
aplicaram um modelo próprio adaptado à sua realidade, em virtude de o proposto em CCT ser mais
direccionado para os docentes do ensino regular.

As tabelas são as seguintes: Tabela A, que corresponde aos docentes licenciados e


profissionalizados. A progressão é seguida nos três primeiros anos, após os quais passa a ser de
cinco em cinco anos até perfazer trinta e um anos de serviço; Tabela B, que é idêntica mas que se
aplica aos docentes portadores de bacharelato e profissionalizados; Tabela K, que é exclusiva do
EAE e que foi criada para abranger os docentes com habilitação própria não profissionalizados23. O
horário lectivo completo é de vinte e duas horas, não havendo redução desta componente ao longo
dos trinta e um anos da carreira.

A entidade patronal é obrigada a proporcionar 35 horas de formação por ano, que deverão
estar de acordo com a especialidade e as necessidades de formação dos docentes.

As grandes diferenças que se verificam neste momento entre as carreiras do ensino privado e
público a salientar são: (i) a possibilidade de as escolas privadas poderem escolher os seus docentes
por simples convite; as escolas públicas só podem escolher os docentes através de prova (pública)
quando há necessidade de contratar para além do quadro, uma vez que para preenchimento de vaga
para quadro o que está previsto é o concurso documental (nacional); (ii) nas escolas particulares os
docentes ficam vinculados ao fim dos 180 dias de período probatório; nas as escolas públicas os
docentes só adquirem estabilidade laboral após concurso e ingresso num quadro; (iii) nas escolas
privadas a progressão é feita também com avaliação docente, mas não há limite de quotas de
graduação, isto é, todos os docentes com avaliação qualitativa de Bom ou Muito Bom progridem
sempre; nas escolas públicas o sistema de avaliação é mais complexo, e a progressão para além do
actual 5º escalão, está sujeita às quotas atribuídas a cada escola; (iv) no ensino privado não há

23
Dados recolhidos nas Tabelas Salariais do CCT aprovado para o período de 01/01/2009 a 31/08/2009.

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redução do horário lectivo em função do número de anos de serviço, ao contrário do que acontece
no ensino público.

Estas condições laborais decorrem do cumprimento estrito da legislação em vigor.

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Que Regulação?

3. CONCLUSÕES

A questão principal de investigação do presente trabalho é saber que regulação tem


caracterizado a carreira docente dos professores do EAE área da música, designadamente qual o
papel que os principais intervenientes (a Tutela, os docentes e os sindicatos), têm na construção e
definição de uma carreira docente para este tipo de ensino.

Após a análise quer dos vários documentos a que tive acesso, quer das transcrições das
entrevistas, parecem ser as seguintes conclusões principais:

I—A partir da “Experiência Pedagógica de 71”, com a tentativa de inclusão do ensino da


música no ensino geral, manteve-se um corpo docente, com a maior parte dos professores a ser
contratado anualmente, sem perspectivas de carreira, contribuindo esta situação para a instabilidade
do corpo docente. A aproximação ao ensino geral não levou, contudo, a uma aproximação
semelhante a nível de carreira docente, não se tendo alterado a situação do pessoal docente;

II—A aplicação do Decreto-Lei nº 310/83, de 1 de Julho, determinou finalmente a


integração dos professores numa carreira docente: a do ensino geral, prevendo-se algumas
adaptações que nunca foram regulamentadas. No que respeita à situação laboral, o mesmo diploma
criou um “Quadro Transitório”, que veio de alguma forma alterar a situação do vínculo contratual
para uma maior estabilidade laboral. Apesar de todo o processo de criação do diploma ter decorrido
por iniciativa do ME, o documento final reflectiu os contributos dos professores e “...do trabalho em
conjunto...não é vulgar fazer decretos-lei, ouvir tanta gente, eu tenho ali a lista das personalidades que foram
ouvidas...”, e continua “...Não sei se foi enviado a todas as escolas particulares mas pelo menos foi enviado à AEEP,
(Associação das Escolas do Ensino Particular) foi enviado a todos os Conservatórios oficiais e foi enviado, salvo erro
a cinco personalidades indicadas por várias pessoas, enfim pelas escolas...” (entr. J, 18).

Segundo estas afirmações do Jurista, depreende-se que houve debate sobre o conteúdo. Pode
dizer-se que houve um certo consenso quanto aos pressupostos da legislação, em que os docentes, e
outros intervenientes tiveram uma oportunidade de introduzir algumas das suas perspectivas, o que
leva a considerar a existência de uma regulação conjunta, embora tenha havido posteriormente um
avolumar de tomadas de decisão por parte das comissões instaladoras. Ao analisar o relatório final
da IGE sobre irregularidades detectadas na EMCN, infere-se que uma regulação autónoma, quase
anárquica, imperou nesta escola.

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Que Regulação?

De facto, a alteração das letras (hoje índices) remuneratórios dos professores, sem a devida
autorização superior, (inclusivamente com o acordo de um órgão de gestão intermédia, que não tem
competência para tomar decisões ao nível financeiro, como é o caso do conselho pedagógico) e a
atribuição de dezoito horas de horário lectivo aos professores contratados, em vez das vinte ou vinte
e duas, são decisões que vão muito além do que é o conceito de regulação autónoma, considerando
que o ECD aprovado pelo Decreto-Lei nº 139-A/90, de 28 de Abril, era aplicável aos docentes do
ensino especializado.

Por motivos de discordância com o Decreto-Lei nº 310/83, de 1 de Julho, após a sua


publicação, as comissões instaladoras das duas principais escolas não adoptaram uma estratégia
para exigir à tutela a publicação da restante legislação que estava em falta para concretizar a
reforma proposta por este diploma, nomeadamente a criação dos quadros de escola, o acesso à
carreira docente, a profissionalização dos professores e as acções de formação necessárias;

III—A publicação do Decreto-Lei nº 344/90, de 20 de Novembro, não veio acrescentar nada


nem alterar a situação dos docentes. As inovações introduzidas, nomeadamente a integração das
áreas artísticas (música, dança, teatro cinema e artes plásticas) nos planos de estudo do ensino
básico, nunca foram aplicadas na prática. No que respeita às propostas inovadoras sobre a criação
das categorias de professor - concertista e professor – compositor, estas propostas também nunca
foram implementadas pela falta de regulamentação posterior;

IV—A criação do Decreto-Lei nº 234/97, de 3 de Setembro, foi um trabalho conjunto dos


cinco conservatórios oficiais e do Instituto Gregoriano de Lisboa com o ME. As escolas
encontraram um conjunto de medidas que resolveram os problemas imediatos de vínculo, com a
aceitação da Tutela. Como referiu o Docente II na entrevista, foi pedido às escolas que elaborassem
um projecto de legislação que viesse de encontro às necessidades imediatas e que fosse um
documento o mais inclusivo possível, no que diz respeito às várias situações em que os docentes se
encontravam. Refira-se que foi uma oportunidade única que os professores tiveram, até à data, em
dar o seu contributo e poderem desenvolver medidas que viessem de alguma forma estabelecer uma
certa ordem na carreira docente do EAE.

Uma vez que foram os docentes que ao elaborarem o projecto de legislação, estabeleceram
as regras de entrada no quadro, o ME pelo seu lado, vinculou os docentes ao ECD com todos os
direito e obrigações inerentes à progressão na carreira, podendo considerar-se esta forma de
regulação como autónoma/conjunta, já que foram os dois grupos de actores a definir as regras do
“jogo”.

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 73


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Que Regulação?

V—O papel das organizações sindicais, nomeadamente da FENPROF/SPGL foi de mera


concordância com o que as escolas propuseram como refere o sindicalista: “ ...pode dizer-(se) que o
234/97 reproduz no essencial as propostas que as escolas fizeram (...) suportadas pelo sindicato (...) mas quem
negoceia (com o ME) é o sindicato”, acrescentando ainda: “Claro que tinha a preocupação de acompanhar as
preocupações das escolas” (entr. S, 3). Neste caso o papel dos sindicatos resumiu-se a transmitir e
apoiar nas negociações com o ME, aquilo que as direcções das escolas tinham elaborado;

VI—Na problemática da distribuição do horário lectivo após a entrada para o QND e o


movimento de professores apoiados pelo sindicato, verifica-se, à época, uma forte influência deste
na estrutura da Direcção Regional de Educação de Lisboa, que terá omitido uma decisão do SE e
decidiu deferir os requerimentos apresentados, no sentido de os docentes serem abonados em duas
horas extraordinárias. Como foi referido, o horário lectivo de dezoito horas era já uma excepção e
uma “regalia” dificilmente explicável do ponto de vista legal. Esta forma de regulação, parte
supostamente, de um órgão de gestão intermédia do ME, mas a decisão neste caso específico, terá
partido possivelmente da estrutura “sindical” interna da DREL, com consequências potencialmente
gravosas para o órgão de gestão da escola.

Conclui-se neste ponto, que os docentes poderão ter sido orientados, com propósitos
políticos, para contornar uma situação que legalmente não tinha outra solução senão o cumprimento
do ECD em vigor;

VII—Na fase actual, toda a legislação que define os quadros de escola e regula os
respectivos concursos do seu provimento está publicada, mas uma vez mais o ME parou todo o
processo. As razões para este novo impasse podem ser originadas pelas contenções do orçamento
geral de estado, que não prevê mais vínculos à função pública, ou por uma revisão do ECD, que
poderá ir no sentido de serem retiradas as reduções da componente lectiva em função dos anos de
serviço, e que, a acontecer, implicaria que uma parte dos docentes agora contratados ficassem sem
horário, sendo os alunos distribuídos pelos professores pertencentes ao quadro. Assim sendo, se
forem de facto, estas as razões para a suspensão do processo, só depois de apuradas as necessidades,
será dado início ao processo de concurso.

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Conclui-se, assim, que uma forte regulação de controlo está a afectar a estabilidade
pedagógica das escola públicas de Música. Os docentes contratados com profissionalização não têm
certezas quanto ao seu futuro e aqueles que não tiveram acesso à profissionalização vêem-se
impedidos de aceder aos concursos. Poderão, caso haja procura, leccionar em escola do EPC, (já
que nestas escolas ainda não é requisito obrigatório ser-se profissionalizado).

Depois da análise destes sete pontos chave da investigação: (i) a Experiência Pedagógica de
1971, no que diz respeito ao vínculo dos Docentes; (ii) o processo polémico da aplicação do
Decreto-Lei nº 310/83, de 1 de Julho; (iii) a publicação do Decreto-Lei nº 344/90, de 20 de
Novembro; (iv) a elaboração do projecto de legislação que resultou no Decreto-Lei nº 234/97, de 3
de Setembro; (v) a tentativa de controlo por parte do sindicato das tomadas de decisão, neste caso
específico, do órgão de gestão da EMCN; (vi) a actuação das organizações sindicais; (vii) a da
paragem de todo o processo de abertura de concurso para os quadros de escola, conclui-se que:

Durante a Experiência Pedagógica de 1971, não se propiciou nenhuma tomada de posição no


sentido de se encontrarem caminhos para, de acordo com a legislação em vigor vincular os docentes
à instituição Conservatório Nacional, ou para a criação de uma verdadeira carreira docente para os
professores dos ensinos artísticos nela ministrados.

Na elaboração do Decreto-Lei nº 310/83, de 1 de Julho, a participação dos docentes


propriamente dita não terá sido muito importante, apesar de o projecto ter sido posto à consideração
de um considerável número de entidades. A preocupação era, no que diz respeito à situação dos
docentes em funções, e de se lhes garantir um vínculo, com a entrada num quadro que lhes desse
estabilidade laboral, o que veio a concretizar-se para a esmagadora maioria. Mas conforme já foi
referido anteriormente, havia uma série de medidas a nível laboral que foram propostas e que não
tiveram sequência legislativa, não tendo os docentes exigido a sua concretização, não havendo
também a preocupação da parte das comissões instaladoras posteriores ao “310”, em apresentar à
tutela soluções que fossem ao encontro da reforma proposta por este diploma legal. Como refere o
Jurista “criou-se de facto uma tensão que foi muito negativa” (entr. J, 8) porque os docentes da recém-criada
escola de música de nível básico e secundário eram os mesmos que os da secção de música do
extinto Conservatório Nacional que ministravam os cursos ditos superiores. Ora, houve uma
“esperança” de que fossem convidados a fazer parte da nova Escola Superior de Música (de Lisboa)
e, de facto, alguns vieram a integrar o corpo docente, como também refere o Jurista: “É evidente que
as escolas superiores foram buscar professores fora do Conservatório, mas também foram buscar muitos professores

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 75


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ao Conservatório (...), porque os melhores também lá estavam, não todos, havia bons que não estavam lá...” até
porque a “preocupação que havia no Ministério e que se compreende, de que as escolas superiores tinham de nascer
livres dos compromissos (...) com aquilo que havia antes” (entr. J, 11). O objectivo do ME foi criar uma
estrutura, que de alguma maneira rompesse com o passado e fosse inovadora nesta área específica.
Outras soluções poderiam ter sido adoptadas, mas esta foi a que melhor se enquadrou, à época, na
estrutura do ensino superior existente.

O maior contributo dos professores para a criação de uma carreira docente, foi sem dúvida o
Decreto-Lei nº 234/97, de 3 de Setembro. Conseguiram que as suas ideias fossem levadas à prática,
começando-se a desenvolver as bases para a construção de um percurso mais sólido na sua
profissão de professores.

O ME colocou nas mãos das escolas a possibilidade de estas encontrarem a melhor solução
para a situação dos docentes contratados. Foi possível, como já foi referido, elaborar uma proposta
que depois de trabalhada com o ME nos aspectos mais técnicos, veio englobar a grande maioria dos
docentes em regime de contrato (anual), integrando-os na carreira existente prevista no ECD em
vigor (1996/97).

Essa proposta pode considerar-se como uma forma de regulação conjunta, já que os actores,
neste caso os docentes e a Tutela, acordaram claramente numa medida que veio regular a situação
de vínculo dos docentes e garantir a estabilidade laboral e pedagógica ao sistema. Foi uma
oportunidade única para os docentes poderem finalmente ser ouvidos, e o problema que realmente
os preocupava foi de certa maneira resolvido.

No entanto, e quanto ao papel dos sindicatos nestas negociações, e apesar da sua


participação, ele foi o de simples concordância com as posições das escolas, não havendo portanto
qualquer influência destas estruturas profissionais neste caso específico de regulação.

Actualmente, a Tutela volta a exercer uma forte regulação de controlo, uma vez que criou os
instrumentos legislativos para resolver o problema dos professores a contrato do ensino público
que, por exemplo na EMCN já ultrapassam os 50% do corpo docente, mas não os acciona e na
actual conjuntura política, as escolas e as representações profissionais dos professores não têm
conseguido dialogar com o ME, no sentido de se abrirem os concursos para os quadros de escola,
acabando com a instabilidade laboral que afecta os docentes contratados desde 1997.

Após esta análise, conclui-se que a influência dos docentes na construção de uma carreira
docente foi em certos momentos de grande actividade, conseguindo deixar uma marca positiva com

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uma forma de regulação autónoma, em que o seu contributo se revelou útil. Talvez porque a Tutela
lhes deu oportunidade de expor as suas opiniões, sentirem que foram ouvidos e o esforço
compensado. Noutras ocasiões, também de grande actividade, perderam a oportunidade de se
fazerem ouvir, talvez pela forma de intervenção, direccionada para problemas que não estavam
relacionados com a Carreira Docente.

Não será suficiente invocar, anos a fio, que ser professor do EAE (área da música) é ser
diferente dos restantes professores das outras áreas e que a música tem especificidades de ensino
que talvez as outras matérias não tenham, porque os docentes deste tipo de ensino não deixam de
cumprir a função de ensinar, que é comum a todos os que se dedicam à prática pedagógica.

Dada a actual conjuntura internacional de crise financeira, que afecta especialmente


Portugal, parece difícil, no tempos mais próximos, haver uma alteração da situação dos docentes
contratados que lhes permitam satisfazer os requisitos para entrada nos quadros das escolas de
música públicas, garantindo-lhes condições laborais estáveis.

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4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este trabalho teve como objectivo perceber que regulação tem caracterizado o
desenvolvimento da carreira dos docentes do EAE, área de música, desde a Experiência Pedagógica
de 1971 até à actualidade, tendo-se verificado que ao longo do tempo houve uma diversidade de
situações, que evidenciam, da parte da Tutela, algum desconhecimento deste tipo de ensino, que
tem as suas especificidades e às quais aquela não têm sabido ou querido responder e, da parte dos
docentes, uma demissão traduzida na não utilização dos meios à sua disposição para a definição da
sua carreira profissional e uma ausência de estratégias que fossem no sentido da construção dessa
mesma carreira.

Com a resistência verificada à aplicação do Decreto-Lei nº 310/83, de 1 de Julho, os


docentes preocuparam-se sobretudo em defender um modelo de ensino que estava a ficar
desactualizado e sobretudo desenquadrado em relação à evolução natural da sociedade24, em
detrimento de uma acção reivindicativa mais activa e que conduzisse o processo a algo de mais
concreto e objectivo, no sentido de reivindicarem um estatuto e uma carreira conducente com EAE
público.

A regulação de controlo tem sido a preponderante no que diz respeito ao EAE, em geral, e à
respectiva carreira docente em particular. O ME tem revelado alguma dificuldade em lidar com este
tipo de ensino, para o qual são necessários bons formadores, o que não se consegue sem garantir a
estes uma adequada formação e condições profissionais condignas com a responsabilidade que lhes
é exigida pelo exercício da sua actividade de professor.

Por seu lado, a regulação autónoma por parte dos docentes tem-se verificado em menor
proporção e teve especial relevo no episódio referido na Parte II deste trabalho, quando é abordada
a problemática do horário lectivo, em que faço um relato detalhado da situação, pois pareceu-me
pertinente realçar a tentativa de uma regulação local dos docentes em relação ao seu horário lectivo
e as diversas “interpretações” (talvez por hábito profissional) que foram feitas ao longo do tempo,
sobretudo após o “310”. De facto um horário lectivo de 18 horas não era condicente com “coisa
nenhuma” como referiu o Jurista, devendo terem sido cumpridos os horários definidos para cada
nível de ensino, neste caso específico as 22 horas lectivas.

24
Os ditos cursos superiores do CN não conferiam grau académico nem estavam ligados a qualquer instituição de
ensino superior.

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 78


Carreira Docente no Ensino Artístico Especializado—Área da Música
Que Regulação?

Surgiram ao longo desta investigação pistas de extrema importância para uma melhor
compreensão da realidade do EAE público em Portugal, pistas essas que, ou por limitação temporal,
ou porque não estavam enquadradas na problemática do presente trabalho, não puderam aqui ser
incluídas. Temas tais como Regime Integrado/Articulado, Planos de Estudo e Avaliação Docente
são questões que se prendem com a carreira docente e com as condições de exercício profissional
dos docentes do EAE, da área da música, mas que por si sós constituem objectos a merecer
investigação específica.

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 79


Carreira Docente no Ensino Artístico Especializado—Área da Música
Que Regulação?

5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

-ALMEIDA, Ana Patrícia (2007), Modos de Regulação Local do Sistema Educativo:


Uma análise de fluxos escolares. ME-DGIDC.

-ARCHER, Elvira, et al, José Vianna da Motta, 1948-1998, 50 Anos depois da sua morte, Edição do
Ministério da Cultura 1998.

-BARDIN, Laurence (2008), Análise de Conteúdo, Edições 70.

-BARROSO, João (2008), Parecer ao Projecto de Decreto-Lei 771/2007-ME – «Regime de autonomia,


administração e gestão...» (artigo)

-BOGDAN, Robert e BIKLEN, Sari, (1994) Investigação Qualitativa em Educação, Porto Editora.

-CARVALHO (1992); Friedman (1991), citados por Nóvoa, no artigo “Para uma Análise das
Instituições Escolares”.

-COHEN, March e Olsen (1972), citado por Costa, Jorge Adelino, Imagens Organizacionais da Escola,
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-COLIN, Armand (1997), Les règles du Jeu, l’action collective et la regulation sociale. Editado por
Creative Commons.

-COSTA, Jorge Adelino (2003), Imagens Organizacionais da Escola. Edições ASA.

-CRUZ, Ivo (1947), in Boletim do Conservatório Nacional, Vol. 1, Ano Escolar de 1946-1947.

-DELVAUX, Bernard, (2001) Régulation: un concept dont l’utilisation gagnerait à être... régulée?
Communication aux journées d’études RAPPE – Paris Março 2001.

-DEWEY, (1959: 394-350) citado por Costa, Jorge Adelino, “Imagens Organizacionais da Escola”,
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-ECO, Humberto, Como se faz uma tese em Ciências Humanas, 7ª Edição, Lisboa, Janeiro 1998.

-FERNANDES, Domingos et al.(2006) Estudo de Avaliação do Ensino Artístico.

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 80


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Que Regulação?

-FORMOSINHO, citado por Costa, Jorge Adelino (2003) Imagens Organizacionais da Escola, Porto
Editora.

-GOMES, Carlos Alberto Faísca (2002), Discursos sobre a «Especificidade» do Ensino Artístico: A sua
representação histórica nos Séculos XIX e XX, dissertação de Mestrado em Ciências da Educação,
Universidade de Lisboa.

-GONÇALVES, Cecília Margarida Couto de Almeida, (2001) “Tema e Variações”, Dissertação de


Mestrado em Ciências da Educação. Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade
de Lisboa.

-GONÇALVES, Cecília Margarida Couto de Almeida, (2007) “Polifonias - A Avaliação do Ensino


Superior de Música como Sistema de Multiregulação”. Tese de Doutoramento em Ciências da
Educação. Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade de Lisboa.

-KRAMER, Samuel Noah, (1963), “A História Começa na Suméria”, Edições Europa América.

-LESSARD-HÉRBERT, M, Goyette, G, Boutin, G. (2005). Investigação Qualitativa, Fundamentos e


práticas, 2ª edição,.

-MARTINEZ (1974, p.18) citado por Costa, Jorge Adelino (2003), Imagens Organizacionais da Escola,
Porto Editora.

-NÓVOA, António, (1999). Para uma Análise das Instituições Escolares, citado por VENTURA,
Alexandre.

-PERDIGÃO, Madalena (1981) Sistema de ensino em Portugal, Fundação Calouste Gulbenkian.

-QUIVY, Raymond e CAMPENHOUDT, Luc Van (2008) Manual de Investigação em Ciências


Sociais, 5ª Edição.

-REYNAUD, Jean-Daniel, (1988) Les régulations dans les organisations: régulation de contrôle et
régulation autonome. Revue française de sociologie, XXIX, 5 – 18

-REYNAUD, Jean-Daniel, (2004) Les régles du jeu, L’action collective et la régulation sociale.
Edições Armand Colin.

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 81


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Que Regulação?

-STOER, Stephen R., (1983) A Reforma de Veiga Simão no ensino: projecto de desenvolvimento
ou “disfarce humanista”? Análise Social, Vol. XIX (77, 78 e 79), 1983-3º, 4º 5º, 793-822.

-VASCONCELOS, António, (2000). “O Conservatório de Música: Actores, Organização e


Políticas”. Dissertação de mestrado, apresentada à Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação
da Universidade de Lisboa.

-VIANA, Mário Gonçalves (1984), Almeida Garrett, pág. 40,-Circulo dos Leitores.

-VIEIRA, Agostinho de Jesus, (2003) Ensino especializado da Música numa Escola Privada,
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-WALFORD, Geoffrey, (2001), citado por Barroso, João, (2006). "O Estado e a Educação: a
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-YIN, Robert, (2009), “Case Study Research: Design and Methods”, quarta edição. SAGE editores.

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 82


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Que Regulação?

5.1. FONTES INTERNET:

-ARAÚJO, Cidália et al, Estudo de caso, Universidade do Minho, Estudo coordenado por Clara
Pereira Coutinho.
http://grupo4te.com.sapo.pt/estudo_caso.pdf
Sítio Internet consultado em 29 de Julho de 2009.

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Sítio Internet consultado em 29 de Julho de 2008.

-BARENBOÏM, Daniel, citado por CHIZY, Édith CANAT de, “L’IMPORTANCE DE


L’ENSEIGNEMENT DE LA MUSIQUE DANS L’ÉDUCATION”. (2008) Académie des Beaux-
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http://fr.wrs.yahoo.com/_ylt=A7x9Qb7np9ZNnVoArt1jAQx.;_ylu=X3oDMTBzOGdmZWZlBHNl
YwNzcgRwb3MDMTYEY29sbwNpcmQEdnRpZAM-
/SIG=13h0ihr9g/EXP=1305942119/**http%3a//www.institut-de-
france.fr/upload/pdf/en_ligne/institut/2008_rentree/canat_de_chizy.pdf
Sítio Internet consultado em 29 de Julho de 2009.

-BARROSO, João, (2005) O Estado, A Educação e a Regulação das Políticas Públicas.


http://www.cedes.unicamp.br
Educ. Soc., Campinas, vol. 26, n. 92, p. 725-751, Especial - Out. 2005.
Sítio Internet consultado em 29 de Julho de 2008.

-DIAS, Adelaide –Ética Profissional e Terapêutica da Fala, Dez Códigos Deontológicos


http://www.google.pt/url?sa=t&source=web&cd=1&ved=0CBcQFjAA&url=http%3A%2F%2Frep
ositorio-
aberto.up.pt%2Fbitstream%2F10216%2F22234%2F11%2F10codigos%2520deontologicos.pdf&ei

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 83


Carreira Docente no Ensino Artístico Especializado—Área da Música
Que Regulação?

=wsA5Tb6ULIqKhQfX4N3zCg&usg=AFQjCNHC1fo7GX5e2WtpWKmLhgDr7uvu9g
Sítio Internet consultado em 21 de Janeiro de 2011.

-FERNADEZ, P.S., DÍAZ, P.S. (2002) Unidad de Epidemiología Clínica y Bioestadística.


Complexo Hospitalario Juan Canalejo.
A Coruña (España) CADATEN PRIMARIA 2002; 9: 76-78
http://www.fisterra.com/mbe/investiga/cuanti_cuali/cuanti_cuali.asp
Sítio Internet consultado em 7 de Junho de 2009.

-KUNZLER, Caroline de Morais, A teoria dos sistemas de Niklas Luhmann. Estudos de


Sociologia, Araraquara, 2004.
http://piwik.seer.fclar.unesp.br/estudos/article/view/146/144
Sítio Internet consultado em 10 de Abril de 2011.

-LIEBER, Renato Rocha, teoria dos sistemas.


http://www.lead.org.br/filemanager/download/4/teoria%20de%20sistema.pdf
Sítio Internet consultado em 30 de Março de 2009.

-Meuret, Denis, Pour une des regulations compensatoires. Université de Bourgogne (IREDU),
2001.
http://www.ac-creteil.fr/zeprep/espace_regulation.html
Sítio Internet consultado em 23 de Agosto de 2009.

-YIN, Robert, (2005) "Case Study Research: design and methods" Tradução e síntese: Prof. Ricardo
Lopes Pinto. Adaptação: Prof. Gilberto de Andrade Martins.
http://www.focca.com.br/cac/textocac/Estudo_Caso.htm
Sítio Internet consultado em 12 de Setembro de 2009

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 84


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Que Regulação?

5.2. FONTES – LEGISLAÇÃO

-Constituição da República Portuguesa, VII Revisão Constitucional (2005).


Lei Magna da República Portuguesa.
-Lei nº 5/73, In Diário da República I Série, N.º 173 de 25 de Julho.
Aprova as bases a que deve obedecer a reforma do sistema educativo.
-Lei de Bases, Lei nº 46/86, In Diário da República I Série, N.º 237 de 27 de Maio.
Estabelece o quadro geral do sistema educativo.
-Decreto Lei nº 221/74, In Diário da República I Série, de 27 de Maio.
Determina que a direcção dos estabelecimentos de ensino possa ser confiada pelo Ministro da
Educação e Cultura a comissões democraticamente eleitas ou a eleger depois de 25 de Abril de
1974.
-Decreto Lei nº 310/83, In Diário da República I Série, N.º 149 de 1 de Julho.
Reestrutura o ensino da música, dança, teatro e cinema.
-Decreto Lei nº 344/90, In Diário da República I Série, N.º 253 de 2 de Novembro.
Propõem uma reforma no Ensino Artístico, alargando-o a todos o níveis e propondo uma carreira
distinta para os Docentes com a criação d figura do Professor – Concertista e do Professor –
Compositor.
-Decreto Lei n.º 234/97, In Diário da República I Série, N.º 203 de 3 de Setembro.
Estabelece o regime jurídico do pessoal Docente de estabelecimentos públicos de ensino
especializado da música.
-Decreto Lei n.º 115A/98, In Diário da República I Série A, N.º 102 (suplemento) de 4 de Maio.
Aprova o regime de autonomia, administração e gestão dos estabelecimentos públicos da educação
pré-escolar e dos ensinos básico e secundário, bem como dos respectivos agrupamentos.
-Decreto-Lei n.º 75/2008, In Diário da República I Série, N.º 79 de 22 de Abril.
Aprova o regime de autonomia, administração e gestão dos estabelecimentos públicos da educação pré-
escolar e dos ensinos básico e secundário.
-Decreto Lei n.º 69/2009, In Diário da República I Série, N.º 56 de 20 de Março.
Estabelece o regime de integração nos quadros de escola dos Docentes dos estabelecimentos públicos do
ensino artístico especializado da música e da dança com pelo menos 10 anos consecutivos de exercício

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 85


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Que Regulação?

efectivo de funções em regime de contrato.

-Decreto-Lei n.º 144/2008, In Diário da República I Série, N.º 144 de 28 de Julho.


No uso da autorização legislativa concedida pelas alíneas a) a e) e h) do n.º 1 do artigo 22.º do
Orçamento do Estado para 2008, aprovado pela Lei nº 67-A/2007 de 31 de Dezembro, desenvolve o
quadro de transferência de competências para os municípios em matéria de educação, de acordo com o
previsto no artigo 19.º da Lei nº 159/99 de 14 de Setembro.
-Portaria n.º 370/98, In Diário da República I Série B, N.º 147 de 29 de Junho.
Estabelece os planos de estudo e as condições em que podem ser conferidos os diplomas e certificados
de modo a regularizar a situação dos detentores das habilitações obtidas ao abrigo do regime de
experiência pedagógica, permitindo, designadamente, o seu ingresso nos quadros das escolas de música.
-Portaria n.º 693/98, In Diário da República I Série B, Nº 203 de 3 de Setembro.
Define os grupos e subgrupos das disciplinas curriculares dos cursos do ensino vocacional da música e
aprova o respectivo elenco de habilitações para a docência.
-Portaria n.º 1550/2002, In Diário da República I Série B, N.º 298 de 26 de Dezembro.
Procede a alguns ajustamentos aos planos de estudos dos cursos básicos do ensino especializado de
Dança e de Música. Revoga as Portarias n.os 294/84, de 17 de Maio, 815/85, de 26 de Outubro, e
1197/92, de 22 de Dezembro.
-Despacho nº 17656/98, In Diário da República II Série, Nº 236 de 13 de Outubro.
Na ausência de legislação que defina as condições de entrada nos quadros de pessoal Docente nas
escolas do ensino especializado de Música e Dança, vem estabelecer as condições de contratação para o
ano lectivo 1998-1999.
-Despacho n.º 13020/2008, In Diário da República II Série, Nº 89 de 8 de Maio
Dispensa da realização da profissionalização em serviço mediante determinadas condições
-Despacho n.º 18041/2008, In Diário da República II Série, Nº 128 de 4 de Julho.
Regula a matrícula nos cursos de Música, em regime supletivo em escolas dos ensinos básico e
secundário públicas, particulares e cooperativas.

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5.3. OUTRAS FONTES:

-Estatutos do Conservatório Real de Lisboa, Decretados em 24 de Maio de 1841,


Lisboa Imprensa Nacional, 1841.

-Parecer do Conselho Nacional de Educação de 10/89, In Diário da República II Série, Nº 43 de 20


de Fevereiro de 1990. Assunto: Parecer sobre o projecto de diploma que deu origem ao Decreto-Lei nº
344, de 2 de Novembro.

-Relatório da IGE (conclusões) de 18 de Janeiro de 1993. Da pág. 5091 a 50101.

-Ofício da FENPROF, Ref. FP-166/99, Assunto: Horário dos professores das áreas artísticas de Música
e Dança, mantêm-se em vigor de acordo com o Despacho nº 17656/98 de 13 de Outubro.

-Informação nº 25-SEAE/EP/2000, Origem: ME. Assunto: Aplicação do disposto no artigo 79º do


ECD – Redução da Componente lectiva, aos professores do Ensino Vocacional da Música.

-DSRH/PD nº. 17675, de 9/05/2000. Assunto: Deferimento de requerimento a solicitar o abono de duas
horas de serviço lectivo extraordinário.

-Ofício nº 9784 de 23 de Julho de 2001, Origem: DGAE. Assunto: Aplicação do disposto no artigo
79º do ECD – Redução da Componente lectiva, aos professores do Ensino Vocacional da Música.

-Ofício DSRH/PD2 de 6 de Agosto de 2001. Assunto: Horário lectivo.

-Ofício Circular nº B08028474V de 21/05/2008. Assunto: Horário dos Docentes dos estabelecimentos
públicos do ensino artístico especializado da Música e da Dança.

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Que Regulação?

6. SIGLAS UTILIZADAS:

AEEP Associação de Estabelecimentos de Ensino Particular e Cooperativo


ANQ Agência Nacional para a Qualificação
CD Carreira Docente
CEI Comissão Executiva Instaladora
CORNC Comissão Orientadora da Reforma do Conservatório Nacional
CN Conservatório Nacional
CNE Conselho Nacional de Educação
CRP Constituição da República Portuguesa
Dc-L Decreto-Lei
DREL Direcção Regional de Ensino de Lisboa
EAE Ensino Artístico Especializado
ECD Estatuto da Carreira Docente
EMCN Escola de Música do Conservatório Nacional
EP Experiência Pedagógica (71)
EPC Ensino Particular e Cooperativo
ESML Escola Superior de Música de Lisboa
FENPROF Federação Nacional dos Professores
IGE Inspecção Geral de Ensino
ME Ministério da Educação
QND Quadro de Nomeação Definitiva
QT Quadro Transitório
SEAE Secretário de Estado da Administração Educativa

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Que Regulação?

7. ÍNDICE DO QUADROS:

-Quadro 1. Vantagens e Inconvenientes dos métodos Qualitativos vs. Quantitativos .......................... pág. 34
-Quadro 2. Categorias e sub - categorias de investigação ..................................................................... pág. 41
-Quadro 3. Guião de entrevista aos Docentes........................................................................................ pág. 45
-Quadro 4. Guião de entrevista ao Jurista.............................................................................................. pág. 46
-Quadro 5. Guião de entrevista ao Sindicalista...................................................................................... pág. 47

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8. ANEXOS

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ENTREVISTA COM JURISTA

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NOTA PRÉVIA

As transcrições das entrevistas têm uma paginação entre ( ) correspondente às citações no texto.

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Que Regulação?

TRANSCRIÇÃO DA ENTREVISTA COM JURISTA


(1)
Investigador—Por isso ia-lhe só pedir que me dissesse a sua profissão e a sua carreira académica
muito sucintamente, identificar, não dizendo o nome, não há (referencia) nomes só conteúdos, que
serão transmitidos no momento de serem tratados.

Jurista—Sou formado em direito e trabalhei muitos anos no Ministério da Educação. Comecei por
trabalhar no Gabinete de Estudos e Planeamento de Acção Educativa em 1966, já lá vão muitos
anos, depois...depois passei para o Instituto de Acção Social Escolar, onde fui Director de Serviços
de Estudos e Planeamento também e depois, em 1978, Janeiro de 78, fui para os Açores como
Director Regional da Administração Escolar, e o primeiro papel que me puseram nas mãos para
resolver foi o da criação do Conservatório que o Governo Regional já tinha criado, oficializado,
passando, integrando, o Conservatório Regional, que era privado, e ao mesmo tempo criando pólos
ainda não existentes, mas enfim, que eles queriam pôr a funcionar em Angra e na Horta;
simplesmente ninguém sabia o que era isto de um Conservatório...
Investigador—Imagino...
Jurista—Não, quer dizer, é evidente que o Conservatório Regional existia e era particular, mas era
totalmente apoiado pela Junta Distrital e por isso pediram imediatamente a sua oficialização; mas
simplesmente qual é o estatuto de uma escola destas... – ah!, isso é o estatuto do Conservatório
Nacional. O Conservatório Nacional era outra coisa, (dependia) da Direcção Geral do Ensino do
Ensino Superior, e a DG também não sabia muito bem o que aquilo era – era um ensino artístico
especializado…nem era nem deixava de ser...bom…!…que foi aliás na DG do ES uma herança da
antiga Direcção Geral do Ensino Superior e das Belas Artes, das quais se autonomizou da Direcção
Geral dos Assuntos Culturais, hoje Ministério da Cultura, não é, que absorveu tudo o que não era
ensino; mas como era ensino (o CN) ficou na DG do ES, porquê?,…porque era ensino das Belas
Artes,...bom, já havia as escolas superiores de Belas Artes, que já se chamavam “Superiores de
BA”, mas que também não tinham o estatuto, que era o estatuto existente no ensino superior.
Naquela altura só existia o ensino universitário, ora o estatuto dos próprios professores não era o
estatuto do ensino superior (universitário), embora os cursos… e isso começa com os cursos de
arquitectura...(este) já era considerado um curso superior mas não dava uma licenciatura...
Investigador—Exactamente não tinha grau académico.

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 93


Carreira Docente no Ensino Artístico Especializado—Área da Música
Que Regulação? (2)
Jurista—Não tinha grau académico. Portanto estas situações eram complicadas, a evolução das
escolas superiores de BA foi para a integração no ensino superior (universitário)...isto foi na altura
também em que se criou depois o ensino Politécnico, o ensino que ainda era anterior ao 25 de
Abril...
Investigador—Exactamente.
Jurista—Data da Lei de Bases do Veiga Simão de 1973, e portanto aquilo, quer dizer, ficou pronto
e acabou por ser integrado mais tarde. Houve ali um equívoco mas as pessoas preferiram a
integração na universidade e lá veio a integrar-se na universidade. Estranhamente o curso de
arquitectura integrou-se, se não estou a dizer nenhuma asneira, na Universidade Técnica.
Investigador—Na Universidade de Lisboa, na clássica?
Jurista—Não, as escolas de Belas Artes é que se integraram na clássica. As escolas de Belas Artes
já sem a Arquitectura e eu penso que a Arquitectura se integrou e está ali naquele campus que há ali
em...
Investigador—Na Ajuda...
Jurista—Na Ajuda exactamente, é isso. A Arquitectura acabou por ir mais cedo para a
Universidade Técnica e a constituir-se como licenciatura; a escola de BA que ficou sem a
Arquitectura, portanto a pintura, a escultura, etc., ficou mais uns anos pendurada e data mais ou
menos de (19)83, foi também ao mesmo tempo que fui ao Conservatório da Madeira, chamava-se
assim e portanto...parece-me que já me perdi um bocadinho agora, onde é que eu estava? Ah,
pronto. Fui para os Açores, a primeira coisa que me puseram na mão foi a criação do Conservatório.
Bom, … o que é que a gente vai pagar aos professores?, como é que a gente vai definir esta escola?
E, quer dizer, olhando para aquela escola era assim: aquilo, os chamados cursos superiores, vinham
todos para o Porto ou para Lisboa, só no Porto ou Lisboa é que havia os cursos superiores; nos
outros Conservatórios regionais o que é que havia?, havia um curso de seis, sete ou oito anos...
Investigador—Dependendo do instrumento...
Jurista—Dependendo do instrumento, enfim, dos instrumentos ou da estruturação – da Experiência
Pedagógica, antes da Experiência Pedagógica, depois da Experiência Pedagógica – pronto, aquilo
era um pouco confuso; mas, quer dizer...havia meninos dos dez anos até aos dezasseis, dezassete
anos, havia um ensino que não era ensino superior, etc. Portanto o que era isto?, era um ensino
Básico e Secundário, não é?, era correspondente a isto; e os senhores professores?, bem os senhores
professores eram professores do Ensino Particular – atenção, portanto eles tinham estatuto de 24
horas de aulas (semana), não tinham sequer as 22 horas do ensino oficial, eram 24 horas de aulas...
Investigador—O primeiro ciclo tinha (tem) 25 horas...

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Carreira Docente no Ensino Artístico Especializado—Área da Música
Que Regulação? (3)
Jurista—Sim, mas no Conservatório (Açores) os professores tinham o estatuto do ensino
secundário particular, portanto davam 24 horas de aulas, ou 22, enfim, portanto o que é que a gente
lhes devia pagar? – o mesmo que se estava a pagar a um professor do ensino secundário?, enfim,
em igualdade de circunstâncias …; isto, um bocadinho independente – aí já é uma concessão e tal –
das habilitações formais, porque é claro os professores do ensino secundário... . Há uma célebre
reunião do Conservatório (Lisboa) com uma cena...curiosa, em que há uma ilustre professora que
diz: “Como é que eu vou ser professora do ensino...passar a ser uma professora do ensino
secundário, se eu tenho um curso superior?”, e houve outro professor, que aliás era casado com uma
professora do ensino secundário, e disse “Oh, minha senhora no ensino secundário todos os
professores têm um curso superior, se não, não são professores.”, mas isto...(risos)...sabe quem era?
Investigador—Quase...
Jurista—De uma ilustre (risos)
Investigador—Pode dizer que não será divulgado...
Jurista—Antecessora sua... (risos) que teve essa saída, que deu azo a uma gargalhada geral.
Ressalvando mesmo assim isso, foi o que se passou a pagar-lhes.... Isto significou uma subida de
vencimento daqueles professores (nos Açores), porque eles estavam a receber pelas 24 horas o
mesmo que os senhores professores do Conservatório (de Lisboa) pelas 12 horas; ora bem, davam
metade do horário, e também tinham uns vencimentos mais baixos do que os professores do ensino
secundário, ... ou melhor … eu tenho de resto uma informação em que faço essa comparação, etc.
De qualquer forma era uma carreira muito limitada, aliás uma carreira...nem havia carreira, porque
só havia professores de 1ª e professores de 2ª, os professores de 1ª, eram os dos cursos superiores
(do Conservatório), os professores de 2ª eram os dos cursos gerais..
Investigador—Do básico, do 1º ciclo e por aí fora...
Jurista—Pois...e portanto era isto que havia no Conservatório de Lisboa e os professores do ensino
particular dos Açores, recebiam o mesmo que os professores do Conservatório, mas com 24
horas.... Bom, isto foi uma coisa muito boa, agora temos um estatuto definido, que valoriza a
carreira Docente, etc., bom, e com várias fases possíveis, enfim uma carreira propriamente,
bom...Eu estive lá (nos Açores) quase 3 anos, voltei para cá, e quando voltei para cá, estava no
IASE quando fui para lá, e quando voltei para cá, bom...fiquei na Secretaria Geral (do ME); eu lá
nos Açores estava requisitado ao Ministério e cumpri a minha comissão de 2 anos, acabei por fica
mais um, foi em 80, quando foi o sismo e foi muito complicado; fiquei até Outubro e quando vim
fiquei na Secretaria Geral, e...a certa altura, vieram ter comigo o Prof. Menéres (Barbosa) e a Profª
Elisa Lamas...

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 95


Carreira Docente no Ensino Artístico Especializado—Área da Música
Que Regulação?

Investigador—Portanto será a origem do 310? (4)


Jurista—Exactamente. O que é que acontece, é – esta “luz” que surgiu com os professores do
Conservatório lá dos Açores, alertou aqui estes... “mas é pá os gajos ganham mais do que nós?, por
favor, os professores do Conservatório de Lisboa?, do “Sacrosanto” Conservatório de Lisboa?...mas
como é que é isto?”.... Bom, eles foram ter comigo, … aliás por uma outra razão, foram por causa
do museu do Conservatório...também era uma coisa complicada, eles estavam em negociações com
o Ministério da Cultura, e eu lá nos Açores como Director Regional da Administração Escolar,
tinha a meu cargo toda a administração da educação, cultura e desporto que fazia parte da mesma
Secretaria...e portanto também tinha ficado ligado à parte da cultura, etc...e de resto estas coisas têm
sempre estas ligações pessoais – o Prof. Menéres tinha sido colega de curso em História do Director
Regional dos Assuntos Culturais de lá (Açores), éramos colegas e amigos.
Investigador—O mundo é muito pequeno...
Jurista—E portanto eles sabiam que eu tinha lá tratado do problema dos museus e tal, e vieram ter
comigo, para saber como é que havia de ser e tal; bom, e eu lá lhes dei uma notinha qualquer sobre
o assunto e tal, ajudei-os lá a encaminhar as coisas, melhor ou pior, mas isso é outro problema, mas
enfim lá foi …. E depois, uns meses depois rebentou …, quer dizer aquilo estava tudo …, (havia)
que chegar a uma conclusão qualquer, o Conservatório estava todo em tensão, em bulha com a Drª.
Madalena Perdigão; e foram ter com o ministro e queriam a reforma do Conservatório e tal, e tal. O
ministro disse “está bem vamos ver o que se arranja para aí...olhe sabe aquele Dr. Caldeira Cabral
que está aí também, ponha-o a tratar do assunto convosco”...
Investigador—Já tinha feito os Açores...
Jurista—E assim fui lá parar, pronto. Já conhecia o Prof. Menéres (Barbosa), a Profª Elisa Lamas,
etc., bom. De resto eu tinha ligações anteriores, não propriamente formalmente ao Conservatório
mas isto são histórias que eu nunca contei a ninguém...(risos), há muitas pessoas que sabem, mas
quero dizer, eu.... A minha mãe era muito amiga da Professora Maria Augusta Barbosa, não sei se
ainda se lembra dela?
Investigador—Sim, sim...
Jurista—Ainda é viva, e então ela era de resto madrinha do meu irmão Pedro, mais novo do que
eu, e eu era padrinho, éramos compadres, (risos), ainda hoje lá vou visitá-la, não tantas vezes como
quereria, mas enfim …, mas então ela dava cursos de História da Música, cursos particulares, com
uma série de alunos e eu também lá estava caído; (eram) o António Vitorino de Almeida, a Melina
Rebelo, que também estava na comissão de reestruturação do Conservatório (em 1981), portanto

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 96


Carreira Docente no Ensino Artístico Especializado—Área da Música
Que Regulação?

eram essas ligações pessoais que se criam, a Carmo Norton e outros, o Victor Dinis, não sei se sabe
quem é?, violinista e depois foi para o Brasil, o Santiago...
Investigador—Santiago Kastner? (5)
Jurista—Não o Armando Santiago, que foi para o Canadá e foi director do Conservatório do
Quebec, etc. Estávamos todos dentro do grupo, a Maria José Nobre...não sei para onde anda...ela
esteve por Castelo Branco, ela esteve nos Estados Unidos e doutorou-se por lá, depois esteve em
Castelo Branco...
Investigador—Há muito tempo que não ouço falar dela...
Jurista—Mas enfim só para dizer que eu andava também nesses meios e portanto conhecia várias
pessoas que estavam no Conservatório nesse momento já como professores, etc., e portanto alguma
ligação também pessoal...
Investigador—Isto nos anos 80...
Jurista—Isto nos anos 80, exactamente inicio dos anos 80, 81, pois, princípios de 81 foi quando
comecei a trabalhar nisso. Bom, portanto eles vieram ter comigo, o ministro nomeou, enfim, para
superintender esse grupo o Professor Alberto Ralha – que faleceu agora há poucos dias, em
Dezembro, salvo erro – e começámos a trabalhar, pronto! E a ideia fundamental, que enfim vai
muito no meu feitio é...bom eu vou para lá, tenho uma ideia do que me parece que será certo, mas
eu vou para lá e eles vão-me dizer quais são os problemas; vamos negociar aqui esta coisa, vamos
assentar num esquema. E assim foi – a primeira proposta feita ao Ministério sobre a estruturação do
“310”, do ensino e da carreira Docente, etc, etc., (foi) redigida por mim, mas não foi assinada por
mim, foi assinada pela comissão directiva do Conservatório; portanto a responsabilidade não é
minha é deles, (risos)! É claro que ele (310) levava uma ideia, mas essa ideia não tinha nada de
original, não é?, essa ideia não tinha nada de original, para além daquilo que eu lhe disse há
bocadinho – nos Açores uns meninos que dos 10 aos 16 anos, estudavam no ensino secundário no
liceu e nas horas vagas iam ao Conservatório, infelizmente era assim e toda a gente achava que era
infelizmente assim, e havia já as experiências do ensino integrado em Braga, enfim havia várias
tentativas de ensino articulado, que também não funcionava...
Investigador—E a Experiência Pedagógica também não tinha corrido muito bem...
Jurista—A Experiência Pedagógica começou em 71 e foi interrompida em 74, 75 e depois ficou-se
numa auto-gestão até 77...
Investigador—Nunca foi legislada...
Jurista—Exactamente, sim, mas a Experiência Pedagógica… E nisso o Conservatório também tem
uma história “triste”, que é a seguinte: A Reforma de 1930 procurou ajustar o sistema de ensino do

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 97


Carreira Docente no Ensino Artístico Especializado—Área da Música
Que Regulação?

Conservatório ao sistema de ensino secundário da época; ora o sistema de ensino em


1929 era, salvo erro, era: 2, 3 e 2, portanto o ensino pós primário, os 2 anos iniciais do (6)
ciclo preparatório, mais tarde assim chamado, os 3 anos do curso geral dos liceus e os dois anos do
curso complementar...
Investigador—Exactamente...
Jurista—Não, 1 ano do curso complementar, … não, 2 anos do curso complementar...
Investigador—Faziam os 7 anos do liceu...
Jurista—Exactamente faziam os 7 anos do liceu. Em 1930 houve um “génio” qualquer que
resolveu que isto não era o melhor sistema e que era preferível fazer 3 mais 3...isto soa-lhe alguma
coisa dos cursos do Conservatório? 3 mais 3? Pois, era a reforma de 1930, era 3 mais 3; e depois
podia haver mais 1 que era um ano propedêutico, que era a entrada no ensino superior; portanto os
cursos liceais eram de 3 mais 3, em 1930 fez-se esta reforma do liceu, e depois fez-se uma reforma
do Conservatório que se ajustou à reforma do liceu; só que em 1931 voltou tudo atrás, os
liceus...(protestaram) e voltou tudo atrás; mas o Conservatório manteve-se mais 40 anos com os 3
mais 3, porquê? E isso é fácil de explicar: é a “especificidade do ensino artístico”...era?, não era!
Bom. Em 1970 estava-se a preparar uma lei de bases, a nova Lei de Bases de 1973. Qual era o
esquema dessa lei de bases?, passava a haver um 12º ano, não é verdade, e então fazer quatro, mais
2 mais 2; isto diz-lhe alguma coisa do 4º ano?
Investigador—Sim...
Jurista—4º ano de educação musical, 4º ano de instrumento, 4º ano...pois foi a reforma de 1971; só
que a lei de bases de 73 nunca chegou a entrar em vigor; ah!, mas o Conservatório sim, … mas essa
era a “especificidade do ensino artístico”...
Investigador—Voltámos à...
Jurista—Voltámos, a história repetiu-se estupidamente – na tentativa de ajustar à reforma do
ensino geral, ajustou-se a uma coisa falhada, por duas vezes isto aconteceu, já era preciso azar,
bom! Mas as pessoas no Conservatório não tinham essa noção e acharam que aquilo era
absolutamente obrigatório, porque era a “especificidade do ensino artístico”; bem, aquilo não tinha
nada de especificidade do ensino artístico, tinha simplesmente o azar de ter caído naquelas fases de
transição. Bom! Agora havia uma outra coisa que era a especificidade do ensino artístico no sentido
de ser o instrumento, o instrumento...o instrumento, com a formação musical ao lado, mas era só o
curso do instrumento, bom! E portanto os músicos tinham uma particularidade – “coitados” só
tinham a 4ª classe!
Investigador—Já não correspondia muito à verdade...embora houvesse...

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Carreira Docente no Ensino Artístico Especializado—Área da Música
Que Regulação?

Jurista—Nunca correspondeu à verdade, quer dizer, nunca correspondeu à verdade...!


Investigador—Mas havia alguma verdade! (7)
Jurista—Eu, quando me diziam essa...; é claro que havia alguma deficiência, digamos de cultura
geral; mas mesmo na reforma de 1930 chegou-se a meter dentro do Conservatório as disciplinas de
história e geografia, salvo erro e não sei se português, uma coisa qualquer desse género, que
correspondia à formação geral do 3º ano, do tal 3º ano do liceu; depois os outros 3 anos, pronto, já
eram mais específicos e tal, mas pelo menos esta … e isso ainda se manteve durante muitos anos e
depois baixou para o 2º ano, visto que era só...o 2º ano de português, ou de não sei quê, já não me
lembro de quê, e era preciso ter para poder inscrever-se no 3º ano de...como é que era no curso
geral, pois...não como é que era? O curso geral eram os primeiros 3 anos e os outros 3 anos eram...
Investigador—Eram o curso superior?
Jurista—Era o curso chamado complementar...não sei se já tinha em 1930 essa designação mas eu
julgo que sim.
Investigador—Mas em 1919 Viana de Mota já aponta algumas disciplinas também.
Jurista—Exactamente Viana da Mota também, exactamente pois, portanto já vinha de trás, tem
toda a razão; e em 1930 exigia-se isso; e depois era obrigatório (para) inscrever-se no 3º ano do
Curso Geral ter estas disciplinas do liceu feitas, mas claro as pessoas iam fazê-lo em curso
individual etc. Mas isso chega a um ponto nos anos 70, em que já não fazia qualquer sentido, não
é?...
Investigador—Eu ainda apanhei, quando entrei no Conservatório em 1969, havia a disciplina de
Português e Francês, que era o Prof. Eurico Lisboa que dava o Português em 1969...
Jurista—Em 60? Isso já era uma integração...
Investigador—Eu estava no liceu...
Jurista—E isso era de facto ideia que vinha muito de trás, que vinha do Viana de Mota da reforma
de 1919, de que tinha de haver essa base de cultura geral comum a toda a gente. É claro, até a um
certo ponto, depois a coisa era mais específica, etc. Mas evidentemente com o alargamento de toda
a escolaridade obrigatória até ao 6ºano e depois ao 9º ano, é evidente o que é que toda a gente
fazia?, tinha que fazer o liceu “ai meu menino, tens que fazer o liceu”!; o paizinho e a mãezinha não
deixavam, pronto, “porque essa é que é a tua vida, depois se tiveres jeito para tocar…”...(risos)
Investigador—Exactamente.
Jurista—Era isto e portanto é evidente que com a escolaridade obrigatória até ao 9º ano, e já na
altura se falava em prolongar mais ainda, evidentemente era indispensável que as pessoas tivessem
essa base; mas também era indispensável aliviar o currículo, o que já se tinha tentado no ensino

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 99


Carreira Docente no Ensino Artístico Especializado—Área da Música
Que Regulação?

integrado, não é? No ensino articulado não havia nenhuma definição, não era ensino
articulado, naquela altura chamava-se articulação de horários, não havia uma (8)
integração do currículo e foi isso que se procurou fazer no 310, que muitas vezes é acusado de ser
apenas uma..., um decreto burocrático, que quis meter a coisa nas baias burocráticas, igualar tudo e
não tendo em conta a especificidade do ensino artístico. Bom! Na verdade não era bem isso e em
primeiro lugar (era) de facto uma ideia de uma reforma pedagógica, que contemplasse essa
integração no currículo, aliviando os alunos daquilo que …(carga horária). Fora isso, havia uma
outra coisa que era...os programas do 3º ano, que depois já passaram para o 4º, porque praticamente
os programas do 4º ano eram os do antigo 3º ano. E o 4º ano quem é que o fazia em 4 anos?
Investigador—Era difícil...
Jurista—Era muito difícil fazer o 4º ano em 4 anos; e depois dependia … se fosse no clarinete
fazia, no piano não, nem pensar nisso. Bom! (risos)
Investigador—Essa é uma batalha que ainda temos hoje.
Jurista—Ah pois é! Pois é…mas isso, hoje a batalha tem outros contornos (risos). No
Conservatório Nacional, tem outros contornos, mas...(risos). Aqui há tempos houve um rapaz nosso
conhecido que se quis inscrever no Curso de Canto e foi lá e perguntou: “Bom, quantos anos é que
são?”, e tal. “Bom, o curso geral de Canto são 3 anos; bom, mas não pense que faz em 3 anos! Ah
sim, não faz em menos de 6”. É claro que se tinha de dar o programa todo de canto, não é...; isto
não foi agora, já foi há uns dois três anos...
Investigador—Também em três anos não se faz um cantor, é evidente...
Jurista—Pois, é evidente que não, mas um curso geral não é para fazer completamente um cantor,
não é? Ah, mas a função do Conservatório é fazer “até ao fim”, não é?; pronto, é esta ideia …; e
portanto passar para a escola superior … “isso a escola superior é qualquer coisa que a gente rejeita,
o Conservatório é que tem de ser, pronto!”; e depois vem a contestação toda e a ideia do “ensino
vertical” – que o ensino tem de começar no mesmo sítio, desde os 5 anos com o mesmo professor
até aos 25 anos de idade, até ao curso superior, etc. Isto é um dos mitos da carreira Docente não é?
Porque isto tem que ver com a carreira Docente, dar a alunos …, tem...tem que ver com a carreira
Docente, tem a ver com a concepção do professor.
Investigador—É mais a carreira pedagógica...
Jurista—Pois, “o aluno tem de ser aluno daquele mestre para toda a eternidade!, isto de mudar de
professor é altamente negativo, cada professor tem o seu método”. É claro que isto é uma teoria
pedagógica; porque há outra teoria pedagógica que diz que quando ele (aluno) muda dá um “salto”,
não é?, porque é obrigado a refazer tudo aquilo que já fez, a sua técnica, com uma outra

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 100


Carreira Docente no Ensino Artístico Especializado—Área da Música
Que Regulação?

perspectiva, pronto, (risos); mas isto são perspectivas diferentes, que têm que ver
depois com a carreira Docente, não é. O que é um professor do ensino “secundário” (9)
do Conservatório – “coisa horrível”!; o que é um professor do ensino “superior” do Conservatório,
aquela coisa que acha que é superior a tudo e a todos! … a nós sobretudo. Bom! Isto tudo gerou de
facto uma situação muito complicada; a situação que eu em 87, fiz uma proposta …; porque isto
tinha muito que ver com uma outra coisa: a criação das escolas superiores separadas do
Conservatório, e quem herdou o “sacrossanto” Conservatório foi a escola “secundarizada”,
horrivelmente “secundarizada”; eu estou a fazer a caricatura...
Investigador—Evidentemente.
Jurista—Reconheço, e o problema é esse. Isto gera um mal estar entre as pessoas, não é, que se
teria evitado se a escola superior (de música) tivesse herdado o Conservatório e se (se) tivesse
criado autonomamente uma escola de nível básico e secundário que começasse a fazer o
trabalho...eu penso que hoje o Conservatório já está mais para aí virado e já tem secções de bairro...
Investigador—Não tem...
Jurista—Mas fala-se em criar em Oeiras.
Investigador—Em criar pólos na Amadora e Odivelas.
Jurista—Têm pólos? É isso. Isso foi uma das coisas que eu defendi, tinha que ter e podia integrar
aliás num projecto pedagógico comum, os pólos já existentes de ensino particular que havia nessa
altura – uma escola em Algés, no Palácio Anjos, que agora já não há, mas havia, a de Linda-a-
Velha, havia a Academia de Amadores de Música, a AAM não a Academia de Stª. Cecília, bom, a
AAM claro mas essa era ali mesmo ao lado.
Investigador—A Fundação Musical dos Amigos das Crianças.
Jurista—A Fundação Musical dos Amigos das Crianças, e se calhar havia que criar um pólo em
Oeiras, um pólo ma Amadora, um pólo...pronto...
Investigador—Em Loures existe agora.
Jurista—Em Loures pois. Quer dizer, porquê? Porque exactamente o ensino articulado só pode
fazer-se, ao nível do ensino básico até ao 9º ano, só pode fazer-se pela proximidade dos alunos; é
utópico pensar que as “mãezinhas” vão levar os meninos, isso era antigamente, quando as
mãezinhas não faziam mais nada a não ser de “mãezinhas”, mas as mãezinhas agora trabalham…
Investigador—A sociedade mudou.
Jurista—Pois, a sociedade mudou e portanto o Conservatório do “Bairro Alto”, tem de ser o
Conservatório Regional do Bairro Alto, quer dizer que abrange ali o Bairro Alto, ainda com a
concorrência da Academia de Amadores de Música.

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Carreira Docente no Ensino Artístico Especializado—Área da Música
Que Regulação?

Investigador—Exactamente... (10)
Jurista—Mas pronto, o que fazia sentido era então reunir naquele edifício central, digamos assim,
reunir os cursos de nível 10º, 11º e 12º (anos) assim e porque não em proximidade com os cursos
superiores, não é? Mesmo que tivessem uma autonomia pedagógica, mas num conjunto em que os
alunos se iam integrando também, etc. Bom, mas isto … mas isto era um projecto, não teve na
altura... A razão fundamental, na altura do 310, para isto não acontecer foi a preocupação que havia
no Ministério e que se compreende, de que as escolas superiores tinham de nascer livres dos
compromissos – tinham que escolher de facto os melhores professores, os habilitados, não sei quê, e
livres dos compromissos com aquilo que havia antes, e que era o caso designadamente também das
escolas do magistério primário, mas que acabou por absorver nas escolas superiores de educação,
estas acabaram por absorver e era isso que acontecia naturalmente. É evidente que as escolas
superiores foram buscar professores fora do Conservatório, mas também foram buscar muitos
professores ao Conservatório, não é? Como é evidente, porque os melhores também lá estavam, não
todos, havia bons que não estavam lá, até por limitação de vagas etc. As pessoas entram e depois
nunca mais saem, e portanto arrastam-se durante anos; mas isto teria possibilitando um outro tipo
de coisa, bom. Mas esta proposta de 87 não foi aceite pela escola superior, que naquela altura já
estava em conflito aberto, e, bom, era a subversão total daquilo; e também não seria aceite pelo
próprio Conservatório que se veria esvaziado, absorvido pela escola… pela odiada escola superior.
Criou-se de facto uma tensão que foi muito negativa.
Investigador—Deixe-me perguntar: acha que pelo facto de terem ficado fisicamente no mesmo
edifício não terá ajudado a essa separação real?
Jurista—Bom, na altura não havia outra solução, não é. Eu penso que foi sobretudo depois da saída
do edifício que se agravou esse corte, não é...talvez tendesse a pensar que isso se agravou ainda
depois da saída do edifício, acha que não?, que, que....
Investigador—Não sei, estou como...
Jurista—Pois, quer dizer, já não me lembro bem, depois manteve-se muito tempo numas salas lá
em cima, o Centro de Documentação e uma ou duas aulas, que se mantinham lá, numa certa tensão,
mas agora não me lembro em pormenor. A escola, quer dizer, as escolas (superiores) foram criadas
em (19)83, mas efectivamente só começaram a funcionar em 1987, Janeiro e Fevereiro de 1987, e
esses quase quatro anos, esses três anos e tal de indefinição das próprias escolas superiores
alimentaram no Conservatório todo esse …; quer dizer, a não criação imediata da Escola Superior
(de Música), que criou também essa tensão, não é, “agora tu vais e eu fico”, e tal; e depois é o tal
complexo da “secundarização”, não é? Bom, que enfim compreende-se na...pronto, no contexto; e

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Carreira Docente no Ensino Artístico Especializado—Área da Música
Que Regulação?

evidentemente, em relação ao Conservatório de Lisboa e Conservatório do Porto, que eram os tais


que tinha os cursos superiores, bom…. Agora, não há dúvida … quando há bocadinho… – voltando
muito atrás – lhe dizia … quando eu fui para lá com estas ideias, estas ideias não tinham nada de
original; estas ideias de quê?, de inserção no sistema (educativo) não tinham nada de original;
afinal, aquando da Experiência Pedagógica tinha-se tentado fazer exactamente isso; aliás, como lhe
digo, a própria coisa em 1930 também tinha; mas a Experiência Pedagógica tinha tentado fazer isso
e depois a Experiência Pedagógica afundou-se no 74, 75; em 77 salvo erro 78, 77 ainda começaram
os gestores do Conservatório, aquela fase também muito confusa e muito tensa lá dentro...e depois
ai a partir de 78, 79 a Drª Madalena Perdigão, agora não no Conservatório mas no gabinete do
ministro, no Gabinete Coordenador do Ensino Artístico procurou, digamos, definir uma lei de bases
do ensino artístico, era aquele Plano Nacional do Ensino Artístico, inserido dentro da lei geral de
bases e propondo exactamente uma integração, no fundo, no sistema geral; portanto quer nas
carreiras Docentes, quer a integração no sistema de ensino, que era fundamental, dar uma carreira
ao aluno que seja paralela a qualquer carreira de formação profissional, bom.
Investigador—Incluindo os professores numa carreira Docente?
Jurista—Incluindo também os professores numa carreira Docente, semelhante à do ensino
secundário. Esta semelhança … houve várias tentativas de negociação de coisas que nunca se
chegaram a concretizar …; e depois houve um despacho, quer dizer, que reduziu para as 18 horas,
mas que não se baseava em coisa nenhuma, quer dizer, foi uma coisa arbitrária.
Investigador—Não é o 310 que vem dizer as 18 horas?
Jurista—Não, o 310 diz uma coisa que está aí,...(procura-se o exemplar) é este, o 310 diz uma
coisa …, depois tem uma vasta secção de transição do pessoal Docente, “os actuais professores...”;
o que diz em relação … em relação ao pessoal Docente é que se integra...é que se integra nas
carreiras Docentes do respectivo nível de ensino...onde é que está? Regime de transição … já
começa aqui, da Carreira...carreira Docente, “aplicam-se aos Docentes do ensino da música de nível
preparatório e secundário as disposições sobre carreiras, constantes no Decreto Lei 513M1/1979 (de
27 Dezembro)”, do ensino secundário. Aos Docentes do ensino da música de nível preparatório e
secundário, “as habilitações serão fixadas por portaria...”; porque evidentemente havia
especificidades.
Investigador—Havia que legislar à posteriori...
Jurista—pois, havia que legislar adequadamente às habilitações, que não eram as habilitações
normais do resto...(dos professores), o sistema de profissionalização – portanto previa-se também a
profissionalização – “será definido...etc”., “os concursos a que se refere este artigo regulam-se pela

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Carreira Docente no Ensino Artístico Especializado—Área da Música
Que Regulação?
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legislação geral aplicável aos concursos, etc.”. Isto foi muito contestado também porque,
evidentemente, os professores deviam de ter um concurso de provas práticas e não concurso
meramente...(documental).
Investigador—Mas não fazia sentido fazer também um concurso com provas práticas?
Jurista—Podia fazer, quer dizer foram feitos ajustamentos...
Investigador—Para além do concurso documental?
Jurista—Para além das documentais, claro; evidentemente que poderia fazer sentido, poderia fazer
sentido, se bem que os concursos documentais deviam documentar uma carreira que comprovava
…, não é? Portanto, quer dizer, poderia não ser indispensável fazer um concurso de provas práticas.
Investigador—Poderia ser redundante...
Jurista—Desde que, claro, desde que o que se exige num concurso documental comprove uma
carreira artística, quer uma carreira, quer uma carreira Docente, nesse domínio, não é? Portanto,
poderia ser ou não.... “Poderão ser contratados para prestação de serviços” etc,.... Pois, isto é outra
coisa que estava prevista e não sei se hoje se faz um pouco – “Aos Docentes do ensino da música de
níveis preparatório e secundário poderá ser distribuído serviço em diferentes estabelecimentos de
ensino, incluindo a leccionação de iniciação musical e instrumental, no ensino preparatório e no
ensino primário, na educação pré-escolar, em turmas reguladas por despacho”; portanto já aqui se
previa que pudesse haver uma iniciação ao nível...
Investigador—Ao que se chama hoje as AECs.
Jurista—Hoje as AECs; mas as AECs, atenção, atenção, estão situadas fundamentalmente no
domínio da preparação musical geral e não das iniciações instrumentais; o que se previa aqui, aos
Docentes, portanto, poderia se atribuída serviço de leccionação, de iniciação musical e instrumental
no ensino primário e na educação pré-escolar, … até na educação pré-escolar, bom, “em termos a
regular pelo Ministério da Educação”; “quando o serviço destes Docentes obrigar à deslocação dos
estabelecimentos onde estão colocados, dá direito à compensação dos encargos de deslocação, nos
termos da lei geral”. Isto o que é que previa? É que pudesse haver professores que circulam, porque
dão duas horas aqui, duas horas ali, duas horas acolá, não é? E isto é uma coisa que já estava
prevista no 310, e que me parecia importante. “Aos Docentes do ensino superior aplica-se o estatuto
das carreiras Docentes do ensino superior politécnico”; isto, claro, foi outra opção que foi discutida,
porque o Plano Nacional de Educação Artística encaminhava-se no sentido do ensino universitário,
da integração do ensino da música no ensino universitário; entretanto em (19)80 foi criado o …
(Departamento de Ciências Musicais, na Universidade Nova de Lisboa). O Plano Nacional de
Educação Artística é de (19)79; eu não sei se você tem o Plano Nacional de Educação Artística?

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Carreira Docente no Ensino Artístico Especializado—Área da Música


Que Regulação?

Investigador—Não tenho...
Jurista—É muito difícil, é espantoso …; a Drª Cecília tem de certeza, mas o António Ângelo de
Vasconcelos, não encontrou isto no Ministério, (risos) encontrou aqui na minha papelada.
Investigador—Plano Nacional de Educação Artística.
Jurista—Seria engraçado ver o que é que se aí dizia sobre as carreiras Docentes, se é que se dizia
alguma coisa, que eu já não me lembro.
Investigador—Irei fazer pesquisa.
Jurista—Pois, a Drª Cecília tem de certeza, que ela trabalhou nisso; mas o António Ângelo de
Vasconcelos, quando foi ao Ministério, aos arquivos lá em...
Investigador—Na 5 de Outubro possivelmente...
Jurista—Na 5 de Outubro também, mas o que acontece é que muito do que havia na 5 de Outubro
foi tudo despejado para uns armazéns que o Ministério tem em...
Investigador—No Instituto Histórico da Educação?
Jurista—Sacavém, é uma coisa que há para ali em Sacavém, não sei exactamente onde é, também
nunca lá fui. Mas pronto, ele procurou por ai tudo e não encontrou nada. É espantoso, até porque
aquilo foi distribuído por toda a gente; eu recebi lá também nos Açores e vim cá a uma sessão em
conjunto com toda a gente, etc. Portanto há-de haver muita gente que o tem, mas ele estranhamente
não encontrou isso no Ministério; mas a Drª Cecília tem com certeza e eu tenho-o, o António
Ângelo Vasconcelos tirou fotocópias do meu, mas neste momento confesso-lhe que não encontrei
ali. Portanto o que se dizia...Ah pois...pronto, mas isto já é do ensino superior; o que está a estudar,
não é ensino superior.
Investigador—Não é só o secundário.
Jurista—“Ensino Particular e Cooperativo”, etc., … os contratos simples e os contratos de
associação, isto nunca foi aplicado como eu preferiria, mas enfim …; depois, regime de transição
em relação ao pessoal Docente – “Regime de transição do pessoal Docente”, “os professores
beneficiam do regime de transição previsto”, etc. “São criados os quadros transitórios …, “Têm
direito a ingresso no quadro transitório os professores com mais de 5 anos, etc., será contado o
tempo prestado no ensino particular...quadro transitório, etc...Os professores do quadro transitório
do ensino superior serão equiparados …; aos professores do quadro transitório que prestam serviço
nos estabelecimentos de música complementar e secundário poderão ser atribuídas de acordo com
as necessidades de serviço até 18 horas semanais”. Ou seja, o que se dizia aqui é que eles
conservavam o seu direito às 12 horas, no entanto podia ser atribuído até 18 horas por necessidade
de serviço, ou seja, apontava-se até às 18 horas semanais de serviço Docente ou equiparadas, só

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Carreira Docente no Ensino Artístico Especializado—Área da Música
Que Regulação?

podendo ser consideradas horas extraordinárias as que excedam aquele número (14)
(18h). Bom, isto tinha que ver com quê? Isto tinha que ver com não criar um fosso muito grande
entre os novos contratados, que eram contratados com base nas 22 horas, e os que já lá estavam,
com base em 12 horas e que, se dessem 13 ou 14, já estavam a receber horas extraordinárias; isso
não era justo, até às 18 horas podia ser-lhes distribuído sem ganharem mais.
Investigador—Mas e todos foram contratados com 18 horas no máximo...eu fui.
Jurista—Pois, mas isso foi depois deste despacho, pois foram, mas essas 18 horas não podiam ser,
tinham de ser 22 horas. Atenção essa diminuição de 4 horas não teve que ver com o decreto (310) e
o que este decreto dizia era as 12 horas, podiam ir até às 18 horas, só a partir das 18 horas é que
eram extraordinárias. Porquê? Na carreira com base nas 22 horas ao fim de não sei quantos anos
passava a 20 e ao fim de não sei quantos anos passava a 18 horas. Portanto, as 18 era o horário dos
professores do ensino Secundário, era de 18 a 22 horas, não é? 18 no fim da carreira, 22 no início da
carreira, mas as 18 era o mínimo que os professores do ensino secundário tinham. Bom. É claro,
não estamos a falar do ensino nocturno, pois … e as direcções de turma, de departamento, tinham
reduções em função das 18, das 20 ou das 22.
Investigador—Então terá havido aqui uma interpretação muito peculiar da legislação?
Jurista—Não houve interpretação nenhuma, os professores estavam todos em pé de guerra com
aquilo tudo. Disseram: “pronto, calem-se lá todos, dou-lhes as 18 horas a todos” (risos). Está a ver
…; mas foi uma coisa que não teve uma base de equiparação nem àquilo nem àqueloutro, ou seja,
criou-se uma situação de excepção, de “especificidade” do ensino artístico. As 18 horas … é porque
são artistas, é por isso, é por isso, não podem ter 20 ou 22, porque são artistas, só podem ter 18!
Mas está a ver, eu estou a dizer isto desta forma irónica, da “especificidade” do ensino artístico …;
mas é que, de facto, este termo de “especificidade” do ensino artístico passou a ser daqueles
chavões...
Investigador—Uma capa para esconder...?
Jurista—Interesses que são muito compreensíveis. Depois outra coisa que se tentou, … porque
havia sempre um problema, … Os professores do EAE têm que ser artistas, ser artistas praticantes,
não é? … têm que tocar, e não há tempo …, não pode ser uma coisa e outra. Então tentou-se
negociar uma coisa deste tipo: muito bem, o professor é contratado para dar as 22 horas ou seja lá o
que for, as 18 horas de aulas, bom, mas pode ser dispensado em função de uma prática artística,
mas também não é uma prática artística qualquer. Depois foi complicado definir o que era isso,
incluído no ordenado do professor; ou seja o professor daria concertos, tudo bem; daria concertos
para os quais estava dispensado então de horas de aulas; não era para ir dar concertos para a

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 106


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Que Regulação?

“Cochinchina”, naturalmente a ser pago pela escola, … porquê? Você está em (15)
Linda-a-Velha e agora só dá metade do horário porque vai dar concertos por esse mundo fora; então
o que é que a escola de Linda-a-Velha tem que ver com isso? Não, agora, se você der regularmente
concertos no Conservatório e para o prestígio do Conservatório, como exemplo dos seus alunos,
ah!, isso sim!; pronto, se tiver essa prática artística ali; … agora se tiver um segundo emprego, isso
é outro problema. Se tocar na orquestra sinfónica nacional tudo bem, mas isso é outra questão, não
é? Isso aí é naturalmente incompatível com a exclusividade, mas os professores do ensino
secundário não tinham exclusividade, portanto desde que os horários (permitissem) podiam fazer
uma outra carreira artística paralela; não havia razão para essa carreira artística paralela … e
portanto também não havia digamos razão… – essa carreira artística paralela, é pago para isso, não
é verdade? – fazer reduzir o número de aulas, pagando-se o mesmo, não é?
Investigador—Nunca foi posta a hipótese aos professores de haver duas carreiras paralelas, ou seja
um professor “artista” que tem um horário reduzido e que ganha, ganharia consoante a carreira, para
permitir fazer os tais concertos e o professor na sua pura acepção da palavra?
Jurista—Ouça, nada impede que esteja contratado a tempo parcial, isso qualquer professor pode
estar, porque tem um trabalho intensivo na orquestra, não sei que mais, não pode dar 22 horas, está
bem, mas pode dar 10, pode dar 8...
Investigador—Ou 12...
Jurista—Ou 12 e então, bom, mas não está a receber um ordenado por inteiro, está contratado a
tempo parcial, também não está a ocupar um lugar de quadro...
Investigador—Exactamente.
Jurista—Mas isto faz parte do senso comum; aliás há uma outra coisa, que já agora isto tem a ver
com a carreira Docente, e que é o seguinte: Quando eu cheguei ao Conservatório o Sr....Ah! Como
é que ele se chamava, o secretário do Conservatório? Ah! Já lá vão 30 anos...já lá vão 30 anos!
Investigador—Eu também estou a tentar...(Sr. Antunes)
Jurista—Então o secretário do Conservatório o Sr. ...está-me debaixo da língua …, veio-me expor
um assunto que era complicado, quer dizer, “Isto agora com a complicação do estatuto da função
pública …”; havia um problema com as faltas, as faltas, porque as faltas, agora já não me lembro
bem exactamente qual era o problema, mas...as faltas eram descontadas de uma maneira...porquê?
Porque eles como só davam 12 horas de aulas, aquilo era considerado pelo Ministério das Finanças
e pela Administração Pública como um tempo parcial. E pronto, eles ganhavam pela letra não sei
quê, tinham um lugar de quadro na letra baixinha, mas depois aquilo era considerado um tempo
parcial …! Mas então, a final de contas era um lugar de quadro…, não era um tempo parcial, se era

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 107


Carreira Docente no Ensino Artístico Especializado—Área da Música
Que Regulação?

um lugar de quadro; isto não encaixava dentro daquilo! Ora eu tinha passado por (16)

uma situação semelhante a esta, que era a dos médicos escolares no Instituto da Acção Social
Escolar, que era a dos médicos escolares – os médicos escolares tinham 18 horas de serviço, mas
tinham um lugar de quadro de médico daquela escola e não sei quê; mas estas 18 horas de serviço –
os funcionários públicos tinham 36 – era obviamente meio tempo, e lá estavam depois essas
regalias, não sei quê, eram todas de meios tempos, não sei de quê, e era considerado tempo parcial.
Ora bem, porquê é que isto era assim? Isto também não era tão original como isso, porque os
professores do ensino superior no fundo também se considerava, tinham evidentemente escalões lá
em cima, os prestígios e a sua coisa etc. … mas era considerado um tempo parcial; esta história da
dedicação exclusiva que mais tarde foi criada, etc., não existia; porque era suposto que o Prof. de
arquitectura era um Arquitecto, que o Prof. de Engenharia era um engenheiro...
Investigador—Praticante como o músico...
Jurista—Que o Prof. de Medicina, bom, se ele não era um médico e não tinha a sua clínica, o que é
que ele sabia daquilo, não é? Bom, portanto, isto era um complemento para os que sabiam mais,
mas não eram professores em tempo inteiro, isso não era concebível, que fossem só professores de
medicina, só ali fechados ali a ensinar, a ensinar o quê? Tinham que estar na prática! O mesmo
acontece com os músicos – os professores do Conservatório, era suposto, eram músicos a fazer
música em qualquer sítio e por isso tinham ali um tempo parcial de 12 horas para dar aulas, para
ensinar aquilo que sabiam e que praticavam, não é? Bom, só que esta perspectiva (actual) era
diferente, é uma perspectiva do professor de tempo pleno e que ensinava a tempo pleno e que
evidentemente com 22 horas não tinha tempo para andar a fazer concertos e para andar a tocar na
orquestra, não é?
Investigador—Exactamente...
Jurista—Como conciliar as duas coisas, e tal. Há um papel curioso que eu tenho ali. (a entrevista é
interrompida neste ponto para consulta documental)
Jurista—Agora conduza isto com mais...
Investigador—Agradeço … é que são elementos extremamente...(importantes). Esta versão (do
310) que foi apresentada aos professores, este preâmbulo tem cinco pontos, o decreto final tem dez,
o documento final está dividido em dez pontos, este aqui tem cinco, houve alguma razão na altura,
se é que se recorda...
Jurista—Mas não tem aí o (310 final)?
Investigador—tenho em computador...parto do pressuposto que o documento final não estaria
pronto, do documento final...

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Que Regulação? (17)
Jurista—O que importaria era ver o que é que está a mais, é como lhe disse, eu tenho ali, encontrei
duas versões disso que identifiquei...
Investigador—A versão final nunca foi, antes de ser publicada, não foi mostrada aos professores
ou já foi consequência do trabalho em conjunto com eles?
Jurista—Isso foi já do trabalho em conjunto, foi; foi aliás aquilo que tenho ali também – a lista das
escolas e das personalidades; eu não sei, isto não é vulgar, fazer decretos-lei, ouvir tanta gente, eu
tenho ali a lista das personalidades que foram ouvidas...
Investigador—Ouvidas?
Jurista—Que nunca mais acaba … São salvo erro cinco para além das escolas, e das escolas
particulares também, não é. Não sei se foi enviado a todas as escolas particulares mas pelo menos
foi enviado às AEEP, foi enviado a todos os Conservatórios oficiais e foi enviado, salvo erro a
cinco personalidades indicadas por várias pessoas, enfim pelas escolas, aliás – diz lá expressamente
– nós fizemos uma reunião com as escolas (de) Lisboa, Porto, Braga que eram as oficiais...
Investigador—Coimbra e Aveiro que foram oficializadas pouco tempo depois...
Jurista—Foi pouco tempo depois, já não me lembro, mas foi assim um conjunto de escolas e esse
conjunto de escolas propôs as personalidades que deviam ser ouvidas e salvo erro foram cinco
personalidades para cada um dos ramos de ensino – cinco para a música, cinco para a dança, cinco
para o teatro, cinco para o cinema; tenho lá os nomes, também lhe posso juntar essa lista; isto para
além das escolas; e eu devo de ter num dossier qualquer também as respostas. Tudo isso foi levado
em consideração, não quer dizer evidentemente tudo aceite, não é, mas foi levado em consideração
tudo isso dentro da linha, da linha geral traçada...
Investigador—O 310 – e para terminar, uma vez que me foi respondendo ao longo desta nossa
agradável conversa – o 310 prevê bastante legislação a publicar posteriormente para regular...e não
foi.
Jurista—Esse foi um dos grandes problemas, não foi? E isso também está ali documentado e é
engraçado também isso, não é, há uma preocupação de que este projecto foi apresentado, há um
despacho do ministro a dizer que deve ser apresentado até 31 de Dezembro de 1982, mas depois há
uma informação qualquer em que eu digo que é apresentado … qualquer coisa de Janeiro … e
imediatamente se propõe a constituição de uma série de grupos de trabalho para desenvolver a parte
dos programas, porque se diz que, para isto entrar em vigor em Outubro, é urgentíssimo fazer andar
simultaneamente …; como é que se avança com programas sem estarem definidos os planos de
estudo? Está bem?. Mas há determinadas disciplinas que a gente já sabe que vão constar do plano
de estudo, História da Música está no plano, tem que estar qualquer que seja o plano de estudos, e

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Carreira Docente no Ensino Artístico Especializado—Área da Música
Que Regulação?
(18)
portanto vamos avançar já com um trabalho simultaneamente com o trabalho dos planos de estudo;
na verdade os planos de estudo vieram e depois, o que é que aconteceu? – o 310 foi aprovado no
último conselho de ministros daquele governo, que caiu imediatamente. O Professor Fraústo da
Silva … – o último conselho de ministros, salvo erro, é de 20 de Maio – … e aprovou-se o decreto;
e no dia seguinte obviamente o decreto estava contestado, não é. Portanto o ministro seguinte o
Augusto Seabra, o José Augusto Seabra, foi logo atacado por todos os lados para revogar o decreto-
lei. Bom! Em todo o caso, ele chamou-me lá, também chamou o Conservatório, e disse: “Neste
momento isto está aqui, isto foi aprovado, isto já tem um longo processo para trás, vamos avançar
com isto. E o que é que se avançou? Avançou-se com as definições do plano de estudos, não é, e
também de algumas situações, também de transição dos alunos, era importante situá-los...
Investigador—Exactamente.
Jurista—E aí saiu a Portaria 214? (294/84, 17/05)...não sei a portaria do plano de estudos, que saiu
salvo erro só em Abril de (19)84; portanto obviamente já não se aplicou naquele ano lectivo
primeiro em Outubro, mas aplicou-se em Outubro seguinte.
Investigador—Aplicou-se ou tentou aplicar-se?
Jurista—Aplicou-se entre aspas!
Investigador—Era isso que gostaria de saber.
Jurista—Mas isso é muito difícil de lhe dizer.
Investigador—Já calculava que assim fosse.
Jurista—Não...deixe-me ver, caiu o ministro, eu estava a trabalhar com aquele grupo de trabalho
com o ministro e então fez-se uma proposta para eu passar para a Direcção Geral do Ensino
Secundário, as escolas superiores ficaram na Direcção Geral do Ensino Superior. Eu fui lá chamado
à Secretaria de Estado, ainda consegui tratar da nomeação logo a seguir à saída do decreto (310), já
com o José Augusto Seabra e os Secretários de Estado respectivos, conseguiram-se fazer as
nomeações das comissões instaladoras das escolas superiores – e isso foi fundamental para a
sobrevivência do sistema; se não, não sei o que teria acontecido. Mas pronto, nomearam-se as
comissões instaladoras que começaram também a trabalhar, etc., a trabalhar com o ensino superior;
de vez em quando chamavam-me “Oh, António, vem cá”, mas pronto, a título particular, não é, na
continuação do trabalho que tínhamos desenvolvido antes, como é evidente. Mas eu fui colocado da
DGE Secundário, para desenvolver toda a legislação que era necessária sair, fundamentalmente a
parte do ensino secundário.
Investigador—(para) Complementar o 310.

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Que Regulação? (19)

Jurista—Complementar o 310 na parte dos Conservatórios de ensino secundário, agora


“degradados à condição de ensino secundário”. E o que é que havia que fazer? – os planos de
estudo que já tinham sido, como digo, começados a preparar em Janeiro ou Fevereiro (1984), antes
da saída do decreto em Julho, mas cuja portaria só veio … mas foi discutida numa reunião, salvo
erro em Castelo Branco, com os Conservatórios particulares também, etc. E eu penso que de um
modo geral o que diz a portaria entra em vigor em Outubro desse ano; e aqueles (alunos) … depois
houve um despacho sobre a transição dos alunos, também já não me lembro assim em pormenor,
mas eu tenho essa documentação; bem, evidentemente que depois veio a verificar-se aqueles
truques todos que a gente há bocadinho dizia, não é, “pois isto agora são 4 anos, mas não penses
que te deixo sair em menos de 6 anos”, não é? Isso é outro problema; portanto a aplicação prática
depois real disso terá sido complicada, sobretudo nalgumas escolas. Depois houve outra coisa que
foi importante e que não foi muito fácil e que eu depois...perdi-me. Eu estive de 84 a 87 na DGE
Secundário a tratar de toda a regulamentação disso (310). Houve um grupo de trabalho também
para os programa das disciplinas comuns, História da Música, Composição...
Investigador—Ou as chamadas “As Teóricas”?
Jurista—Ou as chamadas as teóricas, exactamente, antigamente chamadas complementares,
pois...designadamente, e da Educação Musical claro, também. Eu já não me lembro em pormenor,
lembro-me de ter trabalhado em pormenor a disciplina de Análise e Técnicas de Composição com a
professora...
Investigador—Maria de Lurdes Martins?
Jurista—Maria de Lurdes Martins, não a vejo também há que séculos.
Investigador—Ela faleceu.
Jurista—Já faleceu? Ah, eu não soube...
Investigador—Também só soube depois.
Jurista—Eu calculei, porque ela ultimamente já não estava muito bem, mas depois de facto perdi-a
de vista, tinha amizade...
Investigador—Ainda tive algumas aulas com ela.
Jurista—Pois o programa de ATC foi feito por ela, mas eu devo dizer-lhe que não sendo da
especialidade, (risos) tive com ela discussões sobre isso...
Investigador—Os conteúdos?
Jurista—Os conteúdos, etc. Para fugir ao esquema clássico da harmonia, não é, ao clássico
esquema da harmonia, e pegar …, porque dizia-se que o ouvido está feito todo à harmonia...(risos)
Investigador—Às consonâncias.

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Que Regulação?

Jurista—Às consonâncias, mas isso pode quebrar-se.


(20)
Investigador—E à harmonia tonal.
Jurista—E à harmonia tonal, e depois lá se dava na História da Música umas coisas sobre a
Modalidade...
Investigador—Sobre a harmonia não tonal?
Jurista—A harmonia não tonal. … e porque é que a gente não pega nisto … – e eu tinha alguma
sensibilidade disso das aulas da Professora Maria Augusta Barbosa de análise musical, etc. – …
porque é que a gente não pega nisto na perspectiva da evolução histórica que isto teve e podemos
começar pelos modos gregos, “é pá que coisa estranha que soa mal” … olha pois aí está!; mas
depois isto evolui para chegar aqui e depois desenvolve-se para destruir o sistema, em certa medida.
… Porque é que não pegamos na perspectiva histórica e não fazemos a ATC começando por uma
coisa que apesar de tudo é acessível, a modalidade grega, os modos gregos, a modalidade
gregoriana etc. Apesar de tudo não soa assim tão mal, mas abala. Abala o ouvido harmónico da
harmonia clássica, para depois entrarmos na harmonia clássica e depois no desenvolver de alguma
forma de destruir...
Investigador—A construção e desconstrução.
Jurista—A desconstrução do sistema … e foi isso que ficou no programa de ATC. Mas isto vinha a
propósito de quê? Ah, do desenvolvimento simultâneo destes grupos! Entretanto, é claro que a
implementação do plano de estudos tinha que ver também em parte com os programas, embora,
embora se pudesse aplicar (a)o plano de estudos antigo, mas pronto com alguma adaptação, porque
por exemplo, lá se esticava o 3º ano que já se tinha esticado para o 4º em 71, (agora) esticava-se
para o 5º ano, não é, porque correspondia à prática, não havia necessidade; e depois é a tal história,
ao contrário de 1930, os alunos estavam de facto muito sobrecarregados, portanto com menos
tempo para estudar, mas com alguma possibilidade de estudando alguma, etc., conseguir concretizar
os programas.
Investigador—Os planos de estudo.
Jurista—Uma das coisas que se previa também e está lá num papel que lá tenho, se lhe interessar
também lhe posso mandar, está exactamente este aspecto. Ah, eu ia dizer qualquer coisa que
agora...
Investigador—Sobre os planos de estudo...
Jurista—Sobre os programas...este esticar para o 5º ano...Ah! Já sei o que é que ia dizer sobre os
programas – está previsto nos instrumentos, o que aliás havia em França também, de um repertório
classificado por níveis, dando portanto quer aos professores, quer aos alunos a noção da coisa do

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Carreira Docente no Ensino Artístico Especializado—Área da Música
Que Regulação?
(21)
ponto de vista pedagógico, que é o programa do 1º ano, do 2º ano, do 3º ano e do 1º grau, 2º grau,
do 3º grau; o aluno quanto mais depressa chegar a esse grau melhor. O aluno ao fim de 5 anos,
antes disso não pode se calhar fazer o exame final de...mas se o fizer a um nível mais adiantado,
continua adiantado, embora esteja no 6º ano , não quer dizer que esteja no programa do 6º ano, pode
estar no 8º grau. Portanto, essa maleabilização que muitas vezes foi muito mal entendida no
Conservatório.
Investigador—Porque não pensaram em objectivos a atingir pelos alunos, mas em programas
estanque...
Jurista—Em programas estanque; mas por outro lado condenando uma rigidez dos anos, porque os
meninos podem ser génios aos 5 anos, porque já o Mozart tocava não sei o quê...e portanto e
portanto essa maleabilização da progressão no instrumento era muito importante e era considerado
fundamental na definição dos programas.
Investigador—Eu queria só, e agora para terminar: se esta falta de publicação da legislação
superveniente relativa aos professores, à criação da profissionalização e dos quadros de escola, veio
desvirtuar as intenções do 310?
Jurista—Quer dizer, obviamente que não veio completar o sistema e portanto deixa-o sempre
“coxo”, sempre sujeito mais uma vez às contestações todas; é claro que as contestações que se
arrastaram durante 30 anos e provavelmente ainda de arrastam, correspondem de facto a uma
insatisfação que teve na sua origem, pronto, nos problemas pessoais de quem se sente, “mas nós
vínhamos do ensino superior e agora passamos a ser secundário, que horror”, “artista é sempre
principal, nunca pode ser secundário”! Assim, uns complexos deste género que no fundo
correspondiam a sentir-se um bocado, porque se cultivava muito aquele espírito nós somos os
melhores do mundo e arredores; bom, fossem o que fossem, alguns com certeza que eram, bom,
depois claro quando as escolas superiores – esse período de indefinição das escolas superiores foi
muito prejudicial, nesse sentido – depois quando se criaram as escolas superiores naturalmente
foram buscar os melhores, “não, não, foram buscar mas foi os amigos, porque eu sou muito melhor
que o Coutinho, só que foram buscar o Coutinho em vez de virem buscar a mim, não é, pois é claro,
porque ele é amigo do...”. Isto compreende-se; já não é compreensível como é que isto se arrasta
por mais 30 anos, depois de os mais afectados terem saído; mas isto conseguiu manter a chama viva
com os novos que entravam; conseguia-se manter esta chama viva porque “nós é que somos
(verdadeiramente) superiores”.
Investigador—É curioso, novos formados na escola superior.
Jurista—Ah é? Já formados na escola superior?

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Que Regulação?

Investigador—Exactamente. (22)
Jurista—Agora uma coisa: não há dúvida, não é, o 310 criou as escolas superiores; não sei se as
escolas superiores tiveram o melhor desenvolvimento, se realmente foram puxar para cima no
ensino, não tenho elementos para (avaliar)...penso que foi muito importante e que ainda é muito
importante...não tenho capacidade para avaliar isso, de maneira nenhuma, mas pelo menos
permitiram também, quanto mais não seja aos próprios alunos um estatuto de ensino superior. Eu
lembro-me que uma das queixas dos alunos que andavam no Conservatório, é que enquanto um
aluno do ensino superior tinha dispensa do serviço militar, enquanto não sei o quê...os do
Conservatório não tinham.
Investigador—A menos que fossem músicos militares...
Jurista—A menos que fossem músicos militares, esses não iam, já lá estavam.
Investigador—Não iam para o ultramar …
Jurista—Pois, pois …; mas é isso, havia necessidade de definir um estatuto da escola, um estatuto
dos professores, um estatuto dos alunos (de nível superior, reconhecido); bom, isso é uma
perspectiva meramente burocrática? Não é meramente burocrática, é quase, diria que é de
cidadania, que é de cidadania. Porque de facto era considerado “Ah! Aqueles são os artistas, são os
artistas, coitados só têm a 4ª classe, mas acham que são uns artistas, tocam corneta”! Mas isto (a
necessidade de equiparação de estatutos) era de facto uma ideia minha? Não, isto é uma ideia que
vinha de trás e muito de trás e que teve reformas falhadas sucessivas, que se agarraram a um
presente que ficou rapidamente passado com a história de 1930 e 1971; é característico, quer dizer
foi de facto um azar das duas vezes sucessivas a 40 anos de distância. E de resto … não me lembro
em pormenor disso, … eu tenho para aí um livro do (Dr.) Ivo Cruz que se chama “O que fiz e o que
não fiz”, você conhece? mas a certa altura, tenho uma vaga ideia, não o li todo ao pormenor, ele
tentou apresentar várias propostas de reforma que depois nunca tiveram saída.
Investigador—Eu ouvi da boca dele ele dizer isto.
Jurista—Evidentemente, esse aspecto … de facto a Direcção Geral do Ensino Superior estava
bloqueada porque aquilo não era ensino superior, também não era ensino secundário, era um ensino
especial, um ensino artístico, um ensino que ninguém sabia muito bem o que lhe havia de fazer, não
é?; e aquilo bloqueava ali, quer dizer os papeis iam para lá, e mais papeis, que ficavam na gaveta;
quer dizer, enquanto a gente não souber o que isto vai ser, pronto …. E portanto a integração disto
no sistema de ensino era uma prioridade e estava já contemplado no projecto de (19)79, no Plano
Nacional de Educação Artística de 79, estava em vista na Experiência Pedagógica de 71 e

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Carreira Docente no Ensino Artístico Especializado—Área da Música
Que Regulação? (23)

provavelmente vinha de trás com algumas ideias que nunca tiveram seguimento. Mas a sua
pergunta concretamente essa tal última era?
Investigador—Até que ponto o 310 não teve um maior impacto e não foi...
Jurista—O desenvolvimento do 310 fez-se em relação ao plano de estudos, fez-se em relação a
alguns programas mas não todos, sobretudo penso que não se chegou a fazer nos programas dos
instrumentos e que era esse tal repertório classificado por graus e a adopção francamente dos graus.
Investigador—Com objectivos finais.
Jurista—Com objectivos finais exactamente, uma das coisas que tenho nesse papel, que eu ali
tenho e que diz: serão fixados os objectivos finais de cada ciclo e há uma maleabilidade na
progressão deles; e depois concretamente previa-se, por exemplo naquele esquema anexo do coiso
que tinha isso, naquela minha, no meu papel, o curso de instrumento tinha de ter uma saída com o
8º grau, não é, no mínimo, tanto podia ser o 9º grau ou 10º, mas tinha que ter uma saída com o 8º
grau no mínimo; o curso de educação musical tinha que ter uma saída com o 5º grau de
instrumento, tinha de haver domínio de um instrumento para seguir para as escolas superiores de
educação; para seguir para as ciências musicais tinha que haver o domínio de um instrumento ao
nível do curso geral, 5º grau; e portanto quem chegasse ao 12º ano, não é, e não dominasse o 8º grau
tinha de qualquer forma o 12º de música, mas tinha do curso de educação musical (formação
musical) e não de instrumento; o que também não o impedia de estudar mais instrumento e
concorrer à escola superior, isso é outra questão; mas pelo menos tinha o diploma do 12º ano de
formação musical se tivesse o domínio do instrumento ao nível do 5º grau e portanto essa
maleabilidade era extremamente importante; já na F.M. não havia a mesma maleabilidade, quer
dizer, em princípio isso correspondia ao 1º ano, 2º ano, 3º ano, pronto, e tinha de ter aproveitamento
de F.M....
Investigador—Mas deixe-me só voltar um pouco ao 310, está previsto criar os quadros de escola a
nível Docente?
Jurista—Os quadros de escola, evidentemente; os quadros de escola porque é que nunca foram
criados, não sei se foram, eu julgo que foram...
Investigador—Não, nunca foram.
Jurista—Nunca foram mesmo?
Investigador—Historicamente o 310 inseriu uma série de Professores que estavam nas condições
previstas num quadro transitório; depois disso a inserção seguinte vem incluir noutro quadro que
também é transitório, é o Decreto Lei nº 234/97, que foi apresentado ao governo pelo conjunto das
escolas públicas...e entretanto...

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Que Regulação?

Jurista—Eu tinha ideia...em 97? (24)


Investigador—Em 97 e entretanto, onde eu também participei porque estava na direcção da escola,
houve um projecto de decreto lei que também foi feito por nós para a criação dos quadros e onde
estava previsto aqueles professores que tinham concluído os cursos superiores (do 18881/1930) o
caso da Profª. Melina Rebelo o mais flagrante (entre) e outros fossem considerados professores no
10º escalão...
Jurista—Pois, pois...
Investigador—Esteve na iminência de ser assinado, alguém estava a assinar e alguém lhe puxou a
mão, isto é uma figura de...
Jurista—De estilo.
Investigador—De estilo, e não foi assinado; precisamente ia criar os quadros de escola. Há uma
desconfiança nossa que haveria algumas pressões da Universidade de Aveiro para que isso
acontecesse.
Jurista—Porquê?
Investigador—Porque eles estavam a por no “mercado” professores de música profissionalizados e
que estes teriam prioridade perante os outros (os que estavam já no sistema), porque nós dávamos
prioridade aos professores que estavam no sistema.
Jurista—Que estavam na escola.
Investigador—Que estavam na escola e houve um dos Conservatórios...
Jurista—Isso é das tais coisas… Bom, a guerra toda que se criou, a mesma indefinição no
ministério, “o 310 está errado, toda a gente diz que está errado, bom mas o que é que a gente vai
fazer para o substituir? Como é que ele se chama? O que criou depois a academia lá em baixo...
Investigador—Graça Moura.
Jurista—Graça Moura, ia resolver o assunto...
Investigador—Fez o (Decreto-Lei nº ) 344/90.
Jurista—O que é que esse decreto adiantou? Nada! É muito engraçado, tenho ali pareceres do
Conselho Nacional de Educação sobre o 344/90, que é feito pelo Prof. Mário Pinto, faz umas
considerações: “Sim, pois, isto tem que ser feito qualquer coisa porque isto anda muito contestado,
mas o art. 1º devia dizer menos isto e mais aquilo, e tal...” E depois tenho duas declarações de voto,
uma do António Teodoro e outra do Professor Fraústo, dizem os dois a mesma coisa (risos). Cada
um do seu ponto de vista, dizem os dois a mesma coisa: “este decreto é um palavreado que nunca
mais acaba, não resolve nenhum problema que estava em causa”, e o António Teodoro diz: “Não
resolve o problema dos professores”. O Fraústo: “não resolve problema nenhum é muito palavroso,

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 116


Carreira Docente no Ensino Artístico Especializado—Área da Música
Que Regulação? (25)
não adianta nada a coisa nenhuma, para que é que se assina este decreto?” (risos); mas tem piada, o
António Teodoro diz: “isto não resolve os problemas que estavam em causa, que são os problemas
dos professores”, que era aquilo que dava a contestação toda e depois não resolve nada, depois um
palavreado de um comprimento, com uma mistura, dizia o Fraústo, com uma mistura de lei de bases
e de regulamentação, micro regulamentação, tão pequenina que não adianta nada nem diz nada a
ninguém...
Investigador—São 7 páginas.
Jurista—E portanto o 310 continua a ser a base do sistema; só que depois essa contestação toda
gerou esta. Foi durante o período do GETAP, que foi exactamente o período em que foram dadas as
18 horas, é pá, de borla, para calar! – não tem fundamento nenhum, nem na carreira Docente disto,
nem na carreira Docente daquilo, nem no “coitadinhos, não podem porque aquilo dá muito trabalho,
porque têm de ser concertistas e têm de ter redução de horário”; nada disto tem consistência
nenhuma, foi um simples despacho a dizer que a partir de agora têm só 18 horas; nem corresponde à
carreira disto ou à carreira daquilo, nem à necessidade da especificidade do ensino artístico; não
corresponde a nada, porque quem dá 18, dá 19 dá 20 e também dá 22, não é?
Investigador—Penso que respondeu na essência àquilo que eu necessitava e agradeço o seu tempo.

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Carreira Docente no Ensino Artístico Especializado—Área da Música
Que Regulação?

ENTREVISTA COM DOCENTE I

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 118


Carreira Docente no Ensino Artístico Especializado—Área da Música
Que Regulação?

TRANSCRIÇÃO DA ENTREVISTA COM O DOCENTE I


(1)

Investigador—Bom dia, esta entrevista destina-se a servir de suporte para uma tese, de dissertação
na área da Administração Educacional, cujo tema é a Estrutura da Carreira Docente (ECD) do
Ensino Artístico Especializado, (EAE), quer dizer que esta entrevista não tem qualquer, digamos, o
objectivo não é identificar quem é entrevistado mas saber ao longo da sua carreira, que mais ou
menos de 1971 até ao presente, gostaria de perguntar qual a sua profissão neste caso?
Docente—Eu sou músico, guitarrista, chamada guitarra clássica que já teve muitos nomes e
professor de guitarra desde 1971 no ensino particular e depois desde (19)84 se não estou em erro
professor do Conservatório. Fiz nesta escola que eu amo, neste espaço toda a minha formação como
músico, fiz o curso de guitarra ao abrigo da Experiência Pedagógica de (19)71 crio e depois fiz
simultaneamente o curso superior de educação pela Arte que funcionou também neste espaço.
Investigador—Aqui nesta escola?
Docente—Nesta escola, quer dizer neste edifício porque eram escola diferentes. Aqui viviam
escolas várias, a escola de cinema, a escola de teatro, escola de dança, depois desdobrada em escola
superior de dança e a escola Superior de Educação pela Arte.
Investigador—E já dava um grau académico?
Docente—Na altura em que foi feito, quando conclui o curso, não tinha ideia que desse nenhum
grau académico, (depois) quando aqui e não me recordo bem há quanto tempo foi para os
professores que não pertenciam ao quadro transitório de (19)83 fomos integrados no quadro,
apercebi-me, porque sou uma pessoa distraída, que esse meu curso juntamente com o curso de
música do Conservatório me dava habilitação de licenciatura para a carreira Docente. Eu comecei
aqui a fazer quando entrei para o quadro entrei como licenciado, com surpresa, agradável surpresa
minha que esse curso que eu achava que era simplesmente enriquecimento na área das expressões
artísticas, da psico-pedagogia, e pronto o que me permitiu ter contacto com pessoas extraordinárias,
como o pedopsiquiatra Silva Santos, com o grande João de Freitas Branco, dois nomes só para
nomear dois mestres, e foi assim. Depois em termos de formação académica quando se iniciaram os
CESES, os cursos especializados na ESML, eu mesmo não precisava da habilitação que dava,
inscrevi-me como aluno tendo sido colega de alunos meus aqui do conservatório que frequentavam
em simultâneo os dois cursos e com a minha filha que era a presidente da associação de estudantes
da ESML à data, depois conclui esse curso que me deu a habilitação de licenciatura específica de
guitarra.

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 119


Carreira Docente no Ensino Artístico Especializado—Área da Música
Que Regulação?
(2)
Investigador—Quando entrou para a escola, para o Conservatório, na altura ainda se chamava
conservatório, foi em que ano?
Docente—Como aluno?
Investigador—Já como professor.
Docente—Como professor eu creio que foi em 1984.
Investigador—Portanto entrou já ao abrigo do 310, entrou para o Quadro Transitório?
Docente—Não entrei para o Quadro Transitório, chamava-se Quadro de Nomeação Definitiva.
Investigador—Em (19)84?
Docente—Não, não, eu estive muitos anos com aqueles contratos, isso aí não entrei para quadro
nenhum, não entrei para qualquer quadro. Tinha aquele regime de contrato como todos os
professores que não pertenciam ao QT. Foi muito mais tarde e francamente não recordo o ano em
que os professores que reuniam determinadas condições...
Investigador—Já vamos recordar isso então. Portanto manteve-se desde que entrou até...depois há
um diploma que já iremos falar mais tarde que foi o 234/97 de 3 de Setembro, manteve-se sempre a
contrato? o único vínculo que tinha era ser contratado anualmente?
Docente—Contratado anualmente, eu a certa altura tinha um contratação que era ao abrigo, acho
que era do 144 como individualidade, não foi logo do início mas, pois de momento não me
(lembro).
Investigador—Portanto não teve qualquer progressão na carreira desde que entrou até esse Decreto
Lei que veio criar o QND, manteve-se sempre na mesma situação?
Docente—Sim, sim.
Investigador—Havia alguma diferença na relação laboral entre os professores que eram do QT e os
professores ditos contratados? havia alguma distinção interna?
Docente—Bom, dependia dos professores mas havia alguns, mas como tu dizias isto não é linear.
Com a maior parte dos professores do QT nunca senti que houvesse uma atitude de, enfim, de
discriminação. Outros professores faziam-nos questão de lembrar que estávamos em situação
precária e qualquer “pé fora do estribo” podia significar...(a não renovação do contrato), havia uma
insegurança enorme porque sabíamos que dependíamos da vontade das direcções, era uma situação
precária.
Investigador—Exactamente. E a relação laboral com a direcção havia, digamos não seriam
ameaças...
Docente—Francamente em relação às direcções não senti nunca isso, foi mais em relação a
colegas, as direcções, a experiência que eu tive passei por uma direcção, mas como professor, com

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 120


Carreira Docente no Ensino Artístico Especializado—Área da Música
Que Regulação? (3)
as direcções nem sequer esse tipo de insinuações comigo, pelo menos. Existia, eu cheguei a sentir
esse peso, mas da parte de colegas, de um ou outro colega, mas das direcções, isso...
Investigador—Houve sempre um tratamento...
Docente—Sim, que não continha pelo menos que eu me apercebesse, não continha (qualquer)
espécie de insinuação que da precariedade, antes pelo contrário, mas em relação às direcções, não
recordo quantas direcções porque mudavam muito frequentemente.
Investigador—Que mudanças é que sentiste com a experiência pedagógica de 71 em relação àquilo
que nós tínhamos que era o famoso 18881/30 e depois em 71 tivemos esta chamada Exp.
Pedagógica, que enfim acabou em (19)74, mas que ainda houve bastantes pessoas posteriormente a
isso que de formaram com essa habilitação, que diferenças é que houve neste caso pedagógicas
entre o 18881 e a Exp. Pedagógica de 71?
Docente—Em relação ao decreto anterior a 71 não tenho nenhuma experiência porque eu entrei
para um curso criado como tal ao abrigo da Experiência pedagógica de 71, portanto eu quando
inicio aqui os meus estudos, iniciei-os já ao abrigo da Experiência pedagógica de 71 pois já havia
naturalmente alunos doutras disciplinas que tinham cursos superiores, que possivelmente
continuaram até ao fim (desses) cursos que tinham iniciado ao abrigo desse decreto, mas eu não fui
abrangido por isso.
Investigador—Entre o momento em que entrou em (19)84 e até vamos ver depois mais tarde em
(19)97, houve alguma tentativa do corpo Docente e das direcções em alterar a situação, ou seja
encontrar um vínculo para os professores que estavam a contrato?
Docente—Não recordo com muito pormenor, mas a ideia que tenho é que sempre houve
movimentações da parte das direcções e da parte dos professores, no sentido de se resolver esta
situação dos professores que estavam em contrato (contratados).
Investigador—e era só, essas movimentações eram só para resolver essa situação dos professores
que estavam a contrato ou era mais para além disso, para resolver a situação e criar uma carreira
Docente?
Docente—Eu creio que era para encontrar uma situação de normalidade com aspas ou sem aspas,
para a situação da escolas que se via com um número reduzido de professores que estavam no
chamado quadro transitório e cujo lugar se extinguia com a aposentação ou com a morte deles. Iam
sendo cada vez menos (os) que tinham vínculo à instituição.
Investigador—portanto essas movimentações eram sempre para tentar resolver a situação.
Docente—para resolver de vez a situação só para meia dúzia de professores.

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 121


Carreira Docente no Ensino Artístico Especializado—Área da Música
Que Regulação? (4)

Investigador—Houve uma participação activa para a construção de uma carreira Docente?


Docente—Sim, é essa a memória que tenho, a escola sempre empenhada, o corpo Docente e as
várias direcções em resolver a situação. Recordo-me de uma situação, um director que não consigo
recordar o nome, bom mas muito activa com o ministério, já que não se resolvia por uma via de
legislação, tentou resolver as situações, não me estou a recordar o nome da minha querida colega,
que se aposentou...
Investigador—Não é importante os nomes, é importante saber que houve pessoas que tentaram
resolver (a situação).
Docente—E pagando neste caso, pagando muito caro esse empenhamento até aos limites.
Investigador—Vou saltar uma parte que tema ver com uma altura em que não estava cá. O 344 foi
um decreto lei lançado no tempo do ministro Roberto Carneiro em que falava numa carreira
Docente para não sei se recorda pelo assessor do Roberto Carneiro para o ensino artístico, o maestro
Miguel Graça Moura?
Docente—Recordo-me muito bem.
Investigador—E esse decreto lei foi apresentado aqui ao corpo Docente cá da escola, mas houve
alguma negociação com o corpo Docente desta escola e doutras escolas visto que há seis escolas de
música oficiais. Houve alguma pré-negociação, para digamos pedir propostas para que esse decreto
lei chegasse a um texto final?
Docente—Houve vários encontros com o assessor (risos) mas creio que era como muitas vezes
acontece...isto pode ser um juízo de intenções que não seja legítimo, mas sabe que havia um plano
que estava feito para se dizer que os professores tivessem sido ouvidos, não creio que tivesse...
Investigador—Cumprir uma formalidade?
Docente—Cumprir uma formalidade.
Investigador—Seria um facto consumado?
Docente—Como digo isso são só...estamos no terreno das suposições e é só isso que vale.
Investigador—Há um artigo que fala na criação de um estatuto especial para os Docentes,
nomeadamente o Professor Concertista e o Professor Compositor. Não sei se te recordas neste
ponto em que é focado no 344 que é a criação, no fundo destas duas figuras, o professor concertista,
que se te aplica como guitarrista e o professor que seja compositor como os nossos professores de
ATC. Não sei se isto levantou alguma polémica ou se foi uma proposta feita pelas escolas?
Docente—Eu ai não me recordo que tenha havido alguma polémica, que pode ter havido, se houve
passou-me ao lado.

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 122


Carreira Docente no Ensino Artístico Especializado—Área da Música
Que Regulação?
(5)
Investigador—Depois chegamos finalmente ao 234/97, que é aquele (decreto-lei) que integra
aqueles professores que estavam a contrato desde (19)83 no tal Quadro de Nomeação Definitiva...
Docente—Integra alguns...
Investigador—Integrou alguns, integrou a maioria ou integrou aqueles que estavam...
Docente—Eu não sei em termos de números, se foi a maioria se não foi, mas sei que entraram
muitos professores novos e aquilo previa que o professor estivesse aqui a trabalhar há...
Investigador—Até cinco anos, (corrijo) com cinco ou mais anos de serviço.
Docente—Cinco ou mais anos de serviço. Creio que era isso.
Investigador—Esse decreto-lei foi negociado com as escolas?
Docente—Também não me recordo, porque ai eu já estava...a minha passagem pela comissão que
se chamava instaladora na altura foi muito anterior, tinha sido dez anos antes e portanto não me
recordo se terá havido ou não negociação.
Investigador—Voltamos um pouco atrás na altura em que pertenceu a uma comissão instaladora,
foi presidente, foi secretário...?
Docente—(fui) Vice-presidente, era o Fernando Afonso eu e o José Lopes e Silva.
Investigador—E que relação é que havia entre o Ministério sobre...nomeadamente, não na parte
pedagógica mas na parte, digamos laboral dos professores?
Docente—Uma relação muito difícil, lembro-me que passei muitas horas na (Av.) 24 de Julho com
o Dr. António Caldeira Cabral que era o..., foi o, creio a pessoa que redigiu o famoso “310” e com
os directores e, as conversas eram sempre difíceis. A impressão que tínhamos era a de estar num
“colete de forças” e o que se pretendia era colocar a escola em exacto pé de igualdade com as
escolas do ensino regular, e inclusive retirar-lhe o nome de Conservatório e chamar-lhe um número
qualquer coisa. Mas não era só isso, era um bocado, se me é permitida a imagem, a ideia de um
alfaiate que não tinha capacidade para fazer um fato para um cliente específico e andava a cortar o
cliente para o encaixar num fato pré-fabricado. (n)Esta normalização parecíamos as pecinhas de
fruta aprovadas para cabermos todos...
Investigador—Sermos normalizados?
Docente—Sermos todos normalizados e ai a discussão foi, foi intensa (risos) e eu estive bastante
activo quando me propunha ir às reuniões lembro-me que os meus colegas de direcção diziam: “o
Dr. Caldeira Cabral faz-te uma lavagem ao cérebro” e respondia: “ é uma questão de experimentar
se o detergente que ele usa é suficientemente forte”, e acho que ele não conseguiu.

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 123


Carreira Docente no Ensino Artístico Especializado—Área da Música
Que Regulação? (6)

Investigador—Mas voltemos ao 234. Tem ideia se esse projecto lei foi, digamos da autoria do ME
ou se houve uma movimentação das escolas do EAE, neste caso eram seis, que o tenham redigido
ou que o tenham proposto?
Docente—Eu creio que nessa altura houve muita movimentação das escolas, não sei se foi o
GETAP ou organismos criados no Ministério, específicos para o EAE. Lembro-me que as pessoas
que estava nesse organismo era a colega Isabel Rocha do (Conservatório do) Porto, acabou de se
aposentar agora e havia bastantes movimentação no sentido de se resolver a situação. Depois a
solução que foi encontrada era uma espécie de quadro transitório, que não era aquilo que se
pretendia, mas a situação era tão aflitiva em relação aos professores que estavam há muitos anos
nesta situação precária.
Investigador—Este “234” resolveu a situação naquele momento?
Docente—Sim, para aqueles professores, os que iam entrando e os que estavam há menos de cinco
anos...
Investigador—Continuaram a contrato?
Docente—Exactamente, era tal a situação precária em que estávamos, por exemplo como eu estava
no momento anterior.
Investigador—E qual é a situação actual?
Docente—A situação actual? Não sei descrever muito bem, mas creio que há um quadro de escola,
aliás do QND acho que passei sem dar por isso, mas passei. No entanto os concursos para esse
quadro ainda não foram realizados e há para quem está à espera de concorrer, nomeadamente
professores que cá trabalham há vários anos, têm profissionalizações feitas o ano passado, que creio
que não estão homologadas, embora tenham sido feitas com autorização do Ministério, com
reduções de horário e na ESML, não sei se já foram homologados, sinceramente não sei. Mas até há
muito pouco tempo não estavam e pronto não sei qual é o calendário para esses concursos.
Investigador—Portanto mantêm-se como professores contratados?
Docente—Numa situação bem mais angustiante do que os anteriores contratados, porque se eu
entendo o que se passa, é que por exemplo professores que fizeram concurso para ensinarem nesta
escola, prova de concerto e alguns fizeram provas pedagógica, não têm nenhuma (segurança), ou
seja esse concurso acaba ao que parece não valer nada e terão que concorrer, sendo que a
mobilidade, portanto um professor que esteja em Aveiro, no Porto, em Braga ou qualquer que
queira tem e que seja do quadro tem prioridade em relação aos actuais professores da escola. Creio
que a situação é essa e portanto aquilo que eu me apercebo é que os actuais professores contratados,
estão numa situação de insegurança e de angústia como eu não tenho memória, mesmo de quando

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 124


Carreira Docente no Ensino Artístico Especializado—Área da Música
Que Regulação?

(7)
eu estava a contrato havia alguma...a pessoa entrava com curso e se a escola o escolheu, salvo
qualquer situação anormal esse professor continuava, ia sendo recontratado e renovado o contrato.
Aqui penso que as direcções, a direcção embora procura fazer isso, manter a estabilidade no corpo
Docente e o corpo Docente que foi seleccionado em concurso mas que não está nas suas mãos
mantê-lo, há regras de concurso...
Investigador—Portanto continuamos numa situação, digo continuamos as seis escolas de música,
continuamos numa situação precária no que diz respeito ao seu corpo Docente que não está ainda
vinculado. Terá uma progressão na os que estavam no QND e que estão agora num quadro de
escola um pouco virtual, penso que seja isso e os que estão a contrato não tem ainda qualquer
vínculo?
Docente—Não têm qualquer vínculo e...
Investigador—Com o risco e não serem reconduzidos no próximo ano lectivo?
Docente—Claro. No próximo ano lectivo não sei se vai haver concursos, essa dúvida se o concurso
será para o próximo ano lectivo ou só em 2011, mas aquilo que me parece é que a situação é bem
mais angustiante que aquela por que eu passei, apesar de tudo não era tão, a palavra para mim é
angustiante.
Investigador—Quero agradecer-lhe esta palavras, esta entrevista. Dar-lhe-ei conhecimento assim
que tiver transcrito, antes de mais ninguém terá conhecimento daquilo que nós aqui falámos, terá
algumas alterações, que acho que sejam pertinentes fazer e terá no fim, quando esta dissertação for
aprovada no instituto onde está a ser feita, terá com muito gosto, dar-lhe-ei um exemplar.
Docente—Para mim foi um prazer, foi a colaboração possível mas como colega e meu ex-director
que a minha boa memória das direcções, naturalmente inclui a direcção do José Coutinho. Todas as
direcções foram impecáveis mesmo em momentos difíceis, alguns por que eu passei, tive sempre o
apoio extraordinário, estou a lembrar-me de um processo disciplinar por causa de uma acumulação
em que as direcções e creio que foi durante a tua direcção, foi uma, foi um exemplo que deu para
trazer ao de cima a solidariedade e a defesa do professores, que toda a memória que eu tenho das
direcções o Carlos Franco, todos sem excepção, foram extraordinárias.
Investigador—Muito Obrigado.

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 125


Carreira Docente no Ensino Artístico Especializado—Área da Música
Que Regulação?

ENTREVISTA COM DOCENTE II

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 126


Carreira Docente no Ensino Artístico Especializado—Área da Música
Que Regulação?

TRANSCRIÇÃO DA ENTREVISTA COM O DOCENTE II


(1)

Investigador—Antes de mais quero agradecer a tua disponibilidade em me concederes esta


entrevista, para um trabalho de mestrado que está a ser feito com o tema Carreira Docente dos
professores do Ensino Artístico Especializado, em que o ponto de partida é a Experiência
Pedagógica de 1971.
Gostaria que me desses, que te identificasses na tua profissão até aos dias de hoje, a formação
académica, etc.
Docente—A formação académica?
Investigador—A formação académica
Docente—Bem, então. Eu formei-me, já agora tendo em conta que isto (a investigação) começa na
Exp. Ped. de (19) 71, porque eu comecei a ter aulas de música aos 38 anos, mais ao menos em
termos de piano já, comecei a ter aulas de piano aos 8 anos e nessa altura, foi em 70 exactamente
estava a experiência pedagógica para começar, quando eu entrei no curso oficial de instrumento, eu
fiz a exp. ped., já segui os programas que estavam em vigor na exp. ped. e até ao 8º ano da exp.
ped., fiz todos os exames respeitantes à exp. ped., 2º ano de Educação Musical, o 4º ano, o 6º ano,
exactamente o 4º ano e o 6º ano de piano e o 8º ano. Portanto fiz toda a exp. ped.
A Exp. Ped. teria um curso que depois chamado superior ou especializado que praticamente
ninguém fez, por isso acabei o curso antigo de 1930, o 9º ano de piano, correspondente ao 3º ano
superior.
Portanto o meu percurso foi feito todo na exp. ped. Comecei na Academia de Música de St. Cecília
(AMSC) e depois fiz transferência aqui para o Conservatório Nacional no 6º ano. Penso que vim
para cá fazer o 5º ano, não o 5º ainda fiz lá. Portanto, fiz aqui (CN) o 6º ano como interna do
conservatório. Claro que nessa altura não havia paralelismos pedagógicos e portanto fiz todos os
exames aqui (CN), mas foi esse o percurso. Depois do curso superior de piano fiz também a
licenciatura em Ciências Musicais, que também andei em arquitectura pelo meio, mas isso não
interessa para o caso e depois ainda recentemente fiz o mestrado em Psicologia e Pedagogia da
Música, e portanto em termos de formação é a minha formação.
Em termos de prática lectiva e como professora na carreira comecei o meu percurso como
professora de Educação Musical no ciclo preparatório, fiz dois anos na escola Eugénio dos Santos,
passei de imediato para a AMSC como professora de piano e Formação musical. Enfim estive lá
dois anos e depois entrei aqui (EMCN) como professora acompanhadora e depois disso mudei para
a disciplina de formação musical.

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 127


Carreira Docente no Ensino Artístico Especializado—Área da Música
Que Regulação?

Investigador—Em que ano é que começaste as tuas funções lectivas aqui na escola?
(2)
Docente—Nesta escola foi no ano de 87, 1987.
Investigador—Cargos directivos?
Docente—Cargos directivos. Eu comecei por ter a primeira experiência de direcção da escola , na
actual Escola do Centro de Formação Artística da Sociedade Filarmónica Gualdim Pais (Tomar)
onde fui directora pedagógica, nos dois primeiros anos da escola, fundei, fiz as raízes todas da
escola, depois disso, portanto forma dois anos, 91-92, 92..., não peço desculpa, 92-93, 93-94 e no
ano seguinte fiquei como presidente da Comissão Instaladora da EMCN durante três anos. Após
isso estive dois anos fora também da direcção. Depois regressei como vice-presidente da Comissão
Provisória e depois no ano seguinte já Conselho Executivo, em 2000 até hoje, depois já não sai
mais. Neste momento e desde Junho de 2009 como Directora.
Investigador—Ao abrigo do 74...75 de 2007?
Docente—Ao abrigo do 75.
Investigador—Queria fazer uma pergunta no que diz respeito à relação laboral, ou seja: o vínculo
até ao 234/97 que é um decreto que nós vamos falar mais à frente, que foi o último que criou
vínculo dos Docentes à escola...
Docente—284?
Investigador—Não, 234 de 97, até este decreto que já vamos falar a seguir, houve, ou aliás não
houve um vínculo, os professores não estavam vinculados à escola, eram professores que estavam
contratados, certo?
Docente—Não todos, a situação...queres que conte a história daquilo que eu sei?
Investigador—Sim.
Docente—Pronto. Quando em princípios dos anos 80 o Conservatório (Nacional) foi gerido por
gestores, houve uma fase em que os professores tiveram que assinar uma rescisão de contrato, nem
era de contrato, foi uma rescisão da sua situação que era de Docentes do quadro do conservatório
nacional e eles assinaram, não tenho exactamente a certeza, assinaram a rescisão de contrato e
ficaram sem contrato à antiga instituição que depois deixou de existir. Eles quando voltaram a ser
contratados, já foram contratados para a nova situação de escola (de música do C.N), já não era o
conservatório nacional, porque em (19)83 foi criada...
Investigador—Com o 310?
Docente—Com o 310 foram criadas as escolas que hoje em dia funcionam, umas secundárias as
outras superiores. Nessa altura os professores foram contratados de novo, digamos assim, e são
integrados, julgo que posteriormente mas também aqui não tenho a data, os antigos professores do

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 128


Carreira Docente no Ensino Artístico Especializado—Área da Música
Que Regulação? (3)

quadro numa situação de quadro transitório que portanto, os que eram do quadro antigo ficaram
num quadro transitório à aguardar a definição posterior do que aconteceria à situação de carreira
destes professores do ensino artístico que a partir daí ficou desenquadrada.
Investigador—Esse “310”, esse decreto lei foi, se é que te recordas, uma vez que não estavas como
Docente na escola mas como aluna...
Docente—Como aluna, que na altura era da associação de estudantes.
Investigador—Qual é que foi o impacto do decreto lei na escola. Houve uma discussão com os
professores, houve alguma proposta que o corpo Docente tenha feito para a sua alteração, neste caso
para o melhorar?
Docente—Eu desconheço, mas julgo que não, acho que o decreto foi apresentado como uma versão
final, penso eu que foi, mas não sei se foi discutido internamente. Nessa altura eu era aluna e
portanto não tínhamos acesso. Tivemos depois acesso às propostas finais, também enquanto
estudantes, ainda falamos na altura com as comissões instaladoras, com a Drª. Elisa Lamas, o Dr.
Meneres Barbosa e o pianista Jorge Moyano, que estavam nas direcções nessas alturas e que
iniciaram a escola superior de música de Lisboa, a comissão instaladora da ESML, e de facto nós
associação de estudante ainda conversámos sobre aquilo, e aquilo (Dc.L-310) teve um impacto eu
lembro-me de olhar para os papeis e tentar verificar “o que é que isto quer dizer, o que é que isto
não quer, o que é que isto vai implicar?”, mas foi a partir do momento que ele saiu, teve um
impacto muito negativo imediatamente, houve aqui ondas que como é que hei-de dizer, de
contestação internamente nos professores.
Investigador—Não aceitaram o quê? não aceitaram o vínculo à escola, ou era mais do ponto de
vista...
Docente—Não aceitaram no fundo a estrutura que estava a ser criada, não é. Claro que em termos
de carreira também houve esses problemas, mas penso que os professores destas escolas, tiveram
sempre uma grande maleabilidade e foram aceitando ao longo dos tempos muitas situações que se
calhar outras profissões não aceitariam. Talvez porque são artistas (risos), não faço ideia, mas a
verdade é que sempre trabalharam independentemente de saberem o que é que lhes acontecia no
mês seguinte e claramente estamos outra vez na mesma situação. Mas pronto, não nós (os que estão
no quadro), mas os contratados. Agora em relação ao impacto que teve, foi um impacto de que tipo
de escola (secundária) e de que estrutura que estava a ser criada.
Investigador—Quando entraste como Docente para a escola, entraste a contrato?
Docente—Exactamente.
Investigador—O vínculo era contratual anual?

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 129


Carreira Docente no Ensino Artístico Especializado—Área da Música
Que Regulação? (4)

Docente—Era um contrato anual de trabalho, feito de acordo com o estatuto normal dos outros
professores.
Investigador—Sentias alguma discriminação da parte dos colegas que estavam no quadro
transitório em relação aos colegas que não estavam no QT e que eram contratados pontualmente?
Docente—Não, nada, nunca senti nada.
Investigador—Eram sempre tratados por igual, as direcções sempre os trataram por igual?
Docente—Claro havia diferenças que nós sabíamos, em termos de horários, fundamentalmente
carga horária, de resto sempre foi tudo tratado de igual maneira. Eu pelo menos da minha parte não
senti.
Investigador—Entre o “310” e o “234”, foram alguns anos, um em (19)83 o outro em (19)97.
Houve alguma movimentação dos professores para que fossem criadas condições para haver uma
carreira Docente específica do ensino da música?
Docente—Eu penso que em termos de direcções desta escola, portanto das várias comissões
instaladoras que foram existindo, que houve sempre pressão nos ministérios para que isso
acontecesse. Sempre contactos mais respondidos ou não, mas que de facto na tentativa de resolver
essa situação, no entanto ou porque nunca houve “feedback” ou porque também nunca houve uma
luta em termos de grupo de professores, das pessoas encontrarem-se e em conjunto, eu penso que
nunca existiu e nesse sentido talvez não tenham tido a força que seria necessária, também porque
obviamente estas cinco escolas ou seis que existem no país representam um número tão reduzido
que nunca impuseram no fundo as suas reivindicações, não é. Posteriormente houve condições para
o poder fazer e então essas seis escolas conseguiram algum “feedback”. Nós os dois sabemos
quando.
Investigador—Exactamente. Depois eu ia saltar para o decreto lei que apareceu em (19)90 que é o
344. Este decreto, recordas-te se houve alguma negociação com as escolas?
Docente—Eu julgo que não.
Investigador—Soube-se na altura que era uma pessoa (o autor) conhecida do nosso meio musical,
o maestro Miguel Graça Moura.
Docente—O decreto em si, eu julgo que não houve, julgo que não houve grande (entusiasmo), eu já
era professora e julgo que não.
Investigador—Já éramos professores.
Docente—Também já cá estavas.

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 130


Carreira Docente no Ensino Artístico Especializado—Área da Música
Que Regulação? (5)

Investigador—Qual é que foi a receptividade dos professores ás medidas que lá estavam,


nomeadamente a criação de uma carreira específica, que era a carreira dos professores concertistas e
dos professores compositores?
Docente—Mas isso eu lembro-me de ter sido discutido, houve pelo menos uma reunião geral de
professores...
Investigador—Desculpa interromper. Mas sobre o texto já feito ou era uma proposta?
Docente—Era uma proposta e as pessoas tiveram opiniões e até gostavam da carreira de
concertista, não com o modelo que lá estava previsto.
Investigador—(gostaram) da ideia...
Docente—Na ideia sim, na possibilidade, não no modelo que estava a ser proposto que tinha
implicações de horário de trabalho e remuneratórios, etc. Mas de facto a ideia a ideia em si acolheu
alguma satisfação da parte das pessoas.
Investigador—Não houve nenhuma contraproposta a essa ideia?
Docente—Eu não tenho a certeza.
Investigador—Finalmente chegamos àquele (momento) em que a memória nos diz que houve um
decreto lei que foi pelo menos bem discutido com a classe e a nível nacional com as escolas
públicas. Foi o célebre 234/97 que vem remediar, digo remediar porque deu-me a sensação pelo que
tenho lido e estudado, veio fazer a mesma coisa que o 310, colocar aqueles professores que estão
em contrato num quadro, neste caso de Nomeação Definitiva, mas que ficou por aí, ou não?
Docente—Exacto...
Investigador—Deu seguimento ao...(310)
Docente—O 310 tratava obviamente ser o início, peço desculpa, o 234, da maneira como ele foi
discutido, foi sempre o “pontapé de saída” de uma discussão que era para continuar, e sempre foi
tomado como isso e portanto era uma situação pontual para a resolução de injustiças que se faziam
já há alguns anos, mas que verdadeiramente não era para ficar por ali. Aquele (Decreto-Lei) era
pontual, mas atrás dele teriam de ser definidas outras questões da carreira, que outras condições
seriam necessárias fazer e depois a parte pedagógica mais directamente ligada à prática educativa,
que também estaria implicada nisso e infelizmente esse processo não foi continuado, não é. Mas a
verdade é que era um reparar de situações que se não fosse feito continuaria, qualquer dia não havia
escolas porque não havia professores nos quadros, as pessoas iam morrendo e não se resolvia a
situação. Portanto isso tinha esse cariz de tentar organizar para a partir daí se construir o resto. E o
resto tem sido feito devagar de mais.

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 131


Carreira Docente no Ensino Artístico Especializado—Área da Música
Que Regulação? (6)
Investigador—Portanto a situação neste momento é que encontram-se professores que estão num
quadro não se sabe se é de escola, isso já vamos ver daqui a pouco, e temos outra vez um grande
número de professores que estão a contrato numa situação indefinida?
Docente—Neste momento aqui já é o dobro, mais do dobro. (professores a contrato)
Investigador—A legislação que estava prevista no 234 seria legislação para criar um quadro de
escola, nunca saiu?
Docente—Não, agora já saiu. Nós temos neste momento os quadros das escolas públicas definidas,
não sei de cor o nº da portaria, mas depois posso ver, uma portaria onde está a lotação dos quadros
de todas as escolas públicas do EAE, dança e música. Portanto está lá exactamente o número de
lugares, por cada grupo. O que não saiu foi a abertura dos concursos para esses lugares.
Investigador—Era isso que ia perguntar, e os concursos para esses lugares não foram ainda...
Docente—Isso é que não. Existe já o decreto que regulamente mas também...que é uma portaria
que é a 942/2009, mas não saiu, não foi aberto, ela prevê a abertura, diz como é que se processam
os concursos e novamente não foi aberto.
Investigador—Portanto os professores continuam (contratados). Sei que houve uma acção de
profissionalização.
Docente—Exacto. Houve exactamente na sequência, na saída dessa portaria com os lugares de
quadro, foram criadas condições para que mais professores que já tinham os seis anos de serviço
pudessem fazer a profissionalização. Fizeram-na o ano passado, no ano lectivo 2008/2009 e neste
momento ainda estão à aguardar a homologação dessa profissionalização, nem essa situação está
completa.
Investigador—Gostaria de voltar à origem do “234”. O “234” foi um decreto lei que apareceu
como? foi um conjunto de escolas que o apresentou à tutela, foi o sindicato que o apresentou às
escolas e depois à tutela, como é que se processou toda a construção do “234”?
Docente—O “234” partiu de uma iniciativa das escolas públicas que se reuniram e em situação de
novo governo, tínhamos estado dez anos sob governo “cavaquista”, digamos, e pronto, quando
entrou o novo governo, com o Dr. Guilherme de Oliveira Martins (Secretário de Estado), foi
possível sermos ouvidos e foi possível fazer uma proposta das escolas, e portanto isto na sequência
de um anterior, não sei se era um decreto se era um despacho, não chegou a sair, que organizava a
criação desse possível enquadramento proposto ainda pelo anterior governo e que quando nos foi
proposto, nós claramente dissemos que não. Não estávamos minimamente de acordo com ele e
portanto, aliás em muitos pontos em completo desacordo, o que levou o novo governo assim que
toma posse, isto foi de Agosto (1995) para Setembro, já não me lembro quando é que o governo

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 132


Carreira Docente no Ensino Artístico Especializado—Área da Música
Que Regulação? (7)
dessa altura tomou posse, mas nós conseguimos uma reunião com todas as escolas públicas e com o
secretário de estado na altura e que ele tivesse dito claramente “isto onde é que está mal?,
consideram que isto é tudo para deitar fora ou podemos aproveitar e vocês dizem-nos o que é que é
preciso manter e o que podemos fazer com isto”, dissemos “sim senhor” e fizemos a nossa
proposta, não vamos deitar tudo para o lixo vamos resolver primeiro a situação de facto da
integração dos professores, porque o outro tinha muitas situações complicadas, que não eram só a
entrada no quadro, também tinha os contratos, fazia no fundo aquilo que esta última portaria
942/2009 veio fazer, queria fazer tudo num documento só o que era bastante confuso nessa altura
em (19)95 foi quando começou essa discussão. Foi possível fazer uma proposta das escolas e a
proposta avançou sempre por via das escolas só no fim...
Investigador—O sindicato ajudou?
Docente—O sindicato perguntou às escolas, de facto concordou e apoiou essa proposta.
Investigador—Foram as escolas, que fique bem claro que foram as escolas...
Docente—Exactamente.
Investigador—que lideraram sempre o processo junto do ME?
Docente—Até ao processo final, até à sua aprovação.
Investigador—Até à sua aprovação final?
Docente—Exactamente.
Investigador—É evidente que este decreto lei foi discutido com as escolas. Cada escola (e) o
respectivo corpo Docente?
Docente—Sim. Só posso, nessa altura era presidente, só posso dizer que na nossa escola foi, se os
outros o fizeram não estava lá para ver, deduzo que sim, (que) na maioria das escolas foi isso que
aconteceu.
Investigador—E as situações previam todos os casos (dos professores) que estavam em funções?
Docente—Todos os casos que foi possível prever e portanto que na altura o Ministério da Educação
deu possibilidade, ou seja em função dos anos de serviço, em função de outros decretos que já
tinham saído para outras situações e portanto isto não se pode legislar exactamente como nós
queremos, não é, e portanto obviamente os professores com menos de cinco anos de serviço não
foram integrados, mas todas as situações mesmo com habilitações mais antigas e também
estrangeiras. Não se conseguiu negociar todos os casos e integrar todos aqueles que tivessem as
situações que se considerou.
Investigador—que estavam previstos mais de cinco anos e habilitações estrangeiras mais de sete.
Docente—exactamente e é isso que diz o decreto.

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 133


Carreira Docente no Ensino Artístico Especializado—Área da Música
Que Regulação?

Investigador—Para o futuro o que é que se espera? (8)


Docente—Para o futuro espera-se que eles (ME) abram os concursos dos quadros, portanto o
diploma está feito, é preciso abrir, mas temos aqui um problema que ainda não está completamente
resolvido, é que as escolas continuam a contratar professores, continuamos a ter professores que
não são profissionalizados porque nem todos conseguiram fazer esta última profissionalização,
porque não tinham os tais seis anos de serviço. Neste momento não se sabe como é que as
profissionalizações vão poder ser feitas. Sabe-se sim, quando estes novos mestrados que vão agora
começar permitirem ter profissionalização incluída, eles poderão fazê-los, mas a verdade é que
muitos dos nossos professores já fizeram mestrados que não têm as profissionalizações incluídas e
portanto estamos aqui outra vez numa situação de injustiça por força dos atrasos de tempo nas
decisões que não sabemos muito bem o que vai acontecer e assim que abrir o quadro pode criar
mais injustiças também, porque não podem concorrer professores não profissionalizados segundo o
que está previsto na portaria, e muitos dos nossos professores que aqui estão há mais de cinco anos,
neste momento não vão poder (concorrer) se não tiverem a profissionalização feita, portanto isto é
uma nova situação que...
Investigador—vão-se criar novas situações de injustiça?
Docente—eventualmente tem-se que gerir muito bem ou criar condições para que eles façam a
profissionalização ainda antes de abrir o quadro, também por isso a situação de abertura do quadro
não é tão líquida assim.
Investigador—Acho que cheguei ao fim das questões. Agradeço a disponibilidade e assim que este
documento estiver transcrito, será posto à tua consideração, para que tudo o que foi aqui dito foi
transcrito em toda a sua verdade. Logo que este dissertação esteja pronta terei muito gosto em
oferecer um exemplar à escola.

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 134


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Que Regulação?

ENTREVISTA COM SINDICALISTA

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 135


Carreira Docente no Ensino Artístico Especializado—Área da Música
Que Regulação?

1
TRANSCRIÇÃO DA ENTREVISTA COM SINDICALISTA
(1)

Investigador—Eu ia começar esta entrevista com um 1º bloco, em que eu tento recolher alguns
dados pessoais e profissionais, nunca mencionando o nome, estes são dados entre o investigador e
quem é entrevistado mas há algum interesse em saber alguns dados, a área de conhecimento e as
funções que são exercidas.
Sindicalista—Então eu sou professor de filosofia, numa escola, na escola de Dança do
Conservatório Nacional e sou também presidente do sindicato dos professores da grande Lisboa e
nessa qualidade membro do secretariado da FENPROF onde tenho acompanhado e sido responsável
pela área do ensino artístico.
Investigador—Muito bem. Depois neste bloco 2, gostaria de saber se há memoria no sindicato,
uma vez que já lá vão alguns anos, haverá com certeza memória sobre a redacção do célebre
Decreto lei 310/83, e se o Sindicato foi consultado e quais foram as, digamos as propostas e
tomadas de posição sobre esse Decreto Lei?
Sindicalista—Que eu saiba o Sindicato não foi chamado a, nem consultado para a elaboração do
310/83. Essa foi uma questão que em termos sindicais foi pouco acompanhada. De resto, eu devo
dizer que só a partir dos anos 90 é que em termos da FENPROF houve um acompanhamento mais
organizado e mais sistematizado destas escolas vocacionais de Música e Dança. Eu sei que em 83
ainda tive alguns contactos com gente ligada às escolas, mas eram bastantes inorgânicas, isto é não
houve da parte da FENPROF uma intervenção muito activa nestas áreas no que diz respeito ao
310/83, só posteriormente é que se desenvolveram.
Investigador—Uma vez que foi um decreto que teve alguma importância, porque começou a
delinear uma carreira Docente.
Sindicalista—Mas não foi matéria, até que sabes melhor do que eu o 310 acabou por ficar um
bocado parado, a concretização de boa parte do que lá estava demorou depois muitos anos a ser
posto em prática.
Investigador—A concretizar-se. Mas a minha outra pergunta é na ausência de legislação posterior,
o sindicato teve alguma iniciativa no sentido de alterar, uma vez que o 310 prevê uma série de
legislação posterior para o seu funcionamento, o sindicato teve algum papel activo?
Sindicalista—A partir, sim a partir, que eu possa falar com conhecimento de causa, a partir dos
anos 90. Nós situamos, confrontamos com o seguinte absurdo: tínhamos conseguido, tínhamos
conseguido que os professores de Educação Musical no chamado ensino regular tínhamos

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 136


Carreira Docente no Ensino Artístico Especializado—Área da Música
Que Regulação? (2)
conseguido para efeitos de progressão na carreira, (que) eles fossem considerados bacharéis
entrando com grau superior, o que não foi acompanhado por uma indefinição por parte do
Ministério, isto é, não foi acompanhado, esta medida não abrangeu os professores das escolas
vocacionais...de música, o que fez com que durante algum tempo nós tivéssemos essa situação, que
a todos nós parecia dificilmente justificável em termos de progressão na carreira e em termos de
vencimento e até em termos de ingresso nos quadros. A situação dos professores de educação
musical nas escolas do 2º ciclo era bastante mais sólida e bastante mais sustentada que os
professores das escolas vocacionais...
Investigador—Com, desculpa e penso que com habilitações diferentes...
Sindicalista—Sim, no fundo com habilitações que eram as mesmas, ou melhor se haveria alguém
com melhores habilitações eram os (professores) da (escolas) vocacionais, mas em qualquer dos
casos não eram habilitações formalmente de um grau superior, portanto isto coloca-nos numa
situação de grande dificuldade e essa foi uma questão que desde (os anos) 90 nós tentámos resolver,
isto é, tentar que o Ministério da Educação percebesse, percebesse não, tentasse que o Ministério da
Educação equacionasse a seguinte questão: Não fazia sentido estar a obrigar os professores das
escolas vocacionais que por definição seriam os mais competentes a adquirirem um simulacro de
grau superior de serem bacharéis ou serem licenciados para resolver os problemas de integração nos
quadros que não existiam e numa carreira que não existia. Portanto toda a nossa lógica foi no
sentido que todos estes professores das escolas de Música e Dança que são aquelas...fossem
reconhecidos na sua, no seu ingresso na carreira como tendo a habilitação máxima que podiam ter,
isto é, como licenciados, aí fomos, portanto um pouco mais longe do que a equiparação ao
bacharelato que tinha conseguido para os professores de Educação Musical e de facto quer o 200...
mas isto demorou alguns anos até 97, só em 97 para a música e em 99 para a dança é que foi
possível encontrar uma solução que essa sim foi uma solução justa, ou seja a integração destes
professores nos quadros foi feita a partir do princípio que eles eram licenciados, isto é, pondo entre
parênteses, o facto de formalmente eles, uma boa parte deles não terem grau académico. E acho que
isso foi uma boa solução, reconheceu-se que aqueles professores eram formados, tinham os cursos
superiores de música, que estavam lá há não sei quantos anos, que eram reconhecidamente bons nos
seus instrumentos, de facto deviam começar a carreira como licenciados, e foi isso que se fez, eles
foram integrados como professores licenciados quer na música quer na dança, e acho que esta foi
uma medida justa e aí de facto o sindicato trabalhou muito bem e trabalhou muito bem porque
nunca se separou das escolas, isto é como as escolas de música eram poucas, os conservatórios

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 137


Carreira Docente no Ensino Artístico Especializado—Área da Música
Que Regulação? (3)
envolvidos, porque o ensino particular era outro, estas escolas vocacionais de música eram5, 6 no
país...
Investigador—São 6 com o (Instituto) Gregoriano em Lisboa.
Sindicalista—Portanto era fácil nós termos a opinião de cada uma das escolas, aquilo que eu acho
que permitiu chegar a esta situação foi que o sindicato nunca tomou uma posição que fosse só dele,
foi sempre uma posição sustentada na opinião mais generalizada das escolas envolvidas.
Investigador—Exactamente. Portanto neste hiato entre o 310 e o 234 houve como já disseste
muitas tentativas.
Sindicalista—Há muitas tentativas, depois há inclusivamente a apresentação de vários projectos
que depois poso facultar, vários projectos da criação da carreira e da criação dos quadros e é curioso
que estes projectos nunca foram projectos muito conflituosos, dava sempre a sensação que aquilo ia
avançar e depois, ou por quedas de governo ou por qualquer problema que surgia, nunca avançava e
estou convencido que nunca avançava porque umas vezes também foram questões políticas de
quedas de governo, outras foi o confronto, isto é, o abrir uma excepção no quadro geral da
Administração Pública que era tratar como licenciados gente que formalmente não o era, e isto para
quem está dentro do assunto parecia uma questão óbvia e de elementar justiça. Era evidente que
para a burocracia da administração Pública isto era uma excepção perigosa e havia sempre receio
que outros grupos profissionais viessem a exigir o mesmo tratamento. Eu também devo dizer que a
sensação com que fiquei nestes anos todos no Ministério da Educação até há pouco tempo durante
muitos anos do ensino artísticos foram menorizados e portanto isto eram seis escolas e portanto a
escola de Dança era mais uma eram sete, nunca foram propriamente objecto de preocupação da
parte do M.E. Evidentemente que estavam preocupados com as escolas gerais. Mas eu penso que
entre o 310/83 e o 234/97 há a registar pelo menos dois projectos, que eu devo...que depois posso
facultar, dois projectos de constituição dos quadros das escolas, da definição da carreira Docente
que nunca chegaram a bom porto.
Investigador—O 234/97 foi uma iniciativa dos Docentes ou foi uma iniciativa do M.E? De onde é
que partiu, digamos o fazer um decreto lei para finalmente se arranjar uma carreira?
Sindicalista—Vamos lá ver: a pergunta tem...posso responder em dois planos, do ponto de vista
estritamente formal. O projecto de decreto lei é sempre um projecto apresentado pelo Ministério,
quer dizer não são as escolas nem os sindicatos que apresentam projectos de decretos lei. Agora eu
penso que se pode dizer que o 234/97 reproduz no essencial as propostas que as escolas fizeram,
que as escolas fizeram suportadas pelo sindicato, e aqui depois há questões formais, as escolas
podem apresentar projectos mas quem negoceia é o sindicato, de facto fui eu próprio que negociei

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 138


Carreira Docente no Ensino Artístico Especializado—Área da Música
Que Regulação? (4)

isso. Claro que tinha a preocupação de acompanhar as posições das escolas e eu penso que o
projecto 234 incorpora boa parte das preocupações das escolas na altura. Mas atenção, o 234 é uma
solução provisória é uma solução para remediar de uma forma que me pareceu muito justa, não é
justa, não é uma questão de justiça ou injustiça, (o ministério) resolveu colocar esses professores
nas mesmas condições dos outros, dos outros da área académica se quisermos, agora foi uma
situação para resolver a situação dos professores que lá estavam, que tinham, salvo erro pelo menos
cinco anos de serviço.
Investigador—É isso que o texto diz.
Sindicalista—Ou seja, não resolveu nada para o futuro e o problema depois do 234 é que
evidentemente na altura a boa parte dos professores foram integrados na escola de Música foram
todos integrados e nos conservatórios também, mas quando chegamos a 2008, 2009 tínhamos outra
vez um número elevado de professores que estavam, que não tinham quadro, ai já não era o
problema da...não era o problema das habilitações, é que não havia quadro para os integrar.
Continua a não haver, isto é foi criada mais uma vez legislação excepcional o 69/2009 que integrou
mais um conjunto de professores num quadro que não existe ainda, e esta é a situação que é um
bocado caricata, está-se a criar quadros nominais, isto é para vagas que são fechadas quando os
professores abandonam esses lugares e eu penso que só agora muito recentemente foi publicado um
decreto lei criando formalmente um quadro das escolas de música e dança.
Investigador—Do ensino especializado? De dança e...?
Sindicalista—e de música do Conservatório. Não se fez concurso por uma questão anedótica, quer
dizer que o Ministério tratou de tal modo da publicação que tornou inviável a realização de
concurso, mas eu penso que neste momento as coisas estão bem encaminhadas, isto é vai ser criado
um quadro de...os quadros das escolas de música, vai ser criado o quadro das escolas de dança, o
número de lugares abertos corresponde grosso modo aqueles que as escolas pediram, não se pode
dizer...
Investigador—Às necessidades exigidas...
Sindicalista—Às necessidades exigidas e eu penso que as escolas têm neste momento condições de
estabilidade que não tinham. Acho que foi um processo, que da parte das escolas houve uma boa
intervenção, da parte do ministério sobretudo a partir de 97 houve alguma abertura e acho que da
parte do sindicato houve o bom senso de não, de nunca se desvincular das posições maioritárias das
escolas. Em termos sindicais este processo apresentou contudo dois grandes problemas internos: um
foi exactamente o facto de serem tratados como licenciados um conjunto de professores que o não
eram formalmente. Ora nós tínhamos vários professores, sobretudo na área do 1º Ciclo exactamente

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 139


Carreira Docente no Ensino Artístico Especializado—Área da Música
Que Regulação? (5)
nas mesma situação e isso fez com que internamente houvesse alguma pressão para que o mesmo
procedimento fosse feito relativamente a esses professores. Não nos parecia justo porque se nos
outros cursos não havia, as pessoas não tinham esses graus mas podiam tê-los, o caso dos
professores dos conservatórios, não tinham porque não os podiam ter, e portanto essa foi sempre
uma barreira que não nunca demos azo, nunca demos força a essas movimentações, porque de facto
as situações não eram comparáveis. Uma outra questão, que ainda hoje divide e não sei
exactamente, eu acho que a solução encontrada não foi a melhor. As escolas, os conservatórios,
alguns conservatórios, nomeadamente o de Lisboa, mas também o de Coimbra sempre defenderam
que a admissão dos professores deveria ser feita mediante uma prova pública, coisa que a FNE
nunca defendeu. Formalmente a FENPROF também nunca deveria ter defendido, quer dizer nós
nunca fomos favoráveis a que os professores tivessem que fazer provas públicas e concurso
documental. De facto nós conseguimos, enfim com alguns problemas, quando digo problemas digo
algumas opiniões internas divergentes, mas conseguimos até agora fazer avançar esta ideia. Sempre
estivemos ao lado das escolas, entendendo que no domínio das artes a prática é muito mais
importante que propriamente os graus académicos ou as classificações académicas e que portanto
até porque nós somos confrontados com situações com uma grande diferença, uma grande
divergência de formações académicas, uns eram doutorados, outros não eram, outros vinham
profissionalizados, outros não vinham, depois havia toda a pressão dos estrangeiros que quando
chegaram a Portugal e nós achamos que era correcto ir ao encontro da posição de algumas escolas
que diziam que a realização das provas práticas é muito importante. Infelizmente isso não ficou no
documento, mas isso foi o aspecto que nós não concordamos, nós até ao fim que neste caso
específico se deveria haver provas públicas. É evidente que o Ministério terá jogado com a posição
de outras frentes sindicais nomeadamente a FNE que sempre defendeu devia ser um concurso
documental como outro qualquer, foi pena porque a realização de provas públicas era importante
para salvaguardar a qualidade do ensino.
Investigador—A seguir ao 234 houve alguma proposta das escolas precisamente haver um...para
serem criados os quadros de escola, as condições de ingresso numa carreira?
Sindicalista—Houve, quer dizer, vamos lá ver, nós temos de ter também a noção no terreno. Com o
234 e depois no caso da dança com o 350 as escolas ficaram com o problema momentaneamente
aliviado, boa parte do seus professores que eram necessidades permanentes tinham mais de cinco
anos foram integrados.
Investigador—Mas houve movimentações para não serem só esses?

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 140


Carreira Docente no Ensino Artístico Especializado—Área da Música
Que Regulação? (6)

Sindicalista—Sim. Para não serem só esses, no fundo não são movimentações muito fortes nos
anos a seguir porque o número de professores não era muito forte, não era muito grande, na minha
escola na escola de dança era zero.
Investigador—E na escola de música haveria?
Sindicalista—Haveria alguns mas não eram um número significativo que justificava essa
necessidade de estar a vincula-los e temos de ter atenção ao seguinte em termos sindicais, essa era a
situação de todas as outras escolas, isto é nas escolas não vocacionais tinham os seus professores de
quadro e depois havia alguns professores que eram contratados, e portanto tínhamos posto as
escolas de música na mesma situação das outras. Pronto, mas isto funcionou durante alguns anos,
vá lá até 2000, a partir dai foi acumulando o número de professores contratados que não tinham
lugar no quadro, o quadro não existia. A partir dos anos 2002 a 2004, a 2004 sobretudo volta a
haver forte pressão das escolas com o nosso apoio para encontrar uma solução definitivamente, que
eu penso que foi só encontrada em 2008, 2009 mas a partir de 2004, são os dados que tenho aqui, a
partir de 2004 volta a haver forte pressão da parte dos sindicatos e da parte das escolas no...temos
aqui outra vez um número significativo de professores que deveria estar em condições de entrar nos
quadros, nós sempre defendemos que a esses professores fosse aplicado o mesmo critério que foi
aplicado aos...no 234, mas isso não conseguimos a integração do 69 faz-se curiosamente de uma
forma engraçada e isso vale a pena, porque aí acho que jogámos bem. Nós em termos sindicais
estávamos muito preocupados com uma situação residual em algumas escolas que eram as
chamadas Técnicas Especiais. Também eram grupos que estavam como os professores dos
conservatórios. Uns anos antes não tinham grupo de recrutamento, não tinham quadro, não tinham
carreira, portanto estavam ali os anos que fossem precisos, muitas vezes no mesmo escalão. E nós
estávamos preocupados, enfim não eram muitos, uma boa parte deles acabaram por sair, mas ainda
tínhamos um número significativo de professores que tinham 10, 12, 15 anos e estavam contratados
e que não podiam deixar de estar, não podiam ser chamados à profissionalização e não havia
quadros para os integrar. Na altura nós desencadeamos uma estratégia que foi tentar que o
Ministério vinculasse definitivamente os professores que tivessem 10 anos, que era a maior parte
desses tinha 10 anos e conseguimos, e nessa altura quer na escola de música, quer na escola de
dança, embora fossem poucos, mas era na escola de música houve a pressão para que os professores
dessas escolas que tivessem mais de 10 anos fossem também abrangidos, e nós achámos sempre
que misturar as duas coisas não ia ajudar a resolver os problemas de nenhuns e portanto optámos
por dividir. Tentámos primeiro garantir a situação dos professores das chamadas Técnicas Especiais
e só depois de ganhar essa batalha, isso foi publicado é que passámos a desenvolver campanha

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 141


Carreira Docente no Ensino Artístico Especializado—Área da Música
Que Regulação? (7)
(para) os professores das escolas vocacionais devem ser tratados. Os professores com mais de 10
anos têm de ser obrigatoriamente incluídos nos quadros das escolas. Foi o que conseguimos com o
69, não é, mas agora há aqui um leque de professores das escolas de música, em Lisboa são 22, mas
no resto do pais são mais alguns, que não estão profissionalizados e que continuam sem
possibilidade de aceder a uma profissionalização, isto é eu acho que a partir de 97, perdão 2004, um
processo que lentamente as coisas tendem lentamente a estabilizar, isto é a ficarem com quadros
definidos, com regras de acesso, a questão do concurso de acesso, para mim veio ter este ponto
fraco, é pena que não tenha ficado nítida a existência de provas práticas, só fica obrigatória nos
termos do 69 para situações de recrutamento provisório, quer dizer, o que é estranho é que do ponto
de vista do recrutamento provisório exista ou pelo menos admite-se, eu não sei se se admite, tenho
de ver a legislação, do ponto de vista do ingresso no quadro não há referencia o que parece
francamente contraditório.
Investigador—Decreto Lei 69 de?
Sindicalista—2009, não sei se há mais alguma questão?
Investigador—Para já...(agradeço a disponibilidade e a ajuda)

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 142


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Que Regulação?

QUADRO DE CATEGORIAS E SUB - CATEGORIAS

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 143


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CATEGORIAS E SUB - CATEGORIAS DE INVESTIGAÇÃO

Sub - Categorias
Categorias Siglas
Origem EP-O
Experiência Pedagógica Alteração e Percepção EP-AP
Linhas Orientadoras/Pressupostos EP-LoP
Origem 310-O
Quadro/Contratações 310-QC
Decreto-Lei nº 310/83 Aplicação 310-A
Origem/Pressupostos 310-OP
Horário Lectivo 310-HL
Decreto-Lei nº 344/90 Origem/Pressupostos 344-OP
Origem 234-O
Quadros/Contratação 234-QC
Pressupostos/Docentes 234-PD
Pressupostos/Sindicatos 234-PS
Pressupostos/Tutela 234-PT
Decreto-Lei nº 234/97 Participação/Docentes 234-PaD
Participação/Sindicatos 234-PaS
Participação/Tutela 234-PaT
Papel/Docentes 234-PpD
Papel/Sindicatos 234-PpS
Papel/Tutela 234-PpT
Actualidade Quadros Concursos Actu-QC

Carreira Docente Progressão/Formação CD-PF

Legislação do Ensino
Análise da Legislação AL-EPC
Particular e Cooperativo
Habilitações - Quadros H-Q
Habilitações - Problemática H-P
Categorias - Sindicalista
Quadros - Concursos 69-QC
Concursos Públicos 69-CP

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 144


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Que Regulação?

QUADRO DE REFERÊNCIA ÀS PÁGINAS DAS CITAÇÕES RELACIONADAS COM AS SUB -


CATEGORIAS

Sub - Categorias Jurista Sindicalista Docente - I Docente - II


EP-O 5, 6
EP-AP 3
310-A 18, 19, 21
310-O 3, 4, 5, 22
310-OP 9, 10 1 3
310-QC 11, 12, 13, 14, 15 2 2
11, 12, 13, 14, 15,
310-HL 25
344-OP 16, 17, 24 4 4, 6
234-O 3 5, 4, 5, 6
234-PD 3, 4, 6
234-PS
234-PT
234-PaD 7
234-PaS 7
234-PpS
234-PpT 7
234-QC 4 2, 6
69-QC 4, 7 6
69-CP 4, 5,
H-Q 1, 2, 3, 6, 7
H-P 3
Actu - QC 6 8

Abril de 2011-José Manuel Andrade Coutinho 145

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