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DISTÚRBIOS GASTROINTESTINAIS

ABORDAGEM AO PACIENTE GASTROINTESTINAL


Capítulo 1: Avaliação do paciente gastrointestinal
1. Considerações iniciais: Os sintomas e doenças gastrointestinais são bastante
comuns. A anamnese e o exame físico, muitas vezes, são suficientes para avaliar
pacientes com queixas menores; em outros casos, são necessários exames.

2. História: Utilizando perguntas abertas na entrevista do paciente, o médico


identifica a localização e o tipo dos sintomas e qualquer fator de piora ou melhora.
Desta forma, consideraremos os seguintes aspectos: dor abdominal, distensão
abdominal, obstipação, diarreia, dispepsia, disfagia, hematêmese e/ ou melena, icterícia,
náuseas e vômitos e hematoquezia ou hemorragia retal.

3. Dor abdominal aguda:


3.1. Dor abdominal: Dor abdominal é a sensação de mal-estar ou perturbação
na cavidade abdominal.
3.2. Dor visceral: É originada por estímulos que atuam sobre as terminações
nervosas sensitivas de uma víscera abdominal. A dor visceral pode decorrer por tensão
ou estiramento da parede das vísceras ocas ou da cápsula das vísceras parenquimatosas
e pela tração ou estiramento peritoneal.
O abdome é um dos locais mais frequentes das síndromes dolorosas agudas ou
crônicas provenientes de afecções viscerais, decorrentes de dor referida originária em
estruturas adjacentes e/ou decorrentes de lesões sistêmicas. A incidência anual de dor
abdominal crônica é de 15 casos para 1.000 indivíduos.
A verdadeira dor abdominal visceral é mediada por fibras viscerais aferentes que
acompanham os troncos simpáticos. A localização da dor corresponde geralmente ao
nível segmentário do órgão afetado. Entretanto, a dor originada nas estruturas viscerais
profundas não se localiza de forma tão precisa e se distribui em dois ou três segmentos
sensoriais.
A dor está condicionada geralmente pela distensão ou contração muscular
exagerada de uma víscera oca; a inflamação pode diminuir o limiar dos estí8mulos
correspondentes.
A distensão aguda da cápsula dos órgãos sólidos (fígado, baço, rim e ovários) e a
tensão no peritônio mesentérico também produz\em dor, atuando provavelmente sobre
receptores de tração similares aos que existem no músculo.
A isquemia causa dor abdominal por aumentar a concentração de metabólitos
teciduais na região dos nervos sensoriais.
3.2.1. Tipos de dor visceral: As doenças viscerais podem determinar
dores de vários tipos: visceral verdadeira, visceral referida, parietal localizada ou
parietal referida.
a. Dor visceral verdadeira: A dor visceral verdadeira - não
referida - manifesta-se na região da linha média do abdome, sem localização precisa no
epigástrio, região periumbilical ou mesogástrio, habitualmente descrita como cólica e
associa-se a náuseas, vômitos, sudorese ou palidez.
b. Dor visceral referida: A dor visceral referida localiza-se nos
miótomos e dermátomos supridos pelos neurônios que se projetam nos mesmos
segmentos medulares das vísceras afetadas.
c. Dor parietal (somática): A dor parietal localizada ou a dor
parietal não referida são sensações dolorosas geradas através do peritônio parietal por
agentes nocivos e localiza-se na parede abdominal correspondente ao local da lesão. A
dor parietal localizada é transmitida pelos nervos aferentes cérebro-espinhais que
inervam o peritônio e localiza-se diretamente sobre a área inflamada.
d. Dor parietal referida: A dor parietal referida manifesta-se em
ponto distante do local da estimulação nociceptiva.
Dentre as causas mais frequentes de dor abdominal citam-se os processos
inflamatórios de origem infecciosa ou química, as doenças isquêmicas, as doenças
disfuncionais e as neoplasias.
A dor visceral não costuma ser evocada pelas vísceras e órgãos sólidos como
fígado, rins, parênquima pulmonar, entre outras, e não necessariamente associa-se a
lesão visceral; geralmente é difusa e mal localizada, pode ser referida em locais
distantes da víscera acometida e é acompanhada de reflexos autonômicos e motores que
servem como sistema mantenedor e facilitador da transmissão dolorosa.
A dor abdominal neuropática periférica localiza-se na região de distribuição de
uma ou mais raízes torácicas caudais (D8 a D12), caracteriza-se como queimor, choque,
pontada ou formigamento, é associada a hiperalgesia, hiperestesia, hiperpatia e/ou a
outras anormalidades sensitivas e motoras, incluindo flacidez da parede e/ou alterações
neurovegetativas.
3.2.2. Aspectos anatômicos: A cavidade abdominal é clinicamente
dividida em regiões: hipocôndrio direito e esquerdo, epigástrico, umbilical,
hipogástrico, regiões lombar direita e esquerda, inguinal direita e esquerda. Pode
também dividir-se em quadrantes: superior direito, superior esquerdo, inferior direito e
inferior esquerdo.
No quadrante superior direito alojam-se o lobo direito do fígado, a vesícula biliar,
o piloro, parte do duodeno, cabeça do pâncreas, glândula suprarrenal direita, rim direito,
flexura cólica direita (hepática), componente superior do colo ascendente e metade
direita do colo transverso.
No quadrante superior esquerdo alojam-se o lobo esquerdo do fígado, o baço, o
estômago, o jejuno, o íleo proximal, o corpo e a cauda do pâncreas, o rim esquerdo, a
glândula suprarrenal esquerda, a flexura cólica esquerda, a metade esquerda do colo
transverso e o segmento superior do colo descendente.
No quadrante inferior direito localizam-se o ceco, o apêndice vermiforme, a maior
parte do íleo, o segmento inferior do colo ascendente, o ovário, a tuba uterina direita, o
segmento abdominal do ureter, o funículo espermático direito, o útero (quando
aumentado) e a bexiga (quando muito cheia).
No quadrante inferior esquerdo localizam-se o colo sigmoide, o segmento distal
do cólon descendente, o ovário, a trompa uterina esquerda, o segmento abdominal do
ureter, o funículo espermático esquerdo, o útero (quando aumentado) e a bexiga
(quando muito cheia).
3.2.3. Características clínicas da dor visceral:
a. Dor na região epigástrica: A dor na região epigástrica ocorre
por lesões no estômago, vesícula biliar, duodeno, pâncreas, fígado, região distal do
esôfago, coração e pulmões, principalmente por úlcera péptica, úlcera perfurada,
gastrites, espasmo pilórico, carcinoma gástrico, pancreatite crônica ou aguda,
colecistite, litíase biliar, perfuração do esôfago na porção inferior, esofagite química ou
bacteriana, infarto do miocárdio, pericardite, insuficiência cardíaca congestiva ou hérnia
epigástrica. A dor visceral de origem no estômago localiza-se habitualmente na região
médio-epigástrica. O acometimento da camada parietal do peritônio por doenças
gástricas pode determinar dor apenas no quadrante superior esquerdo do abdômen.
Doenças que acometem o bulbo duodenal causam dor visceral na região epigástrica e
eventualmente, no quadrante superior direito do abdome. Doenças da porção distal do
duodeno causam dor na região periumbilical.
b. Dor no hipocôndrio direito: A dor no hipocôndrio direito
ocorre por afecções do fígado, vesícula biliar, flexura hepática do cólon, distúrbios no
hemitórax direito, hemidiafragma direito, doenças musculoesqueléticas ou do sistema
nervoso. As lesões mais frequentes são a colecistite crônica ou aguda, cólica biliar,
câncer hepático e do sistema biliar, abscesso hepático e pancreático, hepatite crônica ou
aguda, pleurisia hemidiafragmática direita, abscesso subfrênico, úlcera duodenal,
neuralgia intercostal, síndrome pós-colecistectomia e pneumonia. A dor hepática
localiza-se no hipocôndrio direito, epigástrio, ou na região torácica distal, intensifica-se
às expirações e pode ser referida no ombro e escápula direita.
c. Dor no hipocôndrio esquerdo: A dor no hipocôndrio esquerdo
ocorre por afecções do baço, flexura esplênica do cólon, lesão do hemitórax esquerdo,
cauda do pâncreas, doenças neurológicas e musculoesqueléticas. O tromboembolismo
ou trombose dos nervos esplênicos, o infarto esplênico, o abscesso esplênico, a
esplenomegalia, a colite, a ruptura de baço, o carcinoma de flexura esplênica do cólon, a
pneumonia, a neuralgia intercostal, a hérnia diafragmática, a pericardite e a angina
pectoris, são as lesões mais frequentes. A dor visceral pancreática caracteriza-se por
desconforto abdominal constante, com irradiação para regiões lombar ou dorsal distal.
d. Dor lombar: A dor lombar ocorre por lesão dos rins, ureteres,
cabeça e cauda do pâncreas ou cólon. As causas principais são os abscessos perirrenal, a
pielite, a pielonefrite, abscessos renais, tumor renal, tuberculose renal, síndrome
dolorosa pós-nefrectomia, neuralgia intercostal de um ou mais nervos (T8-T11)
compressão radicular por tumor, doenças vertebrais e herpes-zóster.
e. Dor na região periumbilical: A dor na região periumbilical
ocorre por lesão do intestino delgado, apêndice, ceco, corpo do pâncreas, afecções
musculoesqueléticas ou neurológicas, principalmente por obstrução intestinal aguda,
diverticulite de Meckel, tromboembolismo da artéria mesentérica superior, enterocolite,
hérnia umbilical, neuralgia intercostal (T9-T11) ou síndrome dolorosa miofascial. A dor
em cólica na região periumbilical, oriunda do intestino delgado, pode ser desencadeada
por distensão da luz visceral ou por atividade motora excessiva. Processos infiltrativos e
inflamatórios que acometam o peritônio parietal podem causar dor somática localizada a
partir da região envolvida. A tração da raiz do mesentério pode causar dor somática e
dor visceral periumbilical. A distensão do cólon ascendente e da metade direita do cólon
transverso pode resultar em dor periumbilical e/ou dor suprapúbica. A distensão da
metade esquerda do cólon transverso e do cólon descendente determina dor localizada
na porção mediana infra umbilical e suprapúbica.
f. Dor na região ilíaca direita: A dor na região ilíaca direita
ocorre por lesões do apêndice, intestino delgado, ceco, rim e ureter direito, tuba uterina
direita ou ovário direito, afecções musculoesqueléticas ou neurológicas, tais como:
apendicite aguda, salpingite crônica, ruptura de folículo ovariano, cólica renal, pielite
aguda, carcinoma do ceco, hérnia inguinal, epididimite aguda e psoíte.
g. Dor na região ilíaca esquerda: A dor na região ilíaca esquerda
ocorre devido a lesões do cólon sigmoide, trato urinário esquerdo, genitália feminina
interna, afecções musculoesqueléticas ou neurológicas. São causas comuns a salpingite
aguda, gravidez ectópica, colite ulcerativa, psoíte, diverticulite, volvo do sigmoide,
intussuscepção intestinal, obstrução intestinal, hérnia inguinal, epididimite, neuropatia
segmentar (herpes-zóster, hérnia de disco, tumor medular), neuralgias dos nervos íleo-
hipogástrico ou íleo-inguinal e a síndrome dolorosa miofascial lombar.
h. Dor no hipogástrico: A dor no hipogástrico ocorre devido a
lesões da bexiga, genitália interna, doenças intestinais, afecções musculoesqueléticas ou
neurológicas. A cistite aguda, distensão vesical (bexigoma), prostatite, hipertrofia
prostática, carcinoma de bexiga, tumor no retossigmoide, constipação crônica e doenças
da genitália feminina interna são as causas mais frequentes.

Lesões do cólon sigmoide causam dor no quadrante inferior direito ou quadrante


inferior esquerdo ou do abdome, e na região suprapúbica quando há acometimento
peritoneal devido a estimulação mesentérica.
A dor abdominal de origem peritoneal na fase aguda pode associar-se a náuseas,
vômitos, febre, taquicardia, hipertonia e rigidez abdominal, descompressão brusca
dolorosa da parede abdominal e abolição dos ruídos hidroaéreos. O comprometimento
do peritônio parietal geralmente causa dor na região correspondente ao envoltório
acometido. A dor musculoesquelética pode ser referida nas mesmas regiões de
referência da dor visceral.
As disfunções ou alterações vertebrais, ligamentares e/ou musculares da transição
tóraco-lombar podem gerar dor ou desconforto nas regiões inguinal, púbica, glútea e/ou
abdominal e/ou nos membros inferiores. O quadro álgico pode simular visceropatias
abdominais e/ou pélvicas e/ou afecções ligamentares ou articulares dos quadris. As
dores nociceptivas viscerais são difusas e profundas, de localização vaga e descritas
como peso, cólicas, pontadas ou agulhadas, apresentam intensidade variável, podem ser
constantes ou intermitentes, incapacitantes ou não. Associadamente, podem ocorrer
dispaurenia e dismenorreia, assim como alterações do sono, dificuldade para executar
exercícios físicos leves e desempenhar atividades de vida prática e diária.
3.2.4. Dores abdominais de origem miofascial: A síndrome dolorosa
miofascial, principalmente dos músculos reto do abdômen e oblíquos, resulta em dor na
musculatura da parede abdominal e pode mimetizar doenças viscerais.
A dor referida dos pontos-gatilho miofasciais da musculatura abdominal
geralmente ocorre no mesmo quadrante e eventualmente em outro quadrante abdominal
ou na região lombar ou dorsal.
A ativação dos pontos-gatilho na musculatura abdominal pode ocorrer por
traumatismos ou estresses musculares ou representar respostas viscerossomáticas de
doenças viscerais como úlcera péptica, parasitoses intestinais, colite ulcerativa, doença
diverticular do cólon ou colecistopatia. Os pontos-gatilho podem desencadear respostas
somatoviscerais, incluindo vômitos, anorexia, náuseas, cólica intestinal, diarreia,
espasmo vesical ou esfincteriano ou dismenorreia. Esses sintomas associados com a dor
e rigidez da parede abdominal podem mimetizar afecção visceral aguda, como
apendicite ou colecistite.
A ativação dos pontos-gatilho pode perpetuar-se pelo estresse emocional, adoção
de posturas inadequadas e atividades físicas inapropriadas.
A dor na síndrome dolorosa miofascial agrava-se durante a movimentação, tosse e
geralmente associa-se a espasmo reflexo muscular e às anormalidades discrásicas
segmentares e suprassegmentares.

4. Distensão abdominal:
4.1. Definição: Define-se como sendo o aumento repentino ou gradual do
perímetro abdominal. A distensão abdominal pode ser causada pelo crescimento de
órgãos, massas, distensão por gases dos intestinos ou acúmulo de líquidos na cavidade
peritoneal (ascite).
Nas pessoas normais, o volume de gases presentes nos intestinos oscila entre 30 a
200 ml em qualquer momento. Estes gases são produzidos no cólon pela fermentação
bacteriana de nutrientes não absorvidos (principalmente dietas ricas em carboidratos),
ou substâncias orgânicas secretadas na luz intestinal. Os gases do estômago têm a
mesma composição que o ar deglutido. O aumento da quantidade de gases intestinais
pode ser motivado por aerofagia, pela elevada produção intestinal após a ingestão de
alimentos que contenham hidratos de carbono não absorvíveis ou no curso de processos
associados à colonização bacteriana anômala no intestino delgado.
Na obstrução intestinal aguda, a distensão dos intestinos ocorre pelo acúmulo de
líquidos na região proximal ou no segmento obstruído. A sensação de distensão
abdominal, quando não é acompanhada de sinais físicos objetivos de aumento do
perímetro abdominal ou tumefação local, é habitualmente transitória e está relacionada
muitas vezes com algum problema gastrointestinal.
4.2. Etiologia:
4.2.1. Localização: Hepatomegalia, esplenomegalia, tumor ou cisto
renal, tumor ou cisto pancreático, crescimento uterino, massa ovariana, distensão da
bexiga urinária, hérnia de parede abdominal e massa inflamatória.
4.2.2. Distensão abdominal generalizada sem ascite (aumento da
quantidade de gases no trato gastrointestinal):
 Síndrome do intestino irritável
 Pseudo obstrução intestinal
 Íleo paralítico, obstrução intestinal mecânica
 Aerofagia
 Mal-absorção, insuficiência pancreática crônica
 Decorrente de procedimentos cirúrgicos

4.2.3. Ascite:
➢ Transudato: Cirrose, valvulopatia cardíaca direita, síndrome
nefrótica (causas frequentes de ascite), pericardite obstrutiva, hipoalbuminemia,
enteropatia perdedora de proteínas, trombose das veias hepáticas (síndrome de Budd-
Chiari), obstrução da veia cava inferior, obstrução da veia porta, síndrome de Meigs
(fibroma ovariano com ascite e hidrotórax).
➢ Exsudato: Peritonite (bacteriana, tuberculosa), rotura visceral,
pancreatite, perda de líquido de pseudocisto, peritonite biliar, tumores, metástases
hepáticas e peritoneais, carcinomatose generalizada e mixedema.
➢ Quilosa (obstrução linfática): Neoplasias abdominais,
linfomas, tumores mediastínicos, traumatismo do conduto torácico no tórax, filariose,
linfangectasia congênita e ocasionalmente tuberculose, cirrose e síndrome nefrótica.

5. Obstipação:
5.1. Conceito: Retardo na evacuação de fezes com passagem irregular de
material fecal, duras e secas; menos de três evacuação por semana.
5.2. Fisiologia: O quimo passa rapidamente através do intestino delgado; cinco
a seis horas após a alimentação a maior parte dos alimentos está no ceco. No intestino
grosso a massa fecal progride mais lentamente; em geral, são necessárias doze horas
aproximadamente para que passe do ceco ao cólon descendente e sigmoide. São
necessárias mais seis a oito horas para que ocorra a evacuação dos resíduos
alimentícios. Normalmente, a massa fecal penetra no reto quando inicia o mecanismo de
evacuação. O movimento peristáltico que impulsiona a matéria fecal até o reto inicia-se
habitualmente com a ingestão do desjejum. O desejo de defecar começa quando a massa
fecal distende o reto devidos aos movimentos peristálticos.
A obstipação ou constipação intestinal é um problema crônico que acomete
muitos pacientes no mundo. Em alguns grupos de pacientes, como os idosos, a
obstipação constitui um problema sanitário importante; no entanto, na maioria dos casos
a constipação crônica é um motivo para consulta que provoca moléstia, mas não ameaça
a vida nem debilita o indivíduo. Habitualmente, pode ser manejada em nível de atenção
primária com controle custo-efetivo dos sintomas.
A terminologia relacionada à constipação é problemática. Existem duas
fisiopatologias que, em princípio, diferem, mas que se superpõem: os transtornos do
trânsito e os transtornos da evacuação. Os primeiros podem surgir secundariamente aos
segundos, e os segundos em ocasiões podem apresentar-se após os primeiros.
5.3. Definição: A palavra “constipação” tem vários significados e a maneira
como é utilizada pode diferir não só entre os pacientes, mas também entre as diferentes
culturas e religiões.
Em estudo populacional sueco, encontrou-se que o conceito mais comum de
constipação era a necessidade de ingerir laxantes (para 57% dos que responderam). No
mesmo estudo, as mulheres (41%) tiveram duas vezes de probabilidades que os homens
(21%) de considerar os movimentos intestinais infrequentes como representativos de
constipação, enquanto igual proporção de homens e mulheres entendiam por
constipação às fezes endurecidas (43%), o esforço ao evacuar (24%), e a dor ao evacuar
(23%).
Dependendo de diversos fatores - a definição diagnóstica, fatores demográficos, e
a amostragem dos grupos - as pesquisas sobre constipação mostram uma prevalência
que vai de 1% até mais de 20% nas populações ocidentais. Em estudos de populações
idosas, até 20% dos indivíduos que habitam uma comunidade e 50% das pessoas idosas
institucionalizadas relataram sintomas.
Habitualmente, define-se a constipação funcional como um transtorno
caracterizado por uma dificuldade persistente para evacuar ou uma sensação de
evacuação incompleta e/ou movimentos intestinais infrequentes (a cada 3 ou 4 dias ou
com menor frequência), em ausência de sintomas de alarme ou causas secundárias. As
diferenças na definição médica e as variações entre os sintomas relatados dificultam a
obtenção de dados epidemiológicos confiáveis.
5.3.1. Patogênese e fatores de risco: A obstipação funcional pode ter
diferentes causas, que vão desde mudanças na dieta, atividade física ou estilo de vida,
até disfunções motoras primárias produzidas por miopatia ou neuropatia colônica. A
constipação também pode ser secundária a um transtorno de evacuação. O transtorno de
evacuação pode estar associado a uma contração paradoxal ou espasmo involuntário do
esfíncter anal, que pode resultar de um transtorno adquirido do comportamento
defecatório que ocorre em dois terços dos pacientes.
Embora o exercício físico e a dieta rica em fibras tenham um efeito protetor, os
seguintes fatores aumentam o risco de obstipação (a associação pode não ser causal):
 Envelhecimento (mas a constipação não é consequência fisiológica do
envelhecimento normal
 Depressão
 Inatividade
 Baixa ingestão calórica
 Baixa renda e baixo nível educativo
 Quantidade de medicação recebida (independentemente dos perfis de efeitos
colaterais)
 Abuso físico e sexual
 Sexo feminino: As mulheres relatam uma maior incidência de obstipação do
que os homens

Também deve-se perguntar aos pacientes sobre mudanças na alimentação e


eliminação. Em relação à alimentação, deve-se perguntar aos pacientes se há
dificuldades de deglutição (disfagia), perda de apetite e presença de náuseas e vômitos.
Se os pacientes estiverem vomitando, deve-se perguntar a eles a frequência dos vômitos
e há quanto tempo estes ocorrem, e se foi observada a presença de sangue ou material
semelhante a borra de café, sugestivos de hemorragia gastrointestinal. Além disso, deve-
se questionar os pacientes em relação ao tipo e a quantidade de líquidos que eles
tentaram beber, se tiverem tentado beber algum, e se eles foram capazes de mantê-los
no estômago.
Em relação à eliminação, deve-se perguntar ao paciente quando foi a última
evacuação, qual a frequência das evacuações e se essa frequência representa uma
mudança em relação à sua frequência normal. É mais útil solicitar informações
quantitativas específicas sobre as evacuações em vez de simplesmente perguntar se eles
estão com prisão de ventre ou diarreia, porque as pessoas usam esses termos de maneira
bastante diferente. Deve-se solicitar também ao paciente que descreva a cor e a
consistência das fezes, incluindo se elas têm aparência negra ou sanguinolenta
(sugestiva de hemorragia gastrointestinal), purulenta ou mucoide. Deve-se perguntar aos
pacientes se eles perceberam sangue coagulado nas fezes, misturado com as fezes ou
isoladamente, sem as fezes.
É importante coletar os antecedentes obstétricos em mulheres, porque os
distúrbios ginecológicos e obstétricos podem se manifestar com sintomas
gastrointestinais.
Sintomas inespecíficos associados, como febre ou perda de peso, devem ser
avaliados. A perda de peso é um sintoma associado que pode indicar um problema mais
grave, como um câncer, e o médico deve realizar uma avaliação mais abrangente.
Os pacientes se queixam de maneiras diferentes, dependendo de sua
personalidade, do impacto da doença em suas vidas e de influências socioculturais. Por
exemplo, náuseas e vômitos podem ser minimizados ou relatados de forma indireta por
pacientes intensamente deprimidos, mas apresentados de maneira exacerbada em
pacientes histriônicos (pessoas que têm uma necessidade constante de atenção,
demonstram comportamentos excessivamente dramáticos e o seu início verifica-se no
começo da idade adulta).
Elementos importantes dos antecedentes de saúde do paciente incluem a presença
de distúrbios gastrointestinais diagnosticados anteriormente, cirurgia abdominal prévia e
uso de drogas ilícitas e substâncias que possam causar sintomas gastrointestinais (por
exemplo, AINEs, álcool).

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