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Resumo
Este artigo discute acerca do modo como a cultura corporativa influenciou um projeto de
implantação de Just-In-Time (JIT), que representou uma estratégia para a formação de competências
internas. Assim, este estudo detalha os processos de aprendizagem organizacional e mostra a grande
importância da consolidação do comprometimento pessoal, que compõe o principal fator para a
construção de conhecimento voltado à produção dentro das empresas modernas.
Palavras-chave: aprendizagem organizacional; just-in-time; cultura corporativa
Abstract
This paper discusses how the corporative culture influenced a implementation project of Just-In-Time
Manufacturing (JIT), which represented a strategy from a formation of internal competences. From
that point, this study details the processes of organizational learning and shows a great importance of
the consolidation of personal involvement, which composes the principal factor from a building of
production knowledge in the modern enterprises.
Keywords: organizational learning; just-in-time; corporative culture
1. Introdução
O presente trabalho trata da formação de competências em uma empresa industrial com o objetivo de
se implementar a filosofia de manufatura Just-In-Time (JIT) através da gestão do conhecimento e da
utilização de processos de aprendizagem organizacional. A implantação do JIT estaria atrelada à
construção de uma cultura organizacional formadora de competências, promotora da integração da
empresa e da maximização dos esforços pessoais. Assim, conforme FLEURY & FLEURY (2000), a
delimitação eficaz da estratégia empresarial estaria intimamente ligada à formação de competências e
os processos de aprendizagem organizacional configuram-se nos meios necessários para a consecução
destes objetivos. Assim, a cultura Just-In-Time pode ser considerada como agente facilitador dos
processos de aprendizado organizacional e da gestão estratégica do conhecimento.
De acordo com MONDEN (1984), o respeito à condição humana torna constantes os ganhos de
produtividade, facilitando a manutenção e o aprimoramento do sistema de manufatura. Em particular,
o respeito às pessoas está apoiado no estímulo total dos funcionários, buscando transformá-los em
colaboradores, com a chance de transformar suas idéias em ação e de serem reconhecidos por suas
atitudes pró-ativas.
KANTER (1996) comenta que há uma conexão direta entre a cultura organizacional de preocupação
com as pessoas e a habilidade de satisfazer os clientes. Deve-se buscar um ambiente de abertura e
interesse pelas novas idéias, que estimule a iniciativa e o comprometimento individual. Portanto, a
força de trabalho tem importante papel na manutenção e perpetuação do Just-In-Time, cabendo à
administração a função de apoiar o trabalho nas linhas de produção e montagem, transferindo o
conhecimento técnico e estimulando o aprimoramento contínuo.
Na visão ocidental voltada para os resultados, os projetos-pilotos do Just-In-Time, ou seja, as áreas que
tenderiam a disseminar o novo sistema para toda a organização, podem entrar em conflito com práticas
e pensamentos arraigados da administração e do pessoal da produção. Caso não haja o empenho na
disseminação, o projeto-piloto pode tornar-se destrutivo, enfrentando hostilidades e ressentimentos
sem a obtenção de resultados benéficos e duradouros.
O Just-In-Time é uma filosofia que deve ser implementada na empresa como um todo, não somente
nas áreas produtivas ligadas à Manufatura, mesmo sendo o seu grande enfoque o piso de fábrica. De
acordo com a visão de FARIA (1992), o Just-In-Time pode ser entendido como uma tecnologia de
gestão, formalmente constituída de dois conjuntos: o instrumental e o ideológico. No conjunto
instrumental, o JIT trabalha com técnicas, procedimentos e filosofias, sendo que as principais são:
(1) O estudo dos tempos, dos movimentos e do arranjo físico, utilizados nas células de manufatura e
nas linhas de produção e montagem.
(2) O seqüenciamento das operações dos processos produtivos, empregado dentro das células, nos
estudos de redução dos tempos de setup e dos leadtimes vinculados ao processamento dos itens.
(3) A organização de sistemas e métodos de trabalho.
Para o conjunto ideológico, o Just-In-Time utiliza a capacitação técnica (palestras, treinamentos etc.)
para disseminar seus pressupostos e filosofias (como a eliminação de desperdícios e o controle
integrado dos processos) e para motivar e integrar os trabalhadores nas atividades de redução de
estoques, CCQ’s, programas de “perda zero” e Kaizen. A obtenção da máxima eficiência
organizacional através da filosofia JIT implica necessariamente na disseminação de processos
educacionais na empresa. Dentro do contexto Just-In-Time, os líderes devem agir de forma a servir
como modelos, encorajando as pessoas a questionar incessantemente os métodos e os modos de pensar
tradicionais. Assim, os próprios líderes devem questionar os métodos atuais, lançando outras pessoas
ao melhoramento contínuo das atividades desenvolvidas pela empresa.
3. A pesquisa
Os aspectos relevantes do trabalho dizem respeito às modificações técnicas e organizacionais inseridas
em uma empresa industrial, relacionando-se ao desenvolvimento de uma pesquisa-ação. O trabalho
prático é concebido e conduzido através de investigações e intervenções sobre a tecnologia dos
processos de manufatura e a organização do trabalho.
A pesquisa-ação representa uma proposta diferente de investigação, na medida em que estabelece uma
cooperação entre o pesquisador e os usuários para resolverem juntos problemas de ordem técnico-
organizacional. Através disto, pretendeu-se reduzir o isolamento dos indivíduos e envolvê-los com
atividades de caráter mais coletivo. Dentro da organização, a pesquisa-ação procurou facilitar a
mudança de comportamentos, a minimização de conflitos, o aumento da produtividade e a melhoria da
qualidade dos produtos e do trabalho.
THIOLLENT (1983) comenta que a pesquisa-ação possui como princípio fundamental a intervenção
dentro da organização, onde os seus membros e o pesquisador colaboram na definição do problema, na
busca das soluções e no aprofundamento do conhecimento científico disponível. A pesquisa-ação deve
ser acompanhada por práticas pedagógicas, como a difusão de conhecimentos através de treinamento e
simulação. Consiste na identificação e análise de problemas e no desenvolvimento de um plano de
ação a ser acompanhado e avaliado. O abandono do formalismo na investigação não relevou aspectos
mais minuciosos do objeto de pesquisa.
Inicialmente, a presença de uma forte cultura corporativa, sustentada através de práticas antiquadas,
entravou a participação e dificultou a implantação, reduzindo, inicialmente, a possibilidade de
efetividade do Just-In-Time em longo prazo. O ponto mais significativo para a mudança cultural foi a
incoerência entre os valores da cultura organizacional inicial (baseada em exacerbado autoritarismo
detectado nas relações interpessoais) e os pressupostos essenciais do Just-In-Time (calcados na
participação coletiva e no respeito humano).
O treinamento multidisciplinar para a obtenção de uma força de trabalho mais flexível, o apoio à
solução de problemas e a liderança do alto e do médio escalão no projeto de implantação do Just-In-
Time foram aspectos relevantes à consecução da confiança e do empenho dos funcionários, sendo
considerado como “fator embrionário” na busca do comprometimento. O processo seletivo de
implantação, que visou a introdução de técnicas e pressupostos JIT em áreas previamente escolhidas
(áreas-modelo), contribuiu para aperfeiçoar sistematicamente os processos onde foram detectadas
falhas e anormalidades.
O JIT foi sempre difundido como uma filosofia de manufatura dependente de altos níveis de respeito
humano e transparência para que fossem atingidos o comprometimento dos funcionários e a
perpetuação do espírito de melhoramento contínuo. O Kaizen representou a filosofia de
aprimoramento permanente que o Just-In-Time, obrigatoriamente, impõe ao contexto onde foi
implantado. De um modo geral, houve a conscientização acerca da factibilidade de longo prazo
associada ao Just-In-Time. Esta postura evitou a diminuição do empenho por parte dos funcionários,
quando da impossibilidade de mensurar o atingimento dos objetivos ligados à implantação.
Nota-se que um longo processo de melhorias deve ser perseguido para o atingimento da manufatura
JIT. O aspecto que mais se destaca dentro desta filosofia de produção é a integração de todo o fluxo
produtivo, de fornecedores a clientes finais, apoiado no desenvolvimento das pessoas, conforme
argumenta WESTBROOK (1988). Os fracassos na implantação se devem, principalmente, ao
deficiente entendimento do sistema, o que se traduz em uma visão simplista e incompleta. Assim, os
erros mais comuns são encarar o JIT como um programa de fornecedores, redução de estoques e setup
ou um programa que pode ser implementado de forma rápida.
FLEURY (1993) aponta dois tipos de organizações existentes em relação à formação da Cultura da
Qualidade e às mudanças organizacionais que devem ser inseridas para este contexto. Nas
organizações qualificadas, o trabalho é executado em células, com delegação de autonomia e
responsabilidades acerca do desempenho em termos de custos e níveis de qualidade. Há, ainda, a
redução dos níveis hierárquicos para a melhoria da gestão e da motivação dos recursos humanos e a
reaproximação das funções internas da empresa.
Segundo SCHEIN (1991), a cultura da empresa deve atuar para resolver problemas externos
(relacionados à sobrevivência) e internos (relativos ao desenvolvimento coeso da corporação através
da integração de diversos grupos). Para a resolução de problemas de âmbito externo, a empresa deve
atuar como um grande grupo formado por subgrupos (grupos menores), onde prevalece os conceitos
de integração, visão sistêmica, autoridade e comunicação eficiente através de uma linguagem comum.
A importância da cultura organizacional torna-se mais nítida no momento em que a empresa que
adotava o sistema Just-In-Case procura implementar o Just-In-Time. Neste ponto, as pessoas que
estavam habituadas a trabalhar de uma forma bastante particular, baseada na burocracia e na
formalização excessiva de métodos e rotinas, necessitam efetuar a mudança de comportamento, de
maneira a atuar e agir de forma mais reflexiva e flexível. A modificação de paradigma passa a
influenciar drasticamente as novas formas de trabalho.
Pode ocorrer que determinadas pessoas passem a rejeitar a nova forma cultural advinda do Just-In-
Time, até mesmo por um processo mental que é inteiramente inconsciente. Por outro lado, o fato de
que a nova cultura pode ser “aprendida” causa um impacto significativo nos processos de incorporação
de conhecimentos e recapacitação. Desta forma, cabe à liderança estabelecida na empresa o papel de
promover e manter a nova cultura organizacional mais compatível com os novos objetivos de inovação
organizacional. Os diversos grupos presentes na empresa necessitam de uma larga visão para moldar a
cultura aos problemas de adaptação ao cenário externo e de integração interna. O projeto de
implantação deve ser muito bem gerido, de modo a não provocar o fenômeno da contracultura, que
implicaria na rejeição coletiva da nova cultura introduzida na organização.
Segundo ALBUQUERQUE (1992), os paradigmas produtivos baseados na filosofia JIT têm como
características essenciais a preocupação com a qualidade e a produtividade, a produção flexível, a
utilização de recursos humanos polivalentes, o trabalho em equipes e as formas organizacionais que
conduzem a um clima favorável em relação à inovação e à competitividade empresarial. A corporação
deve desenvolver uma cultura que norteie a cooperação e o cumprimento dos níveis de desempenho.
A mudança cultural para a implementação do Just-In-Time sempre deve ser iniciada pela cúpula
administrativa. EBRAHIMPOUR & SCHONBERGER (1984) comentam que é melhor não tentar
nenhuma outra forma de mudança, pois o fracasso é certo e acarretará mais prejuízos do que
benefícios. Caso a alta administração deseje mudar a cultura de modo a possibilitar a aplicação e a
efetivação do JIT, deve ser definida uma nova filosofia empresarial, que a médio e longo prazos,
transforme a organização, segundo as características encontradas na maioria das empresas japonesas.
6. Referências bibliográficas
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