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FERTILIDADE DO SOLO 11

1.3.1. Técnicas de Colheita de amostras de Solo


O conhecimento do estado nutricional do solo é bastante importante não só como
diagnóstico da situação do solo, mas também, para recomendações de fertilização. Para
tal é necessário fazer a colheita de amostras de solo. Esta operação, tem uma grande
importância, porque a amostra deve representar fielmente a natureza e composição do
solo em causa. Por isso uma amostra mal colhida é, logo de início, uma causa
fundamental de erro, uma vez que ela não representa fielmente as características físico-
químicas do solo.

A representatividade da amostra em relação aos solos da área em causa é aspecto


essencial para o sucesso dos resultados do diagnóstico. Por isso, é muito importante
conhecer o número de amostras a colher numa dada área ou encontrar formas de
conseguir a representatividade da amostra independentemente do número de sub-
amostras.

O factor chave a levar em consideração é a homogeneidade ou diversidade da área em


causa. Se os solos são homogéneos e a superfície da área não excede a 5 ha, bastará
colher uma única amostra. Mas se a parcela for heterogénea e extensa será necessário
colher tantas amostras quantas unidades diferentes de solos existirem.

Daí que é importante, antes de proceder à colheita das amostras, avaliar a uniformidade
do terreno de modo a saber o número de amostras necessárias. A avaliação consiste na
observação e distinção das diferenças existentes nas unidades de solo através da cor,
topografia, textura e tipo de vegetação.

Por exemplo se a área em causa apresenta uma topografia ondulada, os solos dos locais
mais baixos irão apresentar provavelmente cores mais escuras do que os solos do topo,
por isso, será necessário retirar amostras diferentes destas duas realidades. Por outro
lado, a área pode ser plana, contudo, com locais de vegetação abundante e noutros,
vegetação escassa, merecendo assim tratamento diferente.

Uma amostra é constituída, no mínimo, por amostras parciais colhidas em 15 a 20 pontos


diferentes. Em seguida, misturam-se as sub-amostras num saco ou balde e retiram-se
1000 g de solo e colocam-se num saco de plástico, indicando a data da colheita, nome do
local onde foi colhido e o número da amostra.
A profundidade de colheita da amostra deve ser constante, sendo recomendado a
profundidade de 20 cm para o caso em que se pretende estabelecer culturas anuais e 20 a
40 cm caso se pretende estabelecer fruteiras arbóreas e/ou culturas permanentes. Os
pontos de colheita de amostras devem ser previamente limpos de pedras, plantas, ervas e
resíduos.

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Existem várias maneiras de escolher os pontos para a colheita das amostras:

a) Transectos – traçam-se (imaginam-se) várias linhas paralelas separadas por 30 a 50


metros, de modo a cobrirem a parcela desejada e em cada 30 passos faz-se a colheita
das sub-amostras (veja figura 3).

Transecto 1

50 m

transecto 2

Figura 3. Esquema da colheita de amostras em Transectos

b) Ziguezague – percorre-se em ziguezague a área de levantamento para a colheita de


sub-amostras e colhem-se de 30 em 30 passos (veja a figura 4).

Figura 4. Esquema da colheita em Ziguezague

c) Círculos e “estrela” – estabelece-se o centro e fazem-se vários círculos imaginários


com diâmetros cada vez maiores; percorre-se o polígono de cada círculo e, em cada
30 passos, colhe-se uma sub-amostra, ou ainda podem colher-se amostras parciais
em pontos dispostos em forma de estrela com um raio de cerca de 20 a 30 metros,
com colheita em cada 30 passos.

A colheita efectua-se, de preferência, com uma sonda, mas uma pá pode também ser
utilizada. Contudo, com a pá corre-se o risco de as profundidades de colheita das
amostras serem irregulares e haverá então necessidade de se abrir uma cova até à
profundidade desejada.

Os materiais necessários para a colheita de amostras de solos são: sonda, enxada ou pá


(veja a figura 5), balde, sacos plástico, etiquetas e marcador.

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FERTILIDADE DO SOLO 13

Figura 5. Colheita de amostras de solo utilizando: a) enxada e b) pá

Após a colheita as amostras são enviadas aos laboratórios de análise de solos.


Durante este processo deve-se evitar colher amostras em locais encharcados, próximos de
caminhos, habitação, de estábulos ou onde tenham montes de estrume, sacos de adubo,
cinzas ou outros produtos, pois os resultados daí obtidos não serão representativos da
área em causa.

1.3.1.1. Análise de amostras do solo

A capacidade do solo em fornecer nutrientes à planta é avaliada através da análise do


solo que mede a quantidade de cada nutriente que se encontra disponível no solo e que
pode ser absorvido pela planta.

Uma interpretação correcta dos valores obtidos é essencial para tirar o máximo proveito
das análises do solo. Essa interpretação é obtida através de várias experiências de campo
com culturas e posteriores análises do solo.

A fertilidade do solo tem grande variabilidade. Independentemente da cultura e do


método de análise utilizado, o solo é classificado como fazendo parte de uma das
seguintes classes de fertilidade:

1. Muito baixa – Indica que a quantidade do nutriente disponível no solo é muito


reduzida e que com a sua aplicação são de esperar, em princípio, grandes aumentos
de produção.
2. Baixa – A quantidade do nutriente disponível no solo é insuficiente para satisfazer
as necessidades da cultura, com a sua aplicação são de prever aumentos
significativos de produção.
3. Média – A quantidade do nutriente no solo é satisfatória mas, com a sua aplicação,
ainda são de prever, na maioria dos casos, aumentos de produção.
4. Alta – As disponibilidades do nutriente são elevadas, podendo em alguns casos e
em alguns anos verificarem-se produções cada vez mais decrescentes.
5. Muito alta – A disponibilidade de nutrientes é muito alta, não havendo resposta da
planta, na maioria dos casos, podendo até haver decréscimo de produção.

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Por essa razão e para simplificar a interpretação de dados obtidos através de


determinações laboratoriais, há tabelas que relacionam as quantidades do elemento e a
classe de fertilidade, como por exemplo a tabela 5.

Tabela 5. Classes de fertilidade do solo com base no seu conteúdo de nutrientes

Classe de fertilidade
em ppm Método
Nutriente Miuto Muito utilizado
baixa Baixa Média Alta alta
P <5 5-9 10-17 18-25 >25 (1)
K <50 50-100 100-175 175-300 >300 (2)
Mg <20 20-40 40-80 80-180 >180 (2)
Mn <24 24-90 91-360 361-1400 >1400 (3)
Fe <31 31-75 75-200 201-500 >500 (3)
Zn <0,6 0,6-1,5 1,6-5,0 5,1-15 >15 (3)
Cu <0,8 0,8-2,0 2,1-6,0 6,1-20 >20 (3)
Fonte: Menete e Chongo, 1999 citando IFA, 1992

Métodos de extracção:
(1) Método de Olsen
(2) Método de acetato de amónia a pH 7.
(3) Método de extracção com acetato de amónia e EDTA

Na tabela acima, não consta o azoto, porque a recomendação para a sua adubação
depende de ensaios de campo e não do seu conteúdo no solo.

1.3.1.2. Avaliação do estado nutritivo das plantas

Diagnóstico Visual
Uma boa produção e uma boa qualidade dos produtos agrícolas só podem ser
conseguidos através do fornecimento adequado de nutrientes à planta. Quando a
concentração do nutriente nos tecidos da planta for demasiadamente baixa ou
exageradamente elevada surgem habitualmente sintomas de deficiência ou excesso, nos
caules, nas folhas ou nos frutos. Por isso o diagnóstico visul serve como método de
avaliação do estado nutritivo das culturas se os sintomas estiverem perfeitamente
relacionados com as suas causas.
É preciso também saber que os sintomas só se manifestam quando a deficiência ou a
toxicidade atingem um certo limite. Assim, a planta poderá ter estado sujeita, durante um
período longo, à falta ou excesso de nutrientes e não apresentar sintomas. No entanto a
redução da produção ou alteração na qualidade de produtos serão um facto.

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Diagnóstico laboratorial

A análise foliar constitui um método seguro para o diagnóstico do estado nutritivo das
culturas. Ela consiste, na análise química das folhas da planta.
A análise foliar, juntamente com a análise do solo permitem o monitoramento e
elaboração das estratégias de fertilização para a cultura em causa. Contudo, há casos em
que as análises do solo podem indicar suficiência de nutrientes e o diagnóstico visual e
foliar indicarem deficiência. Nestes casos, haverá outros factores que poderão estar a
dificultar a disponibilidade dos nutrientes. Estes factores poderão ser: humidade do solo,
aeração, luz, temperatura, práticas culturais, reacção do solo e pragas e doenças.
Como a composição química da planta varia com a idade e com a parte da folha
analisada, é fundamental seleccionar correctamente, para cada cultura, as folhas a serem
analisadas e dispor de valores padrões interpretativos para os diversos nutrientes.

Instrução para colheita e manuseamento de amostras para análise foliar

Para obtenção de amostras representativas e sem contaminação é importante seguir


certas regras:

1) Identificar as zonas mais ou menos uniformes em relação à variedade, idade, vigor,


estado sanitário, coloração da folhagem e tipo de solo;
2) Proceder à colheita de uma amostra de material vegetal na época adequada e com
incidência sobre as folhas ou partes de folhas para as quais foram estabelecidos os
padrões interpretativos, de acordo com a tabela 6, pág. 16, em cada unidade de
amostragem;
3) Evitar plantas atacadas por pragas e doenças, plantas cobertas de poeiras ou
outros materiais estranhos e plantas danificadas mecanicamente ou ainda, plantas
que estiveram sob prolongado stress de natureza biológica ou ambiental;
4) Manusear separadamente amostras de diferentes unidades de amostragem e
indicar devidamente nas etiquetas o local da colheita da amostra, cultura e
variedade e a respectiva data;
5) Descontaminar folhas que apresentem na superfície materiais estranhos como
poeiras e resíduos de pulverização que podem aumentar ou diminuir as
quantidades a determinar. A maneira mais eficaz é proceder a uma lavagem rápida
com um detergente fraco, que não contenha fósforo (P), passando em seguida as
folhas em água pura, se possível destilada, para remover a solução usada na
lavagem. É conveniente enxaguar as folhas lavadas com panos bem limpos ou papel
absorvente não contaminados ou sacudi-los vigorosamente;
6) Entregá-las no laboratório quanto mais cedo possível, nunca além de 12 horas
depois da colheita, ou conservar a 4º C para evitar a redução da matéria seca pela
respiração.

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Tabela 6. Instruções para a colheita de amostras foliares


N.º de plantas
Cultura Época de colheita Folhas ou parte de folhas a na amostragem
colher
Alface (Lactuca sativa) Planta na fase de 8 folhas Folhas mais velhas 25 – 30
Batata comum (Solanum Imediatamente antes ou Folha mais nova completamente
tuberosum) no início da floração desenvolvida 25
Batata doce (Ipomoea Mais ou menos a meio do Folha mais nova completamente
batatas) crescimento desenvolvida 15
Folha n.º 3 a partir do topo,
banda transversal de 10 cm de
Bananeira (Musa sp.) No início da floração largura retirada a meio do 20
comprimento da folha
Cana de açúcar (Saccharum Com desenvolvimento de
officinarum ) 3 a 5 meses 3 folhas a contar do topo 15
Topos, eliminando as partes
Cebola (Allium cepa) A meio do ciclo vegetativo brancas 12
Folha mais nova completamente
Cenoura (Daucus carota) A meio do ciclo vegetativo desenvolvida 15
Folha do ano, com 5 a 7 meses,
Na altura em que os de raminhos terminais, não
Laranjeira (Citrus sinensis) frutos atingem o tamanho frutíferos. 4 folhas/árvore, à 15
de um noz volta da copa
Imediatamente antes ou Folha mais nova completamente
Feijão (Phaseolus vulgaris) no início da 1ª floração desenvolvida colhida a contar do 10
topo da planta
Mandioca (Manihot Ao longo do pecíolo Folha mais nova completamente
esculenta) vegetativo desenvolvida, incluindo o pecíolo 25
Mangueira (Mangifera Folha mais nova completamente
indica) Após a floração desenvolvida 15
Com cerca de 30 cm de Toda a parte aérea 15
Milho (Zea mays) altura. No início da
emissão das barbas Folha da espiga 12
Ao longo do período Pecíolo da folha mais nova
Papaieira (Carica papaya) vegetativo completamente desenvolvida 15
Pimento (Capsicum Imediatamente antes da Folha mais nova completamente
annuum ) floração desenvolvida 25
Tomateiro (Lycopersicon Folha composta adjacente à
esculentum ) A meio da floração inflorescência 15
Fonte: Menete e Chongo, 1999

1.3.2. Efeito da adubação na produção

Quando se introduz o efeito de adubação, encontramos as seguintes relações entre


produção e conteúdo dum elemento: veja a figura 6.

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FIGURA 6.

Consideram-se 5 trajectos da curva de produção:


‰ No trajecto A-B a produção aumenta com incremento de adubação, mas o conteúdo do
nutriente na planta diminui; este efeito chama-se o efeito de Steebjerg (1951).
Explicação: Inicialmente a adição dum pouco do elemento, em forma de adubo, causa -
relativamente- um maior crescimento da planta. Depois, quando ocorre uma nova
carência deste elemento, a quantidade do elemento já absorvido distribui-se através da
planta de maior peso seco; isto é, de facto, uma diminuição da concentração deste
elemento na planta. Este efeito só ocorre em solos muito pobres como, solos arenosos,
alguns ferralsolos e acrissolos.

‰ No trajecto B-C, mais adubação, a produção aumenta com conteúdo constante do


elemento na planta. Esta é a situação que ocorre geralmente em muitas culturas que
recebem pequenas aplicações de fertilizante.

‰ No trajecto C-D há um incremento decrescente da produção e aumento do conteúdo


do elemento à adubação adicional; isto é, um aumento da produção e um melhoramento
da qualidade.

‰ Com adubação adicional chega-se no trajecto D-E, em que a produção relativa é


máxima mas o conteúdo do elemento ainda aumenta. Nesta situação há só um
melhoramento da qualidade da produção.

‰ Finalmente, no caso duma adubação excessiva, a produção vai baixar por causa de
efeito tóxico ou deficiências relativas de outros elementos, trajecto E-F.

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Nas situações anteriores tratou-se só de um elemento relacionado com a produção. Pode-


se imaginar que há relações entre várias combinações de quantidades de mais elementos
e a produção. Por exemplo, conteúdos de N e P em milho versus a produção: veja a figura
7 em que cada curva (isoquanta) representa uma certa percentagem da produção máxima.
Quando um terceiro elemento (p.e. K) é incluído, pode-se obter a imagem 3-dimensional
na figura 8.

FIGURA 7. FIGURA 8.

Para julgar o estado nutritivo duma planta ou cultura não necessário conhecer todas as
razões entre os conteúdos de nutrientes em relação à produção. Uma análise do material
vegetal )principalmente das folhas num certo estado de vida da planta) já indica muito,
nomeadamente quando existem muitos dados sobre a relação entre produção e os
conteúdos de nutrientes para esta planta ou cultura.

1.4. LEIS DE PRODUÇÃO

Muitos investigadores tentaram descobrir relações matemáticas entre a produção duma


planta ou cultura e os factores de crescimento, nomeadamente as quantidades de
nutrientes que devem ser aplicadas para obter a máxima produção. Duas aproximações
deste problema serão aqui tratados: a lei do mínimo de von Liebig e a lei dos
incrementos decrescentes na produção segundo Mitscherlich.

1.4.1. A lei do mínimo

Justus von Liebig (químico alemão do sec. IXX) assumiu uma relação linear entre a
produção e um factor de crescimento. A relação é mostrada na Figura 9.

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FERTILIDADE DO SOLO 19

FIGURA 9.

Quando se aplica o factor X em quantidade X1 a produção vai aumentar até o valor Y1, no
qual um outro (segundo) factor de crescimento se torna limitante (“em mínimo”). Depois
duma adição adequada do segundo factor, a aplicação adicional do primeiro factor X (X2)
vai iniciar um aumento adicional da produção (Y2) até um terceiro factor se tornar
limitante, etc. Uma outra imagem para ilustrar esta lei é o barril de von Liebig (Figura 10).

FIGURA 10. Barril de Von Liebig

É impossível encher este barril mais do que o nível da tábua K (potássio) porque a água
transbordará. Depois da elevação da tábua K o barril pode ser cheio até ao nível da tábua
S..., etc.

Experiências mostram que a relação entre a produção e factores de crescimento não é


linear. A transição entre o aumento inicial da produção e o nível constante não é abrupta,
mas gradual.
Para este fenómeno há várias explicações:

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20 FERTILIDADE DO SOLO

‰ Desde um certo nível da aplicação do factor de crescimento (X), a aplicação


adicional do factor/elemento vai ser usada não só para aumento da produção, mas
também para um incremento do conteúdo deste elemento (qualidade!) na planta.

‰ Um segundo factor de crescimento não se torna em mínimo abruptamente mas


gradualmente. Durante a deficiência crescente deste segundo elemento o
crescimento da produção baixa gradualmente até zero.
‰ A produção é a resultante dum número de componentes que determinam a
produção final; por exemplo a produção de grãos de trigo:

Yi = f (y1, y2, y3, y4)

Produção de grãos (YI) = função do nº de caules (y1), do nº de espigas por caule (y2), do nº
de grãos por espiga (y3) e do peso de grãos (y4). Veja as Figuras 11 e 12

(esquematicamente).

FIG. 11. Curvas esquemáticas da FIG. 12. Curva adapatada para a


Produção para os vários colheita (grãos)
Componentes da produção

Para cada curva de produção (y1,…,y4) aplica-se a lei de von Liebig, mas a quantidade do
factor de crescimento para a produção máxima é diferente para cada caso.

Os vários factores estão interrelacionados. Este ponto, não considerado por von Liebig, é
importante mas é de difícil ilustração.

1.4.2. Lei de produção de Mitscherlich

A lei de Mitscherlich ou a lei dos incrementos decrescentes é descrita pela seguinte


equação diferencial:

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FERTILIDADE DO SOLO 21

dy dy unidade. de. incremento. da. producao


= c( A − y ) em que: =
dx dx unidade. de. incremento. do. factor
de. crescimento
A = produção máxima (potencial)
y = produção actual
c = constante: factor de “eficiência” dependente da natureza do factor de crescimento
(segundo Mitscherlich)

Então, o incremento da produção por unidade do factor x depende linearmente da


diferença entre A (produção máxima) e y (produção actual).

(dy/dx = 0 !)

FIGURA 13.

Integração da equação:

dy
= c( A − y ) (1)
dx
dy
= cdx
( A − y)

∫ dy = c ∫ dx
( A − y)
d ( A − y)
- ∫ ( A − y)
= c ∫ dx

- ln( A − y ) = cx + K y = A - ek (2)

Quando X = 0 Æ y = 0 ⇒ -ln A = K;
Substituição em (2):

− ln( A − y ) = cx − ln A

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22 FERTILIDADE DO SOLO

( A − y)
ln = − cx (3)
A
− cx
A − y = A*e
− cx
y = A(1 − e)

depois de converter em log. teremos:


−0.434 cx
y = A(1 − 10 )

X = total do factor de crescimento aplicado; uma quantidade “b” pode já estar presente
no solo:

−0.434 ( cx + b )
y = A[1 − 10 ] (4)

Com a fórmula (3) é possível calcular a quantidade dum factor x que deve ser aplicado
para obter uma certa produção:
( A − y)
(3): cx = − ln
A
( A − y)
0.434cx = − log
A

A quantidade X necessária para obter uma certa percentagem da produção máxima A (y =


A * p/100):

− log( A − A * p / 100) / A − log(1 − p / 100)


x= = =
0.434c 0.434c (5)
− log(100 − p) / 100 log 100 / (100 − p)
= = =x
0.434c 0.434c
Segundo Mitscherlich, com base em experiências, teremos:

Para Nitrogénio (N): 0.434 c = 0.2


Para Fósforo (P2O5): 0.434 c = 0.6
Para Potássio (K2O): 0.434 c = 0.4

quando o factor X é exprimido em unidades de 100 kg por hectare (de N, P2O5 e K2O); para
obter uma produção que corresponde a 90% da produção máxima (A) precisa-se de:

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FERTILIDADE DO SOLO 23

log100 /(100 − 90) log10


N:x= = = 5 unidades = 500 kg / ha
0,2 0,2

log10
P:x = = 1,67 unidades = 167 kg / ha
0,6
log10
K:x= = 2,5 unidades = 250 kg / ha
0,4
Para obter 99% da produção máxima são necessários 1000 kg de N, 333 kg de P2O5,e 500
kg de K2O respectivamente (verifique!). Estas quantidades, que são o resultado da
aplicação do modelo, são muito elevadas! Por isso muitos cientistas não aceitaram esta
teoria:

• O coeficiente (factor) de eficiência é uma constante? Por quê?


• A teoria de Mitscherlich não explica o decrescimento da produção para aplicações de
elevadas quantidades (excessivas) de factor X.

Razões desse decrescimento podem ser:


1) Efeito da salinidade: a presença de nutrientes em excesso tem um efeito negativo
sobre o crescimento, efeito osmótico!;
2) Efeitos do antagonismo ou de competição devido ao excesso de certos nutrientes.
3) Deficiência de água no fim da época de crescimento: toda a água foi usada durante as
fases procedentes, fase vegetal!;
4) Efeitos específicos causados pelo excesso de nitrogénio: a cultura vai acamar quando
há vento porque os caules não são suficientemente fortes, nos cereais!.

Mais tarde Mitscherlich adaptou a sua fórmula de modo a incluir o fenómeno de


decrescimento da produção:

−0434 cx − kx 2
y = A(1 − 10 ) * 10

− kx 2
Em que k é uma outra constante. O factor 10 chama-se “factor de prejuízo”
(“schádigungsfaktor”). Veja figura 14a.

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24 FERTILIDADE DO SOLO

FIGURA 14a. FIGURA 14b.

Há algumas fórmulas mais simples para descrever a relação produção-factores de


crescimento; por exemplo:

Y = a + bx + cx2 (c = negativo):

É uma parábola (Fig. 14b). Quando o valor de cx2 é pequeno (desprezível), pode se
escrever:
Y = a + bx
Esta função é uma linha recta (compare-a com a curva de von Liebig).

Uma outra equação é:


y = a + b x + cx
(c = negativo). Esta Figura 14c.
curva é parecida a
curva de Mitscherlich
(Fig.14c).

Ambas as equações descrevem o decrescimento da produção. Para estabelecer os valores


para a, b e c é necessário obter pelo menos três observações de Y para diferentes níveis
de X. Um assunto tratado na disciplina de estatística.

Significado das curvas de produção


Estas curvas mostram o “bruto” resultado dum grande número de processos que ocorrem
desde a aplicação do adubo até a colheita. Os resultados incluídos no gráfico dão
imediatamente uma imagem mostrando os efeitos mais importantes.

Algumas culturas têm variedades modernas que são adaptadas aos níveis de adubação
muito elevados. Por isso, estas variedades produzem menos em solos pobres porque elas
precisam de muito adubo. Nestas condições as variedades tradicionais geralmente
produzem mais.

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FERTILIDADE DO SOLO 25

Por exemplo, há duas variedades de arroz: uma variedade com palha curta e outra com
palha longa (Figura 15).

Figura 15. (fonte: IRRI – Filipinas)

Aplicação elevada de N causa prejuízo para a variedade de “palha longa”, a cultura acama
facilmente.

1.4.3. Outros factores de crescimento

Até agora falamos somente dum factor de produção: o adubo. Porém há outros factores
de produção como luz, água, temperatura, conteúdo de CO2 na atmosfera e de O2 do ar no
solo.

Só algumas interacções entre estes factores e adubação são tratados. Os factores


mencionados e as suas interrelações formam parte de assuntos de fisiologia vegetal.
(a) Luz e adubação
Em regiões tropicais a prática de plantar árvores para fazer sombra é aplicada a várias
culturas (café, chá, cacau). Assim produções mais elevadas podem ser obtidas
comparativamente com a cultura não ensombrada. Para muitas culturas parece que a
produção aumenta mais quando se aplica adubação em vez de plantar árvores de sombra
(Figura 16).

Figura 16. Para cacau há uma resposta positiva a maior intensidade de luz.

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26 FERTILIDADE DO SOLO

Explicação deste fenómeno:


Sem nutrição adequada a planta (cultura) não pode consumir ou utilizar adequadamente
os produtos assimilados nas folhas sob maior intensidade de luz, por exemplo: falta de K
para o transporte dos produtos assimilados. Isto é só possível com quantidades
suficientes de nutrientes (por adubação!).

b) Água e adubação
Esta relação é importante nas regiões (semi)áridas, onde as culturas precisam de rega
para obter uma produção aceitável.

Figura 17
1. sem rega
2. com rega
3. com rega em
quantidade
excessiva

Temos uma mais forte resposta da cultura quando há rega; a aplicação óptima do N-
fertilizante é também maior (Figura 17).

Na situação “sem rega” (1) uma aplicação de N pode facilmente causar um abaixamento
na produção (efeito de salinidade!).
A situação “com rega” pode causar uma mais baixa produção do que a produção sem
rega se a água de rega for aplicada em quantidades tão excessivas que o nitrogénio já
presente no solo é lavado (situação 3).

Para o fósforo a situação é parcialmente diferente em comparação com o nitrogénio (veja


Figura 18)

Figura 18
1. sem rega
2. com rega
3. com rega, num solo rico
em fosfatos (o efeito de
adubação
com P é menos claro!)

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FERTILIDADE DO SOLO 27

Como para nitrogénio a resposta da cultura é mais forte quando há adubação com
irrigação (situação 2).
Este efeito positivo tem dois componentes: o efeito de maior fornecimento de água e
fósforo, mas também uma melhor disponibilidade do fósforo por causa do elevado
conteúdo de água no solo. Este melhoramento na disponibilidade ocorre porque a
solubilidade dos fosfatos de alumínio e ferro aumenta em condições de maior humidade
(ambiente químico de redução!) Este efeito pode ser tão grande que a produção (resposta
da cultura) torna-se inicialmente
maior do que a produção com adubação e irrigação (o efeito de adubação é menos claro).
Geralmente a adubação fosfatada em solos secos tem um efeito positivo sobre a
produção.

c) Temperatura, luz e adubação


A produção é interrelacionada positivamente com a temperatura, luz e adubos (Figura 19)
Efeito da temperatura: Quando a temperatura aumenta há uma maior solubilidade e
mobilidade de alguns nutrientes, por exemplo o fósforo (P); há um crescimento mais
rápido das plantas devido ao aumento da velocidade das reacções bioquímicas

FIGURA 19

(metabólicas).

A figura mostra uma relação entre a produção (Y) (fotossíntese, em mm3 de O2/hora) e a
intensidade de luz às diferentes temperaturas.

d) O gás carbónico (CO2) e o oxigénio (O2)


Níveis elevados de CO2 na atmosfera podem aumentar a produção (aumento na
assimilação), se outros factores de crescimento – água, luz e nutrientes no solo – forem
adequados. Este princípio é aplicado em estufas, p.e. na Europa.

Conteúdos elevados de CO2 no solo são prejudiciais – causam deficiência de oxigénio (O2),
que é necessário para as raízes na absorção de nutrientes. A deficiência de oxigénio pode
ocorrer nos solos alagados, em solos com camadas densas, e em solos de textura ligeira
em que uma crosta superficial se forma facilmente durante as chuvas (ou rega).

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28 FERTILIDADE DO SOLO

FIGURA 20.

A Figura 20 mostra a relação entre produção (Y) em termos de fotossíntese (mm3 de


O2/hora) e a intensidade da luz aos diferentes conteúdos de CO2 (vol.%) na atmosfera.

APONTAMENTOS – AULAS TEÓRICAS 2001

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