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Apresentação
Você já ouviu falar em plantas hepatoprotetoras? Plantas medicinais têm sido utilizadas ao longo
dos séculos como protetoras do fígado. Muitas são as evidências de uso efetivo e seguro dessas
espécies durante todo esse tempo. Por outro lado, a medicina convencional avançou pouco no
desenvolvimento de fármacos para suprirem a urgente necessidade mundial por agentes
terapêuticos para doenças hepáticas. Pesquisadores estão investindo, cada vez mais, em estudar e
compreender melhor como essas plantas atuam. Estudos têm confirmado os benefícios delas com
potencial para tratar casos severos e agudos de intoxicação hepática pelo cogumelo mais tóxico do
mundo e quadros de doenças hepáticas crônicas.
Nesta Unidade de Aprendizagem, você vai conhecer plantas utilizadas como hepatoprotetoras,
incluindo aquelas com o uso já estabelecido, como o cardo-mariano, e outras que ainda precisam
ser estudadas um pouco mais. Você terá a oportunidade de entender como elas agem
no organismo, quais são as substâncias responsáveis pelos efeitos terapêuticos e como é possível
garantir que elas tenham a qualidade esperada de qualquer medicamento. A compreensão desses
aspectos é fundamental para contribuir com a promoção do uso racional e seguro das plantas
hepatoprotetoras.
Bons estudos.
Imagine que você faz parte de uma equipe de saúde como farmacêutico e recebeu uma paciente
para avaliação da sua farmacoterapia. Considere as seguintes informações:
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Considerando o caso clínico apresentado, responda as seguintes perguntas:
a) Você recomendaria que a paciente continuasse tomando chá de boldo regularmente? Justifique
sua resposta, apontando a possível racionalidade ou os problemas dessa utilização e as orientações
que devem ser feitas à paciente em relação ao uso do boldo.
b) Sugira outra planta medicinal que a paciente possa utilizar para proteção do fígado, incluindo a
forma farmacêutica, a posologia e a forma de utilização.
Infográfico
Você sabe o que é extração? Na farmacognosia, extração é a separação de determinadas
substâncias de um material vegetal. Dessa forma, obtêm-se os chamados derivados vegetais, cuja
constituição pode ser controlada por meio do desenvolvimento de um processo de extração
adequado. Para obtenção de extratos de cardo-mariano, por exemplo, espera-se que ele tenha altas
concentrações de seu princípio ativo, a silimarina.
Neste Infográfico, você verá as condições utilizadas para obtenção de um extrato de cardo-mariano
com qualidade satisfatória para sua utilização medicinal.
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Conteúdo do livro
O fígado é considerado um dos órgãos mais importantes do corpo humano, desempenhando
funções relacionadas a metabolismo, digestão, armazenamento e excreção de substâncias
endógenas (produzidas pelo organismo) ou exógenas (como medicamentos, por exemplo).
Justamente por atuar no metabolismo de várias substâncias estranhas no corpo, o fígado está
exposto à intoxicação por diferentes agentes. O papel de medicamentos hepatoprotetoras é,
justamente, proteger as células hepáticas desses perigos, o que diversas plantas tem feito com
sucesso. Em geral, as plantas hepatoprotetoras são indicadas para prevenção e/ou tratamento de
intoxicações hepáticas, hepatites virais e doenças inflamatórias crônicas do fígado. Elas fazem isso
por meio de vários mecanismos e substâncias.
Para entender mais sobre esse assunto, leia o capítulo Plantas hepatoprotetoras, da obra
Farmacognosia aplicada, base teórica desta Unidade de Aprendizagem.
Boa leitura.
FARMACOGNOSIA
APLICADA
Introdução
Há séculos plantas medicinais são utilizadas, tradicionalmente, para o
tratamento de doenças hepáticas em vários lugares do mundo. Entretanto,
nas últimas duas décadas, plantas hepatoprotetoras têm despertado
maior interesse de pesquisadores e especialistas, o que pode ser ex-
plicado pela necessidade de se investigar novos agentes terapêuticos
para doenças hepáticas, devido a sua alta gravidade e pelo fato de os
tratamentos disponíveis serem limitados, além de apresentarem muito
efeitos adversos. Os estudos científicos, por sua vez, estão confirmando
que muitas plantas medicinais têm alto potencial hepatoprotetor. Essa
atividade está relacionada, principalmente, às atividades anti-inflamatória,
antioxidante, antifibrótica e antiviral de diferentes substâncias químicas
presentes nessas plantas (VARGAS-POZADA; MURIEL, 2020).
Esses estudos são importantes porque, além de promoverem o uso
seguro e racional dessas plantas, contribuem para o desenvolvimento de
fitoterápicos hepatoprotetores. Os fitoterápicos são produtos obtidos a
partir de plantas medicinais, que, como qualquer medicamento, devem
ter sua eficácia ou efetividade, segurança e qualidade demonstradas
(BRASIL, 2014a).
2 Plantas hepatoprotetoras
Cardo-mariano
O cardo-mariano — Silybum marianum (L.) Gaertn — é uma espécie da família
Asteraceae, sendo uma das plantas mais antigas e amplamente estudadas em
relação às suas propriedades hepatoprotetoras. É uma erva nativa da Europa
e adaptada no Brasil, o que significa que é possível cultivá-la em nosso país,
onde, inclusive, ela é comumente utilizada em saladas. A droga vegetal, ou
seja, a parte da planta medicinal utilizada com finalidade terapêutica, são
os frutos secos, nos quais encontramos teores aproximados entre 1,5 e 3,0%
do seu principal princípio ativo: uma mistura de flavolignanas, chamada de
silimarina (GIRISH; PRADHAN, 2017; SIMÕES et al., 2017).
Fitoterápicos à base de extrato dos frutos de cardo-mariano padronizado
em silimarina estão sujeitos a registro simplificado no Brasil como produtos
tradicionais fitoterápicos (PTF) para a utilização como hepatoprotetores.
Isso significa que o Ministério da Saúde (MS) entende que existem dados
suficientes na literatura cientifica que demonstraram o uso efetivo e seguro
de extratos do fruto da espécie por um período superior a 30 anos e, portanto,
a sua utilização pode ser considerada racional e segura (BRASIL, 2014a;
2014b). Esse é um posicionamento semelhante ao da Agência de Medicamentos
Europeia (EMA), que preconiza a utilização do extrato padronizado ou do
chá dos frutos para doenças do trato gastrointestinal, e como medicamento
de suporte a função hepática (EMA, 2018a).
No Brasil, o Primeiro Suplemento do Formulário de Fitoterápicos da
Farmacopeia Brasileira (FFFB) preconiza a utilização de cápsulas contendo ex-
trato de cardo-mariano em quantidade que corresponda a 200 mg de silimarina
por, pelo menos, três semanas, para indicação como hepatoprotetor (BRASIL,
2018). Uma monografia da espécie também foi elaborada pela Organização
Mundial de Saúde (OMS), em que a utilização como hepatoprotetor é descrita.
Plantas hepatoprotetoras 5
https://qrgo.page.link/hfuLe
Plantas hepatoprotetoras 7
Boldo-do-chile
A espécie Peumus boldus Molina é popularmente conhecida como boldo-do-
-chile ou boldo-verdadeiro. Seu nome popular já indica sua origem: é nativa do
Chile. No Brasil é considerada uma espécie importada, o que significa que ela
não se adaptou as nossas condições de solo e clima, e não pode ser cultivada em
território brasileiro. O Chile, inclusive, exporta toneladas da planta para vários
países, incluindo o Brasil. Existem outras espécies conhecidas popularmente
como boldo, mas, com certeza, a espécie Peumus boldus é a mais famosa e a
que já foi mais estudada (SIMÕES et al., 2017).
Assim como o cardo-mariano, medicamentos à base de extratos da espécie
podem ser registrados de forma simplificada no Brasil como PTF, e ela é
recomendada pela OMS e pela EMA. Além disso, a espécie foi incluída no
Memento Fitoterápico da Farmacopeia Brasileira (MFFB) e no FFFB. Porém,
as indicações, neste caso, incluem o tratamento de dispepsias funcionais e
distúrbios gastrointestinais espasmódicos, e também como colagogo e coleré-
tico, ou seja, que estimulam a secreção de bile e aumentam a secreção de bile,
respectivamente, ajudando na digestão de alimentos gordurosos (BRASIL,
2014b; EMA, 2016; SAAD et al., 2016).
O uso para essas indicações é feito na forma do chá das folhas ou de com-
primidos e cápsulas contendo seu extrato. A forma de preparo do chá é muito
importante para que ele contenha os princípios ativos na quantidade adequada.
Nesse caso, segundo o FFFB , o chá de boldo-do-chile deve ser feito na forma
de infuso, ou seja, a água fervida é colocada sobre o material vegetal, e não
as folhas são fervidas junto com água, o que recebe o nome de decocto. Outra
opção seria utilizar a técnica de maceração, colocando a droga vegetal em
contato com água a temperatura ambiente, como preconizado na monografia
da espécie elaborada pela EMA. Embora os compêndios oficiais não tragam
a indicação de uso como hepatoprotetor, as folhas secas da espécie têm sido
utilizadas tradicionalmente para esse fim há mais de um século (BRASIL,
2011; EMA, 2016; SAAD et al., 2016; SIMÕES et al., 2017 ).
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https://qrgo.page.link/p1PVi
10 Plantas hepatoprotetoras
A silimarina isolada não é considerada um fitoterápico no Brasil, uma vez que é cons-
tituída apenas de poucas substâncias isoladas. Embora os extratos de cardo-mariano
tenham altas concentrações de silimarina, ele contém outras substâncias, portanto sua
eficácia e segurança podem ser diferentes da silimarina isolada. No Brasil, a silimarina
é classificada como medicamento específico e seu registro é realizado de acordo com
a Resolução de Diretoria Colegiada (RDC) nº 24, de 15 de junho de 2010, da ANVISA.
Substância/planta
Estrutura química
medicinal
Boldina
HO
boldo-do-chile
N
H3CO CH3
H
H3CO
OH
Curcumina O OH
cúrcuma H3CO OCH3
HO OH
Ácido cafeoilquínico O
alcachofra OH
O COOH
HO
HO
OH
OH
Lectina
soja H3C
O
O O
H3C O H3C
H3C P
O O
+ O
H3C N
H3C
Plantas hepatoprotetoras 15
Essas técnicas e a maneira como devem ser realizas estão explicada no Volume 1 da
Farmacopeia Brasileira, 6ª edição (BRASIL, 2019).
Plantas hepatoprotetoras 19
No Quadro 2 você pode observar que, para a alcachofra, pode ser utilizada
uma técnica semelhante à utilizada para o cardo-mariano, uma vez que essa
espécie apresenta flavonoides em sua composição, além de ácidos fenólicos,
que resultam em manchas de fluorescência azulada sob luz UV em 365 nm.
Já os curcuminoides presentes na cúrcuma, utilizando-se uma lâmpada com
esse mesmo comprimento de onda, geram manchas fluorescentes verdes.
O boldo, por sua vez, apresenta alcaloides em sua composição, que têm carac-
terísticas diferentes dos outros compostos citados. Além do uso da solução de
iodobismutato de potássio junto com nitrito sódio, podem ser utilizados como
reveladores o reagente de Dragendorff, solução de sulfato cérico e o reagente
de Gibbs (SIMÕES et al., 2017).
É muito importante conhecer e compreender essas técnicas. Um dos princi-
pais fatores que comprometem a utilização de plantas medicinais e fitoterápicos
são as adulterações e os problemas na qualidade desses produtos, ainda mais
em se tratando de pacientes com doenças hepáticas, sensíveis a possíveis
substâncias tóxicas que podem estar presentes em produtos de má qualidade.
Dessa forma, empregar as técnicas descritas da maneira adequada para cada
espécie é fundamental para a promoção do uso efetivo e seguro de plantas
medicinais e fitoterápicos pela população.
Leituras recomendadas
BRASIL. Ministério da Saúde. RENISUS: Relação Nacional de Plantas Medicinais de Inte-
resse ao SUS. Brasília, DF, 2009. Disponível em: https://portalarquivos2.saude.gov.br/
images/pdf/2014/maio/07/renisus.pdf. Acesso em: 14 fev. 2020.
YUAN, Y. et al. Protective effects of polysaccharides on hepatic injury: a review. Inter-
national Journal of Biological Macromolecules, v. 141, p. 822–830, dez. 2019.
Os links para sites da web fornecidos neste capítulo foram todos testados, e seu fun-
cionamento foi comprovado no momento da publicação do material. No entanto, a
rede é extremamente dinâmica; suas páginas estão constantemente mudando de
local e conteúdo. Assim, os editores declaram não ter qualquer responsabilidade
sobre qualidade, precisão ou integralidade das informações referidas em tais links.
Dica do professor
Talvez você não o conheça, mas o cogumelo Amanita phalloides é considerado o cogumelo mais
tóxico do mundo, causando muitos danos ao organismo, especialmente ao fígado. O cardo-mariano
é uma planta hepatoprotetora preconizada para o taratamento de quadros de intoxicação
por Amanita phalloides, sendo que esse é um dos seus efeitos terapêuticos mais estudados.
Na Dica do Professor, você vai conhecer um pouco sobre o cogumelho e como o cardo-mariano
pode ajudar em casos de intoxicação.
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Exercícios
1) Um grande número de agentes podem gerar lesões hepáticas. O papel dos hepatoprotetores
é, justamente, proteger as células hepáticas desses agentes. Isso pode ocorrer por diferentes
mecanismos, incluindo: estabilização da membrana do hepatócito; redução do estresse
oxidativo; aumento dos níveis de glutationa; proteção dos hepatócitos (células hepáticas) da
penetração de substâncias tóxicas; diminuição dos processos inflamatórios no fígado; e
estímulo da síntese proteica no fígado.
A) A curcurmina, principal substância ativa da cúrcuma, exerce seu efeito hepatoprotetor por
estimular a síntese proteica nos hepatócitos.
“Cápsula gelatinosa contendo 180mg de extrato seco de Silybum marianum (L.) Gaertn,
equivalentes a 140mg de silimarina expressas como silibina”.
C) O Ministério da Saúde recomenda que a dose mínima diária de silimarina administrada seja
140mg; portanto, um comprimido do medicamento.
A) O analista deveria ter utilizado uma solução de cloreto de alumínio, que reage com os
alcaloides presentes no boldo, formando manchas roxas.
D) A cromatografia em camada delgada não é uma técnica adequada para análise do boldo-do-
chile, por isso o analista não obteve o resultado esperado.
E) O analista deve repetir a análise, pois o revelador adequado, nesse caso, seria o
iodobismutato de potássio aquo-acético, seguido do nitrito de sódio.
A) O cardo-mariano não seria indicado em caso de intoxicação por paracetamol, porque não é
efetivo em casos de doença hepática aguda.
C) A alcachofra poderia ser uma opção para o tratamento da insuficiência hepática aguda, uma
vez que é rica em alcaloides.
5) Produtos naturais muitas vezes são comercializados na Internet de forma clandestina, com
indicações infundadas e sem controle de qualidade adequado. Esses produtos não estão
registrados na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) e podem fornecer riscos
para os consumidores. Considere que um produto a base de silimarina está sendo
comercializado on-line com a seguinte descrição:
E) Para registro da silimarina, não são necessários estudos de eficácia e segurança, já que é um
produto utilizado há mais de 30 anos.
Na prática
Você costuma tomar chá de boldo? Se sim, sabe qual boldo que está utilizando? Existem várias
espécies conhecidas como boldo, mas o boldo-do-chile é o mais conhecido e o que já foi mais
estudado em relação a seu efeito hepatoprotetor. Muitas pessoas acreditam que estão
consumindo o boldo-do-chile, quando, na verdade, não estão.
Conheça, Na Prática, uma técnica analítica qualitativa que permite diferenciar o boldo-do-chile dos
demais, por meio da identificação da principal substância responsável pela atividade
hepatoprotetora do boldo-do-chile, a boldina.
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Saiba +
Para ampliar o seu conhecimento a respeito desse assunto, veja abaixo as sugestões do professor:
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