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MENSAGENS DA
QUINTA DIMENSÃO

Autor
K. H. SCHEER

Tradução
AYRES CARLOS DE SOUZA

Digitalização e Revisão
ARLINDO_SAN
Enquanto Perry Rhodan com a Crest III, a nave-
capitânia da Frota Solar, se encontra a mais de cinqüenta
milênios distante do tempo real do ano 2.404, nas
proximidades da Terra, só conseguindo escapar, a muito custo,
de um novo golpe da parte dos senhores de Andrômeda, Mory
Rhodan-Abro, esposa do Administrador-Geral, tenta encontrar
uma possibilidade para o regresso dos que se encontram
retidos no passado.
A operação de Mory falhou, e a seguir os homens de
Reginald Bell entram novamente em ação. Um novo plano
para resgatar os que se encontram sumidos no tempo toma
forma. Astronautas e técnicos do Império Solar dão início à
“Operação Secreta Miosótis”, também chamada de “Não te
esqueças de mim”.
O transporte da Frota Dino-3 ilude o alçapão do tempo,
penetrando no passado para levar ajuda a Perry Rhodan.
Apesar dos homens da Dino-3 já não terem mais futuro
para si mesmos, cuidaram do futuro de Perry Rhodan e do seu
Império Solar, colocando memotransmissores em pontos
estrategicamente importantes.
Estes aparelhos transmitem as Mensagens da Quinta
Dimensão.

======= Personagens Principais: = = = = = = =


Perry Rhodan — Administrador-Geral do Império Solar da
Humanidade.

Atlan — Lorde-Almirante e Comandante da USO.

Gucky — O rato-castor recebe mensagens da Terra.

Don Redhorse — Chefe da l.a Esquadrilha de Corvetas da


Crest III.

Major Gerald Snigert — Envia socorro do passado.

Capitão Finch Eyseman — Descobridor de Dino-3.

Rakal e Tronar Woolver — Os “cavalgadores de ondas”


pousam numa “plataforma cósmica”.
Prólogo

No decorrer da política da intimidação terrana dirigida contra os senhores da


galáxia, ainda desconhecidos, e os povos tecnicamente situados numa escala elevada, os
respira-dores de metano-hidrogênio, os maahks, eclodiu uma crise política interna,
provocada por grupos do poder econômico do Império Solar.
A explosão dos distúrbios devia ser atribuída à longa ausência do Administrador-
Geral Perry Rhodan da esfera de interesses internos do Império.
Os rendimentos de impostos e das taxas aduaneiras do Império, de conformidade
com certos círculos, estavam sendo dilapidados de modo irresponsável, com os custos da
ocupação da Nebulosa Beta e do dispendioso reabastecimento e do destacamento de
forças pagas com soldos elevadíssimos.
Aproximadamente em princípios de agosto do ano da crise, 2.404, a força terrana
destacada para a nebulosa anã Andro-Beta era de cerca de quinze mil modernas
espaçonaves, cujo aprovisionamento rompia todos os limites até então permissíveis.
A Crest III, a nova nave-capitânia do Império, continuava no passado. (Nota: Veja
Alçapão do Tempo Vario, Centro de Andrômeda, ano 2.404 d.C.)
Através da utilização de alguns mutantes, cujos nomes não foram fornecidos, o
Administrador-Geral, que permanecia na Crest III, conseguira ultrapassar o muro do
tempo, informando aos responsáveis dos que haviam ficado no assim chamado “tempo-
real”, na esfera de Segunda Galáxia.
O Marechal-de-Estado Reginald Bell, depois disso, organizou uma operação de
salvamento, que entrou para a história da Frota Solar como “Operação Miosótis”
(também chamada “Não te esqueças de mim”).
Somente o Marechal-de-Estado e o comandante de Defesa Solar, Marechal Solar
Allan D. Mercant sabiam, nessa ocasião, que a presença de Rhodan na Terra e nos mais
importantes sistemas de colonização terrana, era mais necessária do que nunca. A crise
econômica tomava contornos cada vez mais ameaçadores.
A personalidade de Rhodan, que se tornara legendária no correr dos séculos, era
considerada como o centro de apoio da unidade da raça humana.
Para o historiador, faz-se presente a pergunta, se as grandiosas tentativas de
possibilitar o regresso de Rhodan do ano 49.988 a.C, para o tempo real, não teriam
surgido, em primeira linha, por considerações políticas dos atuais detentores do poder.
Diversos relatórios mostram claramente a incondicional dedicação de todos os homens da
Frota Solar a Perry Rhodan.
Considerando-se ambos os fatores, cálculos computadorizados efetuados
posteriormente assinalaram que, provavelmente, ambos os fatos, ou seja, as necessidades
políticas de Estado, bem como a amizade e a dedicação a Perry Rhodan, foram
normativos para a execução da operação em questão. Os distúrbios e a inquietação que
predominavam entre os povos da Via Láctea, dominados econômica e militarmente pela
Terra, proibiam a organização de uma nova frota de socorro, com força suficiente de
ataque, a favor da frota já na Nebulosa de Andrômeda. As esquadras de base, sob o
comando do General Koan-Hun (Veja Volume Especial, arquivo pessoal) além do mais,
tinham que ser providas de novas unidades saídas dos estaleiros, nas séries de naves de
grande porte, para substituir as perdidas em combates.
A capacidade de produção dos estaleiros estatais chegou, no outono de 2.404, ao
seu ponto alto, chamando a atenção pública, que suspeitava que o Império se preparava
para uma guerra galáctica.
Só mais tarde deu-se a conhecer que a construção máxima de unidades de grande
porte, dos chamados “Multitipos”, fora ordenada como uma necessidade militar, num
programa secreto de construção de naves para o aumento da Frota.
Vencer grandes distâncias entrara como principal objetivo desse programa. O
Marechal-de-Estado Reginald Bell estava interessado em evitar, junto com a chamada
defesa, uma eventual perda da cadeia de transportes e de transmissão a longa distância.
Isso exigia a construção urgente de naves grandes, com pelo menos três kalups-
conversores, nos seus mecanismos de propulsão.
Uma vez que os verdadeiros motivos foram mantidos em severo segredo, os
interessados na política financeira do Império tinham um farto material para suas
intermináveis discussões. A solução somente poderia ser encontrada por Perry Rhodan,
que certamente daria um fim aos problemas.
Em meados de julho de 2.404 começou, por estas razões, a “Missão Miosótis”
(também chamada “Não te esqueças de mim”). Um tender (transporte) da frota, da mais
nova construção chamado Dino-3, foi introduzido, através de uma manobra enganadora,
no transmissor de tempo Vario, e levado, por este caminho, ao passado.
Os relatórios do Comandante Gerald Snigert só foram fornecidos
fragmentariamente. Porém, sabe-se ao certo que Snigert, um oficial de frente muito
capaz, não encontrou, no lugar previamente indicado, a Crest III, que se achava no
passado.
Snigert, portanto, resolveu tomar medidas que testemunhavam a determinação e o
espírito de sacrifício e abnegação das tripulações terranas nas fronteiras da época de
expansão.
O transporte de abastecimentos Dino-3, equipado com três novos kalups
conversores recém-saídos da fábrica para o ultracouraçado Crest, foi conservado pelo
espaço de tempo de quinhentos anos.
Como foi possível ao comandante da Dino-3 encontrar a Crest, que avançara através
de um curto salto no tempo, para o relativo futuro, e informar à tripulação sobre os
acontecimentos, nessa época foi colocado sob a chancela “Secreto I”. Supõe-se que
diversos membros do Exército de Mutantes, o mais combativo grupo de paranormais do
Administrador-Geral, não podiam aparecer em público para um relato oficial.
Os historiadores, por esta razão, desistiram de concatenar os acontecimentos.
Entretanto, sabe-se ao certo que a tripulação do transporte Dino-3 nunca mais alcançou o
tempo real.
(Extrato da Enciclopédia Terrânia, Volume IV, Memória do Computador
Biopositrônico Nathan. Sinal para Out-put para microedição, informações de registros
positrônicos.)
1

O Tenente Ische Moghu, um afro-terrano com a considerável altura de dois metros,


voltou a cabeça ao ouvir o chiado do som atrás dele. Na tela de imagem, perto da
escotilha principal, apareceu um símbolo de patente militar.
“Quatro cometas prateados”, pensou Moghu.
Ele encolheu as pernas compridas, apertou o botão de sua poltrona anatômica, que o
colocou em posição sentada. Somente depois levantou-se.
Bocejando, lançando um olhar chateado para a sentinela constituída de três homens.
Moghu pegou seu capacete de rádio, colocando-o por cima dos seus cabelos
encarapinhados.
— Esses safados estão mesmo dormindo! — disse Moghu para si mesmo. Curvou-
se por cima de um cabo, que roncava de boca aberta, colocou as mãos em concha na boca
e berrou nos ouvidos do homem de barba por fazer: — O comandante está vindo.
Acordem, vamos, vamos!
O cabo levantou-se de um salto. Mal conseguindo manter-se de pé, bamboleando de
um lado para o outro, sono-lento, ele lutou para manter o equilíbrio, praguejando.
— Ora, ouça-me bem! — disse Moghu, sorrindo. — Isso é necessário? A disciplina
na nave-capitânia da Frota Solar ultimamente está deixando muito a desejar. Oh, os
outros cavalheiros também já acordaram. Posso servir-lhes o desjejum?
Moghu olhou aqueles três homens, de barba por fazer, com um olhar superior, e
falou:
— Eu jamais chegaria a pegar no sono enquanto estivesse de sentinela, diante da
escotilha principal no 1, apesar de saber que ela não tem muita importância.
— Pois o senhor também não me parece muito desperto — resmungou o cabo ainda
bastante chateado, enfiando o dedo mindinho no ouvido. — O senhor por acaso sabe, sir,
quem, contra o regulamento, berrou bem dentro do meu ouvido direito?
O Tenente Moghu olhou a tela de controles. O símbolo do cometa tornou-se maior.
Sinal de que o computador de controle automático registrava que o comandante,
entrementes, chegara à sua ronda na central de controles.
— Não, não tenho a menor idéia. Talvez um mamute histórico sentou-se em cima
dele.
— Pois olhe, o senhor já fez piadas bem melhores — respondeu o cabo, sempre
chateado. — Com todos os diabos, o que é que o velho está querendo a esta hora na sala
de comando? Aqui, reconhecidamente, só há soldadinhos de sentinela, eternamente
oprimidos, sempre prontos para atender às ordens dos portadores de cometas, e tratar de
seu bem-estar constante. Será que algum maluco foi acordá-lo?
— Impossível — retrucou Moghu. — Um comandante que tiraram do seu sono, à
força, é algo assim como uma catástrofe natural. Especialmente quando se trata de um
epsalense adaptado ao meio ambiente. Talvez o senhor vá colocar-se imediatamente no
seu posto...
Quando a escotilha de quase um metro de grossura abriu-se, e um homem de 1,60
de altura — mas com a mesma largura — entrou com certa dificuldade, os quatro
membros da tripulação da Crest III estavam, em posição de sentido, à direita e à esquerda
do computador calculador, que limitava o corredor. Mais atrás, no centro da sala de
comando, ninguém notara que o Coronel Cart Rudo aparecera. Eram cinco horas da
manhã, hora de bordo.
Ische Moghu fez continência, colocando a mão na borda do seu capacete.
O cabo, já com a sua raiva um tanto desgastada, pensou mais uma vez que o
comandante se parecia muito com um gigante quebrado ao meio.
Cart Rudo sorria, um sorriso largo. Ficou parado, enfiou ambas as mãos nas
cadeiras e ergueu os olhos para Moghu.
— Ficou maluco? — quis saber ele com a sua voz de trovão. — Para que essa
besteira?
Moghu ficou sem saber o que dizer. Era terrível ouvir um comandante de nave-
capitânia falar desse modo.
— Continência, de acordo com os regulamentos, sir — disse Moghu, baixando a
voz.
— Poupe as suas forças. Tudo está em ordem por aqui?
Moghu finalmente decidiu assumir a posição de “Descansar”. Com Cart Rudo
nunca se sabia o que ele esperava dos seus homens.
— Tudo em ordem, sir: O computador Um-WO consegue manter a Crest
maravilhosamente em ordem.
Rudo sorriu e voltou-se para sair. Moghu olhou atrás dele, pensando na
responsabilidade que pesava nos ombros deste homem.
— Cuidado! — advertiu o cabo, inquieto. — Pelo grande Urano — parece que hoje
todos os figurões resolveram aparecer por aqui bem cedo. Cometas dourados, uma nova e
agora, ainda por cima, um símbolo da USO. Sir, logo, logo vai acontecer alguma coisa.
Perry Rhodan, Administrador-Geral do Império Solar, e chefe responsável pela
expedição, apareceu na eclusa. Moghu desistiu de uma nova continência.
Rhodan fez-lhe um gesto distraído, e dirigiu-se rapidamente para o centro da sala de
comando.
Depois dele, apareceu o Comandante-Geral da USO, Lorde-Almirante Atlan. Os
longos cabelos brancos do ex-imperador dos arcônidas saíam de dentro do seu boné de
bordo, cobrindo-lhe toda a nuca.
Atlan reteve os passos, curvou-se para a frente e olhou Moghu no rosto.
— Se não estou muito enganado, o senhor está quase estourando de curiosidade.
São cinco da manhã, não é verdade?
O Tenente Moghu anuiu.
— Dirijam-se aos seus postos de manobras. A KC-1, sob as ordens do Major
Redhorse, está entrando. Depressa!
E então Ische Moghu ficou sabendo por que todos aqueles responsáveis haviam
aparecido tão cedo, pela manhã. A confirmação do rastreamento, evidentemente, não
passara pelos canais ordinários, e fora passada diretamente para a cabine de Rhodan, caso
contrário Moghu teria ouvido falar do assunto.
Atlan sumiu na imensidão redonda da central de comando. Mais adiante ouviram-se
ordens, dadas em voz alta.
— Eu não lhe disse, sir? — observou o cabo. E passou a mão pelo queixo de barba
por fazer. Chegou a ranger.
— O senhor devia ser profeta, — observou o tenente. — Cuidado, deixe passar o
tanque vivente.
O cabo saltou para o lado. O Coronel Melbar Kasom, especialista da USO e
subordinado direto de Atlan, entrou. Cumprimentou os terranos com um gesto da cabeça,
bocejou com considerável emissão de ruído, e encostou-se na soleira da eclusa. Kasom
tinha dois metros e meio de altura, e pesava 16,3 quintais. Sua voz mais parecia o
ribombar do trovão.
— Vocês, seus heróis, estão mais parecendo homens das cavernas da Terra. Não há
mais creme para extirpar a barba por aqui?
— Nosso chefe de intendência, o Major Bernard, começou há três dias atrás com
suas medidas de racionalização — sorriu Moghu. — Caso tivermos que ficar até o fim de
nossas vidas no passado, pelo menos teremos oportunidade de aparecermos barbeados em
ocasiões importantes.
Kasom franziu a testa. O seu cabelo cor de areia pareceu ficar de pé.
— Vamos esperar pelas notícias que Redhorse deve trazer. Eu não quero mais me
chamar Kasom, se o setor em torno do hexágono solar galáctico continuar sendo
bloqueado pela frota lemurense. Afinal de contas, nós demos um salto de quinhentos anos
no futuro relativo. Tudo somente para escapar ao perigo lemurense.
Kasom seguiu adiante. Moghu olhou atrás dele, sem dizer nada. Nem se mexeu
quando o cabo observou ironicamente:
— Esta foi uma pílula tranqüilizante psicológica, amigos. Todos nós sabemos muito
bem por que o chefe passou pelo transmissor de tempo intermediário. Posso considerar-
me dispensado com meus homens, sir?
— Pode — confirmou Moghu, distraído. — Dirijam-se aos seus postos de
manobras. Aliás, cabo, gostaria que guardasse suas teorias só para si mesmo.
Os três homens se afastaram. Segundos mais tarde, as sirenes de alerta tocaram
através de toda a nave. Cart Rudo apareceu nas telas de comunicação de bordo.
— Alerta de manobra. Tudo pronto para pouso da KC-1. Sala de máquinas —
ligação de macroenergia para lançamento do raio de tração. Desligo.
As confirmações dos técnicos responsáveis vieram a seguir. Ische Moghu já não
lhes dava mais atenção. Pensava apenas no Major Don Redhorse. Esse homem de quem,
diziam, que tinha feito um pacto com o diabo.
Redhorse deixara a nave-capitânia com três corvetas de sessenta metros, há
quatorze dias — tempo de bordo — para verificar a situação existente no centro da
galáxia. Entrementes, a Crest III ficara esperando, sob proteção de rastreamento, numa
órbita solar.
Caso a situação militar perto do transmissor hexagonal galáctico estivesse como
Rhodan e Atlan esperavam, nada mais estaria no caminho para o regresso do
ultracouraçado para a Nebulosa de Andrômeda.
Dificuldades técnicas com as instalações de controle de Kahalo, o planeta de
ajustagem do transmissor do tempo, seriam dominadas, ao que se julgava. Decisivo para
o destino de cinco mil homens era a questão de saber-se o que tinha acontecido com a
frota de vigilância lemurense sobre Kahalo, nestes quinhentos anos passados. Existia a
possibilidade teórica de que os antigos lemurenses, em sua fuga para a Nebulosa de
Andrômeda, terem deixado para trás inúmeras naves robotizadas, com a tarefa de
defender Kahalo contra todos os estranhos.
Como entretanto Kahalo havia sido encontrado incólume no tempo real, a suposição
de encontrar-se o planeta de ajustagem destruído no passado, não parecia repousar em
bases sólidas.
Icho Tolot, o cientista halutense, não pudera responder a questão, baseado
unicamente na estratégia da época de seus antepassados.
A Crest III havia sido catapultada para o ano 49.988 a.C., através do alçapão do
tempo Vario. A humanidade de então, os lemurenses, tiveram que ceder à pressão
constante das ofensivas halutenses, conseguindo efetuar sua retirada para a Nebulosa de
Andrômeda com a ajuda do transmissor solar, que acabara de ser construído.
No decorrer dessa gigantesca migração, da qual também participaram, mesmo
contra sua vontade, inúmeros povos coloniais da Terra, as coisas haviam chegado a um
ponto que, finalmente, haviam levado Rhodan a decidir abandonar esta época perigosa.
A possibilidade de um salto para o assim chamado futuro-relativo, oferecera-se,
através da utilização de um pequeno transmissor de tempo-intermediário de Vega VI. Os
agentes do tempo ali estacionados pelos senhores da galáxia foram vencidos, e as
instalações para a manobra estratégica da Crest haviam sido utilizadas.
Após uma incursão até a Terra primitiva fora possível verificar que a transposição
de tempo por quinhentos anos no futuro relativo tivera êxito. Portanto, a nave agora
encontrava-se no ano 49.488 a.C.
O continente principal da Terra de então, a Lemúria, já havia submergido no
Oceano Pacífico. O anel de gás provocado pela explosão do planeta Zeut enfraqueceu a
luz solar de tal modo que na Terra iniciara-se o último Período Glaciário.
E novamente haviam chegado a um confronto com um comando especial dos
senhores da galáxia.
Toser-Ban, o misterioso comandante desse grupo de captura, fora morto por Atlan
na ocasião. Desde então, a Crest movimentava-se num vôo sem destino através da
galáxia.
Sempre fazendo o possível para desviar-se das flotilhas halutenses que surgiam por
toda parte, e tratando de encontrar a possibilidade de utilizar o transmissor hexagonal
como meio de transporte.
Da frota lemurense, que em outros tempos dominara a Via Láctea, não se via mais
nada. Os supergigantes de Halut haviam começado a sua marcha da vitória. Inúmeros
dados colhidos em investigações demonstravam que os halutenses agora estavam mais
interessados em transformar suas vitórias militares em sucessos econômicos.
O comandante das rápidas naves auxiliares da Crest conseguira fazer uma
descoberta que deveria ser de valor inestimável aos historiadores do tempo real, contanto
que Rhodan conseguisse, algum dia, regressar a este tempo.
A humanidade antiga, vivendo no seu planeta de origem, a Lemúria — a Terra de
então — fora o poder dominante da galáxia. Até mesmo os gigantes halutenses, com sua
química corporal metabólica, tinham precisado de noventa anos, aproximadamente, para
obrigar os lemurenses a uma fuga.
Entretanto, uma vitória total sobre a humanidade antiga nunca fora alcançada. Isto,
agora, ficara patente inequivocamente.
Os colonos descendentes da humanidade lemurense, nem todos haviam tipo a
possibilidade de abandonar a galáxia natal. As corvetas da Crest haviam encontrado,
sozinhas, vinte e oito planetas semelhantes à Terra, cujos povos tinham sido poupados
pela guerra. Nestes mundos tratava-se, na maioria dos casos, de corpos celestes situados
em pontos muito afastados, que haviam passado despercebidos, tanto pelos planejadores
dos movimentos de fuga lemurenses como também pelo almirantado das forças
halutenses.
Um destes planetas era Esfinge, no Sistema Azul. Ali os representantes da
humanidade haviam conseguido manter-se escondidos, através de inteligentes
estratagemas, de modo que não houve um só ataque ao enorme sistema.
Fora possível manter em funcionamento as valiosas instalações industriais,
ampliando-as, inclusive, com o uso de forças especializadas. O Grão-Mestre Conselheiro
de então, do Sistema Azul, fora suficientemente decidido para não deixar-se levar às
pressões gerais para a fuga, confiando em sua sorte e na sua habilidade.
O grande plano de preservar uma parte da humanidade dos comandos de
escravização dos halutenses tivera êxito. Destes seres humanos, que não haviam
esquecido nada dos conhecimentos herdados de seus antepassados lemurenses, haviam
saído os arcônidas do tempo real.
Silenciosamente e sempre em guarda contra os halutenses, eles haviam construído o
seu novo império, com o tempo esquecendo suas origens e formando uma cultura
autárquica.
Dos acônidas, cerca de trinta mil anos mais tarde, ou seja, por volta do ano 20.000
a.C, saíra a ramificação dos arcônidas, que se declararam uma nova autarquia, indo
fundar o Império Arcônida na distante constelação formada pelo aglomerado estelar M-
13.
Deste povo descendia Atlan. Aliás, só agora ele ficara sabendo que era descendente
dos lemurenses. Ele era humano!
Outros povos colonizados tinham imitado o esconde-esconde dos acônidas com
mais ou menos sucesso. Nestes planetas, entretanto, em todos os casos, houve um passo
atrás do que se referia à técnica e à ciência.
Através de resultados de sondagens, Rhodan agora teve a possibilidade de ter uma
imagem bastante exata sobre a evolução da humanidade e todos os muitos povos que
haviam sido descobertos no tempo real.
A linha condutora biológica fora tão inequívoca, que os cientistas do Império Solar,
durante séculos perguntavam-se por que quase todos os povos eram parecidos com os
seres humanos.
Esta pergunta agora fora solucionada, respondida.
Para Rhodan, entretanto, neste momento, este conhecimento não tinha maior
significação. Se ele não conseguisse levar a Crest de volta à Nebulosa de Andrômeda, e
ali utilizar o alçapão do tempo Vario para um transporte ao tempo real, a humanidade do
ano 2.404 d.C. jamais ficaria sabendo o que acontecera há mais de cinqüenta mil anos
atrás na galáxia.
Todos continuariam se perguntando por que acônidas, arcônidas, saltadores, aras,
ekônidas, e até mesmo os antis, tinham traços de parentesco tão característicos. Os dois
cavalgadores de ondas, Rakal e Tronar Woolver, que haviam conseguido atravessar a
muralha do tempo certa vez, não haviam podido fazer um relatório mais cuidadoso. As
necessidades militares haviam tido precedência.
2

A KC-1, nave-capitania da Primeira Esquadra de Corvetas a bordo do


ultracouraçado Crest III, mal entrara na eclusa do hangar quando Don Redhorse já
aparecia na escotilha.
O rosto daquele homem magro parecia cansado. Fez uma saudação rápida e
esforçou-se visivelmente para mostrar ao pessoal da eclusa uma fisionomia confiante.
Mas só o conseguiu pela metade.
Redhorse empurrou para trás o capacete do seu traje espacial leve, pôs a pasta de
plástico que trazia na mão debaixo do braço, e afastou-se rapidamente em direção às
portas internas da imensa eclusa.
— Ele mal espera pela descompressão — disse um dos técnicos ao oficial de
controle do hangar I — Mau sinal, sir. Ou o senhor já viu alguma vez o índio nervoso?
— Dificilmente. De qualquer modo, ele já estava desembarcando antes mesmo de
poder respirar livremente. Homens que trazem más notícias nunca têm tanta pressa. Isso
serve de argumento?
— Hum...!
Don Redhorse ignorou os olhares inquiridores dos homens. Procurou contar uma
piada, e deixou que o ajudassem a tirar o traje espacial, procurando com os olhos,
enquanto o faziam, pelo oficial que ele esperava ver.
E o encontrou! O alto chefe da USO já estava diante da eclusa do elevador
antigravitacional. O rosto de Atlan ainda estava mais inexpressivo que o do chefe da
flotilha.
Don encaminhou-se até ele, fez uma rápida continência, depois apertou a mão
direita que lhe fora estendida.
— Bem-vindo, Cavalo Vermelho! Os seus irmãos brancos o esperam — disse Atlan
de bom humor. — Fez boa viagem?
— Quase boa demais, sir.
— Formações halutenses?
— Aqui e ali um rastreamento. Naves isoladas, nada de formações ou esquadrilhas.
Esses cavalheiros parecem que não esperam mais pelo surgimento de unidades terranas,
ou melhor dizendo, lemurenses Nosso salto no tempo para quinhentos anos ao futuro
relativo, neste particular, valeu a pena. Com cuidado necessário pode-se estar
relativamente seguro nos setores da orla da Via Láctea.
O sorriso de Redhorse parecia falso. Atlan apertou os olhos, lançando um olhar aos
homens da tripulação da eclusa, que os escutavam atentamente.
— E esta foi a razão da manobra. Está bem, vamos logo subir. Onde é que se
encontram as suas outras unidades de reconhecimento?
— Nosinsky e Kagato se distanciaram de mim, de acordo com as ordens. Eles
estarão na órbita de espera em espaços de seis horas cada um. Achei que seria muito
arriscado virmos diretamente para a Crest, numa formação conjunta de três naves.
— Naturalmente. Muito inteligente. Venha, vamos subir.
Atlan deu um passo para o lado. Redhorse entrou no campo antigravitacional do
elevador e, com cuidado, deu um empurrão para subir. Lentamente pairou para o alto. Os
hangares da Primeira Flotilha ficavam abaixo do convés do meio e da protuberância
equatorial de propulsão da nave.
Atlan dera um empurrão um pouco mais forte para subir. Alcançou Don, agarrou-o
pelo braço e parou o movimento para cima, segurando-se num dos ganchos de segurança
embutidos.
Ambos os homens ficaram pairando, libertos da gravidade, no poço do elevador.
Estavam sozinhos. Aqui também não existia qualquer aparelhagem de videofonia.
A expressão no rosto de Atlan se modificara.
— Pode parar com a sua representação, cheiene! É claro que encontrou-se
constantemente com formações halutenses, ou não?
Redhorse deu uma risada nervosa.
— Formações? Se tivesse falado em frotas, sir, teria acertado na mosca. A galáxia
está cheia de unidades halutenses. Fui rastreado pelo menos umas cinqüenta vezes. Em
quatro vezes, somente uma rápida manobra de fuga para o espaço linear me saltou. Mas
mesmo ali eu não tinha muita certeza de não ter alguém nos meus calcanhares.
— E conseguiu penetrar até o centro galáctico assim mesmo?
— Esta era minha missão, sir. Consegui cumpri-la. Porém, somente depois de ter
me decidido a não dar mais pelotas para os rastreamentos. Não havia outra possibilidade.
Sem ser visto, ninguém consegue penetrar no setor de Kahalo.
Atlan fechou os olhos e respirou fundo. Finalmente declarou, em voz abafada:
— Não precisa dizer-me mais nada, Don Kahalo, e provavelmente também o
hexágono solar, estão sendo bloqueados totalmente por frotas halutenses, não é isso?
— Sim, sir. Eu jamais tomaria a liberdade de censurá-lo devido à transposição do
tempo...
— Mas...
Redhorse pigarreou.
— ...mas nós devíamos ter levado em conta que os halutenses certamente acabariam
por assumir o papel dos lemurenses.
— Correto. E com isso nós realmente calculamos. Naturalmente nunca nessa
proporção! Existe uma diferença entre um povo que procura, por todos os meios, garantir
sua única possibilidade de fuga, e o vencedor deste povo tentar, em seguida, vigiar esta
possibilidade de fuga. Vigilância não é a mesma coisa que um bloqueio total com a
utilização de todos os meios disponíveis.
— Sir, este é um bloqueio mais forte do que qualquer um que a frota lemurense de
Kahalo jamais tentou. Dê uma olhada nos meus diagramas de rastreamento e nas telefotos
que fiz. Poderei mostrar-lhe pelo menos vinte mil imagens-reflexos e cerca de cinco mil
fotos coloridas em terceira dimensão de minha missão astronômica. Muitos halutenses.
Entre eles, ultracouraçados do porte de nossa classe Império. Halut parece conhecer
muito bem o quanto o transmissor de tempo é importante.
Os músculos rijos do rosto de Atlan se distenderam. Por um instante, Redhorse
pensou ter visto um reflexo de desespero nos olhos vermelho-dourados do arcônida. E
logo aquilo passou. O ex-imperador do grande Império Arcônida já se controlara
novamente.
Ele apontou para cima. Novamente deram um impulso, e acabaram chegando ao
convés principal.
Perry Rhodan e Melbar Kasom estavam, de pé, diante da saída do elevador. Além
deles, não havia mais ninguém, a não ser dois robôs da vigilância.
— Isso demorou um bocado — disse Rhodan. Os seus olhos se fixaram em Atlan.
— Os arcônidas, ao que parece, não conseguem deixar de fazer perguntas apressadas.
Don — o senhor teve êxito? Sim ou não?
— Não, sir. Kahalo está sendo bloqueado por pelo menos vinte mil naves
halutenses.
Rhodan virou-se em silêncio e foi embora. Os seus ombros pareciam um pouco
curvados para a frente.
Depois que ele desaparecera, Kasom disse, com um gesto de mão, desencorajador:
— Acabou-se. Nós somos e vamos continuar prisioneiros do tempo. Acho que
devíamos procurar para nós um planeta no qual, pelo menos, pudéssemos respirar ar
natural e beber água fresca e limpa.
— Eu devia imaginar que os seus instintos animais sobrepujariam os de sua mente!
— gritou-lhe Atlan. — Com água e ar certamente está querendo dizer filé de alcatra ou
costelinhas de porco, é ou não é?
Kasom sorriu.
— Caso por lá existirem animais desse tipo — não teria nada contra!
Atlan fez um gesto depreciativo e encaminhou-se para a esteira rolante.
— O senhor está fazendo cálculos errados, especialista Kasom. Nós não vamos
procurar nenhum planeta para descansarmos. Eu tenho mais de dez mil anos de idade, em
termos de cálculo de tempo terrano. E até agora eu sempre encontrei uma saída de
situações que pareciam confusas, pois, caso contrário, já não estaria mais vivo, apesar do
meu ativador celular. Don, projete os seus filmes e diagramas. Kasom, onde está Icho
Tolot?
— Na sala de computação, centro de cálculos, sir. Onde mais ele poderia estar?
— Se procurarem por mim, eu também estarei lá. Passe-me os seus dados, Don. O
senhor é esperado na Sala de Conferências III.
— O senhor não quer...
— Bobagem. O que vou fazer lá? Ficar ouvindo teorias horas a fio? Seus dados me
são suficientes. Não se esqueça da transmissão direta. E muito obrigado, Don. Mais uma
vez arriscou a sua pele. Posso imaginar o quanto é difícil esgueirar-se através de frotas
halutenses, para poder ver aquilo que se deseja ver.
O cheiene sorriu.
Atlan saltou para cima da esteira rolante, alcançando, mais atrás, a entrada para o
elevador G-14, descendo pelo mesmo para a central de computação. A mesma ficava
embaixo da sala de comando esférica, na parte mais abrigada da gigantesca nave de dois
quilômetros e meio de diâmetro.
Icho Tolot, o halutense de quatro braços do tempo real, estava de pé, mais
parecendo uma rocha, diante do supercomputador positrônico da Crest
Quando Atlan entrou, o gigante de três metros e meio de altura e dois e meio metros
de largura virou a cabeça. Atlan olhou para aqueles três olhos vermelhos brilhantes de um
ser vivente cujos antepassados haviam devastado a galáxia, escravizando um número
desconhecido de povos pelo menos durante trinta mil anos.
Tolot ergueu o seu braço direito de manejo.
— Bem-vindo, amigo — saudou ele ao arcônida. A sua voz profunda trovejava
como um rufar de tambores. — Don Redhorse está de volta, não é mesmo?
Atlan anuiu, sem dizer uma palavra. Ao encontrar-se diante do halutense, mais
parecia um anão. Icho Tolot era a prova vivente do poder imenso que os seus pais haviam
representado. Halutenses atacantes, através de um espessamento do tecido celular,
transformavam-se em máquinas de guerra, as quais só era possível repelir com o uso de
armas energéticas de grosso calibre. Até mesmo robôs de grande potencial defensivo
acabavam falhando.
Atlan, já mais de uma vez, vira Tolot entrar em ação. Para aquele gigante
metabolicamente dotado era uma brincadeira derrubar grossos muros com a sua massa
física, de estrutura condensada, como se fosse uma bala de canhão. Sua força física era
ilimitada, do ponto de vista dos terranos.
O halutense esperou pacientemente. Durante este tempo o seu cérebro planificador
assimilava e digeria novos dados. O seu cérebro comum dirigia exclusivamente as
funções corporais.
Atlan continuava em silêncio. Tolot estava sozinho no grande pavilhão. Ninguém
podia ouvi-los.
— Os senhores terão um caminho difícil a trilhar — disse o halutense o mais baixo
que pôde. — Eu não tenho informações muito precisas sobre a estratégia de meus
antepassados.
— Infelizmente.
— Não me censure nada, Atlan.
— Tolices. Como pode pensar nisso?
— É que me parece que, ultimamente, toda a simpatia que me era dispensada está
sendo, lentamente, diminuída. Aqui e ali já tenho visto olhares amedrontados. Isso me
dói. Meus meninos não conseguem perdoar o fato de eu descender de um povo com
inclinações para a violência.
Atlan fez um esforço para sorrir. Ele conhecia os complexos maternais daquele ser
vivente gigantesco. Os seres humanos eram o hobby de Tolot. E ao mesmo tempo seus
“filhos”, cujos esforços expansionistas ele perseguira entusiasmadamente.
— Engana-se, amigo — afirmou Atlan. — Ninguém o censura. Qualquer povo
precisa de determinado tempo para amadurecer, até tornar-se tolerante e compreensivo.
Gostaria de lembrá-lo da história terrana. Ainda não faz nem quinhentos anos quando, na
Terra, homens eram perseguidos, humilhados e até assassinados, unicamente devido à sua
crença, à cor de sua pele ou à sua raça. Esta época só foi superada com muito empenho.
Os historiadores do ano 2.404 concluíram que estes crimes nojentos, em primeira linha,
eram provocados pelo medo que se tinha dos outros. Eu, de minha parte, questiono esta
moderna definição desses atos reprováveis.
— O senhor vivenciou estes tempos pessoalmente. Portanto, deve saber do que está
falando.
— Naquela época ninguém sabia nada ao certo. Nem eu. Hoje, vendo estas coisas
de um outro ponto de vista, eu acho que posso afirmar que estes acontecimentos nada
mais eram que as dores de parto do povo terrano. Se eu olhar a sua história, Tolot, a
mesma mostra-me paralelos. Somente com a diferença de que os seus antepassados
tinham mais poder e ciência técnica. O senhor simpatiza com o Major Don Redhorse?
O halutense girou a parte superior do seu corpo maciço, e olhou para baixo, para o
arcônida.
— O senhor está querendo dar-me uma lição. Concordo. Fale, por favor. Sim, eu
gosto de Don Redhorse.
— Eu também. Todo mundo gosta dele e o admira. Ele é um índio terrano. Existem
pelo menos uns duzentos homens a bordo da Crest, cujos antepassados penetraram nas
terras e nas vidas dos cheienes, como colonos brancos, combatendo-os sem dó nem
piedade. Eu vivenciei tudo isso. Apesar disso, Don Redhorse jamais se lembraria de
censurar Rhodan ou qualquer outro homem branco pelas atrocidades cometidas contra o
seu povo, e que constam da história. Perry o olharia muito espantado, se lhe lembrasse
que os antepassados de Don talvez tivessem sentido ódio de um homem da família de
Rhodan. Isso já passou. Halutenses! O senhor sabe, naturalmente, porque eu escolhi este
exemplo. Não quero que desperdice seus pensamentos, achando que qualquer um de nós
possa censurá-lo por sua origem. E tenho certeza que ninguém o olhou com desconfiança.
— Eu ficaria muito feliz se estivesse enganado.
— O senhor enganou-se. É provável que o tenham olhado de modo crítico,
inquiridor. Não devido aos atos do seu povo, mas apenas devido à sua figura hercúlea. Eu
conheço os homens da Crest. Eles devem estar se perguntando como foi possível que
Halut tenha conquistado tantos sucessos. O senhor é olhado por técnicos altamente
qualificados e cientistas. Eu acho que não conheço um só terrano que não procure a razão
de certas coisas. Isto faz parte da mentalidade dos homens da Terra. Afinal de contas, o
senhor já devia conhecer melhor estes pequenos selvagens, homens das cavernas. Onde é
que ficou a sua risada de que eu tanto gosto?
O halutense, fisicamente — mas também só fisicamente — um monstro, abriu a sua
boca, de goela enorme, e riu, como apenas um supergigante como ele era capaz de fazê-
lo.
Atlan suportou aquele furacão de ruídos, com uma expressão de dor, colocando as
mãos espalmadas nas orelhas, e começando imediatamente, sem perder mais tempo com
palavras, com a programação dos dados básicos recebidos.
Tolot atravessou pesadamente o recinto, apanhou os seus cálculos já aferidos, e um
minuto mais tarde dois seres inteligentes da galáxia estavam calculando como seria
possível salvar cinco mil terranos.
Eles ainda estavam discutindo e calculando quando, quatro horas mais tarde, o
videofone tocou. O rosto de Rhodan apareceu na tela de imagem. O Administrador-Geral
do Império Solar saudou-os com um gesto de mão.
— Como é? Estes gênios da matemática não têm fome? — quis saber ele. — Além
disso, eu gostaria que viessem, por um instante, à sala de conferências III. Cabeças
inteligentes são para serem usadas.
Atlan tocou em Tolot e apontou para a tela de imagem.
— Vamos fazer-lhe o favor? Aliás, eu suspeito que ele esteja apenas interessado no
meu estoque de comida da USO, ciosamente armazenado por mim.
— Podemos falar sobre isso — retrucou Perry. O seu olhar cansado animou-se um
pouco. — Então, daqui a cinco minutos, se os cavalheiros estiverem de acordo.
Ele fez mais um gesto e a tela apagou-se.
Tolot ficou olhando longamente a tela sem imagem.
— Humor macabro — Atlan leu os pensamentos do halutense. — Este homem não
se deixa abater por nada, exceto por si mesmo.
— É o que também acho. O senhor poderá dar uma ajuda moral a Perry. Ele
naturalmente já sabe, há muito tempo, que um regresso à Nebulosa de Andrômeda é
impossível.
— Vamos esperar — declarou Atlan. — Pelo mundo de cristal do Império
Arcônida! Um terrano não se dá por vencido, enquanto não está com a cabeça debaixo do
braço. Ao que me parece, os halutenses, os seus antepassados, depois da conquista da
galáxia, somente se retiraram para o exílio porque não mais conseguiam superar as
grandes tarefas. Ou estou enganado?
— Certamente. O abandono da política da força foi condicionado por um princípio
de cansaço. Seres viventes de minha descendência amam as mudanças, mas sobretudo a
aventura. E com povos vencidos é impossível ter-se aventuras. Revoltas, que certamente
aconteceram freqüentemente, não ofereciam, de modo algum, o estímulo encontrado na
derrubada da grande potência lemurense com suas imensas conquistas. Isto, arcônida, só
isto era capaz de estimular meus antepassados a uma luta sem tréguas. Eu quase diria
que, naquela época, nós não tínhamos intenções legítimas de destruir o inimigo.
Encontramos um adversário que nos provocava psiquicamente. Talvez tenha sido uma lei
da natureza. E agora, vamos?
Atlan entendeu o que o halutense quis dizer com isso. Era necessário conhecer-se o
seu povo para poder compreender sua definição.
***
O Major Dr. Bert Hefrich, engenheiro-chefe da Crest III, lecionava, impassível.
Ficou claro que a Crest III, em nenhuma circunstância, poderia voar os 1,45 milhões
de anos-luz de distância que a separava da Nebulosa de Andrômeda, com suas próprias
forças.
Os três conversores de compensação Kalup, que eram indispensáveis para o vôo
ultraluz, ao serem instalados no ultracouraçado, tinham uma potência de 1,2 milhões de
anos-luz.
Entrementes, o kalup-I havia sido requisitado constantemente. Os números II e III
ainda possuíam sua inteira capacidade de ação de 400.000 anos-luz por unidade. O
alcance ainda restante total, foi calculado por Hefrich em cerca de 960.000 anos-luz. Este
valor, normalmente, era insuficiente para uma viagem através do espaço cósmico vazio
entre as galáxias.
Hefrich explicou:
— A teoria de se recondicionar os conversores usados após toda manobra linear,
com meios encontrados a bordo, continuará sendo apenas uma teoria. Ela jamais foi
aventada pelo pessoal técnico da nave-capitânia.
Hefrich lançou um olhar de desafio ao físico-chefe, o Dr. Spencer Holfing, que,
excepcionalmente, manteve-se calmo. Nem mesmo um sujeito colérico como ele poderia
ignorar a situação.
O engenheiro-chefe continuou:
— A capacidade de carga útil de um ultragigante da classe Galáxia corresponde ao
volume de carga de um cargueiro de trezentos metros da frota de reabastecimento. Ultra-
couraçados são naves construídas para um poder ofensivo e defensivo máximo, inclusive
com um alcance muito grande e independência de espaçoportos planetários. O volume de
carta disponível, que é limitado pelas instalações de máquinas em grande parte, restando
um mínimo, sendo usado para a estocagem de provisões em quase noventa por cento, não
pode ser usado para depósito de peças e acessórios suficientes para os grandes
conversores kalup. As peças e acessórios em depósito limitam-se, em primeira linha, em
elementos de hipercontrole, que não demandam muito espaço, e que, de acordo com a
experiência obtida, costumam sofrer colapsos. O recondicionamento geral de um
aparelho de trezentos e dez metros de altura e cento de vinte metros de diâmetro somente
é possível com os meios existentes num estaleiro de grande porte e muito bem suprido.
Em caso de necessidade, uma nave-oficina seria o suficiente. O caminho mais sensato,
para renovar as unidades de vôo ultraluz, é um procedimento de troca, de acordo com o
plano AZTAC. Para isto nós possuímos instalações que roubam espaço. Se nós partirmos
hoje, com o que nos resta em conversores, sir, acabaremos imobilizados a cerca de
quinhentos mil anos-luz dos limites exteriores da Nebulosa de Andrômeda.
— Vôo de dilatação? — interveio o Dr. Holfing, calmamente.
Rhodan fez um gesto defensivo. Ele sentia-se interpelado indiretamente.
— O que me interessa é chegar à humanidade do ano 2.404. Uma abreviação de
tempo relativamente ligado para a Crest, através de um vôo de dilatação abaixo do muro
do tempo, faria com que nós, numa viagem relativa de pelo menos quinhentos mil anos
de tempo terrano relativamente ligado, acabaríamos envelhecendo apenas alguns poucos
anos. Entretanto, ao chegarmos lá, não encontraríamos mais nenhum Império Solar, e,
provavelmente, nenhuma humanidade. Experiências desse tipo não têm minha aprovação.
Holfing baixou os olhos. Resignou-se.
— Foi apenas uma sugestão. Naturalmente o senhor tem razão. Hefrich — o senhor
e os seus destacados engenheiros realmente não se acham capacitados para efetuar um
recondicionamento nos kalups, pelo menos para que eles sejam capazes de continuar
funcionando nos quinhentos mil anos-luz restantes?
— Isso é impossível. Com quê? Como se tratasse de turbinas energéticas de
impulsão, não haveria qualquer dificuldade especial. Nos macroconversores kalup, ainda
que estejam numa apresentação compacta de construção, não existem elementos
combustíveis fundidos nem tubeiras de injeção entupidas que possam ser substituídos.
Um kalup é uma unidade maciça, interligada sem juntas, a qual — expressado de modo
simples — ou funciona ou não funciona. Normalmente, exceto no que toca às alavancas
de regulagem, não há qualquer coisa que deixe de funcionar. E nós estamos atentos a
isso. Quando o aparelho, entretanto, está gasto hiperfisicamente, e os campos de
compensação começam a tremular, a única coisa que se pode fazer é um
recondicionamento geral ou a troca por outro aparelho novo. Até mesmo um
recondicionamento geral não é, nem de longe, o que se poderia imaginar com um
trabalho desses. Eu tenho que ser contrário a este vôo. Nós acabaríamos morrendo no
espaço entre as galáxias. Aqui, na Via Láctea, pelo menos podemos arranjar alimentos,
água fresca, e outras coisas indispensáveis.
— Isso me soa muito como coisa aprendida nos bancos da academia, doutor —
interveio Atlan, olhando o relógio. — Meus senhores, eu acho que deviam pensar, uma
vez mais, se dominar a frota de vigilância halutense no setor de Kahalo não é possível,
apesar de tudo! Não, por favor, não discordem imediatamente. Eu sei das dificuldades.
Sei por exemplo, que a ajustagem do hexágono solar sintoniza qualquer transmissor, com
exceção do hexágono de Andro. Portanto, antes de mais nada, seria necessário
conseguirmos colocar a sintonia adequada. Isso significa, uma vez mais, o envio de um
comando especial, de presença física, que naturalmente precisará ser protegido dos
atentos halutenses. Quando o hexágono solar galáctico estiver exatamente sintonizado no
transmissor de Andro, poder-se-ia tentar, em seguida, embarcar com a Crest, no campo
de desmaterialização sobre Kahalo, e conquistar o salto desejado. Planos malucos como
este, entretanto, somente devem ser executados por homens que estão conformados com
o fim de suas vidas. Se alcançarmos este dramático baixo nível de nosso mundo psíquico,
poderemos falar sobre isso seriamente. Entrementes, entretanto, deveríamos discutir
diversas coisas. Talvez alguém acabe tendo uma idéia grandiosa. Por favor — isso não é
dito absolutamente com cinismo. Eu também não gosto nada da idéia de ter que
permanecer no passado.
Rhodan deu um fim à conferência. Don Redhorse já estava dormindo há três horas.
Sua tarefa fora cumprida. Ele verificara que uma penetração a força no campo de
desmaterialização do hexágono solar era impossível — ou praticamente impossível.
3

Atlan ficou calmo ao encontrar, na mais cômoda cadeira reclinada de sua cabine, o
rato-castor.
Gucky vestia um leve uniforme de bordo, do qual o seu rabo surgia sem proteção. O
rosto pontudo de rato, com os olhos grandes, inteligentes, estava apoiado na lateral da
poltrona. Atlan notou apenas uma perna recolhida, o largo rabo de castor e a cabeça
coberta de pêlos com as orelhas redondas.
Inconscientemente até, Atlan defendeu-se contra os para-fluxos indagadores.
Gucky, mais uma vez, tentava espreitar o conteúdo do consciente de Atlan.
— Estraga-prazer — resmungou o rato-castor. — O seu monocampo energético está
cada vez mais forte.
— Sorte minha. Alguém me oferece oportunidade suficiente para me aperfeiçoar
cada vez mais.
Gucky mostrou o seu único dente.
— Vou fazer de conta que não ouvi isso, terrano de araque. O que é que você está
fazendo?
— Tirando a roupa para tomar uma chuveirada e depois dormir. Se você estiver de
acordo, peço-lhe que me dê oportunidade para uma pequena soneca.
O dente roedor de Gucky sumiu. Ergueu-se na poltrona pneumática, e deixou
pender as perninhas curtas. O Lorde-Almirante tirou o uniforme. Gucky olhou, por um
instante, para aquela saliência do tamanho de um ovo — o ativador de células — que se
desenhava sob a camiseta. Atlan esperou. Gucky, evidentemente, não viera à sua cabine
para falar de ninharias.
— Senti a sua falta na conferência — observou Atlan, como quem não quer nada.
— Estava cansado, ou simplesmente não tinha disposição para ficar ouvindo detalhar
cerca de cinqüenta planos absolutamente inexecutáveis?
— Estive trabalhando — declarou o rato-castor, magoado.
— Oh!
— Não há nada que justifique esse oh! Preciso falar com você seriamente.
— Mais essa. Baixinho, eu acabo de sair de uma discussão muito séria com homens
que devem ser levados a sério. Por favor, leve isso em conta, e deixe-me em paz. Eu
estou pronto, se você me permitir esta expressão da plebe.
Gucky conservou-se surpreendentemente calmo.
— Todos nós estamos prontos, Lorde-Almirante. Vocês não chegaram a qualquer
resultado, não é isso?
— Nenhum que pudesse ser usado. Minha sugestão é uma missão para malucos ou
cansados desta vida. Jamais a realizaremos. Aliás, agora me questiono, por que cheguei a
falar da conquista de Kahalo. Talvez, foi apenas para dar alguma coisa para pensar aos
homens mais competentes da Terra. Não sei ao certo.
— Você realmente está pronto — disse Gucky, pensativo. — Você jamais falou
coisas mais confusas. Perry no momento está andando pela sua cabine como um tigre
enjaulado. Cart Rudo está quebrando a cabeça, calculando manobras de aproximação de
vôo altamente complicadas, com as quais seja possível dominar a frota de vigilância
halutense.
— Loucura.
— Ele, pelo menos, está fazendo alguma coisa. Os mutantes estão elaborando
planos ousados, e eu também tenho algo para dizer. Por isso estou aqui.
Atlan foi até o autômato de bebidas, retirando-lhe uma caneca de suco de vitaminas
incolor. Gucky fez uma cara de nojo.
— Você devia comer cenouras. Ou melhor, não — acho melhor ficar nessa coisa
sintética. O meu estoque está cada vez menor. Afinal de contas, você está apenas fazendo
de conta que está desinteressado, ou está realmente?
Atlan sentiu que o rato-castor estava ficando inquieto.
Ele já não conseguia mais segurar, para si mesmo, suas novidades.
O arcônida tomou lugar em outra poltrona, esticou as pernas diante de si, e encostou
a cabeça para trás.
— Estou ouvindo, baixinho. E procure ser curto, está bem? É que eu estou
realmente cansado. A Crest vai orbitar esta zona junto de um sol da periferia galáctica,
até tomarmos a decisão de para onde ir. E então...?
Gucky usou de poucas palavras. Seus olhos marrons estavam sérios e penetrantes.
— O que digo agora não é nenhuma piada. Você lembra-se da incursão de Redhorse
à Terra do Período Glaciário? Ele acabou numa armadilha, que lhe fora colocada por um
dos senhores da galáxia, de nome Toser-Ban. Por um triz nós não fomos destruídos pelo
baluarte lunar automático. Antes, entretanto, voamos com uma corveta até a Terra e
conseguimos resgatar Redhorse.
— A quem você está contando isso?
— A você. Toser-Ban quase matou você com um tiro.
Eu ainda cheguei a tempo para poder alçar você telecineticamente. Em seguida
abrimos fogo sobre Toser-Ban com um canhão energético. O seu campo energético ruiu,
e você o matou com um desintegrador.
— Claro, claro. E esse tal cabo Surfat, agora promovido a sargento, comeu carne de
castor.
Gucky sorriu. Ele lembrava-se disso perfeitamente.
— Isso agora não é mais importante. O que interessa são os poucos segundos que eu
precisei para encontrar você. Tive que concentrar-me muito, e nessa ocasião ouvi alguém
chamar o meu nome. Não muito alto, mas nitidamente. Atlan! Eu tinha me concentrado
inteiramente na minha capacidade telepática, para verificar o seu paradeiro. Você me
chamou? Caso positivo, como você me chamou? Você tem dons telepáticos que nos
escondeu até agora?
Atlan colocou a caneca numa mesinha e ergueu-se.
— Baixinho, eu não tenho dons telepáticos, nem chamei você naquele instante. Eu
estava olhando diretamente para a boca da arma de Toser-Ban. Se bem me lembro, a
única coisa em que pensei foi como seria desagradável morrer ali, no meio de toda aquela
chuva. Talvez você tinha sido chamado por John Marshall.
— Não — afirmou Gucky energicamente. — Sobre isso nós discutimos durante
horas a fio. Ele estava ocupado com o mutante-monstro de Makata.
— Muito bem. Onde é que você quer chegar?
O rato-castor fez um gesto vago. Uma expressão de desespero apareceu nos seus
olhos.
— Atlan — eu fui chamado! Telepaticamente e com uma sonoridade quase audível.
Quem é que poderia conhecer o meu nome na Terra primitiva? Há por lá alguém que nós,
no ardor da luta, tenhamos esquecido? Alguém que talvez pudesse ajudar-nos?
— Você está imaginando coisas, baixinho. Vá deitar-se um pouco.
— Eu não estou imaginando nada. Eu fui chamado, contatado. Não, você não
precisa mandar chamar Marshall. Ele nada ouviu. Nós estávamos ininterruptamente
ocupados, e além do mais, psiquicamente exaustos. Se eu não tivesse que defender-me
dos impulsos que tentavam penetrar em minha mente, vindos do mutante-monstro,
porque precisava encontrar você novamente, provavelmente também nada teria ouvido.
Mas, assim, eu o recebi. Eu afirmo que na Terra, ou se você quiser, na Lemúria, existe
alguém que conhece meu nome e que tem dons telepáticos. Este homem, ou esta mulher,
nós devíamos procurar. Afinal, só pode tratar-se de uma pessoa do tempo real. Como é
que ela chegou à Terra?
Atlan fixou o rato-castor com os olhos semicerrados. Via-se que estava pensando no
caso. Será que ele não chamara Gucky mesmo? Num momento de grande perigo, ele não
teria desenvolvido uma capacidade que, normalmente, não tinha à sua disposição?
Falou isso a Gucky, mas este não estava de acordo, e demonstrou-o rudemente, com
um gesto.
— O que é que você quer atingir com este seu relato? — quis saber o Lorde-
Almirante finalmente.
— Vim procurar você, porque foi você quem chefiou aquela missão. Só você é
capaz de saber, com exatidão, o que aconteceu naqueles minutos. Perry expulsou-me,
sem mais nem menos, do seu quarto, e os cientistas desta orgulhosa nave não me
acreditariam.
— Nem eu. Você teve uma alucinação.
Gucky deu uma risada estridente e gritou:
— Jamais tenho alucinações. Isso não existe no meu cérebro. Você vai voar comigo
para a Terra, ou não vai? Quem está afogando, é sabido, costuma se agarrar em qualquer
tábua de salvação. Por que nós não deveríamos fazê-lo?
— Você não está imaginando que Perry faria a loucura de levar a nave às
proximidades do baluarte lunar?
— Como passaremos por ele é assunto seu. Afinal, podemos pegar uma corveta ou
um jato-mosquito. Fale com Perry. Ele agora está num estado de espírito que...
— ...o toma acessível a qualquer maluquice — interrompeu-o Atlan.
Gucky encolheu os ombros.
— Uma pequena chance é melhor que nenhuma. Tire a sua soneca se quiser, e fale
com Perry depois. Dê-me a oportunidade de verificar quem, na Terra, chamou o meu
nome. Se nós recebermos apenas um bom conselho, isso, em nossa situação, já é muita
coisa.
— Este é um argumento muito sensato, baixinho. Muito bem, eu falarei com Perry.
Acorde-me daqui a seis horas.
Gucky desmaterializou num lampejo luminoso. Atlan olhou para aquele lugar, onde
o baixinho ainda estava sentado, segundos atrás. Depois foi tomar uma ducha, e deitou-se
no seu leito. A Crest III continuava orbitando o sol estranho.
4

O retumbar profundo dos impulsores emudeceu. A Crest III, que saíra há oito
minutos do espaço linear, retomara o restante de seu vôo de entrada.
Ela encontrava-se num setor pobre em estrelas, a trinta e cinco anos-luz da Terra. O
sol brilhava como bola de fogo nas telas de eco do rastreador energético ultraluz. Em
nenhuma parte conseguia-se descobrir flotilhas halutenses.
Rhodan estava sentado na poltrona do almirante da Crest III. Perto dele, Cart Rudo
preparava-se para uma partida de emergência.
Perry olhou em volta da gigantesca sala de comando, tentando reconhecer os rostos
dos seus homens. Alguns deles pareciam máscaras azuladas dentro dos capacetes de seus
trajes de combate.
“Eles já estão tendo novas esperanças”, pensou Rhodan, com um sentimento de
vergonha. Fez um esforço para afastar de sua cabeça aquela sensação de estar enganando
os seus homens, e pegou um microfone do intercomunicador, que levou aos lábios.
— Rhodan para Atlan. Chegamos. Distância da Terra, exatamente trinta e cinco
anos-luz, até o momento nenhum rastreamento de corpos estranhos. Você continua
preparado para ir atrás de fantasmas saídos de cabeça de Gucky?
O rosto de Atlan apareceu na tela de imagem. O arcônida já estava sentado na
carlinga hermeticamente fechada do seu caça-mosquito, de onde tinha uma visão de cento
e oitenta graus. Atrás dele, no assento do navegador-rastreador, Gucky estava acocorado.
Ambos vestiam trajes espaciais de combate altamente eficientes, com micro projetores
embutidos para campos antigravitacionais, bem como campos energéticos e defletores
individuais.
— Continuo. Os pontos de encontro de recuo, calculados, estão no seu computador?
Se eu tiver que desaparecer daqui, ainda assim gostaria de voltar a ver vocês novamente.
— Tudo em ordem. Permanecerei neste ponto pelo tempo que for possível, Atlan —
já que você está assumindo este risco, acho que devia tentar ter sucesso no
empreendimento.
Atlan não disse mais nada. Rhodan, hesitante, recolocou o microfone no console.
Com a voz abafada ainda disse:
— Tudo de bom. Levem nossa saudação à Terra, e façam o possível para não atirar
em ninguém. Lá embaixo vivem nossos antepassados. Eclusa livre para decolagem.
Rhodan ouviu o ruído de partida dos jatos através da instalação de vídeo. O caça de
Atlan logo aparecia no campo de filmagem das câmaras externas de bordo. O reator da
popa do aparelho rápido lançou um jato flamejante, e logo sumira de vista.
Durante quatro minutos ele ainda continuava nas telas em relevo como ponto de eco
do rastreamento energético ultraluz. Depois também este símbolo apagou-se.
— Rastreamento à sala de comando! — anunciou-se o Major Notami. — Ele agora
entrou no semi-espaço. Nenhuma interferência mensurável.
Rhodan levantou-se de sua poltrona, dirigindo-se à parede blindada, transparente, da
sala de comando.
— Cart, caso precisar de mim — nas próximas horas estarei na sala de
rastreamento. Tome muito cuidado. E atenção para partida em caso de alerta.
O comandante epsalense apenas anuiu. Ele sabia o risco que Atlan assumira. Na
Terra, continuava existindo a estação do agente do tempo, e além disso, o baluarte lunar,
que trabalhava com um imenso potencial energético. Atlan tinha que executar uma obra-
prima de navegação espacial, se quisesse mergulhar na atmosfera da Terra sem ser
notado.
O Major Don Redhorse estava sentado no assento de comando de sua corveta, em
prontidão de partida. Ele conseguira permissão para poder levar ajuda a Atlan, em caso
de necessidade.
Na Crest III, praticamente ninguém mais falava. Todos tinham esperanças e medo
ao mesmo tempo.
***
Atlan não era homem para confiar apenas numa medida de segurança. A carlinga do
caça-mosquito de vinte e seis metros de comprimento era pressurizada normalmente. Os
campos energéticos individuais dos trajes de combate ofereciam também a garantia para a
manutenção da pressão interna, necessária ã sustentação das forças vitais.
Apesar disso, Atlan tinha fechado o capacete de visão completa, ligando o oxigênio
para respiração. Caso o jato fosse atingido por algum projétil, e se, além disso, os micro
aparelhos dos trajes de combate falhassem, eles ainda poderiam ser usados como trajes
espaciais normais.
Gucky seguira, sem dizer uma palavra, as instruções de Atlan. Ele estava informado
de quanto este vôo era arriscado.
Diante do campo energético do caça aglomeravam-se as partículas de gás de uma
protuberância solar, ejetada, longe, ao espaço. Atlan passou por dentro dessas massas de
matéria quente, com dez por cento da velocidade simples da luz.
Os caças-mosquito eram, até mesmo para grandes estações de rastreamento, objetos
que dificilmente eram notados. Eram pequenos demais, rápidos demais e capazes de
manobras que dificilmente facilitariam uma imagem clara nas suas telas de eco.
Somente suas freqüências naturais energéticas podiam ser mensuradas por aparelhos
de boa qualidade, de modo que existia o perigo de uma perseguição. Para estes casos,
entretanto, os mosquitos tinham, no nariz, um canhão-conversor embutido, cujo
desenvolvimento energético era de pelo menos vinte gigatoneladas de TNT, o que
impunha respeito.
Atlan alcançara o Sol terrano com uma manobra linear. A Terra surgiu como uma
foice em relevo na tela do rastreamento de massa. O relampejar caótico do campo de
sobrecarga de alta energia amainou, à medida que as massas gasosas se tornavam cada
vez menos densas. À esquerda da nave, aparecia a bola de fogo imensa do Sol. Atlan
ignorou suas fantásticas forças gravitacionais de atração com a indiferença do astronauta
que sabia muito bem que podia confiar na sua nave, conhecendo bem suas limitações
exatas.
A velocidade do jato era suficiente para fugir facilmente dos campos gravitacionais.
A enorme irradiação de calor era absorvida pelos campos energéticos da nave.
Deste modo, o aparelho deslizou para fora das últimas línguas brilhantes de gás. A
Terra distante tornou-se mais visível.
O automático de bordo tocou. Atlan apertou uma tecla.
— Apronte-se, baixinho! A segunda manobra leva-nos até à Terra. O anel de gás
cósmico do planeta Zeut destruído chega até à órbita de Vênus. Nós vamos sair por cima
do campo receptor-transmissor do campo magnético da Terra, e imediatamente vamos
mergulhar na atmosfera. Se for o caso de sermos rastreados, os resultados das medições
serão tão afetados pelas micropartículas das nuvens de matéria que será impossível uma
avaliação correta. Nós já passamos por isso.
— Se não acabarmos torrados primeiro!
— Eu tenciono evitar incidentes dessa natureza. A estação de tempo fica no
continente norte-americano Makata e a central de hiper-rádio fica no México. Portanto,
vou tentar mergulhar no outro hemisfério da Terra, entrando em vôo baixo, perto da costa
leste asiática, mais ou menos na altura do Mar da China do sul. Caso conseguirmos isso,
estaremos seguros. Você não terá mais nada a fazer do que aguçar bem seus ouvidos
telepáticos e ficar na escuta. Caso você “ouvir” alguma coisa, terá que me chamar. Nada
de dados de graus. Limite-se a dizer, “para a direita” ou “para a esquerda”. As
diferenças de altitude eu mesmo encontro. Fico mais ou menos na linha do Equador,
entrando numa rota para o oeste. No meio do Atlântico, em todo o caso, me desviarei
para o sul, para não entrar no alcance do rastreamento da estação norte-americana. É lá
que você terá que ter muito cuidado. Se você ouviu o chamado com maior nitidez no
México...
— Não foi com maior nitidez, mas apenas ali — interrompeu-o o baixinho.
Sua voz demonstrava seu nervosismo.
— Muito bem, então só ali. Neste caso, suponhamos que a pessoa desconhecida está
em algum lugar no continente americano. Isso dificulta nossa tarefa. Mas, ainda assim,
vamos levá-la a cabo, uma vez que cheguemos lá. Em caso de necessidade, pousamos
numa montanha alta das Cordilheiras, para que você possa “escutar” em paz. A manobra
terá início dentro de dois minutos.
— Você esqueceu-se do baluarte lunar?
— Não, mas isso não me interessa. No momento não consigo calcular a posição do
satélite. A nuvem de gás de Zeut, em todo o caso, nos esconderá. Além disso, eu suponho
que a aparelhagem do baluarte é controlada da Terra. A manobra começa.
O kalup-compacto do caça-mosquito entrou em ação. O campo de compensação
aparou o aparelho das influências energéticas de quarta e quinta dimensão,
possibilitando-lhe alcançar a zona de libração entre ambas as dimensões.
Na tela que indicava a meta, apareceu a Terra como uma bola brilhante, vermelha.
O jato atirava-se com velocidade ultraluz multiplicada em direção ao corpo celeste,
atravessou sem problemas as nuvens de partículas do planeta explodido Zeut, inofensivas
no espaço linear, saindo tão perto por cima do planeta, que a passagem teve o efeito de
um choque.
A correção de rota de Atlan foi operada manualmente, e por visibilidade direta. A
Terra era uma bola que brilhava, vermelho-esbranquiçada, cujas massas de gelo refletiam
a luz do círculo de gás.
O Sol, instantes atrás ainda um chamejante forno atômico, tornara-se um disco
anormalmente grande, porém sem força luminosa, dependurado no céu.
Formações de nuvens, brilhando também vermelhas, impediam uma visão melhor
da superfície da Terra. Apesar disso, podia reconhecer-se que o jato saíra do espaço linear
por cima do hemisfério à luz do dia, na altura das Ilhas Galápagos.
Esta era exatamente a posição que Atlan não desejara. A altura era de ainda 2.432
quilômetros. As camadas superiores da atmosfera ainda estavam bem distantes.
Gucky não disse uma só palavra. Ele sabia que cálculos mais exatos haviam sido
impossíveis por falta de reconhecimento prévio.
A turbina impulsora do jato chegou a rugir com a reversão. A velocidade de
mergulho do aparelho diminuía em setecentos quilômetros por quadrado de segundo. Este
era um valor que, à parte os jatos-mosquito, somente os mais modernos cruzadores de
reconhecimento da Frota Solar podiam atingir.
Com o resto do seu impulso, Atlan disparou até muito longe acima do Oceano
Pacífico, puxando a alavanca de controle do impulso para a frente.
Este movimento da pilotagem era transmitido, através da computação sincrônica,
para as diversas turbinas direcionais que, deste modo, faziam o efeito de lemes
aerodinâmicos.
O nariz pontudo baixou. Atlan caía num ângulo de queda de quase noventa graus
em direção à superfície.
— Você está maluco! — gritou Gucky, de repente. — Nós vamos arrebentar logo
que tocarmos a atmosfera. Atlan...!
O arcônida não deu-lhe importância. A velocidade da queda era de
aproximadamente seiscentos quilômetros por segundo. Quando o rastreamento de matéria
começou a assobiar, Atlan puxou a nave em queda para cima, suportou os valores de
pressão que passavam até cerca de cinco gravos e, por um segundo, ligou a reversão
completa para frenagem.
O jato entrou em ângulo raso nas camadas superiores da capa atmosférica da Terra,
mas então já não tinha mais, praticamente, nenhuma velocidade.
O segundo vôo em queda aconteceu somente ainda num ângulo de quarenta e cinco
graus e com uma velocidade de queda de dez mil quilômetros por hora. O calor do atrito
derivado pôde facilmente ser absorvido pelo campo de choque da proa.
Mais parecendo um monstrengo sibilante, o caça desceu até às camadas espessas da
atmosfera sobre o mar.
Atlan puxou-o para cima com os lemes
e os jatos da proa, ligando o aparelho para
condições de vôo atmosférico somente. A
nave espacial transformou-se num avião. O
ar reverberante e quente, diante da proa,
diminuía à medida em que a velocidade
decrescia.
Numa velocidade de vôo de apenas
ainda três mil quilômetros por hora,
desapareciam as últimas turbulências. Atlan
tomou a rota oeste, em direção ã costa
asiática.
— Sinto muito — disse ele pelo
intercomunicador de bordo. — O absorvedor
de pressão, mais uma vez, só entrou em ação
com meio microssegundo de atraso. Tive que
entrar em mergulho com um valor de
setecentos. Foi muito ruim?
— Ruim? — gritou Gucky agitado. —
Com todos os diabos, agora eu entendo por
que Redhorse não quer mais voar com você.
Uma coisa dessas a gente faz, quando muito,
com uma programação de computador de
primeira categoria, jamais manualmente. Se você tivesse puxado a nave para cima com
um centésimo de segundo de atraso e, ao mesmo tempo, não tivesse frenado com força
suficiente, nós agora seríamos apenas algumas partículas da nuvem de gás cósmico. Esta
é uma manobra de risco que é proibida em todo...
— Terra firme à vista — interrompeu-o Atlan, sem se impressionar. — Não fique
nervoso, baixinho. O que me interessava era ficar longe do alcance do rastreamento da
estação de tempo, o mais rapidamente possível. É que nós saímos do espaço linear
exatamente por cima da costa oeste norte-americana. Ou será que você não notou isto?
— Notei sim — disse Gucky, chateado. — Você pode subir um pouco mais?
— Sete quilômetros, e nenhum mais. Velocidade três mil, constante. Eu não quero
puxar atrás de mim turbilhões de ar superaquecido, nem entrar no horizonte de
rastreamento de alguma estação desconhecida. Procure controlar-se agora, baixinho. A
sua tarefa está por começar. Eu vou voar ao longo do maciço do Himalaia, atravesso a
planície da índia e depois giro para o sudoeste com a rota embicada para a África Central.
Preste atenção na sua tarefa.
— Faça o favor de me chamar em voz alta, caso acontecer algum incidente.
Em vez de uma resposta, Atlan colocou em alerta de fogo os dois canhões do caça.
A placa blindada do cabeçote da alavanca impulsora foi ejetada para o alto, deixando à
mostra as teclas de ignição.
— Você não está querendo soltar uma bomba de vinte gigatoneladas, está? — quis
saber Gucky, assombrado. — Homem, você está maluco. Isso acabaria rasgando a crosta
do planeta.
— Preste atenção na sua tarefa — repetiu Atlan. — Silêncio agora. Aí na frente
surge a costa asiática.
Gucky recostou-se na sua cadeira e desligou psiquicamente. Fechou os olhos. E
então, o Lorde-Almirante sabia que o seu parceiro não-humano estava escutando com
todos os seus sentidos inconcebíveis, impulsos que um ser humano normal jamais poderia
ouvir.
Gamas de ondas parapsíquicas eram sensivelmente mais complicadas nas suas
freqüências de quinta dimensão, que as conhecidas formas de energia do espaço normal.
Mestres do ofício, ao qual pertencia o rato-castor, afirmavam que cada ser vivente podia
ser reconhecido exatamente através de sua irradiação individual e sintonizados.
O aparelho deslizou por cima das terras costeiras. Bem ao longe ao norte,
destacavam-se os cumes do Himalaia. A planície siberiana, ainda mais para o norte, era
uma gigantesca geleira. Apesar disso, havia vida por ali.
***
As sirenes de alerta soaram através de toda a Crest III. A situação de alerta
condicional de combate, que valera até então, foi substituída por alerta total.
— Nave em alerta total de combate — ressoou a voz de Cart Rudo por todos os
alto-falantes do serviço de intercomunicação. — Rastreamento de corpo estranho em
Vermelho 47 graus, Valor-C 003758, Valor-H 14.0176. Prontidão canhões conversores,
preparar comando em série para compasso de costados em alvo direto. Comando central
de máquinas — elevem todas as estações de força para valores de absorção em cem por
cento, prontidão nos propulsores. Encerrar marcha lenta, nós já fomos rastreados. Central
de comando de tiro. Informe alcance de alvo.
— Central de Comando de Tiro, alcance de alvo concluído. Torres de conversores
já devidamente roladas para fora. Distância um — dois — três — cinco milhões de
quilômetros. Alvo rapidamente erguendo-se no Setor Vermelho. Computador positrônico
de objetivo evoluindo correspondentemente, programação de tiros por baterias.
Este fora o Major Cero Wiffert, o homem mais importante a bordo, quando se
chegava ao contato com o inimigo.
Rhodan apareceu na sala de comando, no momento em que começaram a rugir os
reatores de fusão dos doze gigantescos propulsores. Apesar disso, o ultracouraçado ficou
onde estava, sem se mexer do lugar.
Rhodan sentou-se na sua poltrona e fechou o capacete sobre a cabeça. Os
abafadores de som imediatamente abaixaram sobre seus ouvidos. Respiração separada e
comunicação por rádio, ligaram-se automaticamente.
— Rhodan a todos, intercomunicação por rádio. A nave continua de prontidão para
partida de emergência. Em caso de necessidade, entraremos com empuxe mínimo no
espaço linear. Prepare-se para exigir o máximo dos seus kalups, Hefrich.
— Entendido, sir. Faço isso com o maior prazer. Quantos são?
Ninguém precisava perguntar o que o engenheiro-chefe queria dizer com isso. A
nave encontrava-se na área de domínio dos invasores halutenses.
— Uma só, doutor. Esférica, com pólos achatados. Mil e setecentos metros de
diâmetro equatorial. Propulsores ajustados centralmente na placa polar inferior, ou seja,
construção típica halutense.
— Um pato gordo, sir.
— Rastreamento para o chefe — ouviu-se outra voz. — Objeto entrando em rota de
adaptação. Distância ainda trezentos e quarenta mil quilômetros. Alcance de tiro atômico
para canhões conversores já alcançado. O halutense está diminuindo a velocidade. Fortes
radiações de impulsos energéticos. Agora estão entrando freqüências de quinta dimensão.
O inimigo está erguendo um campo defensivo. Parece que eles estão se perguntando o
que é que está pairando, sem se mexer, aqui no espaço. É possível que nos tomem por um
destroço do período lemurense.
— Acho melhor não contar muito com isso. Destroços geralmente têm um tipo de
impulso próprio, característico. Além disso, nós estamos brilhando como um sol. Oficial-
chefe da bateria de tiro. Fogo à vontade!
O Major Cero Wiffert disparou a primeira salva da bateria de dez canhões do
costado vermelho. A Crest derivou para sotavento do fogo, aparada imediatamente pelo
computador com a instantânea entrada em ação dos propulsores-estabilizadores, e no
espaço de um segundo foi transformada numa estável plataforma de tiro, sem o menor
movimento reflexo.
O troar dos disparos ainda não cessara, quando diante dos halutenses, que se
aproximavam agora em alta velocidade, as bombas de fusão, irradiadas como impulsos de
ultra-luz, se materializaram e imediatamente entraram em processo de reação nuclear.
Nas telas de imagem do rastreamento de energia, de velocidade ultraluz, as
explosões tornaram-se imediatamente visíveis. A luz precisava de quase um segundo para
ser captada pelo sistema de computação externa de bordo. Este segundo de dilação,
entretanto, já dera lugar a uma dilatação tão formidável das dez bolas de fogo, que a
impressão ótica seguinte jogava na tela de imagem uma espécie de chamejante sol
gigantesco.
A nave de combate do inimigo, de grandes proporções, entrara em alta velocidade
naquele inferno, sumindo dentro do mesmo. Até mesmo os gigantes de Halut, conhecidos
por sua rapidez de reação, não haviam tido mais nenhuma possibilidade de escapar da
mais perigosa arma terrana.
Rhodan olhava as diversas telas de imagem e de rastreamento, fascinado. A nuvem
de fogo ampliava-se cada vez mais. E então pareceu como se ela quisesse rebentar de
dentro para fora, e retomar, mais uma vez, o processo atômico.
— Rastreamento à Sala de Comando — o inimigo explodiu. Desenvolvimento
energético de cerca de cinco mil vezes o valor da bomba. Reação integral das armas
utilizadas.
O computador reduziu a luminosidade das telas de imagem. O sol artificial
expandia-se cada vez mais. No seu centro reinavam milhões de graus de calor.
Rhodan levantou-se lentamente. Ao virar-se, viu Icho Tolot. O halutense estava
olhando, em silêncio, aquela bola de fogo.
— Sinto muito, Icho — declarou Rhodan, com a voz abafada.
— Por quê? Eu não o censuro. Nunca se esqueça que estamos lutando contra
sombras. Somente me questiono por que os seus antepassados não conseguiram dobrar os
invasores halutenses.
— É que a Lemúria não possuía o nosso canhão conversor, mas apenas uma
variação dessa superarma. A busca do alvo era muito complicada, muito incerta e
demorada demais. O efeito, em si, correspondia ao de nosso canhão-conversor. Mas isso,
apenas relativamente. De que lhe serve a melhor arma, se o inimigo atira mais
rapidamente e com maior precisão? A queda da Lemúria foi devida, em grande parte, à
deficiência dos canhões de polarização invertida de então. Os alvos precisavam, antes,
serem envolvidos num campo de rematerialização, para ser possível arremessar a bomba.
Naturalmente, os seus ancestrais, muito rapidamente, acomodaram-se a esta
circunstância. Porém, nos primeiros dez anos da guerra, os sucessos de tiro dos
lemurenses devem ter sido tão enormes, que Halut quase foi destruído. E então,
descobriram como era possível absorver o campo de polarização invertida, e já o sonho
de uma batalha de defesa de sucesso passara. Venha, Tolot. Vamos conversar um pouco
mais sobre este assunto.
Rhodan e o gigante, que nada tinha de humano, afastaram-se. A cerca de trezentos
mil quilômetros de distância, a bola de gás brilhante atingia uma tal extensão, que punha
a Crest em perigo, apenas ainda sendo possível ser colhida pelas grades angulares da
aparelhagem de vídeo externa.
Os propulsores da Crest trabalhavam em produção máxima. O campo defensivo
hiperenergético já estava de pé.
Cart Rudo voltou-se para o Primeiro Oficial de Cosmonáutica, Tenente-Coronel
Brent Huise.
— Se isso não for rastreado, eu engulo um sapo. Atenção todos a bordo: Situação de
alerta de combate permanece. Almoço cancelado, usem suas rações de reserva.
— Todo mundo vai gostar — disse o huno de barba vermelha. — Nossa comida já
não é coisa para gourmets. E as rações de reserva, então...!
Huise interrompeu-se a si mesmo e ergueu os ombros. Como quem não quer nada,
ele acrescentou:
— Dez bombas de fusão com mil gigatoneladas por unidade, até mesmo um
halutense tem dificuldade de digerir. Será que agora nós provocamos um paradoxo do
tempo?
Ninguém respondeu. Entretanto, todos pensavam na distância relativamente
pequena da Terra. Esta erupção de energia já poderia ser rastreada, até mesmo por
aparelhos muito ruins, numa distância de trinta e cinco anos-luz.
O Tenente Ische Moghu empurrou para trás o seu capacete e inspirou, como para
certificar-se, o ar da nave.
— Correta e ruim como sempre — disse ele. — O velho está jogando tudo num só
lance. Ele não desviou-se um só centímetro, apesar do halutense praticamente vir em
linha reta sobre ele. Para isso, a gente precisa de nervos de aço. Aliás, eu me pergunto se
ele tem algo parecido com nervos.
***
— ...à direita... direita... mais, mais... para a direita...! — Atlan virou a cabeça,
espantado. O caça-mosquito agora encontrava-se praticamente parado sobre o delta da
foz do futuro Ganges e Brahmaputra. No ano 49.488 a.C, a planície da área dos rios
formava uma imensa baía, que se estendia até as massas escarpadas das montanhas do
Himalaia. O desaparecimento do continente Lemúria, também aqui, tinha causado
movimentos tectônicos. O continente asiático, entretanto, de outro modo, mal se
modificara. Esta imensa massa de terra parecia ter-se defendido com sucesso contra as
fantásticas forças de compressão das massas continentais à deriva.
— Para- a direita...! — disse Gucky, novamente.
Sua voz soava baixa e parecia pouco modulada. Parecia mergulhado num transe
profundo.
“À direita” significava o norte para Atlan. Ele não conseguia imaginar por que o
rato-castor indicava a direção da mais formidável montanha da Terra. A primeira
transmissão, que consistira, conforme dizia ele, da menção do seu nome, tinha sido
captada por ele no México. Como então, de repente, isso começava a falar, de repente,
em pleno Golfo de Bengala?
— À direita...! — exigiu Gucky, com urgência.
Ele estava ficando inquieto.
Atlan colocou o aparelho em ponta e, acionando repentinamente o leme de altitude,
puxou-o numa curva tão violenta, que alguns gravos se fizeram presentes. Forçou o caça
de volta à posição horizontal, tomou altitude e orientou-se pela bússola normal.
— Trezentos e sessenta graus, rumo norte — disse ele, com toda a calma que lhe
era possível. — Está bem?
— Ótimo. Incidência da frente. Não, para a direita demais. Para a esquerda —
esquerda...
Atlan pisou cuidadosamente no leme lateral. A seta iluminada da bússola oscilou
fortemente.
— Gucky, estamos a trezentos e cinqüenta graus. Certo? O baixinho continuava
“escutando” ainda com maior intensidade. O seu nariz pontudo chegou a ficar vermelho.
Atlan, nessa situação, nem se atrevia a perguntar o que estava acontecendo. Estava claro
que o rato-castor estava ouvindo alguma coisa.
— Meu nome passa constantemente — murmurou Gucky, agitado. — Cada vez
mais forte. A intensidade do som está aumentando. Um transmissor fraco.
Demasiadamente à direita, dobre para a esquerda. Rápido, eu o estou perdendo.
A sete luminosa continuava a oscilar. Finalmente, aos trezentos e cinqüenta e sete
graus, conseguira fixar o ângulo de incidência. Ali, nesta linha de vôo, devia estar o
telepata desconhecido, irradiando os seus chamados.
Atlan viu-se diante de um monte de perguntas, para as quais não encontrava
qualquer resposta. Como é que o desconhecido sabia que Gucky estava novamente por
perto? Ou ele o teria rastreado logo após a manobra de penetração na atmosfera? Para
isto, entretanto, ele teria que conhecer, e muito bem, as freqüências individuais de Gucky.
As vibrações sobrepostas dos milhões de sobreviventes lemurenses que se escondiam nas
cidades sob o gelo eram muito fortes. A estas reuniam-se ainda as vibrações duras de
seres humanos mutantes, que também haviam desenvolvido determinados dons
paranormais.
Como é que o estranho poderia falar tão diretamente ao rato-castor? Ou — e esta
era a última e menos provável possibilidade que Atlan imaginou — ou o misterioso
estava chamando ininterruptamente, não importando se Gucky estava próximo ou não?
Isso exigiria um imenso potencial energético. Atlan achou que esta possibilidade teórica
não merecia uma maior investigação. Porém, mesmo assim, Gucky era chamado pelo
nome.
Atlan examinou, mais uma vez, os controles das armas do caça. Neste momento, o
telerrastreamento de energia deu um sinal. Muito longe, no espaço, pelo menos a trinta
anos-luz de distância, forças gigantescas haviam sido liberadas. O computador calculou e
mostrou, com base nos impulsos recebidos, os valores aproximados. Atlan mordeu o
lábio inferior, apertando os dentes com tanta força, que as maçãs do rosto ficaram
salientes. Por ali devia estar pairando a Crest. O que tinha acontecido?
Gucky distraiu-o com um murmúrio ininteligível. Nos receptores dos capacetes do
intercomunicador de bordo, aquilo mais parecia um sussurro indistinto.
O caça-mosquito passou em vôo rápido por cima da cordilheira do Himalaia. Mais
para o norte, surgiram os cumes majestosos das montanhas mais altas. Entretanto, eram
um pouco mais baixas que no tempo real.
Atlan reconheceu o Monte Everest, à direita deste o Kanchinching e, mais para a
esquerda, o pico principal do Gaurisankar. Outras montanhas apareceram bem diante
dele. Teve que puxar o aparelho para cima, para não colidir com aqueles gigantes.
Gucky deu uma nova instrução para a manutenção da rota. Um pouco para a
esquerda!
Atlan seguiu-a rapidamente, erguendo o aparelho. Ele mergulhou num banco de
nuvens e, no segundo seguinte, estava sobrevoando o Gaurisankar. E logo o pico sumira
outra vez.
— A incidência do som está diminuindo — disse Gucky, mais alto. A sua voz
chegava a tremer. — Voamos por cima do transmissor. Voltar!
Atlan não quis acreditar no que ouvia. Obrigou o caça a descrever uma longa curva
para a esquerda, diminuiu os jatos impulsores e deslizou uma velocidade mínima num
vôo de aproximação de volta para o sul. Debaixo deles, erguia-se novamente, majestoso,
o Gaurisankar.
A velocidade do aparelho era ainda de setecentos quilômetros horários. Se Atlan
diminuísse ainda mais a velocidade, o aparelho não agüentaria. As diminutas asas de
sustentação, em forma de delta, não haviam sido desenvolvidas para vôos tão vagarosos.
Atlan estendeu os flaps, aumentando assim a sustentação, conseguindo segurar, com
certa segurança, o jato no ar. O seu polegar, entretanto, estava bem por cima da tecla do
projetar de antigravidade.
Entretanto, ele ainda queria esperar com esta liberação energética. As frentes de
onda de quinta dimensão podiam ser, decididamente, rastreadas com mais facilidade do
que as irradiações dos jatos-propulsores.
Atlan começou a circular o pico. Gucky estava ficando cada vez mais seguro. O
arcônida olhava, sem entender, para baixo. O Gaurisankar, já nesta época, tinha quase
oito mil e quinhentos metros de altura. Ninguém, pelo menos nenhum ser normal, poderia
viver naquela atmosfera rarefeita e gelada. A temperatura do lado de fora da nave era de
setenta graus abaixo de zero.
Finalmente, Atlan viu-se obrigado a ligar a antigravidade. O caça foi amparado pelo
campo, e as asas de suporte foram recolhidas. Pouco depois, o jato estava parado bem
perto, acima do platô do cume. Não era muito grande, e parecia bem diferente do que
existia no tempo real.
Ventos fortíssimos, de alta montanha, batiam contra aquele corpo sem peso, que
somente conseguia ser aparado com a constante utilização dos jatos corretores. Cristais
de gelo, pontudos e duros como agulhas de aço, golpeavam as vidraças reforçadas da
carlinga do piloto.
— Pousar, — exigiu Gucky. Ele estava tremendamente agitado. — Pousar. Eu... eu
ainda não consigo saltar. Exausto demais. Pousar.
Atlan diminuiu o absorvedor da antigravidade e deixou o aparelho descer. Ele tocou
a neve congelada, quebrou a superfície e finalmente parou sobre o duro piso da geleira.
O rugir dos jatos emudeceu. Somente o banco de conversão do microrreator
continuava zunindo o seu canto permanente.
Gucky acordou lentamente de sua condição de transe. Os seus olhos tornaram-se
mais claros.
Finalmente conseguiu falar normalmente outra vez. Lá fora, as tempestades de neve
uivavam em volta do caça. O mesmo foi coberto de massas de neve em turbilhão, e no
instante seguinte, já estava livre delas novamente. A temperatura continuava constante,
em setenta graus abaixo de zero.
— Eles continuam chamando. E agora muito alto e muito nitidamente.
Atlan virou-se rapidamente na sua poltrona.
— Eles...? — gritou ele, sem poder se conter.
— Sim, são diversos. Eu me enganei. Eles falam de si. Eu traduzo...
Gucky fechou os olhos novamente, agarrou-se no seu cinturão e disse com a mesma
voz que anteriormente:
— Gucky — nós chamamos o Oficial Especialista Gucky, chamado Gucky. Mundo
natal Vagabundo, mundo de sua escolha, Terra. Chamamos Gucky. Irradiar para impulso
“Miosótis” — “Não te esqueças de mim” em freqüência individual. Comutação de
transmissor para transferência de informações, indispensável.
O baixinho acordou novamente. Nervosamente, ele declarou:
— Meu nome passa com uma sonoridade dez vezes superior, o texto
significativamente mais baixo. Por isso mesmo, eu apenas escutei “Gucky”, até estar bem
perto. Atlan —isso não é nenhum telepata, mas um paratransmissor mecânico, que foi
sintonizado exatamente para a minha freqüência cerebral. Quem é que poderia conhecê-
la? Somente os especialistas da Defesa estão informados a esse respeito. Além disso
nenhum outro telepata poderia ouvir o chamado.Transmissões em freqüências eletivas
são vinculadas individualmente. Até mesmo Marshall, agora, não captaria um só impulso.
O transmissor foi sintonizado especialmente em mim. Atlan — eu estou com medo.
O almirante conseguiu controlar-se, com esforço. Milhares de pensamentos e
reflexões passavam, ao mesmo tempo, pela sua cabeça. Depois ele lembrou-se da
situação.
— Nada de imaginar coisas agora, baixinho. Irradie o impulso de abertura — qual é
ele?
— Curioso! “Miosótis” — “Não te esqueças de mim”. Estou muito nervoso. Parece
que estou sentindo um profundo pesar.
Atlan conseguiu abafar um gemido, curvou-se sobre os aparelhos de rastreamento, e
sacudiu o rato-castor. Este caiu em si.
— Baixinho, controle-se. Passe o impulso de sua onda cerebral. Em seguida, você
vai ter que ir buscar o transmissor, contanto que possa transportá-lo. Ao que parece,
alguém deixou uma notícia para você.
— E parece que a deixaram há muito tempo. O transmissor já deve ter irradiado
com maior intensidade que agora. O seu estoque de energia deve estar diminuindo.
Somente o meu nome ainda continua passando muito nitidamente. Muito bem, dê-me
apenas mais um minuto.
Atlan esperou, muito impacientemente. O aparelho já estava novamente coberto de
neve. Imediatamente ele afastou aquelas massas geladas com um jato quente das turbinas
dos lemes.
E então, o rato-castor começou a trabalhar. Transmitiu o impulso telepático e
esperou.
A uma distância de apenas trinta metros, uma micro aparelhagem complicadíssima
começou a funcionar. Um relê girou para a esquerda. O contato de transmissão II foi
fechado. Imediatamente, o baixinho estremeceu novamente.
— Alto, muito alto! — gemeu ele. — Silêncio, estas são realmente notícias. Eu
traduzo. É possível que aconteça sair alguma coisa torneada. Passe por cima. Eu
menciono as coisas apenas mais ou menos como me chegam. É difícil falar ao mesmo
tempo, enquanto se recebe uma mensagem telepática. E agora, segue-se o primeiro texto.
Até agora só recebi sinais de chamada. Atenção...
Atlan ligara a gravação em fita do caça, interligando-a com o rádio do capacete do
rato-castor. Nenhuma palavra deveria perder-se. Neste instante, o arcônida já não pensava
mais no perigo que poderia estar espreitando-os de muito perto. Também já esquecera a
fantástica explosão no cosmo. O baixinho não se enganara. Alguma coisa o chamara
efetivamente. E agora ele começava a falar.
— Major Gerald Snigert, comandante do grande transporte da frota Dino-3, chama
a nave-capitânia Crest III. Chamo o Administrador-Geral do Império Solar, Perry Rhodan
e o Lorde-Almirante Atlan, da USO. Eu me encontro com a minha nave, na minha
galáxia natal. Minhas ordens são para encontrar a Crest e substituir os seus kalup-
conversores usados. A bordo de minha nave encontram-se três conversores novos,
testados, saídos da fábrica, que o meu grupo de técnicos poderia instalar na Crest. Minhas
instruções dizem ainda que devo ajudar Perry Rhodan, com meios de auxílios normais, a
regressar para a Nebulosa de Andrômeda. Fui catapultado ao passado pelo planeta Vario.
Conforme nossa documentação, no momento nos encontramos no ano 49.988 antes de
Cristo. Estes transmissores telepáticos, chamados memotransmissores, construídos em
Siga, a pedido da Defesa Solar, são minha última possibilidade de alcançá-los. Sei que
fizeram um salto intermediário de quinhentos anos. Maiores informações somente
poderão ser dadas com a abertura do memotransmissor. Encontrarão uma microfita
gravada, inclusive com imagens, com dados exatos sobre a chegada de minha nave à Via
Láctea, e sobre nossas medidas tomadas.
“Atenção! O memotransmissor é imediatamente destruído, caso for feita uma
tentativa de abri-lo à força. O aparelho abre-se automaticamente, no momento em que o
oficial especialista do Exército de Mutantes, Gucky ou John Marshall, irradiar em sua
freqüência única o nome do homem que no ano 1.971 funcionava como chefe da US-
Space Force, dirigindo os preparativos para o primeiro vôo tripulado por seres humanos
para a lua. Sei que o nome deste oficial somente ainda é conhecido por poucos seres
humanos. Fim das informações.
“Atenção! Post-scriptum: Esta notícia telepática pode ser recebida unicamente pelos
oficiais especialistas Gucky e Marshall. Os memotransmissores espalhados pelos homens
de minha tripulação na galáxia, num total de trinta e duas unidades, foram especialmente
sintonizados nas freqüências individuais, conhecidas de mim, das pessoas mencionadas.
Coloque em segurança o aparelho quem receber esta notícia. Lembro-lhe o código de
abertura. Caso eu seja ouvido, gostaria de despedir-me com um ‘muita sorte’ desejado de
todo o coração. Desligo.”
Gucky, desta vez, precisou de cinco minutos, até novamente ter-se sob controle.
Atlan, durante este tempo, ficou ouvindo a fita gravada. Ele conhecia um major terrano
de nome Gerald Snigert. Ele era um dos oficiais mais responsáveis da frota solar, sendo
conhecido pelo seu equilíbrio.
Atlan começou a refletir mais uma vez. Mal dava atenção ao arquejar de Gucky. O
rato-castor chegara ao fim de suas forças.
De repente, o almirante foi interpelado pelo rato-castor.
— Está bem, eu estou novamente mais ou menos em condições. A tradução foi
horrível. Eu falei compreensivelmente?
— Até sem qualquer erro e não apenas adequadamente, Gucky — eu gostaria de
ajudá-lo a recolher o transmissor. Provavelmente ele está debaixo de uma camada de gelo
de um metro. Você já conseguiu localizá-lo mentalmente?
Gucky já o conseguira. Indicou o lugar. Era ao pé de um paredão rochoso, muito
íngreme, que poderia ser visto como o ponto culminante da montanha. Ali encontrava-se
uma pequena gruta que, aliás, estava inteiramente fechada pela neve, e verdadeiras
massas de gelo erguiam-se diante da mesma.
Atlan não hesitou mais tempo. Examinou o seu traje de combate e abriu a porta
interior da diminuta eclusa de descompressão.
— Deixe disso, — informou Gucky. A sua voz ciciante parecia calma, quase solene.
— Atlan, eu ainda posso dar esse pequeno salto. A gruta é suficientemente grande para
mim. E parece não ter gelo no seu interior. O transmissor não deve ser pesado, caso
contrário o major não teria falado de uma recuperação do mesmo por mim ou por John
Marshall. Os siganeses nunca fabricam aparelhos grandes. Mantenha-se nesta mesma
posição, e espere por mim. Eu salto mais ou menos dentro de três minutos.
Ele silenciou novamente, e Atlan deixou-se cair, hesitante, no seu assento. O seu
plano era de derreter o muro de gelo.
Depois de alguns instantes, o baixinho começou a falar, levado por sua inquietação
interior.
— Você já se deu conta de que Snigert, devido ao nosso salto intermediário, chegou
aqui quinhentos anos cedo demais? A julgar por seu campo de referência, nós nos
encontrávamos no futuro, apesar de, na realidade, ainda continuarmos muito longe, no
passado. Eu acho que Snigert mandou colocar os memotransmissores em planetas
importantes, sempre na esperança de que nós os encontraríamos, quinhentos anos mais
tarde. Esta é a única solução. Neste caso, Snigert, conforme a idade que atingiu, deve
estar morto por pelo menos há quatrocentos e cinqüenta anos. Nós vamos encontrar
apenas ainda os seus despojos — quando muito. Ele teve uma idéia genial, Atlan. Ele não
disse que nos trouxera três kalups novinhos em folha para o passado? Com um tender
denominado Dino-3? Estas são naves gigantescas, sobre cujas plataformas até um
ultracouraçado pode pousar. Isso poderia significar nossa salvação.
Três minutos mais tarde, o rato-castor desapareceu de repente do seu assento.
Depois de mais cinco minutos, ele reapareceu, tão inesperadamente como sumira. Seu
traje de combate não sofrera nenhum dano.
Suas mãozinhas seguravam um cilindro prateado brilhante, com as extremidades
fechadas por terminações abauladas. A superfície era inteiramente lisa.
— Eu sabia que os engenheiros siganeses, experientes em microeletrônica, jamais
constroem grandes aparelhos — disse ele. — Esta coisa aqui tem, pelo menos, quinhentos
anos de existência. Você lembra-se do nome do oficial que, naquela ocasião, chefiou o
vôo lunar de Perry?
— Conheço. Foi o general de três estrelas Lesly Pounder, chefe da US-Space Force,
e comandante militar do Nevada Space Port. Isso faz muito tempo. Snigert foi muito
esperto, escolhendo o nome de Pounder como código para a abertura do aparelho. Caso o
memotransmissor tivesse caído em mãos erradas, seus descobridores, só com isso,
estariam diante de um mistério insolúvel. Isso, mesmo sem contar que jamais poderiam
ter “escutado” os chamados, devido à parafreqüência especial.
Gucky olhou ansioso para o aparelho, quando Atlan deu partida na nave.
Atlan puxou o caça para o alto e afastou as massas de gelo com os jatos dos lemes.
Segundos mais tarde, um corpo lançando labaredas atravessou as nuvens, erguendo-se,
com aceleração máxima, para o espaço, o seu verdadeiro elemento.
Gucky desistiu de abrir o memotransmissor, já agora. Antes de mais nada, era
importante alcançar a Crest.
Atlan voou em direção oeste, por cima do continente asiático, para desviar-se da
lua, visível como uma foice. Depois de ter sumido atrás do horizonte, começou o
verdadeiro vôo de subida.
A atmosfera incendiou-se. Continuava brilhando como uma chama vermelha ao
longo da trajetória de vôo, quando o caça-mosquito já havia sumido no cosmo,
aprestando-se para sua manobra linear.
Atlan tinha consciência de que seu empreendimento tivera o favorecimento de, pelo
menos, três fatores.
O bastião lunar não tivera qualquer possibilidade de abrir fogo, uma vez que o caça,
na sua chegada, encontrava-se perto demais da superfície da Terra.
A isso juntava-se o fato de que naves de vigilância halutenses se encontravam nas
proximidades. Os agentes do tempo na Terra não tinham meios de saber quem teria
enviado aquele pequeno aparelho. Por isso, simplesmente, nada tinham feito.
Como terceiro fator, contava a explosão gigantesca rastreada, em pleno espaço.
Quando coisas dessa natureza aconteciam, nas proximidades da Terra, o emissário dos
senhores da galáxia certamente achava melhor não tomar quaisquer medidas que
pudessem denunciá-lo.
Interiormente Atlan sentiu-se bem com o seu triunfo. Sua missão valera a pena.
Agora não tinha mais a menor importância se ela fora feita a partir da estação ou não. Os
mortos haviam procurado a Crest, e finalmente a haviam encontrado.
Para Atlan agora somente ainda era importante a questão de saber-se onde o tender
Dino-3 estaria orbitando à espera deles, e se ele ainda existia.
Além disso a Crest teria que ser alcançada com exatidão. Atlan lembrou-se do
rastreamento de energia. Se o ultracouraçado fora atacado, em dadas circunstâncias, Perry
teria que recuar. O arcônida preparou-se para uma longa busca, apesar de ter esperanças
de encontrar a nave-capitânia no setor previamente determinado.
Ele olhou o relógio de bordo. Desde o início da missão haviam se passado três horas
e quarenta e seis minutos. A bordo da Crest agora estaria começando a tarde,
aleatoriamente escolhida, dentro do ritmo habitual de vinte e quatro horas.
A explosão dera-se há cerca de uma hora atrás. Atlan perguntava-se quanto tempo
os halutenses hesitariam em voar até o local da explosão de energia. Eles certamente se
davam conta de que ali haviam acontecido coisas nunca antes vistas.
Atlan tinha como certo que Rhodan não se deixara surpreender. Ele provavelmente
abrira fogo, quando não tivera mais outro recurso. A questão era apenas saber-se se ele
teria conseguido manter a sua posição.
5

Nos alto-falantes do intercomunicador houve um estalo. Chamada para a sala de


rádio da Crest. O Major Kinser Wholey já estava com a mão na tecla de transmissão do
hiper-rádio. A medida tinha que vir, já que os halutenses apareciam aos bandos, saindo
do espaço linear. A Crest continuava imóvel, em ponto de espera, a trinta e cinco anos-
luz da Terra.
— Rhodan para Wholey. Silêncio de rádio é suspenso imediatamente. Chame Atlan.
Ele voa, no seu caça, numa rota de adaptação, de Verde. Setor vertical ultrapassado.
Muito acelerado. Nós temos que desaparecer. Oficial das eclusas — prontidão para
manobra de apresamento com o raio de tração. Nada de delicadeza.
O oficial das eclusas para os hangares superiores dos caças era o Tenente Moghu.
Ele já tinha o aparelho de Atlan, que acabara de ressurgir do espaço linear, na sua tela de
rastreamento, controlada pelo computador.
Enquanto Kinser Wholey retomava o contato via rádio, Atlan rastreava os
halutenses que surgiam, e as bocas cintilantes dos canhões conversores roladas para fora
conjuntamente com suas torres giravam em posição, Moghu deu energia total aos seus
lançadores.
O raio de tração, cintilando azul, rompeu o campo energético erguido por
precaução, no qual, no mesmo segundo, ocorreu uma rotura estrutural, provocada pelo
controle automático.
Esta era a raia de aproximação de vôo de Atlan. Ele não podia errá-la, em nenhuma
circunstância, ou o seu jato se vaporizaria num raio brilhante. Por outro lado, Rhodan não
podia prescindir totalmente do campo energético de proteção da nave.
Vinte e quatro naves de combate halutenses, nenhuma menor de mil metros de
diâmetro, aproximavam-se em velocidade estonteante da nave-capitânia terrana.
Atlan acelerou ao máximo. A Crest, ainda há pouco apenas um ponto no receptor de
eco, foi captada pela ótica normal. O seu campo energético brilhava num verde forte.
Sinal de sobrecarga normal em combates.
— Atenção, Gucky — disse Atlan, muito calmo. — Desembarcar e utilizar a
ruptura estrutural do campo energético como abertura para teleportação. Determine
exatamente sua posição, caso contrário você acaba dependurado no campo energético,
inapelavelmente.
— Eu nem penso em deixar você e o...!
— Eu disse desembarcar! E isso é uma ordem. Caso eu não conseguir mais chegar
em tempo na Crest, pelo menos o memotransmissor tem que estar em segurança. Informe
a Perry que, em caso de uma manobra de desvio da nave, seguirei para o ponto de
encontro II. O mesmo fica nas proximidades do sistema de Vega. Se não encontrar vocês
por lá, voarei até o setor de Orion. Ali fica o Ponto III. E agora suma. Já, já, as coisas vão
esquentar por aqui.
Gucky concentrou-se na ruptura estrutural, claramente visível, e desapareceu num
reflexo luminoso. Apenas quatro segundos mais tarde, a nave de Atlan foi agarrada pelas
pontas do raio de tração.
O almirante aplicou a reversão das turbinas para frenação total, deixou-se agarrar e
depois ligou as turbinas em ponto-morto. Apenas o reator de corrente continuava
funcionando a plena capacidade. O neutralizador de pressão precisava agora de todos os
watts.
O puxão da tração veio tão repentinamente e com tanta força que, pela fração e um
segundo, pelo menos vinte gravos se fizeram presentes, comprimindo o arcônida
violentamente sobre o seu assento. Atlan ficou com falta de ar. Uma névoa vermelha
rodopiava diante dos seus olhos, porém logo a neutralização da pressão havia
compensado as elevadas forças da aceleração.
O caça deslizou para dentro da eclusa, acima da protuberância equatorial de
propulsão.
Neste momento, a Crest retomou velocidade. Novamente o caça rodopiou, porém o
raio de tração agüentou firme. Quando o aparelho foi tracionado, com uma velocidade
fora do comum, através da ruptura no campo energético, sendo aparado dentro do hangar
pelos campos defletores magnéticos, a Crest já tinha concluído a mira de ajustagem dos
canhões conversores e canhões energéticos.
A formação halutense, entrementes, formara-se em três grupos de ataque,
aproximando-se numa leva acelerada.
A distância encolhia cada vez mais. Em aproximadamente um milhão de
quilômetros de distância, as armas pesadas da Crest começaram a rugir. Atlan sentiu o
trovejar de muito próximo. Diretamente acima da eclusa dos caças, haviam sido
instaladas duas baterias de canhões energéticos.
Ele jogou o capacete do seu traje de combate para trás, colocando as mãos
espalmadas sobre os ouvidos. Deste modo, ficou deitado na carlinga do caça, até que a
compensação de pressão tivesse terminado, e alguns homens, sob a chefia de Moghu,
apareceram.
Eles puxaram a cobertura da carlinga para cima, retiraram o arcônida, quase
inconsciente, e rapidamente colocaram-lhe abafadores de som sobre os ouvidos.
Quando Atlan conseguiu entender novamente, mais ou menos, os comandos,
verificou que a Crest já se encontrava no espaço linear, atirando-se com velocidade
hiperluz na direção do centro galáctico.
Ninguém mais notou que a salva completa de canhões conversores literalmente
engolira quatro naves da formação halutense. As outras espaçonaves haviam escapado da
destruição certa, através de uma arriscada manobra de desvio.
Atlan dirigiu-se à sala de comando, apresentando-se a Rhodan.
Depois de cerca de duas horas a Crest voltou ao Universo einsteiniano. As imagens
da ótica externa demonstravam que houvera uma aproximação de cerca de dez mil anos-
luz.
Avisos de rastreamento de rotina eram passados. Este setor parecia livre de
formações halutenses. Atlan esperou até que as necessárias medidas de segurança
tivessem sido tomadas. Após a revogação da prontidão de combate em toda a nave,
Rhodan atravessou a sala de comando, para encontrar-se com o arcônida. Este deitara-se,
no setor dos mutantes, num pneumoleito, massageando as manchas azuladas e outros
hematomas, provocados pela violenta manobra de aproximação e pouso, na eclusa do
hangar.
Rhodan sentou-se na beira da cama e olhou para Gucky, que, do outro lado, estava
dando atenção ao cilindro de metal, com John Marshall e os outros mutantes. A discussão
dos paranormais era difícil de ser entendida. Continha inúmeros termos técnicos, que
faziam parte do vocabulário dos mutantes.
— Eu gostaria de agradecer-lhe, amigo — disse Rhodan com fingida calma. —
Vocês correram um grande risco.
— Não vamos falar nisso — defendeu-se Atlan. — Nós estamos seguros, por
algumas horas, neste setor?
— Assim parece. Estamos nos aproximando de uma estrela dupla vermelho-clara. É
Gamona. No tempo real uma base secreta de dois amplificadores de pontes de rádio.
Atlan — eu estou preocupado com a descoberta de vocês. Você já se deu conta de que
cinco mil homens, já agora, estão convencidos que o regresso à Nebulosa de Andrômeda
e a conquista do transmissor do tempo, lá existente, já não é mais um problema? Se
Snigert cometeu apenas um único erro, o seu tender talvez tenha explodido cinco minutos
depois da gravação dessa videofita
Atlan ergueu-se.
— Moghu poderia ter me tratado com um pouco mais de gentileza — queixou-se
ele. — Bem, mas deixemos isso. Perry — Snigert é um homem que sempre soube
exatamente o que precisava fazer. Eu também tenho esperanças. Vamos abrir o aparelho.
O código para esse impulso é o nome de Pounder. Gucky já fez um relatório completo?
— Com todos os detalhes. Vamos até o laboratório de Física. Eu não gostaria de ter
algum imprevisto desagradável com esse aparelho. Afinal de conta, ele tem quinhentos
anos de existência. É um milagre ter conseguido cumprir o seu dever durante tanto
tempo.
— Trabalho criterioso dos siganeses — grita o especialista Lemy Danger, que de
repente surgiu com seu aparelho de vôo individual diante dos comandantes, pairando no
ar.
Lemy pousou perto de Atlan, sobre o leito, e desligou o microimpulsor.
— Por favor não me contamine a sala de comando — gritou o primeiro oficial, de
onde estava. — Esse negócio emite gases de escape.
Lemy olhou-o, numa censura.
— Permita-me, senhor oficial? — disse Atlan. Ele pegou o homenzinho de 22, 21
centímetros de altura com uma mão em torno da cintura e ergueu-o para o seu braço
esquerdo dobrado.
— Muito grato, sir — apressou-se em dizer o menor homem do Corpo de
Especialistas da USO. — É claro que permito.
Rhodan abafou uma risada. O siganês adaptado ao ambiente era um tanto suscetível
quando se tratava de menção ao seu tamanho.
— O que está querendo dizer, Lemy? — quis saber Atlan. — Tem alguma sugestão
especial? Quero dizer, com relação ao aparelho encontrado?
— Na realidade não, sir. Conforme sabe, nestes últimos anos andei encarregado da
microfabricação siganesa, da qual fui o chefe. Por isso posso garantir-lhe que os
memotransmissores, por nós fabricados...
— O senhor teve participação na fabricação? — interrompeu-o Rhodan.
— Não, sir, mas tenho uma idéia de como nossos engenheiros o fizeram. Por isso
aconselharia melhor cumprir exatamente as instruções recebidas telepaticamente. Nada
poderá acontecer.
— Isso é o que o senhor diz, meu caro.
Lemy voltou-se para Atlan, como em busca de ajuda. O Lorde-Almirante olhou,
pensativo, para aquele rostinho. Depois colocou Lemy novamente no chão.
— Por favor vá voando até o laboratório de Física, lá embaixo. Ou prefere que eu o
transporte?
— Seria melhor, sir — suspirou Lemy. — Os gigantes terranos esquecem-se com
freqüência que eu também estou a bordo. E já está se tornando um problema desviar-me
das solas dos seus sapatos.
Atlan enfiou Lemy no bolso externo do seu uniforme de bordo, e levantou-se. Os
mutantes já tinham desaparecido, com o cilindro.
***
O cilindro continha meramente uma microfita de vídeo gravada com material
informativo. A abertura ocorrera sem dificuldades, com o uso da palavra-código,
transmitida por Gucky. Quase noventa e cinco por cento do espaço interno disponível
eram tomados pelo gerador de força e pelo transmissor telepático. Realmente era um
milagre que este trabalho de eletrônica de precisão, obra-prima dos micro engenheiros
siganeses, tivesse funcionado por tanto tempo.
Os cientistas-chefes e oficiais da Crest, durante uma hora, ficaram olhando,
fascinados, a tela de imagem, na qual a fita estava sendo projetada.
O Major Gerald Snigert tinha feito um trabalho metódico. O seu relato se iniciara
com a partida da Dino-3. Todos os membros da tripulação haviam sido apresentados.
A manobra enganadora, por cima do alçapão do tempo Vario, convencera Rhodan
de que, no tempo real, tudo havia sido feito para levar ajuda à Crest em dificuldades.
A Dino-3, uma gigantesca plataforma voadora, com um corpo esférico embutido,
que continha as salas de comando e de alojamento, havia sido deslocada no tempo desde
Vario, e tinha saído, planejadamente, por cima de Kahalo. Aqui, Snigert conseguira,
através de um controle de computação especial, colocar a sua nave disforme em
segurança, antes mesmo da frota de vigilância lemurense poder disparar um só tiro.
Snigert levara a sua nave para o sol duplo vermelho Redpoint, na esperança de ali
encontrar a Crest.
Com isto, começara a tragédia da Dino-3. A nave-capitânia não estava mais no seu
lugar.
Durante as cenas deste filme, Atlan fazia-se as maiores censuras, por ter tido a idéia
de uma transposição adicional do tempo, de quinhentos anos no futuro relativo.
Nesta parte, Rhodan mandara interromper a projeção para declarar que ninguém
poderia ter contado com uma missão de socorro, como esta. Ele o mencionava,
naturalmente, para desanuviar a consciência de Atlan.
Em seguida, o filme continuava informando, em imagens e som, o que os homens
da nave de abastecimento haviam feito para ainda alcançar a Crest que permanecia a
quinhentos anos no futuro.
Depois de terem percebido o salto adicional no tempo, as três corvetas de bordo
haviam deixado o tender, para depositar os memotransmissores em planetas que seriam
visitados pela nave-capitânia, com grande probabilidade.
O mundo mais importante era a Terra. Ali haviam sido deixados três aparelhos, um
no Gaurisankar, o segundo no Kilimanjaro africano e o terceiro no Cerro Negro, nas
cordilheiras do leste.
O Major Snigert não pudera fazer mais que isso. A videofita ainda continha
imagens do regresso da última corveta, de volta de sua missão muito especial.
Depois disso, foram apresentados os três gigantescos kalups, que se encontravam
depositados em compartimentos especiais da plataforma-estaleiro redonda, com seu
gigantesco campo de pouco. Snigert explicou cada detalhe da nave de aprovisionamento,
descrevendo ainda toda a aparelhagem da nave espacial.
Somente um ponto, a princípio, ficara sem menção. A parte de imagens da videofita
chegara ao fim, antes de Rhodan ficar sabendo o que queria saber: Onde a nave fora
escondida? Naturalmente Snigert pensara nisso. Era a notícia mais importante que ele
deixara para trás, para os homens da Crest.
Depois da descrição técnica da carga e das instalações, o Major Snigert reapareceu
na tela de imagem, em dose. Para Atlan, parecia que aquele homem alto, forte, acabaria
entrando na sala de projeção.
— Eu tomei o máximo de cuidado para descrever os acontecimentos
minuciosamente, sempre na esperança de um dia ser ouvido pelos senhores. Se este for o
caso, somente existe ainda uma pergunta muito importante para a tripulação da Crest:
Onde poderá encontrar a minha nave?
“As medidas de segurança, que tomamos contra a descoberta dos
memotransmissores colocados, parecem suficientes. Esta, pelo menos, é a opinião do
Major Gus Barnard, chefe do corpo técnico-científico a bordo da Dino-3. Também não
duvido que apenas os telepatas Gucky e John Marshall poderão ouvir os impulsos de
chamada. Também é praticamente impossível que alguém, se descobrir por acaso um dos
aparelhos — isto é, sem meios telepáticos — possa abrir o cilindro à força, sem destruí-
lo.
“Apesar disso, eu me questiono se seria aconselhável confiar ao cilindro notícias
que mencionassem claramente o novo local em que se encontra o tender. Por isso, decidi-
me por uma terceira medida de segurança, dizendo-lhes simplesmente uma informação
em código. A mesma diz respeito a um sol relativamente desconhecido, que, entretanto,
será facilmente reconhecido e encontrado, com os seus conhecimentos. Um estranho
estará diante de um mistério. Até mesmo se tivesse conseguido ouvir esta fita sem
problemas.
“Especialmente o Lorde-Almirante Atlan não terá problemas em deduzir, da
palavra-código, qual o sol que se refere à mesma, e onde o mesmo poder ser encontrado.
Como único detalhe maior dou a conhecer que o astro em questão, no tempo normal,
serve de reservatório de energia e ponto determinante da posição cosmonáutica da
estação da USO.
“Tenho que contar com a possibilidade de que o Lorde-Almirante não se encontra
mais a bordo da Crest. Por isso, informo aos cosmonautas da Crest que o código do astro
por mim escolhido está contido na computação especial secreta da nave. Com a entrada
do código dado, o computador informará onde poderão encontrar minha Dino-3. E aqui
vai a combinação numérica. Prefiro apresentá-la em imagem, para que não haja nenhum
erro possível.”
A voz do morto emudeceu. Uma tabuleta plástica apareceu, com letras e números
grandes, muito legíveis. Atlan olhava, fascinado, para a tela de imagem:

“E-CK-121288-31”

E isso era tudo que o Major Snigert queria comunicar. Ele apareceu uma vez mais
no filme e declarou, para finalizar:
— Deus queira que os senhores tenham me ouvido. Não temos mais nenhuma
possibilidade de abandonar a galáxia. Portanto vamos tentar concluir nossas vidas em
calma e paz. Nossa tarefa mais importante, agora, é a de conservar os aparelhos, tão
importantes e vitais para os senhores, de tal modo que possam passar quinhentos anos
sem deterioração. Eu agora darei partida para nossa nova posição indicada.
“Quando encontrarem a Dino-3, por favor, verifiquem na sala de comando. Ali
deixarei mais uma videofita, gravada com notícias e informações detalhadas, além de
dados secretos. Uma placa mostrará claramente onde a mesma foi guardada. Desejamos
tudo de bom aos homens da Crest. Encontrem o astro que agora passaremos a orbitar.
Tenho fundadas esperanças que o tender não será rastreado. Caso, entretanto, não mais o
encontrarem, é porque o destino golpeou-nos fatalmente. E nós, apesar de todas as
medidas de segurança tomadas, fomos destruídos. Neste caso, perdoem-nos nossa
incapacidade de fazer-lhes chegar os aparelhos tão necessários. Fizemos tudo que estava
em nossas forças.”
Com isto, o comandante do pesado transporte da frota, Dino-3, despediu-se. O filme
terminara. As luminárias foram acesas.
Os homens continuaram em silêncio. As notícias dos mortos deixaram todos
profundamente perturbados.
Rhodan foi o primeiro a levantar-se, e, antes de mais nada, colocou-se diante de um
videofone.
— Mensagem para todos: Os senhores ouviram Gerald Snigert. Espero que o tender
continue orbitando este sol. A... sim, o que é que há?
Ele virou-se e olhou para Atlan, que se aproximara dele. Atlan observou, fazendo
força para mostrar-se calmo:
— Eu decifrei o código. Como sabe tenho uma memória fotográfica. E-CK-121288-
31 é o código para o sol, sem planetas, verde-claro, Profus, que, no tempo real, é orbitado
por uma estação da USO, do mesmo nome. O astro continua no centro galáctico, a 11.417
anos-luz de Kahalo. O setor foi muito bem escolhido por Snigert. Ali jamais há tráfego de
naves. A Estação Profus da USO serve como posto de observação adiantado, perto do
front dos blues. Eu tenho como altamente provável que a Dino-3 não foi descoberta. Era
isto que eu queria comunicar-lhe.
Atlan recuou. Perry respirou fundo. Seu rosto avivou-se visivelmente. Ele agora era
novamente aquele terrano carregado de energia, que jamais dava para trás, a quem todos
admiravam e amavam.
— Nada tenho a acrescentar às explicações. Partiremos dentro de meia hora, para
um vôo linear direto. Coronel Rudo — acho que, por prudência, indague da computação,
depois indique o rumo para o vôo ao astro mencionado. Isso é tudo. Obrigado.
Depois que Perry desligou, começou a bordo da Crest a mais animada discussão já
havida, há meses. A ação de Snigert era elogiada por todos. Ele e os seus homens não se
resignaram fazendo de tudo para que a Crest ainda recebesse os kalups tão necessários
para substituir urgentemente os que estavam em vias de exaustão.
Depois de exatamente trinta e um minutos, a Crest iniciou sua viagem. Os dados
fornecidos por Atlan demonstraram serem absolutamente corretos.
O astro E-CK-121288-31 era o sol Profus, verde e sem planetas.
6

Naturalmente a Crest estava em alerta total de combate. Naturalmente cinco mil


homens estavam atentos à menor indicação de perigo, e naturalmente cinco corvetas, sob
a chefia de Don Redhorse, encontravam-se em missão de reconhecimento no espaço.
Diretamente ã frente, ainda um bilhão de quilômetros distante, brilhava um sol
verde-pálido. Apesar da pouca distância, a luz do pequeno corpo celeste era dominada
pelo cintilar e rebrilhar do gigantesco mar de estrelas, que aqui, no centro da Via Láctea,
alcançava uma densidade imensa.
Para os olhos aquilo era uma visão fascinante, que testemunhava da grandeza da
criação e de quanto era minúsculo o indivíduo.
Para os cosmonautas da Crest, entretanto, essa densidade de sóis solitários, estrelas
duplas e constelações múltiplas, não era absolutamente apenas uma coisa bonita. Já
apenas as linhas de força energéticas eram um problema em si. Tempestades magnéticas
de intensidades fantásticas atacavam a nave cósmica. Flutuações gravitacionais ricas em
energia, e inteiramente inesperadas e incalculáveis, surgiam tão inesperadamente, que até
mesmo um gigante do tamanho da Crest podia acabar em perigo.
Ninguém gostava de voar no centro galáctico. Apesar de toda a beleza e
grandiosidade, ninguém gostava. As nuvens de gás, de alta rotação, muito densas e em
parte em plena reação atômica, eram ainda outro fator de perigo.
O sol verde Profus pertencia ao tipo de corpos celestes que se situam no centro de
nebulosas de gases quentes. Este, aliás, era o motivo por que este setor só recebia naves
especiais muito raramente, e quase sempre por acaso.
A Crest encontrou o seu caminho baseado nos inúmeros mapas e documentos,
preparados no tempo real por mais de quinhentas naves de reconhecimento da frota
terrana.
Redhorse desaparecera com suas corvetas há várias horas. Ele recebera severa
proibição de usar o rádio. Até mesmo se ele pudesse utilizar o seu transmissor à vontade,
seria duvidoso que fosse ouvido a bordo da Crest. Tempestades energéticas de quinta
dimensão, ainda desconhecidas algumas centenas de anos atrás, e que ficavam além da
capacidade de percepção física, tinham o efeito de fontes de interferência de força
intransponível.
A Crest voou em torno das nuvens gasosas que tinha à frente, com dez por cento da
velocidade simples da luz, ultrapassou uma nuvem de matéria, especialmente perigosa,
através de uma manobra linear de onze segundos de duração e depois continuou
deslizando para dentro da incomensurável densidade estelar que havia diante de Profus.
A uma velocidade não diminuída, o sol que tinham por meta devia ser alcançado em
cerca de dez horas de tempo normal. Redhorse tinha avançado em vôo linear direto.
O rastreamento à distância sofria interferências constantes. Especialmente uma
ultragigante azul, que no momento cuspia protuberâncias violentas, era um grande fator
de interferência.
Do tender da frota não havia sinal. A bordo da Crest os homens ficavam cada vez
mais silenciosos. Os receios de Snigert de que poderia ser rastreado e destruído pareciam
cada vez mais prováveis.
Quinhentos anos eram muito tempo. Este tempo somente se reduzia a um valor
ainda mal perceptível, quando era dominado com a ajuda de um campo de zero absoluto.
Uma hora mais tarde, Redhorse ainda não dera notícias. Entretanto também não
havia indícios de que houvera algum encontro com o inimigo. Provavelmente ele voara
até muito próximo do sol — o mais próximo possível — para procurar o tender,
utilizando diversas órbitas em torno do astro. Rhodan não acreditava que Snigert pudesse
ter escolhido uma órbita muito estreita, para utilizar completamente a proteção contra
rastreamento, oferecida pelo sol. Isto exigiria, em quinhentos anos, um potencial
energético da nave, de proporções imensas. Sem um campo energético de proteção,
nenhuma espaçonave poderia aproximar-se de um sol, como seria de desejar-se,
taticamente.
Atlan também ocupava-se com o problema. Ele girou na sua cadeira e tocou Perry
com um dedo.
— Redhorse provavelmente está procurando perto demais do sol. Eu não posso
imaginar que Snigert tenha escolhido uma órbita de destruição. Um homem como ele
jamais teria confiado, sem restrições, em seus computadores — pelo menos não durante
um espaço de tempo destes. Os reatores de força teriam que funcionar ininterruptamente.
Acho que devíamos avançar mais rapidamente. Sou de opinião que...
Atlan foi interrompido pelo chefe do rastreamento.
— Corveta se aproxima! — gritou Notami, agitado. — Nave de sessenta metros,
sinais de reconhecimento corretos, com controle de reatores de propulsão. Toques de
intervalos, três curtos, quatro longos, depois reversão total. Rastreadores de impulsos
estranhos registram aparecimento de ondas de rastreamento. A corveta nos tem nas suas
telas de imagem em relevo. Desligo.
Dez minutos mais tarde, a nave espacial que se aproximava em alta velocidade pôde
ser reconhecida. Era a KC-4, sob o comando do Capitão Finch Eyseman.
Rhodan deu ordens para apanhar a corveta na eclusa, e pedir depois a Eyseman que
se apresentasse imediatamente na sala de comando.
A KC-4 executou uma manobra de ajustamento de primeira classe, aproximando-se
por trás e chegando à velocidade da Crest, ao alcançar a nave-mãe. Depois disso, não
havia mais problema para puxar a corveta para dentro da eclusa do hangar, com a
utilização do raio de tração.
Depois que a manobra, muitas vezes testada, havia terminado, o berreiro de
Eyseman já podia ser ouvido através do intercomunicador interno. O oficial, cujos olhos
castanhos, suaves, levavam um observador que não o conhecesse melhor a achá-lo um
sonhador, parecia extremamente agitado.
— ...a encontramos! — gritou ele pelos alto-falantes. Rhodan estremeceu,
segurando com mais força o encosto de sua poltrona. Os seus olhos chegaram a ficar
arregalados, com o inesperado daquela declaração que trazia tantas esperanças. — Sir,
nós achamos a Dino-3! — berrou Finch, novamente. — Ela se encontra orbitando muito
mais afastada do sol do que imaginávamos. Órbita das grandes, sir. Nenhum campo
energético de proteção nem nada que pudesse ser considerado como arma de defesa,
nada. Aliás, nós não pousamos. É possível que na plataforma-estaleiro existam robôs de
defesa instalados, que atirariam em nós, como visitantes estranhos. Eu...
— O melhor é que o senhor, antes de mais nada, venha até aqui, à sala de comando
— gritou Rhodan, não menos agitado. — Finch, o senhor lavou os pés?
— O quê...?
— Eu queria beijá-los. De alegria!
— Acho melhor não, sir. O Major Bernard racionou nossa água. Não posso garantir
nada. Já estou indo, sir!
Atlan sorriu, divertido, quando Rhodan olhou para os seus próprios pés, franzindo a
testa.
— Acho que você também não está melhor — resmungou Perry- — Os seus
certamente também não estão mais limpos. Que importa! O principal é que encontramos
a Dino-3. É inacreditável. Há cerca quinhentos anos ela está orbitando este astro sem
importância. O... Eyseman parece estar mesmo com pressa.
O jovem capitão entrou na sala de comando, tropeçando num degrau do pódio de
controles, e caindo contra as pernas de Rhodan.
Finch ficou muito vermelho, encabulado, pois Rhodan não pôde deixar de dizer.
— Ao que me lembro, quando de sua apresentação, da primeira vez, em minha ex-
nave-capitânia, o senhor também fez uma curvatura muito profunda. Esta é uma sua
característica pessoal?
Finch estendeu a mão, em silêncio, entregando a Perry o rolo de filmes, tomado
durante a missão.
Dez minutos mais tarde a videofita já estava sendo apresentada. Na tela de imagens
apareceu algo disforme, feio mesmo, que só com muito boa vontade podia ser chamado
de nave espacial.
Era o pesado tender da frota Dino-3. O mesmo consistia praticamente de uma
plataforma redonda, com um diâmetro de dois mil metros e uma espessura de
quatrocentos metros. Num dos seus costados havia sido acrescentada uma esfera de
setecentos e cinqüenta metros de diâmetro. Parecia que alguém havia colado uma nave de
combate, da classe Stardust, na borda de um disco voador.
Esta era a célula de comando, de abastecimento e de alojamento, na qual também
haviam sido instalada a maior parte dos impulsores normais. Ao mesmo tempo aquela
célula esférica era a cabeça da curiosa nave, pela qual era determinada a sua direção de
vôo.
A plataforma-estaleiro, na qual até mesmo um ultragigante da classe Galáxia podia
pousar, estava vazia. Somente as marcações coloridas dos campos de pouso individuais e
os contornos muito fortes dos inúmeros elevadores de carga destacavam-se nitidamente.
Nas bordas do disco erguiam-se estruturas que pareciam corcovas. Elas faziam parte das
instalações extrabordo do estaleiro e podiam ser roladas para fora, à vontade.
Dentro daquele disco de quatrocentos metros de grossura, um compartimento de
carga enfileirava-se ao lado de muitos outros. Aquilo que a Crest tinha de menos, a Dino-
3 tinha em demasia: Ou seja, possibilidade de acomodar cargas e materiais até uma
capacidade total de setecentas mil toneladas. A isso juntava-se ainda um estaleiro-robô
completamente instalado com o que havia de mais moderno na técnica da construção
naval espacial.
— Tudo intacto, ao que parece — informou Eyseman, quase sem fôlego. — Aqui e
ali os senhores podem ver lugares especialmente brilhantes, na célula esférica e na
plataforma de carga. Ali, parece que aplicaram jatos de plástico. Eu aposto minha cabeça,
sir, que, dentro da nave, as coisas ainda devem estar melhor. Afinal, os homens do tender
tiveram muito tempo para conservar em boas condições as instalações importantes e
sobretudo a sua carga preciosa. Como o tender, além disso, se encontrou constantemente
em pleno espaço, jamais sofrendo as influências do tempo, eu acho que...
— Agora o senhor vai calar essa boca — avisou Rhodan. — Finch, o senhor está
fora de si. Onde é que ficou a sua famosa calma?
O capitão suspirou. Ele ainda poderia continuar contando coisas, horas a fio...
— Apesar disso, ele tem razão — interveio Atlan. — Snigert não deixou nada ao
acaso. Nós vamos ter que abrir esta lata de sardinhas em conserva de quinhentos anos,
antes de mais nada. O que é que você ainda está esperando?
Meia hora mais tarde, a Crest tomava o eu rumo, chegando à órbita do tender,
designada por Eyseman, com uma manobra linear.
Duas das corvetas de Redhorse foram rastreadas imediatamente. As espaçonaves
aceleraram, e vieram, diretas, em direção à nave-mãe.
A Dino-3 estava do outro lado do sol. A distância constante era de setecentos
milhões de quilômetros.
Rhodan disparou com a nave, passando a pouca distância do sol, deste modo
cortando ao meio a órbita, parou, e tomou uma rota de colisão. Dez minutos mais tarde
surgia o tender.
A manobra de aproximação de vôo era uma coisa de rotina para os homens da
Crest. Quando a nave, com velocidade perfeitamente ajustada, pairou por cima da
plataforma do tender, e seus contornos se destacavam nitidamente do negrume do vácuo,
quarenta corvetas deslizaram para fora das grandes eclusas da Crest.
O chefe da flotilha e o comandante receberam ordens para voar num
reconhecimento distante, para garantir a nave-mãe de surpresas que poderiam surgir do
espaço.
Somente depois disso, Rhodan mandou deslocar um jato espacial. Os teleportadores
já se encontravam a bordo do tender. Gucky informava, através de John Marshall, por via
telepática, que realmente havia um dispositivo de segurança, que ele, entretanto, já
desativara. Um paratransmissor exigira dele a menção do ano em curso, o nome do
comandante da Crest bem como o seu próprio nome e posto.
Estes minutos críticos já haviam sido notados a bordo da nave-capitania. No tender,
de repente, os reatores haviam começado a funcionar. Provavelmente o computador
principal, cuidadosamente programado, teria aberto fogo imediatamente, se Gucky não
tivesse transmitido os dados corretos na sua freqüência pessoal.
Rhodan, Atlan, Icho Tolot, o físico-chefe, Dr. Holfing, e o engenheiro-chefe, Major
Hefrich, puseram os pés na plataforma, depois dos teleportadores.
De repente, um dos holofotes da borda da plataforma acendeu-se, e uma voz saiu
dos alto-falantes, como um trovão, fazendo com que os homens estremecessem.
— Esta é uma gravação em fita, feita pelo Major Gerald Snigert, e ligada
automaticamente pelo computador. Ao ouvirem minha voz, os senhores foram
reconhecidos pelo computador de segurança, como proprietários de direito do tender. Eu
os saúdo em nome da humanidade. Conseguiram chegar. Por favor, dirijam-se à sala de
comando. O computador certamente lhes será de auxílio. Bem-vindo a bordo, Perry
Rhodan.
Eles caminharam, em silêncio, através do grande campo de pouso, de brilhantes
placas de aço. Diante deles surgia a esfera enorme da célula de comando.
Escotilhas de aço abriram-se automaticamente. O teleportador Ras Tschubai
materializou perto dos homens e fez-lhes um sinal, sem nada dizer.
Assim eles atravessaram a eclusa, na qual, depois de cerca de quatrocentos e
cinqüenta anos, pela primeira vez ouvia-se um som.
A voz de um robô fez-se ouvir.
— Fala o computador principal da sala de comando. A não ser os compartimentos
de carga da plataforma-estaleiro, os recintos da célula de comando estão sendo
novamente providos com ar respirável. Todas as instalações funcionam adequadamente.
Pequenos danos, em sua maioria consistentes de relês queimados, são trocados pelos
robôs-mecânicos. Bem-vindos a bordo.
O engenheiro-chefe Hefrich e Rhodan conheciam a construção do tender.
Encontraram o caminho para a sala de comando. A mesma ficava, como nas naves de
combate, no ponto de intersecção dos eixos. Exatamente no centro da grande esfera.
Quando as portas blindadas deslizaram para os lados, eles viram os restos mortais
de um homem.
Ele repousava na cadeira giratória de um dos pequenos consoles de controle, que
ficava bem no meio da sala de comando, que media apenas doze metros no seu diâmetro.
Diante dele, agregavam-se, em toda a volta, os aparelhos de comando.
Ele vestia um traje espacial, aparentemente vazio de ar, que devia ter perdido a
pressão, logo depois da morte. Deste modo, ocorrera uma mumificação do corpo. E
mesmo agora, depois dos recintos terem recebido novamente sua atmosfera respirável de
oxigênio, ele não fora atacado.
Rhodan aproximou-se. Perturbado, ele olhou o rosto encovado de um homem alto,
que, em vida, devia ter sido um huno. Cabelo grisalho aparecia debaixo do capacete
esférico transparente do traje espacial. O distintivo e a plaqueta com o nome no ombro
direito indicavam que se tratava do Major da Frota Solar Gerald Snigert.
Atlan só conseguiu dominar a sua emoção a muito custo. Este terrano tudo fizera
para ajudar os homens da Crest. Ele, inclusive, conseguira morrer como último homem
da tripulação. A sua mão direita, estendida, apontava para um grande cartaz de plástico.
O mesmo havia sido colado num console de controles, e fora escrito em tinta vermelha.
Bem-vindos. Não se importem com o que estão vendo e que deve ter sobrado de
mim. Nós vivemos muito bem. A videofita mencionada, com as últimas notícias,
encontra-se guardada na caixa-forte da central de comando, hermeticamente fechada, à
esquerda, perto da passagem que vai dar no armazém de ferramentas. Os homens que
morreram antes de mim encontram-se em caixões de plástico, hermeticamente fechados.
Os senhores irão encontrá-los no hangar de corvetas no 1.
Rhodan leu aquelas palavras com um tremor na voz. Icho Tolot quis retirar o
comandante morto de sua poltrona, para deitá-lo num dos leitos pneumáticos.
— Não, não, antes de mais nada deixe-o descansar aí mesmo — disse Rhodan. —
Compreenda, Tolot — esse era o seu lugar. Que fique com ele, pelo tempo que for
possível. Dr. Hefrich — chame a Crest e dê ordens para que mandem os pelotões de
trabalhadores.
Depois disso, Perry virou-se e encaminhou-se ao cofre-forte da parede. Snigert o
pintara num vermelho-laranja, para que fosse fácil encontrá-lo.
Atlan saiu da pequena sala de comando. Ele queria ficar sozinho, para pensar
melhor naquele homem que executara a sua missão, em silêncio, e tão longe do seu
mundo natal. Isto era o que o arcônida entendia como um verdadeiro ato heróico.
***
As fitas de vídeo-gravação continham as cenas mais importantes da história do
tender da frota, Dino-3. Podia ver-se como todas as instalações de máquinas, controles,
computadores e depósitos de provisões e peças eram lacradas com um revestimento de
paronplástico.
Os homens do tender haviam trabalhado, semanas a fio, usando pistolas a jato,
tendo consumido praticamente todo o plástico de revestimento existente a bordo. Em
conseqüência disso, a Dino-3 realmente transformara-se numa espécie de gigantesca lata
de conversas, na qual nada poderia sofrer a influência do tempo. Aliás, os módulos de
construção utilizados eram constituídos de materiais completamente imunes a danos
provocados por temperaturas, e qualquer outro tipo de deterioramento. Em parte alguma
encontrara-se traços de ferrugem. Até mesmo os isolantes dos fios das instalações
elétricas haviam se mantido inalterados. Era possível, sem problemas, usá-las, passando-
lhes uma voltagem de mais de trezentos mil volts de alta-tensão.
Snigert informava, na sua maneira de ser conscienciosa, sobre o destino de cada um
dos seus homens. A sua causa-mortis, e sobre a vida a bordo, na solidão. Aqui e ali um
planeta próximo havia sido visitado, para dar oportunidade aos homens de, mais uma vez,
respirarem ar natural e tomar água limpa de fonte. Depois, sempre haviam voltado para
bordo. Por questões de segurança, eles haviam desistido de construir casas nesses
planetas, e plantar jardins. E este fora um grande sacrifício.
Somente uma coisa não ficara esclarecida! A Dino-3 tinha uma tripulação total de
setenta e cinco homens. Faltavam trinta e um homens. Tratava-se, preponderantemente,
de membros do corpo técnico-científico, entre os quais havia conhecidas capacidades.
Somente ao fim da gravação de vídeo, houve um esclarecimento do Major Snigert.
Ele informou que o chefe técnico da expedição, Major Gus Barnard, depois da
conservação do tender, saíra com uma das três corvetas, para tentar superar, sem um
envelhecimento notável, o tempo de espera de quinhentos anos, com um vôo de dilatação,
pouco abaixo do muro da luz.
Barnard batizara esta corveta com o nome da primeira nave cósmica terrana, Good
Hope — Boa Esperança.
Como cosmonauta-chefe da nave, o ex-primeiro oficial do tender, Capitão Rog
Fanther, também embarcara na Good Hope. Um sol, distante cerca de duzentos e
cinqüenta anos-luz, fora a meta escolhida, para onde deveriam voar em velocidade
aproximada da da luz. Depois da chegada ao destino, uma manobra de regresso estava
planejada, para a Dino-3, com velocidade também de alta relatividade.
Snigert informou que permitira a expedição, depois do término dos importantes
trabalhos de conservação. Dizia que se devia ficar atento à chegada da Good Hope. O vôo
de dilatação de referência vinculada fora calculado de tal modo que a Good Hope,
deveria estar no tender pelo menos seis semanas antes da chegada, em tempo, da Crest.
Os cientistas da Crest refizeram os cálculos, usando os dados apresentados. Os
mesmos estavam cem por cento corretos — com a diferença, apenas, que a Good Hope
não estava onde devia estar.
Apesar disso, Rhodan enviou dez corvetas, para seguir a conhecida rota da viagem.
Os comandantes deviam tentar rastrear a nave chegando com alta velocidade relativa, e
voar num curso de adaptação.
Dois dias depois, ainda nada acontecera. Icho Tolot calculou as probabilidades de
acidentes, com uma chance em vinte a favor da tripulação. A possibilidade de naufragar,
nesta incrível aglomeração estelar, numa tão alta velocidade normal, era muito elevada.
Rhodan perdeu todas as esperanças. Ordenou que fosse celebrado um culto aos
mortos, lançando seus despojos mortais ao espaço infinito.
Depois disso, começaram os trabalhos de restauração, com alta pressão. As
instalações das máquinas do tender foram liberadas da camada de paronplástico, com
solventes adequados. Cinco dias mais tarde, já pôde ser efetuada a primeira experiência
de funcionamento.
Os bens de provisões foram levados a bordo da Crest. Ela pousara na gigantesca
plataforma. Um campo energético em forma de balão, protegia tanto a nave como a
plataforma do tender, envolvendo-os inteiramente, contendo uma atmosfera bem
temperada, dentro da qual era possível trabalhar-se sem trajes de proteção.
Os homens de Hefrich atacaram os três formidáveis kalups, que estavam
depositados, de pé, nos recintos especiais de carga, da plataforma-estaleiro. Todos os
contatos haviam sido previamente preparados. Nada mais havia a fazer que empurrar para
fora da Crest os conversores queimados e transportar os aparelhos, novos de fábrica, com
um alcance total de 1,2 milhões de anos-luz, para os pavilhões de conversores do
ultracouraçado.
Entretanto, por ora não se podia pensar nisso. Os dois conversores-reserva da Crest,
ainda não totalmente usados, tinham que ser utilizados até esgotar sua total capacidade,
antes de se poder efetuar a troca.
A capacidade das duas máquinas da Crest, e o fornecimento restante do kalup n o 1,
já bastante exigido, eram absolutamente necessários para levar-se a nave com segurança
até a Nebulosa de Andrômeda.
O Departamento Técnico calculou o alcance ainda utilizável dos kalups da nave em
novecentos e dezoito mil anos-luz. Como fator de segurança deduziram-se dezoito mil
anos-luz. Esta distância correspondia também ao alcance do tender da frota Dino-3, que
também dispunha de três kalups.
A finalização dos planos previa efetuar-se, com ambas as naves, trinta vôos de
intervalos cada um de trinta mil anos-luz, para dentro do espaço cósmico. Ao chegar-se
ao limite do rendimento, a Crest novamente pousaria na plataforma, e se começaria a
troca dos kalups, em pleno espaço, entre as galáxias.
Os restantes quinhentos e cinqüenta anos-luz até os limites da Nebulosa da
Andrômeda poderiam, então, serem deixados para trás, sem problemas, com a utilização
dos novos kalups. Os seiscentos e cinqüenta mil anos-luz remanescentes da reserva
calculada eram suficientes para quaisquer manobras de vôo, dentro da segunda galáxia.
Conforme estes planos, o trabalho era executado. Precisaram de cerca de duas
semanas, tempo-padrão, até que as instalações da sala de máquinas do tender e da Crest
tivessem sido examinadas até o menor detalhe. E então o ponto da partida dupla se
aproximou.
As corvetas foram ordenadas de volta para bordo, e entraram nas eclusas. Da nave
da Dino-3, que fizera a viagem no tempo, a corveta Good Hope, não se encontrara
qualquer indício. Tanto a nave como sua tripulação eram tidas como perdidas com cem
por cento de probabilidade.
E então Perry Rhodan ordenou a partida para o dia 1 o de setembro de 2.404, tempo
normal.
O Tenente-Coronel Brent Huise foi designado comandante do tender-estaleiro. Com
ele seguiram cinqüenta homens da tripulação normal da Crest e dos departamentos
técnicos e cosmonáuticos. Engenheiro-chefe passou a ser o Capitão Marco Finaldi, um
terrano que, na nave-capitânia, funcionava como segundo engenheiro.
Os homens já estavam familiarizados com o tender, através de inúmeros vôos
experimentais, efetuados sob a proteção de fogo das corvetas. Haviam ousado
complicadas manobras lineares, quando verificaram que podiam confiar plenamente na
excelente computação da nave especial.
A Crest estava novamente totalmente equipada. Até mesmo água fresca havia sido
trazida de um planeta semelhante à Terra.
O comboio partiu conforme programado. Não era possível esperar-se, por mais
tempo, pela Good Hope.
7

A viagem através da “terra de ninguém” entre as galáxias era um problema de


cálculo com um fator desconhecido — e um empreendimento muito arriscado.
Para os homens da Crest e para o tender Dino-3 que lhe vinha bem perto, nos
calcanhares, valiam outros critérios. Havia apenas uma meta, que tinha que ser alcançada
em qualquer circunstância e enfrentando todos os riscos, ou seja, a Nebulosa de
Andrômeda, a 1,45 milhões de anos-luz de distância.
Considerando-se ligeiramente os dados existentes, sobretudo os detalhes técnicos, a
viagem através do nada absoluto não parecia tão cheia de riscos como poderia tornar-se,
pelo acontecimento de uma única falha. Esta falha tinha que ser evitada.
A moderna Crest III e o também moderno tender Dino estavam equipados com
conversores de compensação kalup, da mais moderna construção. Eles eram conhecidos
como à prova de manipulações errôneas, e tinham apenas um único defeito — ou seja —
após determinado tempo em uso, tornavam-se inteiramente obsoletos.
Este tempo de funcionamento não era expresso do modo habitual, em horas, porém
em anos-luz deixados para trás.
Valores de tolerância até oito por cento mais ou menos eram produzidos através das
elevadas cargas máximas de compensação.
Com isto, haviam começado as discussões técnicas a bordo da Crest III. O fator de
força máxima ainda exigível dos kalups ficava num valor de absorção de campo que
possibilitava uma velocidade de viagem em dimensão intermediária, que ficava por sua
vez cem milhões de vezes acima da velocidade simples da luz.
Um vôo-100-Mega de ultravelocidade da luz, entretanto, já não era mais uma
viagem, mas sim uma manobra de risco para comandos experimentais cansados desta
vida. Rhodan, até agora, só escolhera esta escala de velocidade quando a existência da
nave dependia da mesma.
Uma velocidade de vôo cinqüenta por cento reduzida, de 50-Mega ultravelocidade
da luz, entretanto, até agora, fora absorvida sem qualquer problema por qualquer kalup.
Era possível armazenar este valor, como escala de exigência contínua, na computação de
funcionamento normal.
Por isso, Rhodan decidira-se a deixar para trás os novecentos mil anos-luz até o
ponto X previsto, num setor do espaço, onde a troca dos kalups queimados devia ser
processada, utilizando uma velocidade de 50-Mega ultravelocidade da luz.
O tempo de vôo calculado, de acordo com padrão de bordo, e sem fenômenos de
dilatações relativísticas, era de 148.8 horas.
Este era simplesmente um valor ideal teórico, que somente poderia ter sido atingido
se ambas as naves tivessem voado ininterruptamente com uma velocidade de cinqüenta
milhões de vezes ultraluz.
Na prática, entretanto, os valores ideais nunca aconteciam.
A duração de carga constante, ainda exigível de um conversor kalup, era de seis
horas, num valor de absorção de campo de 50-Mega-VUL.
Rhodan não podia permitir-se exigir tudo de suas máquinas. Caso o tender tivesse
um problema de máquina no espaço linear, por isso tendo que interromper a manobra, ele
estaria perdido para o todo e sempre para a Crest, que continuaria adiante na sua
velocidade indescritível. Ao contrário, as condições teriam o mesmo efeito.
Por isso os saltos intermediários de trinta mil anos-luz haviam sido estipulados. Para
vencer esta etapa, as naves precisavam, a uma velocidade ultraluz de 50-Mega, um
espaço de tempo efetivo de 4,96 horas. Isto era uma hora menos do que os construtores
permitiam para uma emergência.
Caso Rhodan pudesse permitir-se iniciar, imediatamente, o vôo da etapa seguinte,
depois do término de cada uma das manobras de intervalos, as duas naves, na realidade,
não necessitariam mais de 6,2 dias, para alcançar o ponto X, a uma distância de
novecentos mil anos-luz.
Rhodan, entretanto, não podia assumir este risco. Nenhum comandante se deixaria
levar a uma loucura técnica desse quilate. Nem mesmo no tempo real, e perto de bases de
apoio da frota, muito bem equipadas, e que, em caso de emergência, poderiam ajudá-lo.
Um comandante que queria atravessar o espaço vazio entre duas galáxias tinha que
ser ainda mais cuidadoso.
Isso significava, na prática, que cada máquina teria que ser examinada e controlada
minuciosamente, após cada etapa voada. Especialmente os elementos do circuito
sinusoidal dos kalups precisavam de uma atenção maior. Caso eles falhassem numa
manobra linear, a queda entre as dimensões tinha que ser interrompida para um regresso
imediato ao espaço normal. Uma intercomunicação de rádio com a outra nave, nesse
caso, era impossível.
Por isso era imprescindível que as medidas para as revisões e inspeções fossem
muito minuciosas, e isso custava tempo — tempo de viagem. Pois incluíam também as
pausas de inspeção.
***
O vôo mais longo jamais empreendido por terranos começara, sem a utilização de
um transmissor solar, no dia 1o de setembro de 2.404 — tempo real.
Por etapa, foram propostas 4,96 horas de vôo e quinze horas de inspeção, em
conjunto, portanto, cerca de vinte horas para a distância de cada intervalo. Se tudo
corresse, como aconteceu durante as primeiras quinze etapas, a Crest devia chegar ao
ponto X depois de cerca de vinte e cinco dias.
A Via Láctea já se encontrava a uma distância de cerca de quatrocentos e cinqüenta
mil anos-luz para trás. As duas naves encontravam-se no espaço vazio — no vácuo —
que certamente merecia essa designação.
A galáxia natal já podia ser abarcada com a vista, em plena expansão. Brilhante e
cintilante ela pairava no negrume do infinito. Após cada etapa, ela tornava-se um
pouquinho menor, e, em contrapartida, o ponto luminoso da distante Nebulosa de
Andrômeda crescia um pouco mais.
Quinze vezes as duas naves cósmicas terranas haviam entrado no espaço linear.
Quinze vezes transcorrera o jogo ousado com as máquinas, com os nervos de cinco mil
homens a flor da pele.
Os otimistas já estavam declarando, entretanto, que todos se preocupavam demais.
Na realidade, os kalups funcionavam tão precisamente como se estava acostumado a vê-
los funcionar. A Crest já tinha atirado ao espaço o seu kalup-I, totalmente utilizado. O
processo demorara apenas três quartos de hora, pois, para isso, haviam trabalhado os
homens do birô de construções.
Por baixo de cada um desses complexos imensos havia uma espécie de duto de
instalação, que, como um elevador antigravitacional, atravessava a nave até o seu
abaulamento no pólo inferior, desembocando, ali, no espaço.
Deste modo, a nave-capitânia da frota agora já voavam com o seu segundo kalup, o
qual, entretanto, também já se aproximava do seu limite de funcionamento.
A Dino-3 que, por kalup, tinha apenas um alcance de trezentos mil anos-luz, voava,
também com o segundo aparelho, cuja capacidade já se consumira até a metade.
Realmente não parecia que houvesse necessidade de preocupações.
Somente poucos homens a bordo de ambas as naves compreendiam exatamente o
que na realidade se arriscava! Não se tratava do funcionamento exato e sem problemas
das máquinas, e sim do problema de manter-se ambas as naves num mesmo rumo.
Flutuações nos campos de compensação das naves gigantes depois das manobras de
mergulho podiam levar a deslocamentos de distâncias de quinhentos ou mais anos-luz.
Até agora a maior tolerância fora conseguida com quatro anos-luz. Depois de uma
transmissão de hiper-rádio, efetuada com sucesso, a Crest saíra para poupar a manobra de
ajustagem ao tender, difícil de manobrar.
Era uma luta com a velocidade, pois ela era responsável pelos deslocamentos de
posições.
Este problema, entretanto, era apenas notado pelos cosmonautas e engenheiros-
chefes. Rhodan também não pensava em esclarecer a tripulação, cada vez mais otimista,
de como seria fácil perder-se a Dino-3.
Se o transporte, por alguma circunstância, desaparecesse, a Crest estava perdida.
Disso não havia nenhuma dúvida.
A décima sexta manobra devia começar dentro de quinze minutos. Atlan entrou na
sala de comando. Ele vinha da sala de controle de máquinas, onde controlara,
desconfiado, os trabalhos de Hefrich.
Sentou-se perto de Rhodan, na cadeira giratória, jogando sobre a mesa as fitas de
plástico com os diagramas de rendimento.
— Cada vez acabo com mais inimigos — disse o arcônida. — Hefrich fica de
cabeça vermelha, basta eu tocar na porta do seu sacrário técnico.
Rhodan fez um gesto impaciente, nervoso.
— Como estão as coisas?
— Excelentes. Hefrich pode utilizar, mais uma vez, os elementos do circuito
sinusoidal. Nós devíamos reexaminar a sincronização de tempo de vôo com o tender.
— Já foi feito, ainda há pouco. Huise é um excelente cosmonauta. Nós entramos no
espaço linear no mesmo décimo-milionésimo de segundo. O computador principal
terminará o vôo ultraluz, também no mesmo décimo- milionésimo de segundo. Numa
avaliação humana a transposição de localização, desta vez, não poderia ser maior que
duzentos milhões de quilômetros. Mais estreitamente, certamente nós jamais vamos
consegui-lo.
— Nada além de uma distância de trinta mil anos-luz — concordou Atlan. — Esta
proeza, aliás, já é surpreendente.
Rhodan bateu três vezes na mesa de controles e disse:
— Logo que puder vou mandar embutir uma placa de madeira aqui. O que é que há,
Cart?
O comandante epsalense viera para a sala de comando, da central de
radiocomunicações. Também ele parecia cansado. Os homens do pessoal de chefia,
durante a última inspeção, num dos intervalos, haviam dormido um sono profundo de
doze horas, provocado bioquimicamente.
Apesar disso, o que era exigido dos seus nervos aparecia cada vez mais claramente
nos seus semblantes. O subconsciente começava a se revoltar.
— Parece que tudo está em ordem — disse o Coronel Cart Rudo, lançando um olhar
desconfiado para a tela de imagem da ligação em velocidade normal da luz. Via-se o
posto de comando da Dino-3, e, além disso, os mais importantes departamentos, em que
ficavam os kalups. — Brent Huise faz o seu trabalho conscienciosamente. Finaldi, como
engenheiro-chefe, também é muito bom. Apesar disso só me considerarei um homem
feliz, quando não estiver mais rebocando esta nave monstruosa no rastro dos meus jatos.
Mais quinze etapas — com todos os diabos! O que é que está fazendo, desse lado aí,
Henriky?
O epsalense dirigiu-se a um programador do grande computador principal, e
examinou as suas medidas.
Rhodan anuiu, pensativo. O seu sorriso parecia um pouco forçado.
— Está vendo, grande Imperador, homens de primeira também acabam se
cansando! Se me lembro de que no próximo vôo pode acontecer uma falha, o meu pulso
começa a bater mais forte. Nós estamos posicionados bem no fundo do vácuo — no
espaço vazio. O sol mais próximo fica na zona limítrofe da Via Láctea, a uma distância
de quatrocentos e cinqüenta anos-luz. Se o tender azedar no espaço linear, ou se isto
acontecer conosco, vamos precisar de uma sorte incrível para reencontrar o colega com o
hiper-rádio. Transmissões-allround, devido ao seu pouco alcance, nem vale a pena usar.
Se a distância ultrapassar apenas cinqüenta anos-luz, seremos obrigados a trabalhar com
feixe direcional, caso contrário dispersamos nossa energia de transmissão em todas as
direções. E experimente uma vez encontrar uma nave espacial com um feixe direcional,
se você não sabe onde ela se encontra. Desta vez estamos calculando com distâncias
imensas. Também não se pode pensar num rastreamento de energia ou de massa, sem
problemas, caso as naves estejam afastadas entre si mais de cem anos-luz. Para isso o
tender é pequeno demais para servir de objeto de rastreamento.
— Fique calmo, amigo.
— É fácil falar. Faço o possível para isso. Mais não posso fazer.
— Você devia seguir minha sugestão e, para todos os casos, substituir o kalup que
foi lançado ao espaço, por um aparelho novo. E agora, já! Não somente depois de
chagarmos ao ponto X.
— Para quê? Com isso também não chegamos até a Andrômeda. Também estou
considerando o impacto psicológico. Se nós pousarmos agora no Dino-3, e começarmos
com a transferência do kalup, os homens vão ficar nervosos. Olhe só nossos
responsáveis! Eles ficam nervosos cada vez que interrompemos os saltos. Não posso
aceitar sua sugestão, Atlan. Não é má vontade.
— Eu sei — declarou o almirante. Ele estava muito sério. — Vamos esperar que,
daqui para a frente, as coisas continuem dando certo. Na realidade não deveria haver
qualquer falha de peso. As quinze horas de pausa para as inspeções são mais que
suficientes para revisar tudo.
— Afinal, também temos que dormir e comer. Os técnicos estão trabalhando em
dois turnos. Mais depressa eu não viajo de modo algum. Nós temos tempo — muito
tempo.
— Engano seu — disse o arcônida. — Se fôssemos robôs, o tempo nada
significaria. Você mencionou o fator psicológico. Procure não derrubar sua própria teoria,
com sua repentina opinião de que nós temos muito tempo. Aí vem o impulso.
Rhodan passou as costas da mão na testa molhada de suor. O programa de
verificação e avaliação transcorreu com a exatidão do computador. Na determinação do
tempo, que tinha que ser exata até o décimo-milionésimo de segundo, foi levado em
consideração até mesmo o curto espaço de tempo que as ondas de rádio levavam até onde
se encontrava a Dino-3.
O tender estava parado a vinte e dois quilômetros, em diagonal, a estibordo, num
mesmo plano. E agora ele começou a aproximar-se lentamente. Chegou até três mil
metros de distância da Crest, ajustou a sua marcha com exatidão, e com isso conseguiu
que a distância entre as naves, na partida para a décima sexta manobra linear, fosse a
menor possível.
Mais perto, a disforme nave-plataforma não poderia ficar. Isso traria interferências
na estrutura dos dois campos dos kalups.
O controle final foi efetuado inteiramente pela computação. Quando a sincronização
chegou, os dois kalups de ambas as naves começaram a trovejar. A manobra podia ser
executada sem uma aceleração anterior da velocidade, pelos impulsores normais, uma
vez que ambas as naves cósmicas já voavam com dez por cento da velocidade simples da
luz. Isto era suficiente para poder erguer os campos de compensação sem a necessidade
de uma tomada inicial de velocidade.
Atlan notou, de repente, o curioso murmúrio e sibilar do espaço linear, no qual não
tinham validade as leis nem da quarta nem da quinta dimensão.
Ninguém era desmaterializado. Ninguém achava incômodo aquele vôo de cinqüenta
milhões de vezes à hipervelocidade da luz. Aqui valiam outras condições.
Os homens conservavam-se nos seus lugares. Nas telas de imagem havia escuridão,
que só raramente era cortada por um ocasional raio luminoso.
Somente na tela especial do rastreamento paraótico brilhava uma mancha diluída da
luz. Eram as irradiações hiper-gravitacionais da Nebulosa de Andrômeda, captadas pela
aparelhagem.
E agora nem o rumo nem a velocidade da Crest podiam mais ser modificados, ou,
com toda certeza, eles se perderiam da Dino-3.
Também era o mais ardente desejo de Atlan, finalmente poder dizer adeus ao
tender. Caso ele pudesse seguir a nave-capitânia até o ponto X, ele teria cumprido a sua
missão integralmente. E então ele teria, inclusive, que ser deixado para trás.
Depois disso, tudo pareceria bem melhor. A Crest estaria novamente em condições
de voar à vontade, sem estar atada às condições do tender. Se então surgisse alguma pane,
simplesmente a mesma seria considerada com um erguer de ombros, e reparada com toda
a calma. E também mudanças de rumo, não teriam mais qualquer importância.
Entretanto, ainda não chegara esse momento. A décima sexta etapa acabara de se
iniciar.
8

“Vinte e cinco de setembro do ano 2.404, tempo real. Conseguimos! Conseguimos,


apesar dos prognósticos sombrios que cientistas, técnicos e cosmonautas tinham
levantado, depois da vigésima oitava etapa. O terceiro kalup do tender da frota, Dino-3,
trabalhava, tal como antes, sem problemas, porém, na computação principal tinham
ocorrido problemas muito sérios. E ninguém contara com isso.
“Ficamos obrigados a fazer as duas viagens de intervalos com o computador de
reserva do tender, bem menor. E conseguimos alcançar o ponto X, com uma transposição
de mergulho de apenas onze e meio anos-luz.
“Nós nos aproximamos com a Crest, uma vez que a sua última máquina de vôo
ultraluz ainda funcionava mais ou menos. E agora a brava Dino-3 chegara ao fim dos
seus serviços. Depois da manobra de frenação, ela se encontra parada no espaço, e nós
pousamos, há duas horas atrás, na sua plataforma-estaleiro, para recuperar os três kalups
novos de fábrica, nossos conversores de compensação.
“Perry Rhodan ordenou uma pausa de descanso para dormir, de doze horas.
Somente poucos homens, entretanto, seguiram a ordem, que, aliás, fora pensada, mais
como sugestão apenas. A ambição entre os membros da tripulação da Crest tornou-se
uma espécie de doença. Cada um fazia questão de ajudar com todas as suas forças, para
transformar novamente a nave-capitânia, imprestável momentaneamente, para vôos
ultraluz, num instrumento que reagisse precisamente, como sempre fora, este orgulho da
construção naval espacial terrana.
“É inútil lembrar aos homens o desgaste de forças, ocorrido durante o longo vôo.
Todo o nervosismo que, em primeira linha, era o responsável pelo desgaste físico e
psíquico de todos nós, agora parece ter sumido inteiramente. Novamente estamos alegres,
contentes e confiantes. A Nebulosa de Andrômeda está agora a apenas quinhentos e
cinqüenta mil anos-luz de distância. Uma distância que poderemos vencer com o kalup-I
e uma parte do segundo conversor, com toda a facilidade. A hora de pensarmos na
conquista do planeta Vario e na nossa retransmissão ao tempo real está chegando cada
vez mais perto. Desligo.”
Atlan colocou o microfone de lado, e desligou o gravador de fita. O relatório estava
armazenado no Livro de Bordo.
O almirante olhou o seu relógio. Eram 13:31, hora de bordo. Em ambas as telas de
imagem da cabine, cintilava e brilhava uma mancha luminosa, que parecia um disco
chato, perpendicularmente dependurado no espaço.
Era a Nebulosa de Andrômeda. A galáxia natal agora era apenas ainda uma grande
mancha luminosa em meio a milhões de outras manchas. Cada uma delas era uma galáxia
com incontáveis bilhões de estrelas.
Além das distantes galáxias não se via mais nada. O negrume absoluto do espaço
vazio cobria o restante das telas de imagens, transmitindo uma impressão de angustiante
infinito.
Atlan desligou a aparelhagem de vídeo e dirigiu-se à eclusa de ar de sua cabine. A
Crest III parecia uma casa de loucos. Apesar de ser tão grande, que sua tripulação de
cinco mil homens acabava se perdendo nos seus recintos, o arcônida, de repente, teve a
sensação de que a nave se tornara pequena demais.
Por toda a parte ouvia-se gente gritando e falando. Robôs-operários da mais
diferente construção, deslizavam por esteiras rolantes, campos antigravitacionais e
mecanismos rolantes, através dos corredores de um quilômetro de comprimento.
Os elevadores estavam funcionando, por toda a parte a iluminação era total. A
instalação de vídeo-comunicação estava permanente ligada, e deste modo tanto comandos
como outras comunicações eram ouvidos através de toda a nave.
Quando Atlan pôs os pés num pequeno elevador antigravitacional, que levava aos
kalups, abaixo da sala de comando esférica, um trovejar reverberante sacudiu o corpo da
nave.
Os propulsores do tender haviam sido erguidos de modo um tanto negligente.
Minutos depois, Atlan deduziu do berreiro alegre de milhares de gargantas, que o campo
energético, em forma de balão, fora colocado em volta da Crest e do tender.
Os aparelhos fornecedores de ar da nave-estaleiro começaram a trabalhar. E
encheram o campo-balão com um ar respirável, previamente aquecido.
Quando Atlan, depois de uma rápida olhada nos recintos de alta energia, alcançou a
eclusa polar inferior, os primeiros técnicos já corriam, sem trajes protetores, pela
plataforma da Dino-3.
Um homem sorridente, todo sujo de graxa, colocou-se, premeditadamente, no
caminho do arcônida. Atlan teve que olhar melhor, para reconhecer, naquele indivíduo
sem qualquer indicação de posto, o Administrador-Geral do Império Solar.
Atlan engoliu em seco.
— Parece que, agora, vocês acabaram ficando malucos mesmo, não? Naturalmente
os senhores, bárbaros das cavernas, na sua típica leviandade terrana, são incapazes de
aguardar até que todas as preparações para a troca dos kalups forem efetuadas
normalmente.
— Levianos, por quê? — sorriu Rhodan, ainda mais largamente. — Eu mandei
jogar o kalup-III ao espaço, ainda antes de pousarmos na plataforma. Você naturalmente
nem notou isso?
Atlan engoliu em seco mais uma vez. Ele realmente não o notara.
— Alguém andou dormindo — gritou Cart Rudo, para os homens do outro lado. —
Imaginem só! Eu jamais me deixaria levar a fechar os olhos e dormir placidamente,
depois de terminarmos uma aventura perigosa, e esperar dormindo pela sua continuação.
— Isso dificilmente lhe seria possível, Rudo. Gente como o senhor, que tem olhos
como holofotes de halógeno, deviam desistir de dormir definitivamente.
Cerca de duzentos homens começaram a rir. O colosso epsalense encheu os
pulmões de ar, para retrucar de modo ainda mais malicioso, porém não chegou mais a
isso.
Aquela alegria transformou-se, repentinamente, num estarrecimento geral. Cinco
mil corpos enrijeceram. Nos rostos via-se uma tensão enorme. As mãos seguravam com
tanta força instrumentos de precisão, que os nós dos dedos tronavam-se salientes,
brancos.
O berrar das sirenes não podia deixar de ser ouvido.
Em seguida houve o uivar de apitos por toda a nave. Isso significava alerta geral.
— O... o oficial da vigilância ficou maluco? — gaguejou Rhodan. Os seus olhos se
abriram muito, incrédulos.
Atlan já estava correndo para a eclusa inferior da Crest. O arcônida nunca
perguntava pelo porquê das coisas. Antes mesmo dele saltar para dentro do elevador
antigravitacional, já a voz do segundo oficial cosmonauta, Major Jury Sedenko, fazia-se
ouvir, através de todos os alto-falantes, e nos rádio-capacetes.
— Alerta. Rastreamento de energia e de massa no Setor Verde, noventa e dois
graus, elevação vertical onze graus em relação ao plano dos propulsores equatoriais da
nave. Alerta, todos os homens nos seus postos de manobra. Abandonar tender, tripulação
originalmente designada permanecerá a bordo. Suspender campo energético-balão.
Central de bombeamento Dino... Aspirem de volta aos recipientes de pressão o ar
respirável, com a maior velocidade possível. Salas de controle de máquinas Dino e Crest
— imediatamente retomar velocidade mínima de cruzeiro. Baixar a geração de energia ao
mínimo. Instrução ao oficial da vigilância da Crest — Comandante e comandante-chefe,
por favor à sala de comando. Alta incidência de recepção. Eu repito...
Rhodan correu como um louco na direção da eclusa e saltou para dentro do campo
antigravitacional do elevador. Os homens que ainda há pouco corriam pela plataforma de
carga da nave-transporte, o seguiram. A tripulação de emergência desapareceu na célula
de comando.
Quando Rhodan chegou à sala de comando, o comandante e Atlan já estavam
presentes. Os alto-falantes transmitiam instruções. Telas diagramáticas brilhavam. A
central de rastreamento sob chefia do Major Enrico Notami transmitia os dados das
medições ao grande console de comando.
Gucky e os outros dois teleportadores também tinham aparecido. Os cavalgadores
de ondas, Rakal e Tronar Woolver, materializaram de dentro de um distribuidor da
aparelhagem de vídeo, e de repente encontravam-se, de pé, diante do comandante, que
recuou, praguejando.
— Desculpe, sir — disseram os dois irmãos gêmeos, ao mesmo tempo.
Rhodan exigiu que lhe fossem transmitidos todos os dados necessários. Notami fez
uma ligação direta com a sala de comando. O rastreamento tinha uma forte incidência,
vindo do setor mencionado, com um som bastante forte. O sibilar do rastreador
energético demonstrava que, lá fora, alguém trabalhava com um enorme dispêndio de
energia. A distância perfazia quatrocentos e oitenta e três anos-luz.
Em relação com a vibração sonora do rastreamento, esta era uma distância quase
inacreditável. O tender da frota, Dino-3, certamente não pequeno nem fraco em energia,
já não mais poderia ser rastreado, a uma distância de pouco mais de cem anos-luz.
Rhodan só raramente sentira-se tão perplexo como nestes poucos minutos. Também
Atlan pensava intensamente de onde poderia vir a incidência de energia tão forte. Nas
telas de imagem da ótica externa não se via mais nada, além das distantes galáxias.
— É de ficar maluco — disse Rhodan, com raiva. — Olhe para isso! No nada
absoluto, onde em alguns milhões de anos-luz cúbicos dificilmente se consegue encontrar
um átomo solitário, de repente alguma coisa começa a irradiar. Se se tratasse apenas de
um rastreamento de energia de quinta-dimensão, talvez ainda encontraríamos uma
solução. De onde, entretanto, vem essa massa, que se reconhece com tanta precisão?
Massa — imagine você!
Atlan fez que não ouviu. O rastreamento de massa repousava nas irradiações
próprias, hipergravitacionais de um corpo maior, preponderantemente, entretanto, nos
reflexos de hiperimpulsos transmitidos. O arcônida, de repente, percebeu claramente o
tipo de perigo que, em dadas circunstâncias, eles estavam correndo.
Sem perguntar a Rhodan, ele pegou o microfone e deu, agitado, suas instruções:
— Notami, desligue imediatamente seu rastreador de massa. Rápido! Nós fomos
tocados, medidos, de alguma maneira, por impulsos estranhos?
Na tela de intercomunicação apareceu o rosto, perplexo, de Notami. Depois ele
percebeu o que o arcônida estava querendo dizer. E logo ouviu-se o seu berreiro. Os
poderosos hiper-rastreadores da Crest foram desligados. O rastreamento claro de massa
desapareceu imediatamente. Somente diminutos indícios, ainda mal visíveis, de uma
irradiação própria estranha, ainda ficaram para trás.
— Você... você não está pensando, seriamente, que alguém, lá fora, poderia estar à
espreita de nossos impulsos de eco, e...?!
Rhodan interrompeu-se a si mesmo. Olhou, perplexo, para Atlan. Finalmente o
Administrador-Geral olhou em volta, para o círculo de oficiais discutindo.
— Silêncio, por favor, meus senhores. Nosso amigo arcônida parece, mais uma vez,
estar com a razão. Suponhamos, portanto, contra todas as leis da probabilidade, que a
uma distância de quatrocentos e oitenta e três anos-luz, está alguém, ou alguma coisa, que
pudesse se tornar perigoso para nós. O fator de improbabilidade cresce ao ilimitado, se
nos lembrarmos onde nos encontramos. Teria havido dez vezes dez mil possibilidades, de
passarmos voando, despercebidos, por este objeto rastreado, nesta incomensurável
amplidão. Mas não, nós temos que nos encontrar, sem querer, exatamente no ponto X,
por nós escolhido, com essa coisa desconhecida. Coronel Rudo — transmita alerta de
combate.
Novamente trilaram os apitos de alerta. Cinco mil terranos, que já meia hora atrás
ainda gritavam de júbilo, corriam para os seus postos. A pergunta de quem ou do que
poderia estar naquele espaço vazio, estava em todas as mentes.
De repente havia milhares de teorias. Também Atlan e Rhodan construíam
hipóteses, até que apareceu o cientista halutense, Icho Tolot.
— Suas discussões não levam a nada. Voem até lá, e dêem uma olhada. Pelos meus
cálculos deve tratar-se de um corpo com uma massa cerca de cinco mil vezes superior a
da Crest. E isso não pode ser nenhuma nave cósmica.
— E que tal, uma frota de cinco mil naves? — quis saber Rhodan, insistente. —
Tolot, não me deixe maluco. De onde viriam estas naves?
Os grandes olhos redondos do halutense dirigiram-se para Rhodan. Na sala de
comando o silêncio era total.
— Esta, sir, é uma pergunta em si. Nós também, afinal, estamos aqui, ou não?
— Nisso o senhor tem, desgraçadamente, razão — disse Cart Rudo, resmungão. —
Sir, deixe-me voar, com um jato-mosquito, até o objeto rastreado, para dar uma olhada.
Eu então...
— O senhor, então, ficará a bordo de sua nave — revidou Rhodan, um tanto
rudemente. — Não, Atlan, você não precisa levantar-se em silêncio, para apertar mais o
seu cinturão de armas. Desta vez, você não vai arriscar sua cabeça novamente.
— Você tem certeza que eu tenho isso para arriscar?
— Nada de ironias. Lentamente começo a ficar com receio. Atenção, central de
rastreamento, o senhor nos escutou também?
— Sim, sir — informou o Major Notami.
— Por quanto tempo o senhor transmitiu os seus hiperimpulsos de rastreamento de
massa?
Notami engoliu em seco. Ele entendeu o sentido da pergunta.
— Sir — se, lá do outro lado, alguém estava sentado atrás de um receptor de
rastreamento, nesse caso eu deixei trabalhar os meus aparelhos por tempo demasiado.
Cerca de quinze minutos.
— O senhor é uma besta quadrada.
— Como quiser, sir. Entretanto, devo acrescentar que eu rastreei o espaço
constantemente, até mesmo durante as trinta etapas de inspeção. Quando chegamos ao
ponto X, paramos, e pousamos no tender, o rastreamento continuou ligado em ponto
máximo. Desculpe-me, sir, mas estas eram as suas ordens, até que fossem expressamente
revogadas.
Rhodan tossiu, lançando um olhar inseguro para o arcônida, que sorria, irônico.
— Olhe, eu não preciso de sua opinião, terrano adaptado. Eu retiro a besta
quadrada, Notami, e gostaria que o senhor me desculpasse.
O sorriso apagou no rosto de Atlan. Um olhar de admiração foi lançado ao terrano,
que mais uma vez demonstrava sua grandeza humana. Para ele teria sido muito simples
lançar a culpa pelo rastreamento nos ombros do chefe do rastreamento. Mais ou menos
assim: “— O senhor teria que saber disso! Há quanto tempo, aliás, o senhor já está
voando na nave-capitânia?”
Rhodan nem pensava nisso. Somente ele era responsável por este assunto, e também
era sua responsabilidade, agora, de esclarecê-la.
— Ninguém poderia contar com isso — interveio Melbar Kasom, querendo
apaziguar o ambiente. — Grande mundo de meus
pais — quem é que poderia ter a idéia de que, no
espaço vazio, alguém poderia captar nossos
impulsos próprios? Sir, deixe-me partir com um
jato-mosquito. Levo Gucky comigo. Ele poderia
dar uma olhada mais de perto nessa coisa, e voltar
novamente. Para que, afinal, nós temos esse
baixinho prepotente a bordo?
— Eu quebro o seu pescoço — gritou o rato-
castor, furioso, vindo, bamboleante, na direção do
gigante que lhe sorria. — Retire isso,
imediatamente, já!
Kasom fez um gesto defensivo.
— Irmão, eu já estou com o dedo no gatilho
de minha arma de choque. Se você me tocar
telecineticamente, essa coisa dispara. Além disso,
esta declaração, na boca de um mestre ertrusiano
de todas as classes, significa um reconhecimento.
Ou você acha que, de outro modo, eu iria exigir
que você me acompanhasse? Com Melbar Kasom
somente voam homens de primeira classe,
entendeu?
Gucky acalmou-se imediatamente, O seu dente roedor apareceu.
— Muita musculatura, pouco cérebro. Generosamente, vou esquecer o seu deslize.
Portanto, Perry, como é? Eu estou pronto a me confiar a essa montanha de músculos.
A decisão de Rhodan, entretanto, foi diferente.
— Tenho que discordar. O jato de vocês pode ser rastreado, ainda que seja tão
pequeno e rápido. Se, lá do outro lado, eles captaram os nossos impulsos, já se sabe que
há alguém por perto. Isso deverá fazer surgir a mesma perplexidade que entre nós.
Falando francamente — eu estou convencido de que estamos diante de um raro fenômeno
da natureza.
— Nesse caso, você pode me deixar voar até lá — censurou-o Gucky. —
Fenômenos naturais não fazem mal a ninguém.
— Discordo. Primeiramente quero saber o que está acontecendo por lá. Rakal e
Tronar Woolver — os senhores aceitariam ousar uma expedição de reconhecimento? Eu
lhes daria o meio de transporte, através de um rápido raio de rastreamento de massa,
trazendo-os de volta, depois de determinado tempo, do mesmo modo, para a nave.
Os gêmeos se entreolharam. Eles estavam em contato psíquico. Os seus poderosos
músculos torácicos destacavam-se sob os macacões-uniformes da USO. Eles haviam sido
a arma mais secreta de Atlan, nas fileiras dos especialistas da USO, até que ele
finalmente liberou os cavalgadores de ondas, para missões gerais.
— Concordamos, sir — retrucou o Major Rakal Woolver. — A distância não
importa, se o senhor puser à nossa disposição um impulso energético suficientemente
forte. Dez segundos de irradiação são o bastante.
— Os senhores não sabem o que os espera — avisou Atlan. — Lembrem-se disso.
No instante de sua rematerialização, os senhores ficam praticamente indefesos.
— Nós sabemos dos perigos, sir. Vamos arriscar-nos.
— Nesse caso, levem consigo o equipamento que acharem necessário. Sobretudo
bons campos defletores e absorve-dores de irradiações próprias. Os senhores terão que
tornar-se invisíveis, imediatamente após a sua chegada.
— Chegada onde? — perguntou Rhodan, inquieto. — Amigos, eu não estou
gostando desse seu empreendimento. Os senhores bem poderiam acabar pousando numa
estrela anã em sua fase final — mas que continua suficientemente quente para matá-los.
Os respiradores de volumes, adaptados ao meio ambiente de Gator II, um mundo
que possuía apenas a metade de oxigênio na sua atmosfera que a Terra, desapareceram
com um sorriso nos lábios. Ao aparecerem novamente, já vinham com seu uniforme e
equipamentos especiais da USO, cujos aparelhos eram todos de procedência siganesa.
Eles fecharam seus capacetes de pressão, regularam o ar interno bem como a
situação térmica, e dirigiram-se à central de rastreamento. O feixe rastreador energético
continuava de pé.
— Valor constante, nenhuma transposição de local — declarou Notami, prático. —
Prestem atenção. Os seus relógios estão sincronizados com os nossos?
— Num décimo de segundo.
— Isso basta. Quando apertarem no botão cronométrico, eu ligarei o grande
rastreador de matéria. Então os senhores terão que encaixar-se imediatamente no fluxo do
impulso e desaparecer. Exatamente sessenta minutos mais tarde, eu irradio novamente.
Ou isto é muito demorado?
— Nós vamos poder esconder-nos por uma hora, sempre que haja alguém, por lá, de
quem teremos que nos esconder.
— Ótimo. Quando os seus relógios especiais zunirem, também para mim passou a
hora válida. Então lhes chegará o raio de rastreamento, com a duração de trinta segundos.
Sincronizem-se com estas vibrações para que possam rastreá-las imediatamente, e
enfiarem-se nelas para a volta. Caso não aparecerem na Crest, nós iniciaremos
imediatamente uma operação de busca, com dois jatos-mosquito. Se os senhores não
saírem num corpo celeste perigoso, pousem imediatamente com os seus fortes projetores
antigravitacionais, erguendo-se para o espaço. Nesse caso, nós os encontraremos. Os seus
aparelhos de hiper-rádio foram testados?
Tudo estava na mais perfeita ordem. Os Woolvers ligaram, antes da partida, os seus
aparelhos energéticos. Quando rematerializassem ao chegarem à meta, imediatamente
teriam que tornar-se invisíveis.
Os campos energéticos individuais apenas poderiam ser ligados por eles após a sua
chegada ao destino. Os campos teriam interferido negativamente na manobra de
envolvimento parafísico. Eles tinham que correr o risco de morrerem queimados numa
estrela quase exaurida, já nem mais visível oticamente.
Às 15:00 horas em ponto, hora de bordo, eles apertaram os botões de seus
cronômetros. Ao mesmo tempo o grande rastreador de massa entrou em funcionamento,
enviando os seus impulsos de quinta dimensão ao espaço. O contato aconteceu
imediatamente. O gigantesco corpo estranho continuava lá fora. Os Woolvers
desapareceram na forma de uma nuvem luminosa dentro do aparelho.
O rastreador foi desligado novamente. Os cavalgadores de ondas, também
chamados de paranormais, capazes da zero-polarização, tinham desaparecido. Eles
possuíam provavelmente o dom mais estranho entre todos os mutantes. De algum modo,
eles eram anômalos, o que até mesmo Gucky reconhecia.
***
Foi a sorte de Rakal que o erguimento do seu campo defletor aconteceu
concomitantemente com sua rematerialização. Se o aparelho de precisão não tivesse
começado a trabalhar imediatamente, com o agrupamento de estabilização dos enlaces
atômicos até agora liberados, Rakal teria ficado totalmente indefeso e ainda um tanto
tonto do salto efetuado, diante daquele ser vivente monstruoso, que a apenas três metros
de distância comandava os tele controles de uma plataforma de carga pairando no espaço.
Rakal conseguiu lançar apenas um rápido olhar, naquele corpo robusto, de cerca de
2,20 metros de altura e 1,50 metros de largura, antes de ser puxado para o chão pela força
da gravidade.
Seu medidor de gravidade mostrava 2,9 gravos. Rakal teve dificuldade de respirar.
O ar lhe era fornecido em quantidade pela sua mochila de respiração, mas, apesar disso,
ele não conseguia encher os pulmões satisfatoriamente.
Acostumado a cargas físicas exageradas, o cavalgador de ondas conseguiu
movimentar o braço direito até o aparelho de comando, no peito do seu macacão espacial.
O movimento, entretanto, era uma tortura. Rakal estava sob uma carga de cerca três vezes
o peso normal. Finalmente conseguiu acionar o interruptor, e imediatamente o automático
funcionou. Ele ajustou o neutralizador de gravidade num valor de carga de exatamente
um gravo, e absorveu os 1,9 gravos restantes.
Rakal, de repente, já conseguia mover-se outra vez. O estranho não notara o seu
aparecimento. Quando Rakal olhou mais uma vez para aquele colosso, depois que a sua
mente tornou-se novamente claramente ativa, levou um choque.
Aquele ser vestia um traje espacial com um grande capacete de pressão em forma
de meia-lua, que se estendia de um ombro ao outro.
Por baixo, havia uma cabeça nada humana, também em forma de meia-lua, com
quatro olhos alinhados e visíveis na linha da repartição dos cabelos. Os braços
compridos, maleáveis, e as pernas robustas não deixavam mais qualquer dúvida.
— Maahks! — gemeu Rakal, horrorizado. Perplexo, ele olhava aquele gigante tão
perto dele. Outros maahks, que qualquer cosmonauta terrano conhecia muito bem, de
acontecimentos vividos no tempo real, vieram para cima, num elevador.
Rakal ergueu-se, controlou seu campo defletor e correu até um equipamento que lhe
oferecia cobertura. Com um rápido olhar ele vira que se encontrava na superfície de uma
gigantesca plataforma, que aparentemente pairava, sem se mover, no espaço vazio.
Aquela superfície redonda era tão grande, que Rakal não conseguia abarcá-la com a vista.
Gigantescos holofotes lançavam sua luz sobre o metal reluzente.
Rakal encontrava-se perto da borda daquele complexo disforme. Ao virar-se, para
procurar Tronar percebeu, muito perto, quatro pontos luminosos, nitidamente visíveis,
que se destacavam como pequenos sóis dentro da eterna escuridão.
E então deu-se conta de que, neste setor, havia um total de cinco plataformas
gigantescas, cuja finalidade de utilização era bastante evidente.
Este tipo de construções era utilizado como estaleiros cósmicos, locais de
transbordo ou depósitos gigantes. O tender Dino-3, em princípio não era outra coisa, com
a diferença, apenas, de que haviam embutido, numa de suas laterais, uma grande esfera
com recintos para a tripulação e os jatos-propulsores normais.
Também os ambulantes construíam plataformas, que se pareciam muito com estas.
Rakal avaliou o diâmetro da estação espacial em pelo menos trinta quilômetros e a sua
grossura em cinco quilômetros.
Não era tão grande como a ilha-estaleiro KA-barato. Mas, em contrapartida, havia
cinco delas.
Rakal ligou o seu receptor do capacete, para tentar escutar as conversas. Ele
entendia perfeitamente a língua dos maahks. O orientador de freqüência, entretanto, não
conseguiu captar o comprimento de onda dos maahks.
Maahks não eram nada incomuns — no tempo real! Ali eles se haviam tornado um
conceito conhecido e um fator considerável na estratégia terrana.
Rakal, entretanto, sabia muito bem que eles se encontravam no ano 49.488 antes de
Cristo. Ninguém, até então, imaginara sequer que no distante passado já teria havido
maahks.
O cavalgador de ondas tentou conseguir contato com o seu irmão. Conseguiu,
entretanto captou uma frente de irradiação que expressava inquietação e preocupação. Ele
deu um sinal curto e esperou.
Tronar saíra, de sua forma de alta energia, em cima do casco de uma gigantesca
espaçonave, cilíndrica. A nave tinha cerca de dois mil e quinhentos metros de
comprimento e quinhentos metros de diâmetro. Depois que Tronar recuperou-se de sua
surpresa, verificou que este gigante espacial correspondia exatamente aos modelos que se
conhecia no tempo real.
Conseqüências imprevisíveis se desenharam diante dele. Cuidadosamente, Tronar
caminhou pelas paredes externas, desistindo de penetrar no seu interior. Ele sabia como
eram, por dentro, as grandes unidades de combate dos maahks.
O gigante desceu para uma imensa plataforma, pousando ali, por cima de dutos
iluminados.
A este tempo, Tronar recebeu o impulso de rádio do irmão. O contato psíquico
imediatamente foi reconstituído. Vinte minutos mais tarde, Tronar materializou, saindo
do receptor de pulso de Rakal. Dirigiram-se até a borda da plataforma, em busca de
cobertura, deram-se as mãos, e juntaram os seus capacetes de pressão, para a transmissão
do som.
— E terrível — ouviu Tronar, pela voz do irmão. — Cinco estações gigantescas,
aparentemente ilhas-estaleiro, no espaço intercósmico. Somente nesta estação eu contei
vinte e dois gigantes da classe de dois mil e quinhentos metros. E você sabe por que eles
pousam aqui?
— Troca de kalups! — retrucou Tronar, agitado. — Eu fiquei observando. Eles
fazem exatamente o que nós acabamos de fazer ainda há pouco. A questão agora é apenas
esta: Para onde eles pretendem ir, depois da recuperação total de duas naves? Para a
Nebulosa de Andrômeda ou para a nossa galáxia?
— Para a Via Láctea — afirmou Rakal. — Ali, há dez mil anos atrás, os maahks
foram batidos definitivamente pelos arcônidas. Estas estações demonstram que eles
conseguiram transpor as profundezas entre as galáxias, muito tempo antes de nós, usando
apenas propulsores normais de vôo ultraluz. Eles devem ter trabalhado muitas centenas
de anos na construção destas estações de aparelhamento e consertos. Agora a invasão está
em pleno andamento. Tronar — os maahks, originariamente, saíram da Nebulosa de
Andrômeda. É lá que é a pátria deles. Você pode imaginar por que eles estão fugindo?
Tronar anuiu.
— Eu imagino — continuou Rakal. — Os paralelos são inequívocos demais. Os
lemurenses fugiram dos halutenses, com a ajuda de um transmissor solar para
Andrômeda. Ali acabaram encontrando o povo poderoso e tecnicamente adiantado dos
maahks. A primeira guerra de extermínio dos respiradores de hidrogênio-metano contra
os seres humanos deve ter começado logo após a fuga, que os lemurenses empreenderam
com sucesso. Devido ao nosso salto intermediário no tempo, isso, agora, faz
aproximadamente quinhentos anos. Os maahks defenderam-se com todas as suas forças,
porém agora eles estão diante do extermínio. Eles reconheceram a sua derrota em tempo,
e no decorrer de pelo menos quatrocentos anos construíram uma cadeia de gigantescas
estações espaciais, no espaço intercósmico. Eles também fazem vôos por etapas, porque
não podem utilizar o transmissor solar dos lemurenses. Em poucas décadas, eles chegarão
à galáxia, e ali povoarão planetas de hidrogênio-metano-amoníaco. Isso terá que
acontecer sem que os halutenses o notem. Mais tarde, depois do refortalecimento dos
maahks, eles se lançarão, como povo poderoso, sobre os arcônidas, só para, mais uma
vez, serem derrotados. Eles utilizam o transmissor solar para a fuga, são degredados pelos
senhores da galáxia, então já existentes, para povoarem a nebulosa anã Andro-Alfa, na
periferia galáctica, e dez mil anos mais tarde, ou seja, em nosso tempo real, eles voltam a
golpear. O círculo se fecha. Eles estão novamente ali, onde os seus pais tinham
começado. Irmão — nós estamos vivenciando um acontecimento cósmico de grandeza e
significado imensos. Olhe lá — um kalup está justamente agora pairando para dentro da
escotilha da casa de máquinas da grande nave. Eles naturalmente terão uma outra palavra
para o equipamento. Mas, em princípio, trata-se de um kalup.”
Os gêmeos silenciaram. Espantados e com um começo de pânico eles olhavam os
acontecimentos naquelas ilhas-estaleiros. A quinhentos e cinqüenta mil anos-luz de
distância da Nebulosa de Andrômeda.
Pouco depois, eles rastrearam os hiperimpulsos que chegavam da Crest,
envolveram-se no fluxo do eco e rematerializaram novamente na central de rastreamento
da nave-capitânia.
Rhodan, Atlan e os cientistas-chefes da Crest já os esperavam. Tronar fez um sinal
ao irmão. Rakal sentou-se, jogou o capacete para a nuca e disse, exausto:
— Maahks, sir! Cinco gigantescas estações espaciais, ou, para dizer melhor,
plataformas de transbordo e consertos, para as unidades maiores. Não conseguimos
verificar se nossos impulsos foram captados ou não. Eu, entretanto, gostaria de
aconselhar, colocar a Crest urgentemente pronta para partir num vôo ultraluz. Se os
metanos nos descobrirem, acabou-se para nós. Eles provavelmente nos tomarão por
lemurenses. Por favor, ouçam minha teoria...
9

Icho Tolot já reavaliara as suspeitas de Rakal, declarando-as um fato. Os maahks


eram originários de Andrômeda, onde haviam sido batidos pelos lemurenses. A frota de
cerca de sessenta naves espaciais gigantes, que os Woolvers haviam visto, aparentemente
estava transportando centenas de milhares de fugitivos para a Via Láctea. O enorme
dispêndio de forças, feito com a construção das estações cósmicas, só valia a pena, ainda,
para muito poucos maahks. Isso, originalmente, certamente devia ter sido planejado bem
diferente, porém os lemurenses, acostumados a lutar e superiores tecnicamente, não
haviam deixado grandes chances para os maahks.
Há oito horas atrás, na Crest e no tender, haviam começado a funcionar as
máquinas, imprescindíveis para a instalação dos três kalups. Tratava-se, em primeira
linha, de aparelhos de tração, sem cujos campos de tracionamento dificilmente seria
possível passar os conversores através dos dutos de instalação, um tanto estreitos, até a
casa de máquinas.
Rhodan questionava-se constantemente se os aparelhos de rastreamento dos maahks
do ano 49.488 antes de Cristo seriam bons, e se naquelas estações estavam sentados
diante de diagramas, nos quais as vibrações estranhas haviam sido anotadas. Para passar
um kalup pelas eclusas, normalmente, eram necessárias três horas. Entretanto, eles
haviam conseguido, com o emprego de todas as forças disponíveis, transportar para os
pavilhões de máquinas todos os três aparelhos, no espaço de apenas oito horas, porém,
com isso, ainda levariam algum tempo para serem conectados.
Um minuto após a ancoragem do terceiro aparelho enorme, o Dr. Hefrich se
apresentara. Ele estava — assim como todos os outros técnicos da nave — exausto.
Rhodan apenas anuíra com a cabeça, lastimando não poder ter dispensado os outros
membros da tripulação para as instalações finais. A Crest tinha que permanecer em alerta
de combate total.
Assim, quinze minutos depois da transferência do último kalup, a tripulação de
emergência do tender da frota Dino-3 veio para bordo. O Tenente-Coronel Brent Huise
entrou na sala de comando para apresentar-se.
— A manobra foi encerrada, sir. Todos os homens já passaram pelas eclusas, e os
equipamentos de emergência especiais estão novamente a bordo. O tender foi preparado
para ser destruído por uma explosão atômica.
— Está bem, Huise. Agradeço-lhe — e a todos os outros — pelos seus serviços. O
senhor comandou o vôo dessa nave como um mestre. Por favor, reassuma o seu lugar
como primeiro oficial. Como é que estão as coisas da Dino-3?
Huise baixou os olhos, e sorriu, chateado.
— Como numa nave, à qual nos acostumanos, da qual gostamos, e que tivemos que
abandonar. Se eu tivesse, para o tender, também três kalups de reserva, certamente não o
abandonaria. Deixa um gosto amargo na boca, sir. Eu me sinto quase como um traidor de
um amigo muito fiel.
— E era um amigo fiel — confirmou Rhodan. — O senhor tem que esquecê-lo.
Coronel Rudo, pronto para a manobra. Vamos subir com a Crest. Recolher trem de
pouso. Afaste-se cuidadosamente do transportador. Impulso de um segundo, com força
mínima. Deixe a nave à deriva. Caso nos descobrirem realmente, eu quero ter liberdade
de ação.
Atlan anuiu, concordando. Rhodan apenas esperara pelo término da transferência.
O arcônida encaminhou-se para a mesa de controle do videofone e ligou para os
setores dos kalups. Os pavilhões gigantes apareciam, em cortes, nas telas.
— Hefrich, está me ouvindo?
O engenheiro-chefe colocou-se diante do aparelho.
— Eu acho que o senhor não deveria me interromper a todo o instante —
resmungou ele. — Nós não somos bruxos nem feiticeiros.
— Eu sei disso. Ouça-me, eu tenho a sensação de que os maahks não vão demorar
mais muito para aparecer por aqui. Por isso gostaria de aconselhar que o seu pessoal
técnico não fosse dispersado. É mais que suficiente termos pronto um único kalup. Com
que aparelho estamos mais adiantados?
— O senhor está vendo fantasmas. O que é que o Chefe diz disso?
— Concordo — gritou Rhodan. — Suspenda os trabalhos em dois conversores, e
volte-se unicamente para o aparelho que puder colocar em funcionamento o mais
rapidamente possível.
— Desse jeito vamos nos pisar nos calos mutuamente. Isso não vai ser de muita
ajuda, sir, caso contrário eu já teria tomado essa providência. Por favor, considere que
uma conexão que pode ser feita apenas por um homem, porque há falta de espaço,
certamente não será feita mais rapidamente por três. O senhor não está vendo nossas
dificuldades com a lógica devida, sir.
Rhodan não disse mais nada, recostando-se outra vez na sua cadeira. Ele sabia com
que problemas o engenheiro-chefe estava lutando.
— Experimente, apesar disso, pelo menos aprontar, mais depressa, um conversor —
pediu Atlan. — Cada minuto agora é precioso.
— Farei todo o possível. Aliás, estamos fazendo todo o possível.
Com isso Hefrich interrompeu a intercomunicação.
— Não o deixe mais nervoso do que já está — sugeriu Rhodan. — Panela em que
muitos mexem, entorna o caldo. Rudo, em que pé está?
O comandante fez um sinal, e apertou os botões do computador de comando de
emergência. Os jatos da protuberância equatorial da Crest urraram por um segundo. O
gigante elevou-se, e depois do término da manobra de aceleração, deslizou para fora, em
queda livre.
O tender ficava cada vez menor. Finalmente já não era mais possível vê-lo com a
aparelhagem ótica.
Brent Huise mordeu os seus lábios. A Dino-3 fora a sua nave.
Exatamente onze minutos mais tarde, aconteceu o que Atlan, com seu seguro
instinto, já esperara. A voz de Notami, de repente, pôde ser ouvida por toda a nave.
— Rastreamento do Setor Verde. Três grandes naves estão saindo do espaço linear.
Alta velocidade, apenas vinte por cento abaixo da velocidade da luz. Passo a comutação
para verificação de alcance de alvo, sala de comando de tiro.
E mais Notami não disse. Aliás já dissera tudo. Este caso já fora discutido pelo
menos umas dez vezes.
— A última chance! — disse Rhodan, enfático. — Com estes nós ainda podemos.
Entretanto, se rastrearem, nas plataformas-estaleiros, os sois artificiais de nossas salvas
atômicas — e certamente irão rastreá-los! — logo mais de trinta unidades, das pesadas,
sairão do espaço linear. Ou até cinqüenta. E então chegou nossa hora. Major Wiffert, o
senhor tem liberdade ilimitada de fogo. Faça o que achar adequado, conforme a situação.
— Todas as armas, sir?
— Todas as armas! De qualquer maneira, seremos rastreados. O inimigo certamente
conseguirá transmitir um impulso de hiper-rádio, depois de ser atingido por um tiro
energético normal. Portanto acho melhor logo utilizar os canhões conversores.
— Entendido, sir. Terminamos o rastreamento do alvo. O computador está
devidamente incorporado. Estou preparando tiros em leques, dez de cada vez. As
instruções de fogo continuarão válidas até um maior número de naves surgir.
Dez canhões conversores pesados giraram do lado do Setor Verde, para cada
unidade dos maahks, na ponta de suas miras. Somente trinta segundos mais tarde, a Crest
foi detectada pelos rastreadores do inimigo. Notami registrou os hiperimpulsos que
chegavam.
Bem abaixo da sala de comando, trabalhavam setecentos técnicos, dos quais cada
um era um engenheiro experiente e capaz, nas instalações de conexão. Os condutores
ocos de campos isolados do fluxo de corrente de alta tensão é que causavam os maiores
problemas. Os kalups eram devoradores de imensas quantidades de energia — e Hefrich
nem podia pensar em permitir a perfuração de blocos de fusíveis nesta situação.
A ajustagem dos projetores de isoladores de campo exigia tempo. Quando as
conexões dos cabos convencionais já estavam prontas há muito tempo, os reguladores de
campo ainda não funcionavam.
Um trovejar incrível sacudiu a Crest. A primeira salva em leque dos canhões
conversores havia sido disparada. Wiffert atirava com mísseis de mil gigatoneladas.
Os leques dois e três seguiram-se em espaços de meio segundo cada. A nave da ala
direita dos maahks já explodia na tempestade atômica da primeira salva, quando a
terceira bateria ainda atirava.
Instantes mais tarde, em lugar das negras naves cilíndricas espaciais, havia apenas
três sóis branco-azulados no espaço. Eles se expandiram, fundiram-se entre si formando
uma cadeia de fogo, luz e radiação atômica.
A Crest acelerou. Rhodan não queria, de modo algum, ser surpreendido por uma
formação maior, parado como estava no cosmo.
— Muitos cães significam a morte da lebre — disse ele, pelo intercomunicador de
bordo. — Hefrich, quanto falta?
— Mais cinco minutos.
Entretanto precisaram de mais nove minutos, até que o controle final pudesse ser
executado. E apenas um minuto mais tarde, cerca de cinqüenta naves espaciais dos
maahks deslizaram para fora do espaço linear. Os metanitas haviam reagido com incrível
rapidez.
Imediatamente rastrearam os jatos-propulsores energéticos da Crest, e vieram
voando, numa manobra aparentemente calculada para usar o fator surpresa, e que
demonstrava claramente sua maior velocidade.
Garras energéticas chamejantes tentaram penetrar no campo hiperenergético da
nave-capitânia da frota terrana. Quando a Crest já se encontrava no fogo cruzado de
quarenta e oito unidades e os indicadores de sobrecarga começaram a trilhar, finalmente o
kalup começou a funcionar.
A Crest escapou no espaço linear, no mesmo instante em que os maahks haviam
disparado seus canhões.
Muito atrás do ultracouraçado, o tender da frota Dino-3 desintegrou-se numa
explosão atômica. Brent Huise havia apertado o botão de ignição pessoalmente.
As últimas etapas até a Nebulosa de Andrômeda começaram com esta fuga de um
adversário irreal. Rhodan nem imaginava que, com a destruição das três astronaves
aparecidas anteriormente, ele matara a elite científica dos maahks em fuga. Isto
ocasionou, no tempo e que se seguiu, um abastardamento desses respiradores de
hidrogênio-metano, que finalmente, apesar disso, ainda alcançaram a Via Láctea, indo ali
povoar um solitário planeta da periferia do tipo Júpiter.
Sem as suas cabeças pensantes, eles rapidamente perderam a sabedoria dos seus
ancestrais. E precisaram de trinta mil anos, para mais uma vez, alcançar o nível técnico
dos seus pais. E então, eles se encontraram com os arcônidas, descendentes dos
lemurenses, que nesta época estavam no auge do seu poder — e, mais uma vez, tiveram
que fugir.
***
A última etapa havia terminado. Nas telas de imagem da Crest III brilhavam os sóis
periféricos da Nebulosa de Andrômeda. Cinco mil homens estavam, de pé, em silêncio,
nos seus alojamentos e postos, olhando, cheios de esperança, para aquele mar de estrelas.
— Nós ainda chegamos cedo demais, em pelo menos cinqüenta mil anos —
declarou Rhodan, fazendo um esforço para dar à sua voz um tom pragmático. — O que
nos espera, todos vocês sabem. O alçapão do tempo de Vario é a única instalação técnica
capaz de nos levar de volta ao tempo real. Sobre a maneira de fazê-lo, em si, não há mais
nenhum mistério. Como, entretanto, nós vamos poder fazer funcionar este processo, é
uma outra questão. Os senhores podem ter certeza que vamos encontrar a resistência
feroz dos senhores da galáxia. Tenho esperanças de que nosso vôo através das
profundezas cósmicas entre as galáxias não chegou ao conhecimento deles. Enquanto eles
ainda nos presumem na Via Láctea, ainda estaremos em relativa segurança. A nave não
deve ser rastreada, em nenhuma circunstância, não importa por quem. Nós vamos ter que
tentar prosseguir, quietos e sem sermos notados, até o centro de Andrômeda. Somente lá,
nas proximidades do planeta Vario, será possível planejarmos outras medidas.
“Antes da partida para o centro, vamos fazer uma pausa de descanso e também para
revisar a Crest até o seu último relê. Descansem, relaxem bem, e tentem esquecer-se de
nossa situação por algum tempo. Quando chegarmos por cima de Vario, o trabalho será
redobrado.”
Com isto, Rhodan terminou seu pequeno discurso. Era o dia 3 de outubro de 2.404
— tempo real. A viagem durara trinta e três dias, tempo-padrão.
Em relação ao trecho voado, o tempo que se necessitara era muito pouco. Os
homens da Crest eram os primeiros terranos que haviam conseguido um salto até a
galáxia vizinha, sem a utilização de um transmissor solar.
Para o espírito infatigável de Rhodan, já se apresentavam inúmeras possibilidades.
Entre outras coisas, ele também pensava no que teria acontecido com as plataformas-
estaleiro dos maahks — no tempo real naturalmente.

***
**
*
A mensagem dos mortos ajudou aos vivos a
abandonar a galáxia e voar até a Nebulosa de
Andrômeda, de onde um salto de cinqüenta mil anos
deve ser preparado.
Pioneiros e preparadores do caminho desse
ousado empreendimento são nove sujos vagabundos
espaciais e o rato-castor Gucky, que seguem em missão
secreta para a Nova
Lemúria...
“Missão Secreta na Lemúria” é o título do
próximo volume da série Perry Rhodan.

Visite o Site Oficial Perry Rhodan:


www.perry-rhodan.com.br

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