Você está na página 1de 74

UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBERLÂNDIA

FACULDADE DE DIREITO

GABRIELA MARIA ARAÚJO SIQUIEROLI

CONTRATOS INTERNACIONAIS DE
TRANSFERÊNCIA DE TECNOLOGIA:
UMA ABORDAGEM DIRECIONADA AO
DESENVOLVIMENTO

Uberlândia 2015
GABRIELA MARIA ARAÚJO SIQUIEROLI

CONTRATOS INTERNACIONAIS DE
TRANSFERÊNCIA DE TECNOLOGIA:
UMA ABORDAGEM DIRECIONADA AO
DESENVOLVIMENTO

Trabalho de conclusão de curso apresentado à


Faculdade de Direito da Universidade Federal
de Uberlândia, como requisito parcial à
obtenção do título de Bacharel em Direito.
Orientador: Prof. Me. Thiago Paluma

Uberlândia 2015
GABRIELA MARIA ARAÚJO SIQUIEROLI

CONTRATOS INTERNACIONAIS DE
TRANSFERÊNCIA DE TECNOLOGIA: UMA
ABORDAGEM DIRECIONADA AO
DESENVOLVIMENTO

Trabalho de conclusão de curso apresentado à


Faculdade de Direito da Universidade Federal
de Uberlândia, como requisito parcial à
obtenção do título de Bacharel em Direito.

Uberlândia, janeiro de 2015

Banca examinadora

___________________________________________
Prof. Fernando Martins - FADIR/UFU

___________________________________________
Prof. João Víctor Longhi - FADIR/UFU

___________________________________________
Prof. Thiago Paluma- FADIR/UFU
À minha mãe Letícia e minha irmã Giovana
por todo carinho e paciência com que me
ajudaram na conclusão deste trabalho.
AGRADECIMENTOS

Ao professor Thiago Paluma pela excelente e dedicada orientação ao longo da


elaboração deste trabalho.
RESUMO

A difusão global da tecnologia é indispensável para que países em situação de defasagem


possam se desenvolver. Por isto, os contratos internacionais de transferência de tecnologia
constituem um importante instrumento para a diminuição da desigualdade entre países mais e
menos desenvolvidos. No entanto, em muitos casos os países recebedores de tecnologia não
conseguem progredir por conta própria a partir da técnica importada, permanecendo dependes
de novos investimentos estrangeiros. Este trabalho tem por escopo a apresentação dos
principais pressupostos de uma política tecnológica bem-sucedida. Para tanto, são analisadas
as cláusulas restritivas que impedem a efetiva transferência de tecnologia, geralmente
impostas nestas espécies contratuais, bem como o arcabouço normativo nacional e
internacional direcionado ao controle de tais práticas. Merece destaque a influência do Acordo
TRIPS da OMC sobre a legislação brasileira, que provocou a redução do controle estatal
sobre os contratos em questão. A liberalização daí decorrente conferiu maior autonomia às
partes contratantes e incentivou os investimentos estrangeiros. Por outro lado, os altos níveis
de proteção da propriedade industrial impostos pela lei brasileira, após a entrada em vigor do
Acordo TRIPS, dificultou a efetiva transferência de tecnologia. A abordagem aqui proposta
recorre às lições da economia e do direito comparado para análise das normas nacionais e
internacionais regulamentadores dos contratos objeto desde trabalho.

Palavras-Chave: Contratos internacionais de transferência de tecnologia. Desenvolvimento.


Práticas restritivas. Regulamentação nacional e internacional.
ABSTRACT

The global diffusion of technology is indispensable for countries in lag situation to develop.
Hence, international technology transfer agreements are an important tool to reduce inequality
between more and less developed countries. However, in many cases the technology recipient
countries cannot progress on their own from the imported technique, staying dependent of
new foreign investment. This work’s scope is to present the main premises of a successful
technology policy. Therefore, the restrictive clauses that prevent the effective transfer of
technology, usually imposed in these contractual species, shall be analysed, as well as the
national and international normative framework aimed at the control of such practices.
Noteworthy is the influence of the WTO TRIPS Agreement on Brazilian law, which caused
the reduction of state control over the contracts in question. The ensuing liberalization gave
more autonomy to the contracting parties and encouraged foreign investment. On the other
hand, the high levels of industrial property rights protection imposed by the Brazilian law,
after the approving of the TRIPS Agreement, has hampered the effective transfer of
technology. The approach here proposed draws from the lessons of economics and compared
law for the proper analysis of the national and international regulatory standards of the
contracts herein referred.

Keywords: International technology transfer agreements. Development. Restrictive practices.


National and international regulation.
SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ........................................................................................................................ 8

1 TRANSFERÊNCIA DE TECNOLOGIA E DESENVOLVIMENTO ........................... 11


1.1 Tecnologia e sua relação com o cenário econômico ...................................................... 12
1.2 Transferência de tecnologia como forma de redução da dependência ....................... 18
1.3 Progresso tecnológico e desenvolvimento ...................................................................... 25

2 CONTRATOS INTERNACIONAIS DE TRANSFERÊNCIA DE TECNOLOGIA.... 29


2.1 Contratos Internacionais: conceitos e princípios .......................................................... 29
2.2 Contratos internacionais de transferência de tecnologia: características e espécies . 33
2.3 Cláusulas restritivas e práticas abusivas ....................................................................... 40

3 A REGULAMENTAÇÃO DA TRANSFERÊNCIA DE TECNOLOGIA COM


VISTAS AO DESENVOLVIMENTO.................................................................................. 47
3.1 A regulamentação internacional: Acordo Trips ........................................................... 49
3.2 A regulamentação nacional e as perspectivas para a transferência de tecnologia no
Brasil. ...................................................................................................................................... 61

CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................................ 69

REFERÊNCIAS ..................................................................................................................... 71
INTRODUÇÃO

É consenso entre os economistas que o progresso tecnológico constitui fator


determinante do nível de desenvolvimento de um país1. Historicamente, antes mesmo da
Revolução Industrial, o domínio de técnicas que permitiam o incremento da produção dos
bens comercializáveis, em termos de quantidade e qualidade, significava uma multiplicação
das riquezas do produtor, seja pela redução de custos na produção ou pela criação de um
monopólio.

No entanto, para os países de industrialização tardia, o processo de desenvolvimento


esteve comprometido pela falta de tecnologia incorporada aos produtos exportados, pois a
consequente diminuição da competitividade internacional afetava a balança comercial de
forma negativa. Ainda, setores industriais importantes para a melhoria da qualidade de vida da
população ficavam defasados, como a produção de alimentos e medicamentos. 2

As transferências de tecnologia se revelam como um meio para reduzir as diferenças


tecnológicas entre os países, ao inserirem em uma estrutura defasada um processo novo,
muitas vezes já pronto para utilização pelas principais firmas nacionais, prometendo
incrementar a competitividade doméstica e internacional dos bens produzidos.
Porém, infelizmente, muitas vezes este processo pode resultar em um agravamento da
dependência, quando a empresa ou o país, não consegue continuar avançando
tecnologicamente a partir do que foi importado. Assim, a nova técnica rapidamente se tornará
obsoleta e novas transferências internacionais serão necessárias.

                                                                                                                       
1
TIMM, Luciano Benetti; COOTER, Robert D; SCHAEFER, B. O problema da desconfiança recíproca. The
Latin America and Carribbean Jornal Of Legal Studies, V. 1. Berkeley Eletronic Press. 2006. Disponível em:
<http://services.bepress.com/lacjls/vol1/iss1/> Acesso em: outubro de 2014
2
A teoria elaborada pela Cepal (Comissão Econômica das Nações Unidas para a América Latina) em manifesto
original de 1949, relacionou o subdesenvolvimento com a lenta e desigual difusão do progresso técnico em
2
A teoria elaborada pela Cepal (Comissão Econômica das Nações Unidas para a América Latina) em manifesto
original de 1949, relacionou o subdesenvolvimento com a lenta e desigual difusão do progresso técnico em
nível internacional. O cerne desta teoria está na separação da economia internacional em dois polos distintos:
os país do centro e os países da periferia. Os primeiros são considerados homogêneos e diversificados, por
possuírem alta produtividade em vários ramos industriais, enquanto os segundos são heterogêneos e
especializados, por terem poucos setores produtivos. Para mais detalhes vide: PORCILE, Gabriel; ESTEVES,
Luis Alberto; SCATOLIN. Tecnologia e Desenvolvimento Econômico. In: PELAEZ, Victor;
SZMRECSÁNYI, Tamás (Org.). Economia da Inovação Tecnológica. São Paulo: Editora Hucitec, 2006. p.
367.
  9  
 
A promoção do desenvolvimento dependerá portanto, da assimilação das tecnologias e
da garantia de seu acesso aos consumidores finais, conferindo melhoria de qualidade de vida.
Por isso, a adoção de políticas públicas de incentivo aos fluxos tecnológicos e a criação de
mecanismos jurídicos reguladores dos contratos internacionais de transferência, são
estratégias comuns dos governos dentro de um plano de desenvolvimento nacional.

Porém, as antigas práticas protecionistas não mais condizem com a atualidade. O


Estado não pode desconsiderar a realidade econômica globalizada e impor um controle
jurídico incompatível com a prática internacional. Nas palavras de José Eduardo Faria3:

Por um lado, o Estado já não pode mais querer regular a sociedade civil nacional por
meio de seus instrumentos jurídicos tradicionais, dada a crescente redução de seu
poder de intervenção, controle, direção e indução. Por outro lado, ele é obrigado a
compartilhar sua soberania com outras forças que transcendem o nível nacional. [Ao
promulgar as leis, portanto], os Estados nacionais acabam sendo obrigados a levar
em conta o contexto econômico-financeiro internacional, para saber o que podem
regular e quais de suas normas serão efetivamente respeitadas

Assim, a efetiva transferência de tecnologia requer um cuidadoso processo de


ponderação a partir de lições da Ciência Economia e das experiências internacionais,
notoriamente através do Direito Comparado. Generalizando, medidas exageradamente liberais
podem resultar na imposição de cláusulas restritivas e abusivas nos contratos de transferência
por parte das transnacionais. Por outro lado, o exacerbado exercício de controle estatal sobre a
liberdade contratual pode encarecer as operações, afastar os investidores estrangeiros e
reduzir o fluxo de tecnologias de ponta. Ambos os extremos comprometeriam a ordem
econômica interna ao entravarem o progresso tecnológico.

A adequada regulamentação da matéria aqui apresentada exige portanto, uma análise


econômica do direito. Ou seja, em conformidade com o movimento iniciado por Posner (Law
and Economics) 4, as normas jurídicas devem ser avaliadas a partir de um juízo de eficiência,
valor e utilidade. Por esta metodologia, a regulamentação jurídica deve iniciar-se com o
estudo da realidade, sobre como os objetos jurídicos realmente são. Depois, mediante um

                                                                                                                       
3
FARIA, José Eduardo (Org.). Direito e globalização econômica: implicações e perspectivas. São Paulo:
Malheiros, 1994. p. 11.
4
A teoria de Posner se encontra sintetizada na seguinte obra: POSNER, Richard A., The economics of Justice.
Cambridge : Harvard University Press, 1983.
  10  
 
juízo de valor sobre as possibilidades normativas, extraindo-se sua finalidade, poderá ser
escolhida a mais eficiente. De acordo com Ferraro e Conselvan5:

Já a eficiência é um critério do Direito Econômico para realizar o objetivo do


desenvolvimento não danoso e para ponderar as condutas dos agentes não
econômicos na formulação e execução de políticas econômicas voltadas a
regulamentação da tecnologia. Constitui, portanto, um critério para o controle das
cláusula abusivas e práticas restritivas.

Por este motivo, é necessário avaliar o histórico da regulamentação internacional e


nacional sobre os contratos envolvendo transferência de tecnologia, mediante uma análise
econômica do direito, para que possam ser indicadas as expectativas de progresso tecnológico
dentro do atual nível de controle. Internacionalmente as principais bases reguladoras estão
contidas no TRIPS (Trade-Related Aspects os Intellectual Property Rights)6 e nacionalmente
na Lei de Propriedade Industrial (Lei nº. 9.279 de 1996) e na Lei Antitruste ( Lei nº 12.529 de
2011).

No primeiro capítulo, mediante um estudo interdisciplinar entre Direito e Economia


será demonstrada a relação existente entre progresso tecnológico e desenvolvimento,
enfatizando o papel da transferência de tecnologia nesta relação. Também será destacada a
importância do Direito como meio regulador da economia para a garantia do desenvolvimento
também em sua esfera humanista.

No segundo capítulo serão apresentadas as principais espécies de contratos


internacionais de transferência de tecnologia, levando em conta as vantagens e desvantagens
de cada uma delas, com base no Direito Comparado. Ainda serão feitas algumas
considerações a respeito da autonomia das partes e à liberdade contratual, em oposição aos
fundamentos de controle às cláusulas abusivas.

Por fim, o terceiro capítulo abordará a normativa relacionada à regulamentação da


transferência de tecnologia com vistas ao desenvolvimento. Para isso serão analisadas as
evoluções internacionais e nacionais quanto à matéria, conferindo especial atenção ao Acordo
TRIPS.
                                                                                                                       
5
FERRARO, Valkiria Aparecida Lopes; CONSELVAN, Jussara Seixas. Os Contratos de Transferência de
Tecnologia e os Limites à Autonomia Privada . In: Scientia Iuris, Londrina, v.13, p.78. Disponível em:<
http://www.uel.br/revistas/uel/index.php/iuris/article/view/4092/3488>. Acesso em 12 maio 2013.

6
Em português ADPIC (Acordo Relativo aos Aspectos do Direito da Propriedade Intelectual Relacionados com
o Comércio), porém a mesmo no Brasil utiliza-se geralmente a sigla TRIPS.
  11  
 

1 TRANSFERÊNCIA DE TECNOLOGIA E DESENVOLVIMENTO

A relação entre a tecnologia inserida no processo produtivo e o crescimento


econômico, por mais óbvia que possa parecer, não é tão facilmente explicada, uma vez que
existem uma série de variantes que influenciam no sucesso de uma inovação em seu potencial
gerador de riquezas, seja no âmbito de uma única firma (microeconômico) ou no contexto
geral de um país (macroeconômico).

O entendimento sobre a forma como a tecnologia dá ao seu detentor uma vantagem


sobre o mercado é fundamental para uma análise da dinâmica do comércio internacional e da
sua consequente divisão internacional do trabalho. Os países considerados desenvolvidos
comercializam produtos altamente sofisticados tecnologicamente, enquanto os
subdesenvolvidos, ou em desenvolvimento, mantêm suas exportações baseadas
principalmente em produtos primários. Esta divisão da produção mundial é derivada
justamente do desequilíbrio social e econômico entre os países, gerando um ciclo vicioso de
dependência para os menos desenvolvidos. A falta de tecnologia leva à alta especialização
nacional em produtos primários, o que por sua vez desestimula o processo inovativo.7

Transferir tecnologia de outros países constitui um meio veloz para a modernização de


uma cadeia produtiva, mas isto isoladamente não significa que a empresa ou o país
conseguirão continuar produzindo inovações a partir da técnica importada.

De acordo com Nathan Rosenberg8:

Numa sociedade capaz de gerar progresso técnico rápido, nenhuma inovação isolada
é indispensável. Contudo, a razão para isso não é que inovações individuais não têm
importância, mas sim que uma sociedade como essa pode gerar inovações
substitutas. É precisamente a capacidade de gerar várias inovações possíveis que
torna descartável qualquer inovação isolada.

A efetiva transferência de tecnologia pode ser considerada como fruto de dois fatores:
o bom andamento da operação em si e a capacidade tecnológica do país recebedor. Fatores

                                                                                                                       
7
PORCILE, Gabriel; ESTEVES, Luis Alberto; SCATOLIN. Tecnologia e Desenvolvimento Econômico. In:
PELAEZ, Victor; SZMRECSÁNYI, Tamás (Org.). Economia da Inovação Tecnológica. São Paulo: Editora
Hucitec, 2006. p. 367.
8
ROSENBERG, Nathan. Por dentro da caixa-preta: tecnologia e economia. Tradução de José Emílio
Maiorino. Campinas, SP: Editora da Unicamp, 2006. p. 57.
  12  
 
estes que recebem influência direta do Direito, desde a regulação dos contratos celebrados à
criação de uma estrutura jurídica sólida, capaz de atrair investimentos estrangeiros ao mesmo
tempo em que possibilita a tutela dos interesses nacionais.9

É importante ainda destacar que o crescimento econômico de um país não pode ser
confundido com seu desenvolvimento. Este último pressupõe que o aumento do produto
nacional seja acompanhado por avanços políticos e sociais. 10 Assim, a transferência de
tecnologia precisa ser entendida como um meio para o desenvolvimento, e que ao difundir
novas técnicas, além de provocar um incremento do fluxo econômico, também crie novos
setores empregatícios, fomente investimentos em P&D (Pesquisa e Desenvolvimento) e
incentive a educação em níveis universitários e básicos.

1.1 Tecnologia e sua relação com o cenário econômico

Inicialmente alguns conceitos precisam ser esclarecidos, como a definição de


tecnologia e sua distinção de ciência, invenção e inovação.

Tecnologia foi definida de maneira bastante simples pela ONU, em documento inicial
da UNCTAD para o Código Internacional de Conduta em Transferência de Tecnologia (TOT
Code), como sendo “conhecimento sistemático para a produção de um produto, para a
aplicação de um processo ou para a prestação de um serviço.”11 Posteriormente, a própria
UNCTAD reconheceu a deficiência da definição e acrescentou:

Consequently,“technology” includes not only “knowledge or methods that are


necessary to carry on or to improve the existing production and distribution of
goods and services” or indeed to develop entire new products or processes, but also
“entrepreneurial expertise and professional know-how” (Santikarn, 1981, p. 4.).

                                                                                                                       
9
Ibidem., 401.
10
“O desenvolvimento de um povo deve ser medido por uma comparação interna. O que é relevante para saber
se ele está se desenvolvendo é saber se o bem-estar desse povo hoje é maior do que o seu nível de qualidade de
vida no passado. A realidade de outro povo pode ser utilizada como referência para saber até onde se pode
chegar. CORRÊA, Daniel Rocha. Contratos de Transferência de Tecnologia: fundamentos para o controle
de práticas abusivas e cláusulas restritivas. Belo Horizonte: Movimento Editorial da Faculdade De Direito
da UFMG, 2005. p. 88.
11
Tradução livre de “systematic knowledge for the manufacture of a product, for the application of a process or
for the rendering of a service”. UNITED NATIONS CONFERENCE ON TRADE AND DEVELOPMENT
(UNCTAD). Transfer of Technology – UNCTAD Series on issues in internacional investment agreements.
Genebra, United Nations Publication, Sales nº E.01.II.D.33, 2001b. p. 05.
  13  
 
The latter two elements may often prove to be the essential competitive advantage
possessed by the technology owner.12

Daniel Rocha Corrêa, após analisar conceitos de tecnologia elaborados por diversos
autores, bem como o sentido etimológico da palavra13, sintetizou-os da seguinte forma: 14

Os conhecimentos contidos na tecnologia podem ser de qualquer natureza


(científicos ou não) e estão presos a uma finalidade fundamentalmente prática, qual
seja a criação de utilidade. A tecnologia exige o equilíbrio de ambos os lados: os
conhecimentos, que representam a vertente humana, e a destinação prática, que
representa a sua faceta material.

Assim, para os fins deste trabalho, tecnologia pode ser considerada como todo tipo de
conhecimento aplicável ao processo produtivo. Constitui então um ativo intangível, que pode
ser considerado fator de produção, conjuntamente com o capital, insumos e força de
trabalho.15 Por isso difere-se da ciência, que não tendo finalidade específica, se desenvolve
como acervo de saber comum a toda a humanidade.

A tecnologia, por não se tratar de um bem concreto estático16, mas por estar em
constante modificação pela evolução do conhecimento, possui ainda algumas características
que, variando de grau, constituem fatores determinantes da sua relação com o
desenvolvimento econômico. Giovanni Dosi e Mario Cimoli destacam três características
essenciais: oportunidade, apropriabilidade e cumulatividade. 17

                                                                                                                       
12
“Consequentemente, tecnologia inclui não apenas “conhecimentos ou métodos que são necessários para a
continuidade ou melhoramento da existente produção e distribuição de produtos e serviços” ou ainda para
desenvolver produtos ou processos totalmente novos, mas também “expertise empreendedora e know-how
profissional” (Santikarn, 1981, p. 4). Os últimos dois elementos podem frequentemente se provar como sendo
uma vantagem competitiva essencial possuída pelo dono da tecnologia.” (Tradução nossa). UNCTAD, op. cit.
2001, p. 06.
13
Tecnologia deriva do grego Tekne (técnica) e Logos (palavra, proposição, discurso), sendo então o estudo do
saber fazer. SOBERANIS, Jaime Álvares. La regulación de las invenciones y marcas y de la transferencia
tecnológica, 1979. apud CORRÊA, Daniel Rocha. Op. cit., 2005. p. 25.
14
CORRÊA, Daniel Rocha. Op., cit., 2005. p.31.
15
FURTADO, Gustavo Guedes. Transferência de Tecnologia no Brasil: Uma análise de Condições
Contratuais Restritivas. Rio de Janeiro: Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2012. p. 27.
16
Insta destacar que a tecnologia constitui bem imaterial, protegido por direito de propriedade industrial, seja
pela concessão de título de patente sobre invenção ou modelo de utilidade, seja pela proteção conferida aos
segredos de empresa. DINIZ, Davi Monteiro. Propriedade industrial e segredo em comércio. Belo
Horizonte: Del Rey. 2003. p.81.
17
CIMOLI, Mario; DOSI, Giovanni. The Characteristics of Technology and the Development Process: Some
Introductory Notes. In: CHATTERJI, Manas (Ed.). Technology Transfer in the Developing Countries.
London: Macmillan Press, 1994. p.53.
  14  
 
Oportunidade significa o potencial de inovação oferecido por uma tecnologia, tanto na
sua capacidade de acrescentar qualidade e eficiência ao produto ou à produção, quanto na
facilidade com que a nova técnica tende se aperfeiçoar, se tornando mais avançada a cada
esforço inovativo.

A apropriabilidade 18 constitui importante característica, e significa o grau de


vinculação de uma tecnologia ao seu desenvolvedor. Ou seja, quanto mais apropriável uma
tecnologia mais ela estará atrelada a sua origem e menor será sua possibilidade de difusão,
seja por transferência ou por imitação. É então oposta à imitabilidade, ou seja, a facilidade
com que o conhecimento aplicado no processo produtivo possa ser replicado por uma empresa
concorrente. Importante não confundir apropriabilidade, como sendo qualidade inerente à
tecnologia, com a titularidade de direitos de propriedade industrial. Esta última depende do
âmbito de proteção conferido por cada ordenamento jurídico.

Por fim, a cumulatividade indica o quanto a nova tecnologia permite que a empresa ou
o país continue progredindo tecnicamente, somando conhecimentos e realizando outras
inovações.

Apropriabilidade e cumulatividade variam em graus de tacitividade e entendimento


formal de cada tecnologia. Assim, quanto mais tácita for a tecnologia à cadeia produtiva de
uma empresa, tendo sido desenvolvida a partir da experiência, sem a existência de fórmulas,
livros ou manuais que a descrevam, mais dificilmente será transmitida a terceiros, sendo
altamente apropriável. Assim também não será acumulável, pois não existirá base suficiente
para continuar o processo inovativo.

Algumas considerações merecem ser feitas a respeito dos conceitos de invenção,


inovação e difusão, como formas de obtenção de tecnologia. A invenção ocorre em ambientes
de pesquisa, notoriamente universidades, laboratórios ou instituições nacionais. Já a inovação
normalmente ocorre dentro do setor produtivo, como resultado da busca por melhores técnicas
por parte do empresário. Difusão nada mais é do que a obtenção de uma tecnologia já

                                                                                                                       
18
A tecnologia altamente apropriável não pode ser ensinada ou imitada com facilidade, pois é indissociável do
processo produtivo na qual foi concebida. Para melhor compreensão vide: ALBUQUERQUE, Eduardo Motta.
A apropriabilidade dos frutos do progresso técnico. In: PELAEZ, Victor; SZMRECSÁNYI, Tamás (Org.).
Economia da Inovação Tecnológica. São Paulo: Editora Hucitec, 2006. p. 232. Et. seq.
  15  
 
desenvolvida externamente, em seu estado inicial ou maduro, por meio de imitação ou
transferência.19

No entanto, estes conceitos não podem ser vistos de forma separada, por serem
interdependentes. Ao longo do século XX foi travado um grande debate entre economistas
neoclássicos a respeito da interação entre ciência e o desenvolvimento tecnológico. Durante a
Segunda Revolução Industrial, prevalecia o entendimento de que as pesquisas científicas
avançavam de forma autônoma, motivadas pela busca do conhecimento, e eram
posteriormente aplicadas aos processos produtivos (science-pull). Esta teoria foi negada no
Pós-Guerra, por teóricos que argumentavam que as demandas de mercado impulsionavam o
processo inovativo, de modo que a ciência apenas respondia às novas necessidades (demand-
pull). No entanto, as teorias modernas apostam em uma combinação de ambos os sentidos, de
forma que, sendo as pesquisas motivadas pelas demandas atuais, também os avanços
científicos influenciam na configuração do mercado, direcionando o desenvolvimento
tecnológico.20

O problema das teorias neoclássicas mencionadas consiste na exclusão dos processos


de invenção e inovação do contexto econômico. Seriam portanto elementos exógenos, sujeitos
às demandas de mercado e às determinações da ciência, enquanto apenas a difusão seria
endógena, sujeita às leis econômicas e à atividade empresária. O crescimento econômico, para
estas doutrinas (elaboradas a partir do pensamento de Solow) seria uma combinação de capital
e trabalho crescentes, na qual o trabalho seria determinado por fontes exógenas, como o
crescimento da população e o progresso tecnológico. Assim, o potencial acumulativo da
tecnologia e seus benefícios para a cadeia produtiva e para a competitividade da empresa
eram ignorados.21

A partir das críticas a estas teorias, surgiu a corrente neo-schumpeteriana, baseada no


pensamento de Schumpeter, com uma nova tentativa de explicar a relação entre progresso
tecnológico e desenvolvimento econômico. A base no pensamento shumpeteriano consiste na
atividade inovadora do empresário empreendedor, que reinventa o mercado. Neste sentido a
inovação passa ser considerada uma força endógena e a problemática se desloca do modo
                                                                                                                       
19
SICA DE CAMPOS, André Luiz. Ciência, Tecnologia e Economia. In: PELAEZ, Victor; SZMRECSÁNYI,
Tamás (Org.). Economia da Inovação Tecnológica. São Paulo: Editora Hucitec, 2006. p. 163.
20
Idem.
21
FREEMAN, Chris; SOETE, Luc. A Economia da Inovação Industrial. Tradução de André Luiz Sica de
Campos e Janaína Oliveira Pamplona da Costa. Campinas, SP: Editora da Unicamp, 2008. p. 553-556
  16  
 
como o capitalismo administra as estruturas existentes, para a forma como ele as cria e destrói
sucessivamente.22

O modelo de Schumpeter, como bem afirma Nathan Rosenberg, entendia o progresso


técnico como descontínuo, variando entre grandes ciclos criativos e destrutivos. Em
contraposição, surgiram os pensamentos evolucionistas de destacavam o caráter de
continuidade (Marx) e cumulatividade (Usher) do desenvolvimento tecnológico 23 . As
vertentes evolucionistas agregaram-se às schumpeterianas, levando às compreensão de que o
processo inovativo ocorre de forma relativamente lenta, porém cumulativa, de forma que
pequenos melhoramentos são frequentemente agregados à técnica presente, ocorrendo
algumas poucas inovações radicais ao logo do trajetória. A importância de uma inovação
poderá ser medida de acordo com a magnitude da redução de custos que permitir em
comparação com a tecnologia antiga24, e não somente quanto ao grau de revolução que causar
tecnologicamente.

Esta reconciliação entre doutrinas deu origem ao pensamento neo-schumpeteriano, que


estudou o caminho percorrido por uma tecnologia, desde de sua concepção inicial como um
paradigma, sua trajetória e sua fase madura, bem como as características do progresso
tecnológico e suas implicações para o desenvolvimento econômico.

Nas palavras de Dosi, paradigma tecnológico pode ser entendido como “um modelo e
um padrão de solução de problemas tecnológicos selecionados, baseados em princípios
selecionados das ciências naturais e em selecionadas tecnologias materiais.”25

A partir disto, a trajetória tecnológica será o caminho padrão de desenvolvimento,


seguindo a direção delineada pelo paradigma. Por fim, temos o conceito de technological
frontier, que se trata do nível tecnológico máximo que pode ser alcançado dentro do
pressuposto pelo paradigma.26

                                                                                                                       
22
SCHUMPETER, Joseph Alois. Fundamentos do pensamento econômico. Tradução de Edmond Jorge. Rio
de Janeiro: Zahar, 1968.
23
Para saber mais vide ROSENBERG, Nathan. op. cit., 2006. p. 20 a 25.
24
ROSENBERG, Nathan. op. cit. 2006. p.23, 54 e 56.
25
DOSI, Giovanni. Technological paradigms and technological trajectories. Research Policy 11, North-
Holland Publishing Company, 1982. p. 152.
26
CIMOLI, Mario; DOSI, Giovanni. op. cit., 1994. p. 52.
  17  
 
Na mesma linha de Dosi, Rosenberg destaca as características de complementariedade
e cumulatividade de pequenas melhorias do decorrer da trajetória tecnológica como essenciais
para compreensão da relação entre tecnologia e desenvolvimento econômico. Uma inovação
dificilmente se desenvolve de forma isolada, necessitando de diversos inventos adicionais
para que possa ser colocada em funcionamento, a exemplo da máquina a vapor que precisou
esperar pelo desenvolvimento de um tipo de aço mais barato para que pudesse ser
implantada.27 As complementariedades geram conexões entre diversos paradigmas, de modo
que, caso durante uma trajetória tecnológica descubra-se que um certo equipamento X precise
ser produzido para a continuidade do pregresso, um novo paradigma surgirá. Já a
cumulatividade ocorre em decorrência dos pequenos melhoramentos acrescidos
constantemente ao processo produtivo, constituindo progresso economicamente significativo,
mesmo sem a presença de grandes inovações revolucionárias.

Ainda sem discordar da teoria neo-schumpeteriana, alguns autores modernos, ao


considerarem a atividade empresária como propulsora do desenvolvimento tecnológico,
também destacaram a importância das instituições sociais na sua trajetória. O contexto
político, histórico e cultural de um país constitui fator determinante processo de inovação.
Políticas públicas que estimulem a interação entre o sistema de educação e pesquisa e os
setores empresários, com a instituição de um Sistema Nacional de Inovações, influenciam
diretamente sobre a amplitude do progresso tecnológico e sua contribuição para o
desenvolvimento nacional.28

Em alinhamento com esta perspectiva institucionalista, encontra-se o papel do Direito


como criador de um ambiente juridicamente seguro e estável, e ainda como meio regulatório
da atividade empresarial, possibilitando que o progresso tecnológico aconteça em proveito
dos interesses nacionais.

                                                                                                                       
27
ROSENBERG, Nathan. op. cit., 2006. p. 104.
28
FURTADO, Gustavo Guedes. Transferência de Tecnologia no Brasil: Uma análise de Condições
Contratuais Restritivas. Rio de Janeiro: Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2012. p. 24.
  18  
 
1.2 Transferência de tecnologia como forma de redução da dependência

Uma vez compreendido o processo de inovação e desenvolvimento tecnológico em um


contexto econômico e estabelecidas as bases teóricas para tanto, resta analisar a forma como
este processo contribui para desigualdade econômica e social entre países, e como a
transferência de tecnologia pode atuar em proveito dos países menos desenvolvidos,
possibilitando que se tornem tecnologicamente independentes.

Primeiramente, dentro da abordagem neo-schumpeteriana, as características de


cumulatividade, apropriabilidade e oportunidade de um paradigma tecnológico determinam as
consequências da aplicação da nova tecnologia ao processo produtivo de uma empresa ou de
um país. Quanto maior a oportunidade de inovação oferecida, maior as melhorias de custo e
eficiência na produção e no produto final. Da mesma forma, quanto mais acumulável o
progresso tecnológico, maiores as chances de “o sucesso gerar sucesso”. 29 Já quanto à
apropriabilidade, pode-se pressupor que tecnologias parcialmente apropriáveis são mais
vantajosas, uma vez que, não sendo completamente tácitas, podem contribuir para a
acumulação ou complementação de novas técnicas ao mesmo tempo que não são facilmente
imitáveis por concorrentes, assegurando competitividade.

Quando uma tecnologia reúne estas características em suas nuances mais positivas, a
firma ou país que a controla obtém vantagens em relação aos seus concorrentes que podem ser
de duas naturezas: técnicas de produção mais eficientes ou produtos melhores, por serem mais
novos ou de maior qualidade do que os já existentes.30

Estas assimetrias tecnológicas criam uma lacuna (tecnological gaps) entre os


detentores da nova técnica e os concorrentes. Esta lacuna tende a ampliar de acordo com o
avanço do processo inovativo e da velocidade e eficiência da difusão da nova tecnologia.
Assim, considerando-se um alta capacidade de acumulação e oportunidade, associada a uma
estrutura forte dentro da empresa ou país e comprometida com o desenvolvimento
tecnológico, a tendência é de que o progresso técnico seja cada vez mais significativo. Do
mesmo modo, estas características são determinantes quanto à forma de difusão da tecnologia,
sendo que um baixíssimo grau de apropriabilidade, significa uma facilidade na sua difusão

                                                                                                                       
29
NELSON and WINTER, 1982. apud CIMOLI, Mario; DOSI, Giovanni. op. cit., 1994. p.55.
30
CIMOLI, Mario; DOSI, Giovanni. op. cit., 1994. p.55.
  19  
 
por imitação, que ocorre velozmente, impossibilitando que o detentor originário crie uma
vantagem significativa em relação aos concorrentes.31

Tanto em uma perspectiva microeconômica quanto macroeconômica, quando reunidas


estas condições necessárias para a ampliação das assimetrias, cria-se uma distorção no
mercado, na qual detentores e desprovidos de tecnologia veem-se inseridos em “ciclos
virtuosos ou viciosos”. A alta eficiência dos novos produtos, modificam as demandas do
mercado, que se tornam mais exigentes, e só poderão ser atendidas pelos competidores com
maior capacidade tecnológica, o que estimulará ainda mais o processo inovativo. No extremo
oposto, os produtores mais rudimentares perderão parcelas cada vez maiores de mercado,
sendo levados a se especializarem em produtos de baixo teor tecnológico, provocando o
abandono dos esforços inovativos.32

Neste diapasão, se encaixa a teoria elaborada pela Cepal (Comissão Econômica das
Nações Unidas para a América Latina) em manifesto original de 1949, que relaciona
desenvolvimento com a lenta e desigual difusão do progresso técnico em nível internacional.
O cerne desta teoria está na separação da economia internacional em dois polos distintos: os
país do centro e os países da periferia. Os primeiros são considerados homogêneos e
diversificados, por possuírem alta produtividade em vários ramos industriais, enquanto os
segundos são heterogêneos e especializados, por terem poucos setores produtivos.33

Esta separação esta diretamente relacionada com a tecnologia e sua difusão. Os países
de centro, por estarem na vanguarda da industrialização, prosseguiram avançando
tecnologicamente, melhorando a eficiência da produção, diversificando seus setores e
exportando produtos altamente competitivos no mercado internacional. Por outro lado, os
países da periferia, atrasados no processo industrial, se especializaram em bens primários. Isto
demonstra que o processo de difusão da tecnologia para a periferia ocorre de forma mais lenta
do que a inovação nos grandes centros, intensificando a lacuna.

Além disso, pode-se afirmar que a difusão também ocorre de forma lenta no interior
das economias dos países da periferia, causando a heterogeneidade entre os diferentes setores.

                                                                                                                       
31
Daí a importância da proteção dos direitos de propriedade industrial conferidos por patentes. A concessão de
um direito exclusivo de exploração impede a difusão da tecnologia por imitação, mantendo do desenvolvedor
da tecnologia em vantagem competitiva.
32
CIMOLI, Mario; DOSI, Giovanni. op. cit., 1994. p.55.
33
PORCILE, Gabriel; ESTEVES, Luis Alberto; SCATOLIN. Tecnologia e Desenvolvimento Econômico. In:
PELAEZ, Victor; SZMRECSÁNYI, Tamás (Org). Op. cit., 2006. p. 367.
  20  
 
Enquanto alguns conseguem avançar tecnologicamente, outros permanecem rudimentares e a
demanda interna por produtos industrializados não é suprida. Por este motivo, mesmo em
tempos de crescimento econômico e com alta distribuição de renda, observa-se nestes países
um aumento das importações mais significativo do que o aumento das exportações. 34

A alta especialização em produtos primários, como decorrência da defasagem


tecnológica, também gera um risco constante de queda das exportações, devido à baixa
competitividade que possuem, sendo constantemente substituídos por produtos mais
modernos.

Como bem pontua Nathan Rosenberg: 35

O século XX fornece numerosos exemplos de substituição, por novos produtos, de


produtos antigos de cuja produção alguns países, menos desenvolvidos haviam sido
fortemente dependentes – fibras sintéticas no lugar de algodão e lã; plásticos no
lugar de couro (...). Uma economia sem domínio sobre as tecnologias avançadas
pode ser altamente vulnerável a súbitas mudanças de demanda, geradas no exterior
por essas tecnologias, e pode ter apenas poucas oportunidades para ajustar-se.

Instala-se assim, um ciclo vicioso de dependência tecnológica para os países menos


desenvolvidos.

A quebra de um ciclo de dependência implica em uma modificação da matriz


produtiva do país através da modernização. Uma etapa importante é a industrialização de
produtos normalmente exportados in natura, para que possuam valor agregado.36 Para isto, é
necessária a criação de mecanismos que incentivem e acelerem a difusão de tecnologia, bem
como permitam a sua assimilação pelas empresas nacionais, dando origem a uma estrutura
apta a conceber futuras inovações.

A difusão, como mencionado anteriormente, pode ocorrer por diferentes vias, como a
imitação ou a transferência de tecnologia. Enquanto a primeira forma só é possível quanto a
tecnologias pouco apropriáveis e de fácil acesso através de conhecimentos formais, a segunda

                                                                                                                       
34
Idem.
35
ROSENBERG, Nathan. op, cit, 2006. p. 366 e 367.
36
No caso do Brasil, a exportação de soja continua sendo realizada em grande maioria com o produto in natura.
De acordo com estatísticas apresentadas pela Abiove (Associação brasileira das industrias de óleos vegetais),
no período de 2003 a 2014, apesar da produção dos grãos ter crescido significativamente, o mesmo não ocorreu
com os produtos de valor agregado, como o farelo e o óleo, cuja produção cresceu a níveis bem mais modestos.
Isto indica que o país ainda não conseguiu industrializar uns de seus principais bens de exportação. ABIOVE,
Estatística Mensal do Complexo Soja. Novembro de 2014. Disponível em:
<http://www.abiove.org.br/site/index.php?page=estatistica&area=NC0yLTE=> Acesso em: dezembro 2014.
  21  
 
permite a difusão de tecnologias protegidas por direitos de propriedade intelectual ou por
segredos de empresa, o chamado know-how.

A transferência de tecnologia, por sua vez, ocorre por cinco mecanismos principais,
conforme enumerado por Raphael Kaplinsky: parcerias constituindo subsidiárias ou joint
ventures, contratos de licenciamento, compra de equipamentos, compra de know-how, e
circulação de recursos humanos.37

A oportunidade de emparelhamento (cachting up) tecnológico para os países em


desenvolvimento surge a partir da existência de uma competição entre novas e velhas
tecnologias no interior dos países desenvolvidos. Normalmente existe um compromisso
nacional com as tecnologias já produzidas e instaladas, devido aos investimentos realizados,
mão-de-obra específica e o avançado processo de difusão interno, aliados à adaptação do
mercado também interno. Assim, as novas tecnologias enfrentam resistência e competem
internamente (quanto à sua difusão) em condições desvantajosas com as velhas, o que
incentiva o processo de transferência para outros países não comprometidos com tecnologias
anteriores.38

Segundo a evolução da trajetória tecnológica e o conceito de technological frontier


elaborados por Dosi, tem-se que um processo de transferência pode ter vantagens e requisitos
diversos para o país recebedor a depender do estágio em que a tecnologia se encontra. Chris
Freeman e Luc Soete descreveram as quatro fases do ciclo dos produtos39, desde sua criação,
passando pela introdução no mercado, até o alcance da maturidade, na qual a cadeia produtiva
e o produto em si já estão padronizados. Assim, ao traçar um plano de modernização a partir
de transferências de tecnologia, um país poderia visar se inserir em mercados já sólidos, ao
adquirir tecnologias próximas ao technological frontier, para a produção de bens maduros.
Uma operação desta natureza teria custos elevados, mas requisitaria poucos investimentos
adicionais em estrutura e pesquisa, pois inovações futuras não seriam necessárias. Por outro
lado, o país poderia objetivar se inserir em mercados totalmente novos, baseados em
tecnologias recém concebidas, com forte potencial evolucionário. O custo inicial seria mais
baixo, porém muitos investimentos em pesquisa, capacitação de profissionais e infraestrutura

                                                                                                                       
37
KAPLINSKY, Raphael. Technology Transfer, Adaptation and Generation. In: CHATTERJI, Manas (Ed.).
Technology Transfer in the Developing Countries. London: Macmillan Press, 1994. p. 20.
38
FREEMAN, Chris; SOETE, Luc. op. cit, ps. 612 e 613.
39
Ibidem, p. 615 et. seq.
  22  
 
seriam necessários para que a trajetória tecnológica prosseguisse, mantendo a competitividade
internacional.

Isto evidencia o papel duplo das transferências de tecnologia na tentativa de eliminar a


defasagem e a dependência tecnológica dos países em desenvolvimento. Por um lado, elas
visam atender à urgência do país em inserir-se em mercados concretizados, baseados em
produtos maduros, para recuperar a competitividade e suprir as demandas do mercado interno.
Por outro, visam incentivar o desenvolvimento de uma capacidade tecnológica nacional, que
possibilite o processo inovativo e o acompanhamento da evolução das chamadas tecnologias
de ponta, eliminando a dependência.

Para que a independência seja alcançada, não basta que o país recebedor realize apenas
o uso da tecnologia estrangeira, é preciso que esta seja efetivamente adotada e assimilada,
com vistas a dominá-la e aperfeiçoá-la. 40 O uso é a etapa inicial de um processo de
transferência, mas só haverá real difusão da tecnologia a partir do momento em que a empresa
ou país tiver total domínio da técnica obtida, sendo capaz de prosseguir na trajetória
tecnológica por conta própria e desfrutando dos benefícios de acumulação de melhoramentos
e desenvolvimento de complementos ou componentes. Caso contrário, a tecnologia obtida se
tornará rapidamente obsoleta e o país permanecerá eternamente dependente de novas
transferências.

Definindo-se transferência de tecnologia tem-se que “o fator importante é que o


recebedor adquira a capacidade de manufaturar por si mesmo um produto cuja qualidade seja
comparável ao manufaturado pelo fornecedor da tecnologia”.41

A efetiva transferência de tecnologia pode ser condicionada, portanto, a dois


elementos: a capacidade tecnológica da firma/país e o sucesso da operação de transferência
em si. Por capacidade tecnológica entende-se o potencial que a firma ou o país possui de
aproveitar os investimentos realizados, atingindo a máxima produtividade, ou seja, trata-se
habilidade em de lidar com as novas técnicas. Ela possui caráter cumulativo, de forma que
quanto maior a capacidade já existente, maior será o crescimento dessa capacidade após os

                                                                                                                       
40
Ibidem, p. 614.
41
Tradução livre de: “the importante factor is that the recipient acquires the capability to manufacture a product
whose quality is comparable to that manufactured by the technology supplier.” HAYDEN, apud HAUG, David
M. The international transfer of technology: lessons that east Europe can learn from the failed third
world experience. Harvard Journal of Law & Technology, V. 5, Spring Issue, 1992. p. 212.
  23  
 
investimentos em tecnologia, garantindo circunstâncias ainda mais vantajosas para
investimentos futuros.42

Dentro da perspectiva da empresa, a capacidade pode ser traduzida pela existência de


um comportamento tecnologicamente ativo durante e após o processo de transferência.43Isto
requer investimentos constantes em melhoramentos estruturais, pesquisa e profissionais
qualificados. No entanto, o desempenho das empresas depende diretamente da capacidade
tecnológica do pais como um todo. Além de recursos naturais, um país precisa de mão-de-
obra especializada, de uma economia atrativa aos investidores estrangeiros e de políticas que
incentivem o empreendedorismo e P&D (Pesquisa e Desenvolvimento). Segundo Nit
Chantramonklasri, mais do que se preocupar com as ações dos fornecedores de tecnologia, um
país que visa se tornar independente tecnologicamente necessita adotar medidas que gerem
demandas para as empresas nacionais, exigindo que obtenham ótimos resultados em termos
de conhecimento, habilidades e experiência adquiridas durante processos de transferência de
técnicas de produção.44

Ainda a respeito da necessidade de capacidade tecnológica no país, os baixos níveis de


educação não prejudicam apenas na formação de profissionais qualificados, mas também
impede o crescimento das demandas do mercado interno por produtos sofisticados,
desencorajando as poucas iniciativas empreendedoras. Também é possível afirmar que,
inexistindo formação profissional, a substituição de trabalhadores por novas tecnologias gera
desemprego, enquanto em um país tecnologicamente preparado, com a criação de demandas e
mercados, surgem outros setores empregatícios. Outro problema é a falta de um sistema legal
apto a fornecer segurança jurídica e flexibilidade para atrair investimentos ao mesmo tempo
em que protege os interesses nacionais, amparando as empresas locais ao fornecer ferramentas
negociais eficientes.45

Quanto ao sucesso da operação, o fator determinante é o bom andamento da


negociação para que as empresas nacionais desfrutem de condições positivas para a
assimilação da tecnologia. Infelizmente, isto não ocorre com facilidade, pois os países em

                                                                                                                       
42
CIMOLI, Mario; DOSI, Giovanni. op. cit., 1994. p.58
43
CHANTRAMONKLASRI, Nit. The Devvelopment of Technological anda Managerial Capability in The
Developing Countries. In: CHATTERJI, Manas (Ed.). Technology Transfer in the Developing Countries.
London: Macmillan Press, 1994. p. 37.
44
Ibidem, p. 49.
45
HAUG, David. op. cit, 1992. p. 225.
  24  
 
desenvolvimento encontram-se em uma posição frágil, possuindo baixo poder de barganha,
não apenas como decorrência da desvantagem econômica, mas principalmente pela falta de
técnica negocial e administração empresarial adequada.

Ainda, é inerente à transferência de tecnologia que os recebedores desconheçam


detalhes sobre o produto ou serviço que estão adquirindo, caso contrário a transferência não
seria necessária. Trata-se do paradoxo da informação, pelo qual importadores escolhem a
tecnologia com base em informações imperfeitas. 46 Logo, pouco se sabe sobre os pré-
requisitos necessários para a instalação da tecnologia, tampouco sobre a forma como esta
modificará a produção. Estes conhecimentos serão adquiridos apenas ao longo do processo, à
medida que familiaridade com a nova técnica for aumentando.47Esta falta de informação no
estágio inicial prejudica a habilidade negocial e muitas vezes acarreta na obtenção de
tecnologias obsoletas ou inadequadas para a realidade nacional.

Além disso, os detentores de tecnologia mesmo, após transferindo-a, não desejam


perder total controle sobre ela e ainda visam manter o domínio de mercado. Isto faz com que
frequentemente sejam impostas cláusulas restritivas nos contratos, que limitam as
possibilidades de desenvolvimento tecnológico autônomo por parte dos recebedores.

Sobre a posição negocial dos países em desenvolvimento, comenta Francisco Teixeira:

A forma pela qual os países periféricos estavam inseridos na economia


internacional, bem como a organização das instituições e mercados tecnológicos
também reforçam as relações de dependência. Consequentemente, o suprimento de
tecnologia, como foi observado, sempre é realizado de forma desvantajosa para os
países em desenvolvimento. Ou a tecnologia é fornecida em pacotes fechados, que
excluem a participação local no suprimento de insumos com conteúdos
tecnológicos, dessa forma limitando o aprendizado local, ou os termos contratuais
incluem cláusulas restritivas que impedem esforços inovadores na periferia.48

Uma transferência de tecnologia bem sucedida, ou seja, aquela que possibilita a


assimilação da tecnologia recebida e contribui pra a redução da dependência, depende da
reunião de esforços em dois sentidos: na construção de capacidade tecnológica e na criação de
mecanismos que melhorem a posição do recebedor na relação contratual. É essencialmente
                                                                                                                       
46
Ibidem., p. 224.
47
AASEN, Berit et. al. Analytical Perspectives on Technology Transfer. In: CHATTERJI, Manas (Ed.).
Technology Transfer in the Developing Countries. London: Macmillan Press, 1994. p. 32.
48
TEIXEIRA, Francisco L. C., Desenvolvimento Industrial e Tecnologia: Revisão da Literatura e uma
Proposta de Abordagem. Cadernos EBAPE.BR (FGV), Rio de Janeiro, 2005, p.8.
  25  
 
neste último ponto que residem os esforços nacionais e internacionais em regulamentar os
contratos envolvendo circulação de tecnologia, em suas diversas espécies, e que serão
detalhados no decorrer do presente trabalho.

1.3 Progresso tecnológico e desenvolvimento

Antes de prosseguir à análise da transferência de tecnologia e sua regulamentação, são


pertinentes algumas considerações a respeito do papel do progresso tecnológico para o
desenvolvimento nacional e sua relação com o Direito.

Conforme já demonstrado, o avanço tecnológico se revela indispensável para o


crescimento econômico, porém é preciso diferenciar os conceitos de crescimento e
desenvolvimento. Este último exige a combinação de melhorias sociais e econômicas,
considerando ainda o pleno exercício de liberdades políticas por parte da população e da
soberania por parte da nação. Já o crescimento econômico se refere a indicadores, como o
aumento do PIB, sem que haja um estudo sobre a distribuição de renda, a qualidade de vida
ou o nível educacional da população.49

Sob uma perspectiva internacional, o Direito ao Desenvolvimento foi reconhecido


oficialmente pela ONU, a partir da Resolução nº 4 de 21 de fevereiro de 1997 da Comissão de
Direitos Humanos. Trata-se de um direito de terceira geração, ao lado do direito à paz, ao
ambiente saudável e à equidade intergeracional.50

Com base no pensamento de Amartya Sen, célebre economista, desenvolvimento se


trata de liberdade, no sentido de que não basta o crescimento econômico, é preciso que os
diversos setores sociais progridam de modo a possibilitar a ampliação das liberdades
humanas. Para este autor:

O desenvolvimento requer que se removam as principais fontes de privação de


liberdade: pobreza e tirania, carência de oportunidades econômicas e destituição
social sistemática, negligência dos serviços públicos e intolerância ou interferência
excessiva de Estados repressivos. A despeito de aumentos sem precedentes na

                                                                                                                       
49
ROCHA, Thiago Gonçalves Paluma. O Nível de Proteção da Propriedade Intelectual Definido Pelo
Acordo TRIPS/OMC e o Direito ao Desenvolvimento. Uberlândia: Universidade Federal de Uberlândia,
2011. p. 61.
50
ROCHA, Thiago Gonçalves Paluma. op. cit. 2011. p. 53 – 55.
  26  
 
opulência global, o mundo atual nega liberdades elementares a um grande número
de pessoas. 51

Sen considera que o progresso tecnológico pode contribuir de forma contundente para
o incremento das liberdades, porém não de forma isolada, sendo necessários mecanismos que
o complementem. As riquezas geradas são importantes na medida das liberdades que ajudam
a obter, e ainda:

[...] há fortes indícios de que as liberdades econômicas e políticas se reforçam


mutuamente. [...] Analogicamente, oportunidades sociais de educação e assistência
médica, que podem requerer a ação púbica, complementam oportunidades
individuais de participação econômica e política e também favorecem nossas
iniciativas para vencer privações.52

Deste modo, as instituições sociais possuem um papel fundamental na promoção do


desenvolvimento, ao passo em que complementam as iniciativas individuais e permitem que
diversos setores sociais progridam em conjunto. Para North, “as instituições reduzem a
incerteza pelo fato de que proporcionam uma estrutura à vida diária”.53 Nesta perspectiva
encontra-se o Direito como um dos principais promotores do desenvolvimento, pois
estabelece limitações, garante liberdades e confere segurança.

Barral, em consonância com as posições anteriores, destaca fatores que considera


decisivos para o desenvolvimento: a) capital humano (população qualificada); b) liberdade
política e econômica; c) promoção de tecnologia e inovação; d) redução de custos de
produção e impactos ambientais; e) capital social (comprometimento com a comunidade); e f)
instituições fortes que articulem os fatores anteriores. E ainda, uma busca para obter estes
fatores implicaria em investimentos em educação e em melhores normas de propriedade
intelectual. 54

A respeito da importância do sistema jurídico, Barral justifica:

Primeiro, porque o sistema jurídico pode constituir um poderoso impeditivo a este


processo, se permitir instabilidade ou corrupção. Ainda, porque o sistema pode
compreender normas pouco claras e ineficientes, que criam custo para os contratos

                                                                                                                       
51
SEN, Amartya. Desenvolvimento como liberdade. São Paulo: Companhia das Letras, 2000. p. 18
52
Ibidem, p.10.
53
NORTH, apud. AREAS, Patrícia de Oliveira. Medidas Tecnológicas de proteção e desenvolvimento. In:
BARRAL, Welber; PIMENTEL, Luiz Otávio (Org). Propriedade Intelectual e Desenvolvimento,
Florianópolis: Editora Fundação Boiteux, 2007. p. 109.
54
AREAS, Patrícia. op. cit., 2007. p. 111.
  27  
 
privados. Finalmente, porque sistemas judiciais ineficientes provocam
consequências econômicas negativas, derivadas da incerteza jurídica e da
incapacidade de garantir o cumprimento de obrigações sociais e privadas.55

Assim, para este autor, a ordem jurídica precisa conjugar certos elementos para que
não constituía um empasse ao desenvolvimento. São eles: “regras claras e previsíveis;
tratamento equitativo dos cidadãos; necessidade de participação democrática; eficiência do
judiciário”. 56

Cabe destacar, que a posição das instituições jurídicas quanto à regulamentação das
atividades econômicas no contexto da globalização é diversa daquela apresentada no período
do Estado de bem-estar social. Pertinente é a crítica feita por José Eduardo Faria às
instituições regulamentadoras atuais:57

Concebidas mais com o propósito de evitar eclosão de conflitos do que em


estabelecer regras e procedimentos para que eles sejam dirimidos e decididos, essas
instituições não tem a pretensão de controlar ou regular os processos
socioeconômicos nem, muito menos, de impor fins aos seus participantes.
Basicamente, elas se limitam a neutralizar eventuais disfunções de mercado. É por
esse motivo que essas instituições estão voltadas menos à consecução de resultados
concretos obtidos por meio da disciplina conformadora, padronizadora e tipificadora
de comportamentos e mais, (...) à coordenação dos particularismos jurídicos, dos
microssistemas normativos com ritmos próprios de desenvolvimento e das diferentes
formas de legalidade desenvolvidas no interior de inúmeras cadeias produtivas que
constituem a economia globalizada.

O progresso tecnológico por sua vez, conforme indicado por Barral, também possui
papel fundamental para o desenvolvimento dos povos. A melhoria da eficiência da produção e
dos produtos, promove a ampliação dos mercados e a diversificação dos setores internamente,
o que por sua vez contribui para a distribuição de renda. Além disso, o conjunto de políticas
destinadas à promoção do progresso tecnológico, como investimentos em educação e
pesquisa, incrementam a qualificação da mão-de-obra. Especialmente, a construção de
capacidade tecnológica em um país, para possibilitar transferências de tecnologia bem
sucedidas, necessariamente implica em investimentos em diversos setores econômicos e
sociais.

Sobre a necessidade de regulamentação jurídica da tecnologia, conforme Manoel


Pereira dos Santos:
                                                                                                                       
55
BARRAL, Welber. apud AREAS, Patrícia. op. cit., 2007. p. 111.
56
AREAS, op. cit., 2007. p. 112.
57
FARIA, José Eduardo. O Direito na Economia Globalizada. São Paulo: Malheiros. 2002. p. 149.
  28  
 
A verdade é que a regulamentação da propriedade intelectual e da transferência de
tecnologia no comércio internacional conferiu a esta matéria uma dimensão
inteiramente nova. Hoje, estas questões dizem respeito mais ao processo de
regulação do mercado e menos aos interesses individuais dos agentes de produção e
circulação de bens. A globalização da economia revelou que os direitos imateriais
objetivam estabelecer um equilíbrio ideal, não apenas entre o interesse da
coletividade pela difusão do conhecimento, de um lado, e o interesse do particular
pela proteção de seu investimento, de outro lado, mas também dos agentes do
mercado de forma a assegurar o livre comércio e o desenvolvimento dos povos.58

Deste modo, a regulamentação da transferência de tecnologia não é apenas necessária


para a viabilização do crescimento econômico, mas essencialmente para conferir efetividade
ao Direito ao Desenvolvimento. A normativa nacional e a internacional devem buscar a
eliminação da dependência tecnológica dos países menos desenvolvidos, como forma de
reforçar a soberania e por conseguinte, a liberdade do país em relação à comunidade global.
Isto pode ser atingido através de normas e diretrizes que incentivem a efetiva difusão da
tecnologia, ao conferir negociabilidade aos países em defasagem.

Internamente, a legislação doméstica também deve garantir a difusão da tecnologia


para os diferentes setores, diversificando a economia e estimulando a distribuição de renda.
Ainda, os investimentos em educação e pesquisa devem ser constantes, para a qualificação
profissional e melhoria do nível educacional da população, e para permitir o intercâmbio de
conhecimentos entre a ciência e a tecnologia, de modo a fomentar o processo inovativo.
Todos estes esforços devem sempre estar em consonância com o ideal de ampliação da
liberdades humanas.

                                                                                                                       
58
PEREIRA DOS SANTOS, Manoel. apud CORRÊA, op. cit. p. 87.
  29  
 

2 CONTRATOS INTERNACIONAIS DE TRANSFERÊNCIA DE TECNOLOGIA

A difusão internacional da tecnologia, indispensável para o desenvolvimento de países


conforme explicitado no capítulo anterior, ocorre comumente por meio de contratos de
transferência de tecnologia. Para a definição das bases regulamentadoras ideais para estes
contratos, cabe primeiramente uma análise geral de suas características e principais espécies.

No presente capítulo serão apresentados conceitos e princípios relacionados aos


contratos internacionais em geral, notoriamente a autonomia da vontade, estabelecendo um
paralelo com as limitações impostas à liberdade das partes devido a questões de ordem
pública.

Serão também definidas as espécies de contratos de transferência de tecnologia


elencadas pela doutrina e pela legislação e por fim, as cláusulas e práticas abusivas e
restritivas usualmente impostas pelos fornecedores aos receptores da tecnologia e que
dificultam ou impedem a efetiva transferência, contribuindo negativamente para dependência
dos países menos desenvolvidos.

2.1 Contratos Internacionais: conceitos e princípios

Os contratos internacionais são caracterizados por elementos de conexão entre


ordenamentos jurídicos de dois ou mais países. Tais vínculos estão relacionados à execução
ou conclusão do contrato, ao domicílio, nacionalidade ou situação das partes ou ainda à
localização de seu objeto. No entanto, como bem frisa Irineu Strenger, não basta que algum
elemento do contrato esteja localizado em território estrangeiro, é necessário que esta
internacionalidade seja relevante o suficiente para causar uma diferenciação no regime deste
contrato em relação aos domésticos.59

Ainda, por estarem inseridos na realidade internacional, estes contratos são


influenciados por uma doutrina especializada, marcada por maior dinamismo e
interdisciplinaridade, considerando-se a variedade de fatores envolvidos na celebração e

                                                                                                                       
59
STRENGER, Irineu. Contratos Internacionais do Comércio. 4ª ed., São Paulo: LRT, 2003., p. 43.
  30  
 
execução do contrato. Assim, são levadas em consideração questões políticas, econômicas, de
ciências sociais, comércio exterior e relações internacionais.60

É fundamental destacar a importância destas questões interdisciplinares na


determinação dos contratos internacionais. Um contrato para ser considerado perfeito, ou seja,
equilibrado, precisa ser pactuado com base na boa-fé e na liberdade de contratar. No entanto,
para assegurar estas condições, é necessário que ambas as partes tenham conhecimento sobre
os detalhes a serem pactuados. No caso da transferência de tecnologia, a obtenção de
informações sobre o objeto, a forma de execução e demais elementos contratuais, possui custo
elevado, devido ao caráter técnico. Por isso, a avaliação dos custos e dos riscos que orientarão
a liberdade para contratar, será baseada em questões de ordem econômica, e não jurídica.61

Além disso, quanto aos contratos internacionais, a relação entre Estado e empresas é
muito estreita, de modo que os negócios jurídicos firmados têm repercussões políticas. Este
aspecto político tem relevância fundamental, conforme destaca César Flores62:

Mas um dos fatores mais relevantes não está explícito neste negócio jurídico
internacional – que consiste no interesse político numa relação comercial
internacional – cada vez mais integrada. O Estado soberano, que acolhe as
transnacionais está cada dia mais vinculado a esta estrutura macroeconômica e a
estes instrumentos jurídicos comerciais e de natureza privada.

Notoriamente nos casos dos contratos internacionais, tendo como objeto uma compra e
venda ou transferência de tecnologia, é evidente o interesse do Estado na sua regulação, por
razões de ordem política e econômica, muitas vezes opostas aos interesses das transnacionais,
gerando conflitos.

É por este motivo que existem esforços de Estados e organizações internacionais em


criar tratados e convenções objetivando uma regulamentação uniforme para estes contratos,
orientando a relação contratual e diminuindo o poder de determinação das empresas, com
vistas a promover o desenvolvimento.

Porém, o dinamismo e a agilidade das relações comerciais e internacionais não


conseguem ser acompanhados pela normativa nacional ou internacional, pois o processo

                                                                                                                       
60
Idem.
61
FLORES, César. Contratos Internacionais De Transferência De Tecnologia: Influência Econômica. Rio
de Janeiro: Lumen Juris., 2003., p. 28 e 29.
62
Ibidem, p. 38.
  31  
 
legislativo é notoriamente lento. Como o fator econômico é inerente aos contratos
internacionais, a ausência de normas específicas não pode entravar as relações contratuais,
sob pena de impedir operações comerciais importantes para o país.

Neste sentido o princípio da autonomia da vontade possui papel de destaque nas


relações contratuais internacionais, pois a possibilidade de escolha do direito aplicável pelas
partes garante eficiência e segurança ao contrato, tanto na sua conclusão, quanto na execução
e na solução de eventuais controvérsias.

Conforme Nádia de Araújo, este princípio possui três dimensões essenciais:


primeiramente, revela-se como um meio privilegiado para a seleção da lei estatal aplicável ao
contrato; por outro lado, significa a possibilidade para as partes de retirarem o contrato do
direito nacional; e por fim, pode ser visto como um instrumento de melhoramento do direito,
ao solucionar conflito de leis. Assim, a autonomia da vontade inserida em convenções
internacionais, visa à ampla aplicação da convenção, por se tratar de um princípio para a
solução de conflitos, de modo que, ao menos em sede arbitral, seria possível às partes
contratantes optar pela lei aplicável, afastando uma lei estatal específica ou até mesmo a
própria convenção.63

Na doutrina brasileira o princípio da autonomia da vontade é objeto de três correntes


distintas: a primeira que rejeita a sua adoção pelo ordenamento pátrio; a segunda que, embora
admita seu reconhecimento quanto a algumas cláusulas contratuais, limita-o em razão de
matérias de ordem pública; e a terceira, que entende que o Brasil deve seguir a tendência
internacional de ampla aplicação do princípio, incentivando as relações contratuais.64

Tal divergência doutrinária é alimentada pelo fato de que a Lei de Introdução ao


Código Civil de 1917 adotou expressamente o princípio da autonomia da vontade, ao
estabelecer regras de conexão em seu artigo 1365, porém facultando às partes disporem em
sentido contrário. No entanto, a Lei de Introdução de 1942, retirou tal expressão da redação
do artigo 9º66, não deixando clara a situação do princípio no direito brasileiro. Doutrinadores

                                                                                                                       
63
ARAÚJO, Nádia. Contratos Internacionais: Atonomia da Vontade, Mercosul e Convenções
Internacionais. 4ª ed., Rio de Janeiro: Renovar., 2009., p. 24.
64
FLORES, César. Op. cit., 2003., p. 54.
65
“Artigo 13. Regulará, salvo disposição em contrário, quanto à substância e aos efeitos das obrigações, a lei do
lugar onde foram contraídas.”
66
“Art. 9º Para qualificar e reger as obrigações, aplicar-se-á a lei do país em que se constituirem.”
  32  
 
favoráveis à autonomia, como Irineu Strenger, Luís Olavo Baptista e Jacob Dolinger67,
afirmam que a omissão da Lei de Introdução não significa a proibição do princípio como
regra de conexão, e que sendo uma prática amplamente utilizada internacionalmente,
configuraria um sério atraso rejeitá-la.

Como a Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro repetiu a disposição da Lei


de 1942, a controvérsia persiste, sendo que a jurisprudência ainda não se pronunciou a
respeito, limitando-se a aplicar a regra do artigo 9º.

Assim, embora não haja no país uma aplicação ampla do princípio da autonomia da
vontade, a força econômica dos contratos e as pressões internacionais, fazem com que
inevitavelmente seja concedida cada vez mais liberdade às partes. Notoriamente em relação
aos contratos de transferência de tecnologia, nos quais exige-se que o recebedor ofereça
facilidade e agilidade para contratar como atrativo aos investidores, mecanismos
superprotetivos devem ser evitados. Apesar da herança protecionista brasileira, avanços
importantes foram feitos, como a Lei de Arbitragem de 1996, que permite às partes a opção
pela lei aplicável, e o deslocamento da função reguladora, na seara do Direito Econômico, dos
contratos de transferência de tecnologia do INPI para o CADE, como será abordado no
capítulo seguinte.

O estudo aprofundado sobre as implicações do princípio da autonomia da vontade foge


ao escopo do presente trabalho, no entanto, cabe aqui destacar que sua adoção jamais poderá
significar desrespeito a matérias de ordem pública, pois isto significaria violação à soberania
nacional. Como ordem pública, pode se entender as bases principiológicas entendidas como
os valores máximos de um ordenamento jurídico, configurando normas imperativas de jus
cogens.

A salvaguarda do sistema econômico interno, é classificada dentro da ordem pública, e


por isso, constitui um dos motivos relevantes para a interferência estatal em matéria
contratual. É neste sentido que o as normas reguladoras dos contratos de transferência de
tecnologia devem se basear, pois cláusulas abusivas e restritivas frequentemente impostas
pelos ofertantes, tendem a impedir ou dificultar a efetiva transferência de tecnologia,
acarretando em um incremento da dependência tecnológica e econômica.

                                                                                                                       
67
ARAÚJO, Nádia. Op. cit., 2009., p. 112 et seq.
  33  
 
No entanto, justamente em atenção ao sistema econômico, a regulamentação deve ser
moderada, no sentido de garantir o equilíbrio contratual ao mesmo tempo em que não
constitui entrave aos investimentos, evitando ir em desencontro às práticas internacionais.
Neste sentido, o reconhecimento da autonomia da vontade não constitui ameaça aos interesses
nacionais, visto que constitui essencial mecanismo internacional de conexão de ordenamentos
jurídicos que aperfeiçoa os contratos internacionais, e que os filtros estabelecidos pela ordem
pública continuarão a ser aplicados.

Por fim, cabe frisar que pela experiência dos países mais desenvolvidos, especialmente
os Estados Unidos e os da União Europeia, existe uma tendência à valorização da autonomia
da vontade, mesmo em detrimento de preceitos de ordem pública, à medida que o país
intensifica suas relações contratuais internacionais, pois os efeitos observados foram
benéficos.68

2.2 Contratos internacionais de transferência de tecnologia: características e espécies

De acordo com César Flores69, os contratos de transferência de tecnologia podem ser


classificados como: bilaterais, comutativos, onerosos, mistos quanto à liberdade de contratar
e relativamente formais.

A bilateralidade é evidente pois nestes contratos são estabelecidas obrigações para


ambas as partes. O fornecedor da tecnologia, além da transferência do produto ou
conhecimento objeto principal do contrato, também se compromete a possibilitar seu efetivo
uso pelo outro contratante, devendo assim prestar informações, assistência técnica, fornecer
treinamento de pessoal, dentre outras possibilidades. Já o recebedor se compromete não
apenas ao pagamento do preço ajustado, mas a outras obrigações características destes
contratos, como a de manter sigilo, de informar sobre possíveis melhoramentos realizados na
tecnologia recebida ou de prestar auxílio.

Por comutatividade entende-se que no momento da formação do contrato, as partes


possuem conhecimento das prestações devidas umas às outras. Em sede de transferência de

                                                                                                                       
68
Sobre o princípio da autonomia da vontade no direito comparado, vide ARAÚJO, Nádia. Op. cit., 2009., p. 55
et seq.
69
FLORES, César. Op. cit., 2003., p. 75.
  34  
 
tecnologia, embora seja identificável a existência de comutatividade, esta se encontra
comprometida, devido ao paradigma da informação. Ou seja, geralmente a parte recebedora
não é ciente dos requerimentos necessários para a implantação e desenvolvimento de uma
tecnologia, de modo que permanece parcialmente ignorante sobre as dimensões e as
implicações das obrigações que contraiu e que lhe são devidas.

Ainda, estes contratos são geralmente onerosos, porém não obrigatoriamente. Existem
Organizações Internacionais comprometidas com o desenvolvimento por meio da difusão de
tecnologia, que promovem contratos de transferência gratuitos. Ainda, é possível a ocorrência
de gratuidade por cláusula expressa em caso de contratos entre matrizes e filiais.

Quanto à liberdade para contratar, apesar das limitações derivadas de preceitos de


ordem pública exprimidas em normas regulamentadoras e à proteção conferida à propriedade
intelectual, existe grande margem para negociação, devido à ausência de tipificação e à
grande variedade de obrigações possíveis. Pelo mesmo motivo, são contratos relativamente
formais, pois incompatíveis com a imposição de forma específica em todas as suas espécies.

Os contratos de transferência de tecnologia tem como objeto a transmissão de


conhecimentos aplicáveis ao processo produtivo, ou técnica de serviço, conforme a definição
de tecnologia apresentada anteriormente. Porém, a depender das características de
apropriabilidade e cumulatividade da tecnologia, sua difusão por transferência será mais ou
menos possível. Os conhecimentos deverão ser apropriáveis e cumulativos o suficiente para
dificultar a imitação, mas também devem representar um conjunto passível de ser transmitido
através de maquinários, instrumentos e informações. Deste modo, devem construir segredos
de empresa ou estar protegidos por direitos de propriedade intelectual.

Nas palavras de Daniel Corrêa70:

A tecnologia quando considerada objeto de uma transferência de tecnologia,


consiste no conjunto de conhecimentos secretos ou de difícil acesso, aplicáveis à
atividade produtiva. Aqui há uma qualidade a mais na tecnologia: a restrição à
circulação e ao acesso que se verifica tanto nos segredos quanto nos direitos de
propriedade intelectual, pois a tecnologia a que todos têm acesso não se torna
mercadoria por faltar interesse comercial incidente sobre si.

A tecnologia a ser transferida deverá ter valor de mercado, se comportando como uma
mercadoria. No entanto, não se pode afirmar que exista um comércio de tecnologia, pois não

                                                                                                                       
70
CORRÊA, Daniel. Op. cit., 2005., p. 99.
  35  
 
ocorre modificação na propriedade do bem, apenas uma comunicação. O contratante
fornecedor continua detendo os conhecimentos compartilhados, no caso de transferência de
know-how, e continua titular da técnica patenteada, no caso dos licenciamentos.

César Flores enumera algumas disposições que devem estar inseridas nos contratos de
transferência de tecnologia71:

Apesar de algumas variantes, os contratos de transferência de tecnologia deverão


apresentar: a) objeto e finalidade de aplicação do produto; b) treinamento do pessoal
especializado e as respectivas condições de treinamento; c) condições da assistência
técnica; d) controle de qualidade do produto licenciado, bem como o
estabelecimento de regras referente ao aperfeiçoamento do produto transferido; e)
responsabilidade pela confidencialidade do produto; e f) responsabilidade tributária.

Ainda, segundo o mesmo autor, a depender das características do objeto,


especialmente quanto a existência ou não de proteção conferida por direitos de propriedade
intelectual, as espécies contratuais serão diversas. 72

As tecnologias protegidas por direitos de propriedade industrial podem ser objeto de


contratos de licenciamento ou cessão de direitos. No licenciamento o detentor da patente
mantém sua titularidade, porém permite o seu uso ou gozo pelo contratante, normalmente
recebendo royalties a título de pagamento. Já na cessão, a titularidade da técnica é transmitida
pelo cedente, seja de uma patente já outorgada pelo Estado ou de um conhecimento que,
embora reconhecido pelo direito de propriedade industrial, ainda não tenha título constituído.

É necessário ressaltar que contratos de licenciamento ou cessão direitos possuem


eficácia submetida à territorialidade, uma vez que a outorga de direito de propriedade
industrial depende do Estado. Assim, seu reconhecimento estará adstrito ao seu território, ou
dependente de convenções e tratados internacionais bilaterais e multilaterais, para a proteção
internacional. Além do próprio alcance dos direitos de propriedade industrial, a parte
licenciante pode inserir cláusulas limitadoras de territorialidade, podendo dispor ainda sobre a
existência ou não de exclusividade na exploração.

Nas demais hipóteses de contrato de transferência de tecnologia, nas palavras de Denis


Barbosa, “não se paga pelo direito de usar uma tecnologia mas pela própria tecnologia, ou
pelos produtos de sua aplicação.” 73

                                                                                                                       
71
FLORES, César. Op. cit., 2003., p. 83.
72
Ibidem, p. 85.
  36  
 
O contrato de transferência de know-how tem como objeto um conhecimento aplicável
“que não é do saber geral”74 não constituído em título de patente. Assim, não há titularidade
de um direito de propriedade industrial, mas sim a posse de um conhecimento secreto que
constitui bem imaterial passível de ser transmitido. O pagamento neste caso geralmente ocorre
mediante valor fixo ou percentual, sendo semelhante à cessão de direitos, pois o cedente se
compromete a não mais utilizar o know-how em competição com a outra parte. Além desta
hipótese de cessão de bem móvel, um contrato de know-how também pode ter natureza
jurídica de contrato de empreitada, no caso de fornecimento de assistência técnica.

Um ponto distinto importante entre os contratos de cessão de patente e de know-how,


é que os primeiros estão adstritos a uma proteção temporária, enquanto o know-how, por não
depender da outorga de patente pelo Estado, constitui em uma proteção de fato, e portanto por
tempo indeterminado. As proteção neste caso depende da manutenção do sigilo, conforme
disposição contratual.75 Assim, não há qualquer garantia para o possuidor de um segredo
industrial contra invenções autonomamente desenvolvidas por terceiros, podendo ser privado
de utilizá-lo devido à oposição de uma patente posteriormente concedida. Por este motivo, a
opção pelo segredo é mais viável quando pela natureza da inovação a proteção por título se
revela um inconveniente.76

O know-how também poderá ser objeto de contratos de licença, inexistindo aqui a


cláusula de não exploração por parte do licenciante. Nestes contratos é frequentemente
inserida cláusula de sigilo, de modo a garantir que o conhecimento não será divulgado a
terceiros e será utilizado somente conforme os limites contratuais estabelecidos. Esta forma de
contratação é por prazo limitado, podendo ser convertida posteriormente em cessão de know-
how, com o término da vigência da cláusula de não comunicação a terceiros.

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                     
73
BARBOSA, Denis Borges. Tipos de Contratos de propriedade industrial e transferência de tecnologia.
Disponível em: <http://www.denisbarbosa.addr.com/paginas/200/propriedade.html>., 2002. Acesso em:
novembro de 2014.
74
FLORES, Nilton Cesar da Silva. Da cláusula de sigilo nos contratos internacionais de transferência de
tecnologia – know-how. Florianópolis: Universidade Federal de Santa Catarina, Centro de Ciências Jurídicas,
Curso de Pós-Graduação em Direito., 2006., p.57.
75
Ibidem., p. 59.
76
Conforme César Flores: “Logo, a opção pelo segredo de fábrica só se torna atrativo quando a patente do
conhecimento é duvidosa. Também nas invenções patenteáveis que poderão ser facilmente violadas e
dificilmente comprovadas ou nas invenções que apresentam tecnologia de dupla finalidade – militar e pacífica
– cuja ameaça à paz seja significativamente relevante que compense medidas de segurança máxima para a
manutenção de tal segredo.” FLORES, César. Op., cit., 2003., p. 83.
  37  
 
Importante ressaltar que os contratos de transferência de tecnologia podem apresentar
formas mistas, tendo como objeto patentes e know-how e combinações de cessões e
licenciamentos. Sendo ainda possível a ocorrência de licenças recíprocas, em caso de
cooperação entre empresas.

Acordos de licença, seja de patentes, know-how ou na forma de assistência técnica,


apresentam vantagens importantes para o recebedor da tecnologia, tanto para a iniciativa
privada, quanto para o poder público, pois são flexíveis quanto à escolha do que será
licenciado e oferecem margem para negociação.

Conforme David Haug77:

Of the various methods of transfering technology internationally, licensing is the


most versatile. It offers flexibility in technology choice and an oppotunity for the
source and the receiving institution to negotiate. Technology license agreements
also enable a forein licensor to reap profits from the transfer of technology without
risking capital in a sometimes volatile foreing market.

Uma modalidade comum são os contratos de engenharia, também chamados de


contratos de projetos ou turn-key. Aqui o adquirente da tecnologia contrata a implantação de
todo o complexo tecnológico, de modo que o fornecedor entrega a instalação pronta, com
todos os equipamentos e transfere as informações necessárias de manutenção. É necessária a
transferência de know-how, ou até mesmo licenciamento de patentes, e podem ser inseridas
cláusulas de assistência técnica. Estes contratos foram amplamente utilizados na década de
1970 e apresentaram a desvantagem de não permitirem aos países menos desenvolvidos a
possibilidade de selecionarem as tecnologias e componentes que realmente necessitavam, pois
as multinacionais já apresentavam o pacote completo.78

Os contratos de projetos ou pacotes completos, podem assumir particularidades, sendo


denominados contrato “produit en mains”, quando a empresa estrangeira precisa garantir o
sucesso de certa produção e promover treinamento de pessoal, ou ainda contrato “marchés en
mains”, quando o fornecedor ainda precisa realizar a comercialização efetiva dos produtos,

                                                                                                                       
77
“Dos vários métodos de transferir tecnologia internacionalmente, licenciamento é o mais versátil. Ele oferece
flexibilidade na escolha da tecnologia e uma oportunidade para a fonte e a instituição recebedora de
negociarem. Acordos de licença de tecnologia também permitem ao licenciante estrangeiro tolher lucros da
transferência de tecnologia sem arriscar o capital em um mercado estrangeiro algumas vezes volátil.”
(Tradução livre para o português) HAUG, David. Op. cit., 1992., p. 214.
78
Idem.
  38  
 
assegurando sua compra. 79 Estas particularidades foram inseridas como tentativa de
minimizar a dependência tecnológica muitas vezes derivada de um contrato turn-key
convencional.

Os contratos de licenciamento de marcas também se inserem no âmbito da


transferência de tecnologia, devido ao padrão de qualidade associado à marca. Assim, para a
manutenção deste padrão, o fornecedor precisa transmitir o know-how e oferecer assistência
técnica ao licenciado.

Outro contrato que permite a transferência de técnicas é o de cooperação técnico-


industrial ou tecnológica, visando ao fornecimento de informações de engenharia para a
produção de bens de capital. É comum a contratação por parte do poder público, para o
incremento da indústria nacional, pelo prazo médio de cinco a sete anos, a depender da
capacidade de assimilação da tecnologia oferecida. Nestes contratos não há transferência
direta, mas sim uma cooperação informativa para auxiliar no processo implementação de uma
tecnologia previamente obtida.80

Já os contratos de fornecimento de tecnologia tratam-se de cessão definitiva de know-


how ou direitos patenteados, associada a informações técnicas detalhas que permitam sua
assimilação efetiva, de modo que o recebedor possa desfrutar de todas as suas vantagens.81

Há também a modalidade de contrato de show-how, assim denominado pela prática


internacional, tratando-se de uma prestação de serviço de assistência técnica para que a parte
contratante tenha acesso a estudos e projetos. Para o ordenamento brasileiro trata-se de
hipótese de contrato de know-how.

De um modo geral, é de interesse das transnacionais conquistar e controlar novos


mercados por meio de investimentos, mas evitando o fortalecimento da concorrência. Por este
motivo, as transferências de tecnologia ocorrem mais facilmente para subsidiárias totalmente
controladas, franquias ou ainda mediante a formação de joint-ventures.

Os contratos de franquia implicam em transferência de tecnologia, pois o franqueado


deverá estar capacitado ao desempenho da atividade do franqueador, mantendo o padrão de

                                                                                                                       
79
MELLO, Celso D. de Albuquerque. Direito Internacional Econômico. Rio de Janeiro: Renovar, 1993., p.
183.
80
FLORES, Nilton César da Silva. Op. cit., 2006., p. 82.
81
Ibidem., p. 83.
  39  
 
qualidade da marca. Assim, estarão envolvidos licenciamentos de know-how, serviços de
assistência técnica, cooperação, dentre outros. Mesmo se tratando da mesma sociedade
empresária, com produtos e técnicas idênticas em vários países, existe independência
administrativa e sempre são preservadas características locais para a inserção no mercado, daí
a relevância desta forma de difusão de tecnologia internacionalmente.

Nos países em via de desenvolvimento as joint-ventures são constituídas com o


objetivo de cooperação industrial para possibilitar o domínio de atividades econômicas com
importância crescente, além de facilitar a regulamentação dos investidores estrangeiros, que
passam a fazer parte do plano de desenvolvimento nacional.82 A tecnologia será transferida
através de comunicação de técnicas, treinamento de pessoal e suporte operacional contínuo.

Por fim, tem-se os contratos de informática com tecnologia agregada, regidos pela Lei
9609/98 que confere proteção específica ao software. Nestes contratos, além dos componentes
imateriais, como softwares, programas e arquivos, podem estar incluídos componentes
materiais, como as partes de um computador, ou componentes intermediários que também,
agregam tecnologia, como os chips.

A prática do INPI reconhece oito tipos diversos de contrato, promovendo a devida


averbação ou registro, segundo o Ato Normativo 15/197583 e o Ato Normativo 135/9784: a)
cessão de patentes; b) exploração de patentes (licenciamento); c) cessão de marcas; d) uso de
marcas; e) fornecimento de tecnologia (definidos como sendo de transferência de know-how);
f) prestação de serviços de assistência técnica e científica; g) franquia; e h) participação nos
custos de pesquisa e desenvolvimento tecnológico.85

                                                                                                                       
82
STRENGER, Irineu. Op. cit., 2003., p. 430.
83
Ato Normativo nº 15, de 11 de setembro de 1975 - Os contratos de transferências de tecnologia e correlatos
são classificados basicamente, quantos ao seu objetivo e para fins de averbação, em cinco categorias: a) de
licença para exploração de patente; b) de licença para uso de marca; c) de fornecimento de tecnologia
industrial; d) de cooperação técnico-industrial e e) de serviços técnicos especializados; (...).
84
Ato normativo nº 135 de 1997: 2. O INPI averbará ou registrará, conforme o caso, os contratos que impliquem
transferência de tecnologia, assim entendidos os de licença de direitos (exploração de patentes ou de uso de
marcas) e os de aquisição de conhecimentos tecnológicos (fornecimento de tecnologia e prestação de serviços
de assistência técnica e científica), e os contratos de franquia.
85
O rol de contratos de transferência de tecnologia estabelecido pelo Ato Normativo 15/1975 foi posteriormente
reduzido, como parte das medidas liberalizantes adotadas no contexto político para estimular a economia
nacional. Porém na prática, as espécies continuaram as mesmas, de modo que atualmente o INPI promove o
registro dos seguintes contratos: cessão ou exploração de patentes; cessão ou uso de marca; fornecimento de
tecnologia; prestação de serviços de assistência técnica; e franquia (embora este último não seja expressamente
classificado como te transferência de tecnologia).
  40  
 
Os contratos de transferência de tecnologia podem ser classificados em verticais e
horizontais. Os primeiros envolvem cessões ou licenciamentos que são realizados para que o
recebedor, geralmente não concorrente, utilize a técnica para a produção e comercialização de
um produto. Já os contratos horizontais são resultado de cooperação entre concorrentes,
estabelecendo uma união de forças, como é o caso das joint-ventures.

Finalmente, importa ressaltar mais uma vez que, devido as inúmeras possibilidades
encontradas na prática comercial e empresarial internacional, as espécies contratuais não são
rígidas, existindo grande margem para negociação. Porém, esta negociação deve sempre estar
em consonância com o equilíbrio contratual e com as suas finalidades, qual seja, a
transferência de tecnologia. Por este motivo, práticas abusivas e cláusulas restritivas que
obstam a efetiva transferência devem ser coibidas, sendo necessária a regulamentação estatal
e internacional.

2.3 Cláusulas restritivas e práticas abusivas

Devido ao desequilíbrio tecnológico existente entre países desenvolvidos e países em


vias de desenvolvimento, os contratos de transferência de tecnologia muitas vezes são
celebrados em condições desfavoráveis para os recebedores.86 As transnacionais fornecedoras
não desejam perder o controle sobre a técnica exportada e ainda visam manter hegemonia no
mercado internacional. Por este motivo, é frequente a adoção de práticas que inviabilizam a
efetiva transferência de tecnologia e contribuem para a manutenção da dependência.

Tais práticas podem constituir hipóteses de abuso de direito, quando restringem de


forma excessiva o uso da tecnologia recebida, causando desequilíbrio contratual, ou ainda de
imposições anticoncorrenciais, quando impedem o exercício da livre concorrência. Esse

                                                                                                                       
86
Gustavo Guedes cita como exemplo que “detentores de patente frequentemente impõem em licenças
voluntárias restrições às exportações do produto licenciado, e que isto limita a possibilidade do licenciado de
auferir ganhos econômicos provenientes de economia de escala em suas instalações produtivas.” FURTADO,
Gustavo Guedes. Op. cit., 2012., p. 68.
  41  
 
abuso, nas palavras de Remiche e Cassier: “C’est l’abus d’une autre liberté, la liberté de
contracter, au détriment de la liberté de concurrence, qui sera combattu.” 87

As cláusulas são proibidas por abuso de direito de propriedade industrial, quando o


titular extrapolar os limites de seu direito, exagerando o monopólio conferido pela patente ou
quando incorrer em desvio de finalidade. Nas palavras de Dênis Barbosa88:

A doutrina do abuso de direitos de patente parte do princípio que a propriedade em


geral, e especialmente a propriedade industrial, tem uma finalidade específica, que
transcende o simples interesse egoístico do titular. (...) O abuso pode-se dar no plano
funcional, e atinge a finalidade da instituição do privilégio: concedido para estimular
o investimento industrial, passa a assegurar somente a importação, reduzindo a
industrialização interna.

Em uma perspectiva constitucional brasileira, o direito à propriedade está limitado


pela função social. Assim, o direito à propriedade industrial reconhecido por uma patente
possui o fim mediato de garantir o desenvolvimento econômico e social do Brasil. Por este
motivo, um comportamento por parte do titular que inviabilize a evolução tecnológica do
setor industrial ou de serviços, implica em desvio de finalidade, e por conseguinte, em abuso
de direito.

Outra hipótese de abuso ocorre quando o titular do direito, sem extrapolar as


delimitações da patente, utiliza-se de seu poder econômico e de sua posição dominante no
mercado para impor condições desfavoráveis ao outro contratante, restringindo a
concorrência.89 A configuração de abuso de poder econômico requer que a empresa em
posição dominante no mercado relevante90 utilize-se de estratégias para prejudicar a livre
concorrência e beneficiar-se de um monopólio.

O poder econômico é considerado como inerente e necessário ao mercado capitalista,


por isto é tolerado pelo ordenamento jurídico dentro de certos limites, impostos pelo direito
concorrencial. Por isso seu abuso diverge da teoria geral do abuso de direito, aplicável à
                                                                                                                       
87
“É o abuso de uma outra liberdade, a liberdade de contratar, em detrimento da concorrência, que será
combatido” (Tradução nossa). CASSIER, Vincet; REMICHE, Bernard. Droit des brevets d’invention et du
savoir-faire. Bruxelas: Larcier. 2010. p. 13.
88
BARBOSA, Denis Borges. Uma introdução à propriedade industrial. Rio de Janeiro: Lumen Juris., 2ª ed.,
2003., p. 413.
89
Ibidem., p. 444.
90
No Guia para Análise Econômica de Atos de Concentração Horizontal (Portaria Conjunta SEAE/SDE nº 50,
de 1º de agosto de 2001) tem-se que: “o mercado relevante é definido como o menor grupo de produtos e a
menor área geográfica necessários para que um suposto monopolista esteja em condições de impor um
“pequeno porém significativo e não transitório” aumento de preços.” (Guia-H, §29) [SSNIP]
  42  
 
propriedade intelectual, porque aqui existe a concessão de um direito exclusivo, que por si só
constitui exceção à livre concorrência.91

Considerando-se o pioneirismo na matéria e a influência dos Estados Unidos no direito


de concorrência brasileiro, são necessários alguns apontamentos sobre a evolução da doutrina
e jurisprudência daquele país quanto as práticas abusivas em contratos.

O debate entre Direito de Propriedade Intelectual e Direito Antitruste surgiu nos


Estados Unidos logo após a aprovação do Sherman Act (Lei Antitruste) em 1890. Inicialmente
entendia-se que o direito da concorrência não poderia limitar o monopólio concedido por uma
patente. Porém, a partir de 1912, no caso Standard Sanity Mfg. Co. v. United States92, foi
admitida a interferência da defesa da concorrência no direito de propriedade intelectual. Neste
segundo momento, os dois corpos de leis eram entendidos como esferas separadas, sendo que,
enquanto uma conferia o direito a um monopólio, a outra objetivava quebrá-lo. A solução
encontrada foi considerar o monopólio do titular da patente como uma exceção à lei antitruste,
assim a intervenção desta lei só seria justificável quando fossem extrapolados os limites do
título.93

Uma patente possui limites determinados pela descrição da invenção contida no título,
assim o alcance da proteção está circunscrito ao detalhamento da técnica patenteada,
conforme as exigências da lei. Como consequência disso, algumas práticas podem ser
consideradas ilegais por sua própria natureza, já que visam agregar elementos externos à
patente dentro da esfera do monopólio.

A Divisão Antitruste do Departamento de Justiça dos Estados Unidos identificou na


década de 1970 nove práticas a serem vedadas em contratos de licenciamento de propriedade
industrial, por serem consideradas abusivas e anticoncorrenciais. Estas disposições contratuais
ficaram conhecidas como “Nine No-No’s”: a) venda casada; b) tie-outs; c) provisões não
razoáveis de royalties; d) restrições de uso, mercado e território; e) restrições de preço,
                                                                                                                       
91
Além do abuso de poder econômico, existe o paralelo abuso de posição dependente, reconhecido
expressamente nas legislações Francesa, Italiana, Alemã e Portuguesa. Trata-se de hipótese em que uma
empresa, embora não em condição dominante no mercado relevante “esteja em condição de determinar, nos
negócios comerciais com uma outra empresa, um excessivo desequilíbrio de direitos e obrigações. A
dependência econômica é avaliada tendo em conta ainda a real possibilidade da parte que sofreu o abuso de
buscar alternativas satisfatórias no mercado”. (Tradução livre do italiano para o português). DI LORENZO,
Giovanni. Abuso di dipendenza econômica e contratto nullo. Padova: CEDAM, 2009. p. 18.
92
226 U.S. 20 (1912).
93
TIMM, Luciano Benetti. Contrato internacional de transferência de tecnologia no Brasil: intersecção da
propriedade intelectual com o direito antitruste. Porto Alegre: III Prêmio SEAE., 2008., p. 35 – 37.
  43  
 
quantidade ou venda; f) exclusividade e pacote de licenças obrigatórias; g) grantbacks; h)
restrições sobre a venda de produto derivado de patente de processo; e h) licenciamento
cruzado e pool de patentes.94

A primeira delas é a venda casada (trying arrengements) que impõe ao licenciado a


aquisição de outras tecnologias, bens ou serviços, dos quais não necessite, como condição
para o recebimento da tecnologia objetivada.

Tie-Outs são acordoa que proíbem o licenciado de negociar ou desenvolver tecnologia


concorrente ainda que fora do âmbito da patente licenciada. Tal dispositivo constitui entrave a
contratos de produção ou vendas de tecnologias similares e ainda restringe a liberdade de
investimento em P&D, fazendo com que o recebedor esteja constantemente dependente da
tecnologia licenciada.

Como resultado da disparidade existente entre fornecedor e recebedor de tecnologia,


muitas vezes os royalties são acordados de forma desproporcional (royalty provisions not
reasonably), constituindo abuso de direito por tornar o contrato excessivamente oneroso para
o licenciado. O preço abusivo ocorrer ainda de forma indireta, através da venda casada.

As restrições de uso, mercado e território normalmente são inseridas nos contratos de


transferência de tecnologia, essencialmente na modalidade de licenciamento, como forma de
evitar o incremento da concorrência, possibilitando ao detentor da tecnologia a manutenção
do poder de mercado. As mais comuns são as restrições às exportações, para evitar
competição a nível internacional. Esta cláusula desconsidera inclusive a discricionariedade
dos Estados nacionais para reconhecerem ou não um título de patente concedido por outro
país, violando os limites territoriais do direito de propriedade industrial.

Quanto às restrições de preço, quantidade ou venda, o abuso consiste na imposição de


uma regulamentação indevida sobre a inserção dos bens no mercado, produzidos a partir da
tecnologia transferida. Aqui também podem ser inseridas as cláusulas de restrições sobre a
venda de produto derivado processo patenteado. Nesta hipótese a tecnologia licenciada se
refere ao processo produtivo apenas, não sendo legítima a limitação de vendas bens
produzidos, vez que não estão inseridos no âmbito da patente.

                                                                                                                       
94
FURTADO, Gustavo Guedes. Op. cit., 2012., p. 37 et seq.
  44  
 
As cláusulas de exclusividade e pacotes de licença obrigatórias forçam o adquirente a
obter a licença de muitas patentes relativas à mesma tecnologia, normalmente quanto a
componentes e complementos. Muitas vezes contribuem para a imposição de preço abusivo e
ainda levam à aquisição de tecnologias desnecessárias ou inadequadas.

Grant-back trata-se de uma cláusula de cessão exclusiva, que obriga o recebedor a


transferir de forma exclusiva ao detentor quaisquer melhoramentos que tenha realizado na
tecnologia licenciada. Constitui um meio indevido de apropriação das inovações alheias.

Licenciamento cruzado e pool de patentes (cross-licencing e Patent Pooling) são


cláusulas que exigem o licenciamento de muitas patentes para que a tecnologia visada seja
corretamente assimilada. O licenciamento não é imposto diretamente, mas a existência de
títulos de patente sobre componentes ou complementos acaba acarretando em restrições
territoriais, quantitativas ou ainda de preços e mercados, de forma que o adquirente se vê
obrigado a realizar novas licenças.

Outra importante condição contratual restritiva são os dispositivos que vedam ao


licenciado a possibilidade de impugnar a validade da patente. O caráter abusivo de tal
imposição é evidente principalmente nas situações em que o contrato é celebrado antes da
realização do exame patentário, quando existe a oportunidade de questionamento inclusive
para terceiros.

Ainda seguindo a trajetória do direito norte-americano sobre o assunto, em meados da


década de 1970, muitas críticas foram direcionadas ao modelo de separação entre o direito
antitruste e o direito de propriedade intelectual. A Escola de Chicago defendeu a análise
econômica de ambos os sistemas, e concluiu que possuíam finalidades convergentes e não
opostas, pois objetivavam igualmente o crescimento da economia e o amparo do mercado
consumidor. Apontaram então, que os contratos envolvendo direito de propriedade intelectual
deveriam ser regulados pela lei concorrencial assim como qualquer outro contrato, por meio
da regra da razão. Esta regra trata-se de uma análise do caso concreto para identificar as
práticas que efetivamente prejudicam a livre concorrência, a partir de uma avaliação de custos
e preços.95 Assim, atualmente, as ilegalidades não são apontadas simplesmente identificando-
se as cláusulas anticoncorrenciais per se, mas analisando-se cada contrato, com base no

                                                                                                                       
95
TIMM, Luciano Benetti. Op. cit., 2008., p. 38 – 40.
  45  
 
mercado relevante da relação contratual e no poder de mercado e poder econômico das
partes.96

Assim, partiu-se da teoria do abuso de direito de patente para a teoria do abuso de


poder econômico. As cláusulas a serem vedadas não seriam apenas aquelas que exageravam o
direito ao monopólico conferido conforme os limites do título de patente, mas essencialmente
aquelas que importariam em prejuízos de fato para a livre concorrência.

Todas estas práticas restritivas e parâmetros de análise apontados pela doutrina norte-
americana serviram como base para a elaboração de documentos internacionais que visavam
assegurar aos estados signatários maior equilíbrio contratual ao estabelecer normas
regulamentadoras para os contratos de transferência de tecnologia, em atenção ao diferente
poder de barganha dos países. É o caso do Código de Conduta de Transferência de Tecnologia
(TOT Code) elaborado pela UNCTAD na década de 1980 e do atual Acordo ADPIC (TRIPS),
cujas disposições serão explanadas mais adiante.

Cabe ressaltar, que o ordenamento jurídico brasileiro, apesar de influenciado pelo


pensamento norte-americano, confere parâmetros de limitação da liberdade contratual muito
mais amplos do que a proteção da livre concorrência a partir de ponderações econômicas. O
Direito brasileiro, embora chegue a conclusões semelhantes, parte de uma análise sistemática
dos princípios constitucionais.

A Constituição Federal em seu artigo 170 subdivide a proteção da ordem econômica


em nove outros princípios: I - soberania nacional; II - propriedade privada; III - função social
da propriedade; IV - livre concorrência; V - defesa do consumidor; VI - defesa do meio
ambiente; VII - redução das desigualdades regionais e sociais, VIII - busca do pleno emprego;
e IX tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte. Por sua vez, o artigo 173, §4º

                                                                                                                       
96
O resultado do debate foi a simples reinterpretação da Seção I do Sherman Act, que dispõe: “Todo contrato,
combinação sob a forma de triste ou qualquer outra forma ou conspiração em restrição do intercâmbio ou
comércio entre os Estados, ou com nações estrangeiras, é declarado ilícito pela presente lei.” (Tradução livre
de: “Every contract, combination in the form of trust or otherwise, or conspiracy in restrain of trade or
commerce among several States or with foreing nations, is hereby declared to be illegal.”). Tal dispositivo
poderia levar a interpretação demasiadamente ampla, no entanto, sob a regra da razão entendeu-se
jurisprudencialmente que: “os termos do Sherman Act foram interpretados judicialmente no sentido de, tão
somente, avarcar as restrições previstas que, desarrazoadamente, restringissem os negócios” (Tradução livre de:
“ the words of Sherman Act were judicially interpreted to cover only those restrains which unreasonable
restrain trade.”). In: TIMM, Luciano Benetti. Op., cit., 2008., p. 39.
  46  
 
dispõe que: “A lei reprimirá o abuso do poder econômico que vise à dominação dos
mercados, à eliminação da concorrência e ao aumento arbitrário dos lucros.”

Como consequência, a defesa da concorrência, mediante a proibição de abuso de poder


econômico, configura uma das esferas da ordem pública econômica. Por este motivo, deverá
ser realizada levando-se em consideração outros princípios, como a defesa do consumidor.
Cabe ressaltar porém, que embora influam um sobre o outro, os dois âmbitos não se
confundem. O Direito Concorrencial visa proteger o mercado consumidor enquanto estrutura
econômica, já o Direito do Consumidor se dirige à proteção do indivíduo, enquanto parte
hipossuficiente da relação de consumo. 97

Ainda, a limitação da liberdade de contratar é baseada na função social do contrato,


conforme o artigo 421 do Código Civil. Ao compreender-se o contrato de transferência de
tecnologia como um instrumento ao progresso tecnológico e ao desenvolvimento, as cláusulas
restritivas que efetivamente impeçam este processo, mediante abuso de poder econômico,
desrespeitam a função social. Porém, esta análise é muita ampla, necessitando de parâmetros
mais concretos, que inevitavelmente são fornecidos pelo Direito Antitruste.98

Então, embora o Direito Brasileiro utilize-se de uma abordagem principiológica


sistemática para justificar a limitação da liberdade contratual, a análise econômica não pode
ser afastada, pois é a única capaz de fornecer premissas concretas para a regulação dos
contratos em proteção à ordem pública. Mais do que isso, ela deve ser considerada como um
caminho complementar, e não oposto à função social.

                                                                                                                       
97
WADA, Ricardo Morishita. A defesa da concorrência e sua relação com a defesa do consumidor –
algumas proposições reflexivas. Revista de Direito Econômico, nº 30, Brasília, 1999.
98
A função social, ao tempo de sua inserção no ordenamento brasileiro, foi inicialmente concebida pela doutrina
e jurisprudência segundo um modelo solidarista. Conforme Luciano Timm: “Nesse modelo “solidarista”,
portanto, a função social do contrato significaria corrigir o desequilíbrio de poder no espaço do contrato e
distribuir o resultado econômico do relacionamento entre as partes para corrigir a desigualdade social, não
importando, genericamente falando, os reflexos no sistema econômicoEm uma análise econômica, esse
raciocínio não faz sentido, especialmente se se tiver em conta que o Direito e especificamente o contrato tem
como ambiente um sistema econômico de mercado”. TIMM, Luciano Benetti. Direito, economia e a função
social do contrato: em busca dos verdadeiros interesses coletivos protegíveis no mercado de crédito. Revista de
Direito Bancário e do Mercado de Capitais. , v.33, p.15 - 31, 2006.
  47  
 

3 A REGULAMENTAÇÃO DA TRANSFERÊNCIA DE TECNOLOGIA COM


VISTAS AO DESENVOLVIMENTO

O gap tecnológico existente entre os países desenvolvidos e os em via de


desenvolvimento constitui óbice ao aperfeiçoamento das relações de comércio internacional, e
consequentemente ao alcance de paridade econômica e social. Neste sentido, o incentivo à
transferência de tecnologia surge como uma medida veloz para a diminuição da disparidade.
No entanto, tal transferência precisa ser realizada em condições favoráveis aos países menos
desenvolvidos, para que estes assimilem a tecnologia recebida e possam continuar evoluindo
tecnologicamente por conta própria, evitando a afirmação de um ciclo dependência. 99

A diminuição do gap tecnológico exige a construção de capacidade tecnológica100


nacional, que por sua vez, possui uma relação de interdependência com a capacidade interna
das empresas locais recebedoras de tecnologia. Por isso, são necessárias políticas públicas que
estimulem os investimentos estrangeiros ao mesmo tempo em que geram capacitação interna,
através de incentivos às empresas nacionais, para que busquem constantes melhoramentos
estruturais, e de medidas regulatórias que inibam práticas restritivas em contratos de
transferência de tecnologia.101

                                                                                                                       
99
Vide item 2.2.
100
Sobre capacidade tecnológica vide item 2.2.
101
A UCTAD, em relatório de 1991, destacou a importância do avanço tecnológico para o desenvolvimento e
indicou os caminhos a serem seguidos pelos países no contexto econômico da época para que se beneficiassem
efetivamente de transferências de tecnologia: “Some broad conclusions emerge from this analysis. In some
applications, the new technologies could, with adequate diffusion and adaptation, help countries to leapfrog
certain stages of the industrial development process. They can contribute significantly to improving
productivity and sustainability of resources in such areas as agricultural production, manufacturing,
renewable energy generation and pollution control. More generally they should assist in translating into
purposeful action the growing concern with environmentally sound and sustainable development. To take
advantage of these possibilities, developing countries would have to give greater attention to human resource
development, and to policies fostering the development, adoption and adaptation of technology. Such efforts
would call for increased external assistance in research and development and in the strengthening of scientific
and technological institutions. They would also call for increased technology flows, through foreign direct
investment, imports of machinery and equipment, and licensing of patents. Improved access to technology on
concessional terms, including new and advanced technology of critical importance to development, is vital.”
“Algumas amplas conclusões emergem desta análise. Em algumas aplicações, as novas tecnologias poderiam,
com adequada difusão e adaptação, ajudar países a superar alguns estágios do processo de desenvolvimento
industrial. Ela podem contribuir significativamente para melhorar a produtividade e a sustentabilidade de
recursos em áreas como a produção agrícola, manufatura, geração de energia renovável e controle de poluição.
Mais genericamente, elas podem assistir na tradução da crescente preocupação com o desenvolvimento
sustentável e ambientalmente saudável em ações propositais. Para se beneficiarem destas possibilidades, os
países em desenvolvimento teriam de dar maior atenção ao desenvolvimento de recursos humanos e a políticas
  48  
 
No entanto, principalmente a partir da década de 1950, a falta de desenvolvimento
tecnológico dos países menos desenvolvidos encontrava-se a níveis críticos, de modo que as
desigualdades entre centro e periferia limitavam a economia destes países à produção de bens
primários, impossibilitando a diversificação dos setores.102 Isto levou muitos governos à
suspenderem medidas protecionistas, estimulando investimentos estrangeiros, como forma de
obterem tecnologia rapidamente e se modernizarem. Mas devido à falta de capacidade
tecnológica e ao baixo poder de barganha apresentados pelos recebedores, a maioria dos
contratos de transferência continham cláusulas restritivas e desvantajosas. Além disso, as
transacionais exportavam técnicas defasadas ou inapropriadas à realidade dos mercados dos
países da periferia, o que, aliado à falta de informação dos negociantes, acabou provocando
uma espécie de “colonialismo tecnológico”.103

Esta primeira tentativa fracassada de eliminação da lacuna tecnológica entre países


mais e menos desenvolvidos, em consonância com as crescentes preocupações mundiais com
o desenvolvimento dos povos104, alertou governos e entidades internacionais a respeito da
necessidade de regulamentação dos contratos de transferência de tecnologia e da criação de
mecanismos de cooperação entre países.

No presente capítulo serão apresentadas as tentativas de regulamentação dos contratos


envolvendo tecnologia a nível nacional e internacional, bem como um panorama da situação
atual, principalmente quanto ao Acordo TRIPS e sua incorporação pelo ordenamento
brasileiro.

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                     
fomentando o desenvolvimento, adoção e adaptação de tecnologia. Tais esforços requisitariam crescente
assistência externa em pesquisa e desenvolvimento e no fortalecimento de instituições científicas e
tecnológicas. Também demandariam fluxos de tecnologia crescentes, através de investimentos estrangeiros
direitos, importações de maquinário e equipamento, e licenciamento de patentes. A melhoria do acesso à
tecnologia em termos concessionais, incluindo tecnologias novas e avançadas e de importância crítica para o
desenvolvimento, é vital.” (Tradução nossa). UNITED NATIONS CONFERENCE ON TRADE AND
DEVELOPMENT., Accelerating the Development Process: Challenges for national and international policies
in the 1990’s. Eighth session of the Conference. New York: UNITED NATIONS, 1991., p. 6.
102
De acordo com a teoria da Cepal de 1949. In: PORCILE, Gabriel; ESTEVES, Luis Alberto; SCATOLIN.
Tecnologia e Desenvolvimento Econômico. In: PELAEZ, Victor; SZMRECSÁNYI, Tamás (Org) Op. cit., p.
367.
103
HAUG, David. Op. cit., 1992., p. 218.
104
O estudo do desenvolvimento como um direito surgiu após a Segunda Guerra Mundial, baseado na Teoria da
Modernização de Walt Whitman Rostow, pela qual os países de Terceiro Mundo deveriam seguir o exemplo do
Primeiro Mundo, copiando suas instituições e modelos de desenvolvimento. In: DAVIS, Kevin
E. and TREBILCOCK, Michael J.. A relação entre direito e desenvolvimento: otimistas versus céticos.
Rev. direito GV [online]. 2009, vol.5, n.1, pp. 222..
  49  
 
3.1 A regulamentação internacional: Acordo TRIPS

O primeiro grande esforço para a criação de um sistema regulador internacional da


transferência de tecnologia foi realizado pela ONU em 1974, com a aprovação da Declaração
do Estabelecimento de uma Nova Ordem Econômica Internacional (NOEI). Este documento
tinha o objetivo de diminuir a dependência econômica dos países da periferia e promover o
desenvolvimento a partir da cooperação entre Estados.105

A transferência de tecnologia estava no centro das discussões na elaboração da


proposta, sendo defendida a imposição de um sistema regulatório adequado que possibilitasse
o acesso à tecnologia, que era entendido com um direito. Os países em desenvolvimento
esperavam receber tecnologia apropriada aos seus mercados a custos acessíveis, sem que as
transnacionais visassem obter lucros exorbitantes.106

A insatisfação dos países desenvolvidos com os preceitos da NOEI foi gritante e no


decorrer das negociações fizeram reservas a vários dispositivos. Era alegado que a
regulamentação desestimularia as transacionais, que deixariam de investir nos países da
periferia, agravando a lacuna econômica e tecnológica. Os Estados Unidos ainda afirmavam
que a verdadeira colaboração seria manter o seu crescimento econômico, pois isto significaria
um maior fluxo de investimentos. Por fim, quando da resolução final em 1976, os Estados
Unidos e Alemanha votaram contra a aprovação do documento, desencorajando a cooperação
internacional. 107

Outra tentativa relevante para a criação de bases internacionais de regulação dos


contratos de transferência de tecnologia foi realizada pela UNCTAD, a partir de 1975, com a

                                                                                                                       
105
Dentre os objetivos do documento estão: “b – A mais ampla cooperação de todos os Estados membros da
comunidade internacional, baseada na equidade, por meio da qual as disparidades prevalentes no mundo
possam ser banidas e a prosperidade assegurada a todos; [...] p – Dar aos países em desenvolvimento acesso aos
avanços da ciência moderna e tecnologia para o benefício dos países em desenvolvimento, nas formas e em
consonância com os procedimentos que são adequados às suas economias; [...]. ( Tradução livre de: “b - The
broadest co-operation of all the States members of the international community, based on equity, whereby the
prevailing disparities in the world may be banished and prosperity secured for all; [...] p - Giving to the
developing countries access to the achievements of modern science and technology, and promoting the transfer
of technology and the creation of indigenous technology for the benefit of the developing countries in forms
and in accordance with procedures which are suited to their economies [...].”). In: UNITED NATIONS. 3201
(S-VI). Declaration on the Establishment of a New International Economic Order. General Assembly,
1974.
106
HAUG, David. Op., cit., 1992., p. 219.
107
Ibidem., p. 220.
  50  
 
elaboração do Código Internacional de Conduta em Transferência de Tecnologia (TOT Code).
A ideia embrionária para a criação de um código de conduta surgiu ainda no âmbito da NOEI,
porém com um alvo mais específico. O objetivo central era a identificação de cláusulas
restritivas a serem combatidas, tendo como inspiração os “Nine No-No’s”108 do direito norte-
americano.109

Apesar de o Código não objetivar ser um tratado, mas sim um instrumento de


cumprimento voluntário, novamente os desacordos entre países mais e menos desenvolvidos
foram intensos. Dênis Barbosa citou três principais pontos de controvérsia: o fundamento
adotado para a condenação das práticas restritivas; o tratamento dispensado ao poder de
controle das sociedades; e a conceituação da razoabilidade, como sendo o critério para a
exclusão da ilicitude da cláusula.110

Pela tradição liberalista de suas economias, os países de centro, tendo a doutrina e a


prática judiciária dos Estados Unidos como inspiração, adotavam apenas a defesa da livre
concorrência como justificativa para a limitação da liberdade contratual. Já os países de
industrialização mais recente, preocupados com o desenvolvimento social conjugado com o
econômico, e visando condições contratuais favoráveis, utilizam uma fundamentação muito
mais ampla, alicerceada no interesse público.

Como consequência disto, surgiu o segundo ponto de desacordo. Como empresas do


mesmo grupo econômico (matriz, filiais e subsidiárias) e até mesmo franquias não são
consideradas concorrentes, a imposição de cláusulas restritivas nestas espécies de contrato,
mesmo que prejudicassem a assimilação da tecnologia por parte da filial, não poderiam ser
condenadas, visto que não lesivas à concorrência.111 Para os países em desenvolvimento,

                                                                                                                       
108
A Divisão Antitruste do Departamento de Justiça dos Estados Unidos identificou na década de 1970 nove
práticas a serem vedadas em contratos de licenciamento de propriedade industrial, por serem consideradas
abusivas e anticoncorrenciais. Estas disposições contratuais ficaram conhecidas como “Nine No-No’s”. Vide
item 2.3.
109
ZUIJDWIJK, Tom J. M. The UNCTAD Code of Conduct on the Transfer of Technology. McGill Law
Journal. Vol. 24:4, 1978., p. 564 et. seq.
110
BARBOSA, Denis Borges. Uma introdução à propriedade industrial. Rio de Janeiro: Lumen Juris., 2ª ed.,
2003., p. 139 et. seq.
111
Um exemplo disto seria a hipótese de “uma matriz ordenar a extração da matéria prima de determinado país,
remunerando-a a preços antieconômicos, para processá-la e vendê-la com imensos lucros em outro país (...)”.
BARBOSA, Denis. TRIPs e as Cláusulas abusivas em Contratos de tecnologia e Propriedade industrial.
Disponível em: <http://www.denisbarbosa.addr.com/paginas/200/propriedade.html>., 2002., p. 3. Acesso em:
novembro de 2014.
  51  
 
cujos sistemas jurídicos são em maioria amparados na soberania do interesse público sobre o
privado, tais práticas são abusivas, constituindo abuso de poder de controle.

Conforme desenvolvido no decorrer do item 2.3 deste trabalho, o entendimento das


cortes norte-americanas em meados da década de 1970, era no sentido de que os contratos
envolvendo direito de propriedade intelectual deveriam ser regulados pela lei concorrencial
assim como qualquer outro contrato, por meio da regra da razão. Por este raciocínio seria
razoável a prática que, embora aparentemente restritiva, não importasse em um prejuízo para
a concorrência em concreto. A níveis internacionais este padrão de razoabilidade utilizava-se
de uma noção abstrata de interesse público, ou seja, a prática que não fere a livre concorrência
é benéfica para a economia, logo, não importa em prejuízo para o país.

Em contraposição, os países menos desenvolvidos buscam um atendimento ao


interesse público em concreto. Assim, não consideram razoável a cláusula que simplesmente
não macula a concorrência, mas aquela que também não ofende o mercado consumidor,
enquanto estrutura econômica, considerando-se as suas peculiaridades.

Mais uma vez, as controvérsias levaram ao fracasso da tentativa de cooperação.


Assim, os países essencialmente recebedores de tecnologia passaram a criar sistemas
regulatórios próprios, geralmente restringindo consideravelmente a liberdade contratual. A
elevação dos padrões protecionistas, conjugada a práticas como a nacionalização de empresas,
foram adotadas na esperança de estimular a indústria interna a prosperar por suas próprias
bases. As transnacionais, por sua vez, insatisfeitas com os sistemas jurídicos em fomento,
diminuíram os investimentos.112

Ao longo prazo, a falta de cooperação internacional e a manutenção das medidas


protecionistas, dificultaram o processo de redução do gap tecnológico. A ausência de
infraestrutura e trabalho qualificado, conjugadas com os baixos padrões do mercado
consumidor, atrapalharam a assimilação das tecnologias recebidas. Além disso, o setor
empregatício não conseguia se atualizar com a velocidade necessária, o desemprego gerado
por uma modernização não era compensado pelo surgimento de um novo ramo de mercado,
como é esperado em uma economia tecnologicamente capacitada. Também cabe ressaltar que,
os padrões altos de regulamentação não impediam a celebração de contratos desvantajosos,
vez que o desestímulo aos investimentos levava as transnacionais apenas a negociarem

                                                                                                                       
112
HAUG, David. Op. cit., 1992., p. 222
  52  
 
tecnologias antiquadas ou inadequadas ao mercado local, pois o processo de adaptação às
particularidades locais apresentavam baixo custo-benefício.113

A crise global da década de 1980, como consequência dos choques internacionais do


petróleo de 1973 e 1979, relegou as tentativas de cooperação entre Estados para um segundo
plano. Ambos os grupos de países (centro e periferia) estavam concentrados em reformular
sua estrutura interna, passando por fortes alterações políticas e econômicas. Devido aos
problemas macroeconômicos, a indústria de países menos desenvolvidos permaneceu
praticamente estagnada e o mercado rudimentar, inexistindo condições positivas para a
transferência de tecnologias de ponta.114

Para a superação da crise, medidas reformadoras liberalizantes passaram a ser


adotadas pelos governos para atrair investimentos estrangeiros, modernizando e
diversificando os setores econômicos. Neste contexto, países desenvolvidos começaram a
exigir maiores níveis de proteção da propriedade intelectual a níveis internacionais, como
forma de estimular os processo inventivos e os fluxos de tecnologia. É o que consta do
relatório da Secretaria Geral da UNCTAD de 1991115:

Strengthened protection of intellectual property rights has been urged on developing


countries by their trading partners as a further incentive for foreign investment and,
more generally, for the transfer of technology. Such protection may be a necessary
condition for technology transfer associated with patentable products and
processes. Yet most patents registered in developing countries are unexploited in
terms of leading to domestic production. Besides, stronger intellectual protection
will not by itself offset a lack of trained personnel, of equipment and general

                                                                                                                       
113
Ibidem., p. 223 – 224.
114
UNITED NATIONS CONFERENCE ON TRADE AND DEVELOPMENT., Accelerating the
Development Process: Challenges for national and international policies in the 1990’s. Eighth session of the
Conference. New York: UNITED NATIONS, 1991., p. 21 – 23.
115
“Proteção reforçada dos direitos de propriedade intelectual foi exigida dos países em desenvolvimento por
seus parceiros comerciais como um maior incentivo aos investimentos estrangeiros e, mais genericamente, para
a transferência de tecnologia. Tal proteção pode ser condição necessária para a transferência de tecnologia
associada com produtos e processos patenteados. Ainda a maioria das patentes registradas em países em
desenvolvimento são inexploradas em termos de direcionamento à produção doméstica. Além do mais,
proteção intelectual reforçada não irá por si só compensar a falta de pessoal treinado, de equipamento e de
infraestrutura geral, e da proximidade a países protagonistas em pesquisa, que são fatores chaves para a
alocação de recursos em P & D. Tampouco irá realmente ocorrer transferência de tecnologia, a menos que
outras condições sejam atendidas, incluindo, por exemplo, tamanho adequado do mercado e expectativa de
crescimento e habilidade competitiva de licenças potenciais. Essas considerações sugerem que o reforço dos
direitos de propriedade intelectual de forma isolada, improvavelmente será suficiente para induzir
transferências adicionais de tecnologia para países em desenvolvimento; pelo contrário, poderia levar a custos
mais elevados em produtos importados e a um uso mais frequente de cláusulas restritivas em contratos de
tecnologia cobertos por tal proteção.” (Tradução nossa). UNITED NATIONS CONFERENCE ON TRADE
AND DEVELOPMENT., Accelerating the Development Process: Challenges for national and international
policies in the 1990’s. Eighth session of the Conference. New York: UNITED NATIONS, 1991., p. 66.
  53  
 
infrastructure, and of proximity to major research countries that are key factors in
the location of R & D facilities. Nor will technology transfer actually occur, unless
other conditions are met, including for example adequate market size and expected
growth and the competitive ability of potential licensees. These considerations
suggest that the reinforcement of intellectual property rights protection alone is
unlikely to be sufficient to induce additional transfer of technology to developing
countries; rather it could lead to higher costs of imported products and a more
frequent use of restrictive clauses in technology contracts covered by such
protection.

As crescentes demandas por uma regulamentação internacional do direito de


propriedade intelectual, trouxeram a discussão para o GATT, devido à influência do tema
sobre o comércio internacional e à insuficiência da proteção conferida pela OMPI116. As
negociações foram inauguradas em 1986 com a Rodada do Uruguai. Novamente insurgiram
opiniões divergentes entre países mais e menos desenvolvidos, de modo que a ata final,
constituindo o Acordo Constitutivo da Organização Mundial do Comércio, foi apresentada em
1994, encerrando a Rodada do Uruguai.117

Eram três as principais opiniões a respeito do nível ideal de proteção da propriedade


intelectual a ser alcançado pelo futuro acordo.118

A primeira posição, defendida pelos EUA, compreendia a alta proteção da propriedade


intelectual como benéfica às inovações e à transferência de tecnologia, qualquer que fosse o
nível de desenvolvimento econômico do país.

A segunda consistia no posicionamento dos países em desenvolvimento que, em


atenção às incongruências existentes entre Norte-Sul (Centro-Periferia) quanto à capacidade
tecnológica, clamavam por mecanismos viabilizadores da difusão de tecnologia via
transferência. Estes países consideravam a necessidade de facilitação do acesso à tecnologia,

                                                                                                                       
116
“A OMPI (Organização Mundial de Propriedade Intelectual) foi criada em 1970 e integra o quadro da ONU
desde 1974, sendo considerada por esta como instituição especializada. Sua missão básica é promover a
proteção da propriedade intelectual mundialmente, através da cooperação entre Estados, inclusiva
administrativa, como com outras organizações internacionais”. KEMMELMEIER, Carolina Spack e
SAKAMOTO, Priscila. Transferência de tecnologia e as organizações multilaterais. In: BARRAL, Welber;
PIMENTEL, Luiz Otávio. Propriedade Intelectual e Desenvolvimento, Florianópolis: Editora Fundação
Boiteux, 2007. p. 138. Por ser uma organização de caráter técnico, não existem mecanismos de verificação do
adimplemento dos deveres impostos aos Estados ou de solução de controvérsias. Deficiências essas que
tornaram a regulamentação proposta insuficiente. Para saber mais vide: BASSO, Maristela. O Direito
Internacional da Propriedade Intelectual. Porto Alegre: Livraria do Advogado. 2000., p. 129 et seq.
117
BASSO, Maristela. Op. cit., 2000., p. 164 e 165.
118
Idem.
  54  
 
atendendo às suas demandas econômicas e sociais, mais importantes do que o incentivo
representado pelo reforço dos direitos de propriedade intelectual.

Por último, países como o Japão e membros da Comunidade Européia, frisavam a


importância de se alcançar um nível equilibrado de proteção, que recompensasse os
inventores e provesse o incentivo indispensável às pesquisas, sem implicar em um
impedimento ao comércio. A concessão muito ampla de direitos exclusivos pode gerar um
monopólio indesejado.

Ao contrário do TOT Code, o Acordo TRIPS (Trade-Related Aspects os Intellectual


Property Rights)119 possui força obrigatória, vinculando os Estados signatários. Além disso o
principal escopo é a regulamentação da proteção internacional da propriedade intelectual sem
o objetivo específico de diminuir a defasagem tecnológica entre os países. Por isso, os
parâmetros oferecidos para a condenação de cláusulas restritivas são menores do que os
propostos pela UNCTAD em seu Código de Conduta.120

O art. 7º do Acordo TRIPS traz os objetivos a serem alcançados121:

A proteção e a aplicação de normas de proteção dos direitos de propriedade


intelectual devem contribuir para a promoção da inovação tecnológica e para a
transferência e difusão de tecnologia, em benefício mútuo de produtores e usuários
de conhecimento tecnológico e de uma forma conducente ao bem-estar social e
econômico e a um equilíbrio entre direitos e obrigações.

Assim, apesar de não diretamente direcionado à regulação da transferência de


tecnologia, este Acordo busca estabelecer níveis de proteção dos direitos de propriedade
intelectual a níveis razoáveis e harmoniosos, de modo que incentivem a inovação e a difusão
tecnológica concomitantemente.

Por sua vez, o artigo 8º dispõe sobre os princípios do Acordo. É fixado que os Estados,
sempre dentro dos limites do TRIPS, podem adotar as medidas que considerarem necessárias
ao atendimento de seu interesse nacional, no sentindo da promoção do desenvolvimento
socioeconômico. Assim sendo, é encorajada a regulamentação interna dos contratos de

                                                                                                                       
119
Em português ADPIC (Acordo Relativo aos Aspectos do Direito da Propriedade Intelectual Relacionados
com o Comércio), porém a mesmo no Brasil utiliza-se geralmente a sigla TRIPS.
120
BARBOSA, Denis. TRIPs e as Cláusulas abusivas em Contratos de tecnologia e Propriedade industrial.
Op., cit. 2002. p. 5.
121
Documento oficial disponível em: < http://www.wto.int/english/docs_e/legal_e/legal_e.htm#TRIPs >.
  55  
 
transferência de tecnologia para coibir práticas restritivas e abuso dos direitos de propriedade
intelectual.122

Importante destacar que os padrões de proteção estabelecidos pelo TRIPS são


mínimos. Conforme leciona Maristela Basto, é impossível exigir dos Estados uma proteção
mais ampla do que aquela conferida pelo Acordo. Suas disposições não são autônomas e,
justamente por estabelecerem critérios mínimos de proteção e não a medida exata do direito,
não podem ser aplicadas diretamente aos particulares. Apesar de obrigatório, a aplicação resta
dependente da incorporação do Acordo ao ordenamento jurídico interno.123

Por este motivo, há a previsão de um prazo de carência no artigo 65 do TRIPS. Os


países membros tem o prazo de um ano a partir da entrada em vigor do acordo para se
adequarem. Em consideração aos diferentes níveis de desenvolvimento dos países, o prazo é
de quatro anos para os países em desenvolvimento e de dez anos para os países com menor
desenvolvimento relativo.124

A respeito dos contratos internacionais de transferência de tecnologia, a principal


disposição do TRIPS encontra-se no artigo 40:

Art. 40

1 - Os Membros concordam que algumas práticas ou condições de licenciamento


relativas a direitos de propriedade intelectual que restringem a concorrência podem
afetar adversamente o comércio e impedir a transferência de tecnologia.

2 – Nenhuma disposição deste Acordo impedirá que os Membros especifiquem em


suas legislações condições ou práticas de licenciamento que possam, em
determinados casos, constituir um abuso dos direitos de propriedade intelectual que
tenha efeitos adversos sobre a concorrência no mercado relevante. Conforme
estabelecido acima, um Membro pode adotar, de forma compatível com as outras
disposições deste Acordo, medidas apropriadas para evitar ou controlar tais práticas,
que podem incluir, por exemplo, condições de cessão exclusiva, condições que
impeçam impugnações de validade e pacotes de licenças coercitivos, à luz das leis e
regulamentos pertinentes desse Membro.

                                                                                                                       
122
BASTO, Maristela. Op., cit., 2000., p. 168.
123
Ibidem., p. 176.
124
“Ainda sobre as disposições doas arts. 65 e 66 do TRIPS cumpre ressaltar que o prazo para adequação das
legislações dos países em desenvolvimento terminou em 31 de dezembro de 1999. Já para os países com menor
desenvolvimento relativo o prazo terminaria em 31 de dezembro de 1995. No entanto, para estes membros
houve uma prorrogação para 1º de Julho de 2013, existindo a possibilidade de nova extensão. Além disso, no
que se refere às patentes de medicamentos, estes países têm 1º de janeiro de 2016 como data inicial para
conferir proteção jurídica.” ROCHA, Thiago Gonçalves Paluma. Op. cit. 2011. p. 22 et 39.
  56  
 
Analisando-se tal norma, é possível concluir que os critérios regulamentadores eleitos
pelo TRIPS para os contratos envolvendo transferência de tecnologia, são compatíveis com
aqueles apontados pela doutrina norte-americana, ou seja, será condenável a cláusula que
efetivamente causar prejuízo à livre concorrência. Inclusive, o parâmetro de razoabilidade
escolhido é a regra da razão, por meio da observação do poder econômico das partes e da
influência da cláusula sobre o mercado relevante.

Maristela Basso destaca que125:

A norma deixa liberdade aos Estados-Partes para especificar as práticas de


concorrência desleal e adotar as medidas apropriadas para impedi-las ou controlá-
las, desde que compatíveis com outras disposições do Acordo, esclarecendo: a) as
práticas devem ser analisadas “caso a caso”; b) as práticas devem implicar abuso dos
direitos de propriedade intelectual e c) devem ter efeitos adversos sobre a
concorrência no mercado relevante (correspondente).

A referida autora ainda ressalta que não há definição de mercado relevante, deste
modo sua delimitação fica a critério dos Estados. Esta é uma importante abertura do TRIPS,
pois permite que a lesão à livre concorrência seja medida em relação a um grupo maior ou
menor de produtos e consumidores.126

Resta claro que as controvérsias entre países desenvolvidos e países em via de


desenvolvimento impediram que o Acordo adotasse uma postura mais concreta diante das
cláusulas restritivas. Assim, as práticas mencionas do artigo 40.2 constituem um rol
meramente exemplificativo, sendo que o controle deve ser realizado “caso a caso” a partir dos
critérios interpretativos determinados pelo dispositivo em questão.

Apesar da exigência de ocorrência de prejuízo à livre concorrência como justificativa


para o controle de cláusulas contratuais, realizando-se um interpretação conjunta com os
objetivos e princípios enumerados nos artigos 7º e 8º127, existe uma grande margem para que

                                                                                                                       
125
BASSO, Maristela. Op., cit. 2000., p. 249.
126
Nos Estados Unidos: “mercado relevante inclui os produtos aos quais o consumidor recorreria, se o preço do
produto patenteado fosse anormalmente elevado.” Idem.
127
“Art. 8º: 1- Os Membros, ao formular ou emendar suas leis e regulamentos, podem adotar medidas
necessárias para proteger a saúde e nutrição públicas e para promover o interesse público em setores de
importância vital para o seu desenvolvimento socioeconômico e tecnológico, desde que estas medidas sejam
compatíveis com o disposto neste Acordo. 2 – Desde que compatíveis com o disposto neste Acordo, poderão
ser necessárias medidas apropriadas para evitar abuso dos direitos de propriedade intelectual por seus titulares
ou para evitar o recurso a práticas que limitem de maneira injustificável o comércio ou que afetem
adversamente a transferência internacional de tecnologia.” (Grifos nossos).
  57  
 
as legislações internas dos países menos desenvolvidos adotem padrões próprios mais
detalhados em defesa do interesse público.128

Deste modo, a delimitação dos critérios de “abuso dos direitos de propriedade


intelectual” e “efeitos adversos à concorrência no mercado relevante” poderá ser realizada
pelos países a partir de seus objetivos, como o alcance do desenvolvimento socioeconômico
por meio da efetiva transferência de tecnologia. Por este motivo, a utilização da função social
do contrato como princípio limitador da liberdade contratual não é incompatível com o teor
do TRIPS. Porém, para legitimar o controle estatal nos contratos envolvendo propriedade
intelectual, não bastará que o interesse social seja lesado pela inviabilização da transferência
de tecnologia em razão de uma cláusula restritiva. Será necessário a ocorrência de prejuízo à
concorrência no mercado relevante, qualquer que seja o conceito de mercado relevante
adotado pelo ordenamento jurídico interno.

As disposições do artigo 40.1 e 40.2, de aplicação mediata, são completadas pelo


sistema de consultas entre estados (artigo 40. 3 e 40.4)129, que constituí matéria de direito
público externo, e por isso de aplicação imediata. 130

Outra norma importante do TRIPS relativa à transferência de tecnologia, é a extraída


do artigo 66.2131, que estabelece o compromisso dos países desenvolvidos com a evolução
tecnológica dos países em desenvolvimento. Trata-se de norma atenta aos requisitos

                                                                                                                       
128
BARBOSA, Denis. TRIPs e as Cláusulas abusivas em Contratos de tecnologia e Propriedade industrial.
Op., cit. 2002. p. 8.
129
“40.3 — Cada Membro aceitará participar de consultas quando solicitado por qualquer outro Membro que
tenha motivo para acreditar que um titular de direitos de propriedade intelectual, que seja nacional ou
domiciliado no Membro ao qual o pedido de consultas tenha sido dirigido, esteja adotando práticas relativas à
matéria da presente Seção, em violação às leis e regulamentos do Membro que solicitou as consultas e que
deseja assegurar o cumprimento dessa legislação, sem prejuízo de qualquer ação legal e da plena liberdade de
uma decisão final por um ou outro Membro. O Membro ao qual tenha sido dirigida a solicitação dispensará
consideração plena e receptiva às consultas com o Membro solicitante, propiciará adequada oportunidade para
sua realização e cooperará mediante o fornecimento de informações não confidenciais, publicamente
disponíveis, que sejam de relevância para o assunto em questão, e de outras informações de que disponha o
Membro, sujeito à sua legislação interna e à conclusão de acordos mutuamente satisfatórios relativos à
salvaguarda do seu caráter confidencial pelo Membro solicitante.
40.4 — Um membro, cujos nacionais ou pessoas nele domiciliadas estejam sujeitas a ações judiciais em outro
Membro, relativas a alegada violação de leis e regulamentos desse outro Membro em matéria objeto desta
Seção, terá oportunidade, caso assim o solicite, para efetuar consulta nas mesmas condições previstas no
parágrafo 3.”
130
BASSO, Maristela. Op. cit., 2000., p. 251.
131
“66.2 — Os países desenvolvidos Membros concederão incentivos a empresas e instituições de seus
territórios com o objetivo de promover e estimular a transferência de tecnologia aos países de menor
desenvolvimento relativo Membros, a fim de habilitá-los a estabelecer uma base tecnológica sólida e viável.”
  58  
 
necessários para a assimilação da tecnologia, além das condições contratuais e da capacidade
tecnológica. Conforme exposto no item 2.2 do presente trabalho, uma tecnologia poderá ser
transferida em diferentes estágios de sua trajetória, desde a concepção da primeira inovação
(início do paradigma tecnológico) até o produto final da acumulação de melhoramentos
(technological frontier).132 Foi ainda demonstrado que, a obtenção de uma tecnologia recém
concebida, além de custos mais baixos, estimula a pesquisa, produção científica e a
construção de capacidade tecnológica no interior das firmas, sendo mais vantajosa para o
desenvolvimento de tecnologia de forma autônoma no futuro. Apesar do compromisso
firmado com a transferência de tecnologia, ainda em estágios de pesquisa, e não apenas o
produto final, infelizmente a norma não possui aplicabilidade.133

Quanto ao know-how, apesar de o Acordo ser principalmente direcionado a direitos de


propriedade intelectual reconhecidos por título, o artigo 39 estabelece proteção a informações
confidenciais, novamente sob a justificativa de defesa à concorrência. É assegurado às
pessoas físicas e jurídicas que, adotando medidas razoáveis e lícitas para manter a informação
sigilosa, impeçam terceiros não autorizados de conhecer, revelar ou utilizar o conhecimento
secreto. Ainda é exigido que estes terceiros atuem em contradição com práticas comerciais
honestas. 134

De uma maneira geral, os níveis de proteção da propriedade intelectual determinados


pelo TRIPS se revelaram mais elevados do que os adotados pelos países em desenvolvimento
à época do Acordo. Justamente por isso, os prazos de carência do artigo 65 são diferentes de
acordo com o nível de desenvolvimento do país.135 Ilustrativamente, no Brasil a Lei nº
5.772/71 em vigor à época, em seu artigo 24 conferia quinze anos de patente de invenção, já o
padrão mínimo imposto pelo TRIPS no artigo 33 é de vinte anos de proteção.

Assim, preocupados com a aplicação das flexibilidades previstas pelo Acordo, estes
países levaram a discussão à Rodada Doha, que em novembro de 2001 adotou a Declaração
de Doha sobre o Acordo TRIPS e a Saúde Pública. Esta declaração reconheceu a validade de

                                                                                                                       
132
Sobre a evolução de um paradigma tecnológico vide: DOSI, Giovanni. Op., cit. 1982., p. 152. Para saber mais
sobre as fases percorridas por um produto tecnológico no mercado vide: FREEMAN, Chris; SOETE, Luc. op.
cit, ps. 612 e 613
133
ROCHA, Thiago Gonçalves Paluma. Op. cit. 2011. p. 74.
134
DINIZ, Davi Monteiro. Propriedade industrial e segredo em comércio. Belo Horizonte: Del Rey.
2003.,p.79.
135
ROCHA, Thiago Gonçalves Paluma. Op. cit. 2011. p. 38.
  59  
 
políticas destinadas ao atendimento da saúde pública por meio do acesso generalizado a
medicamentos. Foi reforçada a autorização do TRIPS às licenças compulsórias, à
possibilidade de ampliação dos requisitos de patenteabilidade e à mecanismos de importação
paralela de medicamentos.136

Por outro lado, para os países desenvolvidos os níveis de proteção ainda


permaneceram abaixo do esperado, sendo insuficientes para as empresas que visam investir
em mercados estrangeiros, pois os custos de instalação e adaptação nos novos mercados
seriam altos em relação aos lucros obtidos. Assim, muitos países, principalmente os Estados
Unidos passaram a propor tratados aos seus parceiros econômicos menos desenvolvidos,
visando obter condições mais vantajosas do que as determinadas pelo TRIPS. Tais acordos,
normalmente bilaterais, ficaram conhecidos com TRIPS-Plus e TRIPS-Extra. Um exemplo
seria o tratado pactuado entre EUA e Singapura, que proibiu o instrumento da licença
compulsória, com exceção dos casos em que existem práticas anticoncorrenciais, uso público
não comercial, emergência nacional ou extrema urgência.137

Peter M, Gerhart, em uma série de críticas direcionas ao Acordo TRIPS, destacou a


impossibilidade de se balancear de forma adequada os interesses opostos dos dois polos de
países138:

To an international negotiator, what matters is the impact of a proposed regime on


the negotiator’s country. (...) The negotiator values national income from
intellectual property, and has no concern for the effects of any policy on foreing
consumers. Therefore, the goal is to capture profit abroad while minimizing
payments of domestic consumers to foreing innovators. By contrast, nagotiators
from knowledge importing countries want to minimize payments for intellectual
property and have no regard for the interests of foreing producers of knowledge
goods.

                                                                                                                       
136
OLIVEIRA, Daniela Rodrigues. As flexibilidades do Acordo TRIPS na nova dinâmica comercial
internacional. Brasília: Boletim Científico ESMPU, a. 11. 2011. p. 11-33.
137
Ibidem., p. 41.
138
“Para um negociador internacional, o que importa é o impacto de um regime proposto sobre seu país. O
negociador valoriza a renda nacional obtida por meio de propriedade intelectual e não se preocupa com os
efeitos de nenhuma política sobre os consumidores estrangeiros. Deste modo, o objetivo é capturar lucro fora
do país enquanto os pagamentos dos consumidores locais aos inovadores estrangeiros são minimizados. Em
contraste, negociadores de países importadores de conhecimento desejam minimizar pagamentos por
propriedade intelectual e não tem consideração com os interesses dos produtores estrangeiros de produtos
tecnológicos.” (Tradução livre). GERHART, Peter M. The Tragedy of TRIPS. Faculty Publications. 2007,
Paper 157, p. 155. Disponível em: < http://scholarlycommons.law.case.edu/faculty_publications/157> Acesso
em: novembro 2014.
  60  
 
O principal argumento dos países desenvolvidos, baseado na doutrina norte-
americana, para os altos níveis de proteção da propriedade intelectual é a concessão de
incentivos aos inovadores. Sem remuneração adequada as empresas comprometidas com P&D
são desestimuladas, e além de reduzirem os investimentos internos com produção de
tecnologia, também desistem de transferi-las a outros países.

Porém, como acertadamente afirma os professores Pimentel e Barral, a proteção


reforçada da propriedade intelectual também não significa que as inovações realizadas serão
difundidas para outros países. Tendo em vista o baixo poder de barganha das empresas locais,
mesmo que haja grande interesse por parte dos investidores em transferir tecnologia, pouco
progresso realmente ocorrerá sem mecanismos que permitam a absorção e assimilação.139

Apesar do entendimento clássico de que um sistema otimizado de patentes beneficia o


processo inovador enquanto prejudica o bem-estar dos consumidores, análises históricas140
provam que esta relação não é absoluta. Isto porque nos setores onde as empresas preferem
manter suas técnicas sob sigilo, o reforço dos direitos conferidos por títulos de patente não
surtirá positivamente. Ainda, considerando-se a relação de interdependência entre inovação e
difusão tecnológica141, tem-se que, um exagero dos direitos de propriedade industrial causa
um monopólio nocivo à difusão, que por sua vez, na ausência de competitividade,
desacelerará as inovações. Por outro lado, a segurança oferecida por um título de patente
motiva o inovador, que antes amparado por mecanismos de sigilo, passa a conferir
publicidade ao seu conhecimento, facilitando a difusão.142

É possível concluir que apesar das críticas, o Acordo TRIPS alcançou um nível
razoável de proteção da propriedade intelectual e forneceu bases interessantes para a
regulamentação da transferência de tecnologia, em se considerando o atual cenário da
globalização e da divisão internacional do comércio. A preocupação expressa com políticas

                                                                                                                       
139
PIMENTEL, Luiz Otávio; BARRAL, Welber. Direito de Propriedade Intelectual e Desenvolvimento. In:
BARRAL, Welber; PIMENTEL, Luiz Otávio (Org). Op., cit., 2007. p. 26.
140
No século XIX a concessão de direitos elevados em títulos de patentes às recentes gerações de inventores
desencorajou as taxas de inovação nos EUA. Como a evidência do caso de Elias Howe, que possuindo ampla
proteção em virtude de melhoramentos sobre máquinas de costura, preferiu utilizar seus direitos para processar
competidores, ao invés de comercializar seu produto. Para saber mais: MOSER, Petra. Patents and
Innovation: evidence from economic history. Stanford Law and Economics Olin Working Paper No. 437.
2012. Disponível em SSRN:< http://ssrn.com/abstract=2180847 or http://dx.doi.org/10.2139/ssrn.2180847>
Acesso em: outubro de 2014.
141
Para melhor compreensão da relação entre estes conceitos vide item 2.1.
142
MOSER, Petra. Op. cit., 2012. p. 19.
  61  
 
concorrenciais, permitindo e incentivando medidas como as licenças compulsórias em casos
de abusos, confere uma importante limitação ao poder de mercado alcançado por meio dos
direitos de propriedade industrial.

Mas isto não significa que a adesão ao TRIPS solucione o problema da


regulamentação das transferência de tecnologia como propulsora do desenvolvimento. O
Acordo apenas permite ao país anfitrião das multinacionais e importador a agir em pró da
concorrência e do desenvolvimento, e não obriga os países sede a exigir um comportamento
pró-competitivo de suas empresas em relação aos mercados estrangeiros. Cabe aos Estados
membros a adequação de suas disposições de modo a ampliar o poder de barganha das
empresas recebedoras de tecnologia, fornecendo bases concretas para o controle de cláusulas
restritivas, além da promoção de políticas públicas construtoras de capacidade tecnológica. 143

3.2 A regulamentação nacional e as perspectivas para a transferência de tecnologia no


Brasil.

No presente tópico serão feitas algumas considerações a respeito da experiência


brasileira com a transferência internacional de tecnologia, especialmente quanto à legislação
aplicável a estes contratos antes e após a adequação às disposições do TRIPS. Por fim, serão
apontadas as recomendações da doutrina nacional e estrangeira para que o Brasil possua um
melhor aproveitamento destas operações e consiga superar a dependência tecnológica.

A política de modernização da indústria brasileira, como forma de redução do gap


tecnológico, iniciou-se com base no modelo de substituição de importação, a partir da década
de 1960. O objetivo era encorajar as indústrias a desenvolverem tecnologias locais, ao
aumentar seu poder competitivo através de mecanismos protecionistas que encareciam os
produtos estrangeiros. O governo recorria a empréstimos internacionais para investir em
infraestrutura e as transferências de tecnologia ocorriam principalmente por Investimentos

                                                                                                                       
143
HOLMES, Peter. Trade and competition policy at the WTO: issues for developing countries. In: COOK, Paul
et. al. (Ed.) Leading Issues inCompettion Regulation and Development. Cheltenham UK: Edward Elgar.
2004. p. 121.
  62  
 
Estrangeiros Diretos (IED)144 e licenças de patentes concedidas por multinacionais, de suas
matrizes às suas subsidiárias integrais. 145

A forte postura regulamentadora do Estado na economia neste período (décadas de


1960 e 1970) estava em consonância com os preceitos da Nova Ordem Econômica
Internacional (NOEI), na sede da ONU. A preocupação com o desenvolvimento dos países da
periferia resultou em críticas ao liberalismo e à defesa de políticas públicas destinadas à
assegurar a efetiva transferência de tecnologia.146

Para promover o controle sobre a propriedade intelectual, com vistas à sua importância
econômica e social, foi criado o Instituto Nacional de Propriedade Intelectual por força da Lei
nº. 5.648 de 11 de dezembro de 1970. Dentre suas atividades, a autarquia deveria exercer
controle sobre os contratos envolvendo transferência de tecnologia, apreciando e avaliando as
transações, inclusive com poderes para modificar ou vedar cláusulas contratuais.147

A sujeição dos contratos internacionais de tecnologia ao INPI foi confirmada pelo


Código de Propriedade Industrial de 1971 em seu artigo 126148 e o Decreto nº 68.104 de 1971,
regulamentando a lei 5.648/70, que detalhou o papel da autarquia para a criação de condições
viabilizadoras da absorção da tecnologia e sua difusão para os diversos setores industrias.149 E
em 1975, o Ato Normativo nº 15 estabeleceu os parâmetros reguladores destes contratos,

                                                                                                                       
144
São os investimentos realizados pelas transnacionais através da instalação de subsidiárias integralmente
controladas no estrangeiro. HAUG, David. Op. cit.1992 p. 213.
145
TIMM, Luciano Benetti. OP., cit., 2008. p. 14.
146
Ibidem. p. 15.
147
Lei nº. 5.648 de 11 de dezembro de 1970, art 2º: O Instituto tem por finalidade principal executar, no âmbito
nacional, as normas que regulam a propriedade industrial tendo em vista a sua função social, econômica,
jurídica e técnica. Parágrafo único: Sem prejuízo de outras atribuições que lhe forem cometidas, o Instituto
adotará, com vistas ao desenvolvimento econômico do País, medidas capazes de acelerar e regular a
transferência de técnologia e de estabelecer melhores condições de negociação e utilização de patentes,
cabendo-lhe ainda pronunciar-se quanto à conveniência da assinatura ratificação ou denúncia de convenções,
tratados, convênio e acôrdos sôbre propriedade industrial.
148
Lei nº 5772/71, art. 126. Ficam sujeitos à averbação no Instituto Nacional da Propriedade Industrial, para os
efeitos do artigo 2º, parágrafo único, da Lei n. 5.648, de 11 de dezembro de 1970, os atos ou contratos que
impliquem em transferência de tecnologia.
149
Decreto nº 68.104/71, art 3º Ao INPI, sem prejuízo de outras atribuições que lhe forem cometidas, tendo em
vista o desenvolvimento econômico do pais, compete: I - Adotar medidas capazes de acelerar e regular a
transferência de ciência e de tecnologia bem como estabelecer melhores condições de negociação e utilização
de patentes; II - Pronunciar-se quanto à conveniência de assinatura, ratificação ou denúncia de convenções,
tratados, convênios e acôrdos sôbre propriedade industrial; III - Criar melhores condições de absorção,
adaptação ou desenvolvimento de ciência ou tecnologia, através do pleno aproveitamento das informações
acumuladas e de ampla divulgação nos setores industriais ou de pesquisa.
  63  
 
inclusive classificando suas espécies e enumerando as cláusulas e as cláusulas restritivas a
serem vedadas. Estas últimas eram sustentadas pela teoria do abuso de poder econômico e de
modo geral, eram proibidas as cláusulas que limitassem preço, venda, produção,
comercialização ou implicassem em controle de mercado.150

Ainda por força do Ato Normativo nº 15, o INPI estava legitimado a realizar uma
análise econômica dos contratos, determinando a viabilidade da importação de uma
tecnologia. Também poderia proibir a transferência, caso julgasse que o receber seria capaz de
produzir a mesma técnica nacionalmente.151

Este cenário revelou resultados animadores com grande crescimento econômico,


intitulado de “milagre brasileiro” e a visão para o desenvolvimento tecnológico do Brasil era
bastante otimista. No entanto, o modelo protecionista de substituição de importações começou
a revelar suas falhas no final da década de 1979, quando os efeitos da crise internacional
desestabilizaram a economia brasileira já altamente endividada.152

Com a forte regulamentação da tecnologia, os setores de agrotecnologia e


aeroespaciais desenvolveram significativamente, mas de um modo geral, o programa
governamental industrial de P&D não foi eficiente, pois não estabeleceu um relacionamento
com o setor produtivo. Ainda, em comparação com outros países da Ásia no mesmo período,
os investimentos brasileiros em P&D foram baixos. A baixa qualidade educacional a níveis
básicos, universitários e de pós graduação agravada pela pequena proporção de estudantes nas
áreas de ciência e engenharia, contribuiu substancialmente para que o Brasil não apresentasse
o mesmo desempenho que outros países, como a Coreia do Sul.153

Findo o regime militar, o primeiro governo encontrou o cenário econômico e industrial


brasileiro sob as seguintes condições, de acordo com Peter Kingstone154:

                                                                                                                       
150
BARBOSA, Denis Borges. Uma introdução... Op. cit., 2003. p. 979 – 980.
151
TIMM, Luciano Benetti. OP., cit., 2008. p. 27.
152
KINGSTONE, Peter R. Sobering Up and Going Global: Brazil’s Progress from Populism and Protectionism.
Law & Business Review of the Americas. 15, 2009. p. 105-126.
153
METCALFE, J. S.; ROMLOGAN, R.; e UYARRA, E., Competiton, Innovation and Economic Development:
The Institued Connection. In: COOK, Paul et. al. (Ed.). Op., cit., 2004. p. 85.
154
(Tradução livre de: “The concern among these BNDES economists was that the Brazilian economy was
falling behind the rest of the world technologically. In their view, the economy was divided between competitive
and modern sectors on the one hand and backwards and uncompetitive sectors on the other. The competitive
and modern sectors were losing ground in the global economy because of the state’s disorder and the resulting
loss of investment capacity. The uncompetitive sectors, while not aware of their backwardness, were important
because this group’s noncompetitiveness was a drag on economic growth. The solution, in the economists’
  64  
 
A preocupação dos economistas do BNDES era que a economia brasileira estava
ficando para trás do restante do mundo tecnologicamente. Na visão deles, a
economia estava divida entre setores modernos e competitivos de um lado, e setores
defasados não competitivos do outro. Os setores modernos e competitivos estavam
perdendo espaço na economia global, devido à desordem do estado e à resultante
perda de capacidade de investimentos. Os setores não competitivos, ainda que
inconscientes de sua defasagem, possuíam importância, pois sua falta de
competitividade representava um entrave ao crescimento econômico. A solução, na
visão dos economistas, era o afastamento do modelo de substituição de importação e
a busca por maior integração com a economia global. O objetivo desta estratégia de
“integração competitiva” era fechar a lacuna entre setores modernos e defasados e
aumentar a competitividade geral da economia brasileira.

A estratégia de liberalização da economia foi sistematicamente adotada a partir de


1990 com o governo Collor. Em consonância com estes novos objetivos do Estado, O INPI
editou uma série de atos normativos que conferiram maior liberdade aos contratantes, pois a
regulamentação não poderia significar em um bloqueio à aquisição de tecnologia. Em especial
o Ato Normativo nº 120 de 1993, que removeu os requisitos obrigatórios para os contratos de
transferência de tecnologia e impôs o registro por decurso de prazo. Além disso, também foi
retirada da autarquia a discricionariedade para analisar as cláusulas.155

Dando sequencia à estratégia liberalizante, o Brasil aderiu ao TRIPS e aprovou o


Acordo Constitutivo da OMC através do Decreto Legislativo nº 3 de 15 de dezembro de 1994.

Para adequar-se aos padrões previstos pelo Acordo, foi necessária a revisão da
legislação de propriedade intelectual, bem como a aprovação de novas leis sobre a matéria
que, de modo geral, atenderam aos standards mínimos exigidos.156

Quanto à transferência de tecnologia, as principais modificações legislativas


ocorreram com a entrada em vigor da Lei nº 9.279, de 14 de maio de 1996, que revogou o
Código de Propriedade Industrial de 1971 e o parágrafo único do artigo 2º da Lei 5.648/70, e
ainda com a Lei nº 8.884/94 (Lei Antitruste).

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                     
view, was to turn away from import-substitution-industrialization and instead seek greater integration with the
global economy—but on Brazil’s terms. The strategic objective of this “competitive integration” was to close
the gap between the modern and backwards sectors and increase the overall competitiveness of the Brazilian
economy.”). KINGSTONE, Peter R. Op. cit. p. 108.
155
Ato Normativo 120/93, art. 4: “No processo de averbação de que trata este Ato Normativo, o INPI limitará
sua análise à verificação da situação das marcas e patentes licenciadas, para cumprimento dos dispositivos dos
artigos 30 e 90 (e seus parágrafos) do Código da Propriedade Industrial, bem como à informação quanto aos
limites aplicáveis - de acordo com a legislação fiscal e cambial vigente - de dedutibilidade fiscal para fins de
apuração de Imposto de Renda, e de remissibilidade em moeda estrangeira, dos pagamentos contratuais.”
156
BASSO, Maristela. Op. cit., 2000. p. 285.
  65  
 
Com a nova legislação, o controle das cláusulas restritivas passou a ser fundamentado
pela defesa da livre concorrência, em conformidade com os padrões estabelecidos pelo artigo
40 do TRIPS. Por este motivo, os parâmetros de análise foram inseridos na Lei Antitruste, e a
regulamentação dos contratos de transferência de tecnologia deslocou-se do INPI para o
CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica), conforme o artigo. 54 da referida
lei.

O CADE efetuaria um controle preventivo sobre atos específicos, diferentemente do


INPI que tinha legitimidade para analisar qualquer contrato com base em um juízo de
discricionariedade. Apenas os atos que de alguma forma poderiam implicar em dominação de
mercado, na forma do artigo 54157, deveriam ser submetidos a avaliação. Ainda, o critério de
razoabilidade adotado por este dispositivo também foi compatível com o TRIPS, visto que
algumas práticas anticompetitivas poderão ser autorizadas se implicarem em benefícios
econômicos e sociais, conforme a regra da razão.158

Vale destacar que a Lei 8.884/94 foi revogada pela atual Lei 12.529/2011. No diploma
contemporâneo os atos que implicam em dominação de mercado e que devem ser notificados
ao CADE estão definidos no artigo 88 , §5º, e os critérios de razoabilidade para a autorização

                                                                                                                       
157
“Art. 54. Os atos, sob qualquer forma manifestados, que possam limitar ou de qualquer forma prejudicar a
livre concorrência, ou resultar na dominação de mercados relevantes de bens ou serviços, deverão ser
submetidos à apreciação do CADE.
§ 1º O CADE poderá autorizar os atos a que se refere o caput, desde que atendam as seguintes condições:
I - tenham por objetivo, cumulada ou alternativamente:
a) aumentar a produtividade;
b) melhorar a qualidade de bens ou serviço; ou
c) propiciar a eficiência e o desenvolvimento tecnológico ou econômico;
II - os benefícios decorrentes sejam distribuídos eqüitativamente entre os seus participantes, de um lado, e
os consumidores ou usuários finais, de outro;
III - não impliquem eliminação da concorrência de parte substancial de mercado relevante de bens e
serviços;
IV - sejam observados os limites estritamente necessários para atingir os objetivos visados.
§ 2º Também poderão ser considerados legítimos os atos previstos neste artigo, desde que atendidas pelo
menos três das condições previstas nos incisos do parágrafo anterior, quando necessários por motivo
preponderantes da economia nacional e do bem comum, e desde que não impliquem prejuízo ao consumidor ou
usuário final.”
158
Este critério de razoabilidade também é compatível com ordenamento brasileiro conforme a teoria do abuso
de direito. Não haveria abuso de direito caso a prática conferisse benefícios econômicos e sociais, em
atendimento ao interesse público.
  66  
 
destas práticas estão previstos do §6º.159 De modo geral os padrões para os contratos de
transferência de tecnologia permaneceram os mesmos, restando dúvidas apenas em relação ao
disposto no artigo 90. Este dispositivo enumera de forma objetiva os atos que per si implicam
em concentração de poder de mercado e que devem obrigatoriamente ser notificados ao
CADE. O inciso IV determina que há concentração quando “2 (duas) ou mais empresas
celebram contrato associativo, consórcio ou joint venture”. Assim, transferências de
tecnologia em contratos horizontais destas espécies obrigatoriamente devem ser submetidos a
avaliação. Porém doutrina e jurisprudência não entraram em consenso a respeito do que
significaria “contratos associativos”, e se abrangeriam qualquer forma de contrato de
transferência de tecnologia.160

Quanto à Lei de Propriedade Industrial, pode-se afirmar que os padrões de proteção


conferidos pela Lei 9.279/96 foram além do nível mínimo exigido pelo TRIPS. Como
exemplos podem ser citados a inclusão da patente pipeline, que confere proteção retroativa a
tecnologias já em domínio público, o abandono do critério de tutela do meio-ambiente como
justificativa para denegação de patentes e a possibilidade de declaração judicial de
prorrogação de patentes, mesmo contra o próprio texto da OMC.161

Além disso, o Brasil também abriu mão do prazo de carência especial concedido pelo
Acordo aos países em desenvolvimento. Pelo artigo 65.2 o Brasil teria direito a quatro anos
para se adequar aos novos padrões, mas a legislação brasileira foi alterada apenas um ano e
meio após a entrada em vigor do TRIPS.
                                                                                                                       
159 o
§ 5 Serão proibidos os atos de concentração que impliquem eliminação da concorrência em parte substancial
de mercado relevante, que possam criar ou reforçar uma posição dominante ou que possam resultar na
dominação de mercado relevante de bens ou serviços, ressalvado o disposto no § 6o deste artigo.
§ 6o Os atos a que se refere o § 5o deste artigo poderão ser autorizados, desde que sejam observados os limites
estritamente necessários para atingir os seguintes objetivos:
I - cumulada ou alternativamente:
a) aumentar a produtividade ou a competitividade;
b) melhorar a qualidade de bens ou serviços; ou
c) propiciar a eficiência e o desenvolvimento tecnológico ou econômico; e
II - sejam repassados aos consumidores parte relevante dos benefícios decorrentes.
160
Para saber mais sobre as implicações da nova lei, vide: RAMOS, André Luiz Santa Cruz Ramos. A nova lei
antitruste brasileira: uma agressão à livre concorrência. Disponível em:
<http://www.mises.org.br/Article.aspx?id=1319> Acesso em: dezembro 2014. BARRIOS, Lucas. O contrato
internacional de transferência de tecnologia e o Direito da Concorrência no Brasil: análise à luz da
recente jurisprudência do Cade. Revista de Defesa da Concorrência., 2004, 4. p. 117-143.
161
BARBOSA, Denis Borges. Trips e a Experiência Brasileira. Disponível em
<http://www.denisbarbosa.addr.com/trips2004.doc>. Acesso em: novembro de 2014.
  67  
 
Isto demonstra que o país não se aproveitou das brechas concedidas pelo Acordo. As
disposições que conferiam flexibilidade possuíam o objetivo de viabilizar a ordem
internacional visada pela OMC sem comprometer o desenvolvimento dos países. Estes
mecanismos de adequação foram inseridos justamente a partir da compreensão de que padrões
elevados de proteção da propriedade intelectual podem diminuir a competitividade de países
menos desenvolvidos tecnologicamente, mesmo diante de um aumento dos investimentos
estrangeiros. O Brasil acabou cedendo às pressões norte-americanas e restou evidenciada a
falta de planejamento político e econômico.162

Analisando-se a experiência de países que tiveram resultados positivos com suas


políticas de desenvolvimento tecnológico, como os Tigres Asiáticos e mais recentemente a
Índia, podem ser feitas algumas generalizações. Após períodos de intensos investimentos em
infraestrutura, P&D e recursos humanos, a baixa proteção da propriedade industrial nestes
países, acompanhada de medidas de liberalização econômica facilitaram a difusão de
tecnologia por imitação. Além disso, os setores industriais mais incentivados foram os
produtores de tecnologias de ponta, que após importações frequentes de tecnologia, passaram
a prosseguir por conta própria.163

De um modo geral, a partir dos apontamentos realizados neste trabalho, pode-se


afirmar que tanto as políticas tecnológicas protecionistas como as liberalizantes precisam ser
amparadas por um planejamento coeso e incentivos maciços à educação e P&D nos setores
público e privado para que o desenvolvimento ocorra. Nas palavras de J. S. Metcalfe e outros,
a respeito da experiência brasileira em transferência de tecnologia, “essa visão é reforçada por
pesquisas mais recentes que também identificaram falhas em intensificar atividade de P&D no
setor privado, no contexto de comércio rápido e liberalização de mercado e da retirada do
estado da atividade produtiva na década de 1990”.164

Apesar da aparente estratégia brasileira em atrair investimentos estrangeiros mediante


a liberalização da economia, algumas políticas recentemente adotadas revelam

                                                                                                                       
162
ROCHA, Thiago Gonçalves Paluma. op. cit. 2011. p. 81.
163
Para saber mais: SOON, Thiam Tan e HUAT, Tan Chwee. Role of Transational Corporations in Transfer of
Technology to Singapore. In: CHATTERJI, Manas (Ed.). Op. cit., 1994. p. 335-344.
164
(Tradução livre de: “This view is reinforced by more recent research which also identifies the failures to
intensify R&D activity in the private sector in the context of rapid trade and market liberalisation, and the
withdrawal of the state from productive activity in the 1990’s.”). METCALFE, J. S.; ROMLOGAN, R.; e
UYARRA, E., Competiton, Innovation and Economic Development: The Institued Connection. In: COOK, Paul
et. al. (Ed.). Op., cit., 2004. p. 85
  68  
 
desalinhamento com os interesses nacionais. Por um lado, o deslocamento do controle das
cláusulas restritivas em contratos de transferência de tecnologia do INPI para o CADE,
adotando os critérios de proteção da livre concorrência eleitos pelo TRIPS, significou uma
facilitação para a aquisição de tecnologia. Por outro lado, sem altos investimentos em
infraestrutura, P&D e em recursos humanos, tal esforço terá sido em vão, pois não haverá
possibilidade de emparelhamento tecnológico diante dos altos níveis de proteção da
propriedade industrial conferidos pela Lei Lei 9.279/96 que inviabilizam a difusão de
tecnologia por imitação.
  69  
 
CONSIDERAÇÕES FINAIS

Conforme exposto no presente trabalho, os contratos internacionais de transferência de


tecnologia constituem ferramenta fundamental para o desenvolvimento nacional, por
possibilitarem a aquisição rápida de tecnologia, o que constitui ingrediente fundamental para a
melhoria da competitividade do país na economia globalizada marcada pelo veloz fluxo de
informações.

No entanto, para que estes contratos signifiquem benefícios reais para o país, é
necessário que ocorra a efetiva absorção e assimilação da tecnologia recebida. Para isso, é
preciso haver equilíbrio contratual, evitando a utilização de cláusulas abusivas ou restritivas
por parte das empresas estrangeiras, e os setores público e privado devem apresentar
capacidade tecnológica.

Para isso, o Estado deve disponibilizar instituições capazes de contribuir com esse
processo de absorção de tecnologia, incentivo à pesquisa, promoção de parceria em P&D
entre setores públicos e privados, inserção de tecnologia a exportações antes realizadas in
natura, dentre outras medidas. Ou seja, é importante que haja um constante diálogo entre o
Estado e o mercado, de forma cooperativista, de tal sorte que instrumentos contratuais, como
a função social do contrato, por exemplo, não seja encarada pelos contratantes como um ônus,
mas como uma característica de benefício coletivo e social do contrato, que extrapola o
privado e produz efeitos sobre o público.

A partir disto, podem ser feitas algumas recomendações para que o Brasil obtenha
sucesso com uma política tecnológica com vistas ao desenvolvimento.

Com a liberalização da economia e a integração internacional os investimentos


estrangeiros aumentaram, estimulando os variados setores da indústria a se modernizarem. As
transacionais detentoras de tecnologia ficaram mais seguras em investir no Brasil, após a
adoção de altos níveis de proteção da propriedade industrial.

Porém não se pode permitir que o desenvolvimento nacional fique totalmente a mercê
dos investidores estrangeiros. A implementação de uma política tecnológica coesa é
indispensável para a ocorrência de transferência de tecnologia de maneira efetiva. Além da
regulação dos contratos por meio do CADE, é necessária a ampla utilização de mecanismos
  70  
 
que confiram poder de barganha às empresas domésticas, através do fornecimento de auxílio
técnico.

As políticas públicas devem ser incisivas para a construção de infraestrutura e recursos


humanos e para o aumento dos investimentos em P&D, tanto no âmbito das empresas quanto
no setor público. Apenas com o equilíbrio entre importações de tecnologia e desenvolvimento
interno será possível o fechamento da lacuna tecnológica existente entre o Brasil e grandes
produtores de conhecimento no mercado global.
  71  
 

REFERÊNCIAS

ARAÚJO, Nádia. Contratos Internacionais: Atonomia da Vontade, Mercosul e


Convenções Internacionais. 4ª ed., Rio de Janeiro: Renovar, 2009.

BARBOSA, Denis Borges. Tipos de Contratos de propriedade industrial e transferência


de tecnologia. Disponível em: <http://denisbarbosa.addr.com/paginas/200/propriedade.html>,
2002. Acesso em: novembro de 2014.

______________________. Trips e a Experiência Brasileira. Disponível em


<http://www.denisbarbosa.addr.com/trips2004.doc>. Acesso em: novembro de 2014.

______________________. Uma introdução à propriedade industrial. Rio de Janeiro:


Lumen Juris, 2ª ed., 2003.

______________________. TRIPs e as Cláusulas abusivas em Contratos de tecnologia e


Propriedade industrial. Disponível em: <http://www.denisbarbosa.addr.com/p
aginas/200/propriedade.html>, 2002. Acesso em: novembro de 2014.

BARRAL, Welber; PIMENTEL, Luiz Otávio. Propriedade Intelectual e Desenvolvimento,


Florianópolis: Editora Fundação Boiteux, 2007.

BARRIOS, Lucas. O contrato internacional de transferência de tecnologia e o Direito da


Concorrência no Brasil: análise à luz da recente jurisprudência do Cade. Revista de
Defesa da Concorrência., 2004, 4. p. 117-143.

BASSO, Maristela. O Direito Internacional da Propriedade Intelectual. Porto Alegre:


Livraria do Advogado. 2000.

CASSIER, Vincet; REMICHE, Bernard. Droit des brevets d’invention et du savoir-faire.


Bruxelas: Larcier. 2010.

CHATTERJI, Manas (Ed.). Technology Transfer in the Developing Countries. London:


Macmillan Press, 1994.

COOK, Paul et. al. (Ed.) Leading Issues inCompettion Regulation and Development.
Cheltenham UK: Edward Elgar. 2004.

CORRÊA, Daniel Rocha. Contratos de Transferência de Tecnologia: fundamentos para o


controle de práticas abusivas e cláusulas restritivas. Belo Horizonte: Movimento Editorial
da Faculdade De Direito da UFMG, 2005.

DAVIS, Kevin E. and TREBILCOCK, Michael J.. A relação entre direito e


desenvolvimento: otimistas versus céticos. Rev. direito GV [online]. 2009, vol.5, n.1, pp.
222 et seq.

DI LORENZO, Giovanni. Abuso di dipendenza econômica e contratto nullo. Padova:


CEDAM, 2009.
  72  
 
DINIZ, Davi Monteiro. Propriedade industrial e segredo em comércio. Belo Horizonte:
Del Rey. 2003.

DOSI, Giovanni. Technological paradigms and technological trajectories. Research Policy


11, North-Holland Publishing Company, 1982.

FARIA, José Eduardo (Org.). Direito e globalização econômica: implicações e


perspectivas. São Paulo: Malheiros, 1994

FARIA, José Eduardo. O Direito na Economia Globalizada. São Paulo: Malheiros. 2002.

FERRARO, Valkiria Aparecida Lopes; CONSELVAN, Jussara Seixas. Os Contratos de


Transferência de Tecnologia e os Limites à Autonomia Privada . In: Scientia Iuris,
Londrina, v.13, p.65-87. Disponível em: <http://www.uel.br/revistas/uel/index.php/
iuris/article/view/4092/3488>. Acesso em 12 maio 2013.

FLORES, César. Contratos Internacionais De Transferência De Tecnologia: Influência


Econômica. Rio de Janeiro: Lumen Juris., 2003.

FREEMAN, Chris; SOETE, Luc. A Economia da Inovação Industrial. Tradução de André


Luiz Sica de Campos e Janaína Oliveira Pamplona da Costa. Campinas, SP: Editora da
Unicamp, 2008.

FURTADO, Gustavo Guedes. Transferência de Tecnologia no Brasil: Uma análise de


Condições Contratuais Restritivas. Rio de Janeiro: Universidade Federal do Rio de Janeiro,
2012.

GERHART, Peter M. The Tragedy of TRIPS. Faculty Publications. 2007, Paper 157, p.
155. Disponível em: <http://scholarlycommons.law.case.edu/faculty_publications/157>
Acesso em: novembro 2014.

HAUG, David M. The international transfer of technology: lessons that east Europe can
learn from the failed third world experience. Harvard Journal of Law & Technology, V. 5,
Spring Issue, 1992.

KINGSTONE, Peter R. Sobering Up and Going Global: Brazil’s Progress from Populism
and Protectionism. Law & Business Review of the Americas. 15, 2009. p. 105-126.

MELLO, Celso D. de Albuquerque. Direito Internacional Econômico. Rio de Janeiro:


Renovar, 1993.

MOSER, Petra. Patents and Innovation: evidence from economic history. Stanford Law
and Economics Olin Working Paper No. 437. 2012. Disponível em
SSRN:< http://ssrn.com/abstract=2180847> Acesso em: outubro de 2014.

OLIVEIRA, Daniela Rodrigues. As flexibilidades do Acordo TRIPS na nova dinâmica


comercial internacional. Brasília: Boletim Científico ESMPU, a. 11. 2011. pp. 11-33.

PELAEZ, Victor; SZMRECSÁNYI, Tamás (Org.). Economia da Inovação Tecnológica.


São Paulo: Editora Hucitec, 2006.
  73  
 
POSNER, Richard A., The economics of Justice. Cambridge : Harvard University Press,
1983.

RAMOS, André Luiz Santa Cruz Ramos. A nova lei antitruste brasileira: uma agressão à
livre concorrência. Disponível em: <http://www.mises.org.br/Article.aspx?id=1319> Acesso
em: dezembro 2014.

ROCHA, Thiago Gonçalves Paluma. O Nível de Proteção da Propriedade Intelectual


Definido Pelo Acordo TRIPS/OMC e o Direito ao Desenvolvimento. Uberlândia:
Universidade Federal de Uberlândia, 2011.

SEN, Amartya. Desenvolvimento como liberdade. São Paulo: Companhia das Letras, 2000.

SCHUMPETER, Joseph Alois. Fundamentos do pensamento econômico. Tradução de


Edmond Jorge. Rio de Janeiro: Zahar, 1968.

STRENGER, Irineu. Contratos Internacionais do Comércio. 4ª ed., São Paulo: LRT, 2003.

TEIXEIRA, Francisco L. C., Desenvolvimento Industrial e Tecnologia: Revisão da


Literatura e uma Proposta de Abordagem. Cadernos EBAPE.BR (FGV), Rio de Janeiro,
2005.

TIMM, Luciano Benetti; COOTER, Robert D; SCHAEFER, B. O problema da


desconfiança recíproca. The Latin America and Carribbean Jornal Of Legal Studies V. 1.
Berkeley Eletronic Press. 2006. Disponível em: <http://services.bepress.com/lacjls/vol1/iss1/>
Acesso em: outubro de 2014.

TIMM, Luciano Benetti. Contrato internacional de transferência de tecnologia no Brasil:


intersecção da propriedade intelectual com o direito antitruste. Porto Alegre: III Prêmio
SEAE, 2008.

UNITED NATIONS CONFERENCE ON TRADE AND DEVELOPMENT (UNCTAD).


Transfer of Technology – UNCTAD Series on issues in internacional investment
agreements. Genebra, United Nations Publication, Sales nº E.01.II.D.33, 2001b.

UNITED NATIONS CONFERENCE ON TRADE AND DEVELOPMENT.,


Accelerating the Development Process: Challenges for national and international policies in
the 1990’s. Eighth session of the Conference. New York: UNITED NATIONS, 1991.

UNITED NATIONS. 3201 (S-VI). Declaration on the Establishment of a New


International Economic Order. General Assembly, 1974.

WADA, Ricardo Morishita. A defesa da concorrência e sua relação com a defesa do


consumidor – algumas proposições reflexivas. Revista de Direito Econômico, nº 30,
Brasília, 1999.

ZUIJDWIJK, Tom J. M. The UNCTAD Code of Conduct on the Transfer of Technology.


McGill Law Journal. Vol. 24:4, 1978. p. 564 et. seq.

Você também pode gostar