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MITIDIERO, Daniel. Comentários ao Código de Processo Civil.

São Paulo:
Memória Jurídica Editora, 2004, tomo I.
Excerto da obra.

Art. 54. Considera-se litisconsorte da parte principal o assistente, toda vez


que a sentença houver de influir na relação jurídica entre ele e o
adversário do assistido.
Parágrafo único. Aplica-se ao assistente litisconsorcial, quanto ao pedido
de intervenção, sua impugnação e julgamento do incidente, o disposto no
art. 51.

173. Escorço Histórico. Antes de analisarmos propriamente a figura


conhecida em nosso sistema processual como assistência litisconsorcial, que,
consoante argutamente afirmou Ovídio Baptista, “propõe-se à descoberta da
quadratura do círculo no domínio do processo civil”1, parece-nos conveniente
perfilhá-la historicamente, reportando-nos às suas origens.

Elegantemente, referia Pontes de Miranda que “a assistência


litisconsorcial é de estruturação germânica recente (século XIX), mas de
preforma italiana”2. Com efeito, como reconhece a doutrina sem maiores
discussões, nosso art. 54 descende proximamente do § 69 da ZPO alemã 3
(que, de sua vez, descende do § 66 da antiga Ordenação alemã e, mais
remotamente, do § 103 do Projeto de Ordenação Processual Civil da Alemanha
do Norte e do § 723 da Ordenação Processual de Causas Cíveis para os
Estados Prussianos4), sem negar, no entanto, o corte medieval italiano desta

1
“Assistência Litisconsorcial”. In: Da Sentença Liminar à Nulidade da Sentença. Rio de Janeiro:
Forense, 2001, p. 24.
2 a
Comentários ao Código de Processo Civil, 3 ed.. Rio de Janeiro: Forense, 1998, p. 75, tomo
II.
3
Confira-se: Ovídio Araújo Baptista da Silva, “Assistência Litisconsorcial”. In: Da Sentença
Liminar à Nulidade da Sentença. Rio de Janeiro: Forense, 2001, p. 24; Comentários ao Código
de Processo Civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, p. 272, vol. I; José Carlos Barbosa
Moreira, “Substituição das Partes, Litisconsórcio, Assistência e Intervenção de Terceiros”. In:
Estudos sobre o Novo Código de Processo Civil. Rio de Janeiro: Liber Juris, 1974, p. 78.
4
A notícia histórica é de Adolf Wach, Manual de Derecho Procesal Civil. Buenos Aires: Ejea,
1977, p. 453, nota de rodapé n. 1, vol. II.
instituição5. Ademais, dentro da tradição luso-brasileira não se desconhece a
distinção ensaiada por Manuel de Almeida e Sousa de Lobão a propósito do
instituto da assistência, sugerindo duas conformações distintas para esta: “não
só póde assistir na causa aquelle que tem um direito auxiliante do A. ou R.,
mas aquelle que tem um direito proprio e primario, occorrendo a que na causa
entre outros se lhe não machine, ou d’ella não lhe resulte algum prejuizo
conseqüente”6.

Como antecedente nacional do art. 54, temos no Código de 1939 o art. 93


e, recuando um pouco mais no tempo, adentrando-se nos regramentos
processuais estaduais, o art. 22 do Código Estadual da Bahia. Basicamente,
estes os ancestrais do instituto que ora se busca analisar.

174. Da Assistência Litisconsorcial do Código de Processo Civil Vigente.


O instituto da assistência litisconsorcial presta-se à tarefa, para nós, condenada
desde logo ao insucesso, de construir uma posição processual que se
acomode entre a figura do litisconsorte (parte) e do assistente (terceiro). Vale
dizer: busca hibridar de tal modo estas duas formas de participação na relação
processual que acaba por criar um assistente que não é assistente e um
litisconsorte que não é litisconsorte. Como já adiantamos inúmeras vezes no
correr destes singelos comentários, a inglória “assistência” litisconsorcial de
que cuida o art. 54, CPC, não passa de uma forma de inserção litisconsorcial
ulterior. Antes, porém, de demonstrarmos o porquê de nossa crença, parece-
nos de prestância analisar como e em que circunstâncias doutrina e
jurisprudência dominantes defendem a possibilidade de existência de um
assistente-litisconsorte.

Consoante conclui Sérgio Ferraz, autor de prestigiada monografia sobre o


tema, “o assistente litisconsorcial em sentido estrito é aquele que ingressa no
processo respeitante a lide alheia, não estando sua possível afirmação de

5
Sobre o assunto, na doutrina brasileira, Genacéia da Silva Alberton, Assistência
Litisconsorcial. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1994, pp. 29/31; na doutrina italiana, vide
Camillo Giardina, “L’Origine Italiana dell’Intervento Litisconsortile”. In: Rivista di Diritto
Processuale Civile. Padova: Cedam, 1936, pp. 266/276, vol. 13, parte I.
6
Segundas Linhas sobre o Processo Civil. Lisboa: Imprensa Nacional, 1868, p. 41, parte I.
direito, com a parte contrária ao assistido (conflito de interesses) no objeto do
processo, apesar de a decisão, a ser aí proferida, atingi-la no seu teor,
prejudicialmente, ao grau máximo”7. Note-se bem: nada obstante não
considere Sérgio Ferraz o assistente litisconsorcial um verdadeiro litisconsorte
da parte, tampouco estime possível que a situação material de vantagem que
invoque reste enquadrada dentro do objeto litigioso, a decisão proferida no
processo atinge-o, prejudicialmente, “ao grau máximo”.

Para Athos Gusmão Carneiro, “nos casos de assistência litisconsorcial, o


assistente é direta e imediatamente vinculado à relação jurídica (rectius: ao
conflito de interesse) objeto do processo (...). Todavia, vale ressaltar que o
assistente litisconsorcial não é parte: ‘nada pede e em face dele nada se pede:
não é autor nem réu e, conseqüentemente, litisconsorte não é. Na locução
assistente litisconsorcial prevalece o substantivo (assistente) sobre o adjetivo
que o qualifica (litisconsorcial)’”8. Como exemplos da espécie, Athos Gusmão
Carneiro arrola casos em que o assistente é co-titular do direito material
afirmado na petição inicial e casos em que o assistente possui um direito que
está contido no direito invocado no processo pelo assistido9.

Cândido Rangel Dinamarco estima que o assistente litisconsorcial é um


“terceiro titular de legitimidade a litigar com o adversário do assistido; intervém,
sempre sem alterar o objeto do processo mas com poderes para contrariar a
vontade da parte a quem assiste (sem poderes de disposição)”10. Linhas
antes, havia referido Dinamarco que “o eventual direito postulado na demanda
inicial do processo não é seu (caso de assistência ao autor), nem é ele que
será diretamente atingido pela condenação, constituição ou mera declaração
que a sentença trouxer (assistência ao réu)”11. Como exemplos desta espécie,
Dinamarco arrola, entre outros, o afiançado, que presta assistência ao fiador
(ou vice-versa) no processo da ação de cobrança movida pelo credor e o

7
Assistência Litisconsorcial no Direito Processual Civil. São Paulo: Revista dos Tribunais,
1979, pp. 92/93.
8 a
Intervenção de Terceiros, 10 ed.. São Paulo: Saraiva, 1998, p. 128.
9 a
Intervenção de Terceiros, 10 ed.. São Paulo: Saraiva, 1998, p. 129.
10 a
Litisconsórcio, 2 ed.. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1986, p. 31.
11 a
Litisconsórcio, 2 ed.. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1986, p. 28.
tabelião que assiste o comprador do imóvel, na ação em que é pedida a
pronúncia da nulidade da compra e venda por vício da escritura12.

Para Celso Agrícola Barbi, a assistência litisconsorcial pode ocorrer em


dois casos: a) quando o direito em litígio pertence também ao assistente, de
modo que ele teria legitimação para agir sozinho na discussão dele e b)
quando o direito em litígio pertence ao assistente, mas está sendo discutido por
um substituto processual13. Logo após referir as duas hipóteses, comenta Barbi
que “nessa modalidade de assistência, a sentença vai influir na relação jurídica
entre o assistente e a parte contrária ao assistido, porque o direito que se
discute é também do assistente, ou só dele”14.

A posição de Pontes de Miranda, maior jurista que já se viu em terra, a


respeito da curiosa figura do “assistente” litisconsorcial é algo titubeante15.
Porém, do conjunto de suas afirmações podemos extrair a conclusão de que
Pontes não considera o “assistente” litisconsorcial parte, outorgando-lhe
apenas a autonomia deste na relação processual. A circunstância de Pontes
admitir o alcance da coisa julgada à relação jurídica do personagem a que se
refere o art. 54 não infirma nossas conclusões, uma vez que ele mesmo tem
como falsa a afirmação contida no art. 472, CPC16.

O Superior Tribunal de Justiça, através de sua 1a Seção, rel. Min.


Franciulli Netto, já teve a oportunidade de definir a assistência litisconsorcial
como o “meio processual, através do qual pode alguém ingressar em processo
pendente, onde é discutida e será definitivamente julgada, lide que lhe diz,
precipuamente, respeito”, endossando conceito proposto algures por Thereza

12 a
Litisconsórcio, 2 ed.. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1986, p. 27.
13 a
Comentários ao Código de Processo Civil, 11 ed.. Rio de Janeiro: Forense, 2002, p. 221,
vol. I.
14 a
Comentários ao Código de Processo Civil, 11 ed.. Rio de Janeiro: Forense, 2002, p. 222,
vol. I.
15
Afirmando ser parte, Comentários ao Código de Processo Civil, 3a ed.. Rio de Janeiro:
Forense, 1998, pp. 65, 69; de outro lado, reconhecendo não se tratar de parte, pp. 64, 70, 72,
todas constantes do tomo II.
16 a
Comentários ao Código de Processo Civil, 3 ed.. Rio de Janeiro: Forense, 1998, p. 71, tomo
II.
Alvim17. Em duas outras oportunidades, este mesmo egrégio Tribunal estimou
que se verifica a assistência litisconsorcial “quando o direito em litígio, sendo
também do assistente, dá a este legitimação para discuti-lo sozinho ou em
litisconsórcio com outros seus co-titulares. Ou, ainda, quando esse direito está
sendo discutido por um substituto processual”18. Portanto, segundo entende o
Superior Tribunal de Justiça, o direito em litígio deve também ser do assistente,
tendo a sentença, necessariamente, de influir em sua esfera jurídica19.

Ora, quem coloca sob o holofote jurisdicional qualquer situação material


de vantagem própria (isto é, qualquer direito, pretensão, ação, exceção
próprios), evidentemente não se limita a assistir: intervém, restando a sua
situação julgada pela sentença, tal como a daquele a quem e contra quem se
liga. Quem traz a juízo determinado direito, pretensão, ação ou exceção,
mesmo que não o faça de maneira inicial (faça-o, frise-se, ulteriormente), fá-lo
para todos os efeitos, isto é: fá-lo para que a sua situação seja igualmente
julgada pela sentença a ser prolatada pelo Estado-Juiz.

Inicialmente, ainda sob a vigência do Código de 1939, José Carlos


Barbosa Moreira esboçou uma tentativa de apartar conceitualmente a
assistência simples da dita assistência litisconsorcial. Pedimos a permissão
para aqui reproduzi-la, posto que de auxílio à compreensão do tema fazê-lo:
“quanto à diferença entre as duas modalidades tradicionais de assistência,
poderia ser posta nos seguintes termos: a assistência simples ocorre quando o
terceiro tem interêsse jurídica na vitória de uma das partes, porque o resultado
eventualmente contrário a esta viria colocá-lo em situação jurídica menos
favorável, embora a êle não se estenda, desde logo, a eficácia da coisa
julgada. Por exemplo: o tabelião tem interêsse em ver julgada improcedente a
demanda de falsidade da escritura lavrada em seu cartório, se da anulação
pode originar-se ação de perdas e danos contra êle. Dá-se a assistência

17 a
1 Seção, EmbDeclMS n. 5.930/DF, rel. Min. Franciulli Netto, j. em 12.12.2001, DJ 10.06.02,
p. 132.
18 a
4 Turma, REsp. n. 26.845/RJ, rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, j. em 25.10.1994, DJ
a
05.12.1994, p. 33.561. Nessa linha, 2 Turma, REsp. n. 205.249/MG, rel. Min. Francisco
Peçanha Martins, j. em 20.03.2001, DJ 04.06.2001, p. 92.
19 a
STJ, 1 Seção, MS 6.768/DF, rel. Min. José Delgado, j. em 26.10.2000, DJ 18.12.2000, p.
150.
qualificada quando a decisão da causa possa produzir efeitos imediatos sôbre
a relação jurídica de que é sujeito o terceiro. Por exemplo: a sentença que
julgue procedente ação do locador para resilir o contrato de locação determina,
por si só, a resolução da sublocação (Código Civil, art. 1.203); o sublocatário,
portanto, tem interêsse jurídico – mais relevante que o do tabelião, no exemplo
anterior – em participar do processo, já que, embora não se vá discutir neste a
relação de sublocação, êle sofreria pessoalmente os efeitos da coisa julgada.
Mas atente-se bem: sofreria tais efeitos não porque o seu direito houvesse de
ser discutido e negado no processo – onde a controvérsia, òbviamente, se
circunscreveria à locação -, senão por via de conseqüência, em virtude da
regra de direito material que condiciona a subsistência da relação jurídica entre
locatário e sublocatário à subsistência da relação jurídica entre locador e
locatário. Ainda na chamada assistência qualificada, pois, o assistente não
pede para si, nem introduz no debate um temo nôvo, distinto daquele que
constitui o primitivo objeto da ação”20. Concluiu José Carlos Barbosa Moreira
àquele tempo: “por mais que do litisconsórcio se aproxime a assistência
qualificada, vê-se, assim, que entre ambos resta sempre uma distância
apreciável. Se a posição jurídica de uma pessoa é tal que lhe permita pedir de
outrem algo para si, ou que permita a outrem pedir algo dela – em suma: se a
sua posição é tal que se haja de deduzir em juízo relação jurídica de que ela
mesma seja titular -, não tem sentido apontar-lhe, para o ingresso na causa, a
porta da assistência. A única porta adequada – se alguma existe – é a da
intervenção litisconsorcial”21.

Estudando o Código vigente, no entanto, Barbosa Moreira ofereceu outro


deslinde ao problema. Ao comentar o art. 54, escreveu: “a fórmula, sem
embargo da sua ilustre origem, não me parece a ideal. Dizer que se ‘considera’
litisconsorte o assistente é criar um motivo de dúvida e perplexidade. O
legislador deveria ter-se definido: ou bem se trata de assistência, ou bem se
trata de litisconsórcio. E, a meu ver, a segunda hipótese é que é a verdadeira.
Creio que, aqui, o que se prevê é, pura e simplesmente, uma hipótese de

20
José Carlos Barbosa Moreira, “Intervenção Litisconsorcial Voluntária”. In: Direito Processual
Civil (Ensaios e Pareceres). Rio de Janeiro: Borsoi, 1971, p. 26.
21
“Intervenção Litisconsorcial Voluntária”. In: Direito Processual Civil (Ensaios e Pareceres).
Rio de Janeiro: Borsoi, 1971, p. 26.
intervenção litisconsorcial, voluntária, no curso do processo. Porque este
interveniente, ao contrário do que sucede com o assistente simples, vai obter,
no processo, uma sentença que disciplinará diretamente a relação jurídica da
qual ele próprio é titular, como se vê pela parte final do artigo 54. A sentença
vai influir na relação jurídica entre ele, assistente, e o adversário da parte
assistida. Há, portanto, um paralelismo de relações jurídicas, quase um feixe
de relações jurídicas, no plano do direito material, entre a parte contrária e o
assistido, e entre a parte contrária e o assistente. E ambas essas relações
jurídicas vão ser, diretamente, imediatamente, disciplinadas pela sentença, que
vier a ser proferida. Desse modo, a posição que vai ser ocupada no processo
pelo ‘assistente litisconsorcial’, para usarmos a expressão da lei, na realidade é
uma posição totalmente equiparada, e não apenas do ponto-de-vista formal,
mas também do substancial, à de um verdadeiro litisconsorte”22.

Sobre a intrincada figura do “assistente” litisconsorcial, outra não é a


opinião de Enrico Tullio Liebman: “intervenção litisconsorcial (também chamada
assistência autônoma) é a intervenção de quem ingressa ‘em um processo
entre outras pessoas para defender em face de algumas delas, um direito
relativo ao objeto ou fundado no título deduzido nesse processo’. É, pois, a
intervenção de quem poderia ter sido demandado pelo autor no mesmo
processo em conjunto com o réu; e o litisconsórcio ativo passivo é constituído
no curso do processo, justamente em conseqüência da intervenção”23.

Segundo constata Ovídio Araújo Baptista da Silva, existem duas razões


primordiais em razão das quais a doutrina em geral se recusa a enxergar na
figura do assistente litisconsorcial verdadeiro interveniente litisconsorcial
(litisconsorte): a primeira é a de que pretensamente não o alcançaria a coisa
julgada, restando a sua situação jurídica material tão-somente sob a influência
da sentença proferida no processo e a segunda é a circunstância de não

22
“Substituição das Partes, Litisconsórcio, Assistência e Intervenção de Terceiros”. In: Estudos
sobre o Novo Código de Processo Civil. Rio de Janeiro: Liber Juris, 1974, pp. 78/79.
23
Manual de Direito Processual Civil. Rio de Janeiro: Forense, 1984, p. 113, vol. I. Neste
sentido, na doutrina espanhola, confira-se Maria Encarnación Dávila, Litisconsorcio Necesario
– Concepto y Tratamiento Procesal. Barcelona: Bosch, 1975, pp. 31/ 34; Juan Montero Aroca,
La Intervención Adhesiva Simple – Contribución al Estudio de la Pluralidad de Partes en el
Proceso Civil. Barcelona: Editorial Hispano Europea, 1972, pp. 161/167.
formular pedidos o dito assistente litisconsorcial24. Acrescentaríamos, ademais,
que, ao se entender esta verdadeira intervenção litisconsorcial voluntária
ulterior como mera assistência (ainda que estranhamente adjetivada de
litisconsorcial), preserva-se a incolumidade do princípio da estabilidade
subjetiva e objetiva do processo (arts. 41 e 264, CPC), mantendo-se, desta
banda, a harmonia do sistema desenhado pelo Código.

Que influência que a sentença pode exercer sobre a esfera jurídica do dito
“assistente” litisconsorcial? Duas opções há: ou se trata de influir como eficácia
direta (natural) da sentença ou se trata de influir como coisa julgada. Não
existe, ao nosso juízo, outra alternativa. Como bem refere Ovídio, “não há
qualquer zona intermediária em que possa haver uma espécie de influência
que não seja nem efeito natural da sentença e nem coisa julgada”25. Entre as
duas possibilidades, resolvemo-nos pela segunda: a sentença dada na relação
processual em que participa o “assistente” litisconsorcial atinge sua situação
jurídica material posta em jogo com a qualidade de coisa julgada, porque
justamente se a coloca em juízo como objeto do officio iudicium. Discorrendo
sobre o ponto, Pontes de Miranda assinalava que “a assistência litisconsorcial
é de estruturação germânica recente (século XIX), mas de preforma italiana.
Supõe relação dependente da relação litigiosa ou de relação ou relações
necessariamente coordenadas à relação litigiosa. Daí ser sujeito à coisa
julgada eventual entre as partes. (...) Na assistência litisconsorcial, a eficácia
da decisão atinge a relação jurídica entre o assistente e a parte contrária”26
(grifos nossos). Outra não é a opinião de Ovídio Araújo Baptista da Silva27, de
Luiz Fux28, nem, parece-nos, a de Alfredo de Araújo Lopes da Costa29. Como já

24
Confira-se: Comentários ao Código de Processo Civil. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2000, p. 293, vol. I; “Assistência Litisconsorcial”. In: Da Sentença Liminar à Nulidade da
Sentença. Rio de Janeiro: Forense, 2001, p. 51.
25
Comentários ao Código de Processo Civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, p. 293,
vol. I.
26 a
Comentários ao Código de Processo Civil, 3 ed.. Rio de Janeiro: Forense, 1998, pp. 75/76,
tomo II.
27
“Assistência Litisconsorcial”. In: Da Sentença Liminar à Nulidade da Sentença. Rio de
Janeiro: Forense, 2001, p. 47; Comentários ao Código de Processo Civil. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 2000, p. 293, vol. I.
28
Intervenção de Terceiros – Aspectos do Instituto. São Paulo: Saraiva, 1990, p. 10, nota de
rodapé n. 16.
29
Da Intervenção de Terceiros no Processo. São Paulo: C. Teixeira & Cia Editores, 1930, p.
113.
assinalamos, observe-se que aqueles terceiros que ficam tão-somente
expostos aos efeitos diretos da sentença, concorrendo as demais condições
pertinentes, legitimam-se à assistência e não à intervenção litisconsorcial.

No tocante à circunstância de não formular o “assistente” litisconsorcial


pedidos, a afirmação deve ser mais bem sopesada. Em realidade, ao se inserir
na relação processual o “assistente” litisconsorcial adere aos pedidos
formulados pela parte a qual se coliga, havendo assunção de pedidos em
virtude de sua posição na relação jurídica material posta em juízo30. Como
explica Ovídio, “na verdade não será a concreta formulação de algum pedido,
ou a efetiva reação contestatória ao pedido de outrem, que irá determinar a
qualidade de parte que a lei lhes confere, senão que esta condição irá decorrer
da posição que eles assumem na lide. No caso, a estrutura determina a função,
sem que se exija qualquer manifestação efetiva e concreta do figurante”31.

Assim, ante tudo o que se expôs, temos que a pretendida “assistência”


litisconsorcial não passa de um litisconsórcio facultativo ulterior, em que se
opera igualmente a coisa julgada sobre a situação jurídica do interveniente
litisconsorcial, apenas se afastando deste pelo fator cronológico (que, de resto,
não tem envergadura suficiente para descaracterizar a feição do instituto). Não
nos convencem, pois, as supostas distinções manejadas pela doutrina
dominante acerca do assunto.

175. Procedimento para Admissão do “Assistente” Litisconsorcial. Por


força do disposto no parágrafo único do art. 54, incide, no que se refere à
disciplina da admissão do “assistente” litisconsorcial, o vertido no art. 51. Desta
banda, remetemos o leitor aos comentos realizados acerca deste dispositivo
(retro n. 169).

30
Neste sentido, Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart, Manual do Processo de
a
Conhecimento, 2 ed.. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, p. 201.
31
“Assistência Litisconsorcial”. In: Da Sentença Liminar à Nulidade da Sentença. Rio de
Janeiro: Forense, 2001, p. 53.

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