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1
O Olho Vermelho Do Sistema Beta
Clark Darlton
Tradução
S. Pereira Magalhães
Formatação
ÐØØM SCANS
2
Um adversário muito antigo, já quase esque-
cido, surge novamente. E Gucky fez questão de
ver os lagartos voarem.
3
Personagens Principais:
4
1
***
***
***
***
***
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Na reunião dos mutantes houve um grande
grito de surpresa, quando Marshall entrou
acompanhado de Gucky.
— Que surpresa agradável! — exclamou Ras
Tschubai, o africano teleportador, todo conten-
te. — Você é a arma secreta nesta missão?
— Nada de arma secreta — murmurou
Marshall — o malandro penetrou clandestina-
mente a bordo, contra ordem expressa de Rho-
dan.
O africano fez uma cara de espanto:
— Então, Gucky, eu não quero estar na sua
pele.
— Ele não tem um pêlo grosso e lindo —
disse a jovem Betty Toufry, inclinando-se, para
coçar sua nuca.
Gucky estava feliz. Aliás, gostava muito da
jovem telepata, cujas faculdades paranormais
eram muito semelhantes às suas, pois Betty era
também telecineta.
— Rhodan vai desculpar você, Gucky, não
se preocupe — comentou Betty.
— Se você der uma palavra a meu favor,
com toda certeza — disse Gucky, parecendo
mais confiante.
O perscrutador japonês Doitsu Ataka sacu-
diu a cabeça.
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— Disciplina é isto: fazer somente o que o
chefe manda. Agora, para mim está bem. A
vida não será mais tão monótona, pois Gucky
sempre inventa umas gozações.
Marshall lançou um olhar de desaprovação
para o japonês. O rapaz falou de disciplina e foi
o primeiro a quebrá-la. Mas Gucky aproveitou a
situação a seu favor.
— Você tem razão, Ataka — disse ele con-
tente. — Quem é que sabe até quando estare-
mos vivos? Por que não podemos estar alegres?
Rhodan quer que nós todos morramos, natural-
mente só aparentemente. Portanto, vamos
morrer, pelo menos, alegres. Proponho um tor-
neio de coçar e me apresento como voluntário
para...
Marshall achou conveniente mudar de assun-
to.
— Prestem bem atenção ao que vou dizer —
disse ele, cortando todo sorriso. — Acabamos
de descobrir, neste quarto planeta, que o co-
mandante apelidou de Aqua, os primeiros indí-
cios de vida inteligente. Vamos aterrissar. Nin-
guém sabe o que vamos encontrar, uma coisa
está fora de dúvida: isto não tem nada que ver
com nossa missão verdadeira.
Foi, infelizmente, uma dedução falsa, ilógica,
mas Marshall só o percebeu mais tarde, como
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os outros também.
No momento, não lhes sobrou tempo para
pensar.
O alarme tocava por toda a nave. Por uns
instantes, Marshall parecia paralisado, como
que ouvindo a si mesmo; depois, um estremeci-
mento percorreu todo seu corpo.
— Deringhouse, que está acontecendo?
Seus pensamentos são caóticos e confusos...
Ouviu-se um zumbido estridente.
A tela do intercomunicador, que liga entre si
todas as seções da nave, acendeu. Nela apare-
ceu a imagem de Deringhouse, com fisionomia
de atônito e indeciso.
—Atenção geral — disse com voz áspera. —
Prontidão de emergência. Ocupar todos os pos-
tos de defesa. Alguém está exercendo todos os
controles sobre a Centauro e nos está puxando
para baixo. Estamos aterrissando.
Fez uma pausa, como se estivesse pensan-
do, depois continuou:
— Marshall, seus mutantes devem estar pre-
parados. Talvez precisemos de seu auxílio.
— Que está se passando com a nave? —
perguntou Marshall. Já experimentou...?
— Inútil, caímos sob a ação de poderosos
raios de atração, que paralisaram todos os nos-
sos controles. Para lhe ser sincero, Marshall,
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não tenho intenção de me defender contra os
inimigos. Aguardemos, pois, para saber o que
pretendem de nós.
— Não acha estranho, que uma raça, de
cuja atividade não conseguimos ver nada na su-
perfície de Aqua, tenha desenvolvido meios téc-
nicos tão avançados de poder subjugar por for-
ças mentais uma nave tão grande como a Cen-
tauro?
Deringhouse esboçou um leve sorriso.
— É exatamente o que estou querendo des-
cobrir. O que estamos presenciando é parado-
xal e impossível. Que existisse aqui neste mun-
do uma civilização não me admiraria muito.
Mas, deste jeito...?
Marshall percebeu como o assoalho a seus
pés estremeceu todo. Depois veio um solavanco
que quase o derrubou. Após o quê, reinou silên-
cio.
Deringhouse, diante da tela, deu uma olhada
para o lado, antes de se dirigir aos que o viam.
— Já aterrissamos — disse sem expressão
na voz. — Encontramo-nos no meio de um pla-
nalto rochoso. Estamos cercados por cúpulas
de metal cintilante. Mas não vejo armas. De ho-
mens ou outros seres vivos, não há nenhum si-
nal. Devemos esperar até que os desconhecidos
queiram entrar em contato conosco. Pensem,
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porém, numa coisa: não estamos indefesos,
meus senhores. Ao menor vestígio de uma ação
hostil do lado oposto, nós nos defendemos sem
consideração. Mas não seremos os primeiros a
iniciar a guerra. Sem o meu comando, não abri-
remos fogo.
Marshall ouviu como os postos de defesa es-
tavam se preparando para se manterem de
prontidão. Deu algumas instruções aos mutan-
tes e deixou o aposento para se dirigir ao posto
de comando, de onde se tinha uma vista me-
lhor. Em caso de emergência, podia-se dali
mesmo comandar o ataque dos mutantes.
Deringhouse estava de pé diante da galeria
panorâmica, observando toda a circunferência
da Centauro já ancorada. Lançou um rápido
olhar para Marshall, sem se perturbar em suas
observações. Lamanche estava sentado fora dos
controles do envoltório energético, que estavam
desligados.
— Não podem saber de onde viemos, embo-
ra possuam rastreadores estruturais — disse De-
ringhouse meio incerto. — A Centauro e a Ter-
ra estão equipadas com os compensadores cor-
respondentes. Ninguém pode localizar nossos
hipersaltos. Esta arma me tranqüiliza.
— Apesar disso, puxaram-nos do espaço —
disse o telepata pensativo.
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— Não tem importância, Marshall. Confesso
que no início estávamos impotentes e tínhamos
que nos submeter aos fatos, mas agora, creio
eu, já podemos bombardear suas instalações.
Mas não vejo razão para isto. Queremos saber
primeiro como são e quem são eles.
Olhou novamente para a tela, Marshall o
acompanhava.
O pesado cruzador estava parado num am-
plo planalto. A uma distância de trezentos me-
tros estava a primeira cúpula metálica, que es-
condia um trecho da beira da floresta. No hori-
zonte cintilavam os picos de montanhas distan-
tes, ao sol do meio-dia. A segunda cúpula esta-
va mais à direita, depois a terceira e a quarta.
Formavam um círculo em cujo centro estava a
Centauro.
Lamanche acordou de sua letargia.
— Uma verdadeira cilada, uma teia de ara-
nha invisível — dizia ele acabrunhado.
— Estamos presos, exatamente no foco dos
raios de atração. Jamais teria imaginado que es-
tes fulanos chegariam a tanto. Por que não se
manifestam?
— Devem ter seus motivos — respondeu o
comandante. Estava de olhos fixos num deter-
minado ponto à margem da floresta. — Acho
que nossa curiosidade será satisfeita em pouco
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tempo. Lá vem uma viatura.
Os outros dois homens também estavam
olhando.
Das sombras das árvores enormes, de con-
formação esquisita, despregava-se uma coisa es-
cura, rolando lentamente pela planície afora.
Deringhouse ligou o dispositivo de ampliação.
Agora se via mais nitidamente. Era uma espécie
de carro blindado, embora sem a torre de arti-
lharia. Em compensação, a cúpula semi-esférica
era de um material diáfano. Carros deste tipo
eram utilizados freqüentemente para exploração
de mundos desconhecidos, principalmente
quando a atmosfera pudesse ser nociva.
Atrás da cúpula viam-se, com pouca nitidez,
os contornos de algumas figuras. A distância
não permitia ver detalhes.
Deringhouse virou-se para trás e olhou para
Marshall.
— Nenhuma novidade? Ainda não há impul-
sos de pensamentos?
— Sim, mas muito insignificantes. Estão se
protegendo, já tiveram que lidar com telepatas.
Talvez sejam também telepatas e conhecem as
medidas de segurança necessárias, para se pro-
tegerem das radiações do cérebro.
Deringhouse mexia na regulagem da amplia-
ção da imagem e nada respondeu. Notou-se
57
nos seus olhos um brilho maior quando obser-
vava o carro se aproximando. Queria dizer algu-
ma coisa, mas acabou ficando calado. Marshall
reparou que as mãos do comandante tremiam.
— Gucky!... — enviou sua ordem telepática.
— Teleporte-se imediatamente para a central.
O pensamento ainda não tinha terminado,
quando o ar estremeceu no meio da central e
do nada surgiu o rato-castor. Ouviu a ordem de
Marshall e veio no mesmo instante.
— Que há? — chilreou ele, bem disposto
como sempre.
— Estamos entrando em contato com os es-
tranhos, Gucky. Infelizmente estão protegendo
o pensamento. Temos que saber com quem es-
tamos lidando. Você podia...
— Se posso!... — disse Gucky entusiasma-
do, mas continuou com um sorriso malicioso:
— não é verdade, você vai dizer uma palavrinha
a meu favor, quando o chefe...
— Isto é suborno — disse Deringhouse, sem
olhar para trás. — Mas está bem, eu o defende-
rei, se você dentro de dez segundos me disser
quem é que se aproxima de nós naquela viatu-
ra. Talvez eu me engane, mas os contornos da-
quelas figuras apagadas me parecem conheci-
dos...
Marshall teve um calafrio.
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— Conhecidos... Meu Deus... Eu tive a mes-
ma impressão com os impulsos dos pensamen-
tos. Será um acaso?
— Por que discutir? — perguntou Gucky. —
Tenho apenas cinco segundos. Até logo...
Nova cintilação no ar e o lugar onde estava
Gucky ficou vazio.
Dois segundos depois, já estava de volta. No
seu semblante, lia-se grande espanto. Com as
orelhas de pé o pêlo eriçado, sentou-se nas pa-
tas traseiras, apoiando-se na ampla cauda.
— Não, uma coisa desta... — disse, soltando
um longo suspiro. — Quem teria pensado,
como o mundo é pequeno, aliás, o mundo,
não: como o universo é pequeno!
— Mas o que houve? — insistiu Deringhou-
se, já irritado, deixando de lado a tela panorâ-
mica. — Não nos deixe malucos, Gucky, como
são eles?
— Fale logo, Gucky — acudiu Marshall, que
não podia mais se livrar de uma sensação esqui-
sita. Começou a suspeitar que estavam diante
de uma terrível surpresa. — Você os viu?
O rato-castor fez que sim, vagarosamente.
— Materializei-me no carro, no meio deles.
Por motivo de precaução, mantive a respiração,
porque nunca se sabe se a atmosfera é apropri-
ada para nossos pulmões. Mas meus cuidados
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foram inúteis. Respiram o nosso ar. E ficaram
espantados quando me viram.
— Puxa vida, Gucky! — gritou Deringhouse,
com o rosto vermelho. — Quero saber como
parecem eles. São seres da água?
— Que idéia maluca é esta? — perguntou
Gucky, que não perdia a calma. — Você acredi-
ta que peixes inteligentes montaram uma base
terrestre aqui? Já se ouviu besteira maior?
— Gucky — disse Deringhouse, alteando a
voz. — Você talvez não saiba como é importan-
te, mas eu lhe peço mais uma vez para respon-
der minha pergunta: como é que parecem os
estranhos? E o que quer dizer sua expressão: “o
Universo é tão pequeno”...?
— Vocês não me vão acreditar, mas eles se
parecem com os tópsidas. E se me posso ex-
pressar mais claramente, sem decepcioná-los,
gostaria de jurar que são os tópsidas.
Para Deringhouse e para Marshall foi como
se uma mão gelada lhes apertasse o pescoço. É
verdade que já se haviam passado dez anos des-
de que estes sáurios altamente desenvolvidos e
muito inteligentes tinham sido encontrados no
sistema Vega. Mas as escaramuças com eles
ainda estavam bem impregnadas na memória
dos dois homens. Os tópsidas, de estatura mais
ou menos idêntica à do homem, tinham duas
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pernas e dois braços, geralmente utilizados
como braços mesmo. Os dedos das mãos eram
seis, o corpo era coberto por uma camada de
escamas marrom-escuras. A cabeça era de um
lagarto grande, com a conformação característi-
ca dos sáurios; os olhos redondos, negros e mó-
veis pareciam ver tudo que acontecia num raio
de 180 graus.
— Tópsidas! — falou Deringhouse, respiran-
do profundamente. Depois comentou: — É só
o que nos faltava. Estes miseráveis crocodilos
devem estar metidos em toda parte?
— Eles dominam seu pequeno império side-
ral — disse Marshall, pensando nervosamente.
— Se não me engano, este império é em algum
lugar da Constelação de Orion, portanto aqui
nesta região.
— Sim, afastado da Terra por oitocentos
anos-luz. É bem longe daqui.
— Nem tanto assim — contradisse Marshall.
— De qualquer maneira, está na mesma dire-
ção. Não é, pois, de se estranhar que tenham
uma base por aqui.
— Num mundo desabitado? Por que moti-
vo?
Gucky tinha ouvido a conversa de cabeça
baixa, aparentemente sem maior interesse. Mas
chegou a hora de intervir:
61
— Por que vocês estão quebrando a cabeça
com isso? Perguntem diretamente a eles, o que
estão fazendo aqui. Olhem aí, já estão chegan-
do.
Deringhouse deu a volta para chegar à tela.
A viatura com uma pequena cúpula já estava
parada a uns trinta metros da Centauro. Não
havia dúvida de que os sáurios já sabiam há
mais tempo que se tratava de uma belonave dos
arcônidas. Quem sabe, esta circunstância pode-
ria ser aproveitada de uma maneira ou de ou-
tra.
A cúpula da viatura se abriu e dela saíram
três sáurios. Usavam uma espécie de uniforme
que lhes encobria parcialmente o corpo de es-
camas. Todos traziam o radiador energético
num coldre preso ao cinto. Davam a impressão
de arrogância. A julgar pelas aparências, a su-
perioridade estava com a tripulação da Centau-
ro, mas Marshall sabia muito bem que os tópsi-
das, por índole, não conheciam o medo. E não
conhecendo o medo, estavam acostumados a
lutar até a última gota de sangue, mesmo numa
situação sem saída. O medo de um ditador era
maior que o da morte.
— Têm nervos de aço — dizia Deringhouse,
que havia conhecido os tópsidas como coman-
dante dos ágeis caças espaciais. — Colocam-se
62
simplesmente diante das bocas de nossos ca-
nhões e esperam para ver o que vamos fazer.
Poderíamos transformá-los em átomos.
— ...o que não resultaria em vantagem para
ninguém — permitiu-se Lamanche observar.
— Querem que eu os faça correr daqui? —
ofereceu-se Gucky prontamente.
— Você ficou maluco? — perguntou Dering-
house. — Quero saber o que procuram aqui e o
que querem de nós. Marshall, você vai me
acompanhar. Vamos dar uma olhada nos rapa-
zes. Esperamos que entre eles não haja nin-
guém que nos conheça.
— Não há possibilidade disso. Para eles, nós
parecemos todos iguais, como eles para nós.
Eu não conseguiria distinguir um do outro. Mas
que lhes vamos dizer quando nos perguntarem
quem somos?
Deringhouse deu as últimas instruções a La-
manche e se dirigiu para a porta com Marshall.
— Não podem, em hipótese alguma, saber
que somos da Terra. Expliquemos a eles que
pertencemos a um ramo dos saltadores. Prova-
velmente haverão de acreditar, embora os salta-
dores não costumem usar naves esféricas. Acho
bom assim, porque não são muito amigos dos
arcônidas e sabem que também os saltadores
não se dão bem com os arcônidas.
63
— Tenho a impressão — dizia Gucky cami-
nhando atrás dos dois homens — de que aqui
começa uma trama. Esperemos para ver.
Lamanche ficou olhando para eles.
— Se correr tudo bem, Jean — disse ele
para si mesmo — vou devorar três robôs de
combate no almoço. Sem mostarda.
Ao que Gucky, virando-se na porta, acres-
centou:
— Sem mostarda, esta é a condição.
***
70
Major McClears pautava seus atos sempre
em deduções lógicas. Quando recebeu a mensa-
gem alarmante de Lamanche, não pôde deixar
de praguejar horrivelmente. Depois, começou a
pensar o que teria acontecido se Deringhouse
não tivesse voado para o quarto planeta. E a
resposta a esta hipótese seria muito simples: te-
riam esperado com toda calma, no terceiro pla-
neta, até que os saltadores aparecessem; ataca-
riam e se retirariam, assim sucessivamente,
como se quisessem defender mesmo a Terra. A
mudança constante de cada ataque daria a im-
pressão de que se tratava de uma grande frota
de super cruzadores, que de maneira alguma
poderiam ser destruídos. Com o passar do tem-
po, os saltadores já teriam chegado à idéia de
colocar uma bomba de gravitação na pátria dos
terranos e assim destruí-la parcialmente. Estaria
tudo perfeito... mas no quarto planeta estavam
os tópsidas.
Eis o ponto nevrálgico.
E aí então os pensamentos e especulações
de McClears começaram fluir inconscientemen-
te no mesmo sentido que os de seu amigo De-
ringhouse. Por este motivo, teria que negligen-
ciar sua própria segurança. Mais tarde, quando
Rhodan se recordava deste fato, tinha que con-
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ceder que um ser racional não podia agir de ou-
tra maneira, colocando sua segurança em se-
gundo plano em relação à segurança da Terra.
E foi assim que uma ação errada de McCle-
ars iniciou o mais genial de todos os lances que
Perry Rhodan jamais empreendeu. Fez apenas
o que era necessário para dar um toque de ve-
racidade à mentira de Deringhouse referente
aos tópsidas.
Seus pensamentos se atropelaram, enquanto
dava ao encarregado do rádio a ordem de cha-
mar de volta o tenente Tifflor. O mais compe-
tente oficial da nova geração de Rhodan, estava
exatamente em viagem com a Gazela para in-
formar-se das condições na superfície. O disco
voador achatado — trinta metros de diâmetro e
dezoito de altura — era a nave ideal para tais
empreendimentos. A ordem o alcançou exata-
mente quando acabava de aterrissar numa pla-
nície e já ia botando o pé em terra. Não foi
com boa vontade que atendeu à ordem de vol-
tar à espaçonave Terra. Sua disposição era a
melhor do mundo quando se viu frente a frente
com McClears na Central.
— Um planeta maravilhoso, mas infelizmen-
te sem vida animal. Algo incompreensível para
mim, pois não posso imaginar condições me-
lhores. Ah!... o senhor me mandou chamar de
72
volta. Suponho que seja por motivos muito im-
periosos.
— Realmente muito imperiosos — respon-
deu McClears seco. Ainda não tinha chegado a
um ponto final com seus encrencados pensa-
mentos, mas num particular seu plano já estava
traçado. — Deringhouse aterrissou no quarto
planeta, que batizou de Aqua.
— Nada de extraordinário nisso, não acha?
McClears não perdeu a calma.
— Infelizmente, não foi o primeiro que se
enamorou do “mundo d’água”, tenente Tifflor.
Outros chegaram antes dele: os tópsidas.
— Tópsidas? — Tifflor fez um esforço para
se lembrar.
Naquele tempo, era ainda jovem demais e
sabia dos tópsidas só por ouvir falar. Mas lem-
brou-se vagamente de um filme a que assistira
sobre a invasão dos sáurios do sistema Vega.
— O senhor não está se referindo àqueles
seres parecidos com crocodilos que pretendiam
destruir a Terra e por engano acabaram caindo
em cima dos ferrônios?
— Exatamente deles é que estou falando —
disse McClears.
— O que eles procuraram por aqui?
— Não tenho a menor idéia, recebi uma
mensagem muito curta de Deringhouse de que
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os tópsidas obrigaram a Centauro a fazer uma
aterrissagem forçada e prenderam o comandan-
te. Recebemos instruções de nos dirigirmos
para Aqua e lá aguardar novas ordens.
— Como quer Deringhouse dar ordens, se
está preso? — queria saber Tifflor. — Ou se
trata apenas de uma prisão simulada?
— Parece que é mais ou menos isto. De
qualquer maneira, veremos os detalhes em
Aqua mesmo. Não me agrada ter os tópsidas
na vizinhança. Mas já que estão aí, temos que
fazer tudo para tirar proveito da situação. Te-
nho a impressão de que Deringhouse pensa as-
sim também, pois do contrário não se deixaria
prender tão facilmente.
— O senhor tem algum plano?
— Tenho. Se bem que um tanto vago, mas
preste atenção...
E McClears começou a explicar seu plano.
Logo depois das primeiras frases, o jovem
tenente compreendeu tudo. Um sorriso ilumina-
va seu semblante, mas não interrompeu o ofici-
al mais velho, que continuou explicando, en-
quanto a Terra já estava na direção certa. De-
pois da segunda transição, quando Aqua já des-
pontava na tela, concluiu com as palavras:
— Estou plenamente certo de que assim ma-
tamos dois coelhos com uma só cajadada. Se
74
soubesse como colocar Deringhouse a par do
meu plano... Estou convencido de que ele con-
cordaria e pediríamos novas ordens a Rhodan.
Sem consentimento dele, não quero fazer ne-
nhuma ligação telegráfica com a Terra.
— Os mutantes! — lembrou Tifflor.
— Uma possibilidade — concedeu McCle-
ars. — Infelizmente não temos nenhum telepata
a bordo da Terra. Não vejo outra alternativa a
não ser agir separado de Deringhouse. Deixa-
mos a Terra circulando a grande altitude de
Aqua e descemos com a Gazela para a super-
fície.
— E o risco que corremos com isto?
— Está incluído na operação — disse o ma-
jor. — Deringhouse vai fazer uma cara de bobo,
quando souber que vencemos depois de uma
luta curta, mas violenta. Espero apenas que não
tenha cuidados inúteis por nossa causa.
— E eu espero — acrescentou Tifflor cépti-
co — que seus cuidados, se ele os tiver, não se-
jam realmente inúteis.
— Eu também — concordou McClears.
***
***
***
83
Al-Khor estava um pouco nervoso quando
penetrou na cela dos dois prisioneiros. Seus
olhos redondos faiscavam ódio. Apenas um res-
to de ponderação o impediu de mandar fuzilar
imediatamente os supostos saltadores.
— Repita o que o senhor, há pouco estava
dizendo aos meus dois subalternos — disse ele,
ríspido, colocando-se na porta de tal maneira,
que os dois sentinelas que o acompanhavam ti-
nham alvo livre pela frente. — Prometo-lhes
que não vou castigá-los, se disserem a verdade.
Mas, tenho que saber o que aconteceu.
O major sacudiu os ombros:
— Não dê demasiada importância ao que
seus subalternos lhe disseram. Podem ter me
compreendido mal. O que diz a respeito?
— O senhor sabe perfeitamente o que estou
pensando, saltador. Sabe, além disso, que não
são os dois únicos prisioneiros que fizemos. Do-
minamos um cruzador pesado. Um tal de major
Deringhouse está em nosso poder.
Numa demonstração de horror, muito bem
representada, McClears empalideceu todo,
como Tifflor mesmo constatou, levantou-se e
deu dois passos na direção de Al-Khor.
As armas dos dois vigias se ergueram amea-
çadoras. Al-Khor não se intimidou, não se me-
xeu um centímetro de onde estava.
84
— Se o seu depoimento for verdade, suas vi-
das estão salvas.
McClears deu um rápido olhar para Tifflor.
O tenente respondeu com um piscar de olho.
Podia estar tranqüilo de que Marshall havia cap-
tado todos os impulsos.
— Pode começar a perguntar — disse a Al-
Khor.
— Você os ameaçou dizendo que viriam ho-
mens para vingá-los? Falou também aos nossos
subalternos qualquer coisa de uma invasão imi-
nente por parte de sua gente?
McClears, teatralmente, mordeu a ponta da
língua. Uma gota de sangue banhou os lábios
inferiores.
— Na minha cólera... desgraçado, não vale
a pena mentir. Também não sei por que motivo
lhe silenciar uma coisa, que você em poucos
minutos saberá plenamente. Os saltadores
supõem existir neste sistema uma base de seu
eterno inimigo. Você não o conhece, portanto
seu nome não tem nenhuma importância no
conjunto dos acontecimentos. De qualquer
modo, os superpesados estão alarmados. Deve
saber que eles são a tropa guerreira dos saltado-
res. Todo o poderio dos superpesados vai ata-
car o terceiro e o quarto planetas deste sistema
e destruí-los. Posso lhe dar apenas um bom
85
conselho: abandone, o mais depressa possível,
este planeta.
— Que nada! Isto é um truque — respondeu
Al-Khor.
McClears começou a dar gargalhadas. Riu
tanto que lágrimas lhe corriam dos olhos. De-
pois, cheio de satisfação bateu nos ombros co-
bertos de escama do tópsida:
— Um truque! Meu caro amigo, eu juro pe-
los meus antepassados, de que estou dizendo a
verdade. Os saltadores estão ultimando seus
preparativos para despovoar este sistema, com-
pletamente. Nada pode detê-los deste plano,
isso eu lhe posso garantir.
— Nada — repetiu Al-Khor encolerizado.
Nos seus olhos havia um brilho misterioso. —
Acha que nada consegue deter os saltadores?
Eu acho que há uma coisa capaz disso. Quando
souberem que nós consideramos o quarto pla-
neta como nossa propriedade, ninguém terá co-
ragem de...
— Por que não?
— Porque... — Al-Khor hesitou um pouco.
— Porque os comerciantes das Galáxias não
têm nenhum motivo de nos fazer hostilidades.
Eles não são bem vistos pelo Império. Nós,
também não. Por que não podemos estar uni-
dos?
86
— Por um motivo muito simples, meu caro
amigo — disse-lhe McClears com paciência. —
Porque nós somos obrigados a supor que você
é um aliado do nosso ferrenho inimigo, que tem
uma base neste planeta e que praticamente o
povoa.
Quem estava rindo à bandeira despregada
agora, era o próprio Al-Khor.
— Os seres da água? Seus inimigos de mor-
te? É ridículo. Não é apenas absurdo, mas é
também...
— Seres da água? — informou-se cautelosa-
mente McClears. — Não estou compreendendo
o que está falando.
— Neste mundo existe uma raça um tanto
inteligente, que muito raramente aparece em
terra e não precisa mesmo da terra. Por este
motivo, pudemos estabelecer nossas instala-
ções, sem prejudicá-los. Estes seres existem so-
mente na água e devem possuir suas cidades lá
no fundo do oceano. Fora disso não há nada
neste mundo que possa ser uma ameaça. Se
não forem estes seres aquáticos, vocês saltado-
res foram vítimas de um engano.
— Nossas informações estão exatas — con-
tinuou McClears. — Estou bem informado so-
bre os planos dos nossos patriarcas. Nestes pla-
nos consta que os tópsidas têm uma base pe-
87
quena no quarto planeta, cuja existência não
precisa ser tomada em consideração. Você está
vendo que as negociações não vão servir para
nada. Nossos chefes consideram vocês aliados
do nosso inimigo.
— Puxa vida! — exclamou o tópsida. —
Diga-me finalmente quem é este inimigo figa-
dal.
— Não estou autorizado a fazer isto — res-
pondeu McClears.
— Então vamos obrigá-los a fazer.
— Mas andem depressa — disse o major
com toda calma. — Nossas unidades de assalto
estão chegando a qualquer momento. E então
poderia ser tarde demais para vocês.
Al-Khor deu um grito ininteligível, fez um si-
nal para os guardas e deixou a cela. A porta se
fechou com um estrondo.
McClears olhou para Tifflor, que repetiu bai-
xinho toda a conversa e assim a transmitiu para
Marshall e para Gucky.
— Então? — perguntou McClears todo
triunfante.
— Vamos ver — respondeu Tifflor, meio
céptico — se eles vão agir como criaturas inteli-
gentes e corajosas.
— Claro que vão agir assim. Pode ficar tran-
qüilo.
88
Infelizmente, não tiveram a oportunidade de
averiguar isto, pois dez minutos mais tarde al-
guém os apanhou. Levaram-nos numa pequena
viatura diretamente para o litoral. Aí, entraram
numa pequena embarcação que os transportou
para uma ilha de aço. Era a cúpula que há pou-
co haviam visto do ar. Mesmo para Deringhou-
se, teria parecido igual. Por uma escada lateral,
subiram para o andar superior, cercado por um
terraço. Depois um elevador os levou para bai-
xo. Quem os guiava era um tópsida, muito bem
armado.
Nem McClears nem Tifflor pensavam em fu-
gir. Um único pensamento os dominava: será
que seu truque iria falhar?
O salão tinha paredes de vidro que, de todos
os lados, davam para o mar. Tinha-se aqui uma
visão magnífica sobre um mundo a dez ou doze
metros sob o nível da água. Comportas de vá-
rios tamanhos davam a entender que se podia
atingir o mar aberto sem que a água penetrasse
no salão. Ou vice-versa, podia-se do mar pene-
trar na cúpula. E isto parecia ser a única finali-
dade da instalação.
O tópsida se deteve diante de uma porta.
Abriu-a e se afastou, dizendo:
— Aqui será a nova prisão. Ficarão aqui até
que tudo tenha terminado.
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— Terminado o quê? — perguntou McCle-
ars, sem receber resposta.
Penetrou no pequeno cubículo acompanha-
do de Tifflor que logo começou a falar no seu
transmissor da laringe.
A porta fechou e eles estavam a sós. Mas
onde?
Apenas a porta parecia ser de material com-
pacto. Fora disso, pareciam mergulhados no
nada, no meio do mar, cujo fundo tinha um bri-
lho opaco.
Mas logo perceberam a verdade: estavam
numa cela de vidro, sob a cúpula ou ao lado
dela. O cubículo transparente flutuava. Era água
por todos os lados.
McClears sentou-se no chão, bem no canto
oposto à porta, tendo a impressão de estar sen-
tado na água. Olhava em torno com muita curi-
osidade.
— Isto é muito interessante — observou
com sarcasmo. — Devemos estudar os segre-
dos do mar, antes que nos afoguem.
Tifflor se espantou um pouco com a frase.
— Você acha que vão nos matar?
— Que nada! É brincadeira minha. Mas
você ouviu dizer que aqui existem peixes inteli-
gentes ou coisa semelhante. Acho que devería-
mos procurá-los, mas não me pergunte o por
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quê. Pode ser também o contrário: os peixes
devem nos ver, para saberem como parecem os
saltadores. Situação maluca, não é?
— Só queria saber se Marshall teve ocasião
de transmitir minhas informações a Deringhou-
se. Infelizmente Deringhouse não é telepata.
Mas pelo menos Gucky deve saber onde esta-
mos.
A água era de um azul-claro com reflexos
avermelhados, em virtude da luz do sol de Beta.
Neste local, o mar não teria talvez vinte metros
de profundidade. Agora que a vista dos dois pri-
sioneiros já se adaptara à penumbra do estra-
nho ambiente, o olhar deles penetrava facil-
mente até o fundo do mar, situado a uns oito
metros abaixo do piso de vidro da singularíssi-
ma cela.
Plantas marinhas exóticas dançavam ao rit-
mo de uma correnteza invisível, peixes colori-
dos cintilavam em grandes cardumes numa de-
terminada direção, como se estivessem sendo
perseguidos por um inimigo oculto. Entre estes,
flutuavam com calma e dignidade seres transpa-
rentes, que lembravam nossas medusas. Pouco
mais para a frente, o fundo do mar caía bem
íngreme, a água se tornava azul-escuro e infini-
ta.
E subitamente, Tifflor deu um grito semi-
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abafado.
De olhos arregalados, apontava ele para o
azul-escuro do mar aberto. McClears seguiu a
direção indicada por seu braço estendido e pela
primeira vez olhos humanos puderam ver os le-
gítimos senhores do planeta das águas.
***
117
Antes que ficasse mais escuro, a Gazela ater-
rissou com Marshall e Gucky a bordo, bem per-
to da viatura camuflada. A ação se deu no mo-
mento exato, pois, após a destruição do primei-
ro ponto de apoio e da terrificante investida da
Centauro, que transformou todo o planalto em
lava incandescente, os tópsidas deram o alarme
geral. Suas belonaves surgiram de todos os can-
tos do “mundo d`água” e se reuniram num pon-
to a oitenta quilômetros da ilha metálica.
Logo se deu o ataque à Gazela, que foi natu-
ralmente repelido. Antes que se iniciasse o se-
gundo, mais pesado, apareceram Gucky e
Marshall. O pequeno aparelho partiu e desapa-
receu na penumbra. Como voasse a baixa alti-
tude, seus perseguidores não o conseguiram lo-
calizar no radar.
Deringhouse mandou camuflar o pequeno
aparelho numa clareira da floresta, de sorte que
ninguém o percebesse. Um breve rádio para a
Terra era suficiente para dar a localização exa-
ta. Já era noite, Deringhouse fez uma ligação
para a Centauro.
— Alô, Lamanche! Onde é que você está?
— Em órbita, senhor, esperando pela ordem
de atacar.
— Não vai ser tão breve. Fique por aí e
mantenha contato com a Terra. Proteja-se dos
118
ataques dos tópsidas, mas fique onde está. Ain-
da temos de liquidar uns assuntos aqui embaixo.
— Entendido, senhor; se precisar de algum
auxílio...
— Não se preocupe, Lamanche. Estamos
com Gucky aqui. Fim.
Desligou o aparelho e desceu da Gazela pu-
lando na areia macia, quase pisando na cauda
de Gucky.
O rato-castor estava sentado, calmo. Con-
templava o céu escuro e as primeiras estrelas
que cintilavam, formando constelações diferen-
tes e curiosas, como jamais se poderia observar
da Terra.
— Ora essa, que está fazendo aí? Eu pensa-
va que você estivesse tomando banho de mar...
O rato-castor deixou aparecer o dente roe-
dor.
— Vou fazê-lo agora. Acho que posso deixá-
lo sozinho por uma meia hora.
— Que é isso? Você está falando como se
nós não agüentássemos sem você...
Gucky foi caminhando para o mar, deixando
na areia um rastro diferente. Depois de uns dez
metros, parou, olhou para trás e chilreou:
— Como seria se vocês não tivessem
Gucky... Estou convencido de que vou receber
as duas arrobas de cenoura, não é?
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Falou e desapareceu com um salto corajoso
na onda em rebentação.
Deringhouse sacudiu a cabeça com ar de de-
saprovação. Estava suspeitando que Gucky que-
ria captar alguma coisa.
***
***
131
***
***
***
148
A surpreendente descoberta de que os
tópsidas, velhos inimigos da Humanidade, ti-
nham pontos de apoio no sistema Beta, foi
incluída estrategicamente na gigantesca ma-
nobra de camuflagem de Perry Rhodan.
Será que os tópsidas continuarão o jogo,
depois que as frotas dos saltadores e dos aras
aparecerem?
E Topthor, que já viu com os próprios
olhos o sol da Terra! Será que ele não vai re-
conhecer, assim que vir o enorme sol Beta,
que a positrônica o levou a um alvo errado?
Em A MORTE DA TERRA, Topthor é a fi-
gura central de mais uma aventura de Perry
Rhodan.
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ÐØØM SCANS
PROJETO FUTURÂMICA ESPACIAL
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