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d) Regimento do Santo Oficio da Inqúsição dos Reinos de Portugal

recopilado por mandado do ilustlssimo e reverendíssimo senhor Dom


Pedro de Castilho, Bispo Inquisidor-Geral e Vice-Rei dos Reinos de
Portugal 1613
-
Impresso na Inquisição de Lisboa por Pedro
Crasbeek. Ano da Encarnação do Seúor de 1613.
O Regimento de 1613 é um volume de 43 folhas tendo acrescida a
<Taboada dos Títulou em 1 folha. No final, tem 7 folhas com as fórmulas do
juramento do Inquisidor, Deputado, Promotor, Notário. Termina com <<Adver-
tência das cousas que se hão de ordenar paÍa a celebração do Auto de fé.>
De portada ornamental tem no alto um retângulo à largura do texto, com
deseúos de fitas, flores e cabeças de anjos.
Foi fianscrito por José Justino de Andrade e Silva naColeção Cronológica
da Legislação Portuguêsa 1613-1619, pp. 23 e segs.
-
REGIMENTO
Do Santo Oficio da Inqukição do Reino de Portugal
TÍTULO I
Dos Ministros do Santo Oficio, e qualidades,
e das coisas que são necessárias para
o ministério da inquisiçtio

I Primeiramente ordenamos que as cidades e os lugares onde residir o


-
Ofício da Santalnquisição, hajaordinariamentetês inquisidores, os quais serão
letrados, de boa consciência, prudentes e constantes, e os mais aptos e suficien-
tes que se puderem haver, cuja vid4 honestidade e honesta conservagão dê
exemplo de sua pureza e bondade; em os quais ocorrerão todas as qualidades
que se requerem, segundo a forma de Bula da Santa Inquisição, com as mais
que são necessárias para t2io grande e importante cargo.
II HaveÉ em cada Inquisigão três Deputados salariados, oom voto
-
decisivo, como sempre se costumoq e os mais sem saliârio, que paÍecer ao
Inquisidor Geral, pessoas escolhidas, de letas, idade, virtude e consciênci4 que
bem possam servir ao diante o santo oficio de inquisidores, e assim um
Promotor, trêsNotários, dois Procuradores, que defendam os presos, Meiriúo,
Alcaide do cárcere, dois Solicitadores, ou mais, sendo necessário, um Porteiro

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Sônia Áparecida de Siqueira

da Mesa do despacho, um Despenseiro, e os guardas necessáÍios para serviço


e ministéÍio do ciârcere e também haveú Qualificados, que revejam e examinem
os livros, e censurem as proposições, nas Inquisições, que ordenar o Inquisi-
dor-Geral.
Haverá mais em cada um dos lugares principais de cada distrito da
Inquisição, mormente nos portos de mar, e assim nos lugares de África e nas
Ilhas da Madeira, de Terceir4 e de S. Miguel, de Cabo Verde e de S. Thomé,
e nas Capitanias do Brasil, um comissário e um Escrivão de seu cargo e nos
lugares marítimos, haverá um Visitador de velas esfrangeiras, que, com o
Escrivão de seu cargo, terá cuidado de saber se trazem livros de hereges, ou
outros, defesos pelo Catálogo o qual cumprirá o Regimento que lhe for dado
pelos inquisidores.
E, também, nos ditos lugares, havenâ os familiares do S. Ofïcio, que o
Inquisidor Geral ordenar.
E a cada um dos ditos Oficiais, para poder servir seu oficio, terá Provisão,
em forma, do Inquisidor-Geral, e guardará o Regimento que lhe for ordenado,
como em seus títulos se dirá tirando-se a cada um deles primeiro bastante
-
informação de sua genealogia, de modo que conste que não tem raça de mouro,
judeu, nem de gente novamente convertida à fr, e assim de sua vida e seus
costumes e a mesma informação se tomará das mulheres dos ditos Oficiais, o
que se farâna forma do estilo do S. Ofício, com grande rigor e resguardo, e
pelos mesmos Inquisidores, sendo na Cidade onde residem, e por autos e
testemunhas em escrito,
m Os inquisidores e mais Oficiais, quando forem recebidos para
servirem- seus oficios, jurarão primeiro, na forma costumada, que bem e
fielmente servirão, e usarão deles, guardando a cada uma das partes suajustiça"
sem exceção de pessoas, ê que terão muito segredo e fidelidade, cada um no
cargo e oficio que tiver, e que o farão e administrarão com toda a devida
diligência e cuidado, assim como são obrigados.
tV cada uma das Inquisições, haverá uma Câmara do Secretc,
- Em
onde estarão todos os livros, registros e papéis, pertencentes ao Santo Oficio,
a qual Câmara terá portas fortes e firmes. E, na porta, haverá una fechadura
com três chaves diversas, e cada um dos três Notarios terá uma, paÍa que
nenhum, por si só, possa tirar escritura alguma, sem que todos três estejam
presentes; as quais chaves, um não poderá cometer ao outro, antes estarão todos
presentes em sendo ausente um dos ditos Noüários, doente ou impedido,terâa
chave a pessoa que os Inquisidores ordenarem e, além das tês chaves, se algum
Inquisidor quiser ter alguma chave de alguma arca das que estiverem no
Secreto, ou de algum escritório, e nela meter alguns papéis que importarem, e
que seria inconveniente que outras pessoas, ainda que fosse do Secreto, os visse,
principalmente nos negócios que o Inquisidor-Geral especialmente, comunique

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Regimeno do Santo Wio - 1613

com os Inquisidores, e cumpre que outra pessoa não saiba deles conteúdo, em
tal caso, o Inquisidor poderá trazer achave a bom recado.
V Na Casa do Secreto, haverá estantes postâs em boa ordem, e nelas
-
estaÍão todos os feitos findos, e os que processarem, por sua ordem; dos quais
haverá um repertório, para se saber de quem são e em que tempo se trataram e
o caso que é, de maneira que facilmente se possa achar, quando cumprir.
VI Haverá" na dita Câmara do Secreto, os Liwos necessários para o
-
ministério do S. Ofício e, em um deles, se escreverão as criações e osjuramentos
dos Inquisidores e Oficiais e se trasladarão suas provisões e assim mais um em
que se escrevam as reconciliações secretas e confissões que se Íizeram, antes
das pessoas serem presas e haverá outro Livro em que se escrevam as denun-
ciações que se vierem fazer ao S. Oficio; dos quais Livros serão assinadas as
folhas, por uma das margens, por um dos InquisidoÍes, e numeradas; e no fim
delas se fará declaração de quantas são, e de como vão assinadas todas pelo
Inquisidor, o qual assinará a tal declaração no fim do Livro.
E assim haverá outro Livro, no qual o Promotor do S. Oficio, acabado o
auto da Fé, escreverá por lista todas as pessoas que nele saíram e foram
despachadas pelos Inquisidores, declarando os nomes das terras de que forem
naturais e as culpas que cometeram, e as penas que por elas houveram, como
se dirá no título do Promotor.
E haverá mais outro Livro, em gue se lancem em receita todos os Liwos
que houverem de ficar na Inquisição, para se emendarem, ou por se não poderem
ter sem licençq como se dirá no título dos Inquisidores, Capítulo XVI.
E assim haverá outro Livro, que seÍva de receita por lembrança de todas
as penas pecuniárias, e dinheiro das comutações de penitências, como se dirá
no mesmo título dos Inquisidores, Capítulo XX)ilII.
VII Nos livros das denunciagões e reconciliagões, haverá repertório
-
abecedário de todas as pessoas que estiverem culpadas nos ditos Livros,
declaradas por seus nomes e sobrenomes e circunstâncias, por onde se possa
saber quem são.
E assim haverá outro repertório geral, que não, tão-somente compreenda
todas estas pessoas, que estiverem particularmente declaradas nos Livros, mas
também outras que estiverem culpadas por autos de reconoiliação em outas
partes separadas dos ditos Livros de que o Promotorteráespecial cuidado, como
em seu título se dirá, para que sem trabalho se possa saber o que se passa e o
dito Promotor, tanto que se escrever a dita reconciliação, ou denunciação,
lmçarâ logo a pessoa culpada no repertório, sem que haja mais dilação.
VIII Haverá mais no dito Secreto um Liwo apartado dos outros, em
-
que ordinariamente se registrem os mandados e as diligências dos Inquisidores

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Sônia Aparecida de Siqueira

que saírem para fora, ou seja para prisões, ou paÍa outras diligências, tanto que
for assinado pelos Inquisidores e fará declaração na forma seguinte: <A tantos
dias de tal mês, passou tal mandado, ou tal diligência parctal coisa, assinado
pelos Inquisidores F. e F., e foi entregue a F. para o entregar, ou para o dar à
devida execução>>.
E apartadamente se fará título destas coisas, que passarem em cada um
ano, paÍa mais breve se poder saber a diligência que se fez nisso; e se
cumpriram, far-se-á na maÍgem mengão de como se cumpriram, e é satisfeito
ao que se manda.
E assim havenâ outro Livro, em que se escrevam todas as fianças que se
derem no Santo Ofïcio, com as folhasnumeradase assinadaspeloslnquisidores.
IX O selo da Inquisigão estaná em uma arca dento na Câmara do
-
Secreto, e os Notrários selarão as cartas, as diligências e os papeis, que se
passarem para fora e levar-se-á de cada selo que se puser a petição das partes,
vinte réis. E quando se passaÍ mandado algum, para virem a Juízo algumas
testemunhas, que hão de ser examinadas no Santo Oficio, se as testemuúas
estiverem dentro da Cidade e seu Termo, os tais mandados não levarão selo.
X Neúuns papéis se tirarão nunca da Casa do Secreto, nem faslado
-
deles, nem traslado algum de autos que pertençam ao Santo Ofïcio e os
Inquisidores não mandarão darpapéis alguns, sem ordem e licençado Conselho
geral e os Notários os não poderão dar de ouúa maneira.
XI Na Câmara do Secreto, não entrarão senão os Inquisidores e os
-
Notrários do Secreto, e Promotor e não entrarão nela outros Oficiais alguns.
)m Haverá no Secreto da Inquisição uma aÍca com três chaves, na
qual -
se meterá todo o diúeiro das rendas da Inquisição, como estií ordenado,
e duas das ditâs chaves terão os dois Inquisidores mais amigos, e a outateú o
Tesoureiro do Santo Oficio e na Inquisição de Lisboa, as duas chaves da dita
arc4 que esÍá no Secreto do Conselho, terão dois Deputados do Conselho Geral
mais antigos e todo o dito diúeiro que nela se meter, se assentará em um Livro,
ordenado para o mesmo efeito, que estará na mesma aÍca, no qual se assentará
também a quantidade que se tira, e o di4 e para que efeito.
rÍrut otl
Da ordem que se lui de ter na visitação que se faz
por parte do Santo ofrcio, e do tempo da graça
concedida aos culpados no crime
de heresia e apostasia.

I- Pelo grande serviço de Deus, que resulta de se visitarem os distitos


da Inquisigão, e beneficio da gente de nagão, pelos editos de graça" ordenamos

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Regimento do Saüo Olício 1613
-

que, quando paÍecer tempo conveniente para se visitar a Comarca e disfrito de


cada uma das Inquisigões (o que será conforme a ordem que der o Inquisidor
Geral) um dos inquisidores, qual ele escolher, vâfazs a visitação por parte do
Santo Ofïcio, em cada um ano, podendo ser, correndo as cidades e os lugares
que parecerem necessiírios ao Santo Oficio e salvação das almas e levaná
consigo um Noüário do Secreto, Meiriúo e Solicitador e todas as informações
e os papéis que houver no S. Oficio, pertencentes à dita visitagão, e pessoas
daquele distito, e fará visitação na maneira seguinte:
Antes que o dito Inquisidor chegue ao lugar que se há de visitar, o fanâ
saber às Justiças do tal lugar, para que o aposentem convenientemente, e assim
aos oficiais junto com ele, e, porém, quando parecer necessiírio irem dois
Inquisidores visitar, cada um por sua parte, levará cada um seu Notário,
Meirinho e Solicitador, pela ordem acima declarad4 e o outro Inquisidor ficará
na Mesa com os demais Oficiais cumprindo com sua obrigação.
II Tanto que o Inquisidor chegar à cidade ou ao lugar da Comarca onde
-
de novo há de começar a entender no Ofïcio da S. Inquisição, depois de ter
apresentado seus poderes ao Prelado daquela Diocese, farájuntar as Justiças
Seculares e lhes apresentará a Patente de sua majestade, concedida ao Oficio
da S. Inquisição, e dar-lhe-á o traslado del4 se cumprir, para que sejam
informados do que Sua Majestade manda e depois mandará apregoar e notificar
o dia em que se há de publicar o edito da S. Inquisição, que seú domingo ou
Dia Santo de guarda, e assim em que Igreja, para que aclereziae o povo sejam
presentes nela a qual Igreja será a que parecer bem mais conveniente para isso,
e paÍa ouvir o sermão da Fé.
Emandaráquenaquele dianãohajaoutrapregação notal lugar; e o sermão
será principalmente em favor da Fé, e louvor e aumento do Santo Ofïcio, e para
animar os culpados, no crime da heresia e apostasia, e a se arependerem de
seus eÍïos, e pedirem perdão deles, para serem recebidos ao grêmio e união da
Santa Madre Igeja, e para declarar o zelo e a claridade com que as pessoas hão
de denunciarverdadeiramente o que souberem contraos culpados no dito crime.
E assim declarará o grande castigo que se há de dar às pessoas que não
vierem com este zelo, e se moverem a dizer alguma coisa falsamente, contra
alguma pessoa, ou pessoas, ou em outra qualquer coisa que tocar ao Santo
Ofício da Inquisição.
E encomendarão sempre este sermão a pessoa sem suspeita" e que saiba
muito bem fazer: e declararátambém no dito sermão a intenção dos Inquisido-
res, que é procurar mais às almas remédio de salvação, que querer castigar com
rigor da Justiça.
ru Depois de ser acabado o dito sermão, fará publicar, em alta e
-
intelegível voz,o edito e munitório geral, com censuras contra os inobedientes

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Sônia Áparecida de Siqueira

e contraditores, que vá bem formado, mandando, em virtude de obediênci4 e


sob pena de excomunhão, ipsofacto incotenda, que todos os que souberem
alguma cois4 de vista ou de ouvida, contra alguma ou algumas pessoas, de
qualquer Estado e qualidade que sejam, que tenham feito ou dito contra nossa
S. Fé Católica e o Santo Ofïcio da Inquisição, o venham dizer, notificar e
denunciar ao Inquisidor, no tempo que lhes for assinado, o qual tempo lhes
assinarão e darão, por três termos, e canônicas admoestações, em forma,
denunciando de todas as palavras e obras, posto que delas não resulte mais que
suspeita do crime de heresia e apostasia e que o que assim souberem, tocante à
Santa Inquisição, não o digam nem descubram a alguma pessoa, de qualquer
qualidade que seja, salvo a seus confessores, sendo tais pessoas, que lhes
possam bem aconselhar o que são nisso obrigados, fazet e os confessores lhes
mandarão queo veúam logo denunciar aos Inquisidores.
E no mesmo edito irá inserto, que os que tiverem livros proibidos, e
suspeitosos à Fé, os entreguem; e os que souberem de quem os tem, o venham
denunciar, os quais se verão pelo catrálogo dos livros defesos.

E outrossim serão obrigados a denunciar de tudo o que souberem contra


algumapessoa, ou pessoas, de qualquerqualidade de que sejam, que cometeram
o abominável pecado de sodomia, contra nafitram, e dos confessores que
solicitaram os penitentes, mulheres ou homens, no ato da confissão sacramen-
tal.
IV Logo após esta publicação, farâ o Inquisidor publicar outro edito
-
de graça, dizendo nele, que, querendo começaÍ, mais com zelo de salvagão das
almas, e miserioórdia, que com rigor de justiça dão e concedem tantos dias, os
quais todas as pessoas que se acharem culpadas no crime de heresia e apostasia,
e tiverem feito alguma coisa contra nossa Santa Fé Católica e Lei Evangélic4
ou se acharem compreendidos nos sobreditos crimes, veúam manifestar seus
heréticos eÍïores inteiramente, e as mais culpas em que se acharem compreen-
didos; porque serão recebidos com muita benignidade e não haverão pena
corporal, nem perderão seus bens; para este efeito se haverá Provisão de Sua
Majestade, em que remita os bens aos ditos culpados.

E o edito da Fé e da graça, depois de serem lidos, serão afixados na porta


principal da Igreja onde se publicarem; e estarão assim afixados por espaço de
tempo, com pena de excomuúío, ipsofato incotenda, de que não possam ser
tirados de que tudo o Notário do Santo Oficio faúr auto e assento em forma,
-
de maneira que faça fe e também da publicação.

V E esta mesma ordem acima declarad4 que mandamos que os


-
Inquisidores guardem quando forem visitar os lugares de sua Comarcan se terá
qüando o Oficio da Santa Inquisição for de noivo a algum lugar para se residir.

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Regimento do Santo Ofrcio
- I6li

VI O Inquisidor que fizer a visitagão por parte do Santo Oficio, na dita


-
visita somente despachará os casos leves, que não chegarem a mais que de leve
suspeit4 e sendo em parte ü[o remota, que se não possam consultar os Inquisi-
dores, sendo tais, que não requeiram prisão, nem pena corporal, ainda que se
provem plenariamente e todo o mais remeterá aos Inquisidores e não
-
prenderá culpado algum, salvo quando houver temor de fuga. -
VII Vindo alguma pessoa, no tempo da graça, com contrição e arre-
-
pendimento, pedir verdadeiramente perdão de seus erros e mas culpas, será
recebido benignamente, e examinada sua confissão, assim acerca de suas
culpas, como se tem nelas sócios, cúmplices e aderentes; e parecendo que fez
boa confissão, se receberá atal pessoa, com muita misericórdia, a reconciliação,
sendo primeiro chamado o Ordinário para isso e fará abjuração secreta" perante
os Inquisidores, Notário e duas testemuúas somente, a que se darájuramento
que teúam segredo; e a abjuração se escreverá no processo que com ele se
fizer, onde se porá também a sentença da reconciliação.
E na confissão das tais pessoas se declarará até que tempo durou a
comunicação dos erros que confessa com os cúmplices e as pessoas culpadas,
porque depois conste se o cúmplice fala verdade, e sendo as ditas pessoas
menores de vinte e cinco anos, sempre serão providas de curador em form4 e
em sua presença ratificarão suas confissões, abjurarão e se lhes notificarão suas
sentenças e o mesmo se fará em todos os casos em que a pessoa confessa abjura
secretamente, sem se lhefazpr mais processo.
Vm E havendo já
testemunhas, teúam testemuúado das tais
que
culpas, ou -sabendo que as há por qualquer via, ou pela própria pessoa que vem
pedir perdão dizer em sua confissão que algumas pessoas sabem de suas culpas,
em todos estes casos, as tais testemuúas serão examinadas, sendo cristãos-ve-
lhos, para ver se é verdadeira e boa a confissão da dita pessoa, e sendo as ditas
testemunhas cúmplices, ou fautores, não se examinarão, salvo estando presas
no cárcere do Santo Ofício, porque então se poderão examinar e de outra
maneira, não e achando ser verdadeira e boa a dita confissão, a dita pessoa será
recebida a reconciliação, e farâ abjuração em público, no lugar que parecer aos
Inquisidores, sem outra pena pública, conforme a qualidade da dita pessoa e de
sua confissão: haverá as mais penitencias, que parecer aos Inquisidores, e não
perderá os bens.
E sempre os Inquisidores imporão atodas asi pessoas que se reconciliarem,
penitencias espirituais, além das outras arbitrárias, como lhes parecer, segundo
a qualidade das culpas; e lhes mandarão que se apartem da companhia e das
ocasiões que as podem provocar a cair nas ditas culpas, ou em outras semelhan-
tes, e que ouçam as pregações e os Oficios divinos, e comuniquem com pessoas
virtuosas e doutas, que as possam bem instruirnas coisas daFé e se lhes parecer,

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Sônia Aparecida de Siqueira

lhes assinarlao certo confessor que teúa as mesmas qualidades, com que se
confessem, para o mesmo efeito e paÍa examinar bem sua consciênci4 lhes
mandarão que se confessem as quatro festas principais do ano, e tomem o
Santíssimo Sacramento quando parecer bem a seu confessor, e o mais que
parecer que convém.

rÍruro m
Dos que vemfora de tempo da graça pedir
perüio de suas culpas
I - Vindo alguma p€sso4 fora do tempo da graçq com conüição e
arrependimento de suas culpas, será examinada e recebida como se contém no
Título II, Capítulo VII e não havendo testemuúas, abjurará perante os Inqui-
sidores, Notário e testemunhas, sem hábito penitencial, nem cárcere; mas
haverá penitências espirituais, como parecer aos Inquisidores e mandarão que
faça o mais que no dito Capítulo VII se contém.
E havendo testemunhas que teúam já testemunhado das tais culpas, ou
sabendo que as há, por qualquer via, ou pela própria pessoa que pedir perdão
dizer em sua confissão que algumas pessoas sabem de suas culpas, em todos
estes casos, as tais testemuúas serão examinadas, na forma do dito Capítulo
VII, para se ver se é boa e verdadeira a confissão que faz a dita pessoa e
achando-se que a dita pessoa fazboa e verdadeira confissão, e parecendo que
se deve receber a reconciliação, será recebida e abjurará em público, no lugar
que parecer aos Inquisidores, conforÍne a qualidade da dita pessoa e sua
confissão e culpas e levará hábito penitencial, o qual lhe será tirado depois de
lida sua sentença.
E, parecendo aos Inquisidores, que vista a qualidade da pessoa e confissão,
não deve levar hábito ao lugar onde abjurar, se dará conta disso ao Conselho
Geral, para ordenar o que for mais serviço de Deus e haverá as mais penitências
que parecer aos Inquisidores, conforme a Direito e sendo as ditas pessoas
menores de vinte e cinco anos, se lhes dará curador, na forma declaÍada no dito
Capítulo VII.
II E parecendo que a dita confissão não é boa e verdadeira, a dita
-
pessoa será retida e examinada para se proceder no caso, como for justiça; e os
Inquisidores lhe farão as sessões que lhe parecer, antes da dita pessoa ser
recolhida ao cárcere paÍa constaÍ de suas faltas e depois de bem examinad4
não satisfazendo, como é obrigad4 sendo as culpas de qualidade e a prova
bastante para se haver de proceder, ficará a dita pessoa presa e se lhe fará
seqüesho de bens e se procederá contra ela e se dará copia de sua confissão e
das ditas culpas ao Promotor da Justiça, o qual aceitaní a confissão enquanto
faz contra o confidente e o acusará das mais culpas de que está negativo.

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Reginento do Santo Oftcio 16l j
-

E grande sinal do penitente fazer boa confissão e verdadeira, descobrir


outros culpados dos mesmos errores, especialmente sendo pessoas chegadas e
conjuntas em sangue, e a que tenham particular afeição, além das outras coisas
que se requerem para se ter a confissão por boa e verdadeira.
m Vindo alguma pessoa confessar suas culpas fora do tempo da graç4
-
as quais cometeu em Reinos eshanhos, onde foi judeu ou herege, com cúmpli-
ces ou de que saibam outras pessoas que lá o vissem, parecendo que a dita
pessoa faz conÍissão verdadeira e satisfatória, não estando delato abjurará na
Mesa, ante os Inquisidores e seus Oficiais, para que com este favor se movam
os culpados a confessar seus enos e salvar suas almas.
E sendo o caso tal, que possa haver dúvida se é bem que a dita pessoa abjure
em público, daní disso conta ao Conselho e, neste caso, e em outros semelhantes
a cerca da confiscação que se deve fazer ao tal herege, se consultará o
Inquisidor-Geral e o Conselho, para nele se determinar se convém fazer-lhe
alguma eqüidade a cerca dos bens que possuir, escrevendo-se a Sua Majestade.
E o mesmo se fará nos que se vem apresentar de sua vontade, e não estão
delatos e confessam culpas de heresia ou apostasia" e são reconciliados em
forma; mas nos apresentados e que estiverem delatos e com medo da prova se
vem acusar, por não serem presos, se fará seqüestro de seus bens, tanto que
confessarem.
ry Por quanto os hereges e apóstatas, como quer que se tornem à Fé,
-
e de qualquer maneira que sejam reconciliados, são infames de direito e devem
cumprir suas penitências com humildade, pesando-lhes do erro em que criaram,
os Inquisidores lhes mandarão depois de abjurarem, que não teúam, nem
possam ter, oficios públicos, nem beneficios, nem sejam procuradores, rendei-
ros, e boticiírios, fïsicos, cirurgiões, sangradores, nem possam ser bombardei-
ros, pilotos, nem mestres de naus, nem navios, nem possam tÍazeÍ,nem tragam,
sobre si e em suÍrs pessoas e vestidos, ouro, prata" ou peúaria algum4 nem
andem a cavalo, nem tragam armas, posto que sejam obrigados a tê-las, salvo
se for espada, depois de dispensados, sob pena de serem por isso castigados por
impenitentes, com as mais penas que parecer e no termo da soltura dos ditos
penitenciados, se lhes declarará a proibição das ditas coisas.
V E porque o Direito põe muitas penas graves e diversas, aos filhos e
-
netos dos hereges e apóstatas, que por tais foram conderuidos pelos Inquisido-
res, queremos que os ditos Inquisidores mandem sob graves penas e censuras,
que os filhos e netos dos tais hereges condenados na forma do Cap. Stannm
ll de hoeret. in 6o.,não teúam, nem usem oficios públicos, nem honras, nem
sejam Juízes, Alcaides, Meiriúos,Notiírios, Escrivães, Procuradores, Feitores,
Secretiírios, contadores, chanceleres, tesoureiros, médicos, cirurgiões sangra-
dores, botiqueiros, fiéis, corretores, nem rendeiros de rendas algumas, nem

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Sônia Aparecida de Siqueira

outros semelhantes ofícios, que sejam ou se possam chamarpúblicos, nem deles


possam usar por si, nem por outra interposta pessoa, nem sob outra alguma cor
tragam sobre si, nem em seus ativos e vestidos, coisas que são insígnias
-nem
de alguma dignidade ou milícia eclesiástica ou secular: e, porém, com os filhos
e netos dos relaxados se terá algum respeito de favor, mais que com os próprios
delinqüentes. E a dispensação de todas as ditas penas e das mais do capítulo
precedente ficará ao Inquisidor-Geral.
VI Vindo alguma pessoa pedir perdão de algumas
- e que não podem ser sabidas de nenhuma pesso4culpas
per acidens,
ocultas, de
confessando-as
na Mesa do Santo Oficio e pedindo absolvição delas, cada um dos inquisidores
a poder a absolver da excomunhão em que incorreu e reconciliar judicialmente,
na dita Mesa, impondo-lhe penitências espirituais e mandando-lhe mais do que
no Capítulo VIII do Título II está declarado, contanto que pelo que assim fizer
se não possÍìm saber suas culpas ou se de suspeita delas.

E para esta reconciliação não é necessário ser chamado o Ordiniârio; mas


ficará em lembrança, no assento que se frzer da tal reconciliação: e se a dita
pessoa tornar a reincidir nas ditas culpas, ou em semelhantes, se terá respeito
a se não haver por relapsa, para o que se deve dar conta a Sua Santidade.

E vindo a tal pessoa à casa dos Inquisidores, e confessando-lhe a dita culpq


em caso que não queira ir à Mesa do Santo Ofïcio, cada um deles a podeú
absolver e reconciliar, conforme o Breve do Clemente VII, e com as condigões
nele declaradas e o mesmo se fará quando algum confessor conta na Mesa de
algum penitente, que na confissão sacramental declarou que dissera ou frzera
alguma heresia formal oculta, de per acidens, e não quer, por neúum modo,
ou não pode ir fazer a tal confissão na Mesa do Santo Offcio, porque neste caso
lhe poderão cometer os ditos Inquisidores a absolvição da tal heresia, com Í!s
condições do dito Breve.
A qual comissão se não fará, senão com grande e urgente causa, fazendo-se
primeiro diligencia com a pessoa que confessar, paÍã que vá à Mesa do Santo
Oficio e considerando todas as circunstâncias que no caso se requerem, con-
forme o dito Breve.
E quando a dita pessoa for reconciliadana Mesa do Santo Ofïcio judicial-
mente, se não fará seqüestro em seus bens, mas se tomará informagão, pelos
Inquisidores, dafazenda, que tem, para darem disso conta ao Inquisidor-Gcral,
para que Sua Majestade lhe remeta aparte dafazendaque for servido.

VII os Inquisidores pronunciarem sobre o recebimento das


- Quando
reconciliações, e penitencias que derem aos culpados, ainda que seja em tempo
{e graça, antes de serem presos, será requerido o Ordinrário a Direito, porém
quando o delito de heresia e apostasia for oculto, de per acidens, como dito é,

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Regimento do Santo Ofcio 16l j
-

poderá em tal caso um dos Inquisidores, por si só, absolver e reconciliar o tal
penitente, sem o Ordinrârio.
VIII Se algum reconciliado, no tempo dagraça, ou depois, se jatar ou
-
gabar, em público, ou diante de algumas pessoas dizendo que ele não cometera,
nem cometeu as heresias e os eÍïores por ele confessados, ou que não errou
tanto que confessou, sendo-lhe provado, se procederá confa ele, segundo forma
de Direito, a qualidade de suas culpas.
IX Se alguns filhos ou netos de hereges inconerem no crime de heresia
-
e apostasi4 por serem ensinados por seus pais e avós, sendo menores de vinte
e cinco anos, se vierem reconciliar, e confessarem inteiramente seus heréticos
eÍïores, assim de si, como das pessoas que os dogmatizaram, com estes tais
menores, ainda que veúam depois do tempo de graça, os Inquisidores usarão
de muita misericórdia e os receberão caritativamente a reconciliação, impon-
do'lhes penitências menos graves que aos outros maiores.
E, pórem, os menores de idade de discrição não serão obrigados a abjurar
publicamente. Os quais anos de discrição são quatorze anos no varão e doze na
fêmea, e sendo maiores dos ditos anos, abjurarão os heréticos errores que
fiz-eran e cometeram na menoridade, sendo deles capazes.
X Acontecendo vir alguma pessoa reconciliar-se, e sendo examinada
-
em form4 e recebida sua reconciliação, achando-se depois, e constando por
testemunhas que dele vierem denunciar, que não falou verdade em suas confis-
sões, em tal caso, mandar-se-á chamar o tal penitente, e com muito resguardo,
que se não assente, e se examinarão suas culpas, e será examinado e perguntado,
conforme a elas, significando-lhe que ele não tem satisfeito, e que as confissões
por ele até então são fingidas e simuladas, e não verdadeiras, nem satisfatórias,
que abra os olhos da alma e confesse a verdade.
E tornando o tal confidente sobre si, e conformando-se com o que dizem
as testemunhas e com a verdade e pedindo perdão, com moshas de bom
penitente, se usará com ele de misericórdia, achando que a merece, pronuncian-
do os Inquisidores, assim em sua reconciliação, como nas mais penas e
penitências que o penitente merecer, e como parecer que convém a serviço de
Nosso Seúor, e salvação de sua alma. E não abjurará segunda vez; mas será
absoluto da excomuúão de que ficou ligado por não descobrir os cúmplices.
E quando trouxer hábito penitencial, se lhe acrescentará o dito hábito e
cárcere, como parecer que suas culpas o mereceram e não trazendo hábito
penitencial, o levará quando for ao auto, e o trará público, o tempo que parecer
aos Inquisidores os quais terão grande resguardo a cerca destes reconciliados,
que não confessarem inteiramente, ao tempo de sua reconciliação, de si, nem
de outras pessoas, o que sabiam dos ditos crimes, especialmente em coisas e
atos graves assinados, feitos e comunicados com tais pessoas, üio coúecidas

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Sônia Aparecida de Siqueira

ao confidente, e t:Ío.............. penitente estimulado confidente, não tendo respei-


to à sua fingida reconciliação.
XI Por quanto El-Rei Dom Henrique, que este em Glória,Inquisidor
-
Geral neste Reino, passou uma Provisão, dada em 9 de fevereiro de 1579, pela
qual comete aos PÍovisoÍes e Vigários-gerais dos lugares de África que, possam
absolver com reincidência a todos os que, estando em terra de mouros por
homizios, ou sendo cativos, ou por outra causa (não sendo da nagão dos cristiíos
novos) se langaram com eles, e professaram a seita de Mafamede, ou tomando
nome e hábito de mouros e fazendo as cerimônias da dita seita, vindo-se
apresentar ante eles, e pedindo perdão e misericórdia de suas culpas, confes-
sando-as inteiramente; e que mandem confessar e sacramentar, impondo-lhes
as penitências que lhes parecer, prometendo eles de se apartar de seus eÍros, e
peÌmanecer na obediência da Santa Madre Igeja, contanto que se veúam
apresentar ante os Inquisidores, dentro do tempo que lhes for assinado.
Havemos por bem que a dita Provisão se guarde inteiramente, como nela
se contém, e que os Inquisidores os recebam, e tratem com muita caridade e
misericórdia, e os despachem com toda a brevidade possível, respeitando
quanto importa usar-se com as tais pessoas de benignidade, para que os outros
que tiverem cometido as mesmas culpas se não intimidem, antes se esforcem
e animem, para se tornarem à nossa Santa Fé Católica.
E sendo alguma das ditas pessoas reconciliada em forma, lhe não lançarão
hábito penitencial, e somente as tais pessoas abjurarão na Mes4 ante os
Inquisidores e seus Oficiais, e lhes imporão as penitencias espirituais, que
parecer, mandando-os instruir nas coisas da Fé, por pessoas religiosas: e no
modo de abjurar, quando negarem atenção, terão sempre respeito à suspeita que
contra eles resulta ser leve ou veemente, para conforme a ela serem julgados e
penitenciados.
E sendo algumas das ditas pessoas naturais e moradoras em oufo Reino,
os Inquisidores a remeterão, com os papéis que trouxer, à Inquisição do dishito
onde foram moradoras ou naturais paralí seÍem examinadas a cerca das ditas
culpas e penitências conforme elas.
XII ...dando mostras de arrependimento, será admitido à reconciliação
-
da Santa Madre Igreja e abjurará na Mesa, ante os Inquisidores e seus Oficiais,
e será absoluto da excomuúão em que incorreu e instruído nas coisas da Fé,
necessárias para salvação de sua alma; e terá as penitências espirituais, que
parecer aos Inquisidores, e lhe mandarão que se aparte da comunicação de
pessoas suspeitas na Fé, e que lhe possam causar dano à sua alma e que se
confesse as três Práscoas do ano, e disso mande certidão do seu Cura.
E não lhe será feito seqüestro de seus bens; e se dará conta ao Inquisidor
Geral, para que peça à sua majestade que lhe remeta seus bens, porque, com

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Regimento do Santo Ofcio I613
-

este favor e exemplo, se animem oufos semelhantes, pÍìra se converterem e


tornarem à Fé Católica.
E, achando que a dita pessoa não foi suficientemente instruída nas coisas
da Fé, e se criou entre pais e parentes hereges, e em partes onde não teve, nem
podia ter conhecimento verdadeiro da Fé Católica, com outras circunstâncias,
em tal caso, os Inquisidores mandarão instruir a dita pessoa nas coisas da Fé,
por um religioso e depois de estar bem instruída, será absolut4 ad cautelam,
da excomunhão em que podia ter incorrido e lhe mandarão que se aparte da
comunicação de pessoas suspeitas na Fé, como acima esüí dito, e se confesse
de seus erros, e a seu confessor e não abjurarii nem será reconciliado, visto nÍlo
ter suficiente instrução das coisas da Fé.
rÍruro ry
Do modo de proceder, e ordem que se hó de ter, cotn os
culpados no crime de heresia e apostasia.
I Os Inquisidores, no modo de proceder, terão muito tento e estarão
muito -de sobreaviso, e serão presentes todos juntamente, sendo possível,
quando receberem as denúncias das testemunhas que vierem denunciar ao
Santo Ofício da Inquisição e assim quando pronunciarem sobre as culpas que
lhes parecerem obrigatórias para prisão ou pronunciaÍem em outra maneira"
conforme elas.
E, além de estarem presentes os Inquisidores nas ditas pronunciações, para
mais justificagão, poderão chamar os deputados que lhes paÍeceÍ, e, desta
pronunciação p raaprisão, sairá mandado assinado pelos Inquisidores, paÍa o
Meirinho prender os culpados e isto se fará ordinariamente, a requerimento do
promotor da Inquisição.
E, no exame das ditas denunciações, ou inquirições que se fizerem, se
hajam de tal maneira ou portal ordem, que se entenda bem se são as testemuúas
contestes, ou não, perguntando por todas as circunstÍincias que forem necessá-
rias para este efeito.
II Por quanto acontece muitas vezes virem algumas pessoas denunciar
-
ao Santo Ofïcio de çoisas tocantes e pertencentes a ele, contra pessoas de outro
distrito, ordenamos que os Inquisidores de qualquerlnquisição possam receber
as tais denunciações, ratificando as testemuúas em fo{ma; e tomadas, as
mandarão aos Inquisidores do distrito a que pertencem; e havendo causa
importante para isso pedirá comissão ao Inquisidor-Geral, paÍa se pronunciar,
processar e determinar, finalmente, a caus4 na Inquisição onde estivertomada
a dita denunciação, e para virem os culpados a ela.
m Posto que alguma pessoa esteja indiciada de crime de heresia e
-
apostasia, se a prova não for bastante para prisão, a tal pessoa culpada não será

R IHGB, Rio de Janeiro, 157(392):615-691, jul./set. 1996.


Sônia Aparecida de Siqueira

chamada à Mes4 nem examinada, nem se faÍá com ela diligência algum4
porque se sabe por experiência que não há de confessar que é herege, estando
solta em sua liberdade; e semelhantes exames servem mais de avisar os
culpados, que de outro bom efeito e assim convém mais esperar que sobreve-
nham novos indícios ou nova prova.
IV Quando se houver de pronunciar sobre as culpas de alguma pessoa,
-
pÍìra se prender, se terá muito aviso e tento se as culpas são tomadas de muitos
dias ou poucos, porque será necessário saber se as testemuúas são vivas ao
tempo da prisão; porque sendo falecidas, sem serem ratificadas, se prendesse,
haveria depois grande defeito na prova, segundo a prática que se tem conforme
a direito.
E o seqüestro de bens se não fará, senão em caso de heresia" ou em casos
que haja confiscação de bens pertencentes ao Santo Ofïcio; nem se seqüestrarão
bens possuídos por terceiro possuidor, salvo quando o dito possuidor os tiver
da mão do dito preso.
V Assim mesmo se olhaná muito a qualidade das testemunhas, e o
-
crédito que se lhes deve dar, segundo a qualidade do caso e da pessoa e os
Inquisidores farão diligências sobre o crédito que devem dar às testemunhas,
antes que procedam à prisão, como em negócio de tanta importância se requer.
E o mesmo farão em todas as mais testemuúas que perguntarem e quando se
mandar pedir de uma Inquisição a outra crédito da testemuúa será por
remissória e não por carta.
VI Os Inquisidores receberão as denúncias e testemunhas de ouvidas
-
as quais se escreverão por Livro das denúncias; e, porém, não parafaznrem obra
por elas, senão para averiguarem a verdade acerca das culpas que tocam em seu
referimento; e depois se perguntarão as referidas.
E quando parecer necessário confrontarem-se as testemunhas umas com
as outras, de rosto a rosto, e na qualidade do caso o requer, o poderão fazer os
Inquisidores: mas será raramente com muita cautel4 circunspecção e urgente
causa; e havendo lugar, darão primeiro conta disso ao conselho.
VII Quando se perguntarem as testemuúas das denúncias, declarem
-
sempre sua idade, se são casados ou solteiros e que ofïcios têm, onde vivem e
donde são naturais, e se são criados de algumas pessoas, e se têm raça dejudeus
ou mouros ou se foram reconciliados ou penitenciados pelo Santo Oficio, ou
se são filhos ou netos de condenados pelo crime de heresia com as mais
circunstÍincias que parecerem necessárias para constar, e se saber em todo o
tempo, da testemuúa e qualidade dela.
E outrasim declararão a idade da pessoa culpada, quando não constar será
maior de idade. E tanto que as testemuúas depuserem, se ratificarão logo,
conforme ao estilo.

628 R IHGB, Rio de Janeiro, 157(392):615-691, jul./set. 1996.


Reginento do Santo Oflcío 1613
-

E quanto ao perguntaÍ as testemunhas, e pessoas que denunciam se tem


raça" haverá nisso a moderação que parecer aos Inquisidores.
Vm Tendo entendido os Inquisidores que amatériaé de Fé conforme
-
ao parecer e a qualificação dos Teólogos, ou que a cerimônia coúecida dos
judeus ou mouros ou heresia ou fautoriq que pertence ao Santo Ofïcio, o
Promotor logo fará seu requerimento perante os Inquisidores, contra a pessoa
ou as pessoas denunciadas, pedindo sejam presas, apresentandojuntamente as
denuncias e qualificagões, sendo necessiírio e vistas elas pelos Inquisidores que
estiverem presentes no hibunal, votarão as prisões que se houverem defazer,
assistindo alguns Deputados, se parecer, quando o caso for duvidoso ou grave
e o que se assentar, se porá por despacho assinado por todos.
IX Por uma só testemuúa se não procederá à prisão ordinariamente,
-
salvo quando parecer aos Inquisidores que é caso para isso, e a testemuúa é
de correto, e que fala verdade, e sendo o culpado pessoa das ordinárias, tendo
primeiro tomado informação conforme a Direito e as pessoas de maior quantl4
que, por uma só testemuúa, se pronunciarem a prisão, se enviará o assento ao
Conselho Geral, antes de ser presa, para determinar o que for mais serviço de
Deus.
E para a pessoa que vier presa paÍa o Santo Ofïcio, trará o Oficial que a
prender até vinte mil réis, para a sustentação; e, sendo pobre, trará o que puder.
X Tanto que a pessoa que se mandar prender for presa, e entregue ao
-
Alcaide do cárcere, frcarâo mandado dos Inquisidores, que se deu ao Meiriúo,
junto as culpas, para se saber ao tempo que foi preso e se fará de entrega no
cárcere, que andaráacostado aos autos e o Alcaide do carcere ponâos tais presos
nas casas e prisões que os Inquisidores lhes mandarem, sem exceder nisso com
alguma; e os Inquisidores mandarão arrecadar os mandados das prisões que se
não executaram, das pessoas a que foram entregues, porque senão possa
descobrir o segredo.
XI Depois de estar presa a dita pessoa no cárcere do Santo Ofïcio, os
-
inquisidores a mandarão vir à Mesa e declanrã,por termo assinado por ela, que
ficará no seu processo, que fazenda tem de raiz e m6vel e as dívidas que lhe
devem, e as que ele deve, e que papéis e conhecimentos tem em sua casa, ou
em mão de outra pesso4 de dívidas que lhe devem, o direito, ou a ação que lhe
pertenç4 e se mandará ao Juiz do Fisco um item somente dafazend4e do mais
que declarar o preso.

Da genealogia que se há defazer


na primeira sessão
XII Os inquisidores, o mais breve que for possível, mandatão tazer
-
ante si o pÍeso e o consolarão e animarão que se dispoúa para examinar eom

R IHGB, Rio de Janeiro, I 57(392): 615-691 , jul./set. I996. 629


Sônia Aparecida de Siqueira

consciência e confessar a verdade, e lhe farão três admoestações, com boas


palavras, em diversas sessões, as quais se farão comumente e pela maior parte
do termo de quinze dias, salvo parecendo aos Inquisidores com causa que se
deve alargar mais o tempo.
E, na primeira sessão, será perguntado pela sua genealogia, em forma"
deolarando donde é natural, como se chama, a idade e o ofïcio que tem, e os
nomes de seu pai, mãe e avós paternos e maternos, assim vivos, como defuntos
e dostransversaisque se lembrar, e donde eramnaturais e moradores e os oficios
que tiveram, e com quem foram casados e se são vivos ou defuntos e os filhos
que os ascendentes e transversais deixaram, e quantas vezes foi casado, e os
filhos que teve ou tem, e de que idade são.
E assim declarará de que nação é, e se ele, ou os ditos seus parentes, tem
alguma raça de mouro ou judeu e se lhe perguntará pelo decurso de sua vid4
onde se há criado, e com que pessoas, se sabe ler ou escrever, e se aprendeu
algumaciênci4 e se andou foradesteReino, e em quepartes esteve, e as pessoas
com quem conversou etratou, e se foi reconciliado, preso oupenitenciado pelo
Santo Oficio, ou é neto de relanado e se sabe as orações de cristão, com as mais
perguntas costumadas.
E na mesma sessão será admoestado e requerido, de parte de Nosso Seúor
Jesus Cristo, que, sentindo em si ter feito ou dito alguma coisa contra nossa
Santa Fé Católica, que se anependa e confesse suas culpas e a crença e atenção
que teve e delas peça perdão inteiramente, declarando os cúmplices e todas as
pessoas que saiba terem feito, dito ou cometido alguma coisa conha nossa Santa
Fé Católic4 e contra o que tem, crê e ensina a Santa Madre Igreja de Rom4
para que, fazendo-o assim, possa conseguir misericórdia que ele concede aos
bons e verdadeiros confidentes.
E esta admoestação, com as mais perguntas e sessões que lhe forem, se
farão ao réu com juramento, em forma, no princípio das sessões e será tudo
assinado pela parte e pelos Inquisidores. E todas as vezes que se fizer ao réu
audiência, ou se ratificaÍ no que tiver dito contra cúmplices, sempre no fim da
audiência se lerá ao réu tudo o que estiver escrito, e se lhe perguntará se esüi
na verdade como ele o disse, e se tem que acrescentar ou diminuir e assim o
declare o Notiírio na mesma sessão; e o mesmo se fará no exame das testemu-
nhas que se perguntarem na Mesa do Santo Ofício, ou fora dela, por mandado
dos Inquisidores, e nas denúncias que se tomarem e a genealogia nos confiden-
tes se faní no fim das confissões, ou quando parecer aos Inquisidores.
)(III Depois de feita a dita genealogi4 se farâ a segunda sessão, na
qual será -o réu admoestado em forma, como na primeira, e perguntado, in
genere, por suas culpas e pela crenç4 e cerimônias da lei, ou seita de que estiá
delato, assim como se estivesse indiciado de judaísmo ou heresia ou seita de

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Regimento do Santo Ofuio 1613
-

Mafamede, será perguntado por cada uma das cerimônias da dita lei ou seita, e
por crença dela, porque achando-se compreendido em algumas delas, as con-
fesse e salve sua alma; e as perguntas se multiplicarão, segundo a qualidade do
caso.
Depois desta sessão se fará a terceira admoestação, na qual será o réu
admoestado e perguntado em particular por cada uma das culpas que tiver,
conforme ao tempo em que as fez, e cerimônias de que está delato é pessoas
com que as comunicou e não será nunca perguntado por pessoa alguma em
particular, nomeando-a por seu nome, por evitar a sugestão que do contriário se
segue, salvo havendo bastante informação, e dando primeiro conta disso ao
Conselho.
Xry Confessando o réu em alguma das audiências sobreditas, os
Inquisidores- o deixarão prosseguir e continuar sua confissão, sem a interrom-
perem com perguntas e, depois do réu acabar de dizer o que lhe lembrar, lhe
perguntarão o propósito e a ocasião que houve parafazer, ou dizer o que tiver
confessado, e a intenção que nisso teve, e que declare o tempo, o lugar e as
pessoas que se acharam presentes; e confessando ter dito alguma proposição
herética, judaica ou de seita de mouros, ou feito alguma cerimônia judaica, ou
das ditas seitas, lhe perguntarão se ao tempo que disse as ditas heresias, ou fez
as ditas cerimônias, sabia e entendia que eram contriárias à nossa Santa Fé
Católica e contra o que tem e ensina a Santa Madre Igreja de Roma, paÍa com
isso ficar constituindo em penitência e herege consumado.
E assim lhe perguntarão quando começou a crer as coisas que tem confes-
sado, e até que tempo lhe durou a crença dos ditos erros e quem lhos ensinou e
onde os aprendeu e que causa o moveu a deixar os ditos erros e apartar-se deles
e que é o que ao presente crê.
E lhe farão as mais perguntas que lhe parecerem necessiírias para bem do
negócio e clarcza de sua confissão, principalmente as que resultarem das
respostas que o réu der. E lhe perguntarão se, nas confissões sacramentais
fingidas qu,e fazia, confessava os ditos erros de seus confessores e se recebia o
Santíssimo Sacramento, e quantas vezes e a que fim se confessava e comunga-
va.
E confessando o réu algumas cerimônias de judeus e mouros, declarará o
modo em que as fazia, e com que palavras; e se escreverá tudo o que disser por
extenso e da mesma maneira as orações que confessar que rezava, perguntan-
do-lhe com que pessoas tratou, e comunicou os erros e as cerimonias que tiver
confessado, e quem lhas viu fazer oudizer ou sabe delas ou poderá saber.
XV o réu tiver dito que fez algumas coisas, ou comunicou
- Quando
com algumas pessoas e no decurso de suas confissões acrescentaroutros delitos
ou cúmplices ou que os já confessados cometeu mais vezes, se não contentem

R IHGB, Rio de Janeiro, I 57(j92): 61 5-69 I, jul./set. 1996. 631


Sônia Aparecida de Siqueira

os Inquisidores com o réu dizer que fez e comunicou aquela culpa com as
pessoas que tem declarado, ou no tempo que tem confessado em tal sessão; mas
farão que o réu particularmente diga em çada sessão os nomes de todas as
pessoas que se acharam presentes, e a substÍincia da culpas, que cometeram, e
declaração que tiveram, e tempo e lugar, com as mais circunstâncias necessá-
rias, não referindo umas confissões às outas, para que o testemunho fique mais
claro e concludente, e as publicações se possam fazer com certeza.
XVI Os Inquisidores terão muita consideração quando fizerem per-
guntas aos-réus, que seja com muito tento, e não lhes perguntem coisa de que
não estejam indicados ou a que eles hajam dado ocasião em suas respostas,
usando de todo o bom termo, de maneira que o que for somente suspeita ou
presunção, se lhe não de a entender que está provado e para que nisto não possa
haver excesso, oNotiário escreverátudo o que os Inquisidores perguntarem aos
réus, e o que eles responderem, sem deixar coisa alguma por assentar, paÍa que
de todo hajaclarcza.

XVII Neúuma mulher moça se porá só no cárcere em casa apartada


-
e quando parecer necessário, e para sua salvação, apartar-se da companhia das
outras, parecendo aos Inquisidores que convém assim, e que não há outro
melhor meio, lhe darão uma mulher de bem, e de confiança, com esteja em sua
companhia, e olhe por ela e venha com ela, quando lhe fizerem sessões e
audiências na Mesa, e tome com el4 de maneira que se conserve a honestidade
de sua pessoa e se faça o que convém para sua salvação. E todas as vezes que
o Alcaide vier com alguma mulher à Mesa, virá também com ele um guarda do
ciircere; e as prisões que os Inquisidores mandarem fazer trabalharão que se
façam com toda a honestidade, e o meirinho e mais Oficiais da Santa Inquisição
terão disso especial cuidado e diligência.

XVm Os presos negativos, se não mudarão de uma casa para outr4


nem se lhes -dará companhia, salvo havendo causa para isso. E quando parecer
aos Inquisidores que se lhe deve dar a dita companhia, em neúuma manefua
lha darão de pessoas das próprias terras e lugares donde são, nem culpados nas
mesmas culpas in specie, nem parentes; mas serão acompanhados os tais
negativos de alguns bons confidentes, e pessoas de que se tiver melhor conceito
e se proverá de maneira, que com a companhia se não cause mais dano, de que
haveria sem ela.

E quando parecer que o preso ou presa deve ser mudado da casa em que
primeiro foi posto, ou das em que depois estiver, se assentará em seu processo
o dia em que foi mudado da dita casa, e para onde, e paÍa que compaúia se
mudou, e que compaúia tinha antes e porque causa mudou; e da mesma
maneira se ponha no processo do companheiro e quando o preso vier de novo

632 R IHGB, Rio de Janeiro, 1 57(392):61 5-691 , jul./set. 1996.


Regimento do Santo O/ício l6l j
-

para o cáÍcere, se declarará em seu processo a casa em que foi recolhido por
mandado dos Inquisidores.
XIX Os Inquisidores visitarão o cárcere do Santo Ofïcio, ao menos de
-
mês em mês, e todas as mais vezes que for necessário, posto que haja despacho
final; e ouvirão os presos a cerca de suas necessidades, e os mandaÍão prover,
e consolar e saberão se lhe dão algum mau tratamento, e proverão em todo o
que lhes parecer que cumpre; e levarão sempre consigo um Notário, Ptrâ
mandarem tomar em lembrança o que os presos requerem e assim qualquer
outra coisa que paÍecer necessiária e cumprir a serviço de Nosso Senhor. E o
Alcaide do cárcere não será presente à dita visita, mas a pessoa que os
Inquisidores escolherem, que irá diante, com as chaves, abrindo as portas onde
os presos estiverem.
XX Por evitar os inconvenientes que comumente sucedem, de falarem
- de fora com os presos, os Inquisidores
as pessoas olharão muito nisso e
ordenarão como o Alcaide não de lugar, nem consinta que o tal se faç4 sem
sua licença, salvo quando fossem pessoas religiosas e doutas, ou Sacerdotes,
por mandado dos Inquisidores, para sua consolação e edificação e sempre estariá
presente um Notário com o preso, e religioso que lhe falar; e de outra maneira
ie não fará nunca, salvo quando se confessaÍ sacrÍÌmentalmente, como na
Capítulo XIV, Título X, se dirá.
De quando se dará confessor ao preso
XXI Se algum preso adoecer no cárcere, além dos Inquisidores serem
obrigados -mandá-lo curar com diligências, e prover que se lhe dê todo o
necessário para sua saúde, com parecer do médico ou dos médicos, que o
curaÍem, se pedir confessor se lhe dará pessoa qualificada, e de confiança; a
qual jurará nã Mesa que terá segredo, e que, se o penitente disser em confissão
alguma coisa que dê por aviso fora do cárcere, não aceite o tal secreto não dê
semelhantes avisos; e dizendo-lho fora da confissão, o dirá aos Inquisidores e
o avisarão e instruirão da forma como se há de haver com o penitente,
significando-lhe que, mais pois está preso por herege, se não manifestar suas
héresias judicialmente, sendo culpado, não pode ser absolvido; e o mais se
deixará a consciência do dito confessor, o qual será pessoa douta para que
entenda o que em semelhante caso se deve fazer.
E quando o réu estiver são, e tiver saúde, e se pedir confessor, o mais seguro
é não lho dar, salvo quando tivesse confessado judicialmente suas culpas, e
tivesse satisfeito os autos; porque, em tal caso, parece coisa conveniente dar-lhe
confessor, para que o console e esforce; mas como não pode ser absoluto do
crime da heresia antes ser reconciliado ao grêmio da Santa Madre lgreja, parece
que a confissão não terá total efeito, salvo se estiver no último artigo de morte,
ou for mulher prenha, que esteja chegada ao parto, porque as se guardará o que

RIHGB, Rio de Janeiro, 157(392):615-69l,jul./set. 1996. 633


Sônia Aparecida de Síqueira

o direito em tal caso dispõe: e quando o réu não pedisse confessor, e o médico
desconfiasse, ou estivesse duvidoso de sua saúde, pode-se lhe persuadir por
todas as vias que se confesse.

Das suspeições
XXII Quando as partes vierem com suspensão a ambos os Inquisido-
-
res, se lhes parecer que as tais suspensões são frívolas, não as receberão, e
procederão na causa em diante, como lhes paÍecer justiça e sendo tais, que
paÍeça que se devem recebeç as remeterão ao Inquisidor-Geral e ao Conselho
da Inquisição, assinando termo às partes, paÍa que vão requerer suajustiça sobre
elas, ante o Inquisidor-Gera, ou Conselho.
E quando a suspeição for posta a um dos Inquisidores somente, o outro
Inquisidor tomarâ coúecimento do tal feito; e, não seguindo a parte a suspei-
ção, no tempo que lhe for assinado, o Inquisidor a quem for intentada a
suspeição será havido por não suspeito e procederá na causa.
E vindo com suspeição a um dos noüários ou a algum outro Oficial, os
Inquisidores serão Juízes das tais suspeições.
Das apelações

XXIII Todas as apelações de quaisquer agravos que as partes preten-


-
derem lhe serem feitos antes da sentença final, pelos Inquisidores, Comissrârios
ou pelos Ordinários, nas coisas pertencentes ao Santo Oficio, irão ao Inquisi-
dor-Geral ou ao conselho da Inquisigão, que pronunciará o que lhe parecer
justiça, segundo forma da bula da Santa Inquisição e os casos em que o
Promotor poderá apelar, se verão no Título VII, Capítulo VI, e no Título IV,
Capítulo XLVII.
)OilV Quando alguns Inquisidores começarem a proceder em alguma
-
coisa contra algum culpado que tiver preso, logo, com toda a brevidade que for
possível, das outras Inquisições, lhe mandarão as culpas, que contra o culpado
houver, com o crédito das testemuúas da Justiça" e idade delas; e não constan-
do, mandarão a informação que dela houver; nem se remeterá preso de uma
Inquisição a outra, salvo quando mandasse o Inquisidor-Geral outra coisa.
E assim enviarão os Inquisidores, de uma inquisigão a oufia, todas as
informações que parecer que podem aproveitar e os Inquisidores terão lembran-
gas que, tanto que alguns culpados desaparecerem dos lugares da suajurisdição,
logo o escrevam aos Inquisidores de outros distritos e lhes mandarão as culpas
dos tais culpados, com o crédito das testemuúas. E havendo perigo natardanç4
e não se podendo trasladar as ditas culpas, os Inquisidores lhes escreverão,
como tem culpas bastante para ser presa a dita pessoa, declarando-lhe os nomes
dos tais culpados, e ofïcios e modo de viver, fisionomia, idade e outros sinais

R IHGB, Rio de Janeiro, I 5 7 (392) : 6 I 5-69 I, jul./set. I 996.


RegimenÍo do Santo Ofuio 1613
-

e circunstâncias, por onde possam vir em conhecimento deles, para se poderem


prender.
E os Inquisidores a que for enviada a tal informação farão diligência em
seu distrito para ver se podem haver os tais culpados; e pela carta aos Inquisi-
dores os prenderão e tanto que forem presos, lhes enviarão todas as culpas que
tiverem deles, como dito é. E havendo informagão que em alguma das Inquisi-
ções há culpas contra alguns presos, se mandarão pedir as ditas culpas; e não
se achando, virá certidão autêntica" como se buscaram, contra o tal preso, e não
se acharam a qual seú assinada pelo Promotor, e Noüírio e se acostaní ao
processo do tal preso, e se não despachará sem ela.

E de umas Inquisições as outras, se mandará o rol dos culpados e presos,


que nelas houver; e, acabando o Auto da Fé, se lhes mandará a lista dos presos
que nele saíram.

Dos ausmtes

XXV Ausentando-se algumas pessoas, que sejam culpadas no crime


-
de heresia, e apostasia, achando os Inquisidores que podem ser convencidos
pelas provas, que contaeleshouvero requerimento dopromotor, farão sumário
de sua ausência, e se ausentarem com casa movida, ou se sabem onde residem,
ou se são crist2ios batizados e constando-lhe da dita ausência e que são cristãos
batizados e que não se sabe lugar certo onde estejam, ou que fora do Reino, em
parte onde não podem ser presos, nem citados, passarão Cartas citatórias de
editos em forma, confra os culpados, para que veúam alegar e dizer de da
Justiça e mostrar sua inocência dentro no termo que lhe for assinado, o qual irá
repartido por três termos iguais. E será os termos dos editos mais ou menos,
segundo a distlincia dos lugares onde se presume, ou deve presumir, que estão
as tais pessoas. E citarlo-ão para todos os termos e autos judiciais do processo,
até sentenga definitiva inclusive.

E no edito se declarará que dentro no dito termo veúam aparecer perante


eles, no juízo da Santa Inquisição, pessoalmente, a pedir perdão de suas culpas,
e responder sobre certos artigos tocantes à Fé e em certo delito de heresi4 e sob
pena de excomunhão, com suas admoestações em forma. Os quais editos e
citação se publicarão às portas da casadamorada onde soúam amorare habitar
os tais ausentes, notificando-se as pessoas de suas casas, se aí estiverem, e os
vizinhos mais conjuntos. E depois o tal dito será lido e publicado em um
domingo ou dia santo de guarda na igreja principal do tal lugar onde eram assim
vizinhos e moravam e tal edito se lerá à missa do dia" acabada a pregação ou
estação, em alta e intelegível voz, de modo que possa ser bem entendido dos
circunstantes e depois se fixará na porta principal da dita Igreja.

R IHGB, Rio de Janeiro, 157(392):615-691, jul./set. 1996.


Sônia Aparecida de Siqueira

E feita esta diligência, não aparecendo os réus ser-lhe-á acusada pelo


Promotor sua revelia, com todos os tennos no edito conteúdos, assim como
forem repartidos e serão pronunciados por excomungados, revéis e contumazes
e mandarão agravar suas censuÍas contra os réus, em forma procedendo contra
eles ordinariamente e farão seus processos, juridicamente formados até por
sentença serem declarados por hereges, segundo a prova legítima que das culpas
houver, sem lhes mais esperar e não lhe será dado defensor, visto sua contumá-
cia.
XXVI poderão os Inquisidores proceder conta os ausentes
- E tâmbém
por outra maneira, conforme a disposição do Cap. Cum contumâcia eharct.,
Liv. M, citando e admoestando os reuscomo dito é, que apareçÍrm a se defender
e dizer de suajustiça" sobre certos artigos tocantes à Fé, em certo delito de
heresia, sob pena excomunhão, com suas admoestações em forma. E se não
aparecerem, mandarão ao Promotor que acuse suas revelias; e, acusadas,
pronunciarão sobre sua contumácia e excomunhão, e passarão cartas em que
agravem suas censuras; e serão declarados pelos Inquisidores por excomunga-
dos em suas paróquias onde viveram. E se por espaço de um ano continuo
durarem em sua pertinácia e forem revéis, precedendo os ditos termos, os
declararão por hereges, em forma, passando o dito ano.
E os Inquisidores não se apressarão neste modo de proceder, porque as
pessoÍls ano se ausentem mais cedo, ou nõo tornem de suas ausências, salvo
quando coúecidamente for sabido que são fugidos para não tornarem à terr4
ou se foram com casa movida.
Dos defuntos
XXVII Achando os Inquisidores informações bastantes, por onde
-
pareça que algumas pessoas podem ser convencidas de heresia e se achar serem
falecidas, por informação bastante e serem cristlios batizados (a qual informa-
ção de testemuúas a requerimento do Promotor) os Inquisidores mandarão ao
dito Promotor, que se acuse, a fim de serem declarados por hereges e apóstatas
e que seus corpos e ossos sejam desenterrados e lançados das Igrejas e dos
cemitérios eclesiásticos e condenada sua memória e fama" declarando suas
fazendas a quem devem pertencer, segundo a Bula da Santa Inquisição. E para
a dita causa, citados os filhos, e quaisquer outros herdeiros dos defuntos
sobreditos, e todasas outras pessoas a que a causa sobredita tocar. E a tal citação
se fará pessoalmente aos filhos e herdeiros que são certos e presentes no lugar,
podendo ser havidos, e às outras pessoas por editos.
E será dada cópia da defensão aos ditos filhos e herdeiros ou em sua
ausênci4 não aparecendo, se procedeú à revelia. E quando os defuntos não
tiverem herdeiros que sejam citados, se lhes dará defensor ex-fficio. E feito o
processo, achando os Inquisidores o delito provado, condenarão o defunto,

636 RIHGB, Rio de Janeiro, 157(392):615-691, jul./set. 1996.


Regimento do Santo Ofrcio 16l j
-

como dito é, finalmente. E os Inquisidores terão maior consideração na prova


com que hão de parecer contra os defuntos, que seja mais bastante do que fora
sendo vivos, pois por si se não podem defender.
XXUII Os processos dos defuntos se determinarão finalmente, o mais
-
em breve que for possível e por nenhum caso se dilatarão pelos inconvenientes
que disso se seguem, especialmente em caso que o réu haja de ser absoluto, por
se não dilatarem os sufrágios d'alm4 nem se perderem os bens que esülo
depositados. E, assim, como se há de dar sentença contra os que se acharem
culpados, se pronunciará também e absowerá da instância do Juízo a memória
e fama daqueles que não tiverem prova inteira.
E a tal sentença absolutória da instância se lerá no auto público, para
satisfazer a infâmia em que ficaram, pelos editos que se puserem, e publicaram
conta eles. E não se levaní neste caso ao auto público sua estrâtuq nem merìos
se revelarão em particular os erros de que foram acusados, pois lhe não foram
provados.
E damesmamaneira-se deve fazer com os que pessoalmente foram presos,
e defuntos no cárcere, e absolutos da instância do Juízo.

De como se não hó de sobrestar no despacho dos


defuntos com esperança de mais prova
XXIX Quando os Inquisidores procederem conha alguns defuntos,
-
não sobrestarão no despacho de seus processos, por terem pouca prova contra
si, esperando que de novo lhe acÍ€sç4 salvo quando houver verossímil espe-
rança e a ocasião propicia de lhe acrescer a dita prova, pelos grandes inconve-
nientes que disso se seguem aos filhos e herdeiros dos ditos defuntos.
Dos defzmtos no cárcere
XXX Falecendo algum preso pelo crime de heresia no cárcere do
-
Santo Ofïcio, que tiver confessado suas culpas, devem seus filhos e herdeiros
ser citados, conforme a direito. Porém, parecendo aos Inquisidores que o dito
preso tem satisfeito plenamente, de tal maneira que lhes não possa competir
defesa alguma, neste caso não serão citados mas deste assento que os Inquisi-
dores tomarem darão conta ao Conselho Geral. E falecendo no dito ciárcere
algum preso que não esteja convencido no dito crime, seu processo se concluinár,
citando-se seus filhos e herdeiros ou não os tendo, dando-lhe defensor à causa;
e se dará nele sentença absolutória da instância, a qual será no auto público da
Fé; porque, como a prisão foi pública" convém o seja também a satisfação.
E estando para morrer algum preso no cárcere do Santo Ofïcio, que esteja
confidente, se lhe dará confessor que o absolva sacramentalmente, conforme o
estilo, e praticado, em todas as Inquisições; e depois se procederá até se dar
sentença final a qual se lerá no auto, na forma que ele merecer.

R IHGB, No de Janeiro, I 57 (392) : 6 I 5-69 l, jul./set. I 996. 637


Sônia Aparecida de Siqueira

Dos que matam por,suas próprias mãos


no carcere
XXXI Quando alguma pessoa, estando presa pelo crime de heresia" se
-
mataÍ por suas próprias mãos ou seja confidente ou negativa, os Inquisidores a
irão logo ver com dois Notrários e levarão o médico, e cirurgião para que se faça
o exame necessário em seu corpo e se procure saber se o mataram ou ela se
matou por si; e perguntarão aos companheiros e aos viziúos e ao Alcaide e aos
Guardas do cárcere, aos quais farão as perguntas necessiirias para se saber como
aconteceu a dita morte. E mandarão outrossim os inquisidores ao lugar onde o
defrrnto era morador a fazer diligência sobre o siso e a capacidade do tal defunto
e se teve alguma lesão, de que se pudesse causÍìx a dita morte.
E feitâs estas diligências, se correrá com o processo na forma dos mais
defuntos, como estrí dito.
Dos presos que endoideceram
no córcere
XXXII Se algum preso, ou seja confidente ou negativo, endoidecer no
-
cárcere, os Inquisidores farão todas as diligencias e exames necessários, assim
no cárcere, como no lugar onde era morador, para averiguar se a tal doidice é
verdadeira ou Íïngida e achando ser verdadeira, sobrestarão na causa quanto à
pena corporaln pois o furioso nãlo é capazdel4 e também pode acontecer, que
torne seu Juízo, e que ou se defenderá das culpas de que está testificado ou as
confessará e se reduzirá ao grêmio da Santa Madre Igreja. E quanto ao que se
toca à confiscação dafazenda, a causa correrá com seus herdeiros, que serão
para isso citados e em defeito deles se dará curador aos bens e se procederá até
final sentengq mas os Inquisidores não procederão com muita pressa na causa
dos bens e esperarão por algum tempo para ver se toma o tal preso a seu Juízo,
mandando-lhe fazer os oÍïcios necessiírios e em caso que paÍeça que o tal doido
deve ser solto, ou dedo sobre fi*çq virá o tal assento ao Conselho, para nele
se determinar o que se deva fazer.

De como o promotor há de apresentar


o libelo à parte
XX)ilI Sendo o réu negativo, pennanecendo em sua negativa, depois
-
de lhe serem feitas as perguntas, e admoestações que cumprir, estando aparte
em pé e requererá que seja recebida contra o réu e os inquisidores, visto seu
requerimento, admoestarão outra vez ao réu que confesse a verdade, porque lhe
aproveitará mais dizê-la antes da acusação, que depois e não querendo çonfes-
sar, receberão a dita acusação, e lhe darão juramento em forma, para que diga
a verdade e satisfaça a cada artigo e depois lhe mandarão ler e intimar a
acusação, pelo Notario, e o réu respondení a cada artigo por si e permanecendo

638 R IHGB, No de Janeiro, 157(392):615-691, jul./set. 1996.


Regimento do Santo O/ício I6l j
-

em sua negativa, lhe mandarão dar o traslado de sua acusação e, sendo mulher,
lhe será lida por algumas vezes, para lhe poder ficar na memóri4 e estar
informada e instruída da matéria de sua acusação. E logo mandarão ao preso,
que nomeie advogado, que o defenda; e aceitada a causa pelo procurador, feita
a solenidade do direito, e recebido juramento em forma perante o réu, como se
contém no título de seu ofïcio.
O réu estará com seu procurador, que lido o traslado de sua acusagão, o
exortará e aconselhará que confesse a verdade, e não diga o contrário dela, nem
confesse o que não tem feito; e querendo o réu confessar suÍls culpas, o
procurador o remeterá aos Inquisidores, sem lhes tomarem ouvir sua confissão,
nem estar presente a ela, nem se lhe dar ópia do que disser; e os Inquisidores
na Mesa receberão a confissão do dito preso; e, continuando o réu na sua
negativa o dito procurador lhe fará sua defesa e ao tempo que a fizer estará
presente um Notário, sendo possível, e estando ocupado, um Oficial do S.
Oficio, que paÍecer aos Inquisidores (o que também se fará as vezes que o
procurador estiver o réu); e o proourador apresentará a defesa e abonação do
dito réu, nomeando as testemuúas para prova delas aos Inquisidores.
Sobre o recebimento da defesa do réu
XXXIV E oferecida assim a dita defesa, com o haslado do libelo, os
-
Inquisidores pronunciarão que a recebem si et in quqrrtum, e que admitem as
partes a prova, salvo procedendo os Inquisidores que a dita defesa lhes deve ir
conclusa para verem se provada lhe aproveitarâatalcontrariedade, e poder-se
escusar de assinar dilação as partes, havendo consideração que no Júzo da
Inquisição, as inquirições são cerradas. E os Inquisidores darão ordem que as
tais testemunhas nomeadas pelo réu sejam em breve examinadas e recebidas
com sua qualidade, posto que não sejam omni exceptie maiores, para depois se
lhe dar crédito que se lhes deve dar. E pedindo a parte papel para fazer memória
de sua defesa, se lhe dará o que parecer aos Inquisidores, numeradas, e assinadas
todas as folhas peloNoüário; e disso se faráGrmo no processo, de quantas folhas
lhe deram e como as tornou; e todas as vezes que a parte quiser vir com artigos
de defesa, será admitid4 entendendo os inquisidores, que o não faz por malícia
e cautela.

o"u':#"ï,1'i;#;'"iïw;i,i"!r*'
XXXV Quando as partes disserem que não querem procurador, e
-
parecer aos Inquisidores que é o negócio de qualidade para lhe ser dado, sempre
lho darão, e mandarão que procure por eles e defenda suas causas, para que não
fiquem indefesos; e quando forem tão pobres que não tiverem por onde PaEü,
lhe mandarão satisfazer seu üabalho, à custa do diúeiro das despesas da
Inquisição.

R IHGB, Rio de Janeiro, 157(392):615-691, jul./set. 1996.


Sônia Aparecida de Siqueira

Das ratificações
XXXVI Pelo perigo que pode haver na falta da prova dajustiç4 sendo
-
as testemunhas da Justiça mortas ou ausentes, sem serem ratificadas, confor-
mando-nos com o estilo praticado no Santo Ofício, mandamos, que, tanto que
depuserem as testemuúas no Santo Oficio, contra alguma pessoa ou pessoas
se ratifiquem logo e assim o requererá o Promotor, sendo presentes à tal
ratificagão duas pessoas religiosas, que o direito requer; e bastará serem
Sacerdotes, pessoas honestas, e discretas, de boa consciência; as quais recebe-
rão juramento de terem segredo e fidelidade, negócio e caso do Santo Oficio,
paÍa que foram chamadas.
E, depois de assinar a testemunha seu testemunho, os Inquisidores, e
honestas pessoas, saída a testemuúa para foÍ4 perguntarão as ditas honestas
pessoÍrs, pelo juramento que tem recebido, se lhe parece que a dita testemuúa
falou a verdade no que testemuúou, segundo o modo e a maneira, com que lho
ouviram e viram dizer; e o que disserem escreverá o Notário e tudo será assinado
pelas ditas honestas pessoas e Inquisidores. E a mesma diligência se fará com
as testemunhas que de novo o Promotor nomeaÍ e apresentar, em favor e ajuda
de sua prova. E querendo o Promotor verjurar as testemunhas, as poderá ver
jurar; e, porém, não estará presente ao tempo de sua ratificação, pois é, parte,
como se diná no título que pertence ao ofïcio do Promotor.
E depois de assinados os ditos das testemuúas, se fará termo pelo Notiário,
em que se declare a variação, e o titubear das testemunhas, quando o caso
acontece com as mais circunstâncias que parecer, de falarem a verdade, ou o
contnário dela" para crédito que depois se lhe deve dar e este termo se assinará
pelo Inquisidor que estiver presente. E o Notrário declarará, na ratificação que
fizer, se o preso está doente, e o lugar em que se ratificq e se é no cárcere e o
porquê e se tem ferros, ou prisão apertada; e da mesma maneira se ratificarão
as testemunhas, quando se procede contra os casados duas vezes.

E os Inquisidores nomearão as pessoas eclesiásticas ou religiosas, de que


se teúa certa informação de sua geração, limpeza e costumes, os quais
mandarão chamar para assistirem às ditas ratificações. e parecendo aos Inqui-
sidores, que não haverá inconveniente em dilatar algum tempo a dita ratificação,
a farão quando lhes parecer. E o Notário que escreveu o testemuúo não poderá
ser honesta e religiosa pessoa, como no título dos Notrários se dirá, capítulo
XIil.
De como o procurador das partes há de nomear
as testemunhas para a prova de defesa

XXXUI Tanto que a defesa da parte for feita, o procurador nomeará


as testemuúas-paÍa a prova dela, as quais virão declaradas, e nomeadas por

640 RIHGB, Rio deJaneiro, 157(392):615-691, jul./set. 1996.


Regímento do Santo OJício 1613
-

seus nomes e sobrenomes, e ofïcios por vierem, e se têm raça de judeu, ou


mouros, de modo que se possa sahrquem são, e onderesideme astestemuúas
que a parte a pÍincípio, nomear, essas somente se perguntarão e examinarão,
para prova de sua defesa" salvo quando os Inquisidores, com justa caus4
paÍecerem que se deve permitir outra coisa. E os Inquisidores receberão as tais
testemunhas por si mesmo, provendo quanto for possível no excessivo número
delas, conforme a direito.
E os Inquisidores não irão por suas próprias pessoas perguntar testemuúas
a suas casas, antes as farão vir perante si; e acontecendo serem algumas pessoas
tão qualificadas, que não pudessem vir, em tal caso os Inquisidores, darão
ordem como se perguntem em uma igreja ou mosteiro, que mais conveniente
parecer: e havendo algum legítimo impedimento ou enfermidade, proverão
nisso, como lhes parecer que mais convém, para que as testemuúas sejam
perguntadas.

Das publicações

XXXUII Tanto que


se acabar de fazer a prova das partes, assim do
Promotor como -do réu, logo o Promotor requererá aos Inquisidores que façam
publicação dos ditos das testemuúas, e prova dada contra o réu, e mandem dar
cópia e traslado ao dito réu, calados os nomes das testemuúas, e todas as
circunstâncias por onde se possa vir em coúecimento delas, conforme a
disposição do direito e uso, e estilo do Santo Ofício da Inquisição, de maneira
que se não tire defesa à parte. E a isto responderão os Inquisidores, por auto
feito pelo Notiírio, que proverão no pedido pelo Promotor, conforme a direito
e prática do Santo Ofício. E os Inquisidores farão a dita publicação, tirando os
ditos das testemunhas ao longo, ainda que deseja de testemuúas mortas, ou
ausentes, que se não ratificaram, nem podem comodamente ratificar, nas quais
se dirá somente uma testemunha jurada, e outrosim das testemuúas da fama
do delito, sendo ratiÍïcadas a qual publicação se fará" calados os nomes das
testemuúas e as circunstâncias poronde as partes possam vir em coúecimento
delas, tendo respeito ao perigo e inconvenientes, não declarando na dita
publicação, o dia, mês e ano em que a testemunha testemuúou.
E todos os Inquisidores presentes assinarão a dita publicação; porém antes
de a faznr, admoestarão o réu, para que confesse suas culpas e diga toda a
verdade, e peça misericórdia, requerendo-lhe da parte de Nosso Senhor Jesus
Cristo, que a si, nem a outra pessoa alguma, levante falso testemuúo, porque
no Santo Oficio somente se quer saber a verdade, e não o contrário dela; e que
seja certo que a confissão que fizer antes da publicação lhe aproveitará em tudo,
mas que, sendo feita depois, e continuando e persistindo em sua negativa, lhe
farão a publicação dos ditos das testemuúas, como dito é, dando-lhe juramento
em forma, para que confesse a verdade e salve sua alma.

RIHGB, Rio de Janeiro, 157(392):615-691, jul./set. 1996. 641


Sônia Aparecida de Siqueira

E havendo-se de fazer ao réu publicação de mais um testemuúo da


Justiça, lhe sera lido pelo Notrírio cada testemunho, e capítulo dele por si, e o
réu responderá também a cada testemuúo, por si, e lhe mandará dar o traslado
da publicação assinada pelo Notário, ttraÃade verbo ad verbum, de publicação
que fizerem os Inquisidores o qual levanár, para cuidar das pessoas a que há de
por contraditas.

Das contraditas

XXXIX E depois de ser dado tempo bastante ao réu para cuidar de


suas
-
contraditas, virá à Mesa com o traslado da dita publicação, e os Inquisi-
dores dirão ao seu procurador o que há defazer; e se sairão pdraacasa de forq
onde o dito procurador, considerado o número das testemuúas, a graveza do
caso e a qualidade da prova, estando presente o Notário do Santo Oficio,
admoestará ao réu que confesse suas culpas e, não o fazendo, lhe dirá que lhe
cumpre vir com confaditas às testemuúas da Justiça e logo ali fará o procu-
rador, com a tarte, as contraditas, e as ordenará e taxani comunicando com a
parte as coisas que tem para contradizer os ditos e pessoas daquelas testemu-
nhas, que lhe parecerem que o condenam e testemuúam contra ele.

E não vindo logo com contraditas, podená vir com elas até a primeira ou
segundaaudiênci4 ou atéotempo que paÍeceraos inquisidores, posto que esteja
tomado assento em seu processo, considerados os termos a que chega a
evidência da sua malícia, para se lhe não conceder mais tempo e será de maneira
que o réu fique indefeso. E ao procuradornão ficarátraslado algum, nem minuta
da dita publicação, nem o levará para cas4 nem papel algum, nem lembrança
que pertença ao Santo Oficio, nem comunicará as ditas contraditas com pessoa
alguma e assim o jurará se cumprir: nem nomeará testemunhas para prova das
ditas contraditas, por cumprir assim ao segredo do Santo Oficio, pelo perigo
que disso se pode seguir e tudo o que houver de escrever, o fará no Santo Oficio
e este estilo se guardará em todas as Inquisições.

De como na mesa a parte só lai de nomear


as testemunhas dcts suas contraditas

XL E feitas as ditas contraditas, e apresentadas pelo réu, os Inquisido-


-
res o mandarão vir à Mesa, para que nomeie as testemunhas para prova de suas
contraditas, sem estâÍ pÍesente o seu procurador; e lhe serão lidas cada artigo
por si declaradamente e podená nomear, para prova de cada um deles, até seis
testemunhas, que sejam cristãos-velhos e que não sejam parentes do réu dentro
do quarto grau, nem familiares seus, nem pessoas infames, nem presos pelo
Santo Ofïcio.

R IHGB, Rio de Janeiro, I 5 7 (j92) : 6 I 5-69 l, jul./set. I 996.


Regimento do Santo OÍício I 6I 3
-

E, porém, sendo o caso de qualidade, que se não possa provar por outrasi
pessoas, e dizendo o réu com juramento, que não tem outras testemunhas, os
Inquisidores as admitirão, para lhes dar o crédito que se lhes deve dar e enquanto
for possível, não se receberá para prova das ditas contaditas peso algum da
nação dos crisülos-novos. E, sendo caso que os réus não se lembrem de dar
testemunhas, que sejam de receber, paÍa prova de algum artigo das ditas
contraditas, para que não fique indefeso, Os inquisidores terão cuidado de fazer
diligência, ex-fficio,nos ditos casos, fazendo de modo que não sejam pergun-
tadas pessoas, pelas quais veúa o réu a saber quem testemuúou contra ele.
Os Inquisidores, depois de nomeadas as ditas testemuúas pelo réu, lhe
farão perguntas, comjuramento, se depois de acontecer o que dizem em suasi
contraditas, se falava e comunicava com as testemunhas, ou iam uns à casa dos
outros e o que o réu disser se escreverá" pôr termo, no fim da dita nomeação de
testemunhas.

De como os inquisidores hão de procurar que não


nomeiem as partes testemunhas ausentes
XLI Os Inquisidores serão advertidos, para que se evitem as cautelas
e malacias- de que os réus costumam usar, que não nomeiem testemuúas
ausentes, para dilatar suas causas e alongá-las, de maneira que delas se não
possa conseguir cumprimento da Justiça, como se vê por experiência que tendo
os réus testemuúas presentes que podiam nomeÍìr para prova do contudo de
seus artigos, nomeiam testemunhas ausentes fora do Reino, e nas Ilhas e na
índia, para infuscar e deter seus negócios, para que não veúam à luz. E para
evitar isto, os inquisidores dirão mansamente às partes que nomeiem testemu-
nhas presentes e não ausentes, pois os artigos e as matérias deles são, de
qualidade que se podem provar por testemunhas presentes, avisando-os que,
fazendo o contriário se provará nisso, como for serviço de Nosso seúor, e boa
expedição do caso, conforme a direito; e se todavia, nomearem testemuúas
ausentes, afirmando não terem outras, se as testemunhas tais estão no distrito
dos mesmos Inquisidores, pergunta-lós-ão por si mesmos, ou sendo nomeadas
paÍa provaÍ as indiretas, quando o réu é acusado de guarda de sábados, e em
sua defesa diz que intende provar que igualmente trabalhava nos outros dias da
semana, sem fazer diferença aos dias de sábado de trabalho dos outros dias,
negando em efeito a guarda e observância deles, ou outra diligência grave, e de
importância e quando por si o não poderem fazer, cometerão a prova das
contraditas indiretas aos Comissários ou a quem lhes parecer, salvo quando o
caso fosse tilo grave e de tanta importância que se devam as testemunhas
examinar só pelos Inquisidores, ser ter respeito a ser longe, nem ao gasto que
houver de fazer e, neste caso, se consultará o inquisidor-Geral, para mandar que
um Deputado de confiança vífaz.er esta diligência.

R IHGB, Rio de Janeiro, 157(392):615-691,ju\./set. 1996.


Sônia Aparecida de Siqueira

Das contraditas que se hão de receber


XLII Quanto as contraditas, acertando o réu nas testemuúas que o
-
culpam, apontar-la-ão os inquisidores e mandarão prover que as tais testemu-
nhas do réu, contra fuão, e fuão, testemuúas dajustiça, sejam examinadas pelas
contraditas contra elas postas e os Inquisidores as receberão, com suas quali-
dades, ainda que não sejam de inimizades capitais, nem de todo desfaçam o dito
das testemuúas, e as examinarão por si e, estando fora do seu distrito, enviarão
sua carta requisitória aos Inquisidores da Inquisição onde residem as tais
testemunhas, paraque as examinem com o segredo cosfumado, e se enviam em
forma.
E estando as testemunhas fora do Reino, enviarão sua carta precatória em
forma aos Inquisidores do distrito onde residem as tais testemunhas, ou ao
Ordinrârio, quando não há ali Inquisidores apostólicos e isto se faná, sem que a
parte o sinta, e, portanto, não depositará então diúeiro, nem em semelhantes
casos, antes se farão as tais diligências por conta do diúeiro das despesas da
Inquisição, e depois em final se arrecadarâdaparte,e por seus bens, e fazend4
salvo quando o tesoureiro da inquisição tiver dinheiro da dita parte, porque dele
se farão e pegarão todas as diligências que se ftzerem por sua parte.
E, não podendo os Inquisidores examinar por si as ditas testemunhas, que
est2[ono seu distrito, cometerão o dito exame aos Comissários, que as tirariio
na forma acima dita e os Inquisidores lhes mandarão as advertências que forem
necessárias.

De como o recebimento das contraditas


se não publicará à parte
XLIII Quando a matéria das contraditas for relevante, os Inquisidores
-
a receberão por despacho, que não será publicado à parte, posto que somente
se recebem alguns dos artigos delas, pelo réu não vi em conhecimento das
testemuúas e não recebidas as contraditas, se publicará este despacho à parte,
para poder apelar se quiser.
E parecendo que se hâ de fazer alguma diligê ncia ex-officio, sobre algumas
contraditas que não receberam, o tal assento se não porá por despacho, nem por
quota à margem, mas se fará um termo, por Ìrm dos Noüários, em que se
declarem os artigos, sobre que se há de fazer a diligência" e a causa que há para
isso; o que se não publicará,àparte.
E sendo cÍìso que o réu tenha vindo muitas vezes com contraditas, pare-
cendo aos Inquisidores, que ele, maliciosaÍnente e com cautela, quer vir com
outros de novo, os Inquisidores o ouvirão na Mesa, e saberão o que alega para
sua defesa e vendo que lhe importa o que requer, e toca as testemunhas, o
admitirão a elasn e de outra maneira não.

R IHGB, No de Janeiro, I 57 (392) :6I 5-69 I, jul./set. I 996.


Regimento do Santo OJício 161 3
-

De como se hão de aceitar os papéis que se oferecem


de fora para defesa das partes, e a diligencia que
se lul de fazer sobre eles ex-officio

XLIV Vindo alguma pessoa conjunta" ou não conjunta" apresentar


-
alguns papéis, ou rol de testemuúas na Mesa do Santo OÍício, para defesa de
alguma pessoa, os Inquisidores os aceitarão, para fazer diligência ex-officio
sobre eles, informando-se de algumas pessoas de crédito da vizinhanç4 com
muito segredo e cautela, que não sejam as testemunhas nomeadas pelas partes,
que se presume estarem subornadas, para por este modo se saber a verdade das
causasde inimizades, que se alegarem; noque sehaverãocom muito resguardo.

Das contraditas que se não hão de receber,


e de como as pütes hão deficar citadas
p ara oon ir em s ent enç a rtnal

XLV Não acertando o réu em suas contraditas com as testemuúas da


Justiç4 os -Inquisidores as não admitirão, como está dito; e em tal caso terão
muita vigilância, e especial cuidado de se informarem da qualidade das teste-
muúas, convém a saber, de fama e reputação delas e do modo de sua vida, e
tráfego e consciência e se, por ventura, pode haver algumas inimizades entre
eles ou não, de maneira que possa constar, se falam verdade no que testemu-
nharam e acabando estas diligências, a causa se concluirii e ficarão as partes
citadas para ouvirem sentença final.

E escusar-se-á dar vista às partes paraarrazoaÍem e, porém, bem poderá o


procurador ao tal tempo da conclusão, affazoü brevemente, por sua parte,
alegando o que lhe parecer, mas somente lhe será dado vista do libelo e traslado
das publicações de que já houve vista, e o mesmo poderá fazs o Promotor da
Inquisição.

De cotno, e com que pessoas, se hão de despachar


os processos, e de como há de ser requerido o
ordinário primeiro, e do assento que se há
defazer nos autos disso

XLVI Os Inquisidores despacharão os processos, com os deputados


-
que, para isso, forem nomeados e providos pelo Inquisidor-Geral, os quais não
serão menos de cinco, requerendo primeiro o Ordinário, outendo suacomissão
de que se fará assento nos autos; e se relatará no fim do assento a pessoa que
assistiu em seu nome; e os que despacharem não levarão feitos, nem papéis de
lembrança para cÍìsa e farão no despacho o mais que no título dos Inquisidores,
Capítulo XXI dos Inquisidores se contém.

R IHGB, Rio de Janeíro, I 5 7 (392) : 6 I 5-69 I, jul./set. I 996. 645


Sônia Aparecida de Siqueira

Do tormento
XLVII Quando parecer que o réu deve posto a tormento, por ter contra
-
si indícios bastante, os Inquisidores e Deputados estejam advertidos que não
votem no que depois do tormento se há de determinar na causa, confessando
ou negando, mas declararão no assento o tormento que se deve dar, e dirão que
de novo se torne aveÍ,pata conforme ao que suceder, lhe ser dada a pena que
por direito merecer. E no mesmo assento declarará o gênero de tormento que
se há de dar e se há de ser esperto, ou não, e quantos tratos há de haver.
E, querendo o Ordinário assistir ao dito tormento, o poderá fazer, e assim
lho dirão os Inquisidores; e não vindo, nem mandado, os ditos Inquisidores
farão a diligência do tormento, como até agora fizerem.

Da publicação da sentença do tormento,


que se lui de fazer ò parte, na mesd,
estando o promotor presente
XLVru Depois de estar tomado o assento, que se dê tormento ao réu,
-
os Inquisidores o mandarão chamar à Mesa e, estando presente o Promotor do
Santo Oficio, se lhe notificará e publicará a sentença do tormento; e não
apelando nenhuma das partes, nem pedindo tempo para deliberar, se dará logo
a dita sentença à execução, sem esperar os dez dias.

De como serd despachada a pessoa que confessar


no tormento e ratificar sua confissão

XLIX Sendo alguma pessoa julgada, que se poúa


a tormento, con-
fessando no -tal tormento suas culpas, e ratificando sua confissão, até o terceiro
depois do tormento, será convencida e despachada como confidente, conforme
os termos de sua confissão; e estando sempre negativa, se parecer aos inquisi
dores, Ordinários e Deputados, que a suspeita e a infâmia não estão compurga-
das pelo tormento, será o réu penitenciado pela tal suspeita, segundo a forma
do direito, atentando sempre remediar com a penitência a dita suspeita e
infïimia; e abjurará de veemente, ou de leve, como parecer aos Inquisidores; e
o condenarão em outras penas e penitências, que lhes parecer, regulando-as
conforme a qualidade da pessoa do réu, culpas e indícios que contra ele houver,
segundo a disposição do Direito.
Da revogação antes da ratificação
L E confessando o réu no fim do tormento e revogando sua conÍissão,
-
antes de ser ratificada, depois de vinte e quatro horas, parecendo aos Inquisi-
dores que se deve repetir o tormento, o dito réu será perguntado, acusado pelo
novo indício da revogação , para alegar sua defesa se a tiver; e depois será visto

646 R IHGB, Rio de Janeiro, I 5 7 (392) : 6 I 5-69 I, jul./set. I 996.


Regimento do Santo Ofrcio 1613
-

o processo, paÍa se juntaÍ se há de ser repetido o tormento ou não; porém, em


caso que o réu confesse antes de lhe ser dado o tormento em que estiá condenado
e revogue sua confissão antes de ser ratificado, nesse caso, não será acusado
pela dita revogagão, por quanto estiio ainda em pé os indícios pelos quais lhe
estava mandado dar o tal tormento, e esses bastam, com a revogação, para lhe
ser repetido o tormento.
E o que revogou sua confissão no tormento, e nela persistiu, abjurará de
veemente ou de leve, e será condenado nas mais penas e penitências, como no
Cap. I atrás estiâ dito. E todas as vezes que sobrevierem novos indícios ao réu
e parecer aos Inquisidores que se deve tornar a repetir o tormento, considerando
a qualidade da pessoa do réu e culpas e não estrí suficientemente atormentado
com as mais circunstÍincias que no caso puderem haver, poderão tornar a repetir
o tormento, conformando-se com a disposição do direito.

De quando se luá de sobre estm no tormento

LI Quando se tormento a alguma pessoa que esteja negativ4 confes-


-
sando perfeitamente o delito no tormento, e dizendo da crença em form4 e o
tempo que lhe durou, dando autor de seu erro, e dizendo de alguns cúmplices,
e coisas que parecem verossímeis, posto que, no tal tempo, não satisfaça as
testemuúas da Justiça, nem diga delas se sobrestará no tormento, com parecer
dos Inquisidores e Deputados presentes, porque como a diminuição do dito réu
é dúvida que se há de ver e determinar por todos os votos, e Ordinário, se deve
reservar para se ver em Mesa.
E no dito tormento se escreverão todas as admoestações, comunicações e
negociações de consideração, o que o preso disser, e se lhe fizer, porque depois
conste o modo por que o dito réu confessou e para se saber o crédito que se
deve dar à sua confissão. E, confessando o réu no tormento, os Inquisidores
serão advertidos que não poúam o tal confidente com pessoa que lhe faça
revogaÍ sua confissão, mas com quem lhe possa aconselhar o que convém à sua
alma.
De quando se pode pôr a tormento, in cap.
alienum, aparte que estárelmada
à Justiça Secular

LII Sendo o réu negativo, e convencido pela prova da Jusüça e tendo


-
muitos cúmplices do mesmo delito, posto que haja ser relaxado à Justiça
Secular, poderá ser posto a tormento in capítulo alienum;e em caso que vença
o tormento (que se lhe não dá para que confesse suas próprias culpas, pois estão
legitimamente provadas) não o relevará da pena da relaxação, não confessando
e pedindo misericórdia, porque quando a pedir se guardará o que o Direito
dispõe.

R IHGB, Rio de Janeiro, 157(j92):615-691, jul,/set. 1996.


Sônia Aparecida de Siqueira

Mas os Inquisidores devem muito considerar quando se deve dar o tal


tormento, porque se não dará senão em casos particulares, como em um
dogmatista, que tem ensinado e pervertido muita gente, ou pessoa de que se
espeÍe muito grande fruto. E na sentença do tormento se declarará causa dele,
de tal maneira que o réu entenda que é atormentado como testemunha, e não
como parte e que se faz sem prejuízo do provado pelas testemuúas da Justiça;
e havendo votos do tormento nos ditos processos, se consultará o Conselho.

Daforma que se há de ter nos


qssentos emfinal

LIII Nos assentos em que se tomar final determinação, sempre se


-
escreverão os fundamentos, as causas e as razões que se coligirem dos autos,
porque se fundaram e antes que se tomar conclusão em um processo, não se
passará, nem entenderá em outro despacho, sem primeiro o dito assento ser
escrito e assinado pelos Inquisidores e Deputados que foram no despacho; os
quais assinarão todos, ainda que sejam em contrário paÍecer, vencendo-se a
determinação pela maior parte.
E ao tempo do votar em final, os Inquisidores e Deputados, no fim do
assento, declararão o tempo em que o réu cometeu o delito e dirão se esüá
provado por testemuúas, se por confissão da parte, ou por ambos e do que
constar do assento, se dará certidão ao juiz do Fisco, quando a pedir. E nas
sentenças onde houver tormento, se não dirá a circunstância por onde se declare
que foi dado ao réu, nem menos se declaraná, quando houverjejuns no cárcere
do Santo Oficio, que o réu não confessa o lugar onde se frzeram e o mesmo se
farános libelos e nas publicações que lhe derem, e perguntas que se lhe fizerem.
Dos processos avocados ao conselho geral

LIV Tratando-se de algum caso de substancia, tão dificultoso, que os


-
Inquisidores, Ordinário e Deputados, não possam tomar resolução nele, ou por
ficarem, os votos iguais, ou por não haver conformidade na maior parte dos
votos, ou sendo o caso em si üio duvidoso, ou tão grave e de tal qualidade que
deve ser visto no Conselho, posto que seja vencido pela maior parte dos votos,
nos ditos casos, enviarão os inquisidores o processo ao Conselho Geral com a
relação da duvida que há, por escrito, bem declarada e com os fundamentos e
as razões dos votos para no caso de prover, como for justiça, e servido de Deus
Nosso Senhor. E o mesmo se fará nos feitos dos relaxados à Justiga Secular,
antes de se dar execução neles, ainda que a relaxação seja por um só voto.

E nos processos dos heresiarcas e dogmatistas. E nos processos dos que


judaizaram no cárcere, posto que pareça que não estão provadas as cerimônias
ou daqueles que cometeram outras culpas no cárcere, posto que não sejam de

648 R IHGB, Rio de Janeiro, I 5 7 (39 2) : 6 I 5 -69 I, jul./set. I 996.


Regimento do Santo O/ício 161j
-

matéria de henesia. E nos processos dos que confessam, depois que tem assento
de relorados, posto que os tais sejam recebidos depois do assento, em todos os
feitos do pecado nefando, depois de sentenciados. E nos feitos dos cristiÍos-
velhos, que disseram não estar na Hóstia consagrada o Corpo de Cristo Nosso
Seúor, tão perfeitamente, como estiá nos Céus.
E em todos os processos das pessoas, que pelo Regimento do Conselho, se
não podem prender, sem consultar o Inquisidor-Geral, ou o mesmo Conselho,
que os clérigos, religiosos de qualquer ordem, Fidalgos, pessoas de qualidade,
mercadores muito ricos, e notáveis e em todos os ditos casos serão enviados os
ditos processos ao Conselho Geral, com o assento que neles se tomar, e
fundamentos e razões dos votos.

E da mesma maneira, irão ao Conselho todos os processos e negócios que


a ele hajam vindo, antes de se tomar neles final determinação. E, assim, os mais
que neste Regimento se declararão. E isto se entenderá nas Inquisições deste
Reino, porque na Índia se guardará a ordem que tem dado os Inquisidores-Ge-
rais.

Do preso que confessa depois de ser acusado

LV Quando alguma pessoa, presa pelo crime de heresia e apostasi4


depois de-acusada, se vier reconciliar, e confessar todos os seus heréticos etïos,
ou cerimônias judaicas, que tem feitas, e assim que sabe de outras pessoas,
fazendo confissão inteira, sem encobrir coisa alguma em tal maneira que os
Inquisidores, seggndo seu parecer e alvedrio, conheçam e presumam que se
converte à qossa Santa Fé Católica, devem receber a reconciliação em form4
com hábito e cárcere perpétuo e a penitência e o castigo que por suas culpas
merecer, será mais rigoroso, que daqueles que não foram presos, nem acusados,
salvo se aos ditos Inquisidores, juntamente com o Ordinrário, respeitando à
contição e o arrependimento do penitente, e qualidade de sua confissão, por
ser rnuito satisfatória, lhes parecer que se deve de dispensar na pena e penitência
do cárcere perpétuo, e hábito penitencial, porque, em tal caso, o dito ciârcere,
hábito e dispensa dele, ficará ao arbítrio dos inquisidores.

E nisto poderá haver assim mesmo lugar, considerando o modo com que
o penitente faz sua confissão, e sinal de sua conversão e arrependimento e
declaração das culpas que fez, e dos culpados no mesmo crime, e especialmente
se confessa" tanto que for preso, nas próprias sessões, ou depois, sendo-lhe lida
sua acusação. E quando a confissão do dito réu não merecer o tal favor, será
condenado em ciárcere perpétuo, e se poráno assento, que, passado certo tempo,
se lembre ao Inquisidor Geral para que dispense no cárcere perpétuo.

R IHGB, Rio de Janeiro, 157(392):615-691, jul./set. 1996.


Sônia Aparecida de Siqueira

De qwndo se darão os presos sobrefiança


LVI Os que forem condenados judicialmente por suspeitos na Fé,
-
sendo a suspeita de veemente, serão penitenciados, com suas abjurações
públicas em form4 com tempo de cárcere, ou metidos em mosteiros, onde
façam penitência, impondo-lhes se parecer, penas pecuniiárias, para as despesas
da Inquisição, segundo a qualidade das suas culpas e das pessoas, contanto que
não excedam a terça parte de seus bens. E assim lhes serão impostas penitências
espirituais e lhe mandarão que ougam pregagões e se confessem e comunguem
as tnês Páscoas do ano com confessores que os doutrinem e ensinem nas coisas
da Fé.

E os Inquisidores não poderão dar sobre fiança a neúum preso no cárcere


do Santo Oficio e concorrendo tais causaso que pareça que convém dar-se, se
consultará primeiro o Inquisidor-Geral, e em sua ausência o Conselho e
somente aos que andarem soltos poderão, com causa dar sobre fiança.

Das penas e penitências que os inquisidores


imporão às pessoas que abjurarem delevi,
suspeitas dafé

LVII Os Inquisidores poderão dar em fiança os condenados de levi


-
suspeitos, de maneira sobredita no capítulo atnis, havendo causa; e farão suas
abjurações os de leve suspeitos, publicamente, ou na audiência do Santo Oficio,
presentes os oficiais dele, a arbítrio dos Inquisidores, havendo respeito à
qualidade da suspeita, e ser suspeito a cerca de muitos ou poucos, ou houver
escândalo. E aos que assim abjurarem no Santo Ofício, poderão imporpenitên-
cias espirituais, mandando-lhes que ouçam, em domingos e dias de festa, a
missa do dia" com círio ou tocha, na forma costumada" havendo respeito à
qualidade das culpas.

E os inquisidores poderão impor aos de /evi suspeitos, penas pecuniárias,


com a moderação que lhes parecer, quando os atos forem provados ou confes-
sados, como são blasËmias, casados duas vezes, palavras heréticas e em oufuos
casos semelhantes e não sendo provados, ou confessados, como dito é, pare-
cendo aos inquisidores que lhes devem ser postas, irá o feito ao Conselho e
acontecendo que, depois de penitenciados, sobrevenham aos que abjuram de
veemente suspeito, ou de levi, provas de novo, nos tais casos, ora sejam das
mesmas culpas, ou de outras, sendo a prova suficiente contra os tais, os
Inquisidores procederão contra eles, sem embargo das sentenças que precede-
ram e as provas da primeira instância se juntarão as da segunda, e por elas se
julgará.

R IHGB, No de Janeiro, I 5 7 (392) : 6 I 5-69 I, jul./set. I 996.


Regitnento do Santo O/ício 1613
-

De como os inquisidores não poderão dar emrtqnça


algurnas pessoas culpadas no crime de heresia,
senão com ocasião de alguma gronde doença
e do livro dasfianças que há de se haver.

tvm - Os Inquisidores não poderão dar em fiança neúum culpado do


crime de heresia, como acima está dito, sem licenga do Inquisidor-Geral, porém,
acontecendo que algum preso adoeça de alguma doença muito perigos4 fazen-
do-se primeiro diligênciadatal doença e perigo, e parecendo que notavelmente
e sem dúvida corre risco sua vida, e que se não pode a tal enfermidade curar,
estando no cárcere, o poderão dar em fiança para uma casa segura, e sem
suspeita, dando primeiro conta ao Inquisidor-Geral ou ao Conselho. E as fianças
se tomarão e receberão na forma costumada, segundo a qualidade do caso e as
penas delas se aplicarão sempre ordinariamente para as despesas do Santo
Ofïcio e paÍa estas fianças se fará um Liwo, numeradas as folhas e assinadas
pelos Inquisidores, o qual estará no secreto, como está dito no Título I, Capítulo
vm.
De como se há de relmar o preso que tem
contra si prova bastante que diga
quefoi eé cristão

LIX Sendo alguma pessoa presa acusad4 e persistindo em sua nega-


-
tiva, ate sentenga final, afirmando e confessando a Fé católica, e que sempre
foi e é cristão, e que é inocente, e condenado injustamente, sendo o delito contra
o réu cumpridamente provado, o poderão os Inquisidores declarar e condenar
por herege, pois juridicamente consta do delito de que é acusado, e o réu não
satisfaz como deve, para que com ele se possa usar de misericórdia, pois não
confessa. E, porém, em tal caso, devem os Inquisidores muito atentasse advertir
nisso e se for necessiírio reperguntar as testemunhas que contra o réu há, e
torná-las a examinar, o farão, procurando de saber muito miudamente que
pessoas são, informando-se de outras testemunhas de crédito, a cerca da fama"
costumes e coincidência das testemunhas da Justiça, inquirindo e esquadriúa-
do se as tais testemunhas, ou seu pai, ou sua mãe, ascendentes e descendentes,
e outros parentes e pessoas a que tivessem muita afeição, tenham ou hajam tido

I inimizade com o réu.


I E, assim, mesmo se informarão se por algum ódio secreto ou malquerença"
È
ou sendo as tais testemuúas corrompidas por dádivas ou promessas, testemu-
nharam contra o réu. E feita essa diligência, com as mais que lhe parecer que
: cumpre, se lhes constar que as testemunhas falam verdade contra o réu, em tal
t caso, farão os inquisidores o que for justiça, conformando-se com o Direito e
a Bula do Santo Oficio.
i
R IHGB, Rio de Janeiro, I 5 7 (392) : 6 I 5-69 I, jul./set. I 996. 651
Sônia Aparecida de Siqueira

Da notficação que se lui defazer por múo aos que


estão relmados, assim por maus confidentes,
como por negativos corwencidos
LX Quando algum culpado não for recebido a reconciliação, por ser
-
mau confidente, em tal caso os inquisidores lhe farão saber, por auto que seu
processo e confissões se viram por letrados tementes a Deus, e vistas suas más
confissões, contadições e repugnânci4 não se recebe sua reconciliagão, por
suas confissões não serem verdadeiras, nem satisfatórias, e serem fingidas e
simuladas, requerendo-lhe que confesse a verdade. E quando o tal réu for
omnino negativo, lhe dirão em efeito o mesmo, fazendo-lhe a saber que pelas
testemunhas, e prova que contra ele há, consta estar convencido no crime de
heresia, e pronunciado por herege pertinaz e negativo, portanto, o admoestam
que descarregue sua consciência" poÍque, satisfazendo, se possa com ele usar
de misericórdi4 que a Santa Madre Igreja outorga e concede aos que verdadei-
ramente se convertem a ela.

Da notificação que se faz aos relmados, três dias


antes que sefaça o auto dafé

LXI Tanto que algum culpado for relaxado por sentença à Cúria
-
Secular, além de se fazer diligência que se contem no capítulo LX atrás, três
dias antes que se faça o Auto da Fé, lhe mandarão notificar, por um Notrário do
Santo Ofïcio, que os Inquisidores ordenarem, como ele por suas culpas está
rela:<ado ao braço secular, que dispoúa sua alm4 e que olhe o que lhe cumpre
a sua consciênci4 e se confesse e encomende a Nosso Senhor, para que o
encamiúe ao conhecimento da verdade, e lhe tire a cegueira que tem em seu
entendimento, fazendoJhe as mais admoestações que forem necessiírias para
o caso.
E se cumprir que esta admoestação lhe faça pessoa de que o réu teúa
confiança que lhe falará verdade aceitaaele,lhafará4 e o confessor estará diante
para logo o consolar e estar com ele, indo primeiro instruído das coisas que lhe
hâ de dner paÍa sua salvação, e do estado em o réu estrí e dai em diante terá o
confessor cuidado de comunicar o tal penitente, e sempre persuadindo-lhe, e
induzindo-o com santas palavras, para que confesse a verdade e o Alcaide tená
especial cuidado de olhar por ele, de maneira que não aconteça algum perigo.
E a tal notificação se fará por auto e parecendo que o penitente não crê
inteiramente ser relaxado, e que isso dá causa a não dispor também sua I
consciência, em tal caso, o çonfessor o notificará aos inquisidores, paÍa lhe ser 1

lida e publicada sua própria sentença, de modo que, sendo desenganado de sua
condenação, faça o que convém para sua salvação. E quando parecer que é
necessário ler-se a sentença, será à véspera do Auto, para evita.'perigos e

R IHGB, Rio de Janeiro, 157(392):615-691, jul./set. 1996.


Regimento do Santo OÍício 1613
-

inconvenientes, que da mais dilação poderão acontecer, cometendo isto do


tempo ao arbítrio dos Inquisidores, se lhes parecer que outra coisa convém; e
daí em diante se terá grande vigilância na guarda dos tais presos.
Dos culpados que pedem perdão de suas culpas,
até sentença definitiva, qntes de serem
relaxados em auto público
LXII Pedindo alguns culpados perdão de suas culpas, até sentença
definitiva -inclusive, antes de serem relaxados em Auto público à Justiça
Secular, satisfazendo como devem, e de Direito se requer, vindo com puro
coragão manifestando todos seus heréticos erïos e cúmplices, de modo que os
Inquisidores conheçam, e lhes pareça que sua conversão não é assimilada, neste
caso serão recebidos a reconciliação, pelos inquisidores e Ordinrário, posto que
sejam heresiarcas. E estes que assim vierem serão muito bem examinados nos
sinais que mostrarem de sua verdadeira contrição, de modo que tenham os
Inquisidores bom conceito e esperança de sua conversão. E quando o réu
i confessar suas culpas, e pedir delas perdão, depois da notificação que se lhe
faz, três dias antes do Auto, como se contém no capífulo precedente, os
inquisidores examinarão em mesa, com os Deputados, as ditas confissões.
E parecendo à maior parte dos votos que o réu fique no cárcere, o poderão
reservar, para depois serem examinadas suas confissões, pelos sinais e circuns-
tâncias que em tais autos se requer. E com os tais reservados poderão correr os
Inquisidores, chamando-os à mesa, todas as vezes que for necessário, mandan-
do-os acusar pelas diminuições e faltas de suas confissões, e despachando-os
em fïnal. E maior exame se terá com aqueles que se converterem depois de
sentenciados, pela presunção maior que já têm contra si, que contra os outros
e segundo suas satisfações, serão recebidas suas reconciliações, com suÍls penas
e penitências, e quando parecer que os sobreditos confidentes, a que foi
notificado que estavam entregues à Justiça Secular, sejam recebidos a reconci-
liação, serão admitidos, com abjuração pública e com cárcere e hábito peniten-
cial perpétuo, e sem remissão. E levarão ao Auto o dito hábito, diferenciado
com fogos e serão condenados nos anos de galés, que parecer, conforme a
EÍaveza de suas culpas, além das outras penas em Direito estabelecidas contra
os semelhantes, conforme a Bula da inquisição. E as ditas insignes de fogo
levarão somente aqueles a que foi notificado que estavam entregues à Justiça
Secular.

Do que se há defazer, quando algumrelmado queira


confessar suas culpas, estando no cadafalso,
antes de lhe ser lida sua sentença

LKII Acontecendo que algum réu negativo queira confessar suas


-
culpas, depois de estar no cadafalso, antes de lhe lida sua sentença de relaxação,
F

RIHGB, Rio de Janeiro, 157(392):615-691, jul./set. 1996.


Sônia Aparecida de Siqueíra

pedindo perdão deles, os Inquisidores o ouviÍão e lhe mandarão tomar sua


confissão e a examinarão com o ordinário e Deputados, no mesmo cadafalso,
em lugar secreto e parecendo a maior parte dos votos que se deve sobrestar na
execução, poderão reservar os tais confidentes, para depois serem examinadas
suas confissões, como estrá dito. E estando presente no Auto o Inquisidor Geral,
os inquisidores lhe darão conta do assento que nisso se tomar.
E, porém, esta reserva dos que confessam depois de estarem no cadafalso
se fará raramente e com muita consideração, e por causas urgentíssimas, pela
grande e violenta presunção que há do réu fazer a dita confissão com medo da
morte e depois de ver e saber as pessoas que no dito Auto vão confidentes, que
podiam dizer dele, e não se converter de puro coração à Fé. E quando se hatar
desta reserva, na maior parte que vencer, entrarii pelo menos, o voto de um dos
Inquisidores.

Do rol que se fui


de fazer, um dia antes do auto,
pma boa ordem e regimento da procissão
LXIV Um dia antes que se faça o Auto da Fé, os inquisidores manda-
río fazer um- rolde todas as pessoas que hão de sair nele e a cada pessoa se
acrescentará o Familiar, ou Oficial, que há de levar, para que ao dia seguinte
pela manhã se chame o dito Familiar, e lhe seja entregue.

De como as sentenços dos relmados


hão de ser publicadas no auto,
depois das dos reconciliados

LXV No Auto da Fé não se publicarão as sentengas dos relaxados, até


-
não serem publicadas as sentenças dos que se receberem a reconciliagão; e
depois se lerão as sentenças dos relaxados, e se entregarão, para que neles se
faça execução, sem mais dilação, cum protecione Juris e ultimamente se lerá a
sentenga dos livros defesos e se queimarão publicamente os proibidos, que irão
de trais dos relaxados.

De como as justiças seculares hão de acompanhar no dia do auto


os penitentes, e hão de o.ssistir no cadafalso, no tempo
que lheforem entregues os hereges
e os traslados das sentenças

LXW Quando se fzer o Auto da Fé, a Justiga Secular acompanhará


-
os penitentes e pessoas que se houverem de relaxar, que irão por sua ordem e
as Justiças estarão presentes, no cadafalso, no tempo que lhe forem rela:rados
os hereges e juntamente se lhes entregarão, com os traslados das sentengas
próprias, assinadas pelos Inquisidores, e seladas com o selo do Santo Ofïcio.

R IHGB, Rio de Jarciro, I 5 7 (392) : 6 I 5-69 I, jul./set. I 996.


Regimento do Santo Ofcio 1613
-

De como se hão de tornar os penitentes em procissão,


como saiam, ao córcere da inquisição, e do modo
dos sambenitos que hao de trazer
LXVII Acabado de se celebrar o Auto da Fé, os penitentes e reconci-
-
liados se tornarão em procissão, como foram ao cárcere da Inquisigão, para que
os Inquisidores dêem ordem e entendam no mais que se deve prover acerca dos
tais penitentes. E os reconciliados mandarão prover de sambenitos de pano
amarelo, com faixas de pano vermelho, postos em aspa, para que os tragaÍn,
assim como levaram ao Auto, e em suas sentengas de reconciliação se contém.
E os hábitos que os relaxados à Curia Secular levarem ao cadafalso se porão
com seus nomes, como é de costume, pendurados na Igreja principal, ou em
um mosteiro, que mais cumprir e paÍecer que é mais conveniente, para que
sejam vistos de todos, e de tal maneira postos, que claramente se possa ler.

De como os inquisidores não dispensarão nas penas


dados aos culpados depois de serem já postas
LXVIil Os Inquisidores não dispensarão nas penas que forem dadas
-
aos culpados, assim do cárcere, como de outras, depois de serem já postas nos
penitentes, e nos penitenciados a cárcere e hábito, a arbítio dos Inquisidores;
e se guardará o que no Capítulo LX deste título esüá ordenado.
Do que o inquisidor geral devefazer nas comutações
das penas e penitëncias dos reconciliados

LXIX Quando algum reconciliado pelo crime de heresia e apostasia


-
ou penitenciado, e condenado em quaisquer penas, pedir ao Inquisidor-Geral
que lhe comute o cárcere, e hábito penitencial, e outras penas e penitências
espirituais, tomará primeiro informação dos Inquisidores, extensamente, de
mérito dos processos e das culpas do tal reconciliado, e quanto tempo há que
cumpre sua penitência" e com que humildade e sinais de contrição e se cumpriu
inteiramente o que lhe foi mandado pela sentença de sua reconciliação para que
tudo visto pelo inquisidor Geral, faça o que lhe parecerjustiça, e o que convém
ao serviço de Nosso Senhor.
Da lícença que os inquisidores poderão dar aos
reconciliados pobres, que estiverem
no cárcere da penitencia
LXX Depois dos reconciliados estarem no cárcere da penitênci4
-
sendo homens pobres, e querendo ir trabalhar, ou buscar de comer pela cidade,
os Inquisidores lhe poderão dar licença para saírem do dito cátcere, contanto
que tornem a dormir nele. Quando forem e vierem, levarão seu hábito peniten-
cial publicamente. E nos domingos e dias santos de guard4 irão juntos a ouvir

R IHGB, Rio de Janeiro, I 5 7 (392) : 6 I 5-69 I, jul./set. I 996.


Sônia Aparecida de Siqueira

missa do dia e pregagão à Igreja onde os Inquisidores ordenarem. E o Alcaide


e o Guarda do dito cárcere da penitência acompaúarão nestes dias os peniten-
tes, e assim os Familiares que parecer aos Inquisidores os quais Inquisidores
-
verão se a tal reclusão há de ser continua por alguns dias e proverão nisso, como
lhes parecer mais serviço de Deus.

De como os penitenciados, depois de estarem bem instruídos


nas coisas dafé, hão de ir cumprir o luibito perpétuo
às suas terras; e das penas que terão, sendo
achados sem hábitos penitenciais.

LX)([ Depois dos peniúenciados estarem suficientemente instruídos


-
nas coisas da Fé e nas mais que pertencem à salvação de sua alm4 e terem sadio
do cárcere da penitência, os Inquisidores lhes mandarão que vão cumprir o
carcere e hábito perpétuo, em que foram condenados, a suas proprias terras,
onde moravam no tempo em que foram presos. E parecendo que se deve
dispensar, com algum particular, por causasjustas e urgentes, os ditos inquisi-
dores, vistas as circunstâncias, ordenarão o que lhe paÍecer que mais convém
a sua salvação, tendo respeito e se haver de dar satisfação, onde são coúecidos
por hereges, com as boas mostras de sua conversão e penitência.
E os penitenciados, que andarem cumprindo suas penitências, e as não
cumprirem como devem, ou forem achados sem elas, sendo nas Cidades onde
houver Inquisição, pela primeira vez serão repreendidos à Mesa, e se fará disso
termo, assinado por eles em seus processos, para se procederno caso, conforme
a sua importância e os inquisidores darão ordem para que haja Familiares, ou
pessoas, que vigiem os ditos penitenciados. E sendo achado algum penitenciado
sem hábito , e fora do lugar que lhe est.á assinado por cárcere, não tendo licença
em escrito, perderáos vestidos, ou acoisacom que trouxercoberto o dito hábito.
E as Justiças Seculares, achando os ditos penitenciados sem as ditas
penitências, os poderão prender, e deles fazer autos, paÍa os mandarem aos
inquisidores, que lhes julgarão os ditos vestidos. E, achando alguns Oficiais e
Familiares os ditos penitenciados sem hábito, os poderão prender e levar aos
inquisidores, que lhes julgarão os ditos vestidos.
rÍruro v
Dos inquisidores
De como hão de ser conformes os inquisidores,
e o que hão defazer não o sendo

I Os Inquisidores trabalharão sempre de serem conformes, quando for


- em todas as coisas que houverem de fazer tocantes ao Santo Ofício
possível,
da Inquisigão, sem consideração de outro respeito humano, senão de servir a

656 R IHGB, Rio de Janeiro, 157(392):615-69l,jul.het. 1996.


I

Regimento do Santo Ofrcio 1613


-

Nosso Seúor e sendo diferentes, enviarão relação do caso, bem declarada, com
seu parecer e fundamentos, ao Inquisidor-Geral, ou ao conselho da Inquisição,
para se determinar o que for justiça, conforme o que estiá assentado no Título
IV, Capífulo LW, e se alguma diferença particular entre eles nascer, não se
podendo concordar, o terão em segredo, e farão a saber ao Inquisidor Geral,
para que o remedeie como vir que convém, a bem do Santo OÍïcio, e segredo
dele.
O que se entenderá nas Inquisições deste Reino; porque nas de fora dele,
não se concordando os Inquisidores entre si, chamarão os Deputados, e os
assentará o que se determinar pelos mais votos, como estrá dito no dito Capítulo
Lry.
De como os inquisidores não hão de on'ir rogos sobre
presos, nem dar audiências em sucts ccrsas
II Os Inquisidores não ouvirão rogos de pessoas algumas, sobre pre-
-
sos, e coisas tocantes e pertencentes ao Santo Ofício da Inquisição, nem em
suas casas darão audiência, nem ouvirão outros requerentes, nem outra pessoa
alguma que por eles requerer e mansamente lhe dirão que vão à casa de
despacho da Inquisição, onde comumente residem os inquisidores, e ali serão
ouvidos, e lhes será feito inteiro cumprimento de justiç4 e o mesmo cumprirão
os deputados do Santo Ofïcio.
Das pessocrs a que os Inquisidores hão de mandar dar
cadeira de espaldas, vindo à Mesa, e da proibição
de se tomarem recados de fora nela
m Os Inquisidores guardarão em tudo a autoridade que se deve ao
tribunal -do S. Oficio, tratando as pessoas que vierem à Mesa, conforme a
qualidade delas, e com boas palavras e somente mandarão dar cadeiras de
espaldas às seguintes pessoas, a saber:
Dignidades, Cônegos de Sé, ou Igejas Colegiadas, Provisores, Vigários e
Desembargadores dos Prelados e Relações Eclesirásticas, Priores de Conventos
ou Colégio, ou Abades ou Religiosos, ou Priores ou Abades de Igrejas Paro-
quias, Fidalgos, Desembargadores, Corregedores, Juízes, Ouvidores, Vereado-
res ou Cidadãos das Cidades ou do governo de Vilas noúveis, Doutores ou
Licenciados por Universidade, e Bacharéis formados pelas Universidades
aprovadas ou aos que têm privilégio de Desembargadores, aos Secretários
d'El-Rei, escrivão da fazenda da Comarca" assim d'El-Rei, como das Cidades,
ou Vilas notiâveis ou pessoas nobres, e por tais conhecidas. E as mais pessoas
darão cadeira rasa.
E não consentirão que pessoa alguma entre na Casa do Despacho a dar
recados de fora, a eles, ou Deputados, ou a outros Oficiais nem farão negócio

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Sônia Aparecida de Siqueira

algum na Mesa, que não seja da mesma Casa. E sucedendo caso que seja muito
necessário, poderá cada uma das ditas pessoas sair à casa de fora tomar o tal
recado.

Do bom tratamento que os inquisidores


hão defazer aos presos.

IV Os Inquisidores se haverão com os pÍìesos humanamente, tratando-


-
os conforme a qualidade de suas pessoas, guardando com eles a autoridade
conveniente, não lhe dando ocasião a que se descompoúam, nem tratarão com
eles mateira algum4 fora de suas culpas.

Do caderno que coda urn dos Inquisidores lui de ter, para bom
expediente do ministério do Santo Ofuio

V Encomendamos muito aos Inquisidores, que cada um deles teúa


-
um caderno, em que sumariamente escreva os nomes dos presos, o dia em que
foram trazidos ao cárcere, e em que lhe foram feitas as sessões, libelos e
publicações, e os mais termos judiciais e suas confissões, para melhor lembran-
ga dos negócios, e do que neles devem fazer, quando alguma coisa lhes faltar,
e logo como entrarem na Mes4 chamarão o Alcaide e ouvirão os presos que
pedirem audiência, e chamarão os mais que forem necessários, para os exami-
narem e conerem com eles, fazendo as mais diligências que convém.

De como o Inquisidor mais antigo lui defcaer as audiências


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quiserem avisar de alguma coisa

VI Mandamos que nas audiências ordinárias que se faz.emaospresos,


-
não fale senão o Inquisidor mais antigo ou o que de consentimento de todos
começar afazer asessão e o oubo Inquisidor ou Inquisidores e Deputados, que
estiverem presentes, estarão no tal tempo calados, ouvindo com atenção as
perguntas que se fizerem e as respostas que a elas derem os ditos presos; e
entendendo os ditos Inquisidores, ou Deputados, ser necessfuio advertir-se de
alguma cois4 o farão por escrito, dissimuladamente, ao Inquisidor que fizer
audiência, e de outra maneira não.

E, porém, quando os presos forem chamados à mesa em despacho final,


cada um deles poderá perguntar o que lhe parecer para sua satisfação e, neste
tempo e em todo o mais que estiverem à Mes4 mandamos que haja nas práticas
que tiverem, muita modéstia e gravidade, como convém atal lugar e entre tais
pessoas e oficios.

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Regimento do Santo Ofício 1613
-

De como se hão de mandar censurar os proposições,


e de como o assento que sobre elas se tomar
há de ir ao Conselho

VII parecer necessiírio aos Inquisidores mandar censuraÍ


- Quandoo poderão fazer;e depois verão o caso, com os Deputados,
alguma proposição,
juntamente com as qualificações e com o que parecer, virão ao Conselho, antes
de se dar à execução o tal assento, para nele se determinar o que for mais serviço
de Nosso Seúor.

De como os Inquísidores hão de proceder contra os culpados


no crime da sodomia, de qualquer qualidade que sejam,
até serem entregues à Justiçu Secular e de como o
Ordinório será chamado para o despacho deles
VIII Os Inquisidores conhecerão do pecado nefando de sodomia e
procederão- contra culpados de qualquer grau, preeminência e qualidade que
sejam, posto que exemplos, ou Religiosos, no modo e na forma como se procede
no crime de heresia e apostasia, despachando-os com os Deputadcis e conde-
nando-os nas penas que lhes paÍecer, e ainda nas que, pela ordenação deste
Reino, estão contra os semelhantes estabelecidas, até serem entreguès à Justiça
Secular, conforme ao Breve de Sua Santidade e Provisão do Cardeal Dom
Henrique que sobre este caso passou e se ratificarão as testemuúas em form4
fazendo-se publicagão delas, calados os nomes. E paratais casos será chamado
o Ordinário, e os culpados irão ao Auto da Fé, salvo quando parecer ao
Inquisidor-Geral que convém dar nisto outra ordem, conformando-se com o
que Sua Santidade tem ordenado.
E mandamos aos Inquisidores e Visitadores do Santo Ofício, que por
nenhum caso, aceitem denunciação contra pessoa alguma, que haja cometido
pecado bestial, ou de molícies, salvo quando tratando do pecado nefando,
incidentemente lhes for denunciado tais delitos, nem do clérigo que dormir com
sua filha espiritual, fora dois termos do Breve sobre os solicitantes, do que no
capítulo adiante se fará menção.
De como os Inquisidores procederão contra os que solicitam
os ou as penitentes no ato da confissão
t
IX da mesma maneira poderão conhecer os Inquisidores e Visitadores
-
do Santo Oficio dos Clérigos que solicitarem as penitentes, no ato da confissão
sacramental, conforme o Breve de Sua Santidade, que também por ele estiâ
declarando compreender os que solicitam pessoas de gênero masculino no dito
da confissão sacramental, pela suspeita que contra ela resulta de sentirem mal
do sacramento da penitência e os poderão condenar nas penas que lhes parecer,

I R IHGB, Rio de Janeiro, I 5 7 (392) : 6 I 5-69 I, jul./set. I 996.

Í
I
Sônia Aparecida de Siqueira

confonne a qualidade das culpas que cometeram, e da pessoa do delinqüente,


e mais circunstâncias que no cÍnio houver, conformando-se com o Direito.
Caderno de lembranças em que se hão de tomar as
dentfuicias que não parecerem verossímeis,
por se não tomarem em Livro
X Vindo alguma pessoa denunciar contra algum culpado de crime
-
pertencente ao Santo Oficio do qual depõem ao costume, maiormente quando
o que diz não parece verossímil e há conjecturas de falsidade, os Inquisidores
não tomarão em Liwo a tal denúncia, principalmente quando o denunciado for
pessoa notável, e de qualidade; mas se escreverá em um caderno de lembrang4
para se fazer diligência no caso, e se ver se o denunciante fala verdade, ou há
confra a dita pessoa oufua semelhantes informações.
De como se hão defazer diligências de genealogia à pessoa
que o Ordinário nomear, para assistir nos feitos em que
hódevotor; edalembrançaque os Inquisidores
hão defazer ao Inquisidor-Geral, sobre, sobre os
Ordinários não prenderem por culpas
pertencentes ao Santo Oficio
XI Quando o Ordinário nomear alguma pessoa para assistir nos feitos
em que -ele, conforme a Direito há de ser chamado, não sendo algum dos
Inquisidores, ou Deputados, os Inquisidores o farão a saber ao Inquisidor-Geral,
ou ao Conselho, para mandar nisso o que lhe parecer, e se lhe fazer informação
de sua genealogia, conforme o estilo. E os inquisidores terão cuidado de fazer
lembrança ao Inquisidor-Geral, para que escreva aos Ordinrários, que não
prendam pessoa alguma por culpas pertencentes ao Santo Ofïcio, sem primeiro
ofazer saber aos Inquisidores, e lhes mandarem as culpas, para se fazerem as
diligências necessárias, e se perguntârem as referidas, antes da prisão, salvo
havendo perigo na tardança. E os inquisidores verão as culpas que vierem dos
Ordinrários, naMesa, com os Deputados, e se pronunciará logo nelas e não sendo
de mateira que pertença à Inquisição, as remeterão aos mesmos Ordinrârios.
De como os Inquisidores hão de mandar escrever todos
os sinais de penitencia, ou impenitência, que os
presos derem, quando são examinados
)il - Os Inquisidores estejam advertidos que, ao tempo que examina-
rem os presos acerca de suas culpas, mandem escrever nos autos todos os sinais
que tiverem de sua boa conversão, penitência, e todas as coisas que para isso
servirem, assim as que fizerem pelo réu como contra ele, e se pediu perdão de
suas culpas com lágrimas para que os deputados, ao tempo do despacho, vejam
sua impenitênci4 ou boa conversão, e se sua confissão é verdadeira, ou fingida

R IHGB, Rio de Janeiro, 157(392):615-691, jul./set. 1996.


Regimento do Santo Oficio I 61 3
-

e Írs perguntas que fizerem aos confidentes, e pertinazes serão mais a fim de
lhes salvar as almas, que as vidas, atendendo às suas consciências, e ao Direito,
como está dito no Capítulo VIII, do Título IV.
De como o Notario hó de escrever todas as perguntas
e respostas que se fizerem aos presos

XIII Quando os Inquisidores fizerem alguma pergunta ao réu, o No-


-
üário a escreverá, a letra, e formalmente como foi feita a proposta, e não se
contentará com dizer: <<perguntando, respondeu, etc.>> E assim mesmo escreverá
tudo o que o réu responder; porque, não se fazendo assim, seria causa de muita
confusão, e não se poderia bem entender o que se perguntou ao réu, nem se o
que ele responde é a propósito da pergunt4 nem se satisfaz a el4 ou não e isto
se guardará, assim no exame do réu, como no das testemuúas.

Do que se devefazer quando algum judeu


de sinal vier a estes Reinos

XIV acontecer que a alguma Cidade ou Vila deste Reino vier


algum judeu - deQuando
sinal, os inquisidores o mandarão chamar, e o admoestarão do
que deve fazer, e lhe darão um guarda que o acompanhe, que seja pessoa de
confiança, o qual não consentirá que comunique com mais pessoas que as
necesstirias para seus negócios, e o fará recolher como for noite, e haverá sobre
isso vigia; e este guarda será um dos familiares, ao qual pagará o que lhe taxarem
os Inquisidores; e cadajudeu trará seu guarda, e não poderá andar sem chapéu
amarelo.
Da informação que hó de tomar sobre osfilhos menores
dos reconciliados, e relaxados
XV Os Inquisidores se informarão dos filhos dos relaxados e reconci-
-
liados, menores de catorze anos, assim de sua pobreza, como do estado em que
estão, para os rnandarem doutrinar, e darem disso conta ao Inquisidor-Geral, e
ao Conselho o que se cumprirá com efeito, sem embargo de não se fazer até
agofa.
Livro que se hd defazer para pôr em rol todos os livros
defesos que se recolherem na Inquisição
XVI Mandamos que os livros que houverem de ficar na inquisição,
por se não- poderem ter sem licença, ou para se emendarem, se escrevam, e
lancem em receita, em um livro que para isso se fará no qual se declare cujos
são, com as mais confrontações necessárias; e nele se fará a descatga, e entrega
que deles se fizer a seus donos e será Escrivão desta receita um Solicitador e
haverâ casa particular para os tais livros e a chave da dita casa terão os
Inquisidores e os livros que houverem de irpara fora do Reino, os Inquisidores

RIHGB, Rio de Janeiro, 157(392):615-691, jul./set. 1996. 66t


Sônia Aparecida de Siqueira

os revejam e, não havendo Inquisidores, o ordinário os reverá ao que os


Inquisidores darão ordem.
Editos que se hão de publicm sobre os moços estrangeiros
que víeram viver nestes Reinos

XVII Pela freqüência que há de moços esfiangeiros, assim nesta


-
Cidade, como nas mais partes marítimas, onde costumam seus pais trazê-los
ou mandá-los ensinar ordenamos que haja muita vigilância" para que os amos
sejam pessoas de confiança, porque importa serem bem insfruídos. Pelo que os
Inquisidores passarão logo editos, que se publiquem nas pregações e estagões
nas Igrejas desta Cidade, e mais lugares marítimos principais, que neúuma
pesso4 sob grave pena recolha em sua casa moços estrangeiros, sem o fazer
saber na Mesa da Inquisição. E os que já tiverem alguns sem esta diligência" o
façam logo saber aos Inquisidores do seu distrito, os quais úerão muito tento
que não sejam enhegues a pessoas suspeitas e quando os entregarem, mandarão
que indo-se os tais moços de suas casas, o venham fazer a saber na Mesa do
Santo OÍIcio e estes editos se mandarão notificar cada ano uma vez.

Darelação e lista que os Inquisidores hão de mandar, de toda


as pessoas que despachmam, ao Inquisidor- Geral,
e como lui de ser

XVIII Quando os Inquisidores mandarem ao Inquisidor-Geral a rela-


-
ção das pessoas que despacharam, ou que hão de ir ao Auto, declarem o nome
de cada pessoa, de que nação e geração é, de que idade, se solteiro, se casado,
que ofïcio tem, donde é natural e morador, por que culpas foi preso e em que
dia enüou no cárcere, quantas testemuúas tem contra si, e a qualidade delas,
se confessou suÍrs culpas, e em que termos do seu processo as começou a
confessar, e como foi recebido, e se as negou e foi acusado, e como foi
condenado, e que penitências espirituais, penas corporais e pecunirírias lhe
impuseram, declarando a qualidade e quantidade delas. E, no assento de cada
processo, se porá que foi ordinário. E seÉo obrigados mandar ao Inquisidor-
Geral, no Íim de cada um ano, um rol dos processos, que nele se despacharem,
e dos que ficam, e em que termos ficam, para se saber o que no dito ano se fez.

Carta que se há de escrever aos Inquisidores de Castella,


sobre os presos ou delatos portugueses,
que Ió estiverem

)fl Os inquisidores escrevam às Inquisições de Castell4 que lhes


-
mandem relatório dos portugueses que lá estiverem presos, culpados ou sen-
tenciados, para que, se nas Inquisigões deste reino se prenderem alguns deles,
lhes mandem buscar as culpas e que para o mesmo se ofereçam aos de Castella.

RIHGB, No de Janeiro, 157(392):615-691, jul./set. 1996.


Regimento do Santo Ofrcio 1613
-

Do curador ad litem que se há de dar aos


tnenores de vinte e cinco mtos
XX Sendo o réu menor de vinte e cinco anos, constando de sua
-
menoridade os Inquisidores o proverão de Curador ad litem, informajuris, o
qual Curador sení a pessoa que parecer mais conveniente aos Inquisidores e se
fará termo da Curadoria, em form4 no princípio do processo do menor e o
Curador assinaná todas as sessões que se fizesse, com o menor, sendo-lhe
primeiro lidas.

Daforma que se hó de ter nas admoestações


dos relapsos e sodomitas

XXI Os Inquisidores serão advertidos, fizerem admoes- que quando


tações aos-presos por relapsi4 lhe não prometam misericórdi4 e somente os
admoestem que digam a verdade e descarreguem sua consciência, porque assim
lhes convém para a salvação de sua alma e o mesmo se guardará quando forem
pÍesos pelo pecado nefando de sodomia.

De como lui de tornar segunda vez ao Conselho o processo


que láfoi, tomando-se nele outro assento

XXII Quando algum processo vier ao Conselho Geral, e nele se tomar


-
algum assento, se depois do dito asse,nto do Conselho lhe acresceralgumacoisa
de novo, assim da prova da Justiça, como da confissão das partes, os inquisi-
dores tornarão a ver o que mais acresceu, e se fará segundo assento e com isso
tornará ao mesmo Conselho, com os autos, para nele se dar última determina-
ção.

O que se lui defazer quando o Tesoureiro da Inquisição


disser que não tem dinheiro para os presos
X)üII o tesoureiro da Inquisição disser que não tem diúeiro
- Quando
para os presos, e que é necessário pedi-lo, os Inquisidores verão os livros e
recensearão as contas, paÍa ver se tem diúeiro ou não e se é necessiário pedi-lo.

Que os Deputados não venham à Mes;a,


s enão quando forem chamados

XXIV Os Inquisidores não consentirão que os Deputados veúam à


-
Mesa, senão quando forem chamados para despacho, nem lhes cometerão
negócios alguns, nem substanciar algum processo, sem particular comissão
para isso do Inquisidor-Geral.

R IHGB, No de Janeiro, I 5 7 (392) : 6 I 5-69 I, jul./set. I 996.


Sônia Aparecida de Siqueira

Para se ler no princípio do despacho geral


XXV Os Inquisidores, tanto que se começar o despacho geral dos
-
processos, que se não fará sem licença do Inquisidor-Geral e com cinco voúos,
conforme o Cap. XLVI, Tít. IV, todos os dias despacharão e avisarão os
Deputados que não faltem nas horas ordinárias. E no tempo que despacharem,
não ocuparão as horas em práticas fora do negócio de que se tratar, e vindo
algum Deputado, depois de começado o feito, se lhe não tomará a repetir, nem
votará no tal processo, salvo quando por outra via tiver pleniária informação do
caso. E o Inquisidor que ler, não interromperá o que for lendo.
E os Deputados terão seus cadernos, em que escrevarn os méritos da causa
e, em quanto um votar, os outros terão silêncio e estarão atentos aos votos que
se derem, e não falarão uns aos outros. E antes de se escrever o assento, poderá
cada um alterar seu voto. E tanto que se acabar de votar, se escreverá logo na
Mesa o parecer e assento que nos feitos se tomar e se assinará pelos votos que
estiveram presentes, sem se dilatar para outra mesa.
E parecendo que o caso é t?io duvidoso, que é necessiário vê-lo em casa,
ficará para outro dia. E depois de acabado o despacho, logo os Inquisidores
enviarão ao Inquisidor-Geral a lista dos processos despachados, com a resolu-
ção necessiíria de cada um, assim das culpas, como das sentenças, conforme o
que está declarado no Cap. XWII deste título. E damesma maneira, mandarão
ao Conselho Geral todos os feitos, que a ele são avocados, para nele se
despacharem, conforme o que se dispõe no Tít.IV, Cap. LIV.
O que se luÍ defazer sobre os pessoas que andam em tetas
de mouros e ìnfiéis e lhes levam ormas,
mantimentos e mercadorias
XXVI Os inquisidores terão cuidado de saber se algumas pessoas que
-
têm professado a Fé Católica vão à terra de hereges, moúos ou-infiéis e se
deixam lá andar, sem causa e lhes levam ou mandam armas, mantimentos ou
mercadorias, que os Sagrados cânones e a Bula da Ceia do Senhor defendem e
castigam com graves penas e censuras, pois o fazem em prejuízo de nossa Santa
Fé católica, e religião cristã, em favor dos ditos mouros e infiéis, e de sua
maldita seita. Pelo em cada ano, passarão seus editos em forma, com pena de
excomuúão, ipsofato incurrenda, a todos os que souberem que alguma pessoa
está compreendida em cada uma das ditas culpas, ou deu favor, conselho, ou
ajuda a isso, para que, dentro em certo termo, que lhes sená assinado, venham
denunciar o que souberem e se proceder contra os culpados, como forjustiça.
E os ditos editos serão publicados nas pregações e estações das Igrejas e
dos Mosteiros desta Cidade, e dos lugares marítimos principais, em um domin-
go ou dia santo de guarda, e se passará certidão do dia em que foi publicado.

RIHGB, Rio de Janeiro, 157(i92):615-691, jul./set. 1996.


Regimento do Santo Olício I6l3
-

Conta que se hó de tomar ao Despenseiro


de seis em seis meses
XXVII Os Inquisidores ordenarão uma pessoa que lhes parecer, tome
-
conta do despenseiro, cada seis meses, e de relação do que achar e enquanto
der cont4 não servirá e, entretanto, os ditos Inquisidores proverão que sirva
quem lhes parecer. E mandamos aos Inquisidores que teúam muito cuidado
de vigiar e ver se aos presos se dão os mantimentos bem acondicionados, e por
suajusta valia, peso e medida; porquanto nestas coisas há muitas faltas que os
presos padecem: e achando que o Despenseiro excede o modo, o repreenderão
e admoestarão e disso se fará termo, assinado por ele, e fazendo o que não deve,
darão disso conta ao Inquisidor-Geral, para prover no caso, como lhe paÍecer.

Quanto se hó de dar por dia a cada Inquisidor e Deputado,


que for fazer diligências fora da Cidade
onde reside o Santo Oficio
XXWII Quando os Inquisidores forem, por mandado do Inquisidor-
-
Geral, fazer alguma diligência fora da Cidade onde reside o Santo Oficio, se
lhes pagarão cada dia, por andar em serviço da Inquisição, dois cruzados e aos
Deputados se darão seis tostões, o que pagará o tesoureiro, do diúeiro das
despesas da Inquisigão, não havendo outra ordem do Inquisidor-Geral.

Edito que se IuÍ de publicar cada ano


sobre os livros defesos
X)(IX Os Inquisidores, uma vez cada ano, mandarão publicar edito
-
em forma, sobre os livros proibidos, em que brevemente se declare a todas e
quaisquer pessoas, de qualquer estado, qualidade e condição que sejam, que
souberem, por qualquer via que seja, de alguns livros suspeitos e prejudiciais
à Religião Cristii e defesos pelo caüálogo dos livros proibidos, os entegue ao
Santo Ofïcio da Inquisição, estando em se poder e sendo de ouhas pessoas, logo
denunciem secretamente, ante ele, para nisso se prover como parecer serviço
deNosso Seúor.
De como os revedores hão de visitar as livrarias
ordinariamente, e do que os Priores e Cunais
hão de fazer, quando moTTerem nas sucts
paróquias algans Letrados
XXX para livros defesos e proibidos, que os livreiros
- Eem suasatalhar
têm, e vendem
aos
tendas, mandamos aos Revedores do Santo Oficio das
Inquisições deste Reino, que visitem ordinariamente as livrarias, como manda
o concílio tridentino, assim as dos sobreditos, como as dos defuntos do que os
inquisidores terão especial cuidado, os quais mandarão aos priores e Curas, em

R IHGB, Rio de Janeiro, 157(j92): 615-691, jul./set. 1996.


Sônia Aparecida de Siqueira

cujas freguesias falecerem alguns Letrados, que lho façam logo saber, ou aos
ditos Revedores, para que se faça rol dos livros de defunto, e se não vendam os
que forem defesos.

Dapena que tem os livreiros de mandarem buscar livros


fora deste Reino, sem ordem dos Revedores
XXXI
- Ereino,
livros fora deste
outrasim, mandamos que nenhum livreiro mande buscar
sem primeiro mostrar ao revedor o rol dos livros que
manda buscar, sob pena de quatro mil réis, pagos da cadeia, para os presos
pobres da Inquisição. E este capítulo se lhes notificará por um dos Solicitadores
e da notificação passará certidão, que se daná ao secreüário do Conselho Geral,
para constar do sobredito.

De uma carta da Congregação da Inquisição de Roma


em que manda que os Inquisidores privativamente
conheçam do crime dos que casam duas vezes

XXXII Os Inquisidores coúecerilo do crime dos que se casam segun-


-
davez, sendo viva primeira mulher, ou marido, pela suspeita que conüa eles
resulta de sentirem mal do sacramento do mafrimônio, sem embargo dos
ordinários se quererem intometer no conhecimento dele; por quanto Sua
Santidade tem determinado que o câso pertence aos Inquisidores privativamen-
te e assim o mandou, por carta da Congregação da Inquisição, em que ele
assistiu, que está no Secreto do Conselho Geral.

L ivr o e m,i,:i:ffi::#fr;"H:#'::;:e cuni ór i as

XX)üI Os Inquisidores darão ordem que se façaum Livro particular,


-
que sirva somente de receita por lembrança., no qual se langarão todas as
condenações pecuniárias que se fizerem, de um Auto a outro, conforme os
assentos dos processos de todos os que foram condenados, que os inquisidores
proverão. E se fará adição de cada pessoa em particular e da quantia de diúeiro
que houver de pagar e, assim, como forem pegando, se declarará à margem
como tem pago.

E o mesmo se fará pela mesma ordem, por outro título apariado, de todo o
dinheiro das comutações e dispensas das penitências que no dito tempo houver,
com as mesmas adições feitas de cada pessoa em particular, e da quantia do
dinheiro que há de pagar que em todo o tempo conste se ficou coisa por receber,
e se arrecade as quais receitas serão assinadas pelos Inquisidores e por elas
tomanâ depois conta ao tesoureiro da Inquisição.

R IHGB, Rio de Jarciro, I 5 7 (392) : 6 I 5-69 I, jul./set. I 996.


t
Regimento do Santo Ofuio I 61 3
-

rÍruro vr
Das coisas que tocam os Inquisidores
e Oficiais da Inquisição em geral

Que não lnjam dois parentes oficiois na Inquisição e trajo


que hão de trazer, e o tempo que se podem ausentar
do serviço dela, e quem lhes hi de ds licença

I- Em neúuma Inquisição se porá Inquisidor ou Oficial, que seja


parente de outro oficial da mesma Inquisição. E todos trarão hábito decente, e
se porão em toda a honestidade e não conversarão com pessoas suspeitas, nem
se ausentarão de seus oficios, sem nossa expressa licenga e, porém, não sendo
nós presente, os Inquisidores poderiío dar licença aos ditos Oficiais da Santa
Inquisição para poderem ir fora, somente oito dias, constando-lhe que terá
necessidade disso, e parecendo-lhe que ao tal tempo não padecerá em detrimen-
to do Santo Oficio com sua ausência. E os Inquisidores não poderão dar licença
aos ditos oficiais, em um ano, paÍa poderem ser ausentes, mais que vinte dias,
ou juntos, ou interpolados, ficando a Casa provida" o que também se entenderá
nos Deputados que tem ordenado. E havendo algum oficial ou qualquer oufuo
ministro, de ir à Corte, o não fará sem expressa licença do Inquisidor-Geral.

Que se não escmtdalizemna Mesa os presos, e pessoas


que vierem a ela requerer suajustiça

II Os Inquisidores e Oficiais do Santo Oficio sempre terão muito tento


-
que não escandalizem com sua palavra aos presos, nem a outas algumas
pessoas, que requeiram suajustiça perante eles, nem dêem a entender as partes,
nem a seus requerentes, direta ou indiretamente, que o despacho que se requer
depende do outro Inquisidor seu coleg4 e nem dele e disto terão especial
cuidado, por assim cumprir a serviço de Nosso Seúor, e segredo do Ofício da
Inquisição.

O que se há defazer havendo alguma discorrida entre


os Oficiais do Sonto Oficio

ru Entre os Oficiais e Minishos do Santo Ofïcio, haverá muita paz e


-
concórdia e havendo alguma disconida entrè eles, os Inquisidores trabalharão,
quanto for possível, por remediar a tal discórdia e, não se aquietando com as
admoestações que lhes forem feitas, os inquisidores avisarão ao Inquisidor-Ge-
ral para que proveja com o remédio que convém em tal caso: e o mesmo se fará
quando forem inquietos, murmuradores, negligentes em seu oficio, ou insufi-
cientes e inábeis, para os cargos que servirem.

IHGB, RiodeJaneiro,157(392):615-69l,jul./set.1996.
^

,
Sônia Aparecida de Siqueira

Os dias, as horas e os tempos em que hão de assistir


na Mesa os Inquisidores e mais Oficiais
ry Os Inquisidores, e mais Oficiais da Santa Inquisição, virão cada
di4 -
os dias que não forem de guarda, à Casa do Despacho da Santa Inquisição
a saber, de quinze dias de março ate quinze dias de setembro, pela manhã às
sete horas, e estarão até às dez e depois dejantar irão às três e estarão até as
seis e de quinze dias de setembro até quinze dias de março, virão as oito pela
maúã" e estarão até as onze e à tarde virão às duas e estarão até as cinco e,
porém, os Oficiais que houverem de fazer algumas diligências, ou acudir a
outras coisas do Santo Oficio, os Inquisidores lhes mandarão que se façam, não
sendo aí mais necessiários.

Que nenhuma pessoa de fora na Casa do Despacho,


com armas algumas, de qualquer qualidade
que seJam, e a pena que tem

V Ordenamos e mandamos que neúuma pessoa de fora entre na Casa


- Inquisição, com espad4 puúal, adaga ou oufua arma alguma e
da Santa
entrando coma alguma das ditas annas, as perderá para o Meirinho da Santa
Inquisição, e seus homens, o qual terá disto particular cuidado, como se dirá
em seu título.

Que os Oficiais acompanhem os Inquisidores


e ntio recebam presentes nem dádivas

VI Mandamos a todos os Oficiais da Inquisição, que acompanhem aos


-
Inquisidores, e os honrem como é razão. E, assim, os Inquisidores, como todos
os mais Oficiais, não recebam presentes, nem dádivas de qualquer qualidade
que sejam e assim ojurarão ao tempo de suas criações.
Das pessoas que hão de entrar no Secreto, e com que licença,
e que ninguémfale com preso no córcere

VII Neúum Oficial do Santo Ofïcio, exceto os do Secreto, entrará na


-
Casa do Despacho da Santa Inquisição, sem licença dos Inquisidores, nem se
cubrirá ante eles, nem terá assento algum, salvo quando houverem de testemu-
nhar na Mesa. E nenhuma pessoa falará com os presos no cárcere, ainda que
seja Inquisidor, o qual não falará com eles, senão estando presente um Notrírio.

Que se leia este Regimento três vezes no (mo, de quatro em quatro


meses, e do auto que disso e hó defazer, e de como
se há de dar a cópia dele aos Deputados

VIII Porquanto é muito necessário que este Regimento do Santo ofïcio


-
se cumpra e guarde inteiramente, mandamos que este Regimento se leia três

RIHGB, Rio de Janeiro, 157(392):615-691, jul./set. 1996.


Regimento do Sento Olício l61 3
-

vezes cada ano, na Mesa da Inquisigão, de quatro em quatro meses, lendo a


cada Oficial o título que lhe tocar, a saber, no mês de janeiro, maio e setembro,
para que cada um dos Oficiais saib4 e faga na memóri4 o que lhe cumpre e
tocae é obrigado aguardare cumprir, em seu oÍício e cargo e disso faráonotririo
do Santo Oficio Auto e assento, por mandado dos Inquisidores, paÍa que conste
do acima dito. E aos deputados do Santo Oficio se dará cópia deste Regimento,
para que se instruírem nele e saberem as coisas de sua obrigação.

Que nenhum O/ìcial tenha quinhão no que


se perder pma a Inquisição

i IX Neúum Oficial
da Santa Inquisição levaná parte alguma do que se
perder para - Santa Inquisição, porquanto, por razío de seus cargos, são
a
í,
obrigados afazertodaadiligencia, pelo que cumpre ao Santo Ofício. E, porém,
I algum Oficial descobrir alguma coisa, que se perca pdra a Santa Inquisição, o
r' fará a saber ao Inquisidor-Geral, que terá lembrança de lhe fazer isso à mercê
i que for razío.

De como hão de ser pagos os oJìciais de seus ordenados


por certidões dos Inquisidores

X Todos os Oficiais da Santa Inquisição serão pagos de seus ordena-


-
dos, por certidões dos Inquisidores, em que certifiquem com tem servido o
tempo, de que hão de haver pagamento e pagado o tesoureiro, sem certidão dos
inquisidores, se lhe não levará em conüa.

Juramento que se lui de dar ao Médico, Cirurgião, Barbeiro


e as mais pessoas queforem necessárias entror
no córcere, mttes de entruem lá

XI Mandamos que, quando o Médico, Cirurgião, Barbeiro, PaÍteir4


-
Cristaleira, ou semelhantes pessoas, que pelo tempo são chamadas houverem
de entrar no cárcere do Santo Ofïcio, sem primeiro tomarem juramento de
segredo, e se lhe particularizarem as proibições necessrârias, de que se fará
termo, ass inado *,
:*;::uï::: ;:: r^:r:f::
as prisões das mulheres

XII Quando os inquisidores mandarem fazer algumas prisões de mu-


-
lheres, mandaÍão aos Ministros e oficiais que as forem fazer, as façam com
toda a honestidade devida, para que não haja escândalo e com a mesma serão
trazidas aos cárceres do Santo Ofïcio e entregues ao Alcaide.

R IHGB, Rio de Janeiro, 157(j92):615-69l,jul./set. 1996.


Sônia Aparecida de Siqueira

Salários que hão de levar os Inquisidores e mais Oficiais


quando forem fora a fazer diligencias
e donde se hão de pagar
XIII Quando os Inquisidores, Deputados, Notários e mais oficiais do
-
santo oficio forem fora do dishito afazer algumas diligencias pertencentes ao
Santo Oficio, levarão o salário, que se contém em cada um dos seus títulos e se
pagarão dafazenda do réu, se a tiver e quando forem pobres, se pagarão do
dinheiro das despesas do Santo Ofïcio.
Missa que todos os dias lui de haver nas inquisições
e quem a dizer, e o salário que há pcna isso t
XIV Nos oratórios da Inquisição se dirá Missa todos os dias que não
-
forem santos de guard4 para que os Inquisidores e Oficiais, antes de entrarem i

afazer negócio a suas horas, a ouçam e estas Missas dirão aos Notrários do Santo '
Ofïcio, cada um sua semana e haverão de esmolas delas, em cada um ano, doze
mil réis, que se repartirão por todos os quais pagaúL o tesoureiro da Casa e as
poderão dizer por sua intenção.
rÍrurovu
Do Promotor do Santo Oficio da Inquisição
I O Promotor terá grande cuidado e diligência em paÍisar os livros e
-
papéis que houver no Santo Ofïcio da Inquisição, para não somente estarem por
sua ordem, mas também para requerer que se passem mandados para prender
os culpados assim presentes, como ausentes e assim paÍa se perguntarem as
testemunhas que estiverem referidas, para se fazerem as diligências que cum-
prem, e se saber a verdade das culpas de cada um. E assim terá cuidado de t
requerer, quando lhe parecer necessário, que se ponham em ordem os registros
e originais dos negócios, dos feitos e papéis, que houver na CâmaÍa e no Secreto
da Inquisição, por seus repertórios, de modo que se ache cada coisa facilmente,
e para isto se poder fazer se ordenará tempo e horas. Eterâcuidado de acusar,
com muita diligência" os culpados judicialmente, por seus termos ordiniírios,
até se concluírem os processos.
II Não fará artigo fundado em testemunhas de ouvida a outra pesso4
- requererá que tomem as testemuúas de ouvida, paÍa por elas se
e somente
ì

perguntarem as testemunhas referidas, e se poder saber a verdade; e sabida


poderá disso fazer artigo, em qualquer tempo.
m Residirá no Secreto, paÍa ver os processos e repertórios, e papéis
do Santo-Oficio, e fazer as acusações, e requerimentos, nas matérias pertencen-
tes a ele. E não virá à Mesa dos Inquisidores, senão quando o chamarem para
comunicarem com ele negócios do Santo Ofïcio, ou ele tiver alguma coisa que

670 RIHGB, No de Janeiro, 157(j92):615-691, jul./set. 1996.


Regimento do Santo Ofuio 16I j
-

requerer e não estará nunca presente às audiências que se fizerem aos presos e
virá por sua pessoa por sua acusação, a qual lerá aos presos, diante dos
inquisidores, estando o reu em pé e estará presente ao concertar das culpas que
se trasladaÍem. E contará todos os feitos que os Inquisidores processarem
conforme o estilo eclesiástico, e terá o Regimento dele e se as partes a que
tocarem as ditas contas se sentirem agravadas se queixarão aos Inquisidores. E
numerará os processos e, quando for ao Conselho, os verá se esüÍo perfeitos e,
achando que lhe falta alguma coisa, a fará suprir e contará os feitos e lançará
os culpados nos repertórios o que fará com muita diligência e cuidado
IV O Promotor será obrigado a acusar todos aqueles que
negarem a
- culpas
tenção das que confessarem, assim como os casados duas vezes, e os
que confessarem heresias, materiais, negando atengão, e os confidentes dimi-
nutos, posto que a diminuição não teúa mais prova contra si, que a presunção
de direito, como são os que se fizeram judeus até certo tempo, e esüío diminutos
nele, a parte post e os que ftzeram ritos ou cerimônias, que confessam, de
alguma lei ou seita, contra nossa Santa Fé Católica, da qual negam atenção, e
a sendo o réu já acusado por algumas culpas, acrescendo-lhe outras da mesma
espécie, não será acusado por elas, mas somente lhe farão a saber os inquisido-
res, nas perguntas que lhe fizerem, que lhe acresce prova de novo. Mas, porém,
os que fizessem jejuns, ou cerimônias, no qárcere do Santo Oficio, posto que
já estejam acusados por outros jejuns, ou cerimônias semelhantes, que fizeram
antes de serem presos, serão de novo acusados por elas e esta acusação se terá
com tais circunstâncias, que não se declare o lugar onde foram cometidas e
quando o preso pedir que lhe dêem o lugar em que cometeu o delito, o Promotor
lhe declarará o lugar geral em que foi cometido, e não o lugar do lugar.
V Terá em rol todos os processos para saber em que termos estão seus
-
negócios, e o que deve requerer e assim terá cuidado de requerer todas as fianças
que se perderem, pelas coisas nelas declaradas, para que hajam efeito. E sená
obrigado enviar às outras Inquisições o rol dos culpados que houver no Santo
Ofício e terá cuidado saber se as pessoas que foram mandadas prender, e se
ausentaram, tornaram a vir às mesmas terras, para se mandarem buscar de novo.

VI Poderá apelar paÍa o Inquisidor-Geral ou ao Conselho da Inquisi-


-
ção, de todos os despachos dos inquisidores, assim de sentenças interlocutórias,
como das finais, em que lhe parecer que, segundo o direito, o deve fazer,
sentindo que é agravado o Santo Ofïcio.
Vn O Promotor tanto que aprontar as testemunhas da Justiça para se
-
ratificarem, depois em sua presença receberem juramento, não estará presente
à tal ratificação, nem os inquisidores lho consentirão, nem ao exame das
testemuúas, nem à confissão do réu, como está dito no Cap. XXXVI do Tít.
tv.

R IHGB, Rio de Janeiro, 157(392):615-691, jul./set. 1996. 671


Sônia Aparecida de Siqueira

Vm
- Levarâdos
contra quem
feitos que se tratarem no Santo OÍïcio, dos culpados
fonnar a acusação, o salário seguinte, convém a saber: dos
sentenciados de leve suspeita, quatrocentos réis, dos veementes, seiscentos réis
e dos declarados por hereges, novecentos réis ainda que o réu confesse o porquê
há de ser acusado, o qual diúeiro lhe será pago no tempo que paÍecer aos
Inquisidores, das fazendas dos réus, se as tiverem, ou sendo pobres, ou necon-
ciliados, se pagará dos bens confiscados, como até agora se pagou. E indo o
dito Promotor fora, afazer alguma diligênci4 levará cada dia seiscentos réis,
pela mesma ordem pagos.
IX Por quanto acontece moÍïerem alguns presos no cárcere, ou fugi-
- antes
rem dele, de suas causas serem sentenciadas em final, mandamos ao
Promotor tenha muita vigilância em saber dos termos em que estiverem as
causas das ditas pessoas, parufazer correr com elas, até se dar final sentenç4
da qual passará certidão, para o Juiz do Fisco prover os seus inventiírios,
confonne o seu Regimento.
X Mandamos que tanto que houver denúncia de alguma pessoa de
-
outro distrito, o Promotor seja obrigado, dentro em oito dias, fazer trasladar as
tais culpas e enviá-las à Inquisição, de cujo distrito forem as pessoas culpadas,
sob pena de lhe ser muito estranhado, não o cumprindo assim. E a mesma
obrigaçãotenâoPromotormandar às outras Inquisições orol detodas as pessoas
que saíram no Auto da Fé, depois de feito, daí a quinze dias primeiros seguintes,
declarando os nomes dasterras de que forem naturais e as culpas que cometerem
e as penitências que por elas houveram. E estes róis se trasladarão em um Livro
que se farâ,para este efeito somente, em cada Inquisição, para a todo o tempo
se poder ver e saber por ele o que cumprir acerca de tais pessoas.
XI O Promotor terá cuidado de requerer aos inquisidores que mandem
recolher-os mandados de prisão, que se passaram paÍa os Comissrários e
familiares do Santo Oficio, que não tiveram efeito, nem se espera tê-lo tão cedo,
por não ficarem os papéis de segredo em mãos alheias. E terâ obrigagão de
assinar as certidões que os Notiários passarem para outras Inquisições, de como
se não acham cutpas no Secreto do Santo Ofïcio contra as pessoas para que se
pedem.

TÍTTJLo Vm
Dos Notarios do Santo Ofrcio da Inquisição

I - No Santo Ofïcio da Inquisição haverá três Notrârios, os quais serão


Clérigos, de boa consciência, e bons costumes; porque assim o requer a
qualidade do ofïcio e dos negócios que tratam e pousarão semprejunto com os
Inquisidores, por serem Oficiais, de que ordinariamente tem necessidade. E
escreverão assim nos Livros do Secreto da Santa lriquisição, como nos proces-

672 RIHGB, No de Janeiro, 157(392):615-691, jul./set. 1996.


Regimento do Santo O/icio 161 3
-

sos, segundo cada um estiveÍ mais disposto para o poder fazer, e parecer bem
aos inquisidores. E serão avisados que quando as partes apelarem e agravarem
dos Inquisidores, mandarão os próprios processos e autos, e virão ao Conselho,
por pessoa de muita confiança e assim virão os autos dependentes e anexos e
conexos, que cumprirem, segundo para despacho da causa aos Inquisidores
parecer necessiirio, para mais clarcza da justiça.
E os Notrários não trasladarão neúuns autos para se enviarem a outras
partes, sem mandado dos inquisidores, e assinado por eles e terão especial
cuidado de tirarem as culpas do original, ao processo, e concertá-las com ouÍo
Notiârio, estando o promotor presente; o que se guardará com efeito, vendo-se
o original com o traslado e no concerto dirá o Noüário que esteve presente o
Promotor.
II Os Noüírios estarão avisados que não falem, nem digam coisa
-
alguma aos presos; e somente entendam em fazet bem, e como devem seus
t oficios e querendo o Notrário avisar alguma coisa aos inquisidores, que lhe
paÍega que cumpre ao Santo Ofício, principalmente estando o preso presente,
ì"
o fará secÍetamente, por escrito e com muito resguardo.
m Os Notrários escreverão, a letra e formalmente, as perguntas feitas
-
e propostas pelos inquisidores e não se contentarão com dizer: <e perguntando
e respondendo etc>> e da mesma maneira escreverão tudo o que o réu responder,
o que se guardará inteiramente, assim no exame do réu como no das testemu-
nhas, como está dito no Título dos Inquisidores, Cap. XI[.

ry Os Notários lerão aos presos as sessões que com eles se frzerem, e


-
os termos prejudiciais à parte, e assim os testemuúos e as confissões e depois
de lido, se diga como foi lido e o assine a parte. E não receberão por si neúuma
testemunha no crime de heresia e apostasia, sem o inquisidor estar presente, e
a inquirir nem darão papéis neúuns do Secretoo sem mandado dos Inquisidores.

V Um dos Notários sempre estará com o Promotor no Secreto, enquan-


-
to estiver vendo os Livros e papéis que lhe cumpre, para requerer sua justiça,
não sendo em outra coisa acupado.

VI Quando os Notrários tirarem dos processos as testemunhas para


-
outros pÍocessos, declararão no título de cada testemunha a idade e as confron-
tagões del4 conforme a como a testemuúa a tiver declarado a causa por que
foi presa e em que termos de seu processo começou a confessar de si e dos
cúmplices e se o que diz deles foi em tormento ou fora dele, e em quantas
audiências negou com juramento não saber coisa alguma de si, nem de outras
ì pessoas e as variações e revogações que teve em seu processo para que se
entenda se a testemunha é perjura, e quantas vezes se perjurou, e se saiba o
crédito que se lhe deve dar.

R IHGB, Rio de Janeiro, I 57 (392) : 6 I 5 -69 l, jul./set. I 996. 673


Sônia Aparecida de Siqueira

E assim se dirá em que tempo a testemunha foi presa, e se o testemuúo


foi dado em tormento e trasladará toda a audiência do tormento, com a
ratificação que depois fez, para que melhor se entenda o modo de sua confissão,
e a força que faz contra os cúmplices.
VII Quando o pÍeso entrar no cárcere, o Notário do Santo Oficio, que
-
o for buscar, fará um termo, em que assente todo o fato, e peças que o dito preso
trouxe, paÍa que a todo o tempo conste do que se lhe achou. E mandamos ao
Alcaide, e Guardas, sob pena de serem gravemente castigados que quando os
presos vierem ao cárcere, os não busquem, sem estar presente o notário e o
Alcaide terá um liwo, em que escÍeva o fato que achar.
VIII Acabado de se fazer o Auto da Fé, um Notário, com o Alcaide,
-
fará o rol de todo o fato que ficou dos presos relaxados, e assim de algum fato,
se ficar dos reconciliados; e todo se entregará ao Alcaide, de que se fará termo,
assinado por ele.
IX Se algum dos Notários fizer alguma coisa que não deva, de que
-
resulte grave prejuízo ao Santo Oficio, sendo disso convencido, será condenado
por perjuro e falsário e privado perpetuamente do oficio, e lhe serão dadas as
mais penas que parecer aos Inquisidores.
X Os Notrários não levarão mais de seu trabalho dos processos em que
-
escreverem, que o que lhe for contado, segundo o estilo eclesirástico de cada
Diocese e Bispado, onde estiver a Inquisição, e será feita conta de Contador, o
qual terá o Regimento Eclesiástico, por onde se contará e farí a conta, na Casa
do Despacho da Inquisição, para que os papéis e feitos que se houverem de
contar não sejam levados a outras partes. Nem levarão mais dos mandados, e
cartas de diligencias, que as partes requererem, do que esüí em estilo no Juízo
Eclesiástico, e logo declararão no fim da mesma carta, e papel que escreverem,
que for para fora e não houver de tornar ao Secreto, o que lhe foi pago, por
diante se puder saber a conta, e o que levou o Notrário.
XI O Notário que por mandado dos Inquisidores for fora da Cidade,
-
ou do lugar onde estiver a Inquisição , a fazer alguma diligência, não podendo
tornar o mesmo dia, por entender na tal diligencia" ou pelajornada ser grande,
lhe pagarão por cada dia um cruzado, do diúeiro das despesas da Inquisição,
ou à custa das partes, cujas diligências for fazer. E o que for contado aos
Notários dos feitos, se lhes pagaÍâ no tempo que parecer aos Inquisidores, da
fazendados réus, se as tiverem e sendo pobres, ou reconciliados, se pagará dos
bens confiscados, como está dito no Título do Promotor, Cap. VIII.
XII Os Notrírios do Santo Ofïcio escreverão em todas as causas
-
criminais ou civis dos Oficiais e familiares do Santo Ofïcio de que os Inquisi-
dores são juízes, por especial privilégio de Sua Majestade, fazendo todas as
diligências necessárias, que cumprem para boa expedição das ditas causas e em

674 RIHGB, Rio deJaneiro, 157(i92):615-691, jul./set. 1996.


Regimento do Santo Ofcio I613
-

seu lugar não escreverá Oficial nenhum do Santo Ofício e isto enquanto se não
der outra ordem.
Xm Por enquanto achamos que, algumas vezes, os Notários do Santo
-
Oficio assistiam nas ratificações que se fizesse,às testemuúas da Justiça, como
honestas e religiosas pessoas, o que pode ter alguns inconvenientes, mandamos
que daqui em diante, os inquisidores não admitam os ditos Notários às tais
ratificações, salvo sendo o negócio de tanto segredo, que convenha ao Santo
Ofïcio não assistirem pessoas de fora, ou de tanta brevidade, que não sofra
dilação e, nestes casos, o Notiário que escreveu o testemunho não poderá assistir
como honesta e religiosa pessoa.

rÍrulo x
Do Meirinho do Santo Oficio da Inquisição
I- O Meiriúo irá pela manhã, e à tarde, a hora ordenada, aos Inquisi-
dores, para os acompanhar até a Casa do Despacho da Inquisição, e assim
esperará até que acabem, e depois os acompanharát, e o mesmo fará todas as
vezes que os Inquisidores forem à Missa ou a outros lugares públicos, e partes
que cumprir, e assim mais fará tudo o que lhe mandarem os Inquisidores.
U O Meirinho fará, bem e fielmente, seu ofício, e com muito segredo,
-
e não terá familiaridade com pessoas suspeitas, nem com outras algumas que
tenham negócio perante os Inquisidores, que pertença ao Santo Oficio; e traná
consigo os homens que lhe são ordenados, os quais ele não tomará, sem primeiro
os apresentar aos Inquisidores, e serem poÍ eles aprovados, nem os poderá
despedir, sem licença dos mesmos Inquisidores, que examinarão primeiro as
causas que para isso houver.
E não prenderá nunca pessoa alguma, sem ter mandado dos Inquisidores,
assinado por eles e as prisões se farão com todo o segredo, e os presos e as
-
pessoas serão bem tratados dele, com toda a honestidade, e teú muito cuidado
de olhar que neúuma pessoa de fora entre na Casa da Inquisição com annas.
m o Meiriúo for fora da cidade, ou lugar onde estiver a
- eQuando
Inquisição, não poder tornar naquele dia a sua casa, por ser ajornada grande,
pagar-se-lhe-á, por cada dia que assim andar em serviço do Santo Ofício,
intendendo no que os Inquisidores lhe mandarem fazer, quatrocentos réis, o
qual dinheiro se lhe paganá à custa das partes, se,tiverem diúeiro, e quando
forem pobres, se pagará do diúeiro das despesas da Inquisição.
IV Indo o Meirinho, ou qualquer outro Oficial do Santo Oficio, fora,
-
por mandado dos Inquisidores, prender algumas pessoas, tenâ cuidado que as
tais pessoas tragam cama, fato necessário para seu uso, e dinheiro, até vinte mil
réis, oú o que puder, para alimentos do preso, que trouxer; e sendo pobres, trará

RIHGB, Rio de Janeiro, 157(392):615-691, jul./set. 1996.


Sônia Aparecida de Siqueira

instrumento de sua pobreza, para serem providos, como se costum4 no Santo


oficio da Inquisição.
E não consentirá que pessoa alguma fale com presos, nem lhes dê aviso; e
dos que se derem, dará conta aos Inquisidores e trabalhará quando for
-
possível, que os presos venham apartados, e não comuniquem uns com outros,
especialmente os que forem parentes.

rÍruro x
Do Alcaide do cárcere da Santa Inquisição

I O Alcaide do cárcere será homem casado e pessoa de muita confian-


-
ça, terí consigo os guardas que forem necessários, os quais serão de boa
consciência, de maneira que o ciárcere possa ser livre de toda a mácula, e se
possa fazer bem o que cumpre o serviço de Nosso Seúor e terá grande
cuidado, que no cárcere estejam sempre mui apartados os homens das mulheres; -
e sendo possível, que se não vejam, nem ouçam uns aos outros, nem se possam
entender.
II O alcaide não receberá pessoa da mão do Meiriúo, ou de outra
-
alguma pessoa, sem ser presente um dos Notrários da Santa Inquisição, que faça
auto da entregadatalpesso4 assinado pelo dito Alcaide, o qual se acostará aos
autos, com o mandado que se passou ao Meiriúo para prender a tal pessoa; e,
porém, vindo o Meirinho de noite, ou de madrugada, ou havendo outro
impedimento, em tal caso o Alcaide o receberá e porá, enketanto, em alguma
casa escusa, e separada, até os Inquisidores lhe dizerem onde o há de recolher,
e logo pela maúã farífazer auto, como acima fica dito.
ru Terá cuidado quando os presos entrarem no cárcere, de saber se
-
levam consigo armas, ou ouhas algumas cousas de suspeita, ou diúeiro, para
se saber se tem que gastar, e se fará de tudo assento pelo Noüário, e se dará conta
aos Inquisidores, para nisso proverem como convém, fazendo-se tudo, de modo
que as pessoas não fiquem escandalizadas; e quando os presos saírem do
cárcere, os verá mui particularmente, e o fato que levam, e darâdisso conta aos
Inquisidores, e tomará entrega do fato dos relaxados que ficar, e assim de alguns
reconciliados, conforme o termo que o Notário disso fizer, que ele assinará,
como está dito no Título dos Notários.
IV E quanto às mulheres que vierem presas, por mais honestidade, as
-
buscará a mulher do Alcaide, à qual dará um Notrário juramento de segredo, e
que fará verdade, e a drá, acerca do que achar; e esta diligência fará em parte
escusa, onde honestamente se possa fazer, e não será nunca em casa do Alcaide:
e quando a mulher do Alcaide estiver impedida, se fará o que os Inquisidores
ordenarem, e de tudo se fará termo no processo; e o diúeiro que se achar se

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Regimento do Santo Ofcio 1613
-

entegará ao Tesoureiro do Santo Ofïcio, e se fará rol do que se entegar ao dito


alcaide.
V Não lançanâ ferros a nenhuma pessoa, nem os tirará+ nem lhe dará
-
mais ásperas prisões, nem as diminuirá, sem especial mandado dos Inquisido-
res, nem assim mesmo os castigará, nem lhes faní algumas afrontas; e quando
fizerem cousa por que mereçam algum castigo, o farãa saber aos Inquisidores,
para proverem nisso, como lhes parecer que convém; e as pessoas estarão
sempre da maneira que os Inquisidores ordenarem, sem o Alcaide poder alterar
na dita ordem cousa alguma" nem mudar preso algum da casa onde estiver, sem
mandado seu; e quando lhes parecer que se haja de fazer mudança, se fará dela
termo nos autos, de que os Inquisidores terão particular cuidado.
VI Terá muito resguardo, que se não dêem cartas, nem avisos de fora
-
aos presos, nem com eles haja inteligência alguma; e assim terá aviso se nas
comidas que se fazem nas cozinhas, ou cousas que vêm de fora, se enviam
alguns avisos, e sinais, ou escritos aos presos.
Terá vigilância em saber o que os presos fazem,praticam e comunicam de
uma casa a outra, para que todo o que compreender faça saber aos Inquisidores;
e terá cuidado de vigiar de dia e de noite os presos, e será nisso muito solícito,
e do que achar avisará logo aos lnquisidores, para proverem como lhes parecer,
e terá cuidado de fazer vigiar os Guardas, assim de dia, como de noite.
VII Não tomará nenhuma cousa de comer de fora para os presos, nem
lhas dará,-e procurará que não haja avisos do ciârcere para fora dele, nem de
fora para o cárcere e terá muita vigilância sobre os Guardas, vendo se tem
alguma -
particularidade com algum preso, ou presa, e tendo disto alguma
suspeita, ou notícia, avisará aos Inquisidores, para proverem como lhes parecer,
e não se servirá de nenhum dos Guardas, nem os mandará fazer negício algum
fora do cárcere, salvo quando forem buscar as meziúas à botica, ou a chamar
o Médico ou Cirurgião, ou a cousa muito necessrâria ao preso.
VIII presos, e os Guardas os proverão diante dele,
- O alcaide visitará os
sem haver comunicação entre os Guardas e os presos, de que o alcaide não possa
ser sabedor; e não se abrirão as portas das casas onde os presos estiverem, senão
perante o mesmo alcaide, e sendo presente a tudo um Guarda; e havendo
enfermidade, ou outra alguma necessidade urgente, dará conta disso aos Inqui-
sidores, para o proverem; e acontecendo a tal necessidade de noite, o poderá
fazer o Alcaide, e lhe abrirá a porta com muito resguardo, e proverá no que lhe
for necessiírio.
IX presos do necessiírio, conforme a memória ordinrâria
- Proverá
que se costuma
os
fazer, e fora dela lhe não dará cousa alguma' salvo quando
houvesse doença" ou causa para lhes dar alguma cousa extraordinária por
mandado dos Inquisidores, nem faÁ ptátticas aos presos' nem admoestações

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Sônia Aparecida de Siqueira

que confessem suas culpas, nem os induzirá a isso e quando for e vier com
os presos, irá calado. -
X Não falará com os presos em nenhuma matéria, fora das que
-
pertencem ao oficio de alcaide, sob pena de se proceder contra ele com todo o
rigor; e sendo caso que os presos queiram falar com ele na matéria de suas
culpas, ou em ouhas que não forem de seu oficio, lhes diú que vão à Mesa dos
Inquisidores, para que eles os ouçam, e lhes dêem o remédio que convém e
terá cuidado de tratar os presos com toda a caridade, benignidade e bom -
tratamento que frr possível, e provê-los e consolá-los em suas paixões, com a
mesma caridade.
XI Não consentirá que os pÍesos joguem as cartas, nem dados, nem
-
outros jogos, nem consinta que arreneguem, nem blasfemem, e acontecendo
cada uma das ditas cousas, o fará logo a saber aos Inquisidores.

XII joganí
- Onem
alcaide, nem nenhum dos guardas,
comerá, beberá, nem
com presos, os conversará familiarmente, nem os parentes, nem os
requerentes dos presos, nem receberão nenhuma cousa para si, por pequena que
seja e o alcaide terá especial cuidado das chaves do cárcere, e as não fianâ
-
dos guardas, nem de algumas outras pessoas.
)CII O alcaide, nem cousa su4 nem guarda do cárcere,nem oficial da
-
Inquisição não mandarão fazer obra alguma paÍa sua pessoa, ou de sua casa,
aos presos que estiverem debaixo de seu poder, sua guarda e suajurisdição,
posto que lhe queira pagar seu trabalho, nem isso mesmo venderão, nem
comprarão cousa alguma aos presos.
XIV Neúuma pesso4 de qualquer qualidade que seja, posto que
-
Inquisidor, falará com os presos no cárcere, e quando um Inquisidor quiser falar,
será estando presente um Notrírio; e sendo necessário vir alguma pessoa de fora"
para lhe aplicar alguma meziúa" ou lhe fazer algum beneficio para sua saúde,
proverão os Inquisidores que esta pessoa seja tal, que não possa haver contra
ela alguma suspeita, e que seja cristii-velh4 sem raça alguma, a qual se dará
juramento de segredo na Mesa do Santo OÍïcio, e que não levará avisos de fora,
nem de dentro do çiârcere; e não poderá a dita pessoa falar com o preso, senão
estando presente o alcaide, salvo quando for confessor; e o dito alcaide terá
muito tento, que as ditas pessoas não dêem visos, nem cartas, ou de palavra, ou
de outra maneira; e todo o que achar ou compreender, assim dos presos, como
de oufias pessoÍts, fará a saber aos Inquisidores.

XV Em neúuma maneira, a mulher do alcaide, nem pessoa alguma


-
de sua casa, comunicará com os presos; e quando houver alguma necessidade
para isso, se fará sempre com licença dos Inquisidores, salvo quando houver
tão urgente necessidade, que seja necessário acudir a ela sem a dita licença.

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Regimento do Santo Ofrcio I 61 3
-

XM Terá um Livro no cáÍcete, onde se escreverão, por um Notrário


-
do Santo Ofício, todos os mandados que se passaÍem para-se soltarem os presos,
os quais serão assinados pelos Inquisidores; e assim terá outro, em que se
escreva o fato que for achado aos presos quando os buscam, e do que ficar no
cárcere, que se lhe entregará por termo assinado por ele.
XVII Levaút de carceragem, de cada preso rico que tiver fazendas,
-
dois tostões, e assim daqueles a que foi confiscada sua fazend4 e não levará
nada dos presos pobres: e quando acerúar de se mudar de uma Inquisição para
outra, onde se houver de despachar, e soltar, o tal preso, pagaráL somente meia
carceragem ao alcaide do cárcere, em cujo poder primeiro estiver o dito preso,
e a outra pagará ao alcaide do cárcere onde se soltar; e neúuma outra cousa
tomará: e ficando alguma cousa nos cátceres, que pertença aos presos, terá
cuidado de o fazera saber aos Inquisidores, paramandarem portudo em recado,
e se entregar a quem pertencer.
XVIII Adoecendo algum preso, o alcaide o fará logo saber aos Inqui,
-
sidores, paÍa que dêem ordem que se chame o Médico do Santo Ofício, que o
cure, o qual virá à Mesa dos Inquisidores, dar raão da enfermidade do tal preso,
e os Inquisidores lhe encomendarão que tenha muito cuidado de sua saúde, e
para isso se lhe dará tudo o que for necessiírio: e quando a doença for crescendo,
o Médico iú dando a mesma conta sempre aos Inquisidores, para que, sendo
necessário, o provejam de confessor, do que o alcaide terá particular cuidado
de avisar também aos Inquisidores, para que não molra sem confissão.
XIX Quando algum Físico, ou Cirurgião, for ao cárcere visitar alguns
-
enfermos, o alcaide entrará sempre com ele, e assim com as ouftas pessoÍrs
necessiírias aos presos, como se costuma fazer no cárcere; e na parte que for
mais conveniente haverá uma lâmpadq ou as que forem necessárias, acesas
toda a noite.
XX O alcaide do ciírcere fará no tempo da Quaresma lembrança aos
-
Inquisidores, que vejam se no cárcere há algum preso que se haja de confessar,
e saberá deles a ordem que nisso há de ter, fazendo o que lhe mandarem com
muita diligência e cuidado.
XXI Terá rol de todos os presos que tiver no cárcere, para saber dar
-
razão do que lhe perguntarem, e para saber distibuir as esmolas que vierem, o
que fará fielmente, e assim o jurará no juramento de seu oficio.
XXII Mandamos ao alcaide do c"'árcere da Inquisição de Lisboa, que
-
teúa cuidado da chave da porta do pátio da mesma Inquisição, e deva mandar
fechar por um guard4 as oras costumadas; e por este trabalho se lhe fará a mercê
ordinrâria que parecer ao Inquisidor-Geral, para que vindo algum preso de fora,
de noite, ou sendo necessário mandar chamar o Médico, ou outra cousa que
importe, esteja prestes com a chave para mandar abrir a dita porta; e a pessoa

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RegirnenÍo do Santo Ofrcio l6l j
-

dos Solicitadores, que os Inquisidores ordenarem, será Escrivão da receita dos


liwos que houverem de ficar na Inquisição defesos, ou que se houverem de
emendar, conforme o que está dito no Título dos Inquisidores, Capítulo XVI.
VU Os Solicitadores não tomarão nenhuma cousa das partes, e somen-
te levarão-por requererem, e solicitarem as testemunhas, o que lhes for taxado
pelos Inquisidores, de cada testemuúa que fizerem vir a Juízo; e assim lhe
taxarão o que merecerem de seu trabalho por ir fora do lugar onde residem os
Inquisidores, a fazer alguma diligência, por bem da Justiça, tomando no mesmo
dia; e os Inquisidores nestes casos, e dúvidas, se poderão conformar com estilo
eclesiástico que houver, parecendo-lhe que está posto emrazío. Porérn, indo
fora da cidade a fazpr as ditas diligências, levarão por cada dia trezentos e
cinqüenta réis, à custa das partes; e, sendo pobres, serão pagos à custa do
dinheiro das despesas da Inquisição.
TÍTULO XII
Do porteiro da Casa do Despacho do
Santo Oficio da Inquisição

I- O porteiro da Casa do Despacho da Santa Inquisição terá cuidado de


abrir as portas de que tem as chaves, assim pela manhã, como à tarde, antes que
os Inquisidores e os Oficiais do Santo Ofïcio venham, e de ter a Casa do
Despacho bem concertada e limpa, e as chaves dela terá sempre com muito bom
recado, e das petições, e papéis, que andarem na Mesa, de maneira que neúuma
pessoa as possa ver, e somente as despachadas dará as partes, por mandado dos
Inquisidores, e os outros papéis terá com muita guarda e fidelidade; e assim
fará com muita diligência fielmente tudo o que lhe for mandado pelos Inquisi-
dores; em especial terá cuidado de tratar as partes muito caritativamente, e com
boas palavras, e de maneira que não sejam escandalizadas em seus negócios; e
saberá a qualidade das pessoas que houverem de entrar na Casa do Despacho,
para conforme a isso se lhe dar o assento que merecer, entrando com elas para
lhe chegar o assento.
II Terámuito cuidado daporta do despacho da Inquisição, que neúu-
-
ma pessoa entre sem licença, nem a dar recados; e por tomar as petições, ou as
dar à parte, ou por dizer delas quando vierem para falar aos Inquisidores, não
receberá peita alguma, nem outra coisa, nem bem fazer e fará tudo com muita
diligência" e fidelidade, como se requer em todos os ofícios da Santa Inquisição,
e assim jurará de o cumprir inteiramente no juramento de sua criação; e saberá
ler e escrever.
ru O porteiro não entrará na Casa do Despacho, estando os Inquisido-
-
res em despacho dos processos, ou fazendo audiência aos presos ou ouvindo
pessoas de fora: e mais tempos quando houver de falar aos Inquisidores, fará

R IHGB, Rio de Janeiro, 157(j92):615-691, jul./set. 1996. 681


S ônia Ap ue c i da de Siq ueira

sinal à portâ" de maneira que os Inquisidores entendam e mandem que entre; e


assim, nem ele, nem outro Oficial do Santo Ofïcio (exceto do Secreto) entrarão
nunca na Casa de Despacho, sem licença dos Inquisidores.
ry Terá cargo de dar conta dos panos, das cadeiras, das mesas, dos
-
livros, dos bancos e das ouhas coisas que estiverem na Casa do Despacho do
Santo Oficio, o que se lhe entregará por inventiírio; e não irá fora fazer diligência
alguma, sem mandado dos Inquisidores, e os ditos panos não sairão nunca para
fora da Inquisição.
rÍruroxu
Dos Proctnadores que procuramna
Inquis iç ão p e I as p arte s

I- Os Procuradores que houverem de procurar no Santo Ofício da


Inquisição serão pessoas de confiança, leftas e consciência, e sem suspeita de
raga de judeu, nem mouÍo; e sobre isso se fará informação, conforme ao estilo
do Santo OÍício, e jurarão na forma cosfumadq os quais não procurarão por
distribuição, mas antes ficará livre às partes nomearem aquele de que mais
confiança tiverem, e mais confiarem suajustiça" e não admitirão os Inquisidores
a procurar em seu Tribunal neúuma pessoa, sem especial mandado do Inqui-
sidor-Geral, nem os poderão privar de seus procuratórios, depois de admitidos,
sem primeiro disso lhe darem conta; e, porém, com justa causa bem os poderão
suspender.
II Tanto que forem nomeados pelas partes, aceitando a causa, com
-
licença dos Inquisidores, logo receberão juramento, presente o réu, que bem e
fielmente ajudarão seu clientulo na sua causa, requerendo e alegando tudo o
que virem e sentirem que cumpre a bem de sua justiça, e que o não deixarão
indefeso; e no processo da dita causa, quando vier a coúecer que não tem
justiça, o manifestará à parte, e dinâ aos Inquisidores, na Mesa do Santo Oficiq
e desistira da causa.
E sendo menor o réu de vinte e cinco anos, constando de sua menoridade,
o Inquisidor o proverá de Curador ad litem, informa juris; e depois o menor,
com autoridade de seu Curador, nomeará Procurador, e se fará termo de
curadoria no princípio do processo; e assinará todas as sessões que se fizerem
com o menor, sendo-lhe primeiro lidas.
m Os Procuradores não levarão papel algum, nem traslado, nem
-
lembrança dos negócios que pertencem ao Santo Oficio, para sua casa; e tudo
o que houverem de escrever o farão na Inquisição; e não farão rol dos nomes
das testemunhas que as partes derem para prova de suas contraditas; e com eles
estará sempre um Notrário, ou Oficial do Santo Ofício, quando estiverem os
presos, como está no dito Título [V, Capítulos XX)üX e XL das contraditas.

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Regimento do Santo Ofrcio I6I 3
-

TITULO )ilV
Dos guardas do cárcere da Santa Inquisição
I Os Inquisidores nomearão ao Inquisidor-Geral os que forem guardas
-
necessários para serviço do cárcere, os quais serão pessoas de idade, consciên-
cia e segredo, confiança, e de boa vid4 e que não sejam parentes, nem criados
do alcaide e não terão outro oÍïcio incompatível, nem indecente, e serão casados
e tirar-se-á informação de sua geração, e de suas mulheres, por testemunhas,
conforme o estilo do Santo ofïcio a qualinformação se mandará ao Conselho
Geral, para se pôr em uma arca, e se fará assento, no Livro das Criações, do dia
em que começarem a servir, dando-lhes juramento, conforme estilo.
II Não mandarão fazer obra alguma paÍa sua pessoq ou de sua casa"
aos presos -
do cárcere, posto que lhe queiram pagar seu fiabalho, nem venderão,
nem comprarão coisa alguma aos presos, nem comerão, nem beberão com eles,
nem os conversarão familiarmente, nem os parentes, nem requerentes dos
presos, nem receberão coisa alguma para si, por pequena que seja" que os presos
lhe deêm, ou lhes pertença, nem terão as chaves das portas do cárcere, salvo
quando os inquisidores outra coisa ordenarem, sendo necessiírio.
m Proverão os presos das comidas e coisas necessárias, estando
-
presente o alcaide, sem haver comunicação alguma dos presos com os ditos
guardas e sempre ao mudar dos presos de uma casa paÍa outra estará presente
um guarda, pelo menos, com o alcaide, e assim ao buscar dos presos, quando
entram no cárcere.
IV Os guardas que servirem no cárcere, além das mais obrigações que
-
têm de seu caÍgo, serão obrigados avigiar os presos, de noite e de dia, e saber
se falam oucomunicam uns com osouhos, parao dizerem aoalcaide, e saberem
os Inquisidores o que passa no cárcere.
V Um dos guardas do ciircere da Santa Inquisição de Lisboa terá
-
cuidado de fechar a porta do pátio dosestaos de noite, as horas que lhe for
mandado pelo alcaide, que terá a dita chave, e a recolherá, e o dito guarda a
abrirá pela manhã, ao tempo que lhe for mandado.
\{I guardas do cárcere, o Tesoureiro, por mandado dos
- Aos
pagarâ
Inquisidores, constando-lhe como tem servido inteiramente seu tempo e feito
o que são obrigados; e bastará constar por informação verbal do alcaide e
fazendo o que não devem, os Inquisidores darão conta ao Inquisidor-Geral, para
serem despedidos, ou castigados como o caso merecer.
VU Os Inquisidores terão muita vigilância acerca dos guardas do
-
cárcere, informando-se particularmente se estão nele às horas devidas, ou
andam pela Cidade, e se vâo à casa de cristãos-novos, especialmente os que

R IHGB, Rio de Janeiro, I 5 7 (392) : 6 I 5-69 I, jul./set. I 996.


Sônia Aparecida de Siqueira

foram presos no cárcere do Santo Oficio, com os quais se pode presumir que
terão alguma comunicação, ou lhe descobrirão segredos, ou levarão recados do
cárcere, ou os trarão de pessoas de fora; porque disto se seguem grandes
inconvenientes ao segredo e ministério do Santo Ofício. E achando algum dos
ditos guardas culpados nas coisas, o despedirão ou castigarão como a culpa o
merecer, dando primeiro conta ao Inquisidor-geral, e sempre ficarão dois
guardas no cárcere, enquanto um vai jantar, ou ouvir Missa, e logo se tornarão
para o câtcere,para que todos vigiem e cumprÍÌm com sua obrigação. E os ditos
guardas não irão afazer negócio algum fora do cárcere, salvo quando forem
buscaras meziúas àbotica, ou forem chamaro médico oucirurgião, ou alguma
outra coisa que importe fazer-se com brevidade e não irão comprar coisa alguma
para os presos.

rÍru1,o xv
Do Tesoureiro da Inquisição

I - Em cada uma das Inquisições haverá um Tesoureiro, que tenha


cuidado de receber e depender as rendas do Santo Ofïcio e todo o mais diúeiro
das penas e penitências que lhe for aplicado o qual será um dos Noüirios do
Santo Ofício, que parecer aos InquisidoÍes e outro Noüário seú escrivão da
receita e despesa e os Inquisidores assinarão as despesas que se fizerem por seu
mandado e o oficio do dito Tesoureiro não durará mais que até se fizer o Auto
da Fé e, acabando ele, se elegerá outro Tesoureiro.

II O Tesoureiro da Inquisição terá um Livro da receita e despesa, o


-
qual será assinado pelos Inquisidores, por cima das folhas, como os mais do
Santo ofïcio e nele se escreverá todo o diúeiro que o dito Tesoureiro receber,
e assim a despesa que se fizer por mandado dos Inquisidores e por ele se lhe
frzer tomarâ conta, e assim pelo Livro da Receita, por lembrança, que os
Inquisidores frzerem, das condenações pecunirárias, e o diúeiro das comuta-
ções de penitências, como está dito no Título dos Inquisidores, Cap. XX)üII.
m Não pagará salário a neúum dos Oficiais do Santo OÍício, sem
-
certidão assinada pelos Inquisidores, porque conste terem bem servido seu
caÍgo, e cumprido com sua obrigação e bastará para os guardas informação
verbal do alcaide, e para os homens do Meirinho a que o mesmo Meirinho der
a palavra.

IV As diligências que se fizerem, por parte do Santo Ofïcio, o Tesou-


reiro as -pagaú5 e assim as que fizerem por parte dos presos, não tendo eles
donde as pagar; e quando tiverem diúeiro, dele se pagarão, e não o tendo, as
pagarâ o Tesoureiro à sua cont4 para depois se entregar do que gastou do
dinheiro do dito preso, conforme a lembrança que disso tiver.

684 R IHGB, Rio de Janeiro, I 5 7 (392) : 6 I 5-69 I, jul./set. I 996.


,
I
\
Regimento do Santo Ofuio 1613
-

V Quando se tomaÍ conta ao tesoureiro do recebido de suas receitas,


-
não lhe darão quitação, sem primeiro entregar o dinheiro que ficar devendo,
para que dele possa ordenar o Inquisidor-Geral o que for servido e não satisfará
com o descargo que der, dizendo que o entregou por receita nova a seu sucessor.
rÍrul,o xvt
Dos Inmens do Meirinho da Inquisição
I- Os homens do Meiriúo do Santo Oficio serão apresentados por ele,
e os Inquisidores se informarão deles, por testemuúas que teúam razão de os
coúecer, e a suas mulheres e não admitirão senão aqueles que forem para isso,
e que viverem bem, e forem quietos, conhecidos, e de confianç4 e que não
tenham raça de judeu, nem mouro e se lhes dará o juramento em forma,
fazendo-se assento do dia em que começaram a servir.
II Estarão à porta da Inquisição, para verem quem entra" e não consen-
- entrem embuçados, nem se façam alguns desconcertos, como
tirão que é
jogarem, ou virem falar pessoas suspeitas ou doidas, ou pessoas desinquietas e
não deixarão entrar pessoas de fora, senão as que tiverem negócio com os
Oficiais do Santo Ofïcio e trazendo alguma das ditas pessoas alguma arma, lhes
dirão que a deixem à porta e terão cuidado de avisar aos Inquisidores de tudo
o que suceder e lhes parecer mal.
III O Meiriúo do Santo Ofïcio poderá despedir os seus homens,
-
pedindo licença aos Inquisidores, os quais examinarão primeiro as causas que
para isso alegar e não irão fora da Cidade, mas farão as diligências que forem
necessiírias ao Santo Oficio, que os Inquisidores lhes mandarem, os quais não
servirão deles.
IV Um dos homens do Meiriúo, qual parecer aos Inquisidores, terá
-
cuidado de estar à porta do pátio da Inquisição de Lisboa, tanto que for à noite,
para guarda del4 e não consentirá que entre nele pessoa suspeita, ou não
conhecida; e estará at'horas que o alcaide fechar a dita porta por um guarda e
sempre terá a lâmpada na dita porta, como está dito no título do Alcaide, capítulo
XXII e por este trabalho se lhe dará o estipêndio que parecer.
TÍTULO XVII
Do Alcaide do cárcere da penitência
I - No cárcere da penitência haverá um alcaide, que seja pessoa de
consciência e confiança, e de bons costumes, e que teúa idade conveniente ao
caÍgo, e seja casado, e saiba ler e escrever, cristão-velho, sem raça de mouro,
nem judeu, de cuja limpeza se fará informação, e de sua mulher e terá cargo
dos penitenciados que saírem no Auto da Fé, que lhe serão entregues pelos
Inquisidores para os levar ao dito ciírcere, e nele se instruírem nas coisas da Fé,

' RIHGB,RiodeJaneiro,t5T(j92):615-69l,iul./set. 1996.


I
Jr

Sônia Aparecida de Siqueira

e cumprirem as penitências que lhes foram impostas os quais fiatará com muita
caridade, procurando-lhes esmolas para se sustentarem, que repartirá conforme
as necessidades de cada um, com fidelidade e os vigiará, e saberá se cumprem
com o que lhes foi mandado, ou se procedem com quietação, ou tem entre si
dúvidas, ou pelejas, paÍa que de tudo vá dar conta aos Inquisidores e terá os
ditos penitenciados a bom recado, que não possam fugir do dito cárcere.
II Não deixará falar pessoa alguma com os ditos penitenciados, sem
licença -dos Inquisidores, nem sem ela sairão fora do ciárcere; e quando forem
ouvir Missa, ou pregação, à Igreja para isso ordenada, os acompanhará à ida e
vinda e saberá se cumprem suas penitências, enquanto andarem com o hábito
penitencial, e se continuaram nas Missas e pregações, notando-lhe e escrevendo
as faltas que fizerem, para depois dar disso informação aos Inquisidores, quando
lha pedirem.

m Não comerá nem beberá" nem jogará, nem terá conversação e


- particular com os penitenciados, nem receberá deles dádiv4 nem
comunicação
peita alguma, nem terá comunicação com parentes seus, nem aceìtaútrecados
para os ditos penitenciados, que prejudiquem, nem deles para outras pessoÍrs
de for4 nem comunicará com gente da naçáo, nem continuará em suas casas,
e fará tudo o mais que os Inquisidores lhe mandarem.

rV No tempo que os penitenciados estiverem no cárcere dapenitência,


ou quando- paÍecer necessário aos Inquisidores, haverá um guarda, que sirva
aos ditos penitenciados no que lhes for necessário, o qual será cristão-velho,
sem raça de judeus, nem mouro, e fará o que o dito alcaide lhe mandar e não
terá comunicação com os penitenciados, salvo estando presente o dito alcaide,
nem levará recado a pessoa de fora, nem os trarâpara os ditos penitenciados,
sob pena de por isso ser gravemente castigado e terá juramento de segredo, que
os Inquisidores lhe darão, de que se fará assento, que assinará e lhe será pago
seu saliário pelo Tesoureiro do Santo Oficio; e não o sendo, se despedirá.

V No cárcere da penitênci4 haverá um Capelão, que diga Missa todos


os dias,- enquanto nele houver penitenciados, e parecer que convém à sua
salvação e nos mais que parecer aos Inquisidores, o qual será cristão-velho, sem
raça de mouro, nem judeu e disso se fará informação pelos Inquisidores , pessoa
honesta, de boa vida, temente a Deus, e douto e suficiente e terá obrigação de
confessar e sacramentar os penitenciados e presos do dito cárcere, e de estar
com eles, quando tiverem alguma necessidade espiritual, em que cumpra
consolá-los, e esforçá-los e fazer acerca disso o mais que lhe os Inquisidores
encomendarem e terá salário competente, que lhe será pago pelo Tesoureiro da
Inquisição e lhe será dado juramento em forma , de que se fará assento no Livro
das Criações.

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RegimenÍo do Sento Oficio 1613
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ADIÇÕES
E DECLARAÇOES DO REGIMENTO

Nós, o Bispo Dom Pedro de Castilho, Inquisidor Apostólico Geral, contra


a herética pravidade e apostasia" em todos os Reinos de Portugal, etc. fazemos
saber, que sendo nós informado que o nosso Regimento atrás escrito (segundo
a pnítica e experiência dos negócios mostrava) tiúa necessidade de algumas
declaragões, para boa expedição e despacho deles, e querendo nisto prover, o
mudamos ver poÍ Letrados, que das coisas do Santo oficio tem experiência: e
havida relação, ordenamos que se fizessem as adições e declarações seguintes,
as quais mandamos que se cumpram e guardem, juntamente com o dito
Regimento, como nelas se contém e são as seguintes:
I- Porque muitas vezes acontece vir-se alguma pessoa apresentar es-
pontaneamente na Mesa do Santo Ofício, e no mesmo dia vem a testemuúa"
ou testemunhas, a denunciar da mesma pessoa, para que conste qual veio
primeiro, declarará o se foi pela manhã ou à tarde e vindo
Notário, na audiênci4
ambos na mesma audiência, declarará o mesmo Notrário, à margem, quem veio
primeiro.
II Quando se mandar prender alguma pesso4 por caso pertencente ao
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Santo Oficio, pelo qual se não perdem os bens, nem se faz seqüestros deles, se
dirá à pessoa que a for prender lhe faça a saber que deixe seus bens a recado
que convém para boa conservação e guarda deles, encomendando-os à pessoa
que ele ordenar, por invenüário, para que deles se possa alimentar, e sua mulher
e filhos possam beneficiar, pela melhor ordem que lhe pÍlrecer.
m Quando se proceder contra as pessoas que se casam duas vezes,
vivendo -sua primeira mulher ou marido, posto que elas mesmas se veúam
acusar espontaneamente, confessando seu delito, não-se pode, nem deve,
proceder contra elas, sem primeiro verificar ambos os makimônios que tiverem
contaído, e que a pessoa, ou pessoas, com quem casaram, eram vivas ao tempo
que casaÍam segunda vez; porque, sem constar disto, não se pode dizer que
est!ío suspeitos na Fé, para se acusarem e proceder contra eles. E na abjuração
que cada um dos tais delinqüentes fizer, se declarará especificadamente como
abjura a suspeita da heresia dos que crêem e afirmam ser lícito casar duas vezes,
sendo a primeira mulher ou marido vivos; e o mesmo se relataú na sentença.
IV Algumas vezes acontece os Juízes Seculares remeterem ao Santo
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Oficio informações e testemunhas, conffa pessoas que têm dito ou feito coisas,
t das quais lhe parece deve coúecer o Santo Ofïcio. Neste caso, satisfeitos os
Inquisidores que o caso lhes pertence, antes de prover em coisa alguma, hão de
l examinar de novo as testemuúas, e segumdo o que resultar, fazer justiga, sem
se contentarem com a informação secular, pois é de Juiz incompetente. E se o

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Sônia Aparecida de Siqueira

conhecimento do caso lhes não pertence, se há de responder ao Juiz Secular


que a informação que remeteu foi vista, e pelo que toca ao Santo Offcio, não
hâpan que deter o réu, sem lhe dizer que se lhe remete para que faça justiç4
tornando-lhe a mandar sua informação sem nela se pôr palavra alguma, se foi
recebid4 ou não. E o mesmo se fará nas culpas que vem dos Ordinários, quando
não pertencem ao Santo Ofïcio.
V Quando se não começa o processo contra alguma pessoa por infor-
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mação de algumatestemunha, há se de pôr no princípio dele o fundamento que
houve paÍa se receber informação contra tal pessoa.
VI Oficial do Santo Oficio se não prenderá no cárcere dele, sem
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primeiro suas culpas serem vistas em mesa, com os deputados, e o assento que
se tomar ser remetido ao Conselho Geral, por ser o caso grave, e de qualidade,
que primeiro deve ser visto nele, salvo havendo temor de fuga.
VII Pedindo o réu lhe dêem vista de sua confissáo,paratratar com seu
Procurador - o que importa à sua defesa;estando ambos na Mes4 ante os
Inquisidores, um Noüírio lhe lerá tudo o que não tocar a terceiros e cúmplices,
e o mais calarâ.
VIII primeira sessão da genealogia, além das perguntas no Capí-
- NaIV,
tulo XII, Título do Regimento, se perguntará ao réu se tem ordens, quem
lhes deu e onde as tomou, e o mais que parecer necessiirio.
IX Na segunda sessão, se perguntará ao réu pelas cerimônias da
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crença, em geral, ao negativo, ou dejudaísmo, mouro ou herege, ou de qualquer
outra seita, contra a Fé, conforme o Capítulo XIII, Título IV, do Regimento. E
da mesma maneira, sendo o réu indiciado de alguma proposição, ou ato, que
Íizesse, pertencente a qualquer dos sobreditos eÍïos, se perguntará na segunda
sessão, em geral, pelas cerimônias dependentes dele, e será examinado sobre
isso se o creu, leu e aprendeu, e de quem, e onde andou e se criou, e com
-v.g.
quem conversou, etc. e, depois de perguntado e bem examinado, fará ditas
proposições, ou atos, que nega,se lhe fará a terceira sessão, em espécie, e depois
será acusado. E sendo caso que confesse, então será examinado pela atenção,
crença e cerimônias que fez, conforme o estilo que se tem com os confidentes.
X Na terceira sessão, será perguntado o negativo em espécie, v.g. pelas
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culpas, e pelo tempo em geral, até o perdão geral, sem fazer menção do lugar,
dizendo se achou em certa parte, e em certa comunicação, etc., nem se nomeará
nunca pessoa por seu nome, por evitar sugestão e, em neúuma pergunta,
admoestação, libelo ou publicação, se falará por pessoa conjunta ao réu, por
não vir em conhecimento da testemunha.
XI Acusará o Promotor a todo o réu que cometeu culpa" pela qual haja :

de haver-alguma pena, posto que a confesse porque se lhe há de dar defesa, e


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pode alegar coisa que o escuse, ou em parte ou em todo.

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Regimento do Santo Ofrcío 1613
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XII Quanto ao negativo lhe foi feita publicação de alguma testemuúa"


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ou testemuúas, se depois confessar, não se lhe tomarão a publicar as mesmas
testemunhas, posto que o réu esteja diminuto em algumas delas, ou em cúplices
que eles lhe dão; porque pela primeira publicação está satisfeito à Justiça, mas
o tal réu, depois de examinado, e admoestado, e acusado, se lhe fará publicação
somente das testemuúas que depois lhe sobrevieram e acresceram e não lhe
acrescendo alguma de novo, se despachará seu processo, fazendo-lhe primeiro
alguma admoestação, em que se lhe declarem as faltas, e diminuições que tem
sua confissão.
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È
q XIII Quando o réu estiver confidente, e diminuto em alguma testemu-
úa, ou em- cúmplices que elas lhe dão, se fará publicação de todas as testemu-
úas que tiver, que não estejam publicadas, posto que o réu diga delas, para
I comisso se justificar a prisão, e o réu ficar confesso, e convicto, e como contra
tal, se possa pronunciar a sentença, e para mais liberdade e quietação dos votos.
ì XIV Fazendo-se publicação ao réu negativo de alguma testemunha de
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fama, conforme o Capítulo XXXVII, Título IV, do Regimento, atal fama será
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de delito particular que o réu haja feito, ou heresia que dissesse, ou proposição
:
suspeita; e não se fará de generosidades.
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XV Contraditas que não foram alegadas pelo réu, e postas em artigo
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por ele, não se receberão, posto que ofereça algumas de pessoas sua conjunta,
que estivesse, ou fosse presa, no Santo Oficio nas quais se prove alguma
I inimizade que toque as suas testemunhas mas trasladar-se-ão as tais contraditas
T assim alegadas, e assim as testemuúas que a elas foram dadas: e tudo se
pendurará por linha ao feito principal, para se lhe dar o crédito que parecer e
não sendo dadas testemuúas a estes artigos de conjuntos, se perguntarão
testemuúas de novo, ex-fficio, por eles para defesa do réu.
XVI Papéis que os Inquisidores aceitarem de contraditas, para defesa
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das partes e diligências que se fizerem ex-fficio sobre eles, conforme o Cap.
XLIV, Tít.IV, do Regimento, se pendurarão por liúa ao feito principal, e não
se porão dentro do processo do réu, por não confundir a ordem dele.
XXVII Contraditas, quando se receberem, não sendo diretamente
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postas às testemuúas, declarará ao Inquisidor, no despacho do recebimento, a
razáo, e caus4 por que as recebe, dizendo: <<Recebo tal e tal artigo, pelo que
toca a fuão, irmão ou paÍente do réu e assim dos mais, para que conste do
artigo recebido, se a pessoa taxada é parente do réu e em que grau, e se sabia
t se foi justa a causa do tal recebimento.
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XVIII Quando o reu nomeia testemuúas para prova das contraditas
)
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recebidas, sendo as nomeadas mortas ou ausentes, ou não se podendo achar
paÍa serem perguntadas, neste caso, se mandará chamar o réu, e com cautela se
I lhe lerão todos os artigos de conhaditas com que veio, assim recebidos, com

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não recebidos, e se lhe irão perguntando as testemuúas que deu a cada um, e
iú acrescentando as testemuúas, que mais lhe lembrarem, a uns e a outros, de
modo que naquele que faltaram nomeaÍ ouhas de novo, porque desta maneira
nilo fica indefeso, nem pode vir em coúecimento da testemunha taxada.
XIX Sendo caso que ao réu lhe declarem na Mesa que há de ser posto
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a tormento, e antes de lida a sentença, ou depois de lida confesse alguma cois4
se há de ratificar em forma, depois de vinte e quatro horas, como se confessara
no tormento, posto que se lhe não dê; e neste caso se sobrestará no tormento
que se lhe manda dar, até ser ratificado e quando não satisfizer, se verá em mesa
se há de continuar o tormento, ou o que se deve fazer. t
XX Havendo-se de continuar o tormento, não é necessiírio sentença
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de novo, mas basta a primeira que foi publicada ao réu, mas quando se houver
de repetir o tormento, e por novos indícios, então se pronunciará sentenga de
novo, depois do assento da Mesa.
X)O Menor de vinte e cinco anos terá Curador em form4 conforme o
Cap. XX, -Tít.V, do Regimento, o qual menor em sua presençq recebido
juramento, ratificará a sua confissão que o dito Curador disse que aceitava a
curadoria, e, quanto com direito devi4 lhe dava sua autoridade, e bem e
fielmente e com diligência o defenderia nesta causa. E o dito curador estará
presente à sentença do tormento do tal menoÍ, pata que, se lhe parecer, possa
dela apelar.
)OflI No Cap. LVI, Tít. fV, do Regimento se contém que os Inquisi-
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dores poderão dar sobre fiança os culpados que andarem soltos, sem consultar
o Inquisidor-Geral, ou o Conselho. Declaramos que o mesmo serii quando os
culpados estiverem presos pelos ordinários por culpas leves.
XXIII Sendo alguma pessoq presa pelo Santo Ofício, por culpas de
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heresia, ou outras pertencentes a ele, e sendo absoluta ab instatia, os Inquisi-
dores publicarão a dita sentença na Mesa, e não em ato público, salvo quando
a parte o pedisse; e entiÍo se não relatarão as culpas por que for preso, mas
somente se dirá que foi acusado por crime de heresi4 ou de sodomia, ou outro
semelhante.
X)OV Se alguma pessoa, por causa que fzesse, ou dissesse, perten-
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cente ao Santo Ofïcio, foi condenada em pena de açoites, ou em degredo, ou
pena pecuniiíri4 semelhantes sentenças não se cosfuma mandarem-se ler na
Paróquia à estação, mÍls em auto público, salvo quando a pena fosse aplicada
ao Santíssimo Sacramento ou à Confraria de algum santo.
XXV Quando a pessoa que se há de relaxar à Justiça Secular for de
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ordens Sacras, háde dizerasenteçaque o condenam em pertencerem, emandam
que seja degradado atualmente, com a solenidade que o Direito requer, detodas

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* Regimeüo do Santo Ofrcio


- 1613

i.

F as Ordens que tem: e a estes tais não se porão as insígneas dos relaxados, senão
I depois de feita a dita degradação.

I Copiado de um impresso em 1613 por Pedro Crasbecck, de que apenas


achamos no arquivo da Torre do Tombo, um exemplar, que pertenceu
ao Mosteiro de Alcobaça.
A este Regimento atribuem Borges Cameiro e Fernandes Thmaz a data
de 22 de outubro de 1613 - mas é certo que no dito impresso não se
I encontra tal data.

i Nós, dom Pedro de Castilho, Bispo, Inquisidor Apostólico Geral, contra a


u
herética pravidade e apostasi4 em todos os Reinos e Seúores de Portugal, e
!
nele Viso-Rei-Fazemos saber aos muitos reverendos Inquisidores Apostólicos
I das Inquisições dos ditos Reinos, que, vendo nós que, depois de ser feito o
Regimento do Santo Oficio, que El-Rei Dom Henrique, de gloriosa memória"
t Inquisidor-Geral nos ditos Reinos, mandou fazer, e até agora se guardou e
como, conforme a prática e experiência dos negócios, que o tempo foi mostran- -
do, se frzntam novamente, pelos Ilustríssimos e Reverendíssimos Seúores
Inquisidores-Gerais, nossos antecessores, muitas Visitações, Instruções e Pro-
visões, pelas quais o dito Regimento se emendava e alterav4 provendo-se de
novo em muitos casos que ocorreriam, as quais não andavam incorporadas no
dito Regimento, etiúam necessidade de serem publicadas, paraboaexpedição
do despacho dos negócios tocantes ao Santo OÍicio da Inquisigão; querendo
nisso prover e dar ordem necessária, paÍa serviço de Deus, perpetuação, e bom
governo do dito Santo Ofïcio, sendo as ditas Visitações,Instruções, e Provisões
praticadas e conferidas, por diversas vezes no Conselho Geral da Santa Inqisi-
ção, por pessoas de letras e muita experiência dos negócios do Santo Oficio.
Determinamos reformar o dito Regimento, e fazer dele nova recopilação,
de maneira que de todos seja sabida e entendida: a qual sendo bem examinada,
emendada e reduzida em dezessete títulos, mandamos imprimir e aprovamos,
confirmamos e queremos que em todas as Inquisições à nossa jurisdição
sujeitas, se guarde e pratique uniformemente, assim no modo de proceder, çomo
em todo o mais.
Emandamos aos ditos Inquisidores que conforme a este Regimento
procedam, julguem e decidam todos os casos que ocolrerem; e nos que não
W forem nele expressos, sigam a disposição de Direito, conforme a Bula da Santa
Inquisição, tendo sempre a Deus diante dos olhos.
E revogamos, e anulamos qualquer outro Regimento, Provisão ou Instrr-
ção em contrário; e queremos que este só se guarde, e dê à sua devida execução,
como nele se contém; o qual é o seguinte;: O Bispo D. Pedro.

(
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