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ETNIAS:
MATELÂNDIA
HISTÓRIAS, LENDAS E CAUSOS.
A B
ATO ÚNICO
CENA I
ZÉ TORRESMO – Eita! Tempo bom! Saudades danada de dançar num bom baile
igual os de antigamente. Hoje em dia ou é tuche-tuche, ou esse tal de funk, ou o tal
sertanejo dos universitários, é tanta barulheira que a gente nem consegue escutar
os companheiros direito, nem dá pra prosear nos baile de hoje em dia.
(TERMINANDO A MONTAGEM DE SUA BARRACA, PRINCIPIA A VENDA DE
SEUS PRODUTOS).
Zé – Olha ai freguesia a barraca esta cheia e minha carteira tá vazia. Hoje tem
queijo mineiro, bom no preço e bom no cheiro. Você escolhe o queijo, e depois me
da o dinheiro. Vamos chegando minha amiga, tem salame pra encher sua barriga,
tudo aqui é muito bão, olha o doce de leite que pra tu comer com pão, produtos de
primeira só aqui na minha mão. A gente vende pra todo mundo, pro polaco, pro
italiano, pro japonês e pro alemão! (FRANZ VAI CHEGANDO À BARACA).
CENA II
FRANZ – Comigo esta tudo joia, ando meio saudoso dos tempos de outrora.
ZÉ – Não brinca homem! Estava pensando nisso agorinha mesmo. Sabe seu Franz
eu tenho curiosidade de saber como é que são as coisas lá na Alemanha, como é
que o povo se diverte?
FRANZ – A gente gosta muito de festa e alegria, ali viu. Por isso que nós
inventamos a Oktoberfest, uma festa tradicional alemã, que tem muitos produtos
típicos, comidas, bebidas e musicas também. _E sabe que uma das maiores
Oktoberfest do mundo é a de Blumenau, em Santa Catarina, só perde pra de Munich
na Alemanha, AQUI EM Matelândia tem a feira da cuca, e tem umas cuca danada
de boa ali viu, e ali na cidade de Missal acontece a Deutsches fest, que quer dizer
festa alemã, com um montão de atrações, tem comida de vários tipos, chucrutes,
Einsbein que é o famoso joelho de porco, o marreco recheado e a cuca Missal, tem
competições para todas as idades, a corrida do saco (sach huppse) pra piazada, o
concurso do serrote mais rápido (Drumsäge) que é disputado em casal de dois, mas
tem que ser um homem e uma mulher, senão não é casal, viu! A corrida de carrinho
de mão (Schubkarren) também é pra casal de dois, o concurso do Chopp de metro,
dai é cada qual contra si, também tem a escolha do casal de Fritz e Frida e a eleição
da rainha da Deutsches Fest e ainda tem o jogo do barril, pros homens e pras
mulher, mas cada qual separado um do outro, os homem contra os homem e as
mulher contra as mulher, viu!
Zé – Meu Deus seu Franz, quanta coisa. Mas, pera ai como é esse tal de Jogo do
barril?
FRANZ – Má tá loco seu Zé, o senhor nunca escutou falar do jogo do barril?
Zé – Eu não, me explique ai, por favor, que eu gosto de aprender coisas novas.
FRANZ – Bom presta atenção, viu, é uma brincadeira que tem várias regras, No
meio do campo fica o carro do Chopp (Choppwagen), onde está o barril de Chopp, a
equipe que levar um gol deverá servir Chopp pra equipe fez o gol. A equipe que
chutar a bola e acertar o (choppwagen) também vai ter que servir Chopp à equipe
adversária. A equipe que cometer falta deverá servir Chopp pra equipe que sofreu a
falta, em caso de falta grave ou gravíssima, o coitado que sofreu a falta é carregado
na maca e ganha um copo de Chopp pra se recuperar da pancada. E cada vez que
o jogo parar, todos os atletas têm um minuto pra beber Chopp e repor as energias. A
arbitragem é muito rígida, e por isso quando os arbitro cansam, eles param o jogo
pra refrescar um pouco e aproveitam para tomar mais uns Chopp. Tem times que
passam sede, mas têm outros que bebem muito, mais muito Chopp.
Zé – Entendi então o negócio não é joga bola, é ver que toma mais Chopp?
FRANZ – É mais ou menos isso, viu, mas, o melhor de tudo é o baile do sábado de
noite, que tem muita música de bandinha, dai a gente dança, dança até bambear as
canelinhas. Olha fiz até uma rima ali viu? (OS DOIS RIEM, E COMEÇA A
APRESENTAÇÃO DE UMA MÚSICA DE BANDINHA COM COREOGRAFIA).
FRANZ- Burro não senhor, a gente vem aqui compra na sua barraca e o senhor
ofende a gente, burro é o senhor que não conhece a cultura da gente, e me dá logo
um salame, antes que eu mude de ideia, minha Frida fez um cuque e eu vou pra
casa tomar café. Quem sabe mais tarde eu volto, eu acho! (VAI SAINDO, PARA
OLHA PARA TRAZ E DIZ: WIRRE. SAI MEIO NERVOSO, ZÉ FICA SOZINHO
COM CARA DE ASSUSTADO).
Zé – Saúde seu Franz! Eu hein! Não entendi nada! Por fala em café, antigamente
tinha muito café por aqui, mas depois da famosa “GEADA NEGRA” de 1975, as
coisas mudaram, no começo todo mundo ficou meio assustado, morreram quase
todos os pés de café da região, e a grande maioria das pessoas que vieram pra cá,
por causa do plantio do café, acabaram indo embora, mas como diz aquele “velho
deitado” – quero dizer – aquele velho ditado, há males que vem pra bem, já que o
café não deu pé, (RISADINHA POR CAUSA DO TROCADILHO), os colonos daqui
começaram a diversificar suas lavouras, ai deu inicio ao plantio do milho, da soja e
também a criação de bovinos e suínos, pra quem não sabe bovino é boi e suíno é
porco tá, bom tinha vaca também né e as porca por que senão de onde iam nascer
os filhotes? Há vocês entenderam né. (VOLTA AS SUAS VENDAS). _ olha o pão de
queijo, com queijo de verdade, nós preparamos no interior e vende na cidade. Os
produtos do Zé torresmo são de primeira qualidade. Aqui o senhor é bem atendido
nunca vai ficar no vaco. Você põe na sacolinha, no balaio ou enche um saco. Chega
mais e vai pedido, o que é que manda seu polaco?
CENA III
KOWALESKI – É KOWALESKI!
ZÉ – Ta! Ta! Ta! Esse negócio ai que o senhor falo. O que vai querer hoje?
Zé – Eu só queria saber se faz tempo que o senhor veio aqui para Matelândia.
KOWALESKI – Olha tempo faz, mas antes de chegar aqui, os meus antepassados
passaram pela região de Curitiba, que tem uma das maiores colônias polonesa do
Brasil, depois ficamos um tempo ali na região de Guarapuava, ai chegamos por aqui
por volta da década de sessenta, por quê?
KOWALESKI – No começo não foi nada fácil, onde não tinha mato tinha café, era
um perigo andar por ai, mas, sempre que dava tempo a gente inventava um
bailezinho pra se divertir e tentar arrumar uma namorada, mais era difícil demais, os
pais das moças marcava em cima, no baile a gente dançava umas duas ou três
música com a moça o pai dela já ficava olhando de cara feia pra gente, ai tinha que
trocar de par, e os baile de antigamente não era essa barulheira que é hoje não, na
verdade era tudo meio improvisado, sabe, quando a gente acabava de fazer uma
casa, que era feita em mutirão, a gente se juntava e fazia uma casa, depois ia e
fazia a outra, era bonito ver a solidariedade dos pioneiro, ai antes de por as
repartição, sabe as paredes que divide os cômodos das casa? (ZÉ CONCORDA
COM A CABEÇA) ficava só aquele salão grande, a gente chamava os vizinhos que
sabiam tocar algum instrumento musical e convidava todo mundo pro bailezinho de
inauguração da casa. Eu me lembro como se fosse hoje, as pessoas vinham
vestidas do jeito que estavam, não tinha frescura, tinha gente que dançava até de pé
no chão, cada um trazia alguma coisa pra comer ou beber, o que tivesse em casa
estava bom. Como a gente se divertia, não tinha luz elétrica, eram tudo iluminado
com candeeiros, os tocadores na verdade eram sempre os mesmo, por que pouca
gente sabia tocar algum instrumento e cantar então sempre vinha o Selvino Petch, O
Maske, O Afonso, o Chico, O Virgílio Casagrande, o Adolfo Brochar, o Nilo Justen,
os irmãos Breda que vinha de Medianeira, mais o Telmo e o Iracildo Taquariano. Era
uma baita de uma banda, que tocava tudo de improviso, sem ensaio nem nada. (A
CENA VAI SE MONTANDO CONFORME A NARRAÇÃO DO POLONÊS) Na hora
do baile, de um lado ficava os rapazes e do outro lado ficavam as moças. Os
músicos iam se posicionando num canto pra não atrapalhar a dança, e como tinha
pouco instrumento eles revezavam cada um tocava um pouco, ai Sempre tinha um
que gritava, ABRE A GAITA GAITERO!!! (INICIA-SE A CENA, POUPORI DE
MÚSICAS GAUCHESCAS, VALSA, CHOTE, VANERA E VANERÃO. AO TERMINO
ESTÃO OS DOIS COM CARA DE SAUDADES).
KOWALESKI – Mas quantas vezes eu tenho que falar seu Zé, meu nome é
KOWALESKI, KO-WA-LES-KI, até logo, depois eu passo por aqui!
CENA IV
Zé – Até seu... PROVA... DIGO KAWA... É CHOWALESKI! Ah, vai ter nome difícil
assim lá na Polônia seu! Deixa pra lá! Que homem mais estressado. Deus me livre!
Deixa-me voltar pro meu trabalho, que até agora não vendi foi nada. Vamos
chegando minha gente tem salada pra vocês. Aqui sempre trazemos o melhor para
o freguês. Têm vários tipos de produtos, de salada uns cinco seis. De queijo tem
muito mais, mas de doce só tem três. E também tem torresminho, vai um saco
japonês?
TOSHIRO – É TOSHIRO!
TOSHIRO – Sõsu Yakissoba, né? Mais conhecido como Yakissoba, é macarrão com
carnes e legumes grelhados ou fritos, com molho shoyu, muito bom né?
Zé – Ah! Por que não falo antes, bom! Legumes eu tenho bastante, já vou separar
pro senhor, o seu Torisho...
TOSHIRO – É verdade, né? Japonês tem muita tradição e cultura forte, né? Os
japoneses são apegados a terra e a agricultura. O senhor sabia que fomos nós os
japoneses que plantamos a soja pela primeira vez aqui em Matelândia?
Zé – Não brinca, enquanto eu separo seus legumes que tal o senhor me contar
como foi essa história?
TOSHIRO – Tranquilo seu Zé, bom nós saímos do Japão, pra vim para o Brasil na
década de cinquenta, depois de morarmos em umas cidades do estado de São
Paulo, chegamos por aqui na década de sessenta, primeiro tentamos plantar o café
que era a febre da época, mas naquele ano teve uma geada das bravas, não foi
igual à geada negra de 1975, mais foi o suficiente pra gente desistir de plantar café,
né, então a gente resolveu partir para o plantio da soja e também de cereais como o
arroz e o milho, foi difícil naquela época, por que não tinha maquinas pra nada, tinha
que fazer tudo no braço e nós chegamos a colher até 1000 sacas de soja por ano,
mas aqui o que mais fazia sucesso era o milho, porque tinha, tinha não, tem muito
Italiano, né, dai eles gostavam por que do milho a gente fazia a farinha com o que
eles faziam a polenta, lá no Japão a gente nunca tinha comido polenta, lá a gente
come muito e arroz, peixe e frango. O seu zé, por acaso o senhor conhece a música
da polenta?
CENA V
Zé – Até mais ver, bom já fiz um trocadinho, (RETOMA AS VENDAS) mas pra pagar
as contas ainda falta muito, voltemos ao trabalho. Bora, bora minha gente, aqui tem
produtos de primeira. Farinha de milho ou fubá, passadinhos na peneira. Pra fazer
aquele bolo ou uma polentinha bem ligeira. E pra acompanha tem um queijinho que
derrete na frigideira!
ZÉ – Bom dia, mas, olha que coincidência eu e o seu Sugiro, estávamos agorinha
mesmo falando da cultura dos italianos, ai o senhor aparece aqui seu José!
ZOZÉ – Repita de vagar! Vamos junto comigo! ZOoooZÉ! De novo ZOoooZÉ! Mais
uma vez ZOoooZÉ! (OS DOIS FAZEM UM JOGO DE REPETIÇÃO, DUAS VEZES,
DEPOIS ZÉ FALA SOZINHO, ERRADO).
Zé – Já entendi. SOZÉ!
ZOZÉ – Porca miséria! ‘Assa star! Esquece seu Zé. La me donna que fazer uma
polenta, pra comer com queijo e salame, mas o queijo tem que ser daquele que
derrete e fica puxa-puxa e não borrachudo, pó!
Zé – Mais claro que tenho, olha! O melhor fubá da feira, salame italiano fresquinho e
aquele queijo colonial de Minas que o senhor adora seu ZOZÉ!
ZOZÉ – Che bello. Ghe tu parla bene!
ZOZÉ – Signore Zé Torresmo, esse seu jeito meio atrapalhado me faz lembrar um
personagem muito engraçado, que a gente falava muito nos tempos de antigamente.
ZÉ – E quem é ele?
ZOZÉ – Má! Zio Cane, (ZÉ FAZ CARA DE SEM GRAÇA E SINAL DE SILÊNCIO). –
Mas vê se presta atenção! Bem deixa ver, eram tantas as histórias que o povo
contava, por que nosso maior passatempo naquele tempo eram visitar os vizinhos
tomar chimarrão e jogar conversa fora, não se tinha muito que fazer, tinha uns
vizinhos lá perto de casa, que tinham vindo de Flores da Cunha – RS, como eu, que,
aliás, é de onde vieram a maior parte dos colonizadores da nossa cidade não sei se
o senhor sabia?
ZOZÉ – Mais eu já disse que meu nome é ZOZÉ! Ah! Deixa pra lá, como eu ia
dizendo, meus vizinhos, eram descendentes dos italianos que vieram da região do
Vêneto, como eu e muitos outros, e a gente têm como ídolo um personagem muito
conhecido o famoso NANETTO PIPETTA, que foi criado por Aquiles Bernardi,
conhecido na vida religiosa como Frei Paulino, esse personagem Vêneto, é o
símbolo da imigração italiana pro Brasil que começaram a se bandia pra cá no fim
do século XIX até a metade do século XX, nesse tempo vieram mais de um milhão
de italianos pro Brasil, vamos deixar a história para trás; e vamos ao NANETTO
PIPETTA, bom, a história dele e bem comprida, então eu vou fazer um resumo da
vida do nosso herói certo:
TESTAMENTO
Eu, NANETTO PIPETTA, que morri afogado no Rio Iguaçu, com a posse de meia
colônia, quase toda paga, faltando apenas três meses e alguns dias para completar
o pagamento, declaro, aqui na presença do lampião, que deixo toda a posse da
minha meia colônia para a minha mãe e meu pai que estão na Itália lá longe do
outro lado do oceano, em Veneza, muito tristes por que eu morri afogado aqui na
América. Declaro também que eles venham completar o tempo que falta para pagar
a minha meia colônia, e tomar posse dela, pois, eu não a quero mais, já que estou
morto e enterrado. Declaro também que os meus irmãos e irmãs mais novos do que
eu e que estão vivos, podem plantar a cana-de-açúcar que muito doce e boa pra
fazer melado e rapadura também, além de plantar o milho que é para fazer a farinha
e da farinha fazer a polenta que me apetece muito, bom, agora que estou morto não
vou poder saborear a polenta junto com vocês, mas peço que comam em meu lugar,
e não se esqueçam de reunir a família antes de comer a polenta com radicci e rezar
todos juntos um “DAI-LHE, SENHOR O DESCANÇO ETERNO” por minha pobre
alma. Ponto. Este testamento uma vez apresentado as autoridades e devidamente
carimbado será encaminhado ao seu destino. Feito e escrito à noite pelo senhor
meu patrão, a luz do lampião que é alimentado com banha de porco, isso no mesmo
ano, mês e dia em que me afoguei. Eu que sou o patrão do coitado que está morto e
enterrado desde hoje à tarde, digo, assino e escrevo que estou em seu lugar, mas
não no túmulo, que lá esta ele, claro.
Zé – Eita! Que história triste não é mesmo, coitadinho do NONATO PAPITO, né seu
José!
ZOZÉ – Mais que coisa seu Zé! É NANETTO PIPETTA e o meu nome é ZOOOZÈ.
Lairton – Vocês não tão me reconhecendo, sou eu, (TODOS SAEM DOS
PERSONAGENS, TOMAM POSIÇÃO) bom, (INTRODUÇÃO DE LAIRTON SOBRE
A MÚSICA) e pra homenagear a nossa terra, vamos TODOS juntos cantar “MINHA
TERRA”.
FIM