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Serge: Desde 2016 estou escrevendo uma tese sobre os ativistas digitais na África
francófona e já realizei várias entrevistas com alguns em 2016 mesmo, com ativistas e
blogueiros, agora estou na segunda fase de entrevistas. Uma das teses que venho
desenvolvendo é que o ativismo digital vem renovando a ideia do Pan-africanismo e o
fim das fronteiras. Portanto, fiquei impressionado que na última reunião dos
Afriktivistes, agora em 2018, você tenha sido convidado. O que me interessa é entender
esse convite, suas relações, enquanto ativistas, blogueiros, haitianos e africanos. Pode
me explicar como nasceu essa relação com os Afriktivistes?
Wilney: então, essa relação com eles surgiu quando da minha primeira viagem na
África atráves da seleção de Mondoblog, eu diria que começou em Dakar onde
encontrei amigos do continente africanos que também era blogueiros como eu. É lá que
comecei a forjar essas relações com eles. De volta a Haiti vi que as pessoas não eram
tão dinâmicas quanto na África e pensei em criar uma rede ou uma organização para
ajudar os jovens a utilizarem blogs, a tomarem posições sobre a situação social,
econômica que ainda ocorre em Haiti. Então criei essa rede de blogueiros, começamos a
trabalhar e a reforçar esses laços online com amigos do continente africano. Com a
ajuda do Instituto francês em Haiti no âmbito de um prêmio que oferece subvenções,
conseguimos trazer aqui o presidente de Afriktivistes, Cheick Fall. Ele visitou o país,
trocamos ideias e assim nasceu essa relação entre a redes dos blogueiros haitianos e os
Afriktivistes, daí o meu convite.
Wilney: efetivamente. Você sabe que os laços que reúnem Haiti e África são históricos
e as realidades sócio-políticas e econômicas também nos unem. Acho que hoje, estamos
engajados na mesma luta tanto aqui em Haiti quanto lá na África, temos praticamente as
mesmas dificuldades, os mesmos problemas, a distância entre os continentes é grande,
mas socialmente não tanto. É por isso que pensamos compartilhar nossos problemas e
nossas experiências. E também aprender dos ativistas africanos.
Serge: Em Ouagadougou, qual foi seu papel, qual mensagem quis transmitir?
Serge: Me esclareça uma coisa por favor. Vocês realmente têm um problema com as
Fake News em Haiti?
Wilney: Absolutamente, absolutamente! Posso te dar alguns exemplos agora. Você sabe
que em Haiti somos um país que é extremamente exposto a catástrofes naturais. Temos
terremotos, temos temporadas ciclônicas que duram seis meses de junho a novembro
cada ano. E têm pessoas que aproveitam desses momentos quando a população está um
pouco apreensiva porque uma temporada ciclônica é anunciada, bem, pessoas
aproveitam para divulgar falsas informações.
O último ciclone que tivemos aqui foi o Matthew e pessoas aproveitaram justamente
para divulgar falsas imagens, falsas informações, não sei exatamente com qual
propósito, mas temos esse problema em Haiti. Nos meios sociais, políticos, etc, as
pessoas aproveitam desses momentos para divulgarem fake News. Portanto, nós, da
rede dos blogueiros pensamos que era importante ver como abordar esse problema e
trazer soluções.
Serge: bem, queria saber qual é, segundo você, a situação da internet em Haiti, em
termos de acesso e também do ativismo digital, digamos o ecossistema da internet em
Haiti.
Wilney: A situação aqui evolui cada dia. Há cinco anos, o acesso era reservado às
grandes cidades de Haiti, mas hoje é liberado, até mesmo nos interiores do país, mesmo
que a velocidade não seja muito forte, mas as pessoas podem acessar aplicativos como
Whatsapp, portanto a informação circula. Quando uma pessoa numa grande cidade tem
uma informação, basta compartilhar no Whatsapp para que muitas outras pessoas a
obtenha. A outra coisa sobre a internet em Haiti, eu falei há pouco das fake News, mas
acho que do ponto de vista do ativismo isso nos ajuda muito.
Wilney: Sim, tem um hashtag em criolo que significa “onde está o dinheiro de Petro
Caribe”, utilizamos vários hashtags assim, tem também o #ChallengePetroCaribe. Em
definitivo, é um meio de integrar nossas ações, de convidar outros atores a se juntarem a
nós, e hoje temos os resultados. Normalmente a mobilização deve deixar a internet para
ir no mundo real, no campo. A mobilização na internet já foi feita, e amanhã estaremos
na frente da Corte Suprema de Contas para pedir a esses responsáveis de acelerar seus
inquéritos e prestarem contas.
Serge: Você falou há pouco do Instituto Francês que ajuda. Mas fora isso tem outras
formas de ajuda, como por exemplo, financiamento das passagens, há outras instituições
que ajudam vocês? Pode ser também ajuda logística ou em termos de segurança...
Wilney: Queria aportar uma precisão, no começo essa rede de blogueiros não é uma
rede de ativistas. Agora, a rede tem si outras instituições que apoiam como a OIF 1. Mas
não necessariamente sobre o ativismo porque a rede em si não tem um posicionamento
único, ela está lá para federar as pessoas, engajados ou não, mas a rede acompanha. E
depois tem outras instituições que apoiam.
Serge: Entendo porque até mesmo na África tem blogueiros que são ativistas e outros
que não fazem ativismo nenhum. É muito interessante essa precisão. Mas em Haiti
existe pelo menos associações que reúnem ativistas digitais?
Wilney: Por enquanto não, mas tem reagrupamentos virtuais, mas na vida off-line não
tem associação. Mas com o movimento Challenge Petro Caribe as pessoas agora tendem
a se aproximar, mas não é formal; o fato é que estamos sensibilizados a uma causa e
temos pontos em comum.
Wilney: formalmente não. Individualmente temos relações, sim, amigos pessoais. Não
formalmente como foi com os Afriktivistes, temos mais relações com a África. Estamos
pensando mais em como fortalecer as relações nos Caribes, mas por enquanto não temos
ainda essa ideia de nos estender ao continente americano ou latino. Mas com a África
tem esses laços históricos que torna essa parceria “natural”.
Serge: E como achou o desenvolvimento dessa área do ativismo na África e o meio tech
em geral, já que está voltando de lá?
Wilney: Cheguei no momento em que um ativista de Burkina Faso foi preso porque
posto algo no Facebook e tinha uma forte mobilização dos ativistas para que ele fosse
1
Organização Internacional da Francofonia
solto. Acho que o ativismo africano está avançando bastante. Para mim, é muito bom ter
essa associação que tem a capacidade de reunir numa sala de conferência praticamente
todos os países africanos para discutir as questões do ativismo que compartilham suas
experiências, é isso que realmente me impressionou. É por isso que nós estamos nos
aproximamos. Mais uma vez, temos de certa forma um denominador comum, através
dos mesmos problemas aos quais estamos todos confrontados, tanto na África quanto
aqui em Haiti. Se você abrir um jornal haitianos e ler a notícia por acaso, se não
houvesse os nomes, os lugares, etc, você poderia pensar que estão falando da África.
Por isso acho essencial continuar com essas atividades de Afriktivistes, como as
formações sobre segurança online, ainda tem muito a ser feito. Tem muitas iniciativas
que podem melhorar ainda nossa experiência na internet.
Wilney: sobretudo nas trocas de experiência. Não esqueça que Haiti é um país, mas
África é um continente. Portanto temos lá muitos mais recursos, mais ideias a serem
compartilhadas. Se nós estamos em relação na internet hoje, amanhã podemos ter mais
experiência. Outra coisa que observei lá foi o interesse dos próprios ativistas africanos
sobre nosso programa de fact checking, eles gostaram muito, sobretudo da utilização do
robô. É necessário manter essa colaboração, e também a sensibilização nos dois lados
sobre as questões respectivas do outro. Isso só pode ajudar os dois lados a crescer.