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NO CAMPO DOS
FORA-DA-LEI
Autor
WILLIAM VOLTZ
Tradução
RICHARD PAUL NETO
Digitalização e Revisão
ARLINDO_SAN
Há muito tempo os senhores da galáxia, nome que se dá
aos seres misteriosos que dominam a nebulosa de
Andrômeda, vêm usando o povo dos twonosers como vigias
de Andro-Beta. Esta situação teve início há muitos milênios,
mas no ano de 2.402 os twonosers ainda cumprem sua missão
de vigilância segundo as ordens de seus senhores — o que
representa uma infelicidade para Perry Rhodan e os homens
da Crest.
A Crest II, que abandonou o satélite secreto Tróia,
introduzido em Andro-Beta para fazer um vôo de
reconhecimento, foi atacada e aprisionada pelos twonosers,
que a levaram para o interior de um moby. Depois de uma
luta feroz e sem esperança travada contra uma força
infinitamente superior de seres trombudos, Perry Rhodan e
seus homens foram dominados.
Dois mil terranos iniciam a triste caminhada para a
prisão. Em virtude de seu aspecto exterior, os prisioneiros
foram classificados como párias. Um trem levou-os à região
habitada pelos trombas brancas, que formam a casta mais
baixa dos twonosers.
Mas Perry Rhodan não fica preso por muito tempo.
Foge em companhia de um grupo selecionado de terranos e
entra em contato com os chamados criminosos domésticos. A
base de operação da luta de libertação é o Campo dos Fora-
da-Lei!
Havia uma ligação emocional entre os gêmeos Woolver. Em outras palavras, cada
sprinter sentia a grande distância as reações emocionais do irmão.
Rhodan teve a impressão de que por ocasião do ataque ao trem de carga poderiam
tirar proveito dessa faculdade dos dois imartenses.
Brodger Kapitanski não acreditava nisso. Mas nunca se atreveria a criticar os planos
do Administrador-Geral. No início, o sargento tivera a impressão de que os planos de
Rhodan eram sensatos.
Mas isso mudou no momento em que Kapitanski atravessou uma veia
insignificante, para chegar ao tubo pelo qual deveria vir o trem de carga.
Kapitanski estava parado sobre o trilho. A luz da tocha lançava sombras
fantasmagóricas. O trilho metálico parecia mais largo do que tinha na lembrança desde o
tempo em que viajara no trem intercastas. Fazia muita diferença estar sentado no trem ou
ficar à espera do mesmo, parado sobre o trilho.
Kapitanski lembrou-se de que Rakal Woolver usara um dos numerosos condutores
de energia que corriam pelo túnel para chegar à estação mais próxima e entrar às
escondidas no trem de carga. Tronar, irmão de Rakal, esperava com Icho Tolot uns três
quilômetros à frente do lugar em que estava Kapitanski. Era claro que Rakal Woolver não
podia saber em que lugar os criminosos domésticos espreitavam o trem. Era impossível
determinar o lugar de dentro do trem em movimento, enquanto os carros atravessavam a
escuridão da veia.
Por isso os dois sprinters combinaram um sinal muito simples. Rhodan esperava que
funcionasse, enquanto Kapitanski acreditava que seria um fracasso.
Assim que Icho Tolot ouvisse o ruído do trem, bateria fortemente no ombro de
Tronar Woolver. Rhodan escolhera isso de propósito, pois sabia que até mesmo uma
palmadinha amistosa do halutense provocaria dores. Rakal Woolver, que ficaria “na
escuta” com seus parassentidos, não deixaria de registrar o súbito ataque de dor do irmão.
Depois disso sabotaria o sistema de propulsão do trem de carga, para fazei parar o
mesmo.
O comboio deveria parar o mais tardar no lugar em que o sargento Kapitanski
estava à espera.
Quando se lembrava das inúmeras possibilidades de fracasso dos gêmeos Woolver,
Kapitanski começava a transpirar.
Era bastante duvidoso que Rakal Woolver conseguisse chegar ao trem. Além disso
poderia acontecer que o parassinal deixasse de ser transmitido. Nesse caso o trem
passaria que nem uma bala, e o sargento dificilmente teria uma possibilidade de fugir.
Brodger Kapitanski abaixou-se e encostou o ouvido ao trilho. Não ouviu nada.
Os terranos e os criminosos domésticos mantinham-se à espera a pouco mais de um
quilômetro do lugar em que estava Kapitanski, num ponto em que poderiam vê-lo acenar
com a tocha. O sargento representava uma estação sinalizadora entre Tolot e Perry
Rhodan. Apresentara-se voluntariamente para executar essa tarefa.
No momento bem que gostaria que não tivesse feito isso.
Sem querer, lembrou-se de Baynes, ou seja, de Lorde Kendall Baynes, que
sacrificara a própria vida para possibilitar sua fuga. Kapitanski não tinha a intenção de
transformar-se na segunda vítima. Era um homem que sabia pensar friamente. Não havia
nada que lhe fosse mais estranho que o romantismo ou o idealismo exagerado. Se
necessário, lutaria desesperadamente pela vida.
Voltou a abaixar-se e encostar o ouvido no trilho.
Desta vez ouviu alguma coisa.
Era o trem de carga que se aproximava. Devia estar a uns quinze quilômetros, ou
mais, mas aproximava-se inexoravelmente. O sargento teve de fazer um esforço para
ficar parado sobre o trilho. Ainda não tinha muita certeza de que ia dar certo.
O ruído do trem foi-se tornando cada vez mais forte. Kapitanski esperava ver a
qualquer momento os carros enormes saírem da escuridão e precipitarem-se sobre ele.
Levantou-se de um salto e acenou com a tocha. Um ponto luminoso acendeu-se por um
instante bem atrás dele. Rhodan estava acusando o recebimento do sinal.
Nesse momento Icho Tolot daria uma palmadinha “amistosa” no ombro de Tronar
Woolver, na esperança de que a súbita sensação de dor experimentada por Tronar se
transmitisse a Rakal.
Kapitanski lançou um olhar saudoso para o lugar em que sabia estar a pequena veia
salvadora, pela qual tinham penetrado no túnel. Ainda estava em tempo de ir a um lugar
em que estivesse em segurança.
Dali a instantes Kapitanski ouviu o trem, mesmo sem encostar o ouvido ao trilho.
Os rolos de sustentação produziam um chiado estridente e penetrante. Kapitanski mordeu
a ponta da língua. Estava com os nervos muito tensos.
Ficou de pé, com os olhos arregalados e a tocha bem erguida. Se nesse instante os
primeiros carros aparecessem no círculo de luz, não teria tempo de dar um passo para o
lado. A atmosfera deprimente dos planetas estranhos sempre causara uma ansiedade em
Kapitanski. Tornava-se difícil para ele aceitar coisas completamente estranhas. Ali, no
interior do corpo gigantesco de um ser vivo, a repugnância do sargento por tudo que não
fosse terrano tornava-se mais forte.
Kapitanski era bastante inteligente para lutar contra esse complexo, mas nos
momentos em que o perigo era maior este acabava sendo mais forte.
O barulho do trem estava aumentando. O túnel começou a vibrar. O trilho sobre o
qual Kapitanski estava parado parecia movimentar-se. A tocha começou a tremer.
Neste momento o sargento recuperou o sangue-frio. Tentou calcular a distância a
que se encontrava o trem. Kapitanski sabia que atrás dele os terranos saíam marchando
com seus novos aliados, a fim de ocupar o comboio.
O primeiro carro entrou no círculo de luz projetado pela tocha. Kapitanski soltou
um grito e atirou-se para o lado Sentiu instintivamente que, se o trem não parasse, não
teria nenhuma chance. Suas mãos estendidas tocaram a parede do túnel. Encostou-se
fortemente à mesma, embora isso não pudesse salvá-lo, já que os carros tomavam quase
todo o espaço da veia.
Fechou os olhos e ficou à espera do momento ligeiro da dor alucinante, que
precederia a morte. Mas não aconteceu nada. O sargento virou a cabeça. A tocha acesa
estava jogada sobre o trilho.
O primeiro carro do trem estava parado a uns vinte metros do lugar em que se
encontrava Kapitanski.
O sargento respirou aliviado. O plano de Rhodan dera certo. Rakal Woolver captara
o sinal transmitido pelo irmão gêmeo e entrara em ação antes que fosse tarde.
O sargento não se atrevia a aproximar-se do trem sozinho. Sabia que havia pelo
menos dez guardas no interior do mesmo. Além disso o trem devia levar centenas de
bioparasitas Kapitanski perguntou-se qual seria a reação dos guardas. Acreditava que
ficariam entrincheirados nos carros, pois não sabiam o que os esperava fora do trem.
Nestas condições seria difícil apoderar-se do comboio de carga. Mas Kapitanski não
se preocupou com isso. Os criminosos domésticos chegariam dentro de alguns minutos.
Saberiam como quebrar a resistência de alguns trombas azuis. Além disso Icho Tolot e
Tronar Woolver aproximavam-se do Irem, vindos do outro lado. E os guardas teriam de
inventar uma coisa muito boa para deter Icho Tolot.
Kapitanski fazia votos de que os ocupantes do trem não o descobrissem. Sozinho
estaria indefeso diante deles.
Tinham feito parar o trem. Faltava conquistá-lo.
***
Havia dez guardas no trem de carga, conforme haviam previsto os criminosos
domésticos. Tratava-se de trombas azuis que tinham recebido um treinamento militar. Os
mesmos entrincheiraram-se no carro da frente e ofereceram uma resistência obstinada.
Conseguiram matar dois dos atacantes.
Mas Tolot e os gêmeos Woolver conseguiram pôr fim à luta.
Os guardas sobreviventes saíram por um enorme buraco na parede dianteira do
carro, com as trombas levantadas.
— Estão se rendendo! — exclamou Pohiik, satisfeito.
Os desclassificados investiram contra os trombas azuis e começaram a maltratá-los.
Rhodan foi logo para perto de Pohiik, para protestar contra esse comportamento.
— Diga aos seus homens que devem parar — disse em tom penetrante.
Pohiik encarou-o como quem não compreende nada.
— Eles são nossos inimigos — lembrou.
— São nossos prisioneiros — retificou Rhodan. — O que acharia se fosse preso e
alguém o tratasse assim?
Pohiik soltou um grunhido de desprezo.
— A mim ninguém prenderá — afirmou.
Rhodan reconheceu que seria inútil discutir com Pohiik. Ficou satisfeito quando
este deu ordem para que seus adeptos ocupassem o trem. Depois o mesmo fez um gesto
de desprezo em direção aos seis guardas que tinham sobrevivido ao ataque.
— Já pode mandar fuzilá-los — disse, dirigindo-se Rhodan.
Rhodan limitou-se a acenar com a cabeça. Aproximou se dos trombas azuis, com
uma tradutora na mão.
— Dêem o fora! — gritou. — Escondam-se antes que os criminosos domésticos os
peguem de novo.
Cinco dos guardas saíram correndo. O sexto fitou Rhodan.
— Quem é o senhor? — perguntou. Rhodan lançou um olhar rápido para o trem.
— Depressa — insistiu. — Se o senhor ainda estiver aqui quando Pohiik sair do
trem, o senhor estará perdido.
O tromba azul virou-se lentamente e saiu andando. Parecia não poder conformar-se
com a idéia de ter sido derrotado por um ser sem tromba.
O último guarda mal tinha desaparecido na escuridão da veia, quando Pohiik
apareceu de novo. O velho twonoser agitava alegremente as trombas.
— Não será difícil pôr o trem em movimento — disse — São somente quatro
carros. Não será difícil atravessar a área dos trombas azuis com os mesmos, desde que
seus mutantes consigam pôr fora de ação o centro de recepção da casta B.
— Os gêmeos Woolver farão tudo que estiver ao seu alcance para que esta parte do
plano também seja devidamente executada — asseverou Rhodan.
— Para um homem que não possui tromba o senhor parece bastante decidido —
observou Pohiik.
Rhodan não pôde deixar de rir.
— Pohiik, o senhor e Garko o Forte juntos poderão pôr fim à ditadura dos trombas
vermelhas.
O criminoso doméstico ficou aborrecido.
— Garko o Forte? Ele não tem coragem de colocar-se abertamente do nosso lado.
— Tenho minhas dúvidas quanto a isso. Acho que é muito inteligente para lançar-se
numa luta em que não tem nenhuma chance.
— Na luta com os trombas vermelhas nunca teremos uma chance — respondeu
Pohiik em tom pensativo.
Era a primeira vez que Pohiik dissera francamente o que pensava sobre a operação
em que estavam empenhados. O velho twonoser já sofrera muitas derrotas pela vida à
fora. Já não acreditava na vitória.
As reflexões de Rhodan foram interrompidas quando Icho Tolot enfiou a cabeça
maciça por um buraco do primeiro carro.
— Kasom! — gritou o halutense.
Melbar Kasom passou perto de Rhodan.
— O que houve? — perguntou com a voz potente.
— Este trem tem quatro carros — informou Tolot. — Estão todos carregados com
alimentos. Que tal?
— Bioparasitas e milho gigante twonoser — respondeu Kasom. — Um ertrusiano
não seria capaz de entusiasmar-se com isso.
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Assinalaram os pontos que lhes pareceram importantes. Eram setenta e três ao todo.
Quer dizer que teriam que disparar setenta e três tiros energéticos com boa pontaria antes
de sair do centro de recepção.
— É de esperar que, quando tivermos iniciado nosso trabalho, os trombas azuis
apareçam dentro de pouco tempo — disse Tronar Woolver em tom calmo. — Devemos
estar preparados para fugir a qualquer momento. Por aqui existem muitos ecos que
podemos usar para dar o fora.
Rakal Woolver pegou a arma energética twonoser. Não disse uma palavra. Tronar
também ergueu sua arma.
— Pronto? — perguntou Tronar.
— Pronto — confirmou Rakal.
Dali a alguns instantes o centro energético dos trombas azuis transformou-se num
inferno. As primeiras espulas derreteram, espalhando cascatas de fogo. Os projetores de
irradiação dos bancos de energia tornaram-se incandescentes sob a ação das armas
térmicas. Relâmpagos amarelos ofuscantes saíram dos bancos. Um barulho ensurdecedor
encheu o recinto. Houve tremendas descargas energéticas, que produziram o rugido de
uma trovoada.
— Não vamos agüentar! — gritou Rakal Woolver. — Morreremos queimados antes
que consigamos destruir as peças mais importantes.
Tronar apontou para as chamas que subiam ao teto.
— O que não conseguirmos destruir será consumido pelo fogo.
Naquele momento os primeiros trombas azuis apareceram na entrada. Sua reação
tinha sido surpreendentemente rápida. Usavam trajes protetores e penetraram no recinto
sem cuidar da própria segurança.
Suas figuras eram pouco nítidas em meio à fumaça e ao fogo. Rakal Woolver viu
que carregavam equipamentos de extinção de incêndio.
— Ainda não nos viram — gritou para o irmão. Tronar fez um gesto obstinado. Os
raios energéticos disparados pelos dois mutantes quase não podiam ser reconhecidos em
meio ao caos das energias liberadas. O cheiro acre da fumaça quase tornava impossível a
respiração. Os trombas azuis penetravam cada vez mais profundamente no recinto. Os
aparelhos de extinção de incêndio eram pequenos, mas muito eficientes.
— O quadro de comando! — gritou Tronar Woolver.
Atiraram nos relês que estavam à mostra. Um banco de energia explodiu do lado
oposto da sala. Era o sinal para os dois imartenses saírem dali.
Tronar fez um sinal com a arma e desmaterializou.
Rakal Woolver contemplou o espetáculo da destruição. Mais uma vez a linguagem
da violência estava sendo usada pelos representantes de formas de vida inteligentes.
Parecia não haver outra linguagem nas profundezas do Universo. Rakal cerrou os dentes.
Quem sabe se a paz só podia ser alcançada depois que os seres deixassem de correr atrás
dos segredos do cosmos?
Enquanto estava entretido nestes pensamentos, Woolver retirou-se da central
energética.
***
Pohiik era uma massa disforme, uma figura vitrificada, que se deslocava com
movimentos abruptos.
Rhodan abriu bruscamente a porta que dava para o último carro. Levantou a arma e
dirigiu-a para o twonoser.
— Fique parado, Pohiik.
Pohiik hesitou. Balançava que nem um bêbado de um lado para outro do corredor.
Parecia ter havido uma modificação com o parasita que o envolvia. Kapitanski teve a
impressão de que estava irradiando uma débil luminosidade.
— Não atire — disse Pohiik.
Kapitanski teve a impressão de que o tromba branca tinha de fazer um esforço
tremendo toda vez que queria falar.
— Leve isso de volta ao compartimento — ordenou Rhodan. — Não posso permitir
que entre nos carros da frente no estado em que se encontra.
— O senhor não está falando com Pohiik — disse Pohiik com a voz pesada. — Está
falando comigo.
— Ele enlouqueceu de vez, senhor — rugiu Kasom. — Acho que devemos prendê-
lo aqui.
— Espere aí! — disse Pohiik. — Vou provar que não está falando com Pohiik. Olhe
para o ombro direito do twonoser.
Kapitanski estremeceu ao ver uma bolha formar-se no ombro direito do tromba
branca. A mesma inchou até alcançar o tamanho de uma cabeça humana e arrebentou.
— Isso basta? — perguntou Pohiik.
— Um bioparasita do seu tamanho não possui inteligência — disse Rhodan.
Kapitanski teve a impressão de que alguém o mergulhara em água gelada.
Compreendia o que Rhodan queria dizer. Além de envolver o corpo de Pohiik, o parasita
dominava sua mente.
— Uso a inteligência de Pohiik — disse o parasita. — Ele pulverizou substância
tongkt em seu corpo, embora soubesse o que iria acontecer. Pohiik fugiu da realidade.
Queria que eu o assumisse.
— O que vem a ser a substância tongkt? — perguntou Rhodan.
Manteve a arma apontada para Pohiik, ou para aquilo que já fora Pohiik.
— Os tongkts eram uma forma de vida semi-orgânica, que também vivia no interior
do moby — disse o parasita.
— Muitas vezes viviam em simbiose conosco. Permitiam que mudássemos de
forma de uma maneira semelhante à que está se verificando junto ao corpo de Pohiik.
— Suponhamos que aquilo que o senhor diz é verdade — disse Rhodan. — O que
pretende fazer?
— Fomos criados para sermos devorados pelos twonosers — lembrou o ser que
dominava Pohiik, usando a voz do mesmo. — Enquanto nos encontrávamos num estado
que só permitia ações instintivas, nosso destino nos era indiferente, pois éramos
incapazes de processar inconscientemente os acontecimentos que se verificavam em
torno de nós. Mas com o auxílio do twonoser já posso pensar. Sei que os outros parasitas
acabariam por atingir certo grau de inteligência, desde que lhes fosse permitido evoluir
além do ponto que têm alcançado até agora.
Kapitanski teve a impressão de ter um pesadelo enquanto estava acordado. Sua
repugnância por tudo que era estranho foi despertada. Se Kasom não se encontrasse atrás
dele, obstruindo a passagem para os carros da frente, o sargento teria fugido.
— Liberte Pohiik, senão atiro — gritou Rhodan para dentro do corredor.
— Não atire! — disse o parasita. — Os pensamentos armazenados na mente de
Pohiik permitem que eu saiba que o senhor está em dificuldades. Seu lugar não é este
moby, da mesma forma que o dos twonosers não é. É bem verdade que o senhor tem a
intenção de abandonar o mesmo, enquanto os seres trombudos nem pensam em
abandonar seu espaço vital.
— Onde quer chegar? — perguntou Rhodan.
— Nós o ajudaremos a chegar a sua espaçonave. Em compensação o senhor nos
ajudará a crescermos calmamente, até que alcancemos um grau de inteligência que nos
permita oferecer resistência aos twonosers.
— Não estou em condições de travar uma guerra de libertação em benefício de
todos os bioparasitas que se encontram neste moby — respondeu Rhodan.
— Não é por todos — retificou o parasita. — Somente por aqueles que se
encontram neste trem.
— Suponhamos que eu aceite sua proposta — disse Rhodan. — O que poderia fazer
por nós?
— O senhor precisa acreditar que poderemos ajudar. Não posso dizer como, porque
neste caso o senhor tentaria obter este auxílio sem dar nada em troca.
Rhodan baixou a arma.
— Vou pensar — prometeu e fechou a porta.
— E agora, senhor? — perguntou Kasom. — Perdemos Pohiik. Assim que
souberem o que aconteceu com seu chefe, os criminosos domésticos abandonarão o trem.
Aí teremos de encontrar um meio de chegarmos sozinhos ao pavimento superior.
— E possível que os parasitas valham mais como aliados que os criminosos
domésticos — disse Rhodan em tom pensativo.
Voltaram à sala de máquinas para discutir o assunto com Atlan. Os criminosos
domésticos já estavam ficando inquietos. Parecia que estavam desconfiados de que havia
algo de errado. Era apenas uma questão de tempo que mandassem uma delegação aos
carros de trás para saber o que tinha acontecido com Pohiik. Em seguida enviariam outra
delegação à sala de máquinas, para obrigar os terranos a fazer parar o trem numa veia
secundária.
A situação dos fugitivos estava cada vez mais confusa. E nem sequer haviam
chegado ao pavimento médio.
Enquanto isso cerca de dois mil terranos que se encontravam na área dos trombas
brancas esperavam o momento de serem libertados.
***
Ás raras colunas luminosas que faziam parte do sistema de iluminação de
emergência não chegavam a clarear parte do gigantesco pavilhão. Todos os sóis artificiais
do pavimento médio se tinham apagado. Num tempo bastante curto o frio começou a
castigar os habitantes.
Os exércitos dos trombas azuis estavam em marcha. Dirigiam-se ao pavimento
superior. Alguns deles haviam feito uma ação de reconhecimento e contaram aos chefes
da casta B que na área dos trombas vermelhas não houvera nenhuma falta de energia. Os
trombas azuis pautaram sua ação por este fato. Em sua opinião os responsáveis pelos atos
de sabotagem praticados no centro de recepção de energia só podiam ser os trombas
vermelhas.
Rakal Woolver estava parado na escuridão e prestava atenção ao ruído dos pesados
veículos que estavam conduzindo as armas dos trombas azuis às estações das linhas
férreas que levavam às veias superiores. Era o terceiro pavilhão ao qual Rakal Woolver
se dirigira depois dos atos de sabotagem bem-sucedidos realizados no centro de recepção
dos trombas azuis. Enquanto Tronar Woolver tentava atingir o trem de carga antes que o
mesmo chegasse ao pavimento médio, Rakal procuraria descobrir o que estava
acontecendo depois que se verificara a falta de energia.
A reação dos trombas azuis foi de uma rapidez surpreendente. Enquanto seus
especialistas se esforçavam para consertar os estragos, as tropas preparavam o ataque aos
trombas vermelhas. Face à mentalidade da casta B, não foi tomada nenhuma medida
diplomática. O pensamento dessa classe guiava-se exclusivamente pelas considerações de
ordem militar.
Pelos cálculos de Woolver, a temperatura já devia ter baixado uns dez graus. E
cairia ainda mais, porque o equipamento de emergência não era suficiente para abastecer
as potentes luminárias presas ao teto. A oscilação da temperatura certamente se
transmitira aos outros pavimentos. Bastaria que a temperatura descesse alguns graus na
área da casta B, e não haveria nenhuma dúvida sobre a reação dos trombas brancas. Para
um povo habituado há várias gerações a viver numa temperatura constante, a súbita
mudança só poderia significar um ataque que ameaçava sua existência.
Provavelmente Garko o Forte finalmente seria capaz de tomar uma decisão.
Avançaria contra as duas castas superiores, que há muitos anos tiranizavam os trombas
brancas.
Rakal Woolver encontrava-se nas proximidades de alguns quartéis abandonados. O
ruído dos motores era cada vez menos intenso. Os veículos dos trombas azuis já tinham
desaparecido nas diversas veias. Rakal tinha certeza de que a casta B não se limitaria a
um ataque vindo de dentro. Usaria suas espaçonaves de alta velocidade para bombardear
o pavimento superior a partir do espaço. Mas sem dúvida os trombas vermelhas há muito
previam a possibilidade de um ataque. As chances de que a casta B subjugasse o
pavimento superior numa guerra-relâmpago eram bastante reduzidas. Haveria um conflito
demorado, ainda mais se os trombas brancas também resolvessem fazer valer suas
ambições de poder.
Woolver atravessou uma rua que passava entre dois blocos de edifícios residenciais.
Havia uma coluna luminosa solitária a uns cem metros do lugar em que se encontrava. A
claridade da mesma permitia que Woolver visse onde estava. Todas as máquinas do
pavimento médio tinham falhado. Só havia energia para as instalações mais importantes
dos trombas azuis.
O ataque repentino da casta B faria com que os trombas vermelhas não
prosseguissem nos trabalhos de desmontagem da Crest II. Todos os homens de que
dispunham seriam usados na defesa de seu espaço vital.
Iriam pagar pelo erro de terem confiado exclusivamente tarefas militares aos
membros da casta B. Os trombas azuis eram incapazes de avaliar quaisquer problemas
por outros pontos de vista que não fossem os estratégicos. Não conheciam os lances
psicológicos. Isso poderia ser o fim dos trombas azuis, desde que a casta C fosse bastante
inteligente.
Woolver não tinha a menor dúvida de que o resultado da guerra que estava
começando dependeria em grande parte daquilo que os trombas brancas iriam fazer.
Woolver procurou um eco de impulsos. Depois da falha do sistema de
abastecimento de energia os condutores que podiam ser usados pelos mutantes eram
pouco numerosos.
Não seria fácil chegar ao trem. Rakal resolveu esperar junto à boca do túnel, até que
aparecesse o trem. Havia todas as condições para que o mesmo atravessasse o pavimento
médio em segurança.
***
Tronar Woolver materializou na sala de máquinas do trem cargueiro. Rhodan, Atlan
e Kasom ainda não haviam chegado a nenhuma conclusão sobre o que fazer diante da
modificação sofrida por Pohiik.
— O pavimento médio está sem energia — informou o mutante, indo diretamente
ao assunto. — Só está funcionando o sistema de emergência. Rakal pretende inspecionar
alguns pavilhões, para ter uma idéia sobre a reação dos trombas azuis.
Rhodan soltou um suspiro silencioso de alívio. Finalmente estava recebendo uma
notícia animadora. Já havia uma esperança de atravessar a área dos trombas azuis sem
que ninguém tentasse impedi-los.
— Estas notícias deixarão Garko inquieto — disse Atlan. — A falta dos sóis azuis
deve provocar um resfriamento até mesmo no pavimento inferior, pois parte do calor
dessa área será irradiada para o pavimento médio.
— Garko o Forte desconfiará de quem é responsável pelo ataque ao centro
energético — disse Rhodan. — Sabe que os trombas vermelhas são inteligentes demais
para pôr em perigo os seres que lhes fornecem alimentos.
— Isso poderá levar os trombas brancas a informarem os trombas vermelhas sobre o
que realmente aconteceu — disse Kasom.
Rhodan dirigiu-se a Tronar Woolver.
— Major, o senhor terá de saltar imediatamente para pavimento inferior e entrar em
contato com John Marshall no campo de prisioneiros. Marshall deverá explicar a Garko o
Forte que os trombas brancas têm uma boa chance de acabar com a ditadura da casta C.
— Vou tentar, senhor — disse Tronar. — Mas não devemos esquecer que o número
dos condutores de energia no momento é muito baixo.
— Não no interior dos túneis por onde passam os trens — disse Rhodan. — Os
comboios não dependem das centrais energéticas dos diversos pavimentos. O senhor terá
de seguir o trilho.
Rhodan deu outras instruções ao mutante. Marshall tinha de estar perfeitamente
informado sobre o que tinha acontecido, pois só assim teria argumentos irrespondíveis
para apresentar a Garko.
— Os trombas brancas já podem avançar para o pavimento médio do moby, sem
receio de serem expulsos pelos trombas azuis — disse Rhodan. — Garko sabe
perfeitamente que dali para a conquista do centro de distribuição é apenas um pequeno
passo. E quem tiver o controle da estação de distribuição dominará o moby.
— Está bem, senhor — disse Woolver. O peito de tonel do imartense subia e descia.
— Tomara que os tromba vermelhas não nos venham com um plano esperto.
— Temos de ser mais rápidos que eles — disse Rhodan.
Tronar Woolver entendeu a alusão. Estava na hora de pôr-se a caminho. Um ligeiro
momento de concentração total — e Tronar Woolver, major da USO, deixou de existir no
interior da sala de máquinas.
Quando Rhodan voltou a olhar para ele, Atlan sorriu.
— Vejo que já se familiarizou muito bem com meus mutantes especiais — disse o
arcônida.
— Se não fossem eles, praticamente não teríamos nenhuma chance — respondeu
Rhodan em tom sério. — De qualquer maneira quero ressaltar que os dois imartenses são
descendentes dos verdadeiros terranos, e por isso não pertencem à raça dos arcônidas.
Portanto, só mesmo em sentido administrativo você pode afirmar que são seus mutantes.
— O senhor não acha que é indiferente de quem sejam os mutantes? — perguntou
Kasom, que já começava a recear que a discussão se perdesse em meio a considerações
filosóficas.
— No momento sim — concordou Atlan. — Temos de resolver o problema
representado por Pohiik.
Antes que Rhodan pudesse responder, a porta foi aberta violentamente. Os
criminosos domésticos amontoavam-se junto à entrada. Ouviu-se um vozerio. Rhodan viu
o sargento Kapitanski pôr a mão na arma.
— Isso mesmo — disse Rhodan. — Parece que Pohiik realmente se transformou
num problema.
Virou o rosto para a porta.
— O que querem? — perguntou em tom enérgico. — Agora não temos tempo para
discussões.
— Onde está Pohiik? — perguntou o tromba branca que se encontrava junto à
entrada. Era um homem jovem e robusto, que muitas vezes contraditara Pohiik durante as
reuniões realizadas no acampamento. Rhodan lembrou-se de que o nome desse twonoser
era Larkaat.
— No carro de trás — disse Rhodan.
— Viemos de lá — disse Larkaat, zangado. — Não o encontramos.
Rhodan virou a cabeça.
— Pelo amor de Deus, deixe de mexer nessa arma, sargento Kapitanski — disse.
Kapitanski ficou muito vermelho e voltou a enfiar a arma energética no cinto.
Kasom foi para perto de Rhodan.
— Não podemos ser responsabilizados pelo que Pohiik faz — respondeu Rhodan
em tom áspero.
— Somos de opinião que está morto — retrucou Larkaat. — Se for verdade, passo a
ser o chefe dos criminosos domésticos.
— O que deseja, Larkaat? — perguntou Rhodan, olhando fixamente para o olho
facetado rígido do twonoser.
— Não sou obrigado a cumprir os acordos que Pohiik fez com vocês — exclamou
Larkaat em tom de ameaça.
— Quer fazer voltar o trem para que o mesmo colida com o trem intercastas que
vem logo atrás? — perguntou Rhodan em tom irônico.
Via-se perfeitamente que Larkaat ainda não tinha feito nenhum plano para o futuro.
Seguira um impulso repentino, dirigindo-se à sala de máquinas juntamente com os
companheiros. Era bem verdade que não esperara ser recebido com tamanha frieza e
indiferença.
— Pensarei no assunto — resmungou Larkaat e deu repentinamente as costas a
Rhodan.
Rhodan fechou ruidosamente a porta. Perguntou-se onde Pohiik se teria escondido
no momento em que os twonosers tinham entrado no carro de trás para procurá-lo.
— Estes caras são muito desconfiados, senhor — disse Kasom. — O que faremos se
eles nos abandonarem?
— Eles não nos abandonarão — cochichou Atlan em tom convicto. — A
possibilidade de apoderar-se do centro e distribuição fará com que superem a antipatia
que sentem or nós.
De repente, algumas luzes se acenderam nos controles do sistema de tração do trem.
A velocidade parecia diminuir automaticamente.
— O que é isso? — perguntou Kasom.
— Acabamos de sair do túnel e estamos atravessando o campo aberto — disse
Rhodan.
Kasom olhou para a janela com uma expressão de incredulidade.
— Está tudo escuro, senhor. Acho que ainda estamos numa veia.
— Não há energia lá fora — lembrou Rhodan. — Por isso não encontrará as luzes,
por mais que procure.
Kasom aproximou-se da janela e encostou o rosto à vidraça.
— Que coisa desagradável! Podemos estar atravessando um pavilhão gigantesco
sem ver nada.
Rhodan examinou os controles. Não sabia se o trem parava automaticamente nas
estações. Pohiik entendia o mecanismo de tração. Estaria em condições de aumentar ou
reduzir a velocidade do trem quando quisesse. Rhodan só conhecia a alavanca do freio de
emergência.
Não saberia o que fazer se o trem cargueiro parasse por algum motivo.
5
O trem cargueiro parou no interior do túnel. Rhodan deu um sinal para que Pohiik
desligasse a tração. Os homens prepararam-se para descer. Alguns criminosos domésticos
ficaram à espera das saídas dos vagões, exibindo suas trombas vermelhas. Seriam os
primeiros a sair do túnel. Os Woolver haviam informado a Rhodan de que teriam de
atravessar mais um pavilhão menor, antes de atingir o recinto gigantesco em cujo interior
os twonosers tinham construído o centro de distribuição de energia. Pelo que diziam os
dois mutantes, havia poucos trombas vermelhas no pavilhão menor. Rhodan e Larkaat
resolveram fazer uma tentativa de enganar os trombas vermelhas.
Caso se encontrassem com membros da casta C, Larkaat diria que os terranos eram
seus prisioneiros. Rhodan esperava que fosse possível enganar mais uma vez os trombas
vermelhas com as trombas tingidas dos criminosos domésticos. Se o plano fracassasse,
ainda poderiam combater pela liberdade.
Rhodan dirigiu-se a Pohiik, que se mantinha na espera à frente dos controles do
trem.
— Quer acompanhar-nos? — perguntou Rhodan.
— Tenho liberdade de ficar ou ir com os senhores? — perguntou Pohiik em tom de
espanto.
— A decisão é sua — disse Rhodan. — Cumprirei minha parte do acordo.
Larkaat apareceu na entrada da sala de máquinas e fez uma avaliação rápida da
situação.
— Quer dizer que a loucura de Pohiik é esta — chiou e apontou com uma das
trombas para o parasita que envolvia o corpo de Pohiik como se fosse uma pele
suplementar.
Rhodan colocou-se entre os dois rivais.
— Vai começar de novo com essa bobagem? — gritou para Larkaat.
— Ele entrou em simbiose com um parasita — disse Larkaat, nervoso. — Tem de
morrer.
— Não — disse Rhodan.
Larkaat sacou a arma energética. Rhodan ficou de pé entre o indignado filho de
Garko e Pohiik. Fitou o twonoser com a maior calma.
— Se quiser passar por mim, terá de matar-me — disse e também tirou a arma.
Larkaat tremia de raiva. Acabou por retirar-se sem dizer uma palavra.
— Depende exclusivamente do senhor como quer usar sua liberdade — disse
Rhodan, dirigindo-se a Pohiik.
— Tenho idéias bem definidas a este respeito.
— Gostaria de saber uma coisa — disse Rhodan. — o senhor é Pohiik, ou estou
falando com um bioparasita?
— Sou um ser resultante de uma simbiose — respondeu o twonoser.
Rhodan deu de ombros e saiu. Os fugitivos estavam à sua espera no corredor.
Larkaat e os outros criminosos domésticos já tinham saído.
O trem encontrava-se a quinhentos metros do fim do túnel. Quando saltou do
mesmo, Rhodan reconheceu abertura clareada da saída da veia. Larkaat esperava com
rosto contrariado junto ao vagão da frente.
— Temos que desarmar o senhor e seus homens — disse o tromba branca. — Ou
será que o senhor acredita que os trombas vermelhas acreditariam que temos prisioneiros
armados?
Rhodan deu ordem para que seus homens escondessem as pequenas armas
energéticas nos uniformes.
— Isso basta? — perguntou, dirigindo-se a Larkaat.
— É claro que sim — resmungou Larkaat. — Nós os escoltaremos, para que a coisa
pareça verdadeira.
Dali a alguns minutos a estranha coluna saiu marchando da veia. Cinqüenta
criminosos domésticos com as trombas pintadas iam na frente. Depois vieram os
cinqüenta homens do Império Solar. Na retaguarda havia mais cem twonosers. Nesse
meio tempo Rhodan mandara que os dois sprinters voltassem ao centro de distribuição de
energia. Deviam entrar em ação no instante exato em que o grupo combatente aparecesse
na frente do edifício. Rhodan considerara a possibilidade de não conseguirem chegar ao
centro de distribuição. Nesse caso os imartenses agiriam segundo seu critério, tentando
apresentar um ultimato aos trombas vermelhas.
Quando saiu do túnel e pôde ver o pequeno pavilhão, Perry Rhodan viu que as
informações dos dois mutantes da USO eram corretas. Havia três edifícios não muito
grandes no centro. Uma estrada levava diretamente ao arco do portão mais próximo.
Rhodan viu um veículo solitário que se deslocava em direção aos três edifícios. Cerca de
trinta trombas vermelhas estavam parados junto à estrada. No momento não
representavam nenhum perigo, mas Rhodan quis evitar que os trombas vermelhas que se
encontravam no centro de distribuição de energia fossem alarmados.
Larkaat levou a coluna diretamente para os três edifícios. Os primeiros trombas
vermelhas notaram sua presença quando ainda se encontravam a algumas centenas de
metros da pequena povoação.
Rhodan viu um veículo sair em alta velocidade de um dos edifícios e correr na
direção dos fugitivos.
Larkaat levantou uma das trombas e mandou que a coluna parasse.
O veículo era parecido com aqueles que os terranos haviam visto no pavimento
inferior do moby. Freou perto de Larkaat. Dois trombas vermelhas saíram do mesmo.
Larkaat fitou-os com a maior calma.
— Quem são estes forasteiros? — perguntou o mais alto dos dois trombas
vermelhas.
— São nossos prisioneiros — disse Larkaat em tom orgulhoso. — Estavam com os
trombas azuis que atacaram Berdag. Conseguimos prendê-los.
Os dois trombas vermelhas lançaram um olhar desconfiado para os homens da Crest
II.
— Por que os trouxeram para cá? — perguntou o maior dos dois.
— Estamos cumprindo ordens — respondeu Larkaat com a voz calma. — Ordens
de quem?
Era a pergunta decisiva. Rhodan sabia que dali em diante não adiantaria mais
mentir.
— Por que faz essa pergunta? — foi a última tentativa de escapar à descoberta.
— Quem lhes deu ordem de trazer os prisioneiros para cá? — repetiu o tromba
vermelha em tom de ameaça.
Desta vez o filho de Garko não deu resposta. Tirou a arma energética e atirou. O
porta-voz dos dois trombas vermelhas caiu ao chão, sem vida. Seu acompanhante tentou
pôr-se a salvo com um salto desesperado para trás do veículo. Mas a reação veio muito
tarde. Morreu, atingido por pelo menos dez raios energéticos.
Rhodan cerrou os dentes. Aquilo que ele receara acabara por acontecer. Dali a
pouco todos os trombas vermelhas seriam informados que além dos trombas azuis
cinqüenta forasteiros tinham invadido sua área. Rhodan perguntou-se qual seria a reação
da casta C diante do aparecimento de cento e cinqüenta twonosers que possuíam trombas
vermelhas, mas ao que tudo indicava estavam aliados aos atacantes.
A voz de Larkaat fez com que Rhodan voltasse à realidade.
— Vamos andando! — gritou o filho de Garko para os criminosos domésticos.
Rhodan fez um sinal para Tolot e Melbar Kasom.
— Vamos caminhar na frente do grupo — disse aos terranos. — Não quero que
Larkaat pense que daqui em diante manda sozinho.
— O twonoser não deveria ter atirado — disse Atlan. — Daqui a pouco teremos de
enfrentar as divisões dos trombas vermelhas.
— Receio que sim — reconheceu Rhodan. — Dirigiu-se a Tolot: — Vá na frente e
tente entrar em contato com os Woolver. Temos de encontrar um meio de nos
apoderarmos do centro de distribuição, pois só assim Garko o Forte libertará os
prisioneiros.
Icho Tolot apoiou-se nos braços de salto e saiu em alta velocidade.
***
Os gêmeos Woolver estavam parados no recinto superior de uma das duas torres
pertencentes ao centro de distribuição de energia. Ali ninguém os incomodava. Tratava-
se de um depósito de peças sobressalentes. A poeira depositada em toda parte era uma
prova de que os trombas vermelhas raramente entravam lá.
Rakal Woolver caminhava nervosamente de um lado para outro. Se nada os
detivesse, os fugitivos deveriam surgir a qualquer momento. Rakal passou a mão pelo
cabelo curto. Parecia pensativo. Receava que tivessem confiado demais na sorte.
Rakal parou perto da janela grande. Ouviu seu irmão Tronar, que sentara numa
pequena máquina, dar uma risadinha.
— Rhodan não virá mais cedo só porque você vive olhando pela janela — disse em
tom sarcástico.
— Se é que ele virá — observou Rakal.
Tronar levantou-se e foi para perto do irmão.
No mesmo instante ouviram o estrondo de várias explosões. Nuvens de fumaça
levantaram-se bem ao longe. Os dois irmãos entreolharam-se.
— Será que são eles? — perguntou Rakal com a voz trêmula.
— Não — respondeu Tronar. — Devem ser os trombas azuis.
Rakal assustou-se. Se os trombas azuis tinham conseguido chegar ao pavilhão em
cujo interior se encontrava o centro de distribuição, não podia haver mais nenhuma
dúvida sobre suas intenções. Também queriam apoderar-se do centro.
— Não podemos esperar mais — disse Rakal Woolver. — Temos de obrigar os
trombas vermelhas que se encontram na estação a abandonar a luta antes que os trombas
azuis consigam chegar aqui.
Tronar apontou em outra direção.
— Parece que estamos recebendo reforços — disse.
Rakal olhou na direção indicada. Quase soltou um grito de júbilo quando viu Icho
Tolot na estrada, aproximando-se da estação em alta velocidade. O halutense estava
sendo perseguido por vários trombas vermelhas armados. Alguns estavam sentados em
veículos abertos e atiravam no gigante.
— Vamos para a abóbada — gritou Tronar.
Os dois mutantes saltaram ao mesmo tempo. Sabiam perfeitamente qual era o fluxo
de energia que tinham de usar para chegar ao interior do centro de distribuição.
Rakal teve azar. Materializou bem ao lado de um tromba vermelha, que estava
inclinado sobre uma máquina. Woolver tirou a arma energética, segurou-a pelo cano e
bateu violentamente no crânio do twonoser, que não desconfiava de nada. O ser
trombudo soltou um gemido e caiu ao chão. Tronar apareceu a dez metros do lugar em
que estava Rakal. Este fez um sinal de que estava tudo em ordem.
Os dois saíram correndo em direção aos reóstatos. Sete trombas vermelhas
apareceram na outra extremidade do corredor. Os twonosers soltaram gritos de alerta e
sacudiram as armas de cano curto.
— Não se atreverão a disparar um único tiro — gritou Tronar. — Se atingirem uma
peça importante, colocarão em risco o abastecimento de energia de todo o moby.
Sempre que possível, os dois mutantes protegiam-se atrás das máquinas. Ouviu-se
um ruído parecido com uma explosão, vindo do outro lado do edifício. Os imartenses
ouviram o ruído do vidro estilhaçado.
Os trombas vermelhas empenhados na perseguição pararam, indecisos. Acabaram
por dividir-se em dois grupos.
Quatro deles saíram correndo para descobrir a causa do barulho, enquanto os outros
ficaram perto dos mutantes.
Rakal e Tronar enfiaram-se entre algumas espulas gigantescas. Logo se viram à
frente dos reóstatos.
Ouviu-se uma voz retumbante, vinda do outro lado. Logo se seguiu a queda pesada
de um corpo.
— Tolot! — gritou Tronar. — O senhor nos ouve?
— Estou indo! — gritou o halutense.
Dali a mais alguns segundos sua figura enorme apareceu entre os reóstatos.
Foi quando apareceram os perseguidores. Os mutante dirigiram suas armas para as
gigantescas máquinas que irradiavam os fluxos de energia para todos os setores do moby.
Rakal Woolver ligou sua tradutora para o volume máximo.
— Saiam imediatamente deste edifício, senão destruímos as máquinas mais
importantes — gritou para os twonosers.
Os trombas vermelhas pararam e puseram-se a confabular.
— Quem são vocês? — perguntou o chefe. — Pertencem à casta B?
— Somos tripulantes da espaçonave que se encontra neste pavimento — respondeu
Rakal Woolver. — Saiam e digam aos seus chefes que devem suspender os combates
contra os trombas azuis. Fomos nós que paralisamos o fornecimento de energia no
pavimento médio. Não teremos a menor dúvida em fazer o mesmo neste pavimento, a
não ser que o centro de distribuição seja evacuado.
Os trombas vermelhas discutiram violentamente, mas acabaram por retirar-se.
— Mantenham a posição — disse Tronar Woolver, dirigindo-se aos outros. —
Tentarei entrar em contato com Perry Rhodan.
— Ande depressa — recomendou Tolot. — A coluna está presa perto da entrada
deste pavilhão. Os trombas vermelhas colocaram em posição um canhão energético com
o qual bloquearam o portão de entrada.
— Pois terão uma surpresa — disse Tronar e desmaterializou. Seu corpo voltou a
adquirir substância junto a uma coluna luminosa que ficava do lado de fora do edifício.
Pelo menos cem trombas vermelhas exaltados cercavam o centro. Tronar viu o lugar
em que Tolot tinha entrado no edifício. O halutense atravessara a muralha exterior com a
força de um projétil. Um buraco gigantesco, que tinha aproximadamente os contornos do
corpo de Tolot, provava que o mesmo tinha forçado a entrada.
Woolver deu outro salto antes que os trombas vermelhas notassem sua presença.
Usou os condutores que ligavam as diversas colunas luminosas. Não demorou a chegar
ao portão. O mesmo estava ocupado pelos trombas vermelhas, conforme informara Tolot.
Tronar contou pelo menos sessenta twonosers, que tinham colocado em posição uma
arma pesada. Devia ser o canhão energético a que Tolot se referira.
Woolver pôs-se a refletir. Havia uma coluna luminosa bem à frente do portão. O
mutante pegou a pistola energética. Introduziu-se no condutor subterrâneo de energia e
saltou. Conforme esperara, foi sair exatamente no portão. Não perdeu tempo. Levantou a
arma e fez pontaria para o canhão. Os twonosers o descobriram no momento exato em
que disparou o primeiro tiro. Alguns gritaram, enquanto outros pegaram as armas.
Woolver disparou vários tiros na direção do canhão e desapareceu, aproveitando o eco de
impulsos mais próximos.
Os twonosers cercaram a arma inutilizada e soltaram gritos de raiva e decepção. O
mutante reaparecera do outro lado do portão. Woolver certificou-se de que se encontrava
no interior de um pavilhão pequeno. À distância em que se encontrava as armas portáteis
dos trombas vermelhas não representavam nenhum perigo. Tronar viu três edifícios a
alguns quilômetros do lugar em que se encontrava. Havia uma estrada que ligava os
mesmos diretamente ao portão.
Enquanto Woolver fazia o reconhecimento da área, os criminosos domésticos e seus
aliados terranos foram saindo de depressões que ficavam atrás dos blocos de cristal.
— A passagem pelo portão ficou livre! — gritou Woolver. — Apressem-se.
Ouviu os gritos de triunfo dos homens. Os fugitivos apressaram o passo. Melbar
Kasom foi o primeiro a chegar perto do imartense. Havia um brilho arrojado em seus
olhos.
— Conseguiu pôr fora de ação esse maldito canhão? — perguntou.
— Naturalmente — respondeu Tronar. — Mas ainda restam sessenta trombas
vermelhas armados perto do portão.
Kasom soltou um grunhido de desprezo e continuou a correr. Rhodan chegou perto
de Woolver. O mutante apresentou um relato ligeiro dos acontecimentos que se tinham
verificado no centro de distribuição de energia.
Atlan apareceu. O arcônida estava com o rosto vermelho. Tronar viu o sargento
Kapitanski correr na direção do portão, juntamente com um grupo de criminosos
domésticos. Os nervos dos trombas vermelhas descontrolaram-se antes que fossem
disparados os primeiros tiros. O aspecto dos atacantes fizera com que entrassem em
pânico. Quando Melbar Kasom chegou ao portão, correndo na frente do grupo, só
encontrou um canhão energético consumido pelo calor.
9
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