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07 setembro 2018
BBC News Brasil conversou com historiadores para entender causas que levaram à
unificação do Brasil e à fragmentação de seus vizinhos
Não há apenas uma única razão, mas várias, segundo historiadores com quem
a BBC News Brasil conversou. E, para quem busca respostas fáceis, um alerta.
Não há unanimidade nas conclusões.
Maiores distâncias, diferentes estilos de administração
Uma das causas tem a ver com a distância geográfica entre as cidades das
antigas colônias e a forma como as duas possessões eram administradas por
suas respectivas metrópoles.
"É verdade que, hoje, o Brasil é um país enorme, com mais de 8 milhões de km².
Mas, na prática, na época da independência, as principais cidades se
concentravam no litoral. As distâncias entre as cidades eram, assim, menores
do que na América Espanhola. O interior era praticamente território que não era
controlado pela Coroa portuguesa", diz.
"Eles formaram grande parte da elite política brasileira até cerca de 1850, como
ministros, conselheiros de Estado, deputados e senadores", acrescenta.
Por outro lado, na América Espanhola, durante esse mesmo período, 150 mil
estudantes se formaram em universidades locais, diz Carvalho. Havia pelo
menos 23 universidades na colônia, três delas apenas no México. Só a
Universidade do México formou quase 40 mil estudantes.
"A Universidade do México, por exemplo, era muito reacionária, a tal ponto que,
em 1830 (após a independência do México), o governo mexicano decidiu fechá-
la porque acreditava que não seria possível reformá-la", acrescenta.
"Já na América portuguesa, tudo o que era consumido vinha de Portugal, o que
gerava esse vínculo muito forte com a metrópole", lembra.
Até 1760, quando a Espanha era governada pela dinastia dos Habsburgo, as
colônias tinham bastante autonomia.
Mas tudo mudou com as reformas borbônicas feitas pelo rei espanhol Carlos
3º. Naquele momento, a Espanha precisava aumentar a extração de riqueza de
suas colônias para financiar a manutenção de seu império e guerras nas quais
estava envolvido.
Família real portuguesa fugiu de Portugal rumo a Brasil por causa de Napoleão Bonaparte
"Se Dom João não tivesse vindo para o Brasil, o país teria se dividido em cinco
ou seis países. Os lugares de maior desenvolvimento econômico, como
Pernambuco e Rio de Janeiro, teriam conseguido sua independência", assinala.
MUSEU NACIONAL DO CASTELO DE FONTAINEBLEAU
Napoleão Bonaparte forçou rei espanhol Fernando 7º a abdicar do trono em favor de seu
irmão, José (mais tarde José 1º, da Espanha, retratado no quadro)
Na colônia, a notícia caiu como uma bomba. Aqueles que viviam na América
Espanhola já não sabiam mais a quem obedecer. Surgiram juntas
administrativas, muitas das quais no começo governavam em nome de
Fernando 7º, recusando-se a receber ordens de juntas semelhantes formadas
na Espanha (após a invasão de Napoleão, o governo espanhol foi dividido em
inúmeras juntas administrativas).
MNBA
Com o apoio de outras castas, eles travaram lutas sangrentas contra a Espanha
por independência, entre 1809 a 1826.
Por outro lado, quando Napoleão foi derrotado, Dom João 6º elevou o Brasil à
condição de Reino Unido a Portugal. Também permaneceu no Rio de Janeiro
até que as cortes exigissem seu retorno a Lisboa, em 1820, e aceitasse uma
constituição liberal.
Dom João 6º deixou seu filho, Pedro, como príncipe regente no Brasil, e em
1822, Pedro tornou o Brasil independente, coroando a si mesmo como Dom
Pedro 1º. O Brasil ganhou então a independência como uma monarquia
constitucional.
MUSEU DO IPIRANGA
Temor social
Na América Espanhola, por outro lado, diz o historiador americano, "as elites
(...) aprenderam que poderiam lidar muito bem com uma população irrequieta.
Todos os países hispano-americanos tomaram medidas que objetivavam
terminar com a escravidão, possivelmente para diminuir o perigo da revolta
escrava. Mestiços (e alguns mulatos, como na Venezuela), tinham o comando
de forças militares e eram frequentemente recompensados com posse de
terras tomadas dos monarquistas", diz.
MUSEU DO PRADO
Explica Ávila Rueda: "Na época colonial, o conceito de fronteira era distinto do
dos Estados modernos. O que havia era um sistema de jurisdição, não de
fronteiras. E as diferentes jurisdições às vezes se sobrepunham umas às
outras".
"Assim, houve conflitos bélicos muito fortes para delimitar essas fronteiras no
século 19, inclusive após a independência", acrescenta.
Ávila Rueda lembra que, com a abdicação de Fernando 7º, ocorre um processo
em que os territórios provinciais passam a lutar por "mais autonomia".
Argentino José de San Martín é também conhecido como o libertador de Argentina, Chile e
Peru
Graham concorda. "Se você vai se tornar independente da Espanha, por que
continuaria a se submeter aos mandos e desmandos de Buenos Aires, por
exemplo? A divisão por vice-reinos era burocrática. E as fronteiras atuais dos
países da América Latina demoraram para ser consolidadas. Não era possível
prevê-las antes de 1810, pois resultaram de disputas internas após a
independência", explica.
Militar e estadista, Bernardo O'Higgins foi uma das principais figuras militares fundamentais
do movimento de independência do Chile
Em 1822, Simón Bolívar e José de San Martín, duas das figuras mais
importantes da descolonização da América Espanhola, reuniram-se na cidade
de Guayaquil, no Equador, para discutir o futuro da América Espanhola.
Agustín de Iturbide foi declarado imperador do México como Agustín I após independência
da Espanha
Documento "Declaração ao Mundo" ou "Notas para a História" foi encontrado junto ao corpo
de Agustín de Iturbide após sua execução; sangue sobre papel é do próprio Agustín
"A própria mulher de Dom João, Dona Carlota Joaquina, tinha vontade de se
tornar rainha do Prata", lembra Murilo de Carvalho.
Militar liberal e líder político venezuelano, Simón Bolívar foi um dos primeiros a lutar pela
descolonização da América Espanhola
Rebeliões no Brasil
Tiradentes foi líder da Inconfidência Mineira, mas revolta não tinha desejo de libertação de
todo território brasileiro
Ainda assim, como lembra Graham, "mesmos os grupos do sul que declaram
sua aliança a D. Pedro 1º, em meados de 1822, não significavam o triunfo do
nacionalismo. Ao contrário, eles simplesmente preferiam o domínio dele, com a
promessa de autonomia local, ao domínio das cortes portuguesas, que
ameaçava essa autonomia".
Ávila Rueda acrescenta ainda que, "como na América portuguesa não houve
uma guerra de independência e sim uma continuidade com a transferência da
corte, o governo do Rio de Janeiro tinha mais força para suprimir essas
rebeliões".
"Em contrapartida, o governo do México não tinha força suficiente para evitar o
desmembramento da América Central. Tampouco o governo de Buenos Aires
em relação a Uruguai ou Paraguai", acrescenta.
'Acordo de interesses'
Graham concorda. "O governo central não foi imposto às pessoas influentes ou
até mesmo "vendido" a eles. Eles (a elite brasileira) o escolheram", assinala.
Por fim, a opção por um governo central, além de afastar o espectro de uma
anarquia social, também favorecia estender o poder dessas elites, uma vez que
cabia a elas as indicações aos cargos públicos, como oficiais da Guarda
Nacional, delegados de polícia e juízes.
"Eles vieram a considerar o governo central como apropriado e útil para fins
pessoais", diz Graham.
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