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O papel da escola na

formação de leitores

por Renata Helene F. Campos


Autora: Renata Helena Campos

Título e subtítulo: O papel da escola na formação de leitores

Edição: 1ª

Local: Santo André

Nome do Editor: Elos Educacional

Ano da publicação: 2019

ISBN: 978-85-54968-03-8
“Incentivar o hábito pela leitura” ou “formar leitores” são

expectativas que muito aparecem nos discursos dos educadores

e nos planos das escolas há algumas décadas. Essas não são

tarefas simples, não é mesmo? Enquanto educadores, temos

consciência da tamanha relevância dessa temática? Ou será que

de tanto repetir que temos de “incentivar o hábito da leitura”

tornou-se um clichê e perdeu o sentido, caindo num vazio

semântico? O que de fato significa formar um leitor?

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Para tratarmos dessas questões, é relevante recorrer a Lerner (2005), quando afirma que:

O desafio é formar praticantes da leitura e da escrita e não


apenas sujeitos que possam “decifrar” o sistema de escrita. É
formar seres humanos críticos, capazes de ler entrelinhas e
de assumir uma posição própria frente à mantida, explícita
ou implicitamente, pelos autores dos textos com os quais
interagem, em vez de formar indivíduos dependentes da
letra do texto e da autoridade de outros. O desafio é formar
pessoas desejosas de embrenhar-se em outros mundos
possíveis que a literatura oferece. (LERNER, 2005, p. 27).

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A pessoa que tem o hábito da leitura enriquece seu vocabulário, mas também enriquece seu olhar sobre o

mundo, sobre as relações pessoais e sociais. Consegue identificar particularidades na linguagem escrita dos

autores, mas também compara os diferentes posicionamentos: “quem defende o quê ou é contra o quê ou

contra quem”. Vai tornando-se capaz de analisar diferentes formas de pensar, formulando suas próprias

opiniões, em vez de simplesmente reproduzir algo “porque alguém falou que era assim”. Sabe selecionar suas

leituras a partir do que gosta e se interessa, mas também sabe diferenciar notícias falsas ou tendenciosas e

analisar as informações dentro de um contexto. Quem lê se torna capaz de produzir seus próprios textos e

escrever suas próprias histórias.

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Em síntese: quando você é o leitor, ninguém precisa te contar, pois você consegue desenvolver a capacidade
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de buscar, comparar, selecionar, escolher e falar sobre o que leu. Isso amplia o conhecimento sobre a realidade

(analisar as relações dentro da sociedade, reconhecendo situações de opressão, preconceitos, abusos, dentre

outras), e por isso a leitura expande a liberdade do indivíduo, é emancipadora, ou seja, ela liberta quando

amplia a visão de mundo, e pode ser um divisor de águas em relação à maneira de pensar.

1O Brasil é o 2º país do mundo em que as pessoas mais têm a percepção equivocada sobre a realidade (informação que faz
parte da pesquisa “Os perigos da Percepção”, realizada pelo instituto Ipsos Mori, em 2018). Disponível em:
https://www1.folha.uol.com.br/mundo/2017/12/1941021-brasil-e-2-pais-com-menos-nocao-da-propria-realidade-aponta-
pesquisa.shtml (Acesso em 24/09/2018)
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A escola tem papel crucial para o alcance da formação dessa pessoa. É o lugar em que se pode ter um bom

acervo literário, quando as práticas de leitura são priorizadas. É o lugar onde se pode avançar para além da

leitura de bons livros, promovendo diálogos sobre os diferentes olhares e interpretações. É na escola que

podemos circular com autonomia pelas leituras, interagir não só com o texto, mas com as pessoas e fazer

relações com outras obras e com a realidade.

Se a leitura oferece uma maneira articulada de reconstruir a realidade, de


gozar dela esteticamente, de explorar os pontos de vista próprios através
da apresentação de outras alternativas ou de reconciliar-se com os
conflitos através de uma experiência pessoal e subjetiva, o papel do
professor deveria ser, principalmente, o de questionar e enriquecer as
respostas, o de esclarecer a representação da realidade, que a obra
pretendeu construir, mais do que o de ensinar princípios ou categorias de
análise. (COLOMER, 2003, p. 133).

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E quando começar esse investimento? Quando devemos iniciar a formação dessa pessoa leitora?

Desde os bebês! Pesquisas já avançaram sobre a constatação da atenção dos bebês quando alguém

lê para ele. O bebê pode não olhar diretamente para seu ledor, mas ouve e consegue distinguir a entonação da voz

entre uma leitura e uma conversa com ele. Aos poucos identifica palavras já ouvidas anteriormente e presta cada

vez mais atenção, associando também às ilustrações do livro.

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Observa que aquela leitura está sendo feita para ele, vai percebendo a sonoridade, o ritmo e a

cadência da leitura, acha graça das rimas e da entonação do texto e é capaz de sentir que aquele é um

momento de aconchego, algo prazeroso. Isso o aproxima aos poucos desse universo literário que pode

começar pelos livros de banho próprios para bebês até os cartonados mais elaborados e com narrativas mais

complexas.

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Desde a Educação Infantil podemos apresentar livros dos
diversos gêneros, temas, autores (nacionais e estrangeiros), dos
clássicos aos contemporâneos, livros ilustrados, livros com textos
mais curtos ou mais longos, prosas ou poemas, histórias com No ambiente escolar, a leitura por intermédio
.do professor
Além se coloca uma
da experiência situação
estética que bastante
repetição, histórias em quadrinhos. Das diferentes edições dos potente, especialmente no vista
caso da literatura.
proporcionam, tendo em a literatura
Além da
contos de fadas à literatura de cordel; das fábulas às crônicas. como forma deexperiência estética
expressão artística, os que
proporcionam, tendo em vista a literatura
Ficção e não ficção. Diversificar, mas também aprofundar, textos colocam as crianças em contato
como forma de expressão artística, os textos
com diferentes
colocam culturas,em
as crianças em diferentes
contato com
comparar edições, personagens, ler, reler, refletir, analisar a
épocas,
diferentese com a tradição
culturas, do seu próprio
em diferentes épocas, e
linguagem dos textos, conversar sobre as diferentes impressões povo.
com a(LUIZE,
tradição2016, p. 25).
do seu próprio povo. (LUIZE,
e permitir a fruição. A qualidade do trabalho melhora muito 2016, p. 25).

quando o professor tem propriedade e proximidade com as obras


literárias, quando demonstra encantamento e gosto pelas leituras
que faz, sendo modelo, e consegue mediar e fazer intervenções
intencionais.
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Apresentar livros com boa qualidade literária, considerando a linguagem, as ilustrações, o

material gráfico, a preocupação em evitar a reprodução de estereótipos, é um passo importante

para a finalidade da formação do leitor literário. Vale lembrar que quando a leitura aparece como obrigatória

ou forçada em razão de uma avaliação posterior, por exemplo, ou usada para moralizar ou ser um meio para

ensinar determinado conteúdo, ela perde o sentido e o prazer, e assim vai na contramão da formação do

leitor. Usar os diferentes espaços da escola para proporcionar a leitura é bastante interessante (pátio, salas,

corredores, chão, mesas, paredes, textos suspensos), tornando um ambiente em que todos respiram leitura!

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Ler em voz alta diariamente, como atividade de rotina permanente, com encantamento, faz parte do

processo de formação do leitor. Investir nas diversas estratégias ao longo de todos os anos de escolaridade

dos alunos, expondo painéis de indicações literárias, proporcionando momentos de empréstimos de livros e

visitas a bibliotecas, organizando saraus, envolvendo as famílias, conversando sobre as leituras e sobre a

relação que cada um fez (a partir de suas experiências pessoais) e o que cada um interpretou, pensou ou

sentiu, enfim, fazendo da leitura algo instigante e fundamental na vida de todos.

Nessa insistente tarefa de longo prazo, além de reconhecer na literatura o valor estético e artístico, os

alunos também percebem que a prática da leitura é insubstituível para a formação da sua própria

identidade.

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Referências Bibliográficas

COLOMER, Teresa. A formação do leitor literário: narrativa


infantil e juvenil atual. Trad: Sandroni, Laura. São Paulo: Global,
2003.

LERNER, Délia. Ler e escrever na escola: o real, o possível e o


necessário. São Paulo, Artmed, 2005.

LUIZE, Andrea. A linguagem escrita na Educação Infantil: uma


análise sobre as práticas de leitura. Revista Veras. São Paulo.
V6, n1, janeiro-junho/2016.

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