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Classificação das Constituições


Professor Me. Amarildo Lourenço
Teoria do Estado e da Constituição

I – Pra Início de Conversa

Na última aula, falamos sobre o conceito de Constituição e abordamos seu


sentido jurídico, político e sociológico. Lembram-se? Falamos, também, do
constitucionalismo e do neoconstitucionalismo. Agora, para avançarmos com o
nosso conteúdo, vamos abordar um tema muito interessante: a classificação das
Constituições.

Sempre que vamos classificar alguma coisa, é preciso, antes, estabelecer


os critérios de classificação. Apenas para ilustrar, veja o seguinte caso: Vocês
foram convidados por uma fábrica de automóveis para avaliar e classificar um
carro novo que está sendo lançado no mercado. Se vocês forem bons analistas
de carros, vão querer saber, antes de fazer a análise, quais são os critérios de
classificação, que poderiam ser, por exemplo: economia (carro econômico ou
não econômico), segurança (carro seguro ou inseguro), beleza (carro bonito ou
feio), conforto (carro confortável ou desconfortável), potência (carro muito
potente ou pouco potente), etc.

Perceberam? Antes de classificar qualquer coisa, é preciso definir os


critérios de classificação. Assim o faremos, quando tratarmos da classificação
das Constituições, logo em seguida.

Está bem assim? Vamos em frente!

2 Classificação das Constituições

As Constituições podem ser classificadas segundo muitos e diferentes


critérios, que variam segundo os diferentes autores. Vamos nos ater aos
seguintes critérios, que reputamos como os mais importantes: (a) quanto à
origem; (b) quanto à forma; (c) quanto ao modo de elaboração; (d) quanto ao
conteúdo; (e) quanto à estabilidade; (f) quanto à extensão.

2.1 Quanto à Origem

Quanto à origem, as Constituições podem ser (a) outorgadas, (b)


promulgadas e (c) cesaristas.

As Constituições outorgadas são aquelas em cuja elaboração não há a


participação popular. São Constituições impostas, autoritárias e sem debates
democráticos no seu processo de elaboração. No Brasil, em 1937, o Presidente
Getúlio Vargas deu um golpe de Estado, instituindo o chamado Estado Novo e
elaborando, segundo seus interesses e convicções, uma Constituição nova para o
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país. Trata-se de um bom exemplo de Constituição outorgada. Nessa mesma


classificação estão a Constituição do Império (1824), outorgada por Dom Pedro
I, e a Constituição de 1967, outorgada durante o regime militar brasileiro.

As Constituições promulgadas são também chamadas de populares ou


democráticas. Seu processo de elaboração se dá com a participação do povo,
normalmente por meio dos seus representantes eleitos, que formam a chamada
Assembleia Nacional Constituinte. Nessa Assembleia, é que ocorrem os debates
democráticos que, ao final, vão resultar na nova Constituição. A atual
Constituição Federal brasileira é um bom exemplo de Constituição promulgada.
Deputados e senadores foram eleitos pelo povo para elaborá-la e as discussões
parlamentares se deram entre 1987 e 1988, até que ela foi aprovada em
05/10/1988.

As Constituições cesaristas são aquelas que são, na verdade,


Constituições outorgadas que, depois de terem sido elaboradas sem a
participação popular, são submetidas ao referendo (ratificação) do povo, para
dar uma aparência de legitimidade.

2.2 Quanto à Forma

Quanto à forma, as Constituições podem ser escritas, o que ocorre


quando seu texto está consolidado em documento único, a exemplo do que
ocorre com a Constituição brasileira. Existem, também, as Constituições não
escritas, também chamadas de costumeiras ou consuetudinárias – baseadas
nos costumes do país. Na verdade, as chamadas Constituições não escritas são
formadas por leis esparsas (diversas leis aprovadas em épocas diferentes), pela
jurisprudência (precedentes dos tribunais superiores, sobretudo das Cortes
Supremas) e convenções sociais. O Reino Unido é um bom exemplo de país que
adota Constituição costumeira.

2.3 Quanto ao Modo de Elaboração

Quanto a esse critério, as Constituições podem ser ortodoxas (também


chamadas de simples), que são aquelas influenciadas por uma ideologia apenas.
Para exemplificar, Cuba possui uma Constituição ortodoxa, na medida em que
todos os seus artigos são influenciados pela ideologia socialista. Têm-se,
também, as Constituições ecléticas, também chamadas de compromissórias,
cujos textos são uma síntese de ideologias opostas que se harmonizam. É o caso
da Constituição Federal brasileira, que, por exemplo, contempla a livre
iniciativa e o direito de propriedade, traços marcadamente capitalistas, mas
prevê contempla, também, o valor social do trabalho e a função social da
propriedade, traços de clara influência socialista. Prevê a livre concorrência
(liberalismo econômico) e a redução das desigualdades (Estado social), além de
outras ideologias opostas conciliadas em seu texto.

2.4 Quanto ao Conteúdo


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Em relação ao conteúdo, a Constituição pode ser material ou formal. A


Constituição material é aquela em cujo texto encontram-se, apenas,
disposições (artigos, parágrafos, incisos, alíneas) de natureza constitucional.

Aqui, é importante fazer um esclarecimento: nem toda norma


constitucional tem natureza constitucional. Dizendo de outro modo: na
Constituição de um país são inseridas disposições que não poderiam estar em
nenhum outro lugar, senão na Constituição. São previsões que falam daquilo
que é mais essencial para o estatuto jurídico e político da nação, como a forma
de governo, a forma de Estado, o sistema de governo e os direitos fundamentais.
Essas, são normas de natureza constitucional. Quando uma Constituição possui
apenas regras assim, dizemos que ela é uma Constituição material.

Acontece que é possível que haja, na Constituição, alguma disposição que


não precisava estar exatamente ali. Por exemplo, uma disposição que estabelece
critérios para a aposentadoria (idade, tempo de contribuição, etc.) ou prazos
para propor ações trabalhistas. Ora, uma regra assim poderia estar num outro
tipo de lei que, ao menos em tese, produziria os mesmos efeitos.

Mas, por uma opção de quem elaborou a Constituição, resolveu-se


colocar o assunto ali, constitucionalizando o tema. Esse tipo de norma não tem
natureza constitucional, porque não tratam da essência do Estado. Por isso,
quando uma Constituição as possui, é chamada de Constituição formal, que é,
justamente, aquele tipo de Constituição que contém normas materialmente
constitucionais (de natureza constitucional) e normas que são apenas
formalmente constitucionais (têm forma constitucional, mas natureza não
constitucional).

Uma pergunta importante poderia ser feita aqui: é possível que exista
alguma norma que tem natureza constitucional, mas que não esteja prevista na
Constituição escrita de um país? A resposta é afirmativa. Lembram-se que na
aula passada falamos sobre o bloco de constitucionalidade? Dá uma olhadinha
lá! Vimos que, segundo o neoconstitucionalismo, tratados e convenções
internacionais que versam sobre Direitos Humanos têm a mesma eficácia de
norma constitucional. É isso. Tais tratados têm natureza constitucional, mesmo
que não façam parte do texto da Constituição.

A Constituição brasileira é uma Constituição formal, visto que em seu


texto há disposições de natureza constitucional e disposições de natureza não
constitucional.

2.5 Quanto à estabilidade

Quanto ao critério da estabilidade, temos as Constituições rígidas, que


são aquelas que, para serem alteradas (por meio das chamadas Emendas
Constitucionais), exige-se um processo mais dificultoso, com a adoção de uma
série de exigências e vedações. É o caso da nossa Constituição. Em períodos à
frente do curso, será estudado, de maneira mais detalhada, o processo de
Emendas à nossa Constituição. Podemos adiantar, contudo, algumas
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dificuldades que são colocadas pela própria Constituição: não basta ter a
maioria dos votos para se aprovar uma Emenda, mas são necessários 3/5 (três
quintos) dos votos; as Emendas têm que ser aprovadas duas vezes na Câmara
dos Deputados e duas vezes no Senado; não podem ser abolidas as cláusulas
pétreas, como os direitos individuais, etc.

Todavia, quando o processo de alteração de uma Constituição for o


mesmo processo utilizado para a alteração das demais leis que estão abaixo da
Constituição (que integram o que vamos chamar de Direito Ordinário),
chamamos essa Constituição de flexível. Normalmente, são flexíveis as
Constituições costumeiras, considerando a possibilidade de que as leis esparsas
que a compõem podem (ou possam) ser alteradas de modo menos dificultoso.

Ainda dentro deste critério, podemos mencionar as Constituições


imutáveis, que não podem ser alteradas, e as Constituições semirrígidas,
que possuem trechos de alteração rígida e trechos de alteração flexível.

2.6 Quanto à Extensão

Quanto à extensão, as Constituições podem ser analíticas, que são


aquelas que possuem um texto mais longo e detalhado, com um conjunto mais
amplo de disposições; e podem ser sintéticas, que são mais principiológicas,
com textos mais curtos.

A Constituição brasileira é analítica, contendo 250 artigos, que tratam de


princípios fundamentais, de direitos e garantias fundamentais, da organização
do Estado, da organização dos Poderes, de normas tributárias, da ordem social,
etc., mais o Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), com 114
artigos.

Quadro 1 – Classificação das Constituições


Critério Modos de Classificar
Origem Outorgadas Promulgadas Cesaristas
Forma Escritas Não Escritas ***
Modo de Elaboração Ortodoxas Ecléticas ***
Conteúdo Materiais Formais ***
Estabilidade Rígidas Flexíveis Imutáveis e
Semirrígidas
Extensão Analíticas Sintéticas ***

Quadro 2 – Modo de classificar a Constituição Federal de 1988


Critério Constituição Federal de 1988
Origem PROMULGADA (DEMOCRÁTICA)
Forma ESCRITA
Modo de Elaboração ECLÉTICA
Conteúdo FORMAL
Estabilidade RÍGIDA
Extensão ANALÍTICA
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BIBLIOGRAFIA INDICADA

BRASIL. [Constituição (1988)]. Constituição da República Federativa do Brasil:


promulgada em 5 de outubro de 1988. Disponível em
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm#adct

LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado. Editora Saraiva.

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