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APLICADA
Introdução
Há séculos plantas medicinais são utilizadas, tradicionalmente, para o
tratamento de doenças hepáticas em vários lugares do mundo. Entretanto,
nas últimas duas décadas, plantas hepatoprotetoras têm despertado
maior interesse de pesquisadores e especialistas, o que pode ser ex-
plicado pela necessidade de se investigar novos agentes terapêuticos
para doenças hepáticas, devido a sua alta gravidade e pelo fato de os
tratamentos disponíveis serem limitados, além de apresentarem muito
efeitos adversos. Os estudos científicos, por sua vez, estão confirmando
que muitas plantas medicinais têm alto potencial hepatoprotetor. Essa
atividade está relacionada, principalmente, às atividades anti-inflamatória,
antioxidante, antifibrótica e antiviral de diferentes substâncias químicas
presentes nessas plantas (VARGAS-POZADA; MURIEL, 2020).
Esses estudos são importantes porque, além de promoverem o uso
seguro e racional dessas plantas, contribuem para o desenvolvimento de
fitoterápicos hepatoprotetores. Os fitoterápicos são produtos obtidos a
partir de plantas medicinais, que, como qualquer medicamento, devem
ter sua eficácia ou efetividade, segurança e qualidade demonstradas
(BRASIL, 2014a).
2 Plantas hepatoprotetoras
Cardo-mariano
O cardo-mariano — Silybum marianum (L.) Gaertn — é uma espécie da família
Asteraceae, sendo uma das plantas mais antigas e amplamente estudadas em
relação às suas propriedades hepatoprotetoras. É uma erva nativa da Europa
e adaptada no Brasil, o que significa que é possível cultivá-la em nosso país,
onde, inclusive, ela é comumente utilizada em saladas. A droga vegetal, ou
seja, a parte da planta medicinal utilizada com finalidade terapêutica, são
os frutos secos, nos quais encontramos teores aproximados entre 1,5 e 3,0%
do seu principal princípio ativo: uma mistura de flavolignanas, chamada de
silimarina (GIRISH; PRADHAN, 2017; SIMÕES et al., 2017).
Fitoterápicos à base de extrato dos frutos de cardo-mariano padronizado
em silimarina estão sujeitos a registro simplificado no Brasil como produtos
tradicionais fitoterápicos (PTF) para a utilização como hepatoprotetores.
Isso significa que o Ministério da Saúde (MS) entende que existem dados
suficientes na literatura cientifica que demonstraram o uso efetivo e seguro
de extratos do fruto da espécie por um período superior a 30 anos e, portanto,
a sua utilização pode ser considerada racional e segura (BRASIL, 2014a;
2014b). Esse é um posicionamento semelhante ao da Agência de Medicamentos
Europeia (EMA), que preconiza a utilização do extrato padronizado ou do
chá dos frutos para doenças do trato gastrointestinal, e como medicamento
de suporte a função hepática (EMA, 2018a).
No Brasil, o Primeiro Suplemento do Formulário de Fitoterápicos da
Farmacopeia Brasileira (FFFB) preconiza a utilização de cápsulas contendo ex-
trato de cardo-mariano em quantidade que corresponda a 200 mg de silimarina
por, pelo menos, três semanas, para indicação como hepatoprotetor (BRASIL,
2018). Uma monografia da espécie também foi elaborada pela Organização
Mundial de Saúde (OMS), em que a utilização como hepatoprotetor é descrita.
Plantas hepatoprotetoras 5
https://qrgo.page.link/hfuLe
Plantas hepatoprotetoras 7
Boldo-do-chile
A espécie Peumus boldus Molina é popularmente conhecida como boldo-do-
-chile ou boldo-verdadeiro. Seu nome popular já indica sua origem: é nativa do
Chile. No Brasil é considerada uma espécie importada, o que significa que ela
não se adaptou as nossas condições de solo e clima, e não pode ser cultivada em
território brasileiro. O Chile, inclusive, exporta toneladas da planta para vários
países, incluindo o Brasil. Existem outras espécies conhecidas popularmente
como boldo, mas, com certeza, a espécie Peumus boldus é a mais famosa e a
que já foi mais estudada (SIMÕES et al., 2017).
Assim como o cardo-mariano, medicamentos à base de extratos da espécie
podem ser registrados de forma simplificada no Brasil como PTF, e ela é
recomendada pela OMS e pela EMA. Além disso, a espécie foi incluída no
Memento Fitoterápico da Farmacopeia Brasileira (MFFB) e no FFFB. Porém,
as indicações, neste caso, incluem o tratamento de dispepsias funcionais e
distúrbios gastrointestinais espasmódicos, e também como colagogo e coleré-
tico, ou seja, que estimulam a secreção de bile e aumentam a secreção de bile,
respectivamente, ajudando na digestão de alimentos gordurosos (BRASIL,
2014b; EMA, 2016; SAAD et al., 2016).
O uso para essas indicações é feito na forma do chá das folhas ou de com-
primidos e cápsulas contendo seu extrato. A forma de preparo do chá é muito
importante para que ele contenha os princípios ativos na quantidade adequada.
Nesse caso, segundo o FFFB , o chá de boldo-do-chile deve ser feito na forma
de infuso, ou seja, a água fervida é colocada sobre o material vegetal, e não
as folhas são fervidas junto com água, o que recebe o nome de decocto. Outra
opção seria utilizar a técnica de maceração, colocando a droga vegetal em
contato com água a temperatura ambiente, como preconizado na monografia
da espécie elaborada pela EMA. Embora os compêndios oficiais não tragam
a indicação de uso como hepatoprotetor, as folhas secas da espécie têm sido
utilizadas tradicionalmente para esse fim há mais de um século (BRASIL,
2011; EMA, 2016; SAAD et al., 2016; SIMÕES et al., 2017 ).
8 Plantas hepatoprotetoras
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10 Plantas hepatoprotetoras
A silimarina isolada não é considerada um fitoterápico no Brasil, uma vez que é cons-
tituída apenas de poucas substâncias isoladas. Embora os extratos de cardo-mariano
tenham altas concentrações de silimarina, ele contém outras substâncias, portanto sua
eficácia e segurança podem ser diferentes da silimarina isolada. No Brasil, a silimarina
é classificada como medicamento específico e seu registro é realizado de acordo com
a Resolução de Diretoria Colegiada (RDC) nº 24, de 15 de junho de 2010, da ANVISA.
Substância/planta
Estrutura química
medicinal
Boldina
HO
boldo-do-chile
N
H3CO CH3
H
H3CO
OH
Curcumina O OH
cúrcuma H3CO OCH3
HO OH
Ácido cafeoilquínico O
alcachofra OH
O COOH
HO
HO
OH
OH
Lectina
soja H3C
O
O O
H3C O H3C
H3C P
O O
+ O
H3C N
H3C
Plantas hepatoprotetoras 15
Essas técnicas e a maneira como devem ser realizas estão explicada no Volume 1 da
Farmacopeia Brasileira, 6ª edição (BRASIL, 2019).
Plantas hepatoprotetoras 19
No Quadro 2 você pode observar que, para a alcachofra, pode ser utilizada
uma técnica semelhante à utilizada para o cardo-mariano, uma vez que essa
espécie apresenta flavonoides em sua composição, além de ácidos fenólicos,
que resultam em manchas de fluorescência azulada sob luz UV em 365 nm.
Já os curcuminoides presentes na cúrcuma, utilizando-se uma lâmpada com
esse mesmo comprimento de onda, geram manchas fluorescentes verdes.
O boldo, por sua vez, apresenta alcaloides em sua composição, que têm carac-
terísticas diferentes dos outros compostos citados. Além do uso da solução de
iodobismutato de potássio junto com nitrito sódio, podem ser utilizados como
reveladores o reagente de Dragendorff, solução de sulfato cérico e o reagente
de Gibbs (SIMÕES et al., 2017).
É muito importante conhecer e compreender essas técnicas. Um dos princi-
pais fatores que comprometem a utilização de plantas medicinais e fitoterápicos
são as adulterações e os problemas na qualidade desses produtos, ainda mais
em se tratando de pacientes com doenças hepáticas, sensíveis a possíveis
substâncias tóxicas que podem estar presentes em produtos de má qualidade.
Dessa forma, empregar as técnicas descritas da maneira adequada para cada
espécie é fundamental para a promoção do uso efetivo e seguro de plantas
medicinais e fitoterápicos pela população.
Leituras recomendadas
BRASIL. Ministério da Saúde. RENISUS: Relação Nacional de Plantas Medicinais de Inte-
resse ao SUS. Brasília, DF, 2009. Disponível em: https://portalarquivos2.saude.gov.br/
images/pdf/2014/maio/07/renisus.pdf. Acesso em: 14 fev. 2020.
YUAN, Y. et al. Protective effects of polysaccharides on hepatic injury: a review. Inter-
national Journal of Biological Macromolecules, v. 141, p. 822–830, dez. 2019.
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