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O Imperador De Nova Iorque
W. W. Shols

Tradução
Richard Paul Neto

Digitalização
Denize

Revisão
Gandalf01

Formatação
ÐØØM SCANS

PROJETO FUTURÂMICA ESPACIAL

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A Terceira Potência, dirigida por Perry
Rhodan — uma feliz combinação da energia
humana com a supertecnologia arcônida —
pode apresentar, nos seus anos de existência,
uma história muito movimentada, cheia de
dramáticos altos e baixos.
Mas os acontecimentos mais recentes dão
a impressão de que, ao se encontrar com os
saltadores ou mercadores galácticos, Perry
Rhodan passou a se defrontar com um poder
que tem a intenção e a capacidade de des-
truir a Terra para eliminar um possível con-
corrente no comércio interestelar.
Há oito mil anos os saltadores detêm o
monopólio do comércio galático, isso porque
sempre reprimiram no nascedouro qualquer
concorrência que se esboçasse.
A Terra e a Solar System, dois cruzadores
espaciais da Terceira Potência, juntamente
com o grupo de Julian Tifflor, que se encon-
tra no planeta de gelo, dão muito trabalho
aos saltadores no sistema de Beta-Albíreo,
impedindo-os de se lançarem a um ataque di-
reto contra a Terra. Acontece que os saltado-
res já dispõem de uma quinta-coluna em nos-
so planeta, composta de inúmeros agentes
que procuram conquistar as bases da Tercei-
ra Potência.
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O IMPERADOR DE NOVA IORQUE é um
desses perigosos agentes...

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Personagens Principais:

Perry Rhodan — Chefe da Terceira Potên-


cia e comandante da Stardust-III.
Reginald Bell — Ministro da Segurança da
Terceira Potência.
Coronel Freyt — Representante de Perry
Rhodan na Terra.
Ivã Ivanovitch Goratchim — Que tem o cos-
tume de brigar consigo mesmo.
Tako Kakuta — Um teleportador que não
gosta de rastejar.
Homer G. Adams — Um homem que não
faz a menor questão de se colocar a serviço de
um “imperador”.

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1

Uma transição no hiperespaço.


Provinham da quinta dimensão, onde eram
apenas energia e estavam reduzidos a uma
amostra fiel de sua verdadeira identidade. Cada
vez que ocorria o fenômeno repetiam-se as
mesmas dores físicas. A rotina não alterava
nada nesse quadro. Cada transição trazia seu
choque.
As juntas repuxavam e, depois que o espaço
normal havia recuperado o corpo, os olhos pre-
cisavam se adaptar ao mesmo.
Figuras coloridas e saltitantes surgiam de um
estranho crepúsculo. Custavam a desaparecer.
Pedaço por pedaço, os olhos voltavam a abran-
ger a visão da realidade. Quando isso aconte-
ceu, Rhodan se deparou com o sorriso largo de
Bell, que não parecia muito convincente.
Reginald Bell não teve o menor constrangi-
mento em praguejar em altas vozes e esfregar a
nuca. Pouco lhe importava que todo o pessoal
reunido na sala de comando da Stardust-III o
visse naquela oportunidade. Tinha certeza de
que cada um deles estava ocupado em primeira
linha com seus problemas. Ninguém escapava à
dor e ao choque.
— Graças a Deus! Estamos em casa!
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Estas palavras só poderiam ter saído da boca
de alguém que há muito tempo vivia as concep-
ções cósmicas. Afinal, ainda se encontravam
muito além da órbita de Plutão, a cerca de oi-
tenta unidades astronômicas do planeta Terra.
Mas, se considerarmos que o salto espacial
os transportara num instante por uma distância
de trezentos e vinte anos-luz...
Subitamente um forte zumbido se fez ouvir
em meio a essas reflexões ociosas. Pareciam
cem transformadores avariados ao mesmo tem-
po. De um instante para outro, todos se esque-
ceram das dores nas juntas. Uma sereia de alar-
ma não teria causado maior agitação.
Perry Rhodan sentiu o beliscão que Bell deu
em seu braço.
— Está vendo? Um belo dia esses saltos teri-
am que causar algum problema. Nem quero ver
quando a tela de proa esquentar.
Reginald Bell não foi o único que sentiu ar-
repios de susto. Qualquer ruído, por mais fami-
liar que seja, deixa de ser inofensivo quando se
verifica uma coincidência temporal entre ele e o
retorno do hiperespaço. Apesar da segurança
proporcionada pela tecnologia arcônida alta-
mente desenvolvida, o homem desconfiava por
instinto.
Desta vez Rhodan sorriu. Em sua mente o
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instante de pavor foi mais curto.
— A tela já está quente. Não sei por que
todo esse nervosismo.
Os instrumentos na sala de comando já ti-
nham voltado a funcionar. Na lâmina translúci-
da via-se a constelação familiar do sistema so-
lar. Os dispositivos automáticos haviam manda-
do para o espaço os raios dos rastreadores e
dos aparelhos de radar. Antenas complicadas
captavam os impulsos identificáveis no espectro
eletromagnético e, depois de transformá-los em
símbolos inteligíveis, conduziam-nos para o
quadro que se encontrava diante do primeiro-
piloto.
Não havia a menor dúvida: a transição fora
coroada de êxito. Estavam em casa. Apesar dis-
so, o sorriso de Rhodan só durou poucos se-
gundos.
O ruído fora causado pelas instalações su-
perpotentes do aparelho de intercomunicação
instalado na nave, cujos impulsos de captação
conseguiam absorver, num décimo de segundo,
uma mensagem de um metro de comprimento.
O aparelho de decifração acoplado ao mesmo
fez com que poucos segundos depois o texto
decodificado se encontrasse diante dos olhos de
Rhodan.
— Cruzador Terra para Stardust-III! Cruza-
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dor Terra para Stardust-III! Segundo informa-
ções colhidas pela equipe de Tifflor, os agentes
que o inimigo colocou na Terra são robôs ar-
cônidas. É de recear que se trata de robôs que
sejam de nossa propriedade e se encontrem a
serviço da Terceira Potência. As pesquisas reali-
zadas levam à conclusão de que, em alguns ca-
sos, certos especialistas dos mercadores conse-
guiram chegar à Terra sem serem reconhecidos
e modificaram a programação dos robôs segun-
do suas conveniências. Existe um perigo grave
para a Terra. Cruzador Terra para a Stardust-
III! Cruzador Terra para a Stardust-III!
Com um clique, a reprodução em fita foi in-
terrompida. Por alguns segundos, um silêncio
total tomou conta da ampla sala de comando
desse gigante do espaço, cujo diâmetro atingia
oitocentos metros.
— Vejo que a missão secreta do cadete Tif-
flor não foi em vão — constatou Rhodan laco-
nicamente. Até parecia que as informações que
acabara de receber não o preocupavam, mas
lhe causavam alegria por demonstrarem que
seus planos foram corretos. Bell, porém, não
sentiu a menor disposição de se mostrar exul-
tante com uma notícia tão desalentadora.
— Esse menino, o Tifflor, ainda o levará a
um convento, onde você poderá meditar em
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paz — esbravejou o homem de olhos cor de
água. — Até parece que você ainda não com-
preendeu todo o significado da mensagem que
acabamos de receber. Permita que eu a inter-
prete no sentido de que o inferno está às soltas
na Terra. Este é o primeiro ponto. E o segundo
ponto é o seguinte: temos que deixar Vênus de
lado e nos dirigir diretamente à Terra.
— Ainda dispomos de três minutos para re-
solver isso, Bell — disse Rhodan em tom indife-
rente e sem a menor ironia. — Na posição em
que nos encontramos, a mudança de rota não
será superior a um segundo do arco graduado.
O que importa no momento é acelerarmos a
nave ao máximo...
Enquanto falava, Rhodan transmitiu as ins-
truções necessárias através de seu painel de
controle. Poucos segundos depois, a Stardust-
III, impelida por forças titânicas, disparou para
a frente. A nave parecia adquirir vida. O uivo
dos geradores de propulsão rivalizava com o ba-
rulho dos mecanismos de absorção da força
gravitacional, forçados até o máximo de sua ca-
pacidade.
Esses fatos não afetaram o bem-estar dos tri-
pulantes. O que parecia se mover era o univer-
so, não a nave. A sala de comando parecia um
pólo imóvel plantado no centro do espaço
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cósmico.
Rhodan se reclinou no assento do piloto.
— Agora precisamos de paciência. De doze
horas de paciência, que será o tempo que leva-
remos para pousar no planeta Terra.
Era a ironia das leis naturais.
Um salto espacial de trezentos e vinte anos-
luz podia ser comprimido num tempo objetivo
de poucos minutos. Mas num vôo normal a
uma velocidade próxima à da luz — a que tinha
de recorrer no âmbito de sistemas solares habi-
tados, por motivos de segurança — um pulo de
gato de pouco mais de dez bilhões de quilôme-
tros demorava meio dia.
Paciência!

***

A situação da Terra entrara num estágio


novo, bastante crítico.
Depois de longos anos, Rhodan pretendia
cumprir a promessa de levar Thora e Crest, os
arcônidas, ao seu mundo natal. Por outro lado,
achava que a criação de um governo universal
para o planeta Terra representava um proble-
ma urgente. Mas uma série de acontecimentos
misteriosos vieram perturbar a realização desses
projetos.
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Dois destróieres de três tripulantes da Ter-
ceira Potência não regressaram de um vôo de
reconhecimento. Mais ou menos ao mesmo
tempo, desapareceu uma nave auxiliar, da clas-
se dos chamados girinos. Tudo isso aconteceu
numa época de paz, na qual não se percebia o
menor sinal de que houvesse o perigo de uma
invasão extraterrena. Como se isso não bastas-
se, as naves de patrulhamento da Terceira Po-
tência, alertadas por esses fatos, constataram
que pouco depois algumas naves desconhecidas
pousaram em Vênus e logo voltaram a decolar.
Certas perturbações na estrutura espaço-tempo-
ral permitiram a medição de transições que só
poderiam ter sido originadas por hipersaltos
executados por unidades espaciais desconheci-
das. O maior cérebro positrônico do sistema so-
lar, instalado na selva do hemisfério norte do
planeta Vênus, com base em fatores de proba-
bilidade bem fundados, concluiu que um poder
desconhecido vindo das profundezas do espaço
descobrira a posição da Terra, mas recuava di-
ante de um conflito aberto.
Constatada essa situação, Rhodan colocou
em estado de alarma seu Exército de Mutantes
e, numa missão extenuante, tangera seus mem-
bros para todos os cantos do globo terrestre.
Mas a missão não produziu o menor resultado.
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Seus colaboradores supersensoriais — parte de-
les eram telepatas — voltaram sem terem con-
seguido nada.
Em Terrânia, a metrópole da Terceira Po-
tência, erguida em pleno deserto de Gobi, não
se sabia o que fazer. Pelo que tudo indicava,
certos acontecimentos misteriosos que se verifi-
caram na Terra só podiam ser atribuídos a
agentes vindos de fora. Mas ninguém conseguia
localizar esses agentes. E, quando um mutante
não conseguia encontrá-los, qualquer um have-
ria de confessar que não podia fazer mais nada.
Isso, todavia, não aconteceu com Perry Rho-
dan!
Ele inverteu as posições. “Se Maomé não
vai à montanha, a montanha tem de ir a Mao-
mé”, conjeturou. Agiu como se Julian Tifflor,
um dos elementos mais promissores de seu cor-
po de cadetes, fosse um agente altamente se-
creto da Terceira Potência. Tifflor era a isca.
E os desconhecidos morderam a isca.
Apoderaram-se da nave espacial em que Tif-
flor viajava, a Good Hope-IX, comandada pelo
major Deringhouse. Para isso, lançaram mão
de um raio de tração. Depois desviaram o veí-
culo espacial para o sistema que gravita em tor-
no dos sóis geminados de Beta-Albíreo, situado
a uma distância de trezentos e vinte anos-luz.
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Imediatamente a Stardust-III, com dois giri-
nos a bordo e acompanhada dos cruzadores
Terra e Solar System seguiu o cadete. Mas
Rhodan teve bastante inteligência para não su-
perestimar o poderio de sua pequena frota.
Não podia arriscar um ataque direto; teria que
se manter a uma distância segura e sondar a si-
tuação.
As informações de Crest, o arcônida, confir-
maram o acerto desse procedimento.
Descobriram que estavam lidando com uma
raça legendária de mercadores galácticos, os
saltadores. A posição do sistema de Beta-Albí-
reo constituía o indício mais seguro disso. Crest
pôde explicar detalhadamente o que havia com
essa raça.
Há oito mil anos da escala de tempo terres-
tre os saltadores haviam se separado do Grande
Império arcônida, embora fossem descendentes
dos arcônidas. Seu estilo de vida inconstante fez
com que passassem a levar vida nômade. Com
isso desenvolveram uma cultura e uma tecnolo-
gia autônoma. Enquanto o mundo de Árcon,
que já fora tão forte, entrou num processo de
degenerescência ininterrupta, os mercadores sa-
íram pelas imensidões da galáxia, onde encon-
traram poder e riqueza. Embora não fossem de
índole guerreira, não recuavam diante de qual-
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quer meio para alcançar os objetivos a que se
propunham. E um desses objetivos era a Terra.

***

Paciência!
Esse pedido de Rhodan representou uma
dura provação para todos. Até para ele mesmo.
Faltavam doze horas para o pouso na Terra.
O que não poderia acontecer nesse tempo?
Os agentes estranhos eram robôs que inte-
gravam suas próprias fileiras. Mas robôs com a
programação modificada.
Na sala de comando não discutiam muito.
Sempre que o chefe da Terceira Potência se
encontrasse presente, guardava-se um respeito
espontâneo, embora todos soubessem que
Perry Rhodan era um homem acessível a qual-
quer idéia razoável.
Um homem que raras vezes guardava silên-
cio era o representante de Rhodan, Reginald
Bell.
Bell encontrou a palavra adequada para des-
fazer o clima de tensão.
— Até parece que vocês estão sendo leva-
dos para a forca. O que importa que faltem al-
gumas horas para o pouso? Ao menos conhe-
cemos a situação. Afinal, os robôs enlouqueci-
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dos já estão andando há semanas pelas áreas
que estão sob nosso controle. E, apesar do tra-
balho secreto que talvez já tenham feito, a Ter-
ra continua de pé. Quando estivermos na Ter-
ra, não demoraremos a dar um fim a isso. Acho
que ainda vamos atrapalhar os cálculos dessa
gente.
Bell se calou. Um ou outro dos circunstantes
respondeu com um aceno de cabeça. Mas não
chegou a se estabelecer a conversa que ele de-
sejaria. Perry Rhodan transmitiu algumas or-
dens para os observadores e solicitou um con-
trole de rota.
Concluída essa operação de rotina, o silên-
cio voltou a se instalar na sala. Os pensamentos
voltaram a caminhar pelo futuro e pelo passa-
do.
A Good Hope-IX, com o comandante e os
cadetes, caíra nas mãos dos saltadores. A essa
hora, porém, já se sabia que Tifflor e seus com-
panheiros haviam conseguido chegar a um pla-
neta de gelo, onde se mantinham escondidos.
Rhodan enviara Gucky, um estranho ser pelu-
do, para ajudá-los; graças aos seus múltiplos
dons parapsicológicos, Gucky representava
uma ajuda substancial. No momento era só o
que podia fazer pelo grupo. A qualquer mo-
mento teria que contar com a vinda de reforços
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para o inimigo. Suas naves eram unidades dota-
das do acabamento arcônida. Para se manter
diante desse inimigo dotado de iguais recursos
técnicos teria que procurar alcançar uma superi-
oridade em outra parte. E essa outra parte só
poderia se situar no planeta Peregrino, o plane-
ta da vida eterna.
Mas, para encontrar o Peregrino, não basta-
ria uma navegação de rotina. Os anuários astro-
náuticos e as tabelas de efemérides não adianta-
riam nada. O planeta da vida eterna era um
mundo sem sol. Era um solitário que jazia nos
campos gravitacionais da Via Láctea, mas podia
alterar sua rota independentemente dos mes-
mos, segundo a vontade e os caprichos de seu
senhor.
O cérebro positrônico altamente desenvolvi-
do estava em condições de obter dados sobre a
posição do planeta; e estes dados se revestiam
de razoável teor de probabilidade. O cérebro
“mais inteligente” de que dispunha a Terceira
Potência estava instalado em Vênus.
Esse fato bastara para levar Perry Rhodan a
se afastar do sistema de Beta-Albíreo. Precisava
dos dados sobre a posição em que o Peregrino
se encontrava no momento, pois ali iria buscar
aquilo de que necessitava para alcançar superio-
ridade sobre os mercadores.
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Concluiu-se que a notícia alarmante transmi-
tida pelos cruzadores em patrulha não corres-
pondia ao programa. Apesar disso, Rhodan
conseguiu extrair o que havia de melhor nesse
fato.
Finalmente obtivera algum indício sobre a
ação a ser empreendida na Terra. Na verdade,
a origem daquela situação que envolvia todos
estava no seu planeta natal. Por semanas a fio
não conseguiram pôr as mãos no inimigo invisí-
vel. Só agora, através da atuação de Tifflor,
descobrira-se que a causa de tudo aquilo não
eram seres vivos, mas robôs.
O novo dado constituía motivo suficiente
para desistir por enquanto do pouso em Vênus.
De nada valeriam as vitórias que fossem alcan-
çadas lá fora, na galáxia, se a Terra, que era a
base da Humanidade, ia passando progressiva-
mente ao controle do inimigo.
Rhodan preferiu não transmitir para Terrâ-
nia os fatos que haviam acabado de chegar ao
seu conhecimento. Seria melhor chegar de sur-
presa. Não queria que qualquer dos agentes do
inimigo soubesse antes da hora que sua identi-
dade havia sido descoberta.
Na altura da órbita de Júpiter, a Stardust-III
expediu o primeiro aviso. Tratava-se de uma
mensagem lacônica e rotineira, que informava a
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base de Gobi de que o pouso de Rhodan estava
previsto para breve.
A confirmação de Terrânia veio pela voz do
próprio coronel Freyt.
— Ainda bem que está chegando, chefe.
Muita coisa aconteceu na sua ausência.
— Não me aborreça, coronel — disse Rho-
dan com um sorriso, a fim de confundir eventu-
ais escutas do inimigo. — As notícias que lhe
trago também não são muito agradáveis. Espe-
ro que ao menos tenha descoberto os agentes
do inimigo durante minha ausência.
— Reivindico o direito de não ser mais inteli-
gente que você e seu Exército de Mutantes —
respondeu o coronel Freyt em tom distante. —
Elaboramos um relatório detalhado sobre as
ações por nós empreendidas. Com sua permis-
são, o mesmo lhe será apresentado logo após
sua chegada.
— Não faça tanto drama. Afinal, qual foi o
resultado?
— Os tais dos agentes inimigos não existem.
Muito obrigado, coronel. Fique com esse
tipo de surpresa para si. Seria justo que uma
pessoa que volta para casa só recebesse notí-
cias agradáveis. Acho que você não levará mais
de dez anos para aprender isso...

19
***

A Stardust-III penetrou na abóbada energéti-


ca da área central de Terrânia, que se abrira es-
pecialmente. No espaçoporto A vários veículos
estavam à espera, para levar os oficiais aos
quartéis. O resto da tripulação foi colocado em
vários ônibus robotizados. Ficaram para trás
apenas dez homens da equipe de conservação,
que imediatamente entraram em contato com
os robôs de plantão, que realizariam uma limpe-
za e uma verificação cuidadosa no gigantesco
veículo espacial.
Rhodan foi imediatamente ao escritório de
Freyt. Somente Bell o acompanhou.
Contrariamente ao que costumava fazer, o
coronel não comparecera ao espaçoporto para
recebê-los. O cumprimento que pronunciou à
entrada de Rhodan e Bell não teve nada de so-
lene. Freyt parecia deprimido. De pé atrás da
escrivaninha, disse com a voz um tanto cansa-
da:
— Façam o favor de sentar.
Estendeu um estojo de cigarros a Rhodan e
Bell. Sentou devagar e respirou aliviado. Talvez
fosse porque a partir desse momento a respon-
sabilidade pela Terceira Potência voltara às
mãos de Rhodan. Apesar disso, não parecia
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muito aliviado.
— Tudo continua como antes, chefe, com a
única diferença de que o inimigo fica mais atre-
vido a cada dia que passa...
— Há pouco me disse pelo rádio que os
agentes inimigos não existem.
— E não existem mesmo, se me baseio no
resultado das nossas investigações. Mas eles
passam a existir se você lê os jornais, Rhodan.
— Está bem. Conte tudo, Freyt.
— Esqueça-se da palestra que tivemos pelo
rádio. Aqui estamos entre nós; podemos falar à
vontade.
— Duvido muito de que estejamos a sós.
— Não se faça de neurastênico, coronel!
Nunca me constou que você sofresse alucina-
ções. Não me comece com isso justa mente
agora.
— Estou falando sério. Não há dúvida de
que os agentes que procuramos realmente exis-
tem. Mas não existe um ser vivo na Terra que
possa ser reconhecido como tal. O senhor mes-
mo experimentou aquele fracasso com a atua-
ção dos mutantes...
— Não me recorde os meus fracassos.
— Hoje já sabemos mais alguma coisa. O
cadete Tifflor descobriu que os indivíduos que
estamos procurando são nossos robôs... Ou ao
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menos alguns deles...
— O coronel Freyt encarou o chefe.
— Nossos robôs? — gaguejou. — Isso é...
— Isso é perfeitamente possível e plausível,
Freyt. É a única explicação que temos. Tifflor
sabe disso. Não imaginou esta solução, mas an-
dou espreitando o inimigo.
— E a explicação é perfeitamente aceitável.
— Todo mundo sabe que nossos telepatas
não podem ler os pensamentos dos robôs. Seu
processo mental desenvolve-se em outra faixa
de freqüência que o do homem natural. Além
disso, as reações celulares artificiais são muito
mais primitivas e menos exatas que as do nosso
cérebro. Portanto, não há por que deixarmos
de acreditar nessa versão.
De um instante para outro, Freyt parecia
completamente transformado. Sua atitude volta-
ra a exprimir o otimismo que todos estavam
acostumados a ver nele.
— Nesse caso não haverá o menor proble-
ma. Suspendemos o suprimento de energia de
todos os robôs e realizamos uma revisão com-
pleta nos mesmos.
— Foi esta a decisão que tomei há oito ho-
ras — disse Rhodan, arrefecendo o entusiasmo
de Freyt. — Mas espero que você consiga ima-
ginar o que vai acontecer se paralisarmos hoje
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de tarde todos os robôs de trabalho. Nossas li-
nhas de montagem estão trabalhando a plena
capacidade. A eliminação de vários milhares de
elementos de vigilância significaria que em mui-
tos casos as reações necessárias deixariam de
ser realizadas. Imagine o que vai acontecer se a
corrida de um alto-forno sofrer um atraso, ou se
o suprimento de grafite de um reator não for
controlado, ou...
O coronel Freyt levantou a mão, num gesto
de recusa.
— É claro que compreendo, Rhodan. Nossa
indústria não pode funcionar sem a utilização
constante dos robôs. Haveria uma catástrofe...
— Somos escravos da nossa tecnologia —
disse Bell, completando o raciocínio. — É uma
situação maluca. O inimigo está em nossas filei-
ras. Se reduzirmos essas fileiras à inatividade,
nossa cidade não demorará um dia em voar pe-
los ares. A solução do dilema cabe a você, Rho-
dan.
Rhodan provou que a solução não era tão
difícil assim. Era bem verdade que os habitantes
humanos de Terrânia teriam que desenvolver
uma energia extraordinária.
— Dispomos de sete horas para preparar a
execução do plano. Depois das vinte e duas ho-
ras, o último turno dos trabalhadores da indús-
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tria comum vai para casa. Até lá noventa por
cento das nossas fábricas estarão paralisadas.
Só teremos de nos preocupar com os dez por
cento que trabalham dia e noite. Trata-se das
usinas de força, dos postos de controle geral,
dos hospitais, das unidades policiais, do serviço
de vigilância estratégica, etc. Até as vinte e duas
horas todos esses serviços deverão ser ocupa-
dos discretamente por seres humanos. Às vinte
e duas horas e dez minutos o suprimento de
energia de todos os robôs será suspenso.
De todos os robôs de trabalho, Rhodan —
ponderou Bell. — Não se esqueça de que os ro-
bôs de combate dispõem de um comando indi-
vidual, motivo por que não dependem dos im-
pulsos fornecidos pelo cérebro central de con-
trole.
— É um risco que temos de assumir — de-
clarou Rhodan. — Com uma única ação não
podemos liquidar tudo. Acontece que os robôs
de trabalho representam perto de oitenta por
cento do total de que dispomos. Com a parali-
sação deles, o risco principal será eliminado.
Faça o favor de convocar a cúpula do estado-
maior, coronel. Daqui a meia hora quero falar
com os meus colaboradores.
No mesmo instante teve início uma atividade
que poucas vezes havia sido vista em Terrânia.
24
Sob um sigilo absoluto e mediante um estrito
controle telepático, os colaboradores mais che-
gados de Rhodan receberam suas instruções.
Estas foram retransmitidas à ampla rede de se-
tores subordinados.
Para o observador desprevenido, as ativida-
des do dia-a-dia pareciam prosseguir sem a me-
nor alteração. Os numerosos turistas que se en-
contravam na cidade, vindos de todos os conti-
nentes, e que costumavam chegar a Terrânia
em contingentes diários de dois a três mil, ape-
nas viam a atividade benfazeja daquela nação
territorialmente tão pequena. Sem desconfiar
de nada, sentiam a paz, a segurança e o poder
que irradiavam do reino de Rhodan.
Quando a hora X se aproximava, se encon-
travam nos locais de vida noturna ou nos seus
aposentos nos hotéis.
22:00 h: As sereias anunciam o término de
mais um dia de trabalho, o fim do último turno.
22:05 h: O nervosismo cresce entre as pes-
soas informadas sobre os acontecimentos. Os
sentidos estão tensos.
22:10 h!
Em algum lugar situado no interior da abó-
bada energética central uma mão puxa a chave
de que tudo depende. No mesmo instante, mi-
lhares de robôs de trabalho suspendem sua ati-
25
vidade. Veículos dirigidos eletronicamente pa-
ram em meio à viagem. Em todos os lugares
em que havia máquinas que controlavam outras
máquinas o trabalho é suspenso. Nas indústrias
vitais as pessoas que se encontram de prontidão
saltam para a frente e numa questão de segun-
dos substituem as máquinas que entraram em
greve. A vida tinha de continuar.
Tudo aquilo havia sido preparado nos meno-
res detalhes. Os homens de Terrânia trabalha-
vam em mais de cinco mil turnos especiais. A
execução de numerosas funções, que o homem
progressista há anos entregara à máquina, cor-
reu sem o menor contratempo. Aquilo repre-
sentava uma recaída para o desconforto de
tempos mais atrasados. Mas, apesar dos termos
lacônicos em que fora concebida, a ordem se-
creta levara ao conhecimento de todos os parti-
cipantes que as questões que se encontravam
em jogo eram de importância vital.
De repente, viaturas policiais com os alto-
falantes a todo volume passaram pelas ruas.
— Atenção, moradores de Terrânia! Houve
um contratempo no posto central de controle
de robôs. Pedimos a todos que se mantenham
calmos e disciplinados. Os reparos demorarão
algumas horas. O ministério do interior tomará
imediatamente todas as medidas necessárias.
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Os hóspedes e habitantes de Terrânia que teri-
am que andar mais de quinze minutos para che-
gar em casa deverão comparecer aos pontos de
parada. Pedimos que os que residam mais perto
andem a pé. Não há motivo para preocupa-
ções. Mantenham-se disciplinados. O ministério
do interior tomará imediatamente...
O quartel-general da operação fora instalado
no escritório do coronel Freyt. Este se transfor-
mara numa espécie de prefeito de Terrânia,
embora sua posição oficial não fosse esta. Era o
representante de Rhodan no território da Ter-
ceira Potência e, como tal, conduzia os destinos
do Estado e de sua capital sempre que Rhodan
se encontrasse em outro lugar. E muitas vezes
Rhodan se encontrava em outro lugar.
O representante de Rhodan nas questões
universais era Reginald Bell. Dali se concluía
como esses dois homens sofriam sob o peso
das chamadas viagens de negócios. Quase sem-
pre andavam fora. Em outro país, em outro
planeta e até em outro sistema solar.
A tarefa de Freyt era mais prosaica, muito
embora tanto no caráter como no aspecto exte-
rior ele tivesse muita semelhança com Perry
Rhodan. Geralmente ficava no deserto de Gobi,
onde executava as funções de lugar-tenente do
chefe.
27
Quando Rhodan regressava, muitas vezes
apresentava relatórios extensos sobre os acon-
tecimentos rotineiros do dia-a-dia. E às vezes
havia algo de excitante.
Como hoje.
O coronel Freyt não procurou ocultar o fato
de que a presença de Rhodan representava um
alívio para ele. Dificilmente teria havido em
Terrânia horas tão críticas como as que esta-
vam se passando. Reginald Bell chegou a afir-
mar que era o dia mais excitante que vivia des-
de o pouso no deserto de Gobi.
— O resultado de nosso trabalho foi exce-
lente — argumentou Bell. — Nenhuma das
ações que nos foram relatadas deixa nada a de-
sejar. Sei perfeitamente que só na Terceira Po-
tência uma tarefa pode ser executada com ta-
manha precisão. Mas a coisa deverá ter seu
prosseguimento...
— Você não demorará em saber como pros-
seguirão as coisas — respondeu Rhodan. —
Até agora o mundo não parou por causa das
preocupações que passam pela sua cabeça.
— Mas os robôs pararam. Lembro-me per-
feitamente das promessas gordas que você
transmitiu pelos alto-falantes móveis e pela rá-
dio estatal. Você sabe perfeitamente que, por
enquanto, nem podemos pensar em reativar os
28
robôs de trabalho, a não ser que deseje trazer
de volta o risco que ontem enfrentávamos.
— Agora é noite. Nas próximas horas pouca
gente estará interessada em saber quando os
robôs estarão plenamente recuperados. A situa-
ção só começará a se tornar crítica amanhã de
manhã, quando as pessoas quiserem esquentar
a água para o café. Até lá teremos que dar con-
ta do recado.
Bell se limitou a dar de ombros, num gesto
de incredulidade. Pensava nos milhares de ro-
bôs, que teriam de ser examinados um por um.
E o exame só poderia ser realizado por seres
humanos.
Saíram do escritório de Freyt e dirigiram-se
ao elevador que os levaria ao subsolo. Ali havia
muitos veículos que podiam ser dirigidos pela
mão do homem. Pegaram três carros e saíram
para a área dos fundos, de onde se dirigiram a
um pavilhão situado a cerca de quatro quilôme-
tros de distância.
Ali uns trezentos engenheiros haviam mon-
tado seus postos de controle. Já estavam traba-
lhando no momento em que Rhodan chegou
com seu estado-maior, que incluía vários mu-
tantes.
Numa fila ininterrupta vinham chegando os
caminhões, cujos guindastes colocavam cautelo-
29
samente no chão os robôs desativados.
Rhodan e Reginald Bell entraram no pavi-
lhão e visitaram alguns dos postos de controle.
O chefe da Terceira Potência conversou com os
engenheiros-chefe e os dirigentes técnicos.
Apenas dizia algumas palavras indiferentes, pois
a forma de execução do trabalho havia sido es-
tabelecida em todos os detalhes. Os pacientes
eram classificados segundo critérios especiais e
transferidos a outro setor, onde era apagada a
programação anterior. Poucos recebiam desde
logo um novo programa. Eram aqueles que se-
riam necessários para os serviços que teriam
que ser executados ainda naquela noite. Os ou-
tros teriam que aguardar novas solicitações.
Saíram do pavilhão, depois de terem se cer-
tificado de que o trabalho com os robôs corria
normalmente. Antes de entrarem nos seus car-
ros, Rhodan se dirigiu a Tako Kakuta, um tele-
portador japonês que, graças às suas capacida-
des sensoriais que haviam passado por um pro-
cesso de mutação, estava em condições de se
teleportar no mais curto espaço de tempo para
qualquer lugar que escolhesse. No âmbito da
geografia terrestre as distâncias praticamente
não representavam nada para ele.
— Olá, Tako! Dê um salto para junto do ca-
pitão Klein, que está dirigindo a ação contra os
30
robôs de combate. Peça que ele lhe forneça um
breve relato sobre a situação e vá diretamente
ao escritório do coronel Freyt. Dentro de cinco
minutos no máximo estaremos lá.
— Está bem, chefe — confirmou o telepor-
tador. Por um instante concentrou-se sobre o
alvo que pretendia atingir com o salto. Depois
disso, a figura de seu corpo se dissolveu num
nada aparente. Para os homens da Terceira Po-
tência, o desaparecimento de um teleportador
numa questão de segundos era um aconteci-
mento corriqueiro.
— Peço aos outros que venham comigo —
disse Rhodan.
Elaborara um plano bem definido para as
ações a serem empreendidas naquela noite. E
uma das providências mais inteligentes consistia
em estar prevenido para qualquer imprevisto.
Por isso não podia dispensar a presença dos
mutantes. Deviam estar à mão quando surgisse
algo de extraordinário.
Rhodan examinou o grupo de mutantes.
Muitos dos mais capazes dos seus mutantes
tinham ficado em companhia de John Marshall,
a bordo dos cruzadores pesados Terra e Solar
System, estacionados no sistema de Beta-Albí-
reo. Assim mesmo Rhodan podia depositar
toda a confiança nos homens e nas mulheres
31
que com ele tinham regressado à Terra.
Além de Tako Kakuta podia contar com
Anne Sloane, uma americana loura e delgada
que tinha o dom da telecinésia. Nos últimos
anos, ela aperfeiçoara este dom através de um
treinamento constante. Também havia Ishi Mat-
su, uma japonesa, que era uma ótima telepata.
E Wuriu Sengu, um tipo de ombros largos com
aspecto de lutador, cujas forças mentais permi-
tiam-lhe enxergar através da matéria compacta.
Tanaka Seiko, o goniômetro, possuía um cére-
bro que desempenhava as funções de um re-
ceptor de ondas de rádio; podia captar qualquer
freqüência sem precisar de um rádio. Finalmen-
te, naquela noite ainda dispunha de Kitai Ishi-
bashi, um sugestor que dispunha de considerá-
veis forças hipnóticas. Quem se encontrasse
sob a influência de Kitai, faria o que ele desejas-
se, embora acreditasse que estava agindo por
sua livre vontade.
Chegaram ao escritório de Freyt.
— Se as coisas correrem conforme você pla-
nejou — disse o Dr. Manoli, amigo intimo de
Rhodan desde o tempo da primeira viagem lu-
nar — poderemos passar a noite com vinho e
cigarros.
— Com vinho não. Hoje de noite o uso do
álcool é proibido.
32
Tiveram de se contentar com cigarros.
Pouco depois chegou Tako Kakuta. Não en-
trou pela porta ou por qualquer outra abertura
na parede. Veio pela maneira peculiar de um
teleportador. No meio da sala se rematerializou
de seu breve salto.
— Tudo bem, chefe — anunciou. — O capi-
tão Klein está cheio de serviço e disse que eu só
o perturbava. Mas acabou dizendo que pode-
mos ficar tranqüilos.
Rhodan levantou a cabeça; parecia contrari-
ado.
— Desejo um relatório especificado, Kakuta.
Não quero ver chegar o dia em que Klein não
tem tempo para mim. Da próxima vez não se
contente com algumas frases vazias. Entendido?
— É claro que o capitão me entregou algu-
mas linhas — disse Kakuta, abatido. — Aqui
está o papel.
Rhodan leu; seu rosto parecia mais satisfei-
to.
— Está bem. Ao que parece, também no se-
tor de Klein tudo está dando certo. À meia-noi-
te em ponto, o grupo de choque entrou em
ação. Até agora mais de quinhentos robôs de
combate foram desativados em ações individu-
ais. Se as coisas continuarem assim, ao ama-
nhecer do dia a missão estará concluída e pode-
33
remos incluir um comunicado tranqüilizador no
noticiário das sete.
— Gostaria de ter o seu otimismo — res-
pondeu Bell em tom indiferente, sem modificar
a posição confortável em que se encontrava na
poltrona de plástico. — Se as informações ex-
pedidas pelo cruzador Terra forem exatas,
grande parte dos nossos robôs age segundo a
vontade do inimigo. Não posso imaginar que os
saltadores tenham alterado apenas a programa-
ção dos robôs de trabalho. Todas as probabili-
dades levam à conclusão de que um inimigo es-
perto se interessaria em primeiro lugar pelas
máquinas de guerra. Em primeiro lugar foram
concebidas para atuar num conflito declarado, e
depois sua qualidade de indivíduos cibernéticos
confere-lhes uma autonomia maior que a dos
robôs de trabalhos, submetidos a um comando
centralizado.
— Seu raciocínio não deixa de ser correto
— confirmou Rhodan. — Foi por isso que tive
uma conversa mais prolongada com o capitão
Klein. A luta que ele terá que travar hoje de noi-
te é mais difícil que muitas das grandes batalhas
do espaço que já enfrentamos. Seus comandos
especiais são formados exclusivamente por ofi-
ciais e tenentes. Mas você ouviu o que Tako
acaba de dizer.
34
O teleportador confirmou com um aceno de
cabeça, como se estivesse empenhado em acal-
mar os ânimos exaltados.
— Por três minutos ouvi o capitão Klein ex-
pedir ordens e receber informações. O trabalho
está sendo executado com uma precisão crono-
métrica. Os homens se aproximam dos robôs
de combate ativados em grupos de três. Na
maioria obedecem à sua lei fundamental, segun-
do a qual devem aceitar sem discussão qualquer
decisão de um ser humano. Não oferecem re-
sistência ao serem desativados...
— Na maioria?
— Isso mesmo. Dizem que houve três exce-
ções. Mas antes que os sujeitos pudessem ativar
seu campo protetor individual, nossos coman-
dos os atomizaram com seus radiadores manu-
ais. O chefe tem razão. Quando o sol nascer,
tudo terá chegado ao fim.
Todos olharam instintivamente para Rho-
dan, que parecia ser o único que não partilhava
o otimismo generalizado. Em sua testa via-se
uma ruga.
— O que acha, Bell? Você não acha que a
coisa está sendo fácil demais?
— Sei o que está querendo dizer. Um robô
de combate deveria ter reações mais seguras,
que lhe permitissem ativar seu campo protetor
35
em tempo quando fosse atacado por um ho-
mem. Ainda acontece que, se os saltadores pro-
gramaram vários exemplares segundo seus inte-
resses, estes deviam se unir para enfrentar nos-
sos comandos. De outra forma a coisa não faria
sentido.
— É isso mesmo. Acho que nosso vôo para
Vênus terá de ser adiado por algumas horas ou
alguns dias. Não sairemos da Terra enquanto
não tivermos certeza de que tudo está em or-
dem. Sairei por alguns minutos. Enquanto isso
você assume o comando, Bell.
Reginald Bell confirmou com um aceno de
cabeça. Ninguém perguntou quais eram as in-
tenções de Rhodan.

***

Uma vez lá fora, Rhodan entrou num carro


e saiu em desabalada carreira em direção ao es-
paçoporto central, em cuja proximidade estava
instalado o cérebro positrônico de Terrânia. En-
trou no enorme edifício. Não havia ninguém
por perto. As barreiras de segurança iam abrin-
do caminho para Rhodan, depois de este ter se
identificado através do modelo de suas ondas
cerebrais. Finalmente atingiu o grande pavilhão
e realizou alguns cálculos. Os resultados pareci-
36
am satisfazê-lo até certo ponto.
Era bem verdade que seu trabalho não era
apenas este.
Os acontecimentos que se desenrolavam na
Terra representavam um contratempo nos pla-
nos de Rhodan, mesmo que pudessem ser ven-
cidos num espaço de tempo bastante reduzido.
O regresso para o sistema do Sol fora realizado
exclusivamente com vistas ao grande cérebro
positrônico instalado em Vênus. Depois da des-
coberta do planeta Peregrino, Rhodan armaze-
nara nas extensas aparelhagens do cérebro po-
sitrônico de Vênus os dados e as quantidades de
aproximação daquele corpo celeste. Por isso
mesmo, só aquele cérebro poderia lhe fornecer
os dados de que precisava.
Rhodan transmitiu o aviso em palavras fala-
das, gravou-o em fita e ouviu a gravação.
— Perry Rhodan, de Terrânia, para o cére-
bro P de Vênus. Chave secreta PQ-3Z4! Ordem
de prontidão. Preparar todos os dados para o
Projeto Vida Eterna-Peregrino. Estado de alar-
ma até novas instruções. Peço confirmação.
O texto era correto. Rhodan introduziu-o no
hipercomunicador, que realizava a transmissão
instantânea pela quinta dimensão. A resposta
chegou dentro de poucos segundos.
— Cérebro P de Vênus para Perry Rhodan
37
em Terrânia. Instruções compreendidas. Todos
os dados para o Projeto Vida Eterna-Peregrino
serão preparados. Estado de alarma até nova
ordem. Ajuste conforme chave secreta PQ-3Z4.
Completamos: cláusula de bloqueio ligada ao
projeto Peregrino não inclui o receptor. Quais-
quer informações serão fornecidas exclusiva-
mente a Perry Rhodan em pessoa. Fim.
A tela do telecomunicador se apagou. Rho-
dan foi para o carro e voltou ao escritório de
Freyt.
Lá não encontrou nada de novo.
— Tako, dê mais um salto para o lugar em
que se encontra o capitão Klein.
— Sim.
— Por que não vamos todos ao quartel-
general de Klein? — perguntou Bell. — Assim
receberemos as informações de primeira mão.
— Ficamos aqui — decidiu Rhodan laconica-
mente. — Uma concentração das mulheres e
dos homens mais importantes na área de Klein
poderia provocar suspeitas.
Não quero que o quartel-general da ação
que está sendo empreendida fique exposto a
um risco desnecessário. Klein deve trabalhar de
forma discreta enquanto isso for possível.
Kakuta cumpriu a ordem. Demorou um pou-
co mais que da outra vez. Em compensação
38
voltou com notícias mais agradáveis.
— Metade dos robôs de combate estaciona-
dos em nosso território já foi posta fora de
combate. Mas oito máquinas tiveram que ser
destruídas porque opuseram resistência. O capi-
tão Klein não sofreu qualquer perda.
— As coisas estão correndo mesmo com a
precisão de um cronômetro — disse Bell, bas-
tante satisfeito.
E por mais algumas horas isso seria verdade.
Quando o crepúsculo anunciou a chegada
de um novo dia, todos os robôs de combate ha-
viam sido desativados. Nas primeiras horas da
manhã foi iniciado o transporte para o pavilhão
de controle, onde os gigantes de mais de dois
metros seriam submetidos ao mesmo tipo de
verificação realizada com seus colegas da casta
dos trabalhadores.
Às sete da manhã, o capitão Klein apresen-
tou a lista completa das máquinas colocadas
fora de combate, com indicação do tempo e lu-
gar. Onze indicações traziam a nota “destruí-
do”.
— Foi um serviço excelente — disse Rho-
dan, elogiando o capitão.
Falou alguns segundos antes da hora. No
mesmo instante veio a grande reviravolta.

39
2

O Videofone emitiu o ruído insistente da li-


gação automática. No mesmo instante o zumbi-
do do alarma encheu a sala e, por cima da tela,
a luz de advertência começou a piscar a breves
intervalos.
Na tela surgiu a figura de um tenente.
— Os robôs estão marchando, capitão! Es-
caparam do pavilhão e avançam numa frente
ampla por três ruas...
O tenente apontou a objetiva para fora da
janela da sala de vigilância, e todas as pessoas
que se encontravam no escritório de Klein pu-
deram testemunhar o acontecimento. Mais de
mil robôs de combate saíram do pavilhão e en-
cheram a grande praça fronteira. As vanguar-
das começaram a formar três cunhas, que avan-
çavam para o norte, leste e oeste.
— Dê ordem de retirada a todos os destaca-
mentos militares, capitão! — gritou Rhodan. —
Os que ainda estão vivos na área do pavilhão
devem se retirar numa distância mínima de qui-
nhentos metros e entrar em formação. Os mu-
tantes comparecerão ao quartel-general do co-
ronel Freyt. Vamos logo, coronel! Bell, você irá
comigo.
Os dois amigos entraram no carro de Rho-
40
dan e saíram em disparada em direção ao cére-
bro positrônico. A viagem não durou mais que
cento e cinqüenta segundos.
Eram cento e cinqüenta segundos muito pre-
ciosos, pensaram os dois. Mas sabiam que a
perda seria recuperada.
Era bem verdade que Rhodan poderia dar o
alarma em qualquer lugar em que se encontras-
se. Suas pulseiras versáteis bastariam para isso.
Mas, face à catástrofe ora desencadeada, o
anúncio de qualquer tipo de alarma não seria
uma medida suficiente. O cérebro positrônico
havia sido programado para milhares de alter-
nativas, e regulado previamente para qualquer
emergência. Dessa forma, todas as reações es-
pecíficas poderiam ser determinadas e emitidas
ao mesmo tempo.
Rhodan mal havia passado pela última bar-
reira, quando sua simples presença fez com que
o cérebro se ativasse para o recebimento de co-
mandos.
— Bell! A caixa número três! Passe para cá!
Uma gaveta sobre trilhos deslizou para fora
de um armário embutido; estava recheada de
cartões perfurados. Rhodan arrancou um maço
de cartões da mão do amigo e atirou-o para
dentro da abertura de recepção, que media três
metros. Bell entregou-lhe outras pilhas de car-
41
tões, que foram atirados sem prévia escolha
para dentro do primeiro estágio do seletor.
Rhodan comprimiu nove botões. Desde o tem-
po do supertreinamento arcônida sabia de cor a
respectiva combinação.
— Agora vamos respirar profundamente três
vezes. E vamos soltar o ar bem devagar.
Isso não durou mais de quinze segundos. O
fim do exercício respiratório coincidiu com a
conclusão da primeira operação de interpreta-
ção. Rhodan segurou um dos muitos cartões
que atirara na máquina.
— É este! Reação de alarma para todo o ter-
ritório da Terceira Potência no caso da falha de
todos os robôs individuais combinada com um
perigo vindo de dentro...
O cartão logo desapareceu em outro setor
do cérebro. O aparelho superdimensionado
despertou para a vida em cem pontos diferen-
tes. Cada reação fundamental desencadeava
muitas outras. Com a rapidez de um relâmpa-
go, os impulsos positrônicos captaram todos os
aspectos da tarefa e se incumbiram de uma
operação complicada e variada de emissão de
ordens.
Rhodan e Bell não puderam fazer outra coi-
sa senão ficar parados e respirar profundamen-
te por mais três vezes.
42
As ordens elaboradas pelo aparelho abrangi-
am também o setor civil. Os funcionários mais
importantes receberam instruções sobre as pro-
vidências a serem adotadas por via direta, atra-
vés dos receptores de videofone instalados em
seus escritórios e residências. As instruções ge-
rais foram transmitidas pela emissora de rádio
governamental, cuja programação normal foi
interrompida automaticamente.
Quando o cérebro positrônico ia repetir as
instruções, Perry Rhodan interveio pessoalmen-
te. Suas palavras foram transmitidas por uma
rede de alto-falantes, instalados principalmente
ao ar livre. Dessa forma todos que se encontra-
vam no território da Terceira Potência ouviam
suas palavras, inclusive o inimigo. Mas no mo-
mento não havia como evitar que isso aconte-
cesse.
As palavras de Perry foram de uma concisão
extrema. Em poucas palavras expôs a situação
extraordinária com que se defrontavam. Ao
concluir, disse que as instruções posteriores se-
riam secretas.
Saíram do recinto em que se encontrava ins-
talado o cérebro.
Quando saíram à rua, viram chegar os pri-
meiros caminhões com tropas, que se destina-
vam à proteção das instalações técnicas mais
43
importantes do Estado. Os soldados saltaram
dos veículos e se espalharam em torno do quar-
teirão. Rhodan saudou-os com um gesto de oti-
mismo e colheu uma série de olhares de confi-
ança. Podia confiar nesses homens. Não tinha
a menor dúvida.
Bell fez a mesma constatação.
— Que belo dinamismo, não é? — disse.
Sorriu e se apressou em entrar no carro de
Rhodan, que já se punha em movimento.
— De volta para o quartel-general!
Ali já haviam dado início ao cumprimento
das ordens recebidas. A cúpula do estado-maior
estava de prontidão com as roupas desajeitadas
que formavam o traje transportador arcônida.
— Já está na hora de nós dois colocarmos
isso — pediu Bell. — Com um automóvel con-
vencional não agüentaremos por muito tempo.
— Um belo dia você ainda aprenderá a ler
pensamentos — zombou Rhodan em tom amá-
vel.
Já estava envergando o traje arcônida.
Deixou o capacete aberto. Em caso de ne-
cessidade o fecho poderia ser colocado num
instante.
Nos últimos anos a entrega dos trajes trans-
portadores arcônidas passou a ser liberada em
escala cada vez maior para os funcionários e re-
44
presentantes mais importantes da Terceira Po-
tência. De início Rhodan e Bell eram os únicos
que os possuíam. Mas as fantásticas possibilida-
des de utilização desse equipamento tornaram
imperioso, no correr do tempo, que também os
membros do Exército de Mutantes, a alta oficia-
lidade e os funcionários mais graduados os re-
cebessem.
O traje arcônida era uma vestimenta um tan-
to desajeitada, que se usava por cima da roupa
comum. Uma instalação antigravitacional embu-
tida no mesmo permitia que seu portador voas-
se. Além disso, era dotado de um defletor de
raios luminosos que tornava a pessoa invisível
dentro da faixa de freqüência do olho humano
normal. Finalmente, uma barreira energética
cuja potência equivalia aproximadamente à de
um robô de combate assegurava a integridade
física do portador.
Lá fora um oficial deu sinal de sua presença.
Era o comandante do grupo destacado para a
proteção do escritório do coronel Freyt.
— Está bem, capitão — disse Bell. — Cum-
pra sua tarefa. Peço-lhe que só permita a entra-
da de pessoas que tragam alguma informação
de real importância.
Rhodan já se aproximara da tela do videofo-
ne. A grande base fixa instalada na Terra já co-
45
nectara as ligações sem fio para as comunica-
ções radiofônicas. Dessa forma surgiu o quadro
captado pela visão dos que se encontravam nos
helicópteros que patrulhavam os ares.
Apenas oito minutos tinham passado desde
o momento do alarma. Apesar disso o aspecto
das ruas passara por uma transformação pro-
funda. As três cunhas do exército de robôs
avançavam implacavelmente. Em outras pala-
vras, ainda não haviam se deparado com qual-
quer resistência digna de nota.
Mas a qualquer momento deveriam chegar
às linhas de Klein, que haviam realizado um re-
cuo. Enquanto esse receio ainda tomava corpo,
o fato aconteceu.
Os radiadores de impulsos das tropas de in-
fantaria escondidas nos prédios expeliram a
energia térmica, que era a única que represen-
tava um perigo para aqueles seres artificiais.
Boa parte dos atacantes prosseguiu em sua
marcha. Apenas uns poucos caíram ou se des-
mancharam. Os outros envolveram-se automati-
camente com seus campos energéticos proteto-
res, alimentados por uma miniusina nuclear. Os
robôs que se encontravam nas fileiras exteriores
desviaram-se imediatamente, deslocando-se o
mais rapidamente que seu formato o permitia
em direção às casas.
46
— Mantenha-se em contato com o inimigo,
capitão — disse Bell subitamente, dirigindo-se a
Klein. — Mas libere um canal para a força aé-
rea.
Ninguém se surpreendeu com essas pala-
vras. O alarma desencadeado pelo cérebro P in-
formou todo mundo sobre qual era seu lugar e
quem era seu comandante. Reginald Bell, mi-
nistro da segurança da Terceira Potência, inves-
tira-se automaticamente no comando supremo
das operações. A presença de Perry Rhodan
não alterava nada nessa situação.
O coronel Friedrichs apareceu no videofone.
— Sim senhor!
— Gostaria que o senhor me apresentasse
seu relato, coronel.
— As esquadrilhas de caça decolaram con-
forme o plano. A segurança de nosso território
nacional fica a cargo de caças de um tripulante.
Os destróieres de três tripulantes patrulharão o
espaço, até a altura da órbita lunar. No interior
da abóbada energética só podemos recorrer aos
helicópteros. Vinte e cinco unidades acabam de
decolar e se dirigem para as cunhas dos robôs.
Que armas devem ser utilizadas?
— Em hipótese alguma podemos usar bom-
bas. Não pretendemos reduzir nossa cidade a
um montão de escombros fumegantes. O ata-
47
que deve ser realizado com o armamento de
bordo. Utilize os radiadores de impulsos térmi-
cos. São as armas a cujos efeitos os robôs são
mais sensíveis.
— Sim senhor.
A comunicação foi interrompida. A atenção
de Bell voltou a ser dedicada à tela. As perspec-
tivas da cidade não pareciam muito boas, ao
menos no que dizia respeito à área situada no
interior da abóbada energética de dez quilôme-
tros de diâmetro, que formava o centro vital de
Terrânia.
Na tela via-se a imagem de muros que des-
moronavam. Edifícios de cinco e seis pavimen-
tos situados na rota dos robôs caíam como se
fossem barracos. As máquinas de guerra desen-
volviam um raciocínio autônomo, e dispunham
das armas mais eficientes que jamais um solda-
do carregou na Terra.
Sempre que eram recebidos pelo fogo da in-
fantaria, os aparelhos de observação neles ins-
talados logo lhes revelavam a posição do inimi-
go. Acontece que a massa dos soldados não dis-
punha de campos energéticos individuais. Não
tinham a menor chance.
Os alto-falantes informaram-nos de que re-
forços sob a forma de carros blindados, dirigi-
dos por homens, se encontravam a caminho.
48
Retiravam-se em corrida desesperada. Os vultos
saíam dos abrigos em disparada. As armas de
radiações dos robôs dispunham de bons alvos.
Sua capacidade de reação era muito superior à
do homem. Seu sistema nervoso era menos so-
fisticado que o de um ser biologicamente estru-
turado mas, em compensação, muitas vezes
mais eficiente. O sistema nervoso do homem e
do animal é uma instalação de alarma criada
pelo instinto de autoconservação. Nos robôs a
necessidade desse tipo de alarma praticamente
não existia. Sua especialidade era o ataque e a
destruição.
A primeira lei dos robôs — “Nunca deves
matar um ser humano” — estava sujeita a uma
forte diferenciação. Assim que qualquer ser hu-
mano passava a ser considerado um inimigo,
todos os escrúpulos eram deixados de lado. Em
virtude da modificação da programação realiza-
da pelos saltadores, todos os seres humanos
passaram a ser considerados inimigos.
Os homens assumiram maior cautela. Passa-
ram a se utilizar de qualquer coisa que os ocul-
tasse. Com os rostos cobertos de suor e sujeira,
foram chegando às posições de defesa.
Os oficiais designavam o lugar de cada um.
Uma ligeira massagem de choque. Tabletes
energéticos. Novas armas. Os primeiros carros
49
blindados estavam chegando. A tripulação de
outros tomava seus lugares no interior dos veí-
culos. E os soldados que haviam escapado ao
inferno continuavam a chegar.
— Que diabo! Onde estão os helicópteros?
— gritou Bell.
— Já estão chegando — disse Rhodan em
tom áspero.
A ponta da coluna de robôs que marchava
pelo centro se derreteu sob o fogo dos radiado-
res de impulsos. Oito máquinas de guerra foram
destruídas. Mas depois aconteceu uma coisa es-
tranha.
Os robôs se uniam em grupos de seis. Pro-
curavam estabelecer uma espécie de contato.
Quem os observasse, logo percebia que o havi-
am encontrado. Reforçavam-se mutuamente na
ativação dos campos energéticos. E um campo
energético seis vezes reforçado seria impenetrá-
vel até mesmo para as armas de médio porte
com que estavam equipados os helicópteros.
“Poderíamos nos orgulhar com a inteligên-
cia desses robôs, se eles estivessem do lado cer-
to”, pensou Rhodan.
Assim que uma onda de ataque dos helicóp-
teros passava, os grupos de seis dissolviam-se e
prosseguiam no ataque.
— Assim não conseguiremos deter o inimigo
50
— gemeu Bell. — Por que será que nesta bata-
lha não dispomos de mutantes?
— Pois temos mutantes — disse Rhodan em
tom oracular. A pergunta de Bell fora puramen-
te retórica. — As instruções contidas nas direti-
vas elaboradas pelo cérebro haviam-nos infor-
mado de que, no caso desse alarma, a utilização
dos mutantes não era recomendada. A não ser
que se quisesse jogar tudo numa única cartada.
Um dos princípios fundamentais que preva-
leciam na Terceira Potência determinava que os
mutantes deviam ser poupados sempre que ha-
via uma probabilidade de noventa por cento ou
mais de que os mesmos seriam destruídos.
— Dispomos de um teleportador, de um te-
lecineta, de um telepata, de um espia, de um
goniômetro e de um sugestor — constatou Bell.
— Tako só pode lidar consigo mesmo, Anne
poderia ser muito útil se não fosse preciosa de-
mais, e Ishi não pode extrair qualquer informa-
ção de uma máquina. Também Wuriu e Tanaka
não nos podem ser úteis. Kitai ainda não reali-
zou qualquer experiência bem sucedida com
máquinas. Então, para que servirá essa gente?
— Ofereço-me como voluntário — disse
Anne Sloane, uma lourinha delicada. — Já
movi objetos de várias toneladas por via teleci-
nética...
51
— Mas não em plena batalha — objetou
Rhodan. — Não adianta que enfrente esses co-
lossos, Anne. Conseguiria deter e fazer recuar
alguns deles, mas apenas por alguns instantes.
Mas não demoraria em chegar a sua vez. A su-
perioridade numérica é muito grande.
— Poderia atirá-los para o ar e fazê-los cair.
Eles se arrebentariam.
— Não fale mais sobre isso — recusou Rho-
dan. — Ainda temos outras coisas em reserva.
Tako, quer dar um pulo até aqui?
Rhodan falou baixinho com o teleportador;
ninguém entendeu suas palavras. Com exceção
talvez de Ishi Matsu, que era uma boa telepata.
De uma hora para outra, o rosto de Tako ir-
radiou alegria. Acenando fortemente com a ca-
beça, disse:
— Está bem, chefe! Voltarei quanto antes.
E logo desapareceu.
Ninguém se atreveu a fazer qualquer pergun-
ta a Rhodan. Sempre que bancava o misterioso,
ele se mostrava coerente nessa atitude; não re-
velaria seus segredos a ninguém.
O quadro que aparecia na tela estava com-
pletamente modificado.
Nas três frentes de avanço, a marcha dos ro-
bôs fora detida provisoriamente. Mas apenas
provisoriamente.
52
Os blindados que intervieram na batalha rea-
lizaram aquilo que Anne Sloane pretendia al-
cançar através de suas forças naturais. Recor-
rendo a radiadores antigravitacionais, os defen-
sores criaram áreas restritas em que os objetos
perdiam o peso. Alguns dos robôs, impelidos
pelos instrumentos de deslocamento, dispara-
ram para o alto. Assim que cessou o efeito dos
raios antigravitacionais, precipitaram-se ruidosa-
mente ao solo. Poucos resistiram ao impacto.
Segundo o levantamento provisório de Bell,
cerca de cinqüenta robôs já haviam sido destruí-
dos. Mas ainda havia mais de mil, que prosse-
guiam implacavelmente em direção ao objetivo:
a instalação de comando da abóbada energéti-
ca, o cérebro positrônico do deserto de Gobi.
— Se não houver algum milagre, ao menos
oitocentos robôs conseguirão passar — afirmou
Bell. — Temos que desferir um golpe decisivo...
— O centro em que se situam as instalações
mais importantes dispõe de um dispositivo de
segurança muito potente. E o edifício do cére-
bro P dispõe de uma barreira energética pró-
pria.
— Obrigado pela lição — disse Bell em tom
mordaz. — Acontece que não posso comparti-
lhar seu otimismo. Já vimos que, através de um
contato mútuo, os robôs são capazes de refor-
53
çar suas defesas. Aposto que ainda têm outras
surpresas para nós. E, se essas surpresas dizem
respeito à sua tática de ataque, não haverá ne-
nhum motivo para otimismo.
Os robôs iniciaram nova manobra.
A utilização dos raios antigravitacionais re-
tardou seu avanço. Nos momentos críticos do
bombardeio executado pelos blindados moviam-
se a passos rastejantes. Enquanto não impeliam
o corpo para cima, mantinham-se relativamente
próximos ao solo. Alguns deles até aproveita-
vam a oportunidade para se impelir para a fren-
te. Com isso atingiam velocidades para as quais
não haviam sido concebidos.
Dessa forma as máquinas de guerra avança-
ram velozmente e, com uma rapidez espantosa,
colocaram-se entre os flancos de quatro blinda-
dos. Os pesados veículos foram imediatamente
destruídos.
Foi uma perda total.
A manobra tática seguinte dos robôs consis-
tiu numa ampliação de sua frente de ataque. As
pontas das colunas se dividiram. Em seis, oito e
doze colunas prosseguiram no avanço.
Numa ação que exigia tempo, os homens ti-
veram que deslocar reforços em torno de outros
quarteirões. E, utilizando o tempo que se pas-
sou até que esses reforços pudessem entrar em
54
ação, os robôs ganharam mais de mil metros de
chão.
— Que diabo, Rhodan! Por que você anda
bancando o misterioso? — exclamou Reginald
Bell. — Explique logo o que pretende fazer com
Tako. Afinal, o ministro da segurança sou eu.
Num movimento instintivo, todos os olhares
se voltaram para Rhodan. O olhar obstinado
deste não tinha mais nada da confiança que há
pouco irradiava.
— Ei, Rhodan! Será que alguma coisa não
está em ordem?
— Estão cercando o quarteirão J-D III. É lá
que mora o homem que Tako foi procurar.
Nem todos sabiam a quem Rhodan se refe-
ria. O quarteirão J-D III era grande: contava
mais de duzentas residências.

***

Ivã Goratchim estava dormindo. A cabeça


do lado esquerdo que, para distingui-la da outra,
usava o nome Ivanovitch, despertou poucos se-
gundos antes. Mas os reflexos das juntas fize-
ram com que Ivã também não demorasse em
abrir os olhos.
— O que houve?
— Não está ouvindo, Ivã?
55
— Quando acordo sempre ouço alguma coi-
sa. Mas prefiro não ouvir nada. Bem que você
poderia ter me deixado dormir.
Ivanovitch recorreu ao braço direito, comum
aos dois, para se coçar. Como as duas cabeças
dispusessem de um único corpo, sempre ti-
nham que chegar a algum acordo sobre o uso
do mesmo. Desde o nascimento, Ivã Goratchim
adaptara-se à necessidade desse procedimento.
Além disso, possuía um caráter pacífico co-
mum, que fazia com que via de regra as duas
cabeças acabassem concordando.
Acontece que desta vez Ivanovitch era de
outra opinião. Achou que os ruídos eram muito
importantes. Por isso a mão que o coçava er-
gueu-se subitamente e, antes que Ivã desconfi-
asse de qualquer coisa, seus próprios dedos lhe
beliscaram a orelha.
— Diabo! Que é isso?
— Isto é para você abrir o ouvido, meu caro.
Estou ouvindo alguma coisa que não parece ser
muito boa. Se você adormecer de novo, nem
por isso aquilo que há de mau irá embora.
Acho que o ruído indica a existência de algum
perigo.
— Indica guerra, Ivanovitch. Ouço um baru-
lho que parece de veículos blindados passando
por aí.
56
— De veículos blindados atirando — corrigiu
a cabeça que era três segundos e meio mais jo-
vem. — Se os blindados estão passando, po-
dem estar numa parada. Mas quando estão ati-
rando, fazem guerra.
Ivã Goratchim saltou da cama. Ainda de pi-
jama, correu para a janela e procurou abri-la.
— Você é um idiota! — gemeu Ivanovitch.
— Em Terrânia não existem janelas que pos-
sam ser abertas. Os aparelhos de condiciona-
mento nos trazem o ar puro.
— Acho que isto não é nenhum progresso.
Uma janela só é uma janela de verdade quando
podemos nos inclinar para fora dela. Você vê
que estes vidros embutidos na parede são um
absurdo. Nem podemos ver se o inimigo pene-
trou em Terrânia.
— Nenhum inimigo pode penetrar em Ter-
rânia — objetou Ivanovitch. — Quanto mais na
abóbada energética em cujo interior, conforme
você sabe, estamos morando. Vai ver que você
está pensando nos nossos libertadores da Sibé-
ria.
— O mundo, ou Terra, conforme hoje se
diz, está unido. Trata-se de um ataque vindo do
espaço. Se me lembro o que Rhodan nos con-
tou sobre os saltadores, e como o Supercrânio
abusou de nós, não me sinto nada bem.
57
— Não diga tolices! A Terceira Potência é o
baluarte mais forte da Via Láctea.
— Você mesmo acaba de dizer que é guer-
ra. O que pode ser?
— Devíamos mudar de roupa e sair para a
rua.
— Com este tempo não dou um passo para
fora de minha casa. O ar está cheio de aço, e
de coisa pior. São esses raios modernos. A gen-
te não os vê, não os ouve...
— Existem raios que se vêem e ouvem.
— E existem outros que não se vêem — tro-
vejou Ivã obstinadamente.
Uma pequena briga entre as duas cabeças
parecia estar a caminho. Mas, no mesmo ins-
tante, ambas constataram que mesmo pela ja-
nela fechada podiam ver alguma coisa.
No céu viram uma fileira de helicópteros,
que desceram em curva fechada. Os canos dos
radiadores de impulsos relampejaram.
Ivã Goratchim empalideceu. O susto remo-
vera todos os mal-entendidos. As cabeças e o
corpo reagiram em conjunto, como se obede-
cessem a um único cérebro.
Num movimento instintivo, Goratchim se
afastou da janela.
— Isso não é nenhuma manobra ou parada
— afirmou Ivã. — Aposto que os saltadores in-
58
vadiram nosso território e pretendem conquistar
a Terceira Potência. Devemos ir imediatamente
para junto de Rhodan a fim de prestar-lhe auxí-
lio.
— Ir até lá? — perguntou Ivanovitch em tom
desolado. — Nem sabemos onde está Rhodan.
A sede do governo fica a dois quilômetros. E
quando estivermos caminhando pela rua, nin-
guém nos dirá quem é nosso amigo e quem é
nosso inimigo.
— Perguntaremos ao pessoal — disse Ivã in-
genuamente.
Finalmente as duas cabeças chegaram a um
acordo: ao menos teriam que mudar de roupa.
Quando Goratchim acabou de fazer o nó da
gravata, Tako Kakuta surgiu do nada. As duas
cabeças levaram outro susto. Ainda não se ha-
bituara à maneira pela qual um teleportador
costuma chegar. Mas logo percebeu que tinha
diante de si um homem de confiança de Rho-
dan.
— Senhor Kakuta! Sua indiscrição nos torna
muito nervosos.
— Pelo universo, Goratchim. Eu o procurei
por toda a residência. Quem poderia imaginar
que com todo este drama você ainda está na
cama?
— Ainda é cedo, e estávamos muito cansa-
59
dos — respondeu Ivã.
— O que aconteceu? — interrompeu-o a ca-
beça da esquerda. — Como pôde qualquer po-
der do universo penetrar até o interior de Ter-
rânia?
— As explicações têm de ficar para depois.
Por enquanto temos que aceitar o fato de que
isso aconteceu — disse Tako Kakuta. — Os
agentes dos saltadores obrigaram nossos robôs
a se passar para o seu lado. Até parece que
todo o exército de homens de lata enlouqueceu
de uma hora para outra. Rhodan mandou que
viesse até aqui para lhe pedir que o ajudasse.
— Rhodan estaria em condições de mandar;
não precisaria pedir — afirmou Ivã.
— Tanto faz que seja uma ordem ou um pe-
dido — prosseguiu Ivanovitch. — Estamos com
ele. O que devemos fazer?
— Senhor Goratchim, o senhor é nossa últi-
ma esperança.
Ambas as cabeças se esticaram num orgulho
infantil.
— Para nós esses robôs são um brinquedo
— afirmou Ivanovitch.
— Goratchim, você deve agir com muita
prudência — advertiu-o o teleportador. — De
nada nos adiantará se cair na primeira batalha.
Você tem muito mais a perder que qualquer ou-
60
tro homem: duas cabeças.
— Somos fortes — afirmou Ivã.
— Para encontrar toda sua força, o forte
tem de agir com inteligência — doutrinou Kaku-
ta. — Está pronto? Faça o favor de vir comigo.
Eu o levarei para junto de Rhodan.
A residência ficava no primeiro andar. Não
adiantava usar o elevador. A rua estava cheia
de gente.
— É muito mais gente do que vimos da jane-
la — espantou-se Ivanovitch. — E todos correm
na mesma direção. Será um ataque?
O suor porejava na testa de Kakuta.
— É uma fuga! — explicou em tom menos
gentil do que usara até então. — A frente de
combate fica para outro lado. Temos que do-
brar à esquerda e dar uma volta pelo quarteirão
J-G VII. A área que fica à nossa direita não está
segura. É possível que em frente ao centro de
compras ainda encontremos um táxi livre.
— Por que não pegamos um táxi robotiza-
do?
— Porque os robôs se revoltaram. Vamos,
entre na confusão!
Enquanto Kakuta dava ordem de caminhar,
Ivã segurou as duas cabeças com um gesto rápi-
do. Foi um movimento instintivo.
De um instante para outro o edifício retum-
61
bou em todos os cantos. As paredes pareciam
adquirir vida. Com um movimento chiante, uma
fenda de cerca de dois centímetros abriu-se no
teto e caminhou rapidamente em direção ao so-
alho. O emboço chovia sobre suas cabeças.
Encontravam-se na entrada do edifício; enri-
jeceram de susto.
Kakuta contou em voz alta até cinco. Quan-
do concluiu, tudo parecia ter passado. Mas na
rua o inferno parecia andar às soltas. Destroços
caíam em meio às massas em fuga. Eram peças
que se soltavam do telhado e dos pavimentos
superiores. Homens, mulheres e crianças tom-
bavam mortos. A onda dos fugitivos os pisotea-
vam.
Goratchim ia saltar para a frente.
— Fique aqui! — berrou Kakuta. — Os en-
fermeiros cuidarão dessa gente. Se não pensar-
mos exclusivamente na nossa tarefa, todos os
cidadãos da Terceira Potência estarão perdidos,
e não apenas os poucos que estão ali. O prédio
tem uma saída pelos fundos?
— Tem. Leva a uma rua particular dos resi-
dentes.
— Vamos, Goratchim. Talvez por lá a con-
fusão não seja tanta.
A suposição de Kakuta se revelou mais ver-
dadeira do que ele desejava. A rua particular
62
parecia varrida de gente.
Saíram do terreno.
Naquele instante, a porta do edifício do ou-
tro lado da rua se abriu. Um robô saiu.
Kakuta levantou o radiador manual e dispa-
rou. Ao mesmo tempo efetuou uma teleporta-
ção reflexiva, que o colocou sob o abrigo do
edifício.
A reação de Goratchim não foi tão rápida.
Não pudera ver o robô. Quando percebeu ao
mesmo tempo o perigo que o ameaçava e a
fuga de seu aliado, quase se sentiu tomado pelo
pânico.
Por alguns segundos permaneceu imóvel em
plena rua. Aguardou o golpe mortal. Algumas
frações de unidade de tempo se passaram. Ain-
da estava vivo.
Depois disso, a vontade de Goratchim se
concentrou sobre o robô, que provavelmente
hesitara porque o homem de duas cabeças lhe
causara certa perplexidade. E essa hesitação foi
seu fim. O mutante Goratchim não teve que fa-
zer outra coisa senão pensar, e o cálcio contido
no robô desfez-se numa devastadora reação em
cadeia.

***

63
— Gostaria de saber onde está Tako — dis-
se Rhodan. — Afinal, ele não podia deixar de
perceber o que aconteceu no quarteirão J-D III.
— Como teleportador não terá o menor
problema em escapar ao cerco — afirmou Ma-
noli. Não compreendia como o chefe poderia
ter esquecido esse fato.
— Ele poderá. Mas não conseguirá tirar Go-
ratchim de lá.
— Então seu segredo foi esse Goratchim —
gemeu Reginald Bell. — Por que não nos lem-
bramos logo de recorrer a ele? Era uma idéia
tão simples. Será que há algo de errado com
nossa capacidade de reação? Eric, o que me
diz?
— Quer que eu responda na qualidade de
médico?
Rhodan interrompeu o debate com um ligei-
ro movimento de mão.
— Se é que você procura uma explicação
psicológica, Bell, esta só pode ser uma. Em
nosso subconsciente confiamos demais na ori-
entação estratégica fornecida pelo cérebro P.
Todo este alarma complicado foi previamente
programado. Mas nesse alarma não havia lugar
para Goratchim, porque o cérebro não o incluía
em seus cálculos. Nossa programação de alar-
ma já tem algum tempo. Acontece que Gorat-
64
chim só veio para junto de nós há pouco.
O quarteirão J-D III estava praticamente cer-
cado pelo exército de robôs. Rhodan interrom-
peu sua exposição. Todos sabiam que naquele
momento o importante era agir. E o curso que
os acontecimentos tomaram nos próximos mi-
nutos realçou ainda mais a necessidade de
ação.
O coronel Friedrichs lançou helicópteros ar-
mados contra o quarteirão J-D III. Bell imediata-
mente deu contra-ordem.
— Será que o senhor ficou louco, coronel?
O senhor está atirando para uma área cheia de
civis.
— As frentes estão misturadas. Se quiser-
mos poupar a vida de nossa gente a qualquer
preço, já não poderemos atingir os robôs.
— Peço-lhe que deixe a decisão desse tipo
de problema por minha conta. Instrua seus ho-
mens a chegar mais perto do inimigo. Procure
atingir os robôs um por um. Mas não extermine
a inteligência da Terceira Potência.
Todos compreenderam que a decisão de
Bell transformava o grupo de helicópteros num
comando suicida. Os robôs já haviam derrubado
três aparelhos. E o raio antigravitacional, que
representava a arma mais perigosa, tinha que
ser utilizado em escala cada vez maior. Em to-
65
dos os pontos as frentes se misturavam numa
luta corpo a corpo. Quem fosse subtraído à
ação da gravitação terrestre, passaria a rodopi-
ar no ar. Com isso o caos seria completo.
— Bell para o coronel Friedrichs. Concentre
uma onda de ataque com todas as forças aéreas
disponíveis exclusivamente sobre o quarteirão
J-D III. A área tem que ser libertada de qualquer
maneira.
Por três minutos permaneceram em silêncio
diante da tela do videofone. A ordem de Bell
causou uma alteração instantânea na ordem de
batalha.
O ataque concentrado contra o quarteirão J-
D III transformou a área num verdadeiro infer-
no. Mas percebia-se pelo emprego rigoroso do
fogo dirigido que as perdas dos homens meca-
nizados eram muito maiores. Os fugitivos pude-
ram respirar, e conseguiram recuar um pedaço.
A cunha dos robôs revoltados perdeu tempo
e energia. Até parecia que os indivíduos ciber-
néticos se impressionaram com a tática. Por um
instante davam a impressão de não saber como
as coisas iriam continuar.
Bell exultou:
— Estão confusos. Friedrichs! Retire imedia-
tamente os reforços e concentre-os no quartei-
rão H-G VII. Repita a manobra.
66
— Se você tiver alguma objeção contra mi-
nhas disposições intuitivas, Rhodan, avise logo
— prosseguiu Bell, Voltando-se para o amigo.
— Ainda não sei o que houve com Kakuta e
Goratchim e não tenho a menor idéia do que
você pretende fazer com eles.
— Continue assim, Bell. É só por meio de
uma série de mudanças táticas que você conse-
guirá confundir os robôs, se é que isso se torna
possível.
Ninguém falou nas próprias perdas, muito
embora Friedrichs tivesse perdido mais quatro
helicópteros.
Finalmente Tako transmitiu um aviso pelo
telecomunicador portátil.
— Acordei Goratchim, Rhodan. Ainda esta-
mos na casa dele. O ataque maciço valeu ouro.
Poderia mandar para cá o tanque mais próxi-
mo? Ivã é um atacante de primeira, mas suas
defesas contra um ataque à traição são muito
débeis.
— Está bem. Continue no interior da casa.
Mandaremos uma máquina com um forte cam-
po energético.
— Obrigado.
O capitão Klein tomou suas providências
sem aguardar uma ordem expressa. No quartei-
rão J-D IX havia dois tanques de setenta tonela-
67
das. Klein mandou que seguissem imediatamen-
te para a residência de Goratchim.
— Um dos dois tem que dar um jeito de pas-
sar. Protejam-se mutuamente.
— Às ordens, capitão — disse o primeiro-
tenente em tom seco e interrompeu a comuni-
cação.
O ataque contra o quarteirão H-G VII não
produziu tanto efeito. Talvez fosse porque os
robôs já se haviam adaptado ao plano de Bell.
— Temos que pensar em outra coisa.
A constatação foi bastante deprimente. A
concentração das forças sobre dois pontos tam-
bém trouxera suas desvantagens. Dentro de
poucos minutos as duas tenazes que os robôs
estendiam para o norte conseguiram realizar
um grande avanço.
— Esses patifes aproveitam qualquer chance
— resmungou Bell. — Deviam supor que os
pontos em que nossa defesa é mais forte são
aqueles em que ficam os objetivos mais impor-
tantes. Será que isso é inteligência?
— Na minha opinião — interveio Dr.Manoli
— o mais importante será descobrirmos de que
forma se comunicam entre si. Só assim podere-
mos descobrir seus planos.
— Não diga tolices. Sabemos perfeitamente
como se comunicam. Mas não sabemos quem
68
os comanda.
— Pois é isso.
— Consegui. Querem fazer o favor de ficar
quietos por um instante?
Todos olharam para Tanaka Seiko, que até
então não dissera praticamente nada. Entre os
mutantes aquele japonês esbelto e delicado
sempre fora conhecido como um homem quie-
to e introvertido. Esse traço de caráter teria que
se cristalizar forçosamente com base na capaci-
dade parapsicológica da goniometria. Perscruta-
va seu interior com uma intensidade muito mai-
or que um telepata. Seu sexto sentido consistia,
sob o ponto de vista puramente técnico, num
aparelho de rádio extremamente complicado,
cuja sofisticação ainda não havia sido alcançada
pela mão do homem ou dos arcônidas. Seiko
ouvia as ondas de rádio. Além disso, estava em
condições de realizar espontaneamente a deter-
minação de uma freqüência de ondas, que lhe
revelava com toda nitidez o conteúdo da trans-
missão que desejasse captar.
Aquela concentração, que perdurava por vá-
rios minutos, sempre resultava em certa debili-
dade física.
Sentado numa poltrona, manteve-se de
olhos fechados.
— Conseguiu o quê, Tanaka?
69
Seiko fez um gesto de recusa, que fez com
que mesmo Bell e Rhodan se calassem. Obedi-
entes, mantiveram-se à espera.
O zumbido do videofone se fez ouvir. Justa-
mente no momento mais impróprio! Bell se li-
mitou a girar o botão de recepção, que elimina-
va imagem e som. Pegando o microfone, cochi-
chou:
— Aguarde um instante. No momento a re-
cepção é impossível.
O interlocutor do outro lado protestou com
veemência. Mas não chegou a ser ouvido.
O que fora conseguido por Tanaka? A ques-
tão mais importante era esta.
Pouco depois Tanaka se descontraiu.
— Consegui captar uma das freqüências pe-
las quais os robôs se comunicam. Os saltadores
devem ter modificado seu mecanismo de radio-
comunicação. Temos que sair daqui, Rhodan.
— Por quê? Afinal, os robôs não têm força
aérea e ainda se encontram a um quilômetro e
meio daqui.
— Um dos seus espiões descobriu que o
quartel-general de nossas forças de defesa fica
aqui, no escritório do capitão Klein. Até aqui
acreditavam que ficasse no edifício da sede do
governo.
— Está bem. Procure captar novas mensa-
70
gens, Tanaka. E esforce-se para não perder a
freqüência. Se nós o incomodarmos, fique na
sala ao lado.
— Acho que seria o melhor.
Seiko se retirou.
— ...recuso toda e qualquer responsabilida-
de. Com todo respeito que lhes dedico.
O súbito berreiro saiu do videofone, que Bell
voltara a regular para o volume máximo. Na
tela viu-se o rosto furioso do coronel Friedrichs.
— Agora chegou sua vez, coronel.
— Já estava na hora. Minhas tropas já não
estão em condições de manter qualquer posi-
ção. Lançar homens contra robôs, isso é uma...
— Diga logo de que se trata, coronel! — tro-
vejou Bell.
— Minhas perdas já chegam a um total de
quatorze helicópteros. Preciso do apoio das for-
ças de terra.
— O apoio é o senhor, coronel. Sinto mui-
to. Não dispomos de outras máquinas e não te-
mos onde buscá-las. Por questões de segurança
a abóbada energética permanecerá fechada.
Retire suas unidades por dez minutos e rea-
grupe-se com os remanescentes. O Exército de
Mutantes lhe dará apoio. Aguarde novas instru-
ções.
— Dentro de dez minutos os robôs chegarão
71
ao nosso quartel-general, se não forem ataca-
dos pelo ar. Peço permissão para transferir
meu estado-maior para o norte.
Bell lançou um olhar indagador para Rho-
dan. Este se limitou a acenar com a cabeça.
— Está bem. Retire-se para a quadra A-N
XII, coronel. Com isso chegará bem perto do
espaçoporto. Mas não se esqueça de que de-
pois disso sua posição não mais poderá ser mo-
dificada.
— Obrigado.
A comunicação foi interrompida com um es-
talo.
— Vamos aos mutantes, Rhodan! Não te-
mos outra alternativa.
Sem dizer uma palavra, Rhodan passou os
olhos pelo grupo que o cercava.
— Ishi, você é uma mulher e uma telepata.
Suas qualidades não podem ser utilizadas num
confronto com robôs. Gostaria que se retirasse
para a quadra administrativa.
Obediente, Ishi acenou com a cabeça.
— Imediatamente?
— Sim, faça o favor.
Ishi Matsu fechou seu traje arcônida e se
despediu. Decolou do telhado do edifício e de-
sapareceu, tornando-se invisível aos olhos de
qualquer robô.
72
— Os outros ficarão aqui até que sejamos
cercados. Capitão Klein, avise o batalhão de
guardas sobre a nova situação. Mande que se
mantenham em rigorosa prontidão. Todos os
veículos que disponham de campo energético
próprio devem se reunir num grupo de defesa.
— Às ordens.
A tela já revelava o perigo da nova situação.
De início o plano dos robôs só se revelava va-
gamente. Mas Tanaka informou todas as pesso-
as que se encontravam no recinto sobre o obje-
tivo visado pelos movimentos das máquinas de
guerra. De repente concentraram quase um
quarto de seus efetivos num avanço para o les-
te. Já teriam percebido a fraqueza momentânea
das defesas humanas? Sem os ataques vindos
do ar praticamente não encontravam resistên-
cia. Despedaçavam blocos inteiros de prédios
quando numa rua alguém abria fogo sobre eles,
por mais reduzido que fosse. A três quadras do
quartel-general do capitão Klein defrontaram-se
com a primeira linha de defesa mais fortemente
estruturada. Três tanques enfileirados formavam
uma grande barreira energética, que cobria toda
a pista de rolamento. O fogo concentrado de
suas armas de impulsos abateu a energia defen-
siva de sete dos atacantes; sete robôs desfize-
ram-se na incandescência provocada pelos ti-
73
ros.
Mas os robôs não conhecem medo.
Num fanatismo cego, a frente por eles for-
mada deslocou-se em direção aos tanques.
Naquele instante foi derrubado numa outra
rua o helicóptero que propiciava a transmissão
da imagem no sistema de videofone.
No quartel-general perdeu-se todo contato
ótico com os acontecimentos. Reginald Bell sol-
tou uma terrível praga.

***

Ivã Goratchim não era feio apenas por pos-


suir duas cabeças. Seu aspecto geral era sim-
plesmente monstruoso. Era um dos numerosos
mutantes negativos nascidos na Sibéria depois
das primeiras experiências realizadas com bom-
bas atômicas. Os aspectos negativos revelavam-
se de várias formas.
A altura de dois metros e meio, as disformes
pernas de coluna, sua pele esverdeada e esca-
mosa e seu corpo anguloso e desajeitado eram
suficientes para provocar a impressão de se tra-
tar de um monstro.
No caráter e na capacidade biológica era
uma combinação quase paradoxal entre o bem
e o mal. Se não fosse a mutação que o transfor-
74
mara num detonador, poderia se dizer que era
uma criatura inofensiva. Ambas as cabeças im-
punham a ele um gênio paciente, ingênuo e
submisso. Desde a infância costumava ser cha-
mado de monstro. Isso produzira em sua mente
um pronunciado complexo de inferioridade. Até
então, praticamente não chegara a tomar qual-
quer iniciativa. Durante o curso de uma gera-
ção, seus dois cérebros haviam se acostumado
a uma espécie de concorrência. Com isso sua
capacidade mental se consumira. Era bem ver-
dade que, perante um terceiro, as duas cabeças
se mantinham unidas como se fossem uma só.
Mas esse fato não substituía a ausência da von-
tade de impor-se.
Ivã Goratchim transformara-se numa criatu-
ra tipicamente submissa. Só queria servir para
ser recompensado com o amor do próximo.
O legendário Supercrânio, que há algum
tempo cobrira a Terra e a Terceira Potência,
com uma ameaçadora guerra de guerrilhas, fora
o descobridor estratégico de Ivã. Tirara-o da
tundra siberiana e lançara mão dele para seus
desígnios maléficos. E Ivã era fácil de aprovei-
tar. Afinal, era ingênuo... e era um detonador.
Essa última qualidade, que mais tarde lhe
conferiria um lugar de destaque no Exército de
Mutantes de Rhodan, consistia no fato de que
75
suas energias mentais provocavam nos compos-
tos do cálcio e do carbono o mesmo efeito que
um impulso térmico produz na pólvora. Bastava
que Ivã Goratchim se concentrasse, para que os
átomos de cálcio entrassem num processo de
fissão nuclear. Acontece que o cálcio e o carbo-
no estão praticamente em toda parte. Por isso
Goratchim, o detonador, estava em condições
de matar qualquer ser vivo e destruir qualquer
objeto, desde que sua mente se concentrasse in-
tensamente para isso. Era ali que terminava seu
caráter inofensivo.
A destruição do robô de combate provou o
fato.
Ivã viu-se diante de um montão de escom-
bros de metal e de massa plástica. A visão da-
quilo restituiu-lhe um pouco de sua autoconfian-
ça. Não era uma criatura indefesa. Nem mesmo
contra essas impiedosas máquinas de guerra.
Apenas teria que agir com cautela. E esta idéia
fez com que se retirasse imediatamente para
trás do muro que cercava a área de onde acaba-
ra de sair.
A rua ficou vazia. Não foi disparado mais
nenhum tiro. Mas o que aconteceria se saísse
de trás do muro? Não teria sido visto por outro
robô que se mantinha escondido? Do outro
lado da rua havia centenas de janelas. Atrás de
76
qualquer uma delas a destruição poderia estar à
espreita.
Esperou. Quando se lembrou de Tako Kaku-
ta, voltou a sentir medo. Por que o teleportador
havia desaparecido? Certamente apenas porque
aqui o ambiente estava carregado de chumbo e
de energia. De repente, o barulho cresceu enor-
memente. O ouvido já se acostumara aos ruídos
da luta que se desenrolava em ruas distantes.
Mas agora mais de vinte helicópteros corriam
pelo céu e disparavam seus radiadores de im-
pulsos térmicos. A rua já não estava vazia.
Dois, três robôs apareceram e de pernas duras
foram caminhando na direção oposta à que ti-
nham vindo. Outros juntaram-se a eles.
Ivã olhou pelo canto do muro e voltou a se
abrigar. Uns trinta robôs de combate estavam
desfilando pela rua. Parecia ser uma retirada.
Será que isso significava que Perry Rhodan
já conquistara a vitória?
A ingenuidade de Goratchim era pronuncia-
da demais. Logo esqueceu a prudência. Se
Rhodan estava vencendo, o mais terrível de
seus mutantes não poderia deixar de dar sua
contribuição para a vitória.
Levantou-se. Sua altura equivalia a quase
duas vezes a do muro. A cabeça e o tórax esta-
vam desprotegidos. Os robôs estavam a menos
77
de vinte metros.
Para eles a percepção e a reação eram si-
multâneas. A vantagem de Ivã consistia unica-
mente na surpresa. Ele o sabia.
Antes de se levantar, preparara rapidamente
a concentração de seus pensamentos. Os dois
cérebros completavam-se numa cadeia de relés.
Só por isso seu ataque alcançou um êxito parci-
al.
Mais de uma dezena dos guerreiros artificiais
perderam a vida no instante em que estavam
começando a perceber o perigo. Mas os que se
encontravam na segunda e na terceira fila tive-
ram tempo de reagir. Viram o mutante de duas
cabeças e não perderam tempo em se espantar
com o aspecto pouco humano do mesmo. O
ataque de Ivã era sinal de sua periculosidade. E
os robôs se orientavam exclusivamente por essa
circunstância.
Fizeram pontaria com seus olhos estereos-
cópicos, que incluíam o mecanismo de ponta-
ria. O funcionamento do radiador de impulsos
térmicos era automático.
Nesse instante alguma coisa pegou nas per-
nas de Ivã Goratchim, que caiu estendido na
grama plantada atrás do muro. Espantados,
seus dois pares de olhos fitaram o rosto de
Tako Kakuta, que se mantinha agachado atrás
78
do muro.
— Vamos embora! Siga-me, seu idiota! Fi-
que grudado no chão, arrastando-se sobre os
cotovelos e os joelhos.
Para um teleportador era uma maneira pou-
co usual de se afastar de uma área de perigo.
Mas a esta hora não poderia se transferir para
outro lugar pela simples força de seu desejo.
Levava a reboque a figura desajeitada de Gorat-
chim; não poderia abraçá-lo e levá-lo num salto
teleportado.
Logo perceberam que a intervenção de
Kakuta fora necessária. Antes que a criatura de
duas cabeças tocasse a grama, os primeiros fei-
xes de raios térmicos passaram por cima dele e
demoliram a parede do edifício. Depois disso os
robôs baixaram a direção dos tiros, fazendo
pontaria sobre o muro.
Lascas de pedra esvoaçaram em torno das
cabeças de Tako e Ivã. Sentiram que o calor au-
mentava a seu lado. Quando tinham percorrido
uns dez metros, o muro cedeu. O raio energéti-
co dissociara o silício dos elementos a que esti-
vera ligado, derretendo-o a uma temperatura de
quase dois mil graus centígrados. O muro se
desmanchou num fluxo de lava incandescente.
Havia um buraco nele.
Será que os robôs acreditavam terem liqui-
79
dado o inimigo?
Não teriam bastante inteligência para saber
que o homem é um ser que sabe rastejar? Ti-
nham. E estavam programados para se orientar
pelas reações humanas. Se o homem tivesse fu-
gido, ele teria se deslocado para a direita. Logo,
prepararam-se para abrir outro buraco no
muro. Mas Tako fizera exatamente o oposto
daquilo que as máquinas esperavam. Rastejara
para o canto do jardim que ficava mais próximo
aos robôs. E Ivã seguira-o docemente.
— Agora estão a apenas dez metros de nós
— cochichou o teleportador. — O próximo ata-
que tem de ser muito bem preparado. Concen-
tre-se com bastante antecedência na destruição,
Ivã. Eu me teleportarei para a casa em frente e
atirarei da janela com meu radiador de impulsos
térmicos. Você só deve detonar no máximo por
três segundos. Depois disso, atire-se ao solo e
rasteje o mais depressa possível. Deixe o resto
por minha conta.
Com uma pancada no ombro de Ivã, Kakuta
se despediu.
Tudo se passara numa questão de segundos.
Pelo que se concluía dos ruídos, os robôs dispu-
nham-se a prosseguir na sua caminhada. Gorat-
chim se concentrou. O primeiro tiro foi dispara-
do do prédio em frente.
80
Tako visou a fileira da frente, formada por
quatro robôs que ainda disparavam sobre o
muro. Por isso o radiador de impulsos produziu
efeito dentro de poucos segundos. Quando o
feixe de energia atingiu o reator, o campo pro-
tetor deixou de existir.
Doze ou quatorze dos robôs de quatro bra-
ços se viraram instantaneamente e visaram o
novo inimigo. Mas a aparição de Tako na jane-
la não passou de uma sombra fugaz. O japonês
executou novo salto, que o levou ao prédio vizi-
nho, dois andares abaixo. Logo correu para a
janela a fim de sondar a situação.
Ivã Ivanovitch estava de pé atrás do muro.
Não houve nenhum relâmpago, nenhum
raio energético que envolvesse aquela figura pe-
trificada. Permaneceu ali apenas por três segun-
dos, mas sua rigidez e concentração dava a im-
pressão de que ali fora colocado para toda a
eternidade. Mas foi apenas um instante da eter-
nidade que decidiu o destino de nove dos robôs
de combate.
No centro de seus ventres teve início a rea-
ção em cadeia dos átomos de cálcio. Isso foi
sua morte.
Ivã obedeceu à ordem que lhe fora dada.
Deixou-se cair sem aguardar o resultado da de-
tonação por ele provocada. Os cinco robôs que
81
ainda restavam puseram-se em movimento sem
muita perda de tempo. Dois foram para a direi-
ta, três para a esquerda.
Kakuta liquidou um deles, deu um salto de
trinta metros através das paredes e destruiu
mais um.
Goratchim, que de repente se esquecera de
todo cuidado, tomou conta do resto. Abriu os
braços e deixou-se cair para o lado da rua. Só
pensava na destruição do inimigo.
O grito de advertência de Kakuta revelou-se
inútil. Os robôs não estavam à altura dessa in-
vestida de apaixonada concentração humana.
Os que ainda restavam sucumbiram ao fogo que
consumiu seus corpos artificiais.
A rua estava livre. Kakuta surgiu ao lado de
Ivã.
— Que diabo! Não lhe proibi este tipo de le-
viandade? Qualquer outro homem preza sua
vida e age com cautela. Mas você...
Goratchim exibiu dois rostos decepcionados.
Esperava que seu ato merecesse uma recom-
pensa sob a forma de um elogio. Obediente e
sacudindo a cabeça dupla, seguiu o japonês
para um edifício, de onde o mesmo solicitou,
pelo telecomunicador, o envio de um carro blin-
dado.

82
3

— Estamos entrando na última fase — mur-


murou Perry Rhodan em tom obstinado. — É
ela que decidirá quem de nós é o mais forte.
Essa idéia não deixou os amigos muito satis-
feitos. Poucas vezes o chefe deixara o resultado
de um combate em aberto como o fizera desta
vez. Sempre confiara sua segurança e a dos in-
divíduos que o cercavam à técnica de que dispu-
nha. Hoje, porém, parte da técnica da Terceira
Potência passara-se para o lado do inimigo.
Esse fato alterara profundamente a situação.
O cerco em torno do quartel-general do ca-
pitão Klein tornava-se cada vez mais apertado.
Os robôs haviam esmagado a maioria das li-
nhas de defesa colocadas nas ruas. O chão esta-
va começando a arder sob os pés, no sentido li-
teral da expressão.
Rhodan deu ordem de retirada ao seu es-
tado-maior.
— Bell, não faça essa cara de herói frustra-
do! Hoje não se trata de demonstrar coragem,
mas de não queimar os dedos... Fechar os tra-
jes de combate. Capitão Klein, avise o coman-
dante do batalhão de guardas. Faremos o possí-
vel para providenciar o revezamento quanto an-
tes.
83
Klein fez continência e saiu. Rhodan mexeu
na sua pulseira para chamar Kakuta.
— Alô, Tako! Vamos nos transferir para um
edifício de escritório. De qualquer maneira, pro-
cure chegar até aqui com o Ivã, a fim de apoiar
a tropa de Klein. No momento não tenho ou-
tras ordens. Os dois tanques já chegaram?
— Não senhor.
— Pois espere. Não deverão demorar.
O capitão Klein voltou.
— Tudo liquidado, chefe.
Rhodan confirmou com um aceno de cabe-
ça.
— Todos conhecem o objetivo. Vamos em-
bora! Não se esqueçam de ligar os defletores de
raios luminosos. Nossa retirada deve ser invisí-
vel.
Decolaram do telhado. Cada traje arcônida
era um veículo. Rhodan flutuou no ar por al-
gum tempo, para colher uma impressão sobre a
situação geral. Não parecia ser boa. Mais de um
terço do território coberto pela abóbada ener-
gética estava em poder dos robôs.
— Wuriu — gritou Rhodan pelo telecomuni-
cador, enquanto voavam.
— Sim.
— Estou me lembrando do helicóptero des-
truído. Fique aqui por uma hora e mantenha-
84
me informado sobre a situação. Não podemos
nos dar ao luxo de ficarmos cegos no nosso es-
critório.
— Perfeitamente!
O contato através do telecomunicador não
representava o menor risco. Os robôs talvez
conseguissem captar transmissões radiofônicas
normais, mas não as do aparelho audiovisual
que trabalhava por meio de impulsos codifica-
dos.
Pousaram no telhado do arranha-céu em
que ficavam as repartições do governo. Quando
regulavam seus trajes para a posição zero hou-
ve alguma exaltação, logo transformada numa
sensação de alívio. O edifício do governo estava
cheio de gente retida em seu local de trabalho
por causa do alarma.
— A situação não está boa, não é, senhor
Rhodan? — perguntou uma jovem funcionária.
Pela primeira vez naquelas horas o chefe da
Terceira Potência conseguiu esboçar um ligeiro
sorriso.
— Não, senhorita Grohte, a situação não
está boa. Mas estamos nos esforçando ao máxi-
mo para que as coisas logo se modifiquem a
nosso favor. Mantenha-se no seu posto, para
que tudo dê certo.
Pegaram o elevador e desceram ao escritó-
85
rio de Bell. Chegando lá, encontraram Crest e
Thora, os dois arcônidas que nessa situação de
alarma não tinham qualquer tarefa especial a
desempenhar, mas deviam permanecer naquele
pavimento por motivos de segurança.
Thora, a mulher vinda do longínquo planeta
de Árcon, logo se aproximou de Rhodan.
— Como estão as coisas, Perry?
O tratamento familiar não combinava com o
olhar petrificado. Rhodan deu de ombros.
— A decisão não deve demorar, Thora.
— Você devia colocar um girino à nossa dis-
posição, Perry. Crest e eu temos o direito de
nos mantermos afastados desta luta.
— Não há dúvida. Acontece que nosso pla-
no exige que a abóbada energética permaneça
fechada. Ninguém pode sair do centro de Ter-
rânia.
— Não vejo por que...
— Está bem. Se as coisas se tornarem críti-
cas por aqui, voltaremos a falar a respeito. Por
enquanto a área governamental não corre o
menor perigo. O front está sob controle.
A arcônida teve de se contentar com a expli-
cação.
Pouco depois Kakuta chamou.
— Os tanques chegaram. Entramos neles e
seguimos na direção indicada.
86
— A terceira linha de defesa que cerca o ba-
talhão do capitão Klein foi rompida — anunci-
ou Wuriu Sengu. — O edifício está ao alcance
dos tiros do inimigo. O avanço pelos flancos foi
retardado. Mas o inimigo está formando uma
cunha central que avança em direção à área go-
vernamental.
— Aí está — constatou Thora.
Ninguém deu atenção às suas palavras. Bell
mandou que todos os helicópteros disponíveis
voltassem à luta. O coronel Friedrichs confir-
mou o recebimento da ordem em tom resigna-
do.
Rhodan pareceu tomar uma decisão:
— Se a entrada em ação de Ivã coincidir
com o ataque dos helicópteros, tenho alguma
esperança no êxito da operação. O resultado
seria ainda melhor se recorrêssemos a um ter-
ceiro fator. Bell, você está no comando; não
precisa de mim. E pode dispensar Anne e Kitai.
— Basta que Tanaka fique comigo para cap-
tar as ondas irradiadas pelo inimigo. Mas afinal,
o que pretende fazer?
— É o terceiro fator. Nosso grupo de cho-
que será invisível. Isso representa uma boa van-
tagem.
Rhodan não deu outras explicações. Não
podia perder tempo, pois do contrário o apoio
87
do novo grupo poderia chegar tarde.
Os três se retiraram e desceram ao quarto
subterrâneo. Ali cada um deles pegou cinco
bombas explosivas normais, que apesar de seu
peso reduzido produziam o efeito de uma tone-
lada de TNT por bomba.
O comandante dos blindados era o sargento
Cry. Era uma alma paciente e um gênio na dis-
tribuição de cargas, pois conseguiu, num espa-
ço de três minutos, acomodar os dois metros e
meio do corpo de Goratchim no espaço estreito
de um blindado. E não foi só isso! Ainda conse-
guiu abrigar a tripulação normal e Tako Kakuta.
Os homens de Terrânia já tinham conheci-
mento das faculdades de Ivã. De repente se sen-
tiram muito seguros no interior do blindado.
Cry apenas ficou quebrando a cabeça sobre a
maneira pela qual Ivã trabalharia. Pois não po-
dia se mexer muito.
— Isso não tem importância — disse e cabe-
ça da direita. — Não existe campo protetor que
possa resistir à força dos meus pensamentos.
Ainda menos o dos robôs. E este pedacinho de
aço dos seus tanques para mim não é nada.
Apenas preciso ter um pouco de visão pela fen-
da de observação...
— Aqui está um telescópio. Com isso a vi-
são será melhor e mais confortável.
88
— Muito bem, companheiro — disseram as
duas cabeças de Goratchim, alegrando-se ao
mesmo tempo.
Os blindados andavam bem juntos. Seus
campos protetores podiam ser regulados para
um efeito aditivo, desde que os geradores ficas-
sem a uma distância menor que o triplo do raio
do campo energético. Qualquer comandante de
tanque conhecia o truque. Mas o mesmo pres-
supunha grande habilidade de quem dirigisse o
veículo, pois as esteiras dos dois tanques não
podiam ficar a uma distância superior a vinte
centímetros.
A área em torno da quadra J-D III estava va-
zia. Vez por outra viam-se mortos ou robôs des-
truídos. Os destroços das casas desmoronadas
não representavam qualquer obstáculo para
aqueles colossos.
Dali a duas quadras começou a área contro-
lada pelos robôs. A primeira linha foi liquidada
por um impacto casual da peça de artilharia do
blindado. Mas a situação logo se tornou crítica.
A troca de tiros atraiu uma dezena de inimigos,
que se lançaram ao ataque em frente ampla.
— Cuidado, Ivã! — gritou Tako Kakuta.
— Eu os vejo no telescópio. Devo...?
— É claro que sim. O que está esperando?
A força demoníaca da mente de Goratchim
89
pôde se desempenhar em toda a plenitude. Não
precisava pensar na fuga, pois confiava nos
campos protetores dos blindados. Por isso con-
seguiu se concentrar integralmente no ataque.
Os robôs estouraram. Foram reduzidos a
uma coisa incandescente indefinível.
O contra-ataque dos dois veículos passou
por cima deles.
Mais uma quadra.
Outros inimigos. Mais de trinta, que logo
abriram um fogo permanente e concentrado.
— Isso é demais! — gritou Cry. — Nossos
campos protetores não agüentam. Temos que
recuar.
— Espere um instante! — respondeu Kaku-
ta, também gritando.
Cry era o comandante, mas um oficial do
Exército de Mutantes sempre seria seu superior.
Um tremeluzir inquietante surgiu diante da
lâmina do visor. O campo energético estava
sendo solicitado até o limite de sua capacidade.
Finalmente a força do ataque diminuiu. Os pen-
samentos devoradores de Ivã haviam encontra-
do seu caminho.
A rua estava livre.
Para a frente!
O suor porejava nos rostos.
Para a frente!
90
Os helicópteros trovejavam em vôo baixo.
Ainda bem que tinham voltado.
Para a frente!
Destino: o quartel-general do batalhão de
guardas de Klein. O videofone transmitia gritos
de socorro ininterruptos vindos de três posições
cercadas.
— Agüentem! — foi a ordem que Bell trans-
mitiu do edifício do governo.
Era um consolo débil para os defensores. O
som das armas de impulsos dos helicópteros
que voltaram a intervir foi bem mais agradável.
Vez ou outra surgiu até um acesso de otimismo,
quando a rádio governamental da Terceira Po-
tência transmitiu os êxitos observados por Wu-
riu Sengu.
— O mutante Ivã Goratchim acaba de entrar
em ação. Nos últimos cinqüenta minutos des-
truiu setenta e dois robôs de combate.
Passaram pelo cruzamento de duas ruas
principais.
Faltavam trezentos e cinqüenta metros para
atingir o batalhão de guardas do capitão Klein.
Não se via nenhum inimigo.
— Cuidado! — disse Kakuta. — Os robôs
gostam de lutar em campo aberto. Mas não de-
vemos confiar demais nisso. Hoje de manhã fi-
quei sabendo que às vezes gostavam de pregar
91
surpresas.
Foi o que aconteceu nesse instante.
Os quatro edifícios de esquina, todos eles de
doze andares, explodiram ao mesmo tempo.
Milhares de toneladas de concreto subiram para
o alto e caíram no cruzamento. Os campos
energéticos dos blindados protegeram-nos con-
tra o impacto propriamente dito, mas nem
mesmo os motores nucleares conseguiram
movê-los.
— Estamos presos! Que surpresa!
Cry nunca deveria ter dito isso. Ao que pare-
cia os robôs estavam bem informados sobre as
transmissões da rádio Terrânia. Foram avan-
çando de quatro lados ao mesmo tempo. Eram
muito mais de cem.
Cry gritou para dentro do videofone.
— Solicito apoio aéreo imediato no cruza-
mento da Alameda Kepler com a Rua Fermi.
Cento e cinqüenta robôs estão atacando o gru-
po de choque Goratchim. Os tanques estão pre-
sos nos destroços de concreto.
Ivã teve que esperar. Quanto mais próximo
se encontrasse o objeto, maior era a eficiência
de sua energia mental. Mas Kakuta e Cry apres-
saram-no.
— É bem possível que os robôs comecem
logo. Quase alcançaram a distância crítica.
92
No mesmo instante o pó de concreto esgui-
chou diante do visor. O chiado dos geradores
revelava que os mesmos estavam sendo força-
dos ao máximo de sua capacidade.
— Deixem toda a energia para o campo
protetor — berrou Cry. — Não atirem mais.
O ataque ficou exclusivamente a cargo de
Ivã. Este se esforçou o mais que pôde e regis-
trou alguns êxitos. Mas os robôs estavam tão
longe que não poderia atingir todos de um só
golpe.
— Se eles perceberem que o alcance do de-
tonador é limitado, estamos perdidos.
— Helicópteros! — gemeu o sargento no
seu assento de piloto.
Sua voz não parecia muito confiante.
A imagem que surgiu na tela revelava que o
tanque ao lado não emitia qualquer energia.
Fora atingido. A potência do campo energético
comum estava reduzida à metade.
— É o fim! — afirmou o sargento. — Sai-
am!
— Revogo a ordem — berrou Kakuta. —
Não perca a cabeça, Cry. Já pensou o que fa-
rão com você se andar pela rua? Sargento, ten-
te deslocar o tanque para trás.
O sargento obedeceu. Mas não conseguiu
mover o tanque um centímetro sequer.
93
E não era possível se libertar por meio de
disparos energéticos, porque os destroços que
teriam de ser removidos encontravam-se num
ângulo morto.
— Coloque toda energia no campo protetor,
sargento. É nossa última salvação. Ivã, faça o
favor de andar mais depressa.
Ivã e Ivanovitch responderam com um gemi-
do. Três, quatro, cinco exemplares do inimigo
foram para os ares.
— Muito bem, Goratchim! É assim que eu
gosto! Dê-lhes mais. Daqui a pouco estaremos
ao alcance do fogo deles. Até agora esses caras
só dispararam alguns tiros espalhados. Quando
concentrarem todo o fogo nos poucos metros
quadrados do nosso tanque, nem teremos tem-
po para pensar.
O zumbido do gerador de campo subiu na
escala e perdeu-se na freqüência mais elevada,
imperceptível ao ouvido humano.
Calor!
Suor nos olhos!
Seria apenas imaginação? Ou será que o
campo energético já estava cedendo?
— Ivã! Ótimo! Mas dê-lhes mais, muito
mais. São mais de cem.
Kakuta abriu a gola da camisa, para respirar
melhor. Seu instinto insistia para que executas-
94
se um salto teleportado, que o colocaria a salvo.
Mas tinha de ficar ao lado de Goratchim. Era
responsável pelo mesmo. Os robôs se lançaram
ao ataque geral.

***

— Lançar! — ordenou Rhodan.


Seis bombas explosivas caíram do nada apa-
rente e detonaram em meio à falange maciça
dos robôs, atirando-os para todos os lados. Os
campos energéticos protegiam-nos contra os
estilhaços. Mas o deslocamento de ar atirou-os
para o alto. Era este o momento de Anne Sloa-
ne e do neutralizador gravitacional.
Protegida pela invisibilidade de seu traje, a
telecineta descera até um ponto bem próximo
ao solo, flutuando entre os telhados de dois pré-
dios. Concentrou-se sobre o caos formado pe-
los inimigos privados do apoio sobre o solo.
Com um único pensamento atingiu um grupo
de vinte robôs, impelindo-os para o alto.
Quando atingiram a altura de oitenta me-
tros, Anne retirou a força cinética de suas víti-
mas e deixou que caíssem livremente ao solo.
O impacto transformou os robôs em sucata.
— Vamos repetir a dose!
Naquela rua Anne Sloane dependia exclusi-
95
vamente de si mesma. É que estavam em três e
tinham que repelir os ataques que, divididos em
três cunhas vindas do norte, sul e leste, procedi-
am numa obstinação mecânica contra o tanque
encalhado.
Tako Kakuta captou a última mensagem vin-
da pelo telecomunicador.
— Rhodan está presente. Anne Sloane, a te-
lecineta, também. Eles nos tirarão daqui, Ivã.
Agüente mais um pouco.
— Vamos fazer mais três lançamentos de
duas bombas de cada vez — ordenou Perry
Rhodan.
Mais uma vez o caos se instalou entre os ro-
bôs. A mesma coisa que Anne Sloane conse-
guia realizar com seu cérebro, Kitai Ishibashi e
Rhodan faziam indiretamente por meio dos an-
tígravos. Assim que as máquinas rebeldes perdi-
am o apoio em virtude das explosões, a força
gravitacional era retirada. Os robôs subiam que
nem bolhas de sabão, para despencarem em
queda livre.
Nenhum deles resistia à queda.
Poucos robôs conseguiram se manter no
solo e desapareceram no interior dos edifícios
mais próximos. O ataque contra o tanque co-
mandado por Cry foi suspenso.
— Estamos salvos — constatou Tako Kaku-
96
ta.
— Muito bem. Iremos até aí — comunicou
Rhodan. — Anne e Kitai, pousem imediata-
mente no cruzamento. Não se esqueçam de dei-
xar ligados os defletores de luz. É bem possível
que ainda haja alguns robôs atocaiados.
A tripulação do outro tanque estava morta.
O lado esquerdo do veículo havia sido esmaga-
do.
Anne Sloane se aproximou do tanque co-
mandado por Cry e se concentrou.
Até parecia obra de fantasmas: de uma hora
para outra, blocos de concreto de cem quilos
pareciam se mover por sua própria força, des-
locando-se para o lado. Aos poucos os destro-
ços que impediam o movimento do blindado fo-
ram sendo removidos.
— Ligue o motor.
Cry transmitiu a ordem de Rhodan. Não
houve mais qualquer problema para o tanque.
— Muito obrigado, chefe! Foi formidável!
— Não há por quê. Dirija-se ao lugar em
que está o batalhão do capitão Klein. Acredito
que do lado de cá o cerco já foi rompido. De
qualquer maneira, tenha muito cuidado. Como
vai Goratchim?
— O estado dele é excelente — disse Kaku-
ta. — Está entusiasmado com o seu trabalho.
97
***

Acompanhado dos dois mutantes, Rhodan


realizou um vôo de inspeção por cima das li-
nhas de combate Do lado leste das três posi-
ções cercadas, a situação também parecia bas-
tante perigosa. Os robôs haviam cercado o regi-
mento de guardas de uma usina de força, infli-
gindo-lhe graves perdas humanas.
— Vamos repetir o exercício — disse Rho-
dan. — Agiremos como da outra vez. Que dia-
bo é aquilo?
Ainda se encontravam a uma distância de
mil metros. Diante de seus olhos uma dezena
de robôs flutuou no ar e se precipitou ao solo.
Mensagem transmitida pelo telecomunica-
dor.
— Indagação geral. Quem está agindo com
trajes arcônidas por cima do enclave, oeste?
— Sou eu — respondeu uma voz bastante
familiar. — Não atravesse o meu caminho,
Rhodan. Mantenham-se mais ao sul.
— Ora, Bell! Será que ficou louco?
— Nada disso. Afinal, ainda temos o coronel
Freyt. Passei o comando a ele. Quando vi o seu
grupo saindo com umas simples bombas explo-
sivas, logo imaginei quais eram suas intenções.
98
Já deveríamos ter começado com isso há tem-
po. Não se preocupe mais com este setor. Dê
um apoio ao pessoal do setor central.
Rhodan concordou, pois as palavras de Bell
eram perfeitamente razoáveis. Voltaram.
Realizaram um controle da situação no bata-
lhão de guardas de Klein.
— Vamos embora! — ordenou Rhodan.
Aqui também não precisavam deles.
Ivã Goratchim agira como um possesso em
meio aos robôs. Os homens já podiam se deslo-
car livremente pela rua.
Houve um ligeiro contato com Kakuta, que
ainda se encontrava no tanque de Cry, em
companhia do detonador.
— Tomamos o rumo oeste, Rhodan. Posi-
ção atual, quadra H-G IV. Ivã está bem adapta-
do ao serviço. Não enfrentamos qualquer resis-
tência digna de nota. As grandes unidades ro-
botizadas foram todas dizimadas. Só lançam
ataques em grupos de três ou quatro. E a um
ataque desses nosso campo energético pode re-
sistir.
Vez ou outra ainda se assistia à explosão de
uma máquina de guerra. Wuriu Sengu confir-
mava os detalhes das observações parciais.
O coronel Freyt mandou que as tropas que
ainda estivessem em condições de combater se
99
lançassem ao contra-ataque. À uma hora come-
çou a operação de limpeza. Rhodan anunciou
seu regresso ao quartel-general.
— Gostaria que viesse imediatamente — dis-
se Freyt. — Tenho uma notícia muito impor-
tante.
— Dentro de três minutos estarei aí.

***

As pessoas que se encontravam no gabinete


do ministro da segurança pareciam deprimidas.
Isso não era de estranhar. A população de Ter-
rânia sofrera perdas dolorosas.
— O que houve, coronel? — perguntou
Rhodan.
— Uma mensagem de Adams. Em Nova Ior-
que estão enfrentando uma situação idêntica.
Rhodan permaneceu calado o tempo de que
precisou para respirar.
— Peço maiores detalhes. A G.C.C. fica no
centro de uma grande metrópole.
Freyt fez correr a fita gravada.
— Remetente: General Cosmic Company,
Homer G. Adams, diretor-geral. Destinatário:
Perry Rhodan, Terrânia, território da Terceira
Potência, deserto de Gobi. Data: 3 de agosto.
Hora: 23:45 h, tempo da costa leste dos Esta-
100
dos Unidos.
“Desde as 23:30 h, seiscentos elementos da
polícia robotizada da G.C.C. estão fora de con-
trole. Não encontramos nenhuma explicação
para o incidente. Três homens que tentaram se
aproximar dos robôs para desligá-los foram
mortos. Na sede da G.C.C. a confusão é total.
Ao que parece, alguns andares do edifício da
administração central se encontram sob o con-
trole das máquinas rebeldes. Peço instruções e
apoio.”
Desligando a fita, Freyt completou:
— É só, chefe.
— E já chega, coronel. Receio que tenha-
mos que dispersar nossas forças ainda mais.
Bell ainda não está de volta?
— Não.
Bell foi chamado e posto a par da nova situ-
ação. Reagiu com algumas palavras grosseiras,
mas logo se calou quando lançou os olhos sobre
Thora.
— E dizer que nossa meta era uma transição
rápida para o planeta Peregrino. Gostaria de
saber o que será da nossa frota estacionada no
sistema de Beta-Albíreo se tivermos que ficar
presos aqui em casa.
— O inimigo é o mesmo. Apenas, aqui os
protagonistas da peça usam outras máscaras.
101
De qualquer maneira temos que dar um jeito
neles. Não podemos deixar a Terra enquanto
perdurar esta situação.
— Sugiro uma ação-relâmpago. Hoje de
manhã conseguimos desenvolver boas táticas de
combate contra robôs desertores. É bem verda-
de que alguns deles ainda estão andando por aí.
Mas o coronel Freyt não terá nenhum problema
em lidar com eles. O trabalho principal será o
de cuidar dos mortos e feridos. Os robôs de tra-
balho poderão dar uma ajuda nesses serviços de
limpeza. Foram todos examinados e podem ser
reativados logo.
Rhodan confirmou com um aceno de cabe-
ça. Pelo telecomunicador transmitiu uma men-
sagem-relâmpago a Adams, informando-o de
que nos próximos minutos seriam deliberados
em Terrânia os detalhes da operação de apoio.
— Até lá não esboce qualquer reação,
Adams. Daqui a pouco voltaremos a entrar em
contato com você.
No momento em que Bell falou numa ação-
relâmpago, não apareceu ninguém que o cha-
masse de utopista. Mas, antes que a breve con-
ferência fosse concluída, surgiu outra notícia
vinda da central de informações, que arrefeceu
ainda mais o que ainda restava de otimismo en-
tre os participantes.
102
— Mensagem de rádio vinda de Berlim: O
escritório da G.C.C. para a Europa Central caiu
nas mãos de robôs policiais e de guerra revolta-
dos. O prefeito de Berlim decretou o estado de
emergência para toda a cidade.
“Mensagem de rádio vinda de Sydney: O
edifício do escritório da G.C.C. para a Austrália
foi mandado para os ares por desconhecidos.
Quarenta robôs descontrolados correm pela ci-
dade, matando o que lhes atravessa pelo cami-
nho. O exército e a polícia estão impotentes.
“Mensagem de rádio vinda de Durban: Ro-
bôs-polícias da General Cosmic Company ata-
caram e mataram o funcionalismo humano.
Poucas pessoas conseguiram escapar. Os robôs
entrincheiraram-se no edifício e expediram um
ultimato que exige a entrega do poder ao go-
verno local.
“Mensagem de rádio vinda de Montevidéu...
“Mensagem de rádio vinda de Manila... de
Madri, do Kuwait...”
Ação-relâmpago!
Era uma ação-relâmpago, sim, mas dos sal-
tadores. Em todos os lugares em que a G.C.C.,
o fator de poder econômico da Terceira Potên-
cia, havia instalado suas dependências, estavam
estacionados os robôs de combate.
— Se os saltadores conseguirem atingir e
103
contaminar todas as nossas filiais, isso equivale-
rá a um incêndio mundial — constatou Rhodan.
— As mensagens de rádio que acabamos de re-
ceber não serão as últimas. As filiais e fábricas
estão espalhadas por mais de duzentos pontos
no globo terrestre. Alô, central. Peço uma liga-
ção direta imediata com a F.D.T.
A Federação de Defesa da Terra era coman-
dada por Allan D. Mercant, um homem peque-
no e esguio, e tinha sua sede no fiorde de Uma-
nak, na Groenlândia. O rosto desse homem só
aparecia nas telas do videofone.
— Já sei o que está querendo, Rhodan. Pa-
rabéns pela vitória alcançada em Terrânia...
— Quer dizer que já está a par?
— Só podia estar. Meus agentes também es-
tão trabalhando no Canadá. Aliás, seu escritório
de Quebec foi esquecido em todas as mensa-
gens radiofônicas. Não sei o que posso fazer
por você, Rhodan. Afinal, não disponho de
cem milhões de cidades. Teremos que dividir a
tarefa.
— Antes de mais nada, envie tropas especi-
ais com armamentos pesados para Nova Ior-
que. Se essa cidade sucumbir, com ela sucumbi-
rá a economia do mundo. E uma nave espacial
será a última coisa que poderá ser usada por lá.
— Posso dispor de duas divisões para Nova
104
Iorque. Não sei se isso será suficiente para en-
frentar o Imperador de Nova Iorque...
— Enfrentar quem?
— O Imperador de Nova Iorque. Ainda não
soube que na noite passada os robôs proclama-
ram a monarquia?

O gabinete de Adams nunca abrigara tanta


gente. O ar estava viciado, apesar das ótimas
instalações de condicionamento de ar.
— ...agradeço, senhoras e cavalheiros. Peço
que voltem a seus lugares e se mantenham cal-
mos. Estes fenômenos foram observados em
todo o mundo. Nem mesmo Terrânia foi pou-
pada. Por lá a rebelião dos robôs já foi reprimi-
da. E Perry Rhodan está se dirigindo para cá.
Um gesto cansado. As pessoas comprimi-
ram-se junto à porta, para sair. Nem todos po-
diam voltar aos seus lugares no escritório. Os
primeiros dez pavimentos haviam sido ocupa-
dos pelos robôs. E também a cobertura e o
campo de pouso de helicópteros e outras aero-
naves de decolagem vertical.
— Quero ar! — gritou Adams, desesperado.
Miss Lawrence estava parada na porta. Era
o bom espírito de seu corpo secretarial. Hoje
105
não parecia se sentir tão segura. Isso já se de-
duzia do simples fato de que não perguntava
pelos desejos de Adams.
— Esta carta acaba de ser entregue, Mr.
Adams. Dizem que é para o senhor.
— Obrigado! Fique mais um momento. Hoje
não suporto ficar sozinho. A correspondência
pode aguardar até amanhã. Até mais.
Abriu a carta e leu.
— O Imperador de Nova Iorque honrá-lo-á
com sua visita às duas da tarde. Prepare tudo
para a recepção, e tome providências para que
possa passar sem enfrentar o menor perigo. Se
o senhor ou seus subordinados tomarem qual-
quer atitude inamistosa, a sede da G.C.C, irá
pelos ares. Exigimos obediência, mas sabemos
ser um bom senhor para os que nos amam.
Adams amassou a carta, mas logo se arre-
pendeu e voltou a alisar o papel.
— Leia, miss Lawrence!
A secretária obedeceu. Sua risada estridente
era prova de que acreditava em cada palavra. O
medo e o pânico tiraram-lhe a fala.
— Já temos um imperador — disse Adams
com uma risada. Também essa risada não pare-
cia muito espontânea, mas de qualquer maneira
podia-se entender o gesto. — Os robôs elege-
ram um imperador. Gostaria de saber qual foi o
106
secretário que conseguiu enganá-los. Qual é sua
opinião, miss Lawrence?
— Minha opinião é que a coisa não é de
brincadeira. E sei que nunca senti tanto medo
como hoje.
— Não são invasores extraterrenos, minha
filha — procurou consolá-la Adams.
— Não são monstros, mas simples robôs X,
construídos pelo próprio homem. Vamos refle-
tir friamente sobre o assunto, miss Lawrence.
Esses caras estão malucos. Não é provável que
toda a série esteja padecendo de um defeito de
construção. Se fosse assim, as avarias teriam
surgido progressivamente, e não em todos os
robôs ao mesmo tempo.
Não tenho a menor dúvida de que alguém
cuja identidade ainda não conhecemos modifi-
cou a programação das máquinas. Talvez tenha
agido apenas sobre um único exemplar dotado
de uma inteligência extraordinária. Depois
transmitiu as instruções aos robôs de reparo.
— Queira desculpar, Mr. Adams. Não tenho
seus nervos, e por isso no momento não estou
em condições de refletir sobre as causas do fe-
nômeno. Também não sou nenhuma cientista,
motivo por que não posso compreender os de-
talhes. O senhor tem que tomar alguma provi-
dência.
107
— Tomar providências? — perguntou
Adams, esticando as palavras. — Não venha
me dizer que acredita seriamente que vou dar a
este bilhete uma atenção maior que a um peda-
ço de papel tirado do lixo. Ora, esta, o impera-
dor de Nova Iorque! Que infantilidade! Que lou-
cura!
— Acontece que em Terrânia os filhos da
loucura mataram mais de mil pessoas. E eu não
gostaria de pertencer aos milhões de Nova Ior-
que.
O homem pequeno e corcunda sentado
atrás da escrivaninha encolheu a cabeça entre
os ombros.
— Em Terrânia desencadearam uma guerra
feroz — refletiu Adams em voz alta.
— Mas em Nova Iorque pretendem negoci-
ar. Qual é a explicação disso?
— Faltam apenas dez minutos para as duas,
chefe — insistiu a secretária. — Pense nas pes-
soas que se encontram no edifício.
— Está bem. Receberei o Imperador. Quem
sabe se não conseguimos envolvê-lo numa dis-
cussão mais prolongada? Nesse caso poderei
apresentá-lo a Rhodan. Até que sua idéia não é
má. Prepare bastante café, miss Lawrence. Isto
é, basta um pequeno bule para mim. Acho que
o gosto do Imperador será outro.
108
Homer G. Adams transmitiu instruções para
que os funcionários da empresa se mantivessem
calmos à chegada do Imperador. E manteve
uma palestra pelo telecomunicador com Perry
Rhodan.
— Que pena — concluiu Rhodan. — Não
poderemos estar aí antes das três e meia. Mas
mandarei Kakuta.
O teleportador chegou ao escritório de
Adams exatamente dois minutos antes das
duas.
No mesmo instante, miss Lawrence anunci-
ou a chegada do Imperador. De tão nervosa e
medrosa que estava, mal conseguia pronunciar
o nome.
— Deixe-me ocupar seu lugar — disse Kaku-
ta.
Adams quis objetar. Fez questão de dizer
que não era nenhum covarde.
— Não é por isso — ponderou o japonês.
— Terei mais facilidade em dar o fora que você.
Ponha seu traje arcônida e sente ao meu lado.
Esteja invisível. Assim poderá aparecer a qual-
quer momento, caso isso seja necessário. Dei-
xarei o telecomunicador ligado, para que dentro
do seu capacete você possa acompanhar a pa-
lestra, palavra por palavra.
— Faltam dois minutos, miss Lawrence.
109
Os dois minutos transformaram-se em três.
O Imperador não estava com pressa. Examinou
detidamente todas as ante-salas e, segundo seu
gênio, dirigiu algumas perguntas ingênuas aos
presentes. Por outro lado, demonstrou uma
série de conhecimentos superespecializados.
Duas horas e três minutos.
O Imperador entrou.
— O senhor não é Mr. Adams.
— Sou Tako Kakuta, primeiro teleportador
do Exército de Mutantes. Poderei desaparecer a
qualquer momento, se tiver vontade.
— Sou o Imperador. Chame-me de Impera-
dor.
— Como queira, senhor Imperador.
— Gostaria de falar com Mr. Adams.
Chame-o imediatamente.
— O chefe não pode comparecer, senhor
Imperador. Eu o represento em qualquer setor.
Por alguns segundos o Imperador manteve-
se imóvel. Depois disso, dois pesados robôs de
combate rolaram para dentro da sala. Só agora
se notou a grande diferença. O Imperador era
um robô-secretário com muito saber armazena-
do. Era a classe que dispunha do maior grau de
inteligência e cultura geral. A altura era de um
metro e setenta. Kakuta lembrou-se que, fora
do território da Terceira Potência, esses tipos
110
dispunham de mecanismos de comando autô-
nomos, tal qual as máquinas de guerra. Não va-
lia a pena ligar os poucos exemplares dissemi-
nados em largas áreas geográficas a um cérebro
de controle centralizado.
— Sou o Imperador desta cidade e exijo
obediência. Qualquer recusa no cumprimento
de uma ordem será punida com a morte.
Kakuta sabia que um interlocutor desse tipo
não teria a menor disposição para negociar.
Seu plano de envolvê-lo numa palestra mais
prolongada tinha que cair por água abaixo.
— Chamarei Mr. Adams, Majestade.
— Majestade não! Sou o Imperador!
A teimosia do secretário mecanizado era al-
tamente ofensiva. Kakuta se controlou.
Dirigiu-se à sala contígua e deixou a porta
aberta para que Adams, invisível, pudesse se-
gui-lo.
— Chefe, é necessário que o senhor compa-
reça pessoalmente.
Adams abriu o capacete. O Imperador não
tomou conhecimento de sua estranha vestimen-
ta.
— Precisamos de sua colaboração, Mr.
Adams. Ofereço-lhe um escritório elegante em
minha residência no Empire State Building. O
fato de que o senhor é indispensável para mim
111
constitui a melhor garantia de sua sobrevivên-
cia. O novo Império não poderá ser dirigido to-
talmente sem homens. Siga-me.
O Imperador foi andando. Os dois robôs de
combate pararam na porta, como se esperas-
sem que o maior gênio financeiro do mundo se
colocasse entre eles.
Para os dois homens, o curso que tomaram
os acontecimentos representou uma surpresa
excessiva. Estavam habituados à objetividade.
Mas a cerimônia do novo soberano foi rápida
demais.
Queriam Adams e mais ninguém. Assim que
Adams se encontrasse do lado de fora, a guerra
desabaria sobre o edifício da G.C.C.
— Siga o Imperador! — ordenou um dos ro-
bôs.
Adams obedeceu. Estava pálido e suas mãos
tremiam. Kakuta fazia votos de que fosse de rai-
va, não de medo.
Mas logo o japonês teve que cuidar da pró-
pria segurança. O último dos robôs virou-se
para ele e levantou o braço inferior do lado es-
querdo, que tinha um radiador de impulsos
térmicos embutido. Kakuta teleportou-se para a
sala contígua e ouviu o som inconfundível da
destruição. A essa hora o gabinete de Adams
devia se parecer com um campo de batalha.
112
Finalmente estavam mostrando as cartas.
Ligou o telecomunicador.
— Alô, Rhodan! Deixarei meu aparelho liga-
do para a transmissão. Acompanhe as informa-
ções. Fim. Tenho que me teleportar de novo.
Kakuta saltou para a segunda ante-sala, pela
qual o Imperador ainda teria que passar.
— Pare! Nenhum passo!
Estava com o radiador de impulsos térmicos
apontado para Adams. O Imperador estacou.
— Quem não quiser ser destruído que saia
do meu caminho.
— Um instante, senhor Imperador. O se-
nhor não pode dispensar o mais importante dos
nossos homens. E entre homens sempre preci-
samos de um entendimento.
Um dos seus robôs acaba de disparar contra
mim. Exijo garantias contra esse tipo de trai-
ção.
— O Imperador ordena, os outros obede-
cem.
— Menos eu! Se não quiser entender a lin-
guagem da razão, terei de matar Mr. Adams.
Escolha.
Kakuta preferiu jogar no seguro. Atirou no
primeiro dos robôs de combate, que estava en-
trando na sala. Depois saiu correndo e destruiu
também o segundo, que naquele instante consi-
113
derava concluída sua insensata missão destrui-
dora no gabinete do chefe. As duas máquinas
não haviam sido reguladas para enfrentar um
perigo iminente e por isso mantiveram seus
campos protetores desativados.
Kakuta voltou à ante-sala. Parecia se sentir
muito mais à vontade.
— Agora vamos ao nosso acordo, senhor
Imperador! Quero um acordo que inclua garan-
tias para o edifício da G.C.C. Senão estiver dis-
posto a firmá-lo, o senhor não sairá daqui. Não
tenho o menor interesse na sua dinastia de ro-
bôs. Estamos interessados única e exclusiva-
mente na nossa firma.
A máquina não deu mostras de qualquer rea-
ção emotiva. Nem poderia desenvolver uma re-
ação desse tipo. Por isso o homem tinha de re-
dobrar os cuidados perante a mesma.
— Eu sou o Imperador e dou as ordens. Os
outros obedecem.
A arrogância da máquina deixou Kakuta ain-
da mais irritado. Não devia perder o autocon-
trole! Se essa criatura realmente era o impera-
dor, por que não o prendia? Por que não o des-
truía?
O teleportador colocou o dedo no gatilho.
Não acreditou que um disparo de sua arma pu-
desse salvar Nova Iorque. Era impossível que o
114
comando de todas as máquinas robotizadas esti-
vesse centralizado nesse cérebro P. Essa histó-
ria do imperador só podia ser um blefe. De
qualquer maneira, o que poderia fazer?
— Eu o matarei, senhor Imperador, a não
ser que se disponha a negociar em bases justas.
— No momento em que o senhor me matar,
as comunicações com o centro de controle esta-
rão interrompidas. Isso desencadeará um alar-
ma. Num prazo curtíssimo este edifício seria re-
duzido a um montão de ruínas.
— Nada de violência, Kakuta — voltou a in-
tervir Adams. — O Imperador deve ter tomado
todas as providências para sua garantia. Sugiro
um negócio melhor...
— Fale — disse o Imperador.
— O senhor nos entrega vinte robôs-polícia
em estado passivo, que se encarregarão da pro-
teção do edifício.
A voz do Imperador se transformou num
ronco. Talvez pretendesse ser um riso irônico.
— No novo Império só existe uma força po-
licial. Sua proposta é inaceitável. Eu sou o Im-
perador, os outros obedecem.
A raiva de Kakuta foi substituída por uma li-
geira satisfação. Afinal, conseguira envolver o
robô numa palestra. O tema não tinha a menor
importância. Na situação em que se encontrava
115
ele se prestaria à palestra mais idiota deste
mundo.
— O senhor está enganado, senhor Impera-
dor! A G.C.C, não pertence ao senhor. Temos
de estabelecer algum tipo de coexistência. Nin-
guém conseguirá destruir a Terceira Potência.
Não se esqueça disso.
— A Terceira Potência não pertence ao
meu território. Terá outro imperador.
— O imperador da Terceira Potência já
morreu, se é que está interessado nisso. E com
ele morreram duzentos guerreiros seus.
— O destino dos habitantes de Gobi é la-
mentável. Mas não é o que está em discussão.
— Esse destino devia lhe servir de exemplo.
— Eu sou o Imperador, Mr. Kakuta. A au-
diência terminou. Mande abrir a porta.
Dois policiais querem entrar.
Kakuta teleportou-se para o corredor, onde
foi parar no meio de dez robôs. Logo saltou
para diante, pois ali não teria vivido mais de
cinco segundos.
— O senhor está enganado, senhor Impera-
dor. Não são dois robôs, são pelo menos dez.
Devemos interpretar isso como uma ameaça?
— Mande abrir a porta! — ordenou o Impe-
rador.
Foram suas últimas palavras. Mal acabara de
116
pronunciar as mesmas, caiu em meio a um es-
trondo e ficou reduzido a um montão de sucata.

***

— Chega de táticas de retardamento — dis-


se Perry Rhodan, que subitamente se tornou vi-
sível, vindo do nada. Foi seguido por Anne Slo-
ane, pelo Dr. Manoli e por Tanaka Seiko. Re-
gularam seus trajes arcônidas para a posição
zero e abriram os capacetes.
Alguns funcionários do escritório haviam
desmaiado.
— Eric, faça o favor de cuidar dessa gente.
— Como foi que conseguiu entrar aqui?
— Passei pelo seu escritório, Adams. Tem
um buraco enorme na parede externa.
— Você acaba de matar o Imperador.
— Que imperador, que nada! Há pelo me-
nos trinta e cinco tipos destes em Nova Iorque.
Temos que evacuar a cidade, senhoras e senho-
res. Vamos começar pelo edifício da G.C.C. O
perigo é muito grande.
— Antes de mais nada, temos de cuidar dos
robôs que estão lá fora — advertiu Kakuta. —
A qualquer momento podem entrar aqui.
— Está bem — confirmou Rhodan. — So-
mos cinco pessoas equipadas com trajes especi-
117
ais e radiadores de impulsos. Eric, você ficará
de sentinela na porta. Anne e Tako, subam
mais um andar...
— Não conseguirão passar. Tako disse que
estão bem diante da porta.
— É verdade?
O japonês fez que sim.
— Nesse caso abram a porta e disparem
uma salva maciça. Dentro de cinco segundos
tudo deverá estar liquidado.
Perry Rhodan sabia perfeitamente que isso
representaria um desafio para o inimigo. Em
Terrânia já perguntara a si mesmo se não teria
sido melhor deixar os robôs em paz. Se o fizes-
se, naquele dia teria havido menos mortos. Mas
qual seria a alternativa para os sobreviventes?
Teriam que ficar quietos e aceitar tudo?
O exército de robôs teria prosseguido nos
serviços de espionagem sem que ninguém os
incomodasse. Teriam revelado aos saltadores,
estacionados no sistema de Beta-Albíreo, onde
ficavam as posições mais importantes da Terra.
O fim teria sido a capitulação de nosso planeta.
Os saltadores descendiam dos arcônidas.
Não havia dúvida de que possuíam certa superi-
oridade técnica.
Nada disso. Rhodan não se cansara de con-
sultar sua consciência. Qualquer adiamento no
118
confronto entre os homens e os robôs teria pio-
rado a situação da Humanidade. Ainda bem
que a luta declarada havia irrompido. Só assim
a confusão terminaria logo. E isso apesar de al-
guns cálculos errados realizados no interior da
cúpula energética, que fez com que, de uma
hora para outra, o conflito se alastrasse por
todo o mundo.
As coisas se tornaram piores do que Rhodan
calculara. Justamente por isso fez questão de
que se chegasse a uma decisão rápida.
A porta se abriu!
Os robôs estavam sem a menor proteção.
Enquanto realizavam a ligação individual que
ativaria seus campos protetores, a energia dos
radiadores arcônidas foi despejada sobre eles.
A escadaria parecia um inferno. Nenhum
dos lutadores artificiais teve tempo de esboçar
qualquer gesto de defesa.
Com os trajes de batalha fechados, Rhodan,
Anne Sloane e Tako Kakuta saltaram para a
frente. Os campos protetores que os cercavam
tornavam-nos imunes às radiações liberadas por
ocasião do ataque.
— Vamos limpar a área em cima e embaixo!
— ordenou Rhodan. — Tanaka, onde está
você? Mantenha-se próximo a Tako e dirija-se
para cima. Anne, você irá comigo aos andares
119
inferiores.
Com o ataque, os elevadores sofreram pesa-
das avarias e não puderam ser utilizados. Foi
uma desvantagem considerável.
Na verdade, para as pessoas que portavam
os trajes arcônidas o problema não era muito
grave. Podiam flutuar pelas escadarias, sem de-
pender dos degraus.
Rhodan e Anne chegaram ao décimo segun-
do pavimento.
— Pare!
Admiraram-se de não terem encontrado
qualquer resistência. Seria de esperar que os ro-
bôs houvessem ocupado ao menos os acessos
de todos os pavimentos.
Rhodan tirou suas conclusões. Estava acos-
tumado a refletir sobre qualquer fato e procurar
adivinhar os motivos.
Havia um fato conhecido: em Nova Iorque
deviam estar estacionados cerca de seiscentos
robôs de combate e uns oitocentos robôs de
trabalho. Em meio a uma cidade de dez milhões
de habitantes, o número era insignificante. Mes-
mo que o inimigo concentrasse suas atenções
sobre a sede da G.C.C, teria que ter muito cui-
dado com o seu pessoal.
— Não tenha medo, Anne — disse o chefe
da Terceira Potência para animar sua acompa-
120
nhante. — Tenho a impressão de que estamos
superestimando a situação dos robôs neste edi-
fício. Lembre-se de que, segundo dizem, ocupa-
ram os dez pavimentos inferiores e a cobertura
do edifício.
Continuaram a flutuar para baixo. A teleci-
neta sempre ia um pouco atrás de Rhodan.
No décimo pavimento encontraram um úni-
co robô junto à entrada principal desse setor de
escritório. Estava parado como uma sentinela
entediada, que não sentia qualquer emoção du-
rante as horas de serviço.
— Como esses caras são estúpidos! Nem to-
mam conhecimento de que trinta metros acima
de suas cabeças um grupo de companheiros foi
destruído.
As palavras de Rhodan soaram debilmente
no ouvido de Anne. No interior do traje trans-
portador arcônida havia um ambiente fechado.
Nem mesmo as ondas sonoras alcançavam o
exterior.
Invisível e sem fazer o menor ruído, Rhodan
se aproximou do inimigo. Aquela sentinela soli-
tária dera-lhe uma inspiração toda especial. Dis-
parou em primeiro lugar contra os angulosos
braços inferiores, que eram os mais perigosos,
já que portavam as armas. Depois foi a vez das
pernas, e por fim dos braços superiores.
121
O robô caiu ao chão como um saco. Em seu
crânio logo se desenvolveu uma série de rea-
ções. O alto-falante rangia a intervalos regula-
res, como se estivesse acoplado a um pisca-pis-
ca. O robô estava pedindo socorro.
Rhodan saltou para a frente e moveu a
chave-mestre que se encontrava nas costas da
criatura, que foi colocada completamente fora
de ação.
— Pegue-o, Anne. Vamos logo! Leve-o para
cima, para a sala da direção. A qualquer mo-
mento a coisa pode...
A coisa já começara. Três robôs de combate
surgiram na porta oposta. Ficaram parados por
alguns instantes. Um homem provavelmente te-
ria ficado tão nervoso que atiraria, mesmo que
não visse nada. Mas os robôs hesitaram, porque
não viram nada. Era bem verdade que o dispo-
sitivo de localização de matéria seria posto a
funcionar imediatamente, e contra este a invisi-
bilidade não adiantaria nada.
— Tenha cuidado, Anne! — chiou Rhodan.
— Leve esse sujeito. Preciso dele no estado em
que se encontra. Dê o fora! Eu cobrirei a retira-
da.
O radar dos robôs levou perto de quinze se-
gundos para localizar o alvo. Isso bastou para
que a telecineta desaparecesse com sua vítima.
122
Rhodan flutuou para baixo, visto que a descida
para o nono andar era observada menos inten-
samente pelos robôs. E dessa direção abriu
fogo, antes que os três colossos se dispusessem
a atirar.
Dois deles foram liquidados na primeira in-
vestida. O terceiro teve tempo de determinar a
posição de Rhodan e respondeu ao fogo.
O campo protetor gerado pelo traje de Rho-
dan torceu-se sob o impacto dos raios dispara-
dos pela arma inimiga. A fluorescência causada
pelo atrito das duas formas de energia revelou
ao robô a posição exata de Rhodan. A máquina
aumentou o poder de fogo de seu braço arma-
do. O homem procedeu da mesma forma com
seu radiador de impulsos térmicos. Modificou a
focalização, concentrando os raios num feixe
tão estreito que eles atingiam o alvo como uma
alfinetada.
Esse tipo de manejo da arma pressupõe uma
prática e uma pontaria extraordinária. E numa
luta contra robôs ainda se tornava necessário
que o combatente estivesse a par da anatomia
dessas máquinas.
Rhodan estava a par.
Atingiu o reator individual e dessa forma
saiu vencedor no duelo, que por pouco não tem
um desfecho totalmente diverso.
123
O robô estava fora de combate. Apesar dis-
so, Rhodan esperou um instante e verificou o
andar de cima e o de baixo. O de baixo adquiriu
vida, enquanto no décimo pavimento tudo con-
tinuava em silêncio.
Voltou a flutuar para cima.
Anne Sloane já colocara o robô no pavimen-
to de Adams, onde foi depositado num lavató-
rio.
— Não está levando seus sentimentos huma-
nos longe demais? — perguntou Adams, sacu-
dindo a cabeça. — Desde quando se costuma
fazer prisioneiros entre os robôs?
— O menino é muito precioso. Será levado
para Terrânia, onde o examinaremos. É bem
possível que ele acabe nos revelando como foi
tramado todo esse complô.
Dali a pouco Kakuta e Seiko retornaram.
— Limpamos a cobertura do edifício, chefe.
Lá em cima havia cinco robôs.
Adams logo compreendeu as intenções do
chefe. E manifestou sua objeção.
— Acha que todo mundo deve dar o fora da-
qui?
— Acho que é precisamente isso que você
mais tem desejado nesta última hora.
— Sem dúvida. Acontece que a sede da
G.C.C, é uma oficina de trabalho insubstituível.
124
Só os registros guardados neste edifício...
— Está certo, Adams. A responsabilidade
será minha. O que mais vale são os seres huma-
nos. Não quero perder nenhum deles. Acredito
que, assim que tivermos desaparecido, o inte-
resse da família imperial nova-iorquina será de-
dicado a outros objetos.
Poucos minutos depois, um gigante esférico
desceu sobre a cidade de Nova Iorque. Naquela
hora, a cidade das possibilidades ilimitadas esta-
va festejando mais um triunfo. Apesar do peri-
go dos robôs, a população assustada corria
para os telhados a fim de contemplar o espetá-
culo.
O diâmetro da nave espacial Stardust-III era
de oitocentos metros. Quando parou poucos
minutos acima da cobertura do edifício da
G.C.C, sua sombra envolveu metade de Ma-
nhattan.
Era a nave de Perry Rhodan!
Representaria uma esperança?
Para certas pessoas. Para os funcionários da
G.C.C.
Mais de doze mil pessoas foram transferidas
para o veículo espacial esférico no curso de
duas horas. Ninguém ficou para trás. E os ro-
bôs nada fizeram contra esse tipo de resgate.
Ou não se interessavam pelo que estava aconte-
125
cendo.

***

Nova Iorque era grande!


E tinha um imperador, embora o Imperador
tivesse tombado.
As estações de rádio transmitiram a notícia
de forma bastante dramática. Algumas centenas
de pessoas já haviam sido obrigadas a se colo-
car ao serviço da nova dinastia. Outras pessoas,
que formavam a maioria, não despertavam o
interesse da nova dinastia.
Depois de alguma hesitação, a obra de des-
truição teve início. Ninguém sabia se ela conta-
va ou não com o consentimento do Imperador.
De resto, isso não importava O que importava
eram os fatos. E a evolução destes começou de
forma bastante semelhante à de Terrânia.
No momento em que o crepúsculo matutino
começou a subir pela costa leste dos Estados
Unidos, as duas divisões da F.D.T. enviadas por
Mercant chegaram à cidade. Vieram acompa-
nhadas de tropas aero-transportadas e equipa-
das com tanques pesados, protegidos por cam-
pos energéticos. Além disso, trouxeram caças
de um tripulante.
As tropas de infantaria logo conseguiram se
126
firmar na cidade. Foi bem ao norte, onde a
Broadway assumia um caráter pequeno-bur-
guês. Todavia, os pilotos dos caças não demo-
raram a constatar que pouco se poderia fazer
do ar. A caça de mil e quatrocentos robôs espa-
lhados pela cidade parecia uma tarefa sem a
menor possibilidade de êxito. Por isso, pelas
nove horas os caças foram trocados por heli-
cópteros.
O movimento de fugitivos diminuía rapida-
mente. Durante a noite os robôs apenas se rea-
gruparam. Com isso, a maior parte dos habi-
tantes de Nova Iorque se iludiu. Não souberam
avaliar o perigo e resolveram ficar em casa.
Quando chegaram as primeiras notícias sobre a
ação furiosa dos robôs, o pânico e o caos toma-
ram conta da cidade. De uma hora para outra
as vias de saída, estações e aeroportos ficaram
congestionadas.
Entre os dez aviões que decolaram em pri-
meiro lugar, dois foram derrubados por robôs
de combate. Caíram numa área densamente
povoada.
As duas divisões da F.D.T. iniciaram um
avanço precipitado, contando com o apoio de
helicópteros em vôo baixo. Venceram seis qui-
lômetros sem serem molestadas. Mas, de um
instante para outro, os movimentos de tropa es-
127
tacaram em todas as ruas que se dirigiam para
o sul. Precisamente às nove horas e trinta e cin-
co minutos teve início o fogo de defesa dos ro-
bôs. Pelas previsões humanas, a ação fulminan-
te teria causado perdas sensíveis às tropas de
Mercant. Mas as ordens transmitidas a estas fo-
ram terminantes. Ambas as divisões marcharam
todo o tempo com os campos energéticos indi-
viduais ligados, sem se iludir com a ausência ini-
cial de qualquer defesa. Apesar disso não havia
o menor motivo de ficar alegre.
Uns duzentos robôs de combate fecharam
Manhattan para o norte. Enquanto isso, quatro-
centos faziam estragos pela cidade, espalhando
o terror entre a população. Os robôs de traba-
lho apoiavam seus colegas o melhor que podi-
am.
10:15 h. Mensagem de Allan D. Mercant,
dirigida a Perry Rhodan:
— Não conseguimos avançar mais. A atua-
ção da força aérea demorará em nos levar ao
objetivo e, além disso, coloca em perigo a po-
pulação civil. Cada minuto custa novas vidas
humanas. Precisamos de uma campanha-relâm-
pago.
Resposta de Perry Rhodan, dirigida a Allan
D. Mercant:
— Evacuamos todos os colaboradores da
128
G.C.C. que se encontravam em Nova Iorque. A
Stardust-III dirige-se novamente à cidade.
Agüente mais um pouco, coronel. Estamos fa-
zendo o possível; chegaremos dentro de doze
minutos.
A atuação de Rhodan não poderia ficar res-
trita exclusivamente a Nova Iorque. Simultanea-
mente com a Stardust-III, seis naves auxiliares
da classe Good Hope — os chamados girinos
— haviam decolado da base de Gobi. Cada
uma das naves auxiliares trazia ao menos dois
mutantes a bordo. Destróieres e caças de um
homem haviam decolado de todos os pontos da
Terra em que se encontravam estacionadas as
máquinas da Terceira Potência. Centenas de
aparelhos controlavam o espaço aéreo de nos-
so planeta e aguardavam ordens para entrar em
ação.
Berlim, Sydney, Durban, Montevidéu, Mani-
la, Madri, Kuwait e mais três dezenas de pontos
geográficos foram assinalados com uma luz
amarela no mapa do estado-maior da Terceira
Potência.
Anne Sloane partira para Berlim, Tanaka
Seiko para Manila e Wuriu Sengu para Durban.
Os mutantes começaram a se tornar escassos.
E sobrara um único. Ivã Goratchim. Encon-
trava-se a bordo da Stardust-III.
129
10:27 h. A sombra da gigantesca nave es-
férica voltara a cobrir a cidade de Nova Iorque.
— Onde está o efeito moral? — perguntou
Reginald Bell, desesperado. — Se os inimigos
que se encontram lá embaixo fossem seres hu-
manos, já teriam feito as malas.
— Paciência — disse Rhodan. — Resolve-
mos construir robôs sem nervos. E lá estão
eles...
Modificaram a regulagem das telas de obser-
vação. Os detalhes puderam ser vistos. Os qua-
dros que se desenharam nas telas não foram
nada agradáveis.
As perdas nas divisões da F.D.T. haviam
crescido rapidamente. Os tanques destruídos es-
tavam espalhados por todos os cantos. As tro-
pas de Mercant batiam em retirada.
Chamado da Groenlândia.
— Não me explique o que está acontecendo
aqui — respondeu Perry Rhodan. — Vejo-o
com os próprios olhos. E vejo melhor que você.
Dê ordens oficiais de retirada. Só assim podere-
mos atrair os robôs para fora da cidade. E é
exatamente isto que teremos de fazer para evi-
tar que Nova Iorque desapareça do mapa.
— Está bem.
— Fim!
Ivã Goratchim, o detonador, entrou num
130
tanque, que foi levado ao chão num campo gra-
vitacional dirigido. O corpo de Ivã não cabia
num traje de batalha normal.
Mais trinta tanques foram levados ao chão
pela mesma forma. Tinham a artilharia e a tri-
pulação normal, e sua missão consistia em des-
viar de Ivã Goratchim a atenção do inimigo.
Em virtude da situação dos fronts, a área do
cruzamento da Broadway com a Quinta Aveni-
da estava livre de robôs. O grupo de desembar-
que da Terceira Potência chegou ao solo sem
qualquer problema e logo se espalhou em blo-
cos de três. Tako Kakuta, o teleportador, servi-
ria de elemento de ligação entre Rhodan e Ivã.
— Salte quando for necessário, Tako. Ivã é
um produto da natureza siberiana. Não acredita
muito no telecomunicador e no nosso equipa-
mento técnico. É preferível que fique com ele.
Ivã não pode sofrer a menor tensão emocional.
Tem de concentrar todas as suas energias na
detonação dos robôs.
Às 10:34 h Kakuta anunciou a primeira des-
truição de um robô por Goratchim. No mesmo
instante o hipercomunicador da sala de coman-
do produziu um forte ruído.
— Estabeleça contato imediatamente! — or-
denou Rhodan ao oficial de plantão da sala de
telegrafia. O ruído com que a ligação automáti-
131
ca do receptor principal havia reagido ao cha-
mado era típico. O comandante da nave podia
realizar qualquer palestra sem abandonar seu lu-
gar na ponte de comando. Enquanto isso mais
de trinta pessoas se incumbiam dos trabalhos de
registro na sala de telegrafia. A qualquer hora
todas as freqüências possíveis tinham de ser
mantidas sob observação. Três dezenas de tele-
grafistas e vários mini-robôs eletrônicos realiza-
vam um controle ininterrupto do espaço. Cons-
tantemente chegavam notícias sobre a situação
nos diversos pontos da Terra.
Rhodan acabara de ler um comunicado so-
bre a chegada de Anne Sloane a Berlim. O
zumbido do hipercomunicador revelava que o
expedidor da mensagem se encontrava num
ponto muito distante.
— Estabeleça imediatamente a ligação.
— Sim senhor.
— Cruzador Solar System para a Terceira
Potência. Cruzador Solar System para a Tercei-
ra Potência. O major Nyssen deseja falar com
Rhodan.
— Que diabo! Uma ligação direta — espan-
tou-se Bell. — Deve haver alguma novidade.
O correio pneumático junto ao assento do
piloto-chefe expeliu um cartucho. Um jovem te-
nente pegou-o e entregou o bilhete a Rhodan.
132
— Ivã registrou novos êxitos, chefe.
— Não me venha com Ivã a esta hora. Capi-
tão Bols, faça o controle da decodificação auto-
mática e cuide para que nenhuma outra mensa-
gem passe pela minha linha. Alô, major Nys-
sen! Aqui fala Perry Rhodan. Encontro-me a
bordo da Stardust-III. A nave está na atmosfera
terrestre.
Na tela surgiu o rosto magro do oficial pe-
queno e rijo. Nyssen sempre exibia um sorriso,
por mais difíceis que fossem os problemas com
que se defrontava. Sua voz rangedora só era
agradável para quem o conhecesse muito bem.
— Como está a situação, major? O momen-
to não é propício para notícias alarmantes.
A base de impulsos de quinta dimensão ga-
rantia a comunicação simultânea a uma distân-
cia de trezentos e vinte anos-luz.
— Em conformidade com as instruções rece-
bidas, nos mantemos a uma distância segura da
frota dos saltadores. O inimigo vem recebendo
reforços constantes, e nossa situação torna-se
cada vez mais difícil.
— Devo interpretar isso como um pedido de
socorro, major?
— Quando poderá voltar? Afinal, seria im-
portante para nosso planejamento tático que
conhecêssemos esse detalhe.
133
— Voltaremos assim que tivermos visitado o
planeta Peregrino. Sabe perfeitamente que nes-
tas circunstâncias não posso fornecer qualquer
indicação de tempo. Isso significa que a ordem
de manter sua posição continua de pé. Mais al-
guma novidade?
— Apenas duas observações que talvez se-
jam importantes para você. Há uma hora cons-
tatamos um deslocamento altamente suspeito
na frota dos saltadores. Até agora o receio de
que se trate de um ataque em grande escala
contra nossas naves não se confirmou. Nossos
telegrafistas dizem que descobriram uma men-
sagem direcional orientada para o sistema so-
lar. É claro que isso não pode ser provado.
— Está bem. Examinaremos isso. Mais algu-
ma coisa?
— Não encontramos mais a Orla XI no meio
do grupo inimigo.
— Isso significa que você conseguiu destruí-
la. Meus parabéns, major. Tifflor ficará satisfei-
to ao saber que seu ex-carcereiro Orlgans viu
chegada a hora.
— A Orla não foi destruída. Simplesmente
desapareceu. Receio que se trate de outro tru-
que do comandante dos saltadores.
— Nesse caso só posso lhe recomendar que
continue de olhos bem abertos. Você ainda terá
134
de se arranjar por algum tempo sem a nossa
presença. Não desanime, major!
— Está bem, chefe. Mais alguma ordem?
— Quero que desligue. Lembranças para a
frota. Fim.
O contato foi interrompido.
Poucas vezes se vira tamanho nervosismo a
bordo da Stardust-III como naquela hora. Todos
sabiam que o tempo era muito importante para
a expedição. A frota estacionada no sistema de
Beta-Albíreo precisava de socorro imediato. O
cérebro P estacionado em Vênus já preparara
os dados sobre o planeta Peregrino e aguardava
a visita de Rhodan. O próprio Peregrino corria
por regiões desconhecidas. Uma vaga esperan-
ça fora depositada nele.
E os robôs rebeldes estavam descarregando
sua fúria sobre a Terra.
Rhodan era um homem diferente. Desde
que, valendo-se de alguns estratagemas, conse-
guira receber no planeta Peregrino o dom da
vida eterna — que além dele só fora dispensado
a Reginald Bell — via-se numa posição bastante
delicada. Apesar disso, a essa altura já devia ser
capaz de feitos mais grandiosos.
Teria que estar em todos os lugares ao mes-
mo tempo.
A catástrofe que desabou sobre Nova Iorque
135
desenhou-se nas telas. Os robôs de combate ti-
nham transformado quadras inteiras de Manhat-
tan em infernos de fogo. Um traço duro se de-
senhou em torno da boca de Rhodan.

— Regime de prontidão para a Stardust-III.


Avisem quando estiverem prontos para comba-
ter.
O comando de Rhodan significava que ele
interviria no conflito com todo o potencial da
nave.
— Você sabe o que está fazendo, Rhodan.
A constatação de Reginald Bell deveria ter
sido formulada como uma pergunta. Mas não
foi.
— Ponho vidas humanas em perigo, se é
isso que você quer dizer. Mas ponho um núme-
ro muito maior de vidas em perigo se não fizer-
mos o que está ao nosso alcance.
A sombra por cima do inferno atômico de
Nova Iorque cresceu. Representava a única es-
perança dos seres humanos que ainda viviam
na cidade. Todos sabiam que era a nave de
Perry Rhodan.
O campo energético da Stardust-III tocou a
ponta dos arranha-céus mais altos. O gigante
136
foi parar nas proximidades do Empire State
Building.
— Comandante para os postos de combate.
Só abram um fogo bem dirigido. Não disparem
cargas maiores sobre alvos disseminados. Toda
e qualquer vida humana deverá ser poupada.
Os disparos serão registrados com exatidão.
No momento em que chegou o último aviso
de prontidão, Perry Rhodan mandou abrir fogo.
A Stardust-III se deslocou lentamente para o
norte, aproximando-se da frente de luta. Ivã
Goratchim se encontrava na rua 42. Kakuta re-
alizou uma teleportação e compareceu a bordo
por dois minutos.
— Trinta e cinco robôs destruídos. Alguns
dos nossos tanques também foram atingidos.
Não dispomos de números exatos.
— Como vai Ivã?
— Está em plena forma. Estamos lutando
contra máquinas. Por isso não tem problemas
de consciência. E bem verdade que se acostu-
mou à minha presença...
— Pois trate de voltar quanto antes.
Kakuta desapareceu imediatamente.
Alguns robôs tentaram atingir a Stardust-III.
O insucesso total, causado pelo campo ener-
gético superpotente da nave, logo os levou a
mudar de tática. Reuniram-se em grupos de três
137
e procuraram se manter sob o abrigo dos edifí-
cios.
Bell praguejou e chamou-os de bandidos.
— Deixe-se de nervosismo, Bell. Já alcança-
mos um êxito. Os robôs já não podem se dedi-
car exclusivamente ao ataque. Têm de cuidar
também de sua defesa.
Às 11:18 h o êxito definitivo dos homens
começou a se esboçar. As divisões da F.D.T.,
em sua retirada, haviam atraído boa parte dos
efetivos inimigos para fora da cidade, onde a
Stardust-III em poucos segundos volatilizou per-
to de cento e cinqüenta máquinas com um pe-
sado canhão desintegrador. Os soldados de
Mercant puderam contemplar novamente a
possibilidade de um avanço. Mais tarde reuni-
ram-se aos blindados da Terceira Potência, no
centro de Manhattan, e avançaram por cima do
East River, em direção ao Brooklyn.
Várias emissoras transmitiram proclamações
do Imperador de Nova Iorque. Tratava-se de or-
dens de resistir, do tipo das que costumam ser
expedidas por ditadores que vêem seu sistema
desmoronar.
Os homens que se encontravam nas salas de
comando da Stardust-III puderam dar-se nova-
mente ao luxo de um sorriso.
— Não venham me dizer que o Imperador
138
não conhece as fraquezas humanas — disse
Bell em tom sarcástico. — As ordens que está
transmitindo constituem um indício patente de
loucura.
— Não é bem isso. As contradições resultam
do fato de que pelo menos duas dezenas de ro-
bôs-secretários acreditam que são o Imperador.
Deve ter havido um curto-circuito no seu siste-
ma de comunicações. Para mim isso constitui
prova de que o poder dos robôs chegou ao fim.
É bem verdade que há muito trabalho pela fren-
te, até que a última máquina de combate seja
destruída. Temos um girino a bordo. Coronel
Freyt, o senhor ficará por aqui na Good Hope-
XVIII até que o perigo esteja removido. Entre
em contato com o capitão Sirola e avise Mer-
cant na Groenlândia.
— Perfeitamente, chefe!
— Obrigado. Prepare-se para a saída.
Às doze horas e dez minutos a Stardust-III
deixará a Terra. Ordem dirigida ao oficial de
mutantes Kakuta. Regresse imediatamente! Da-
qui em diante, Ivã terá de se arranjar sem você.

***

Bell reclinou-se na poltrona; respirava pesa-


damente.
139
— Estou acostumado à velocidade com que
você costuma agir, Rhodan. Mas agora você
está atropelando seus atos. Você se esqueceu
de alguns mutantes que se encontram na Euro-
pa, na África e na Ásia.
— Ainda há outros na América do Sul e na
Austrália. Mais tarde iremos buscá-los. No mo-
mento o que mais importa é irmos para junto
do cérebro positrônico instalado em Vênus. Se
não houver nenhum imprevisto.
— Você desconfia de alguma coisa?
— Estou pensando na mensagem que Nys-
sen nos mandou do sistema de Beta-Albíreo.
— Está aludindo à transmissão direcional
dos saltadores? Isso não me preocupa. O fato
de que esses caras mantiveram contato perma-
nente com a Terra não constitui nenhuma novi-
dade. Sabemos perfeitamente que os robôs não
empregaram apenas sua capacidade militar
contra nós; também funcionavam como espi-
ões. A atividade dos robôs de trabalho constitui
testemunho evidente disso. Nossa intervenção
apenas desencadeou o conflito aberto.
— Está certo — respondeu Rhodan. —
Acontece que você se esquece do resultado do
nosso controle de comunicações pelo rádio.
Não houve qualquer contato entre os saltadores
e os nossos robôs. Ao menos não houve ne-
140
nhum contato direto.
— O que você quer dizer com isso? Um es-
pião que não pode transmitir os resultados de
suas investigações não vale coisa alguma.
— Pois é justamente isso. Acho que deve
existir uma estação retransmissora.
Talvez em Vênus.
— Isso não passa de uma suposição.
— Naturalmente. Vamos verificar o que há
de verdade. Não se esqueça da informação de
Nyssen sobre a transmissão direcional. Ainda
acontece que, segundo dizem, o comandante
dos saltadores, pertencente à corporação mer-
cantil, desapareceu do sistema de Beta-Albíreo.
Ao que tudo indica, seguiu em direção ao Sol.
A Stardust-III pusera-se a caminho de Vênus.
Rhodan transmitiu, através de um código secre-
to, um aviso preliminar dirigido ao cérebro po-
sitrônico. Dentro de um tempo muito breve,
compareceria para procurar os dados relativos
ao planeta Peregrino. Se era verdade que Orl-
gans se encontrava a caminho da Terra, o tem-
po urgia ainda mais.
Toda a tripulação das salas de telegrafia fora
instruída a concentrar suas atenções sobre qual-
quer mensagem de hipercomunicação. Mal ha-
viam vencido o décuplo da distância da Lua
quando o primeiro resultado foi anunciado.
141
— Impulsos de hipercomunicação vindos das
profundezas da Via Láctea!
— Não conseguiu estabelecer a localização
goniométrica? — perguntou ao jovem oficial.
— Um segundo. Durou apenas um instante.
Deve se tratar de impulsos de localização extre-
mamente concentrados no tempo.
— Para que serve o equipamento eletrôni-
co?
— Perfeitamente, chefe! Já temos o resulta-
do. Vem quase exatamente da direção de Beta-
Albíreo.
— Pois então! Deve ser a emissora a que
aludiu Nyssen. Ou será que se trata de uma
mensagem expedida por um dos nossos cruza-
dores?
— Não senhor. Nenhuma das nossas chaves
de codificação adapta-se à mesma.
Não conseguimos interpretar a mensagem.
— Por enquanto — disse Rhodan. — Por
enquanto só estamos interessados em saber
onde se encontra a estação receptora. Coloque
em funcionamento todo o equipamento gonio-
métrico, tenente. Tenho certeza de que a esta-
ção retransmissora hipotética de Vênus não tar-
dará em trair sua presença.
— Perfeitamente.
— E agora vamos dar um passeio pela nave
142
— disse Rhodan, dirigindo-se a Reginald Bell.

***

O passeio se transformou numa verdadeira


correria. Rhodan estava com pressa, não ape-
nas porque queria reassumir quanto antes o co-
mando da Stardust-III, mas também porque ha-
via uma centena de problemas que o martiriza-
vam ao mesmo tempo.
Pegaram o elevador e subiram ao pavimento
imediatamente superior. Bell viu-se no interior
do laboratório particular de Perry Rhodan. O
amigo apontou para um robô de combate bas-
tante danificado.
— Está reconhecendo esse sujeito, Bell?
— É o robô de Nova Iorque? — conjeturou
Bell.
— Deixamos algumas centenas deles nesse
estado. É o sujeito que pus fora de combate no
corredor do edifício da G.C.C. Está em condi-
ções melhores do que poderia parecer à primei-
ra vista. Os equipamentos mais importantes de
seu corpo não foram avariados. Como vê, já
preparei a experiência.
Bell confirmou com um aceno de cabeça.
Um emaranhado de fios ligava o corpo do
robô paralisado com uma série de instrumentos.
143
Rhodan ainda não tivera tempo para realizar as
experiências planejadas.
— Ainda bem que você está aqui. Com isso
economizo uma porção de explicações.
— Você acha que o sujeito lhe revelará mui-
ta coisa?
— Faço votos de que a programação intro-
duzida nele pelos agentes dos mercadores ainda
não tenha sido apagada. De qualquer maneira,
lhe restituí a consciência da Terceira Potência.
É um ser muito inteligente com um conflito in-
terior.
Rhodan interrompeu sua exposição e esta-
beleceu contato pelo videofone com a sala de
telegrafia.
— Alô, tenente Evans. Ponha a mensagem
misteriosa dos mercadores no meu transmissor.
— Pois não.
A transmissão foi apenas uma questão de
segundos. Rhodan gravou a mensagem concen-
trada no tempo sobre um fio e reproduziu-a em
intervalos variáveis. O setor intelectual do robô
foi reativado por meio de um simples movimen-
to de chave.
— Olá, Robby. Como está a recepção?
— Ótima. Uma recepção é o suficiente.
— Muito bem. De onde vem a mensagem?
— De Orlgans, comandante dos saltadores.
144
— Obrigado. O que diz?
— Orlgans para a estação Sol. No momento
não podemos fornecer apoio. Todas as forças
dos mercadores estão engajadas no sistema de
Beta-Albíreo, em virtude de fortes contra-ata-
ques desencadeados por cruzadores e destróie-
res inimigos. A ordem SZ-7 continua em vigor.
— Um momento. O que diz a ordem SZ-7?
— É uma ordem de resistência. Exige um
ataque geral e imediato contra a população da
Terra, mediante a utilização de todos os recur-
sos militares.
— Obrigado. Prossiga com o aviso.
— Chegou ao fim.
— Muito bem. Como é que só agora você
conseguiu decifrar a mensagem? Pelo que sei
existe uma estação retransmissora no sistema
solar, que costumava fornecer-lhes as notícias.
— Nosso receptor é muito fraco. No caso o
equipamento de rádio da Stardust-III desempe-
nhou as funções de estação retransmissora.
— Hum. A explicação não deixa de ser plau-
sível. Para onde vocês irradiam suas mensagens
destinadas a Orlgans?
— Na direção de Aldebaran-Touro...
Bell interrompeu o robô com um ataque de
tosse forçado.
— Veja só. Você suspeitava de Vênus, Rho-
145
dan. Parece que foi um engano.
Rhodan deu de ombros.
— Foi uma suposição intuitiva. No momento
o planeta Saturno se encontra na posição do
Touro. Robby, será que Saturno está no jogo?
— Não posso dizer. Não disponho de infor-
mações a este respeito.
— Mentiroso! — trovejou a voz de Reginald
Bell. Mas Rhodan assumiu a defesa do robô.
— Robby não tem nenhum motivo para
mentir. Chegaremos mais longe se acreditar-
mos nele. Afinal, já conseguimos alguma coisa.
O sistema de Saturno não é muito grande; de-
verá haver um meio de resolver o problema.
Teremos que realizar quanto antes uma mudan-
ça de rota.
— Pelo amor de Deus! — gemeu Bell. —
Até já estou começando a ficar nervoso. Gosta-
ria de saber o que vai pensar o cérebro P insta-
lado em Vênus quando souber que voltamos à
Ponte.
Rhodan pôs a mão na chave que desativaria
o robô, mas Bell o reteve num gesto rápido.
— Um momento, Rhodan. Ainda dispomos
de dez segundos. Preciso fazer uma pergunta
muito importante a esse menino. Trata-se de
uma questão que ninguém conseguiu solucio-
nar.
146
Logo depois, dirigiu-se ao robô:
— Ouça o que vou dizer. Você voltou a sen-
tir-se como um servo da Terceira Potência, não
é, Robby?
— Sim senhor.
— Deixe de cerimônias — insistiu Rhodan.
— Está bem. Você está lembrado da revolta de
robôs em Terrânia.
— Não participei da mesma.
— Mas vocês tiveram meios de se comuni-
car entre si.
— Sim senhor.
— Pois bem. A revolta foi controlada antes
do tempo. Antes que pudessem desferir o gol-
pe, seus companheiros de Terrânia foram pos-
tos fora de ação. Inclusive os robôs de combate.
Apesar disso puseram-se em marcha ao ama-
nhecer e espalharam muita desgraça. Qual é a
explicação?
— Muito simples. A polícia humana teve
que lidar com os robôs um por um. E cometeu
o erro de não vigiar as máquinas desativadas.
Alguns robôs ainda livres dirigiram-se aos seus
camaradas enquanto a ação policial estava em
andamento e voltaram a ativá-los. Foi por um
estratagema de guerra que todos os robôs de
combate se deixaram depositar no grande pavi-
lhão.
147
— Desligue esse sujeito, Rhodan! — excla-
mou Bell, furioso. — Se escuto isso por mais al-
gum tempo, acabarei tendo complexos de infe-
rioridade.

***

O treinamento hipnótico e a prática galácti-


ca conferiram-lhes grande presença de espírito.
Ao regressarem à sala de comando, já haviam
concluído o processamento psíquico dos conhe-
cimentos recém-adquiridos. Rhodan voltou a as-
sumir o comando.
— Vamos alterar a rota.
Seguiram-se os detalhes e as confirmações
expedidas pelos diversos postos.
Saturno?! Com grande espanto os co-pilo-
tos, engenheiros de máquinas, navegadores, as-
sistentes e ordenanças tomaram conhecimento
do novo objetivo.
Evans anunciou o resultado da medição go-
niométrica.
— A resposta dirigida à base dos saltadores
instalada no sistema de Beta-Albíreo é irradiada
a partir do sistema de Saturno.
— Obrigado, Evans. Já fixamos a rota com
esse sistema. Tente obter uma indicação mais
precisa do destino.
148
O pessoal do rádio provou que não era total-
mente inútil.
— Apuramos a posição exata da emissora
do inimigo, chefe. Fica na lua de Saturno deno-
minada Titã, a sete graus de longitude oeste e
oitenta e quatro graus de latitude norte, ou seja,
nas proximidades do pólo norte.
— Obrigado, tenente. Foi um serviço bem
feito.
— Fixação precisa da rota. Correções...
A Stardust-III voltou a desenvolver a veloci-
dade normal, equivalente à da luz, cruzou a
órbita de Marte, atravessou as extremidades do
anel de planetóides e mergulhou no negrume
do espaço. Júpiter encontrava-se em oposição.
Saturno com suas nove luas era o objetivo mais
próximo que se encontrava a seu alcance.
Os aparelhos de escuta da Stardust-III esta-
vam regulados ininterruptamente para a esta-
ção retransmissora do inimigo. Mais três men-
sagens foram captadas. Tratava-se de pedidos
de socorro dos exércitos terrestres de robôs. Na
quarta e última transmissão a estação de Titã
anunciou que ela mesma se encontrava em pe-
rigo. Os robôs depositados no laboratório de
Rhodan realizaram a decodificação.
— Titã para Orlgans! Titã para Orlgans! O
couraçado Stardust-III aproxima-se, navegando
149
à velocidade da luz. Mantém uma rota que se
dirige exatamente para cá. É impossível que se
trate de uma coincidência. Alguém deve ter re-
velado nossa posição. Solicitamos apoio imedi-
ato.
— Não podemos dispensar a nave Orla XI.
Parta para o contra-ataque. O girino arcônida
dispõe de armamento suficiente para um ataque
de surpresa. Modificação do código. Nova posi-
ção: 74 562 AT 9...
O resto foi incompreensível.
A consulta que Rhodan formulou ao robô
não produziu o menor resultado. Seu cérebro
não fora programado para a chave 74 562 AT
9. A linguagem ininteligível foi introduzida ime-
diatamente no grande cérebro positrônico insta-
lado a bordo da nave. Mas a codificação inimiga
era tão complicada que várias horas ou mesmo
dias poderiam se passar antes que se dispusesse
de um texto compreensível.
Acontece que a decisão teria que vir nos
próximos minutos, pois a Stardust-III, que já ini-
ciara as manobras de frenagem, encontrava-se
a apenas oitenta e cinco milhões de quilômetros
de Titã.
— De qualquer maneira Orlgans cometeu
dois erros — comentou Bell, satisfeito.
— Sabemos que não pode vir pessoalmente,
150
e que dispõe de uma nave auxiliar arcônida de
sessenta metros. Face a isso podemos avaliar
com alguma aproximação a força do inimigo
que nos aguarda em Titã.
— Até podemos avaliá-la com muita exati-
dão — disse Rhodan com uma raiva contida. —
Na mensagem foi mencionada a palavra girino.
Acontece que se trata de um apelido que demos
às naves dessa classe.
— Dali você conclui que se trata de uma
nave da nossa frota?
— É a conclusão que se impõe, meu caro.
Lembre-se de que ainda não localizamos a
Good Hope-I, comandada pelo tenente Dayton.
Todas as buscas foram infrutíferas. Pode-se per-
feitamente conquistar uma nave e tripulá-la com
sua própria gente. Acho que os saltadores não
são tolos. Saberão lidar com a tecnologia ar-
cônida central.
— Isso significa que podemos dar a tripula-
ção comandada por Dayton como perdida...?
Rhodan ficou devendo a resposta. Não esta-
va tão bem informado.
Faltavam quinze milhões de quilômetros
para Titã.
— Bell, sugiro que você nos dê cobertura
com três destróieres. Com o poder de fogo de
nossa nave provavelmente não precisamos dis-
151
so, mas nunca se sabe como se desenvolverá a
situação. De qualquer maneira faço questão de
que alguém vá dar uma olhada em Titã. Estou
interessado na estação dos saltadores.
— Não pretende pousar?
— Talvez nem tenhamos oportunidade para
isso. Prepare-se. Leve dois oficiais da guarnição
de reserva e os tripulantes de que precisa. Falta-
vam dez milhões de quilômetros para chegar a
Titã.
Três destróieres comandados por Bell saí-
ram da nave-mãe e dispararam para o espaço
em ligeiros impulsos de aceleração. Tomaram
uma rota tangencial, a fim de descrever alguns
círculos em torno da maior das luas de Saturno.
No mesmo instante o girino decolou. Conta-
vam com sua presença e por isso estavam pre-
parados. Bell esteve a ponto de se precipitar so-
bre ele. Mas Rhodan ordenou que não modifi-
casse sua rota.
— O sujeito foi destinado a nós. Vocês só
empreenderão qualquer manobra se forem ata-
cados.
— Está bem — disse Bell, contrariado, e
obedeceu.
O girino se aproximou silenciosamente. O
rugido interno de uma nave espacial acelerada
ao máximo perde-se no vácuo do universo.
152
— Isso mesmo! É a Good Hope-I — consta-
tou Crest, o arcônida. — E lá vêm os disparos.
Três torpedos espaciais se aproximaram ver-
tiginosamente. O campo energético da Star-
dust-III se dobrou. Foi um devorar mútuo de
energias termodinâmicas. Três bombas investi-
ram contra o campo energético. Bastava que
um dos projéteis conseguisse vencer o obstácu-
lo para que uma deflagração atômica irreversí-
vel fosse desencadeada em certos elementos do
objeto atingido. O artilheiro podia regular o ar-
tefato à vontade, no que dizia respeito aos ele-
mentos até o número oitenta. De qualquer ma-
neira, todos os elementos pesados seriam atin-
gidos pela conflagração.
A sensação provocada pelo fato de se en-
contrar sob o fogo desse instrumento de des-
truição maciça não era nada agradável.
Os homens que ali se encontravam tinham
que depositar muita confiança na potência do
campo energético.
Os instrumentos indicaram a potência do
ataque energético.
— Sessenta e cinco por cento — murmurou
Rhodan.
Poucos segundos depois as agulhas voltaram
à posição primitiva. Haviam resistido ao primei-
ro ataque.
153
O segundo foi desfechado com cinco bom-
bas.
— Setenta e oito por cento.
— O que está esperando? — perguntou o
Dr. Eric Manoli, que se encontrava perto de
Rhodan.
Este se limitou a lançar-lhe um ligeiro olhar;
não disse nada. Afinal, o que poderia dizer?
Que preferia não atirar porque se tratava do gi-
rino Good Hope-I? Essa fala pareceria muito
sentimental. Era possível que o motivo fosse
outro.
Talvez o tenente Dayton.
Bell anunciou sua posição além de Titã.
— Observamos nitidamente a estação.
Trata-se de uma montagem de aparência mo-
desta. Ao que parece o resto encontra-se sob a
superfície da lua. Como estão vocês?
— Bem, obrigado. Repelimos dois ataques.
Não se preocupem conosco. Pousem.
O fim da ligeira palestra coincidiu com o ter-
ceiro ataque do girino. Seis bombas arcônidas!
— Oitenta e três por cento!
Os geradores uivaram em freqüências eleva-
das. Deram o último de si para recarregar o
campo energético numa fração de segundo.
— Oitenta e sete por cento! Noventa e dois
por cento!
154
As forças que protegiam a Stardust-III da
destruição pareciam reduzidas a uma fina mem-
brana. Quando diminuiria a força das seis bom-
bas arcônidas?
Finalmente: oitenta e nove por cento, oiten-
ta e oito, oitenta e sete...
As agulhas dos indicadores de carga tende-
ram para baixo. Mas logo a Stardust-III foi atin-
gida por uma sacudidela, que só depois de um
momento de choque puderam ser absorvidas
pelos compensadores de gravitação. As agulhas
saltaram para noventa e oito por cento.
Nesse momento da eternidade, os gritos se
misturaram. Os instrumentos de alarma anunci-
aram a aproximação de matéria pela popa.
Tudo foi tão rápido que num momento de ten-
são nervosa a mente humana não poderia esbo-
çar qualquer reação.
A única coisa que poderia salvá-los seria o
autômato positrônico.
Cada um dos três destróieres vindos pelas
costas havia disparado uma bomba arcônida.
Logo se seguiram os impactos e os esforços de-
sesperados do dispositivo automático de defesa.
— Setenta e dois por cento! Trinta e seis
por cento...
As agulhas caíram para trás. Mas a posição
da nave não conferia mais. Que abacaxi!
155
Saturno estava a vinte milhões de quilôme-
tros.
— Não é possível! — disse Manoli, seguran-
do o ombro, com o rosto contorcido de dor.
— Dispomos de um controle múltiplo. Se
você tivesse razão, todos eles teriam falhado.
— Mas...
— Não há nenhum mas, Eric. Foi apenas
um salto espacial involuntário. As energias libe-
radas durante o duelo tiveram, por uma simples
coincidência, uma disposição tal que causaram
uma verdadeira curvatura do espaço. Por pouco
conseguem nos atirar para fora do conjunto de
quatro dimensões. Sugiro que antes de mais
nada cuidemos do girino. Está ficando muito
perigoso para que possamos ter qualquer con-
templação.

***

— Que é isso, Flynn? — perguntou Bell em


tom de desespero ao seu artilheiro. — Será que
nossas telas goniométricas estão desreguladas?
O tenente Flynn sabia que o sentido da fala
de Bell era muito mais sério do que suas pala-
vras poderiam dar a entender.
— Se esses bandidos tivessem destruído a
Stardust-III, deveria ter sobrado ao menos uma
156
nuvem energética.
— A conclusão não é nada má, desde que
nos mantenhamos no seu campo de experiên-
cia. Acontece que estamos lidando com um ini-
migo cujo poder real talvez nos seja desconheci-
do. É bem possível que tenham montado suas
armas num girino apresado.
Enquanto falava, Bell já ligara o receptor.
Utilizou a freqüência secreta de emergência.
— Bell para Rhodan! Bell para Rhodan!
Responda, Rhodan!
Houve uma ligeira pausa. Depois se ouviu:
— Rhodan para Bell! O que houve?
— Graças a Deus, Rhodan! Onde é que vo-
cês se meteram? Perdemos a posição.
— Sem querer, realizamos um pequeno sal-
to espacial. Foram quinze milhões de quilôme-
tros. Os caras lançaram mais três destróieres
com que ninguém contava. Não se preocupem.
Cuidaremos da Good Hope-I. Espero receber
em breve informações precisas sobre a situação
em Titã. Fim.
Os homens suspiraram aliviados e se reclina-
ram nos assentos. A formação de destróieres gi-
rou para baixo e abandonou definitivamente a
órbita do satélite.
Rhodan foi esquecido. Concentraram todas
as atenções sobre o pouso. Um mundo de gelo
157
como Titã, cuja atmosfera cristalina de metano
e amoníaco misturados com vários gases no-
bres é capaz de uma série de reações químicas,
requer muito cuidado de qualquer astronauta
que nela queira penetrar.
Obedecendo ao comando de Bell, os pilotos
ativaram o chamado campo de vácuo, que cria-
va uma zona neutra de mais de quinhentos me-
tros em torno de cada aparelho.
Sem o menor incidente, pousaram ao lado
da torre de rádio. Não houve o menor movi-
mento defensivo.
— Aguardem! — ordenou Bell. — Deixem a
temperatura baixar. Liguem a refrigeração arti-
ficial. Avisem assim que o envoltório externo
esteja em condições normais.
A operação durou dois minutos, que não fo-
ram desperdiçados. Os homens colocaram tra-
jes espaciais. Depois disso Bell ordenou o de-
sembarque.
— Dois homens de cada aparelho virão co-
migo. Os co-pilotos ficarão para vigiar as
máquinas.
A torre era uma construção metálica em for-
ma de grade, levantada numa planície lisa que
não poderia fornecer abrigo a ninguém. Apesar
disso teriam de agir com cautela. Os seis ho-
mens se aproximaram lentamente do objetivo,
158
com os fuzis de desintegração e os radiadores
de impulsos em posição de atirar. Reginald Bell
caminhava à frente. Seu traje espacial era um
equipamento de batalha de origem arcônida.
Mantinha o campo protetor ativado. Os outros
cinco andaram em sua sombra, para que um
ataque de surpresa com armas ligeiras pudesse
ser rechaçado.
Mas não aconteceu nada. Atingiram a arma-
ção metálica sem serem molestados. Embaixo
dela havia uma porta-alçapão que conduzia
para baixo do solo.
— Tenham cuidado! — voltou a advertir
Bell, quando Flynn se pôs a mexer no fecho. —
Está bem, tenente. Continue a girar isso. Mas
não enfie logo a cabeça pela abertura.
Um dispositivo hidráulico fez o alçapão desli-
zar para o lado. Bell soltou uma bolsa presa ao
lado externo de seu traje e colocou-a cautelosa-
mente acima da abertura. Um segundo depois
metade do objeto havia sido consumida pelo ca-
lor.
— Ah, então puseram sentinelas!
A constatação foi pronunciada num tom es-
tranho. Até parecia que Bell se sentia satisfeito
por ter tido razão.
— Podemos conversar à vontade. Ninguém
pode ouvir a conversa travada pelo telecomuni-
159
cador de nossos trajes espaciais, mesmo que se
encontre a apenas três metros. Aguardem mais
um instante. Vou ligar o defletor de ondas lumi-
nosas para dar uma olhada.
Para os outros o momento parecia bastante
crítico. Mas Bell confiava na eficiência do apa-
relho.
Afinal, estava invisível. O olhar duro do robô
de combate constituía a melhor prova disso.
— Alô, minha gente, que surpresa! Seis me-
tros abaixo de mim está um robô que os merca-
dores de Orlgans devem ter roubado de alguma
filial da G.C.C. na Terra. Até parece que seus
olhos estão abrindo furos no ar; ao que tudo in-
dica, aguarda outro ataque. Vamos ver se te-
mos mais alguns desses sujeitos de lata por aí.
Bell apontou o radiador de impulsos térmi-
cos para baixo e apertou o gatilho. O robô do-
brou as pernas e volatilizou-se pela metade.
— Vamos esperar!
Passaram-se dez segundos, meio minuto.
Nada se movia.
— Ao que parece o ambiente está limpo.
Mas prefiro descer sozinho para dar uma olha-
da.
Por alguns segundos, Bell ficou dando tratos
à bola para descobrir como um simples mortal
poderia descer por essa galeria vertical de seis
160
metros. Devia ser uma forma de deslocamento
bastante desconfortável, mesmo que se conside-
rasse que a gravitação não era superior a um
terço da terrestre.
Perto da galeria havia alguns botões. Devia
experimentá-los. Deixou cair algumas pedras.
Ao comprimir um dos botões, as mesmas não
caíam mais. Flutuavam.
— Um elevador antigravitacional! Tudo em
ordem, minha gente! Avisarei assim que pude-
rem seguir.
Bell flutuou para baixo.
Ao atingir o primeiro piso, viu-se numa sala
pequena. Não se via nada além dos destroços
do robô. Nas paredes viam-se três escotilhas.
Eram comportas de ar atrás das quais devia se
encontrar uma atmosfera de nitrogênio e oxigê-
nio. Um exame mais detalhado confirmou o
fato.
Bell escolheu a passagem do meio.
Mandou que os cinco homens o seguissem e
informou-os ligeiramente sobre sua descoberta.
— Tenente Flynn, venha comigo. Os outros
esperarão aqui.
O corredor descia obliquamente. Dali a cem
metros o mesmo se ampliou, sendo novamente
fechado por três portas. A da direita levava a
um grande depósito, ocupado principalmente
161
por cinco robôs terrestres desativados.
— Esses sujeitos de lata ficarão admirados
quando os despertarmos para a vida...
Como o tempo fosse escasso, não puderam
examinar os detalhes, por mais curioso que Bell
ficasse com os numerosos instrumentos. Um
belo dia Freyt teria de cuidar daquilo.
A segunda porta dava para um apartamento
residencial muito confortável. Lembrava as resi-
dências terrestres; apenas os móveis de uso dos
ocupantes pareciam dimensionados além das
normas usuais.
— Isso bem pode ter sido uma residência de
gigantes — constatou Bell em tom indiferente e
dirigiu-se à outra porta.
Penetraram num recinto escuro, que logo os
fez farejar um perigo. Mas depois de terem
dado três passos, a iluminação automática der-
ramou uma luz direta sobre eles.
Era um pavilhão comprido com boxes aber-
tos.
Havia uma espécie de enfermaria, sala de
repouso, laboratório... e seres humanos.
Bell e Flynn estacaram por um momento.
Não eram robôs nem saltadores, mas seres
humanos.
O ar era respirável.
— Retirar o capacete — ordenou Bell e
162
abriu o visor.
Flynn acompanhou-o. No mesmo instante as
súplicas dos companheiros debilitados atingiram
seus ouvidos.
— Que patifes! — disse Bell por entre os
dentes. — Que patifes de saltadores.
O primeiro homem que libertaram das amar-
ras que o prendiam ao leito foi o Dr. Berril,
médico de bordo da Good Hope-I. Seguiram-se
alguns mortos. O sétimo dos homens estava
vivo, se é que se quisesse chamar de vida aquilo
que fez com que o corpo maltratado se empi-
nasse.
Abatido, o Dr. Berril sentou-se na beira da
cama.
— Fale, doutor! Mesmo que seja difícil. O
senhor tem que fazê-lo por si e pelos compa-
nheiros. Além disso, é o único médico que te-
mos por aqui.
— Eles nos prenderam e trancafiaram. To-
dos os dias realizavam interrogatórios psíquicos.
Deixamos de ser homens. Nossos cérebros...
— As reações de seu cérebro são normais,
doutor. Pense nos companheiros que tiveram
um destino pior que o seu. Tome este compri-
mido energético. E use estes tubinhos para ali-
mentar os outros. Venha, eu o apoiarei.
O comandante, tenente Dayton, era um dos
163
mortos. A maior parte dos tripulantes havia
morrido. Só vinte e dois homens podiam ser
considerados clinicamente vivos. E Bell só dis-
punha de três destróieres completamente lota-
dos.
O problema fez porejar o suor em sua testa.
Tinha que agir. E tinha que agir imediatamente.
Ao lembrar-se de Orlgans, sentiu seu espírito
ferver. Onde estaria Orlgans? Teria abandona-
do o grupo de seus companheiros de clã estaci-
onado em Beta-Albíreo? Não poderia surgir a
qualquer momento no sistema do Sol? O desti-
no dos espiões robotizados que deixara na Ter-
ra constituiria motivo mais que suficiente para
isso.
As ordens de Bell foram terminantes, quase
grosseiras.
Mandou que os quatro homens que aguarda-
vam diante das comportas descessem.
— Doutor, o senhor e Flynn os instruirão.
Todos nós dispomos de um estoque de medica-
mentos que nos permite prestar os primeiros
socorros. Enquanto isso cuidarei de outro as-
sunto.
Bell desapareceu sem dar qualquer explica-
ção. Seu destino era o pavilhão da frente, onde
estavam depositados cinco robôs. Conhecia os
companheiros de lata de dentro e de fora. Esse
164
conhecimento pertencia ao saber adquirido
através do treinamento hipnótico.
— Número um — murmurou em tom sar-
cástico — levante-se. Você tem visita.
Ativou-o para um décimo de sua potência,
examinou a programação e constatou justamen-
te aquilo que esperara.
— Seu desertor de uma figa, eu lhe darei
uma lição... Mas como?
Sua mente se iluminou com uma rapidez ex-
traordinária. O traje arcônida.
O gerador destinado ao campo defensivo de-
senvolvia uma energia eletromagnética que bas-
taria para apagar a programação indesejada
que fora introduzida no robô. As experiências
realizadas por Rhodan já lhe haviam ensinado
em que setor do robô fora introduzida a má
consciência.
Número um, a primeira tentativa.
Deu certo.
O resto não passou de um trabalho de roti-
na. Dali a vinte minutos, os cinco robôs de
combate estavam reativados e programados de
acordo com os interesses da Terceira Potência.
Bell emitiu algumas ordens e explicou a situ-
ação. Obedientes, os cinco robôs se espalharam
pela estação. O número um foi à sala de instru-
mentos, o número dois à enfermaria, o número
165
três marchou para a residência dos mercadores,
o número quatro assumiu seu posto diante das
comportas de ar e o último ficou numa posição
avançada na superfície de Titã.
Um pouco mais satisfeito, Bell voltou para
junto dos companheiros.
— Por enquanto nossa posição está garanti-
da. Os cinco robôs continuam leais a nós. De-
colarei só no meu destróier e farei com que o
coronel Freyt mande socorro quanto antes. Não
deverá demorar mais de um dia.
Bell e Flynn se despediram. Dali a poucos
minutos o destróier disparou para o céu de
Titã.

***

À decisão de Rhodan seguiram-se as ordens.


Os saltadores que tripulavam a Good Hope-I
deviam ser de opinião que haviam destruído a
Stardust-III. Tomaram uma rota estranha.
— Olhe só! — disse Eric Manoli, espantado.
— Dirigem-se à Terra. Será que pensam que
ainda podem salvar alguma coisa? Acredito que
Freyt já conseguiu liquidar a resistência dos ro-
bôs.
— As últimas informações são satisfatórias
— disse Rhodan. — Mas a Humanidade tem
166
muitos mortos e feridos a lamentar em todos os
continentes. Quando me encontrar com o pri-
meiro saltador, registrarei essa dívida. Um mo-
mento, Eric! Veja só a rota! Parece que não é a
Terra.
Manoli se sobressaltou. Depois sacudiu a ca-
beça e disse:
— Há poucas horas você me falou em sua
intuição. Ao que parece sua idéia ligada a Vê-
nus não era tão absurda...
Na verdade, o girino tomara decididamente
a rota de Vênus.
— O fato é que a espionagem realizada pe-
los robôs revelou a Orlgans algumas coisinhas
que devíamos ter guardado para nós — disse
Rhodan. — O ponto nevrálgico da Terceira Po-
tência não é o deserto de Gobi, mas o grande
cérebro positrônico instalado em Vênus. Está
na hora de agir.
— Têm uma vantagem de mais de vinte mi-
lhões de quilômetros — ponderou Manoli.
— E a velocidade da luz sempre é a veloci-
dade da luz. Tanto faz que seja um pequeno gi-
rino ou a Stardust-III que desenvolve a mesma.
— Faremos uma coisa proibida — disse
Rhodan com um sorriso matreiro.
A coisa proibida foi uma ligeira transição
que os levou através da quinta dimensão. No in-
167
terior de qualquer sistema planetário uma ma-
nobra desse tipo representava um perigo ine-
quívoco, pois poderia afetar a estabilidade do
conjunto. Mas não era a primeira vez que Rho-
dan fazia uma coisa dessas. Já adquirira prática.
As medições realizadas pelos trinta e cinco
observadores e a interpretação dos dados pelo
cérebro positrônico instalado a bordo consumiu
dez minutos. A hora havia chegado.
A Stardust-III realizou o salto espacial. Desa-
pareceu pura e simplesmente do setor do espa-
ço em que se encontrava e, sem cruzar a órbita
de Júpiter, Marte e Terra da perspectiva proje-
tada na quarta dimensão, surgiu de uma hora
para outra nas proximidades de Vênus. Abri-
gou-se atrás do planeta e aguardou o inimigo
que se aproximava.
Aguardou durante oitenta e quatro minutos.
A surpresa total foi o grande aliado de Rho-
dan. Os instrumentos de alarma mal podiam ter
soado na Good Hope-I quando a Stardust-III se
transformou num monstro imenso. Doze bom-
bas carregadas por torpedos que se deslocavam
quase à velocidade da luz precipitaram-se sobre
o alvo. Todos os canhões pesados de desinte-
gração dispararam ao mesmo tempo. A Good
Hope-I se transformou numa nuvem de energia.
Os homens que se encontravam a bordo da
168
Stardust-III ainda não haviam terminado de dar
seu suspiro de alívio quando os instrumentos de
alarma anunciaram nova aproximação de maté-
ria. Três destróieres se aproximaram na esteira
da Good Hope-I. Eram as mesmas naves que
por pouco não tinham dado cabo do couraça-
do.
— Pontaria. Ponte de comando para direção
de tiro. Reconheceram o alvo, ou precisam de
dados goniométricos?
— Obrigado. Temos os três destróieres gru-
dados na mira. O senhor poderia dar ordem de
fogo, chefe?
— Fogo!
Mais uma vez contemplaram o fogo de artifí-
cio que se exibiu em pleno céu. Rhodan sabia
que não estava indo longe demais. Em situa-
ções como esta sempre soubera harmonizar
seus atos com a consciência. Não que sua cons-
ciência não prestasse, mas conhecia perfeita-
mente os limites e os deveres pelos quais tinha
que pautar seus atos.
Não estava usando uma desculpa barata ao
alegar que agia em prol do bem-estar de toda a
Humanidade.
Quem se aproximasse pacificamente, pode-
ria contar com um aperto de mão de Rhodan.
Mas quem trouxesse a morte para a Humanida-
169
de teria que contar com a própria destruição.

***

Dois destróieres foram atingidos. O terceiro


escapou na sombra de Vênus. Não voltou a
aparecer. Devia ter caído ou pousado.
Um destróier?
Rhodan se lembrou do planeta Peregrino.
Teria que ir ao Peregrino. Não poderia perder
mais tempo por causa de um destróier que se
encontrava a serviço do inimigo.
Mandou que estabelecessem uma ligação en-
tre sua sala de comando e a cidade de Terrânia.
Em palavras ligeiras, relatou ao coronel Freyt o
que havia acontecido. Subitamente havia um
terceiro interlocutor na mesma faixa de ondas.
— Olá, Bell. Por que está entrando na nossa
conversa?
— Tenho tanta pressa quanto você. Coro-
nel, mande imediatamente um girino para Titã.
Também Bell ofereceu um relato lacônico de
suas descobertas. Freyt confirmou a recepção e,
ao concluir, informou seus interlocutores de que
a guerra de robôs na Terra podia ser considera-
da finda.
— Nesse caso posso receber meus mutantes
de volta — constatou Rhodan. — Irei em dire-
170
ção ao cérebro positrônico de Vênus. Coronel,
mande a Good Hope-II para Titã e liquide o as-
sunto com Bell. Voltarei a chamar assim que ti-
ver terminado em Vênus.
Os instrumentos de Rhodan instalados em
Vênus terminaram o trabalho em menos de
dois dias terrestres. O cérebro positrônico já ha-
via preparado os dados sobre a posição do pla-
neta Peregrino. Mas o registro desses dados,
que eram extremamente complicados, durou
várias horas. Na verdade, tratava-se apenas de
valores aproximados, dotados do maior grau
possível de probabilidade. Por fim, as coordena-
das foram introduzidas no cérebro positrônico
da Stardust-III através de um código elaborado
pelo próprio Rhodan.
Antes de decolar, Rhodan ainda solicitou um
relatório sobre os acontecimentos que se havi-
am desenrolado nas últimas semanas em Vê-
nus. O cérebro ali estacionado informou-o so-
bre três destróieres que haviam pousado na sel-
va do hemisfério sul.
— Não é apenas o sujeito que nos escapou
que se mantém escondido aqui.
A constatação de Rhodan revelou certa con-
trariedade. A perspectiva mudava constante-
mente; até parecia que seus planos seriam es-
tragados a cada hora.
171
O planeta Vênus não representava uma fo-
lha em branco da história da Humanidade. Há
mais de um ano várias divisões plenamente
equipadas do Bloco Oriental, então em plena
revolta, haviam pousado ali. Depois de uma
série de lutas de resultado variável, travadas
principalmente entre os cidadãos do Bloco Ori-
ental, fortes grupos formaram-se sob o coman-
do do general Tomisenkow, e passaram a em-
preender uma pacífica atividade colonizadora.
Mas também aqui a situação ainda não havia
sido esclarecida. Se Rhodan contasse com a
possibilidade de um contato entre saltadores do
clã de Orlgans que haviam pousado ali e os ho-
mens de Tomisenkow, não poderia afastar a
possibilidade de novas complicações.
— De qualquer maneira, não demoraremos
nem um minuto — decidiu Perry Rhodan e deu
ordens de decolar. O coronel Freyt teria que
cuidar de Vênus. Era o homem que na ausência
de Rhodan teria que exercer o governo da Ter-
ceira Potência. Uma vez fora da densa atmosfe-
ra de Vênus, a Stardust-III deu início a uma in-
tensa troca de mensagens de rádio. Bell respon-
deu imediatamente, informando que o traslado
dos vinte e dois sobreviventes de Titã fora con-
cluído com êxito. Já se encontravam nos hospi-
tais de Terrânia.
172
— ...nossos mutantes também estão a pos-
tos, Rhodan. Não há mais nada que impeça a
decolagem.
— Muito bem. Apressem-se. Daqui a uma
hora no máximo quero recolher a Good Hope-
II a bordo e dar o fora daqui. Ligue-me mais
uma vez com o coronel.
Freyt recebeu instruções detalhadas e se des-
pediu.
— Boa viagem, Rhodan. E um bom regres-
so. Lembranças ao pessoal da frota.
Combinou com Bell um ponto de encontro
entre as órbitas da Terra e de Marte. Dali a
uma hora a Stardust-III recolheu a bordo a
Good Hope-II e deu início à longa viagem com
destino ao planeta Peregrino. Antes de atingir o
ponto de transição, situado além da órbita de
Plutão, Rhodan pediu mais uma ligação direta
com o major Nyssen. Pediu um relato sobre a
situação atual. MacClears, comandante do cru-
zador Terra, anunciou-se pelo hipercomunica-
dor:
— No momento o major Nyssen está reali-
zando um vôo contra os saltadores. A Solar
System está envolvida num combate contra três
inimigos. Até agora tudo deu certo. Mas não sa-
bemos até quando será assim. Os mercadores
receberam reforços. Receamos a intervenção
173
de couraçados ainda mais potentes dos saltado-
res. No momento só nos resta esperar que a
Stardust-III não demore a voltar. — Faremos o
que estiver ao nosso alcance. Mas não sou ne-
nhum profeta e não costumo fazer promessas
vazias. Agüente mais algum tempo. Com um la-
conismo tipicamente militar, MacClears confir-
mou o recebimento da ordem e desligou.
— Preparem-se para o salto interestelar —
soou o comando de Rhodan. Reclinara-se pro-
fundamente na poltrona e fitava a tela de proa,
que mostrava milhares de sóis que se desenha-
vam sobre o fundo negro do espaço cósmico.
Em algum ponto desse labirinto, o planeta da
vida eterna percorria seu caminho. Era o plane-
ta que trazia o nome bastante significativo de
Peregrino. Nele estava o próximo objetivo de
Rhodan. Era ali que existia o ser indefinível, que
não tinha nome. Só esse ser poderia salvar a
Humanidade ameaçada.
— No planeta Peregrino receberemos armas
que nos assegurarão uma superioridade definiti-
va sobre os saltadores — murmurou Rhodan,
falando quase para si.
— Isso soa como uma prece, Rhodan —
prosseguiu Bell no raciocínio de Rhodan.

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Numa ação maciça, as autoridades milita-
res da Terra conseguiram remover a ameaça
representada por seus próprios robôs, cuja
programação foi alterada. Mas a Terra só po-
derá se defender contra todos os clãs dos sal-
tadores se Perry Rhodan puder contar com
uma nova arma.
Essa arma lhe é dada durante seu VÔO
PARA O INFINITO.
VÔO PARA O INFINITO é o título do
próximo volume da série Perry Rhodan.

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ÐØØM SCANS
PROJETO FUTURÂMICA ESPACIAL
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