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Decres
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E CULTURA
INSTITUTO NACIONAL DO LIVRO
CORRESPONDÊNCIA
DE
CAPISTRANO DE ABREU
EDIÇÃO ORGANIZADA E PREFACIADA
POR
VOLUME I
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DE CAPISTRANO DE ABREU
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.
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E CULTURA
INSTITUTO NACIONAL DO LIVRO
CORRESPONDÊNCIA
DE
CAPISTRANO DE ABREU
EDIÇÃO ORGANIZADA E PREFACIADA
POR
VOLUME I
DE CAPISTRANO DE ABREU
i
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E CULTURA
INSTITUTO NACIONAL DO LIVRO
CORRESPONDÊNCIA
DE
CAPISTRANO DE ABREU
VOLUME I
NA
SUMÁRIO DO VOLUME I
PREFACIO IX
CARTAS
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(
PREFÁCIO
A EDIÇÃO DA CORRESPONDENCIA
A PROCEDENCIA.
OS CORRESPONDENTES.
Já em 1901 ele transmitia a Mário de Alencar o que lhe lhe dissera José
Carlos Rodrigues quando voltara da Europa : " Estão os senhores Nabuco e
Aranha em Londres a se entusiasmar pelos artigos de José Veríssimo e a
dizer dêles maravilhas com o Oliveira Lima . Ele não vale o que eu pago13 ”.
E quando morre o amigo, ele escreve : “ Não posso conformar m
- e com a
idéia de que não mais tornarei a encontrá-lo. Muitas vezes nossas opi
niões e atitudes divergiram inteiramente, mas os laços de boa amizade
nunca afrouxaram e a intimidade foi sempre crescendo mais forte 14."
Nesta correspondência já conhecida, pois divulgada desde 1931 , domina
a história, mas aparecem também opiniões literárias e observações críticas.
Nenhum acervo tem tanta significação intima, pessoal, como o con
junto de cartas dirigidas por Capistrano a Mário de Alencar, a quem o
unia a velha admiração ao pai , José de Alencar. O primeiro encontro
com o escritor causara- lhe tão grande impressão que ele guardava a data :
“ Há hoje 47 anos que vi seu pai pela primeira vez em Maranguape15.”
Não só os estudos históricos, etnográficos e lingüísticos aparecem como
relêvo que sempre lhes deu Capistrano, mas retratam -se suas crises morais,
com a perda da esposa, a ida da filha para o convento , a morte do filho
Fernando. Em nenhuma outra correspondência mostram -se tão eviden
tes sua aspereza crítica e sua franqueza algumas vezes dura. Mário era um
amigo mais môço, e ele lhe desejava tanto bem que se permitia usar de
uma sinceridade às vezes rude. Censura-lhe os caminhos da vida e da
literatura, opina, mostra e defende suas convicções filosóficas, históricas
e literárias. Nesta correspondência manifesta sua formação germânica
e seu profundo respeito e admiração pela cultura alemã . A primeira
carta é uma descrição e uma análise muito interessante do sucedido a Raul
Pompéia e não menos valiosas são as interpretações sobre a imagem do
Pai de Alencar, na vida e na obra de Mário16 .
As cartas a Domício da Gama são poucas, mas não sem interesse.
Conheceram-se nos fins de 1887, quando a Gazeta de Notícias começara a
publicar contos de Domício e Capistrano dêles falara a Raul Pompéia ! .
Foi Capistrano quem deu o primeiro passo para a carreira diplomática
lias datam de quase cem anos . Eles são de Icó, nós de Sobral; Maran
guape nos reuniu ... Uma vez disse - lhe : vamos escolher dentre seus
livros um , vamos revê-lo e emendá -lo ; será sua mensagem 38.” Vários
livros da imensa bibliografia de Jaguaribe, como a Arte de Formar Homens
de Bem39, a Mudança da Capital Federal40, A Inteligência e a Moral do
Homem41 e Reflexões sõbre a Colonização !? encontram nestas páginas
as observações críticas do seu amigo fiel , que tanto se interessava pela sorte
literária dos seus companheiros de estudos.
A última carta desta Correspondência, escrita a João Lúcio de Aze
vedo aos 17 de julho de 1927, pouco antes de sua morte, ocorrida a 13 de
agosto, é o melhor testemunho de sua constante atenção e de seu favor
à História , à qual serviu tôda sua vida com fiel e inspirada devoção.
A SIGNIFICAÇÃO DA CORRESPONDENCIA .
BIOBIBLIOGRAFIA
feito de colaboração com ele, que sempre foi avesso a falar de si. Só
êle teria memórias do período mais interessante da sua formação moral,
da infância e da primeira mocidade no Ceará e o Rio de Janeiro 52.” Essa
história constitui em si um ensaio à parte, que já escrevemos e em outra
oportunidade será publicado .
Os estudos e ensaios críticos sobre Capistrano formam hoje uma
extensa bibliografia 53. É verdade que se têm destacado muito os as
pectos anedoticos e pitorescos, interessantes para a compreensão de sua fi
sionomia humana, mas nem sempre fiéis e exatos. Mais valeria distin
guir os traços do homem na sua vida diária, seu feitio, suas tendências,
suas características, gostos, costumes e ojerizas. E a correspondência
serve para singularizar e concretizar a pessoa tão genuinamente brasileira
e tão intensamente original de Capistrano.
2 - 1.•
XXVI CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
fazia nem ouvia conferências. “ Em geral não assisto a estas coisas, por
que ficando longe apenas apanho pedaços, ficando perto arrisco m - e a um
acesso de tosse que pode perturbar a assembléia 56.” “ Não quis fazer
parte da Academia Brasileira, e é avesso a qualquer sociedade por já achar
demais a humana. Por exceção única pertence ao Instituto, do qual pre
tende demitir-se em tempo, se não morrer repentinamente 57.” “ Fui ins
crito na Academia Humana independente de consulta e já acho excessivo .
Os fundadores da Academia de Letras daqui eram quase todos meus ami
gos, instaram comigo para que lhes fizesse companhia. Resisti e cada
vez estou mais convencido de que andei com juízo 58. "
É certo que andou namorando, logo depois que aqui chegou, o Ins
tituto Histórico e o Colégio Pedro II . Em artigo na Gazeta Literária
de 18 de novembro de 1879 escreve Capistrano constar " que sua Majes
tade fez um dia a filosofia do caráter brasileiro, dizendo que entre nós
as aspirações limitam-se a duas : ser senador ou lente do Pedro II. " Ele
Capistrano de modo nenhum aspirava ao Senado e cedia desde logo seus
" direitos presentes e pretensões futuras em favor do candidato nacional,
o sr. Martinho de Campos." " A cadeira do Colégio Pedro II bem pode
ser que já tenhamos aspirado, mas para isso são necessárias várias condi
ções : a secularização do Colégio, a liberdade de opinião e a impossibili
dade de reproduzirem -se julgamentos como o do concurso de Filosofia.
Mas não vão, por isso, alegar nosso desinteresse. Pretendemos posição
mais elevada : a de membro do Instituto Histórico. ” É certo que ao
apontar esta pretensão Capistrano a reveste de uma forma irônica, cheia
de restrições. Mas restrições ele fizera também ao Colégio Pedro II,
o que não impedira de a êle candidatar -se em 83, quando já não fazia da
secularização do Colégio uma condição indispensável para sua candidatura.
sessenta anos ou quase, labutava com as primeiras letras 99. ” Foi nesse
porão que de 8 de dezembro de 1923 a 13 de agôsto de 1927 viveu seus
últimos dias o grande Mestre de nossa História, e onde se fundou a So
ciedade Capistrano de Abreu.
Capistrano nunca foi, como se verá também nesta correspondência,
um destes trabalhadores heróicos de que necessita a ciência . Trabalhava
pouco e lia muito e sempre. Sofria crises de desânimo e desencanto que
o levariam, em 1925, a assinar-se João Ninguém. Nesta época ele temia
que a surdez, unida à miopia, formassem “ uma das acumulações piores que
as proibidas pela Constituição. Se a cousa se realizar, mudar-me - ei do
Rio para qualquer lugar escuro 100.” Sonhava com freqüência. “ Agora
estou passando regularmente: durmo com facilidade e não tenho sonhos
agitados”, dirá em 1915 a Mário de Alencar101 . Em 1920 conta a
João Lúcio que, tendo contemplado o retrato de Paul Groussac, sonhara
que conversavam os dois, êle e João Lúcio, sob a proteção do Gigante de
Pedra , o Corcovado 102
J. H. R.
CAPISTRANO DE ABREU E A HISTORIOGRAFIA BRASILEIRA1
grado e ressangrado ”. Por isso eles são uma síntese social e econômica
limpa e enxuta, que evita transformar -se, como tantos outros livros de
história, numa conversa entre eruditos. Capistrano conhecia muito bem
este tipo de palestra, sabia quando e como usá-la, mas não a queria agora
que seu livro pretendia ensinar simplesmente o segredo do Brasil aos bra
sileiros, numa época em que, como escrevia José Veríssimo, a história
nacional era tão prodigiosamente desprezada que, com exceção da obra
de Varnhagen, uma conversa só para eruditos, era com os estrangeiros
que teríamos de ir aprender a história de nosso país.
O livro nascia do desejo de divulgar e atualizar, em forma simples,
mas não erudita, sem pedantismo, o conhecimento de nossa história, mais
social e econômica que política, liberta o mais possível da seriação de
datas e nomes, livre da cronologia dos vice-reis e governadores, que su
focaram ou ajudaram os anseios do povo brasileiro em sua luta trissecular
pela Independência.
Não era o inédito que o preocupava, mas sim a clara certidão da
verdade, buscada e colhida nos arquivos e bibliotecas, apertada e resu
mida em poucas linhas, exposta com razões próprias que esclareciam e
convenciam . Capistrano foi sempre o homem da síntese e basta ler sua
correspondência para logo se ver que ele admitia de mau grado os estu
dos em vários e grossos volumes. Mas para compor esta síntese era
necessário proceder a uma imensa atividade investigadora que o precipi
tava como um nadador num mar sem limites. Os Capítulos eram uma
síntese da pesquisa realizada para anotar a História Geral de Varnhagen
e preparar a edição de textos históricos fundamentais ; eram o filho le
gítimo de uma análise demorada, cuidadosa e ilimitada. Em várias partes
dêste livro logo se notará a compreensão e não a simples descrição , o
entendimento e não só os fatos.
E por que não incluiu nesse livro a Inconfidência Mineira, recen
temente considerada como o mais importante movimento precursor da
Independência ? O fato é que entre 1878, quando criticava Varnhagen
por considerar a Conjuração Mineira como uma cabeçada e um conluio,
e 1903, quando se intrigava com as honras prestadas a Tiradentes em
detrimento dos Mascates e dos Republicanos de 17, êle parece ter-se
convencido de que a Conjuração realmente não tivera a importância que
começavam atribuir-lhe. Muito mais importantes eram as lutas dos
Emboabas e dos Mascates, a consciência da riqueza do país, as proezas
dos Bandeirantes, os atritos armados e sangrentos, as lutas dos Repu
blicanos de 17. Ele mesmo dira, em carta a Mário de Alencar, que
XLVIII CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
base documental este tema de nossa história ; não seria uma mistura de
dados históricos, antropológicos, geográficos e fatos contemporâneos, como
Os Sertões de Euclides da Cunha, livro de 1902. Seria um desenvol
vimento sucinto e legível daquele capítulo da tese de 1883 ou dos Cami
nhos de 1889, com a base histórica, geográfica e antropológica que nin
guém conhecia em particular e em conjunto como ele nessa época. Os
Caminhos antigos e o povoamento são, para a historiografia brasileira, o
que The Frontier in American History de F. Turner é para a historio
grafia americana.
Quando Capistrano de Abreu apareceu na historiografia brasileira,
esta centralizava seu interesse especialmente nas comunidades do litoral.
Ele viu o sertão e o caminho como processo de incorporação e dilatação
da fronteira ocidental: era um campo novo, um método de investigação
e interpretação original da formação colonial do Brasil . O sertão e os
caminhos são um fator de criação da vida brasileira. Insatisfeito com
as histórias puramente políticas que mutilam a unidade humana, ele não
divide com sua geografia e economia aprendidas dos alemães o suceder
histórico. Ao estudar a ocidentalização do Brasil, estava particularmente
interessado em achar aquilo que a distinguia da velha civilização européia.
O sertão e o caminho são ilustrações dos processos de desenvolvimento
da história brasileira. O verdadeiro ponto de vista da história do Brasil
não é a costa atlântica, mas o sertão e o caminho que a ele conduzem
e o articulam com o Governo Geral . No processo de transformar o
sertão, o colono a princípio se barbariza e depois ele próprio e o sertão
se alteram e, nesta mudança, cria-se uma nova personalidade, que é dis
tintamente brasileira . O papel do sertão e dos caminhos, entrevisto agora
pela primeira vez , modificou profundamente o escrito e a metodologia
histórica no Brasil . A história do Brasil colonial não era só a da
colonização da costa atlântica, mas a expansão pela terra, livre ou ocupada
por bárbaros.
Capistrano nunca foi um historiador regional . Pelo contrário, sempre
soube valorizar as contribuições de cada região ao todo da formação do
Brasil. Desde cedo compreendeu que a nossa história é um ato de
incorporação e dilatação. Em 94, numa crítica ao livro de Oliveira
LIV CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
indispensável fazer o atlas histórico, pelo qual tanto trabalhou entre 1916
a 1920. Seu engano foi pensar que não teria, como Goethe, o livro lido
por aqueles que mais quisera, um verso do prólogo do Fausto que sempre
O comoveu . Os Capítulos de História Colonial há cinqüenta anos são
lidos e relidos pelos que estudam o Brasil e admiram a devotada paixão
com que Capistrano de Abreu quis descobrir o segredo do Brasil aos
brasileiros .
Claridade e crítica, sobriedade e competência , probidade e erudição
completam e formam as qualidades do seu espírito e de seus trabalhos.
Não importam os grossos volumes ; devemos fixar-nos não só no que
Capistrano realizou como historiador, mas no que aspirava realizar, no
que queria, no que postulava. É na novidade deste principio e na es
tranha energia com que soube mantê-lo que reside seu mérito essencial e
incomparável.
Diante de tudo isso , novamente se impõe a pergunta : onde repousa
o valor permanente de Capistrano ? Na interpretação. Ele foi um
intérprete, porque foi um grande humanista. Que significa isto ? Que
êle, como historiador, se preparou para conhecer tudo o que a espécie
e o destino humanos podem realizar no mundo, neste mundo que é o
Brasil . Tudo que é humano tem interesse, exatamente porque é hu
mano ; o bom e o mau , o nobre e o comum , o gosto e o desgôsto pela
vida, o titanismo da mocidade e o desespero da maturidade, as belezas
da vida e os temores da morte, a proximidade e o afastamento de Deus,
tudo cai no âmbito do humano.
Pode-se desde logo notar o contraste entre a estima que lhe devotavam
e a lição que ensinou . Capistrano de Abreu tornou-se uma legenda no
campo da historiografia, onde todos prestam seu culto ao mestre. Estêve
na moda louvá-lo, mas desprezou-se seu conselho. A razão para o con
traste é fácil de achar. Êle é uma companhia desagradável para quem
procura o êxito imediato, pois combinava uma espécie de ironia socrática
com uma intolerância puritana contra a presunção.
Como disse recentemente Eduard Spranger, em artigo publicado o
ano passado na Revista de História Alemã, no volume dedicado ao 90.
aniversário do maior historiador europeu, Friedrich Meinecke, a cons
ciência histórica é uma forma alta e própria de genialidade. Ela é a
mais valiosa criação do espírito europeu. “ Não reconheceríamos sua
força se a considerássemos apenas como essencialmente reprodutiva.
Muito mais do que isso, o grande historiador constrói o mundo espiritual
LVI CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
- 1
A RAMOS PAZ 1880-1909
My dear,
Tacho, isto é , cuba ou bacia grande de metal, não se pode traduzir
bem em guarani, digo, tupi, que não conheciam metais.
A tradução menos insuficiente que encontrei foi nhaenguaçu. Nhaen
( ñaen ) , segundo Batista Caetano, significa : continente, vaso, vasilha, bacio,
bacia... ; conduto, o em que se transporta ou leva, prato em geral ou
receptículo, louça, panela, ola ; guaçu significa grande.
Poder -se - ia também dizer : ita -nhaenguaçu : cuba grande de pedra,
porque os indios, depois de conhecer os metais, chamaram -no : ita.
Demorei esta resposta, para ver se eni mapas antigos de Minas Gerais
encontraria a antiga denominação indigena.
Não encontrei.
Bien à voils ,
J. C. DE ABREU
CARTAS A RAMOS PAZ 5
Jly dear,
Fui hoje à rua de S. Pedro, n.º 2, onde há uns inglêses que escrevem
por máquina, para começarem a passar a limpo o meu trabalho. Não os
encontrei ; só 4.a feira.
Meu trabalho vai depressa agora . Está pronta a primeira parte (Des
crição Geográfica ) ; espero acabar hoje ou amanhã a segunda ( 0 Colono
na Mata ) , para passar à 3.a ( Cultura do Café ).
Na quarta pretendo dar as estradas de ferro, escolas, alimentação, etc.
Provavelmente no fim da semana estará pronto tudo, e como os ingle
ses trabalham depressa, espero entregá -lo à companhia antes do fim do
mês.
Bien à voils,
C.
Rio, 19 de junho.
Uly dear,
Aly dear,
Mando -lhe alguns dos volumes que pede. Veja o que falta e depois
de amanhã mande nova lista. Como Saldanha da Gama não estava
presente, e parece não ter entendido bem o que lhe disse, não mando
todos.
6 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
As suas Efemérides, 1.º vol. e indice (aparado tudo ) disse -me Tei
xeira de Melo que entregou a Júlio para lhe ser dado em mão própria.
Está perdido, naturalmente.
Adiós.
Bien à vous,
J. C. ABREU
Rio, 26 de julho de 1882.
My dear,
Agradeço-lhe sinceramente quanto diz da minha tese.
Há dela duas tiragens; uma, a que lhe remeti, apenas de cinqüenta
exemplares meus, pois cem ficam na Instrução Pública ; outra de cento
e cinqüenta, que não está pronta, e em que, além da folha de rosto , deve
estar modificado o último capítulo, que a angústia do tempo me obrigou
a reduzir extraordinàriamente.
Desta mandar-lhe -ei os exemplares pedidos, quando estiver pronta,
isto é, dentro de vinte a trinta dias.
Da tese do Berquó poderei talvez arranjar-lhe um exemplar -- foi
tão bem impressa pelo Leuzinger; das de Nunes Pires e Bettencourt
ceder - lhe -ei os meus, depois do concurso, se não conseguir outros
foram impressas pelo Dias da Silva Júnior.
Bien à vous,
J. CAPISTRANO DE ABREU
My dear,
Escrevo-lhe da cidade do Salvador, onde acabo de desembarcar, e em
sua honra procurarei dar um suspiro no túmulo de Paraguaçu .
Escrevo -lhe para pedir o obsequio de, unido ao Chaves ou separado ,
conseguir -me a passagem de que lhe falei .
.
A passagem seria para mim o ideal em dois casos : 1.0 : de ir para
o Ceará no vapor de 20 do corrente mas sem fixar definitivamente
o vapor em que deveria eu embarcar, para que pudesse eu fazê - lo a
10 ou 20 de abril , conforme me conviesse ;
CARTAS A RAMOS PAZ 7
My dear,
Não sei se já lhe disse que com alguns amigos estou encarregado
de publicar uma coleção de documentos sobre a História do Brasil,
por conta do governo.
O primeiro volume será distribuído por estes dias, e contém dois
interessantes trabalhos de Anchieta, um dos quais até hoje inédito e o
outro quase inédito, tão incorretamente foi antes impresso na Revista
do Instituto .
A este seguir-se-á outro, contendo cartas de jesuítas, datadas de
1549 a 1568, em número de 80, mais de 50 das quais inéditas.
Trato agora de reunir elementos para outro volume, que deve ir
de 1570 a 1600, e, por causa dêste, venho incomodá -lo. Vi no Catálogo
da Biblioteca do Pôrto que la existe, em espanhol, uma história da fun
dação do colégio de Pernambuco em 1576. Não conheço o documento,
mas este com certeza deve ser curioso, porque, sobre ser contemporâneo,
trata de objeto virgem .' Simão de Vasconcelos, como sabe, termina sua
Crônica na morte de Nóbrega, isto é, em 1570.
Sei que tem relações na Biblioteca do Pôrto, e por isso venho pedir
lhe o obsequio de obter -me uma cópia exata e autêntica. Embora o
Catálogo não indique o número de páginas do ms., julgo que não há de
Ser grande.
Desejaria também obter cópia de uma Memória, que trata da Capitania
de Pernambuco. Para não causar, porém, desde já , tão grande incômodo,
8 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
Muito obrigado por sua amável carta, mais uma prova de sua ines
gotável bondade.
Estou pronto, com a vantagem que o dr. Göldi prometeu ajudar-me.
Resta, porém , que me mande alguns exemplares do livro ; que me diga
se tem de sair com nome de F. F.; se o livro é propriedade da
Metropolitana; enfim , as questões congêneres, que conhece tão bem e me
lhor que ninguém.
Pretendo ficar por aqui até o fim de março e poderia levar o tra
balho pronio, se não houver a urgência de antes. Mas mande -me o mode
lo, que é o principal .
Tenho -me dado muito bem por aqui. Meus meninos têm passado
admirávelmente ; Adriano ligou -se com um indio que trouxe comigo e
CARTAS А RAMOS PAZ 9
C.
Colônia Alpina, 14 de fevereiro de 1893.
My dear,
T. ABREU
S. Rita de Teresópolis, 26 de fevereiro de 1893.
My dear,
Se não houver qualquer obstáculo imprevisto, pretendo descer para
a cidade na próxima semana.
Lá falaremos melhor sobre a noticia do Rio de Janeiro, de que pou
co tenho podido ocupar-me ainda especialmente e que só lá farei.
10 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
My dear,
Escrevo -lhe de S. Rita de Passa -Quatro, quase no extremo da linha
Paulista. Aqui estou desde dezembro, e provavelmente não voltarei antes
do meado de fevereiro.
Aqui planta-se café, e, segundo tenho ouvido calcular, o município,
que aliás não é grande, exportou o ano passado pelo menos 600 mil
arrôbas .
Por causa do café exatamente é que lhe escrevo.
Há anos publicou -se um livro de van Delben Laerne sobre café
do Brasil. Tenho uma idéia vaga que muito poucos exemplares foram
postos à venda ; mas ou a Associação Comercial, ou alguns cafèzistas
ficaram com grande número dêles. Meu parente deseja muito possuir
um. Será possível obtê-lo por seu intermédio ?
Vim buscar Adriano, que desde outubro saíra do Rio, gravemente
doente. Felizmente posso considerá-lo restabelecido ; está forte, gordo,
já anda muito a cavalo , e conseguiu realizar uma de suas grandes am
bições : aprender a nadar.
Desejo que tenha entrado corn o pé direito no ano novo .
Bien à vous,
CAP.
My dear,
Junto a nota dos primeiros livros, que encontrei.
Contém apenas os encadernados.
Farei outra remessa de brochuras .
Bien à vous,
J. C. DE ABREU
Rio , 3 de setembro de 1896 .
CARTAS A RAMOS PAZ 11
Caro Compadre,
Recebi com tanto prazer sua carta quanta foi a mágoa que senti,
sabendo de sua partida a horas de já não poder procurá -lo.
Estive na Biblioteca, porém não consegui ver o manuscrito a que
se refere, e que é uma longa carta de D. João de Castro. Para o outro
vapor com certeza darei conta de sua incumbência.
Talvez seja melhor comemorar o descobrimento das Índias, dando
uma edição portuguêsa popular do livro que a Academia de Viena pu
blicou agora, acompanhado de muitos mapas. Seria fácil arranjar aí
um tradutor e, dispensados os mapas, a despesa não seria grande.
Mande buscar desde logo na Itália o livro de Sophus Ruge, que é
hoje a primeira autoridade sobre questões de Geografia histórica e História
geográfica, intitulado : Storia delle Scoperte Geografiche, originàriamente
escrita em alemão, mas já traduzida em italiano e até em espanhol. Nela
terá o melhor dos guias; se não me engano, ele cita um ms. português
de Dresda, escrito no século XVI e ainda inédito, e que talvez conviesse
mais que a carta de D. João de Castro.
Agradeço-lhe seus amáveis oferecimentos e, para começar, far-lhe-ei
dois pedidos : 1.°, veja se obtém para a Biblioteca Nacional um catálogo
de Fernando Palha ; 2.º, que há de relativo ao Brasil na livraria de
Carvalho Monteiro ?
Estamos em estado de sítio ditadura fraternal , chama - o o Pa
trocínio .
O assassino já começou a falar, dizendo que agiu por ordem de
Diocleciano Mártir, ao sinal dado por um irmão de Medeiros e Albu
querque, com a pistola entregue por um distribuidor da República, cha
mado Veloso, que já está preso. Deviam ser mortas umas quinze pessoas,
entre as quais o presidente, ministros da guerra e marinha, presidente
da Câmara, comandante da polícia, deputados e senadores, entre os quais,
já se sabe, o Rui.
Diocleciano tinha entrevistas diárias com Barbosa Lima e, parece,
com Guanabara, o qual , está provado na polícia, foi o mandante do
assassinato do Gentil.
Sua afilhada vai crescendo sem novidade, chegando aos seus seis
anos, que completará para o mês. Ainda não sei se em janeiro irá para
o colégio. Os outros vão bem , exceto o incorrigível Adriano, a quem
não vejo jeito.
12 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
Saudades.
Bien à vous,
C.
Rio, 16 de novembro de 1897 .
J. C. DE ABREU
Rio, 17 de fevereiro de 1900 .
Dois dos donatários eram naturais de Viana, que com o Brasil teve
o maior comércio, pelo menos até a guerra holandesa. Não haverá ves
tígios destas relações antigas no cartório daquela cidade ?
Sua afilhada está boa. Vai entrar para o colégio no próximo mês.
Já não é sem tempo, que em dezembro completa dez anos.
E agora até quando ?
Saudades do
Compadre e am .
CAPISTRANO DE ABREU
Rio, 23 de maio de 1901.
My dear,
Peço-lhe o obsequio de tomar providências sobre a cópia da jus
tificação de Mem de Sá, de que estou sentindo falta enorme.
Creio que o mais simples será o seguinte : escrever ao seu sobri
nho para procurar Pons, e pagar- lhe a cópia, se já está feita, ou encar
regá-lo de fazê-la, se não tiver recebido sua carta .
CARTAS A RAMOS PAZ 15
J. CAPISTRANO
Rio , 31 de agosto de 1904 .
1.º
18 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
mas pelo menos escreveu sempre, julga que a sedição deve ser julgada
pelos tribunais militares. O resultado final será fiasco completo.
Um amigo, chegado ontem da Bahia, conta a história da Bahia
de modo muito diverso do que contam os jornais. Tôda a guarnição
estava disposta a aderir ao movimento daqui. Sotero de Meneses, que
burlou a tentativa do turbulento alferes Teodomiro, devia assumir o
governo. Tôda a dissidência consistiu no seguinte : Teodomiro pensava
que se devia prosseguir no movimento a todo o transe. Pensavam ou
tros que não tinha mais objeto, depois do fracasso da Escola Militar .
E o caso das pedras, que ainda dura ? Diz-se que o Didimo e cúmplices
serão condenados pelo Supremo Tribunal .
Antes de terminar : conquanto Sousa Viterbo não seja especialista
da História do Brasil , provavelmente poderá informar sobre os do
cumentos da Tôrre do Tombo , relativos à nossa terra .
Junto uma nota dos documentos citados por Varnhagen para o
período que me interessa .
Sua afilhada continua bem e lhe manda saudades .
Do trabalho de Calogeras já está publicado o primeiro volume.
Não o mando porque tenho de fazer um artigo e meu exemplar
está aparado.
Quando torna
Saudades do
Compadre e am.º obr.
J. C. ABREU
[ 1912 )
Nota ] :
Caro compadre,
Boas saídas e melhores entradas de ano desejo-lhe neste dia, que
é o maior do nosso hemisfério .
Deve - lhe chegar, pelo vapor que esta leva, o primeiro volume do
livro de Calógeras. Dê-o a ler a alguém que possa escrever sobre o
assunto .
Vi que o Alfaia de Santos está botando abaixo a papelada da Torre do
Tombo. Dá-se com ele ? Lembre-lhe a conveniência de publicar os do
cumentos mesmo aí, onde sairão mais corretos . Se Alfaia não estiver
por isto, peço-lhe cópia da carta de Brás Cubas, agora descoberta.
Como sua demora pode prolongar -se, peço-lhe reserve uma hora por
dia, ou um dia por semana para visitar os arquivos, e tomar nota dos
manuscritos. Que há na Ajuda ? O que contêm os 300 volumes da
Symınitica (creio que assim se escreve ) de interessante para nossa terra ?
Sua afilhada manda com muitas saudades a esperança de vê -lo para
o ano no seu 14.° aniversário .
Saudades do amigo velho
C.
Rio , 21 de dezembro de 1904.
Escrevo- lhe éste bilhete só para dizer que ultimamente não tenho
tido notícias suas.
Talvez tenha recebido uma carta minha, pedindo novos documentos .
Remeti -lhe por um dos vapores passados o primeiro volume do Calo
geras sõbre as minas do Brasil; o segundo está adiantado ; o terceiro
deve sair para maio .
Nosso amigo Peixoto me trouxe da Europa um exemplar do Pere
grino da América : era o volwe 761 de um alfarrabista seu conhecido,
CARTAS A RAMOS PAZ 21
cujo nome não me acode agora . Está bem conservado, mas o sujeito é
um espertalhão : no prólogo a Nossa Senhora da Vitória faltam pelo me
nos duas páginas.
Que notícias há da segunda parte ? Não sei quem me disse que
existe inanuscrita na Coleção Pombalina.
Ainda não achei meio de conseguir o Livro de Marinharia de João
de Lisboa, impresso por Libânio .
Sua afilhada passa bem e lhe envia saudades.
Bien à vous,
Cap.
Rio, 27 de janeiro de 1905.
[Fôlha sôlta ]
Diz Varnhagen que na Biblioteca das Necessidades houve em tem
po um ms. de Frei Vicente do Salvador. Viu - o ele uma vez ; depois
não houve mais meio de encontrar - se.
São passados mais de 60 anos. Já terá reaparecido ?
Caro Compadre,
Recebi seu bilhete, e não forme mau conceito de mim , se lhe disser
que gostei de saber que não vem já.
Há tanta cousa a ver por aí ! E sua estadia pode ser tão útil !
Outro dia, lendo os Aditamentos à Sinopse Cronológica, de João
Pedro Ribeiro, encontrei duas grandes novidades :
P. 184. 1517 – abril 6. R. que se deu a João da Costa, quando foi
iescobrir terras ao Brasil.
Arq : R. Corpo Cr. p. 1 , maço 7, doc. 18.
Será possível que este documento ainda exista ? Como tem es
capado até hoje a todas as investigações ? Peço -lhe mande verificá -lo
com tôda urgência e, se existe, mande copiá -lo. Imagine como estou
impaciente. Se fosse rico, teria ido telegrama.
O outro documento deve relacionar-se com Cristóvão Jaques, com
quem tenho contas velhas a saldar.
1528. Março 25. Alvará que proibiu a saída dos navios dos portos
do Brasil antes de outubro.
Arq. R. Corpo cronológico, p. 2, maço 154, doc. 94 [à margem :
pág. 212. )
22 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
[ 1905] J. C. ABREU
CARTAS A RAMOS PAZ 23
Compadre, Am ."
Não tenho tido cartas suas nem recebido notícias. Na última, avisa
va -me que iria aquela semana à Torre do Tombo mandar fazer as cópias.
Tenho esperado por elas todos os vapores.
Um dos dias últimos do ano passado um dos proprietários do Kosmus,
empregado na Biblioteca Nacional, encontrou -me no momento psicológico
e prometi-lhe publicar lá a minha História do Brasil.
Tomei como fato consumado meu folheto sobre o descobrimento,
impresso pelo Laemmert, e comecei com as primeiras explorações. Já
sairam três artigos, o quarto está-se compondo ; desde ontem estou li
berto da terrível divisão em capitanias, o assunto mais incapaz de receber
forma apresentável que eu conheço.
Por este teor caberia em cada capítulo a narrativa de 8 anos, e
a cousa assumiria proporções descomunais. Isto será só no principio :
o quinto, sexto e sétimo abarcarão mais de quinze anos cada um, em
Pernambuco , S. Paulo e Bahia, de 1534 a 1549; depois a cousa correrá
mais depressa.
Ainda poderia aproveitar -me a carta de Brás Cubas, descoberta
pelo Alfaia, se não fôr a de 25 de abril de 1562, que já está impressa ;
e uns documentos sobre Jerônimo de Albuquerque, citados por Varnha
gen com as indicações :
Imp. em 7 de julho de 1584, III ( maço ? gaveta ? ) 20, 53.
Carta de Teles Barreto, de 7 de agosto de 1583.
Peço - lhe, pois, que dê urgência e preferência à cópia destas três
preciosidades.
Depois de publicado o 4.º artigo no Kosmos, remeterei os quatro
números, se o Visconde, a quem não vi mais depois da missa do irmão,
me disser que ainda poderão encontrá-lo no além -mar.
Minha edição de Varnhagen esteve em crise com a morte de Gus
tavo Massow , que, caladinho, deixou uns oitocentos contos. Agora o
Wittmann ( não sei se escreve assim ) está muito interessado em botá -la
para fora. Espero que nestes três meses poderei pôr na rua o pri
meiro volume.
Amanhã sigo em excursão às margens do Paraíba, desde Volta
Redonda até Pôrto Novo. Tornarei no fim do mês para trabalhar a
tôda a força durante sete meses.
Desejo resposta às seguintes perguntas :
24 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
Caro Compadre,
Escrevi-lhe por vapor passado, chamando sua atenção para dois do
cumentos citados por Antônio Ribeiro dos Santos no Suplemento à Si
nopse Cronológica um de 1517, outro de 1528 .
Na Biblioteca Nacional de Lisboa, fundo de Alcobaça, n.º 431 da
antiga século XVII - n.° 306 da moderna numeração, há uma
cópia da Vida de José de Anchieta pelo padre Pedro Rodrigues, já
impressa pela B. N. Mandar - lhe -ei um exemplar para tirar certas dúvidas.
Agora o que desejo é o seguinte : uma carta de Fernão Cardim
ao padre geral Aquaviva da Bahia, a 8 de maio de 1608 , à dedica
tória do livro, a apreciação, uma lista dos governadores-gerais, dos pro
vinciais, visitadores -gerais, escrita no principio e no fim do tal códice.
A letra é 1620 ; não precisa recorrer a copistas paleógrafos.
Desta vez irão os números do Kosmos.
Sua afilhada foi interna para o novo colégio fundado pela Deutsche
Schule. Nunca vi contentamento igual ao dela, quando saiu no primei
ro domingo: creio até que preferia passar o dia no colégio a vir para
a casa da avó .
Adeus . Saudades do C.e e am . °
J. C. ABREU
Rio, 9 de maio de 1905 .
CARTAS A RAMOS PAZ 25
Caro Compadre,
Tenho recebido bilhetes seus com promessa de ser mais extenso
em outra ocasião ou de mandar documentos em outro vapor. Até ago
ra nada tenho recebido.
Comuniquei seu recado ao Barata.
Quando começou a estudar as cousas do Pará, não fugia de des
pesas; agora, continuando com a mesma perseverança na Biblioteca, no
Instituto e no Arquivo, já anda mais apertado. É este o último ano de
senatoria ; talvez venha disso . Entretanto é rico e não tem filhos.
Estamos aqui às voltas com a eleição presidencial. Apesar de todas
as acusações justas ou injustas lançadas contra Bernardino, creio que
a eleição dêle será fácil ; mas será a única facilidade. Depois, não sei
prever o que poderá sobrevir.
Tenho folheado com bastante interesse o Arquivo Histórico Portu
guês. Ainda nada achei sobre o Brasil; estou à espera que terminem as
cartas de quitação de D. Manuel, para lê-los miùdamente e ver se serei
mais feliz.
Não posso compreender como tão pouca cousa se tenha salvado do
Brasil antes de 1535 ! A propósito : recebeu meu pedido relativo ao
Regimento que se Deu a João da Costa, quando foi descobrir terras ao
Brasil ?
O original estava na Torre do Tombo, Corpo Cron ., p. 1.º, maço 7,
doc. 18, segundo João Pedro Ribeiro, Aditamentos à Sinopse Cronológica,
p. 184.
Acabo neste mesmo instante de ver que o Arquivo Bibliográfico
da Universidade de Coimbra começou a publicar um ms. jesuíta, muito
curioso , intitulado De Algumas Cousas mais Notáveis do Brasil. Saiu
nos números 1 , 3, 7, 8, 11 do ano passado, 2 deste ano .
Peço -lhe dois obsequios: 1.° : influir, se puder, para que terminem
a impressão, a que já deve faltar muito pouco ; 2.° : comprar -me os
números indicados e os que hajam saído depois do 4.º do corrente
ano, último chegado à Biblioteca, se contiverem a conclusão ou a con
tinuação.
Apenas percorri ligeiramente o trabalho do jesuíta, cuja existência
só hoje fiquei conhecendo, mas encontrei algumas novidades e com mais
atenção espero encontrar outras. Infelizmente à coleção do ano passado
falta o número 7.0.
Estamos aqui no inverno, mas o calor não nos deixou . Anteontem
choveu ; ontem , era engrossamento ao Coquelin , a temperatura baixou e
continua.
26 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
Barata, que acaba de sair, diz que suas dúvidas são a respeito do
bom estado do manuscrito e de serem originais ou cópias.
Duvida que sejam originais, pois estes consta - lhe estarem na Biblio
teca do Pôrto .
Comprar cópias caras não vale a pena, pois as obras já estão impressas.
Verificado que são originais e o estado é bom , não terá dúvida em
remeter-lhe o dinheiro.
Compadre e amigo,
Preciso com urgência saber quantas edições teve o Peregrino da
„América, quando foi publicada a primeira e quando saiu a última.
Não me espere na próxima semana, pois que Vieira Souto está recla
mando a conclusão do trabalho e eu ficarei doente, se não me livrar de
semelhante amofinação .
Bien à vous,
C. DE ABREU
3/2/907.
Caro Compadre,
Recebi os documentos mais a carta do Pons.
Peço-lhe escreva, dizendo que comece desde logo a cópia, semanal
mente remeta o copiado, juntamente com a nota da despesa. Agora, com
o incêndio do Laemmert, posso esperar os documentos.
Vou passar uns dias em Sobragi , Minas. Na volta creio poder -lhe
entregar um exemplar dos Capítulos de História Colonial.
Bien à vous ,
C. DE ABREU
Petrópolis, 21 de setembro de 1907.
Caro Compadre,
Escrevo-lhe a correr, de Honório Gurgel, estação da E. F. de Melho
ramentos.
Amigo Domingos,
Alegrou -me que a minha crítica lhe tivesse sido agradável . Tinha
consciência de ter sido justo, mas, não podendo ser bastante explícito, ao
mesmo tempo temia que, no modo breve por que fui obrigado a tratá - lo , V.
não visse qualquer cousa que ofendesse aos seus interesses.
A sua carta suscita bastantes questões, sobre que não me acho habili
tado para escrever, discutindo-as. Pergunta-me se não há casos em que
à moralidade a mais pura se une a inteligência a mais bronca ? Há
porém casos elementares. Casos complicados, que exigem o peso dos mo
tivos e em que há complicação e conflitos de direitos, parece-me que não.
Entretanto, há ocasiões em que se não pode dizer de que lado está o bem ,
de que lado está o mal. Na sua penúltima obra, Data of Morality,
publicada em setembro ou outubro, Spencer cita alguns. Acresce que a
alma é um organismo: as diferentes faculdades coexistem na dependência.
Para que a cultura seja completa é preciso que se cultivem todas as fa
culdades ao mesmo tempo .
Pede-me indicações sobre a educação intelectual. Em uma carta que
lhe dirigi talvez no mesmo dia em que V. me escrevia , indiquei-lhe os livros
de M.me Pope Carpentier, muito interessantes e instrutivos. Indicar-lhe-ei
também , por não saber se já conhece, L'Éducation de Bani, o eminente
psicólogo ; L'Instruction Publique, de Michel Bréal, o eminente higienista ,
Histoire des Théories de l'Éducation , por Compayré, que dizem ser muito
bom .
Chamo a sua atenção principalmente para as lições sõbre os objetos.
Há um livro que lhe deve ser muito útil : é uma psicologia do menino
durante os três primeiros anos. Não me ocorre agora o nome do autor,
30 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
que se não me engano é Perez ; mas consta que o livro, como coleção de
dados e observações, é muito curioso.
Uma cousa sõbre que chamarei a sua atenção é o estilo. V. precisa
torná-lo mais claro e mais correto . Em um livro como a Arte de Formar
Homens de Bem o defeito não destaca ; mas, se V. escrever uma obra mais
literária , há de lhe fazer grande mal o prevenir o leitor contra.
Regozija -me muito a aceitação que tem tido o seu livro. Ele o merece .
Ocupe-se da educação intelectual; dê um caráter mais científico à educação
moral; modifique o estilo, que o sucesso , em vez de decrescer, irá gra
dualmente aumentando .
Obrigado pelo que diz dos artigos de História pátria. Infelizmente vão
se alongando de tal modo que não sei mais onde irei parar. A principio
era a minha intenção escrever apenas 4 ; mas agora dar -me -ei por muito
feliz se bastarem 6. Eu que os escrevo contrariado, porque os 6 meses
que tenho escrito na Gazeta ainda não me tornaram nem mais fácil nem
mais aprazível a tarefa !
Recomende -me à família , a Lucas, e disponha de inim .
J. CAPISTRANO
B. N. , 15 de março de 1880 .
Recebi hoje um cartão teu , e, para ser franco, não gostei nada : primeiro
porque não tinha ido antes ver-te, segundo porque não me encontraste
em casa .
Não te procurei ainda porque não sabia onde estavas.
Disse-me Tristãozinho que estava em S. Teresa ; mas em que hotel ?
Disse -me depois o Dr. Derby (que está muito teu amigo e que a ti
quase exclusivamente atribui a grandiosa idéia da Comissão Geológico
geográfica ) , que tinhas falado em ir para Petrópolis.
Nosso patricio Dr. Nascimento disse-me que estavas em Riachuelo.
Entre as três versões hesitei tanto como nosso patricio Rodrigues, ou
o burro de Buridan .
Dirás que nada mais fácil do que ir à Câmara certificar-me. É exato ,
mas se för à Câmara uma vez sou capaz de ir todo o ano. Prefiro só ir
lá em último recurso .
Além disto, tenho estado muito ocupado com uns livros, de que bre
veinente te mandarei um exemplar.
CARTAS A DOMINGOS JAGUARIBE 31
Amigo Domingos,
Caro Domingos,
Fui hoje ao hotel de S. Teresa, onde pretendia deixar a carta junta
se V. estivesse na cidade e por qualquer motivo eu não o encontrasse.
Lá me disseram que pelo menos desde o dia 10 você não estava
mais lá, o que não sei como combinar com o que me disse Silvio assegu
rando -me anteontem ter estado com V. muito poucos dias antes .
Escrevo - lhe para comunicar que pretendo partir para S. Paulo na
próxima semana : dê-me, pois, seu endereço exato para eu telegrafar.
Vou com a minha filha e Abril .
Meus respeitos a ex.ma família .
Seu
João C
Rio, 23 de novembro de 1898 .
32 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
Velho amigo,
Domingos,
6 - 1:
34
CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
Quantos netos ?
Como vai Camarguinho ? Lembro -me dêle sempre com saudade.
Adeus ! Adeus! Talvez até para o ano !
Sempre o velho amigo
JoÃO
Rio, 1 de novembro de 1902.
Caro Dominguinhos,
Sua carta foi dirigida para aqui na ocasião em que estava no Rio.
Por isso involuntàriamente deixei de dar-lhe resposta imediata.
Na livraria Garnier encontrei alguns canudos mandados pela Comissão
Geológica. Faltou -me tempo para abri-los e verificar quem os mandava
Sei agora que o devo a V. Enquanto não o posso fazer diretamente, pe
ço-lhe agradeça em meu nome ao diretor. E a V. muito obrigado pela
lembrança .
Meu trabalho sobre a língua de uns indios do Juruá está chegando ao
fim. Já começou a composição tipográfica, e espero não passe além de
março . Será uma verdadeira carta de alforria. Há quase um ano não
faço outra cousa, e não sai como desejava, porque seria preciso pessoa
mais competente.
Compreendo a fascinação que sobre seu espirito exercem colonização
e imigração, seus velhos amores ainda do tempo de estudante. Mas para
que V. há de entrar nisto agora ? Planos não faltam ; faltam bons imi
grantes, faltam bons chefes de colônia, faltam terras próprias para
culturas de gente branca, falta enfim a noção de que o Brasil não
irá por diante enquanto o café reinar, e não tratarmos de nossa alimen
tação com os próprios recursos. Por isso a Argentina prospera e o Brasil
marca passo .
Melhor que tudo seria V. dedicar -se a um plano que vi umas vezes
em papéis velhos seus, e é o melhor de quantos V. tem concebido. Lem
bra -se ainda do pão dos pobres ? Comece V. só com sua gente, lance bem
a semente, não se apresse, e verá a bela árvore que nasce e pode ver o
arvoredo que há de medrar.
Tenho tido uma vontade de ir a S. Paulo, uma saudade de você e
dos seus !
Talvez em janeiro acompanhe o ministro a Itapura. Falaremos então.
36 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
Caro Dominguinhos,
Mostrei tua carta a Amarante. Disse -me que ia te escrever ; não sei
se com suas atrapalhações já o terá feito : faço-o agora.
No dia marcado, estive no cais para irmos a bordo, abraçar Camar
guinho. O vapor chegou mais cedo do que pensava , ao chegar já não
ie encontrei e vi a praça tão atravancada de gente – republicanos portu
guêses, como soube depois, à espera de Alexandre Braga – que depois de
algum tempo me retirei .
Sinto muito não abraçar Camarguinho, de quem tanto gosto. Ainda
me lembro da primeira vez que o vi , logo depois de teu casamento . Estava
tão satisfeito ! parecia tão feliz . Confiava em ti e não se enganou . Ainda
me lembro das palavras do Eduardo Prado.
Recebi o número do Estado de S. Paulo : vou lê-lo com toda a atenção
que o assunto merece. Parece que Teodoro Sampaio escreveu também
algo que ignoro. Vejo que vão proceder a escavações.
Muito gostarei que Sampaio, alheio às questões havidas, de que não
tenho conhecimento senão vago, consiga acabar as divergências e reviver
a Revista do Instituto Histórico dai; que já tem prestado não poucos
serviços.
Não sei se já te comuniquei que no incêndio da Imprensa Nacional
queimou-se todo o meu livro. Os textos deviam acabar na página 460.
Na véspera revira até 450.
Salvei um exemplar que com as provas está completo ; há três na
Alemanha até p . 384 ; outro na Espanha, até 272. Eis todo o resultado de
quase três anos de trabalho.
Falei na Bibl . Nac. para ver se seria possivel fototipá-lo : não é, com
os recursos normais do estabelecimento .
DOMINGOS JAGUARIBE
CARTAS A DOMINGOS JAGUARIBE 37
Nosso patricio Dias Martins falou com Pedro de Toledo para mandar
reimprimi-lo na tipografia de Estatística. Toledo concordou que sim ,
quando o Diário Oficial sair de lá, isto é, dentro de um ou dois anos .
Vou pensar em outra cousa .
Espero -te até o fim do mês , como prometeu.
Lembranças a D. Mariquinhas, Camarguinho, todos, todos.
Um abraço do amigo velho
João
Rio, 24 de setembro de 1911 .
Sá não recebeu teu livro ; mora : Humaitá, 306 .
Caro Dominguinhos,
Só ontem me encontrei com Chiquito Sá, secretário de Calogeras,
cujas informações, em resumo, são as seguintes:
A Companhia, depois de organizada, requereu prorrogação de prazo ,
que lhe foi concedida. Depois pediu nova, que Edwiges negou . Igual
procedimento teve Calogeras em dezembro, quando a Companhia pediu
reconsideração do despacho .
Há duas hipóteses agora : rescisão ou novação do contrato . Para
esta não sei se o ministro estará autorizado.
Chiquito prometeu -me nota mais explícita, que incluirei se chegar
a tempo .
Espero que não tenha metido ainda dinheiro neste negócio que não
me parece bom . Por isso foi que lembrei -lhe a conveniência de ouvir
principalmente seu advogado. Sei como V. é um coração levado sempre
por impulsos generosos ; sei que o mundo anda cheio de exploradores.
Se V. quiser vir, será naturalmente mui bem recebido. Telegrafe-me
então. Falaremos primeiro com Chiquito, porque dispõe de mais tempo e
por ele V. será bem orientado ; depois se entenderá com Calogeras mais
ràpidamente.
Falei anteontem com Miguel na conferência do Fazenda 1 no Instituto
Histórico. Ainda não sabe quando ira ; se eu fôr, nem poderei levar Ma
tilde nem ir aos Campos -do -Jordão nesta época .
1. Vieira. Fazenda .
38 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
Caro Dominguinhos,
Quando fiquei sabendo que V. tinha descido dos Campos levando
Clotilde e as meninas, logo pensei que não tornariam mais para as alturas.
Ficou-se no seu jucundo bosque, tanto mais encantador quanto é obra do .
Dominguinhos,
Acabo de ver no Inst . Hist. três volumes com as atas da Câmara de
S. Paulo e S. Amaro da Borda do Campo.
A publicação é do Arquivo Municipal de S. Paulo.
Pode V. me arranjar com urgência ?
Já hoje lhe escrevi longamente.
Saudades do amigo velho
João
Rio , 4 de março de 1915 .
Caro Dominguinhos,
Fiquei muito satisfeito de saber que V. tinha-se separado da tal so
ciedade. Aquilo começara mal, desonestamente ; não podia mudar de
natureza. Julgar -se alguém enfermeiro que lida com pesteados e não
apanha contágio sucede às vezes ; mas é melhor procurar companheiros
sadios e ares mais puros.
Calógeras sondou o governo do Ceará sõbre a emigração de cearenses
para o sul : a resposta foi que não aconselharia tal, para não despovoar
o estado. Com a falta de dinheiro existente não sei como se poderá
40 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
Caro Dominguinhos,
Remeti com a maior urgência o livro que V. pediu, deixando escre
ver -lhe para depois. Desculpe a demora.
Já três vezes visitei Clotilde e Maria José : duas estive com a viúva
do saudoso Leonel. Está velha, não a reconheci, nem poderia, porque só
a vi poucos dias depois do casamento, dormindo e almoçando em sua casa.
Acabo de ler nos jornais que a filha casou, com um grego, segundo parece
do nome .
A algumas pessoas do Ceará tenho dito que V. tem trezentos e tantos
lotes já demarcados, que cede em plena propriedade aos retirantes que
quiserem ocupá-los. Até aqui nada se podia fazer, porque o governador
se opunha à imigração. Li, porém , que o governo vai facilitar as pas
sagens. Talvez seja própria a ocasião de V. telegrafar a Calógeras, repe
tindo o oferecimento, e pedindo permissão para nomear o patronato
cearense em que pensou e para o qual Bevilacqua e creio que Samico decla
raram - se dispostos a concorrer.
Depois disto conviria que V. desse um pulo aqui para encaminhar
melhor as cousas .
CARTAS A DOMINGOS JAGUARIBE 41
Caro Dominguinhos,
Acabo de receber sua cartinha.
Andava com saudades e ia escrever-lhe a pedido de nosso patricio
Medeiros que foi ao Ceará buscar a família .
Ele deseja que lhe sejam reservados três ou quatro lotes em Itanhaém .
Causou -me surprêsa muito pouco agradável saber que V. ainda con
tinua com dores reumáticas. Como a medicina é falha e impotente ! Por
minha parte, este ano tenho sido poupado, exceto logo à chegada de M.
Grosso, mas por um ou dois dias.
Acho que V. deve abrir mão da idéia de capital nos Campos-do
Jordão. No planalto central está com certeza ser assim , dentro da letra
da Constituição ; dentro do espírito não está, porque a constituição exige
um ponto central, de fáceis comunicações para o país inteiro, e este só
pode ser encontrado em M. Grosso e Goiás, na divisora das águas entre
o Amazonas e o Prata .
Mas isto é o menos ; a verdadeira questão é financeira.
V. não pode imaginar a que ponto ficamos reduzidos, porque nunca
freqüentou república de estudantes quebrados e caloteiros.
Com a guerra piorou tuciu, e quem sabe quando acabará isto ? Depois
da guerra a cousa será pior, porque a reconstrução européia será a maior
empresa que jamais se iniciou e de lá não podemos esperar nem dinheiro,
nem capitais.
A Inglaterra , acostumada a ver touros de palanque, e confiar seus
destinos a mercenários pagos com seu ouro inesgotável, está vendo que a
era nova não tem paralelo possível com a revolução francesa , em que
ela trouxe a espada desembainhada durante vinte e cinco anos, em todas
as partes do mundo.
42 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
Caro Dominguinhos,
Recebi sua carta .
Ainda não vi Rolinha e nos últimos dias não tenho estado com
Clotilde nem outra pessoa dos seus.
Parece que não é das mais felizes a idéia de fazê-la morar nos
Campos. Fica muito longe e sobretudo muito isolada. Por ora reina a
paz naquelas alturas, mas de um dia para outro quem sabe que poderá
suceder ? Conversei ligeiramente com um filho dela, empregado no Te
légrafo, e deixou a mais favorável impressão. Se Clotilde e Maria José
se emancipassem do terrível João Nogueira, poderiam morar todos juntos:
seria ouro sobre azul.
CARTAS A DOMINGOS JAGUARIBE 43
Não sabia que V. tinha comprado tanto gado para os Campos. Sempre
impulsivo ! V. já garantiu folgadamente o futuro de sua família ; para
que correr novos azares ? Sua vida tem sido um trabalho constante .
Por que não descansa agora ?
Tenho pensado que V., já que não pode estar ocioso, poderia publicar
um volume de documentos para a história de S. Paulo. A Bib. Nac.
recebeu o catálogo de uns existentes em Portugal, não só desconhecidos,
como inéditos. Com uns 100 $ mensais durante o tempo que V. quisesse,
poderiam se obter cópias suficientes : eu o ajudaria na escolha do material,
correção de provas, anotações, etc.: poderia ficar terminado o volume lá
para o meio do próximo ano. Se V. visse que agradava a idéia, poderia
publicar mais algum .
Anteontem acompanhei a bordo Martim Francisco que embarcou com
a senhora para a Europa. Conta fixar -se em Montreux e prometeu não
voltar sem trazer o livro sôbre a família, em que há tanto tempo pensa .
Contristou -me a possibilidade de D. Mariquinhas não querer tornar
à serra . Deu - se lá tão bem !
Não tenho notícias do Assis Brasil, mas duvido que ele venha agora
por cá : geralmente prefere o inverno. Para o ano , Guimarães Natal vai
passar as férias em Pedras Altas : pretendo ir, ou se fôr antes, voltar
com ele .
Estou às voltas com meu trabalho sobre a lingua bacairi; não sei
se, depois de vinte anos, ainda serei capaz de dar conta da mão.
Saudades a boa D. Mariquinhas, filhas, genros, netos.
Um abraço do velho amigo
JOÃO
Rio , 24 de setembro de 1915 .
Caro Dominguinhos,
Não tenho à mão a carta do seu amigo de Itapetininga, e não posso
responder com precisão ao que ele deseja.
Diga-lhe que em 1912 publicou-se em Paris :
H. Beuchat, Manuel d'Archéologie Américaine, por onde poderá
orientar -se .
Fomos ontem visitar laiá, mas só encontramos Chiquito e Leonel.
Que há de decidido sobre Campos-do - Jordão ?
44 CORRESPONDÊN DE CAPISTRANO DE ABREU
CIA
*
Caro Dominguinhos,
O suicídio do Derby não foi para mim menor surpresa que para V.
Últimamente só por acaso nos encontrávamos, em conversas rápidas. Sabia
que andava aborrecido com a repartição e com o ministro porque Arrojado
me dizia. No dia 18 foi a S. Paulo assistir à formatura do Colégio Macken
zie ; no dia 20 veio, apesar de tôdas as instâncias e muito calado, segundo
conta um companheiro de viagem .
Seria resolução súbita, ou idéia longamente amadurecida ? A cir
cunstância do banho, do café, da leitura dos jornais, de já estar de calças ,
gravata e botinas inclina à primeira hipótese.
Não deixou, pelo menos não foi encontrada até agora declaração
alguma. Consta, porém, que a pessoa de sua intimidade vagamente deu a
entender qualquer cousa .
O suicidio foi às 10 horas ; creio que por intervenção de Calmon a
polícia dispensou a autópsia e o transporte para o necrotério. O entêrro
fez-se à tarde ; nem assisti a ele nem vi o cadáver, porque não houve
tempo.
Lembro -me que há alguns anos Eduardo Prado calculava a fortuna
do Derby em 80 contos. Conheço um amigo a quem emprestou 20, que
lhe foram pagos ; com outro , hoje morto , gastou outro tanto . Agora
disseram -me que sacrificara tudo em uma mina dirigida por um irmão
nos Estados Unidos ; a mina deu mau resultado e o irmão suicidou-se há
alguns anos. Também me disseram que tomou sete contos e tanto num
banco para pagar as estampas de uma obra, que o gravador alemão não
quis entregar sem primeiramente receber o dinheiro. () governo pediu à
Câmara um crédito para pagar o adiantamento ; o projeto figurou na
ordem do dia e depois desapareceu ; não sei se foi rejeitado, ou apenas
CARTAS DOMINGOS JAGUARIBE 45
Caro Dominguinhos,
Respondo a sua prezada carta , recebida ontem .
Assis já lhe escreveu a respeito de seu cabeçalho , com o qual não
parece estar muito de acordo.
A 2.a edição do T. Sampaio foi impressa ai ; ai deve morar o editor,
por isso lhe pedi um exemplar ; creio que não o terá na Bahia.
Quinta, 17, voltamos de uma excursão, começada uma semana antes,
que nos levou a Alegrete. Passamos dois dias em S. Gonçalo , antiga
estância de família, hoje ocupada por Paulo, irmão do Assis e muito
simpático. Assisti a um rodeio de mil reses, à domação de dois poldros
brabos e vi como se tonia de cuia e bomba o tal mate chimarrão, não sei
quantas vezes por dia.
De S. Gonçalo, que fica adiante de S. Gabriel, fomos por Cacequi a
Alegrete, depois de passar pela ponte do Santa Maria, que dizem a
maior da América do Sul, de quase dois quilômetros, o comprimento da
Avenida Rio Branco. De carro fomos a Ibiapuitã, cerca de cinqüenta
quilômetros, aonde Assis possui grande extensão de campo -- mais de
iegua e meia que agora trata de situar com gado. Para começar já
estão trezentas cabeças de gado Devon.
Lá moram uns parentes muito distintos, cujo chefe, um calabres, cha
mado Milano, veio para o Brasil sem saber ler e tocando harpa de ouvido.
Depois de aprender a ler no Rio, veio para estas bandas, largou a harpa
para mascatear, tornou - se negociante, casou - se com uma prima do Assis,
e concorreu muito para que à família viesse uma herança, que é a base da
46 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
abastança de tóda ela. A maior parte do terreno que nosso amigo possui
em Ibiapuită vem daí.
O velho Milano tem três filhos, dos quais dois advogados em Alegrete,
outro estabelecido na estância : são rapagões sacudidos, todos casados e
bem estabelecidos. O velho não trabalha mais ; fez partilha em vida e os
filhos entregam -lhe dezesseis contos anualmente que ele gasta como en
tende, isto é com muito critério e fazendo muito bem .
Em parte de nossa excursão acompanhou -nos Amaro, filho de Barto
lomeu , irmão de Assis, hoje falecido, de quem fui muito amigo. Com
êle combinei ir a Pôrtɔ Alegre, em meados de março. Por isso não
demorarei em Santos : tomarei o último vapor de março que för ao Rio
diretamente. Espero que D. Mariquinhas dê-se bem em Petrópolis com o
tratamento . Lembranças a ela e a todos.
Um abraço do velho amigo
JoÃO
P. A., 20 de fevereiro de 1916.
Dominguinhos amigo,
Causou -me verdadeiro prazer a notícia de que o inventário correrá sem
embaraços. D. Mariquinhas foi previdente e foi justa, reconhecendo tudo
o que V. fêz por ela e pelo Camarguinho durante mais de trinta anos.
João foi justo e atilado. É natural que Benvinda reconheça a superioridade
com que vocês agiram e de uma vez se tenha libertado das más ilhargas
que podiam prejudicá-la .
Conversei ligeiramente com Miguel, chamando -lhe a atenção para a
proximidade do vencimento da letra. Prometeu providenciar sem demora.
O negócio do carvão ainda não está de todo liquidado, mas disse Alfredo
Pinto, um dos diretores da Companhia, hão de vencer.
A sr.a do Arrojado pretende ir sábado a S. Paulo, assistir ao casamento
de uma amiga. Ele a acompanhará para dar um pulo ao Rio Claro. Res
pondeu a Martim Francisco ? Nunca me passou pela idéia ; escrevi-lhe
uma carta que deve ter chegado à Europa depois que ele partiu e aqui
conversamos longamente. Parece que afinal ele escreverá o livro : pela
CARTAS A DOMINGOS JAGUARIBE 47
conversa da senhora parece que virão residir aqui. Nada pode haver
melhor.
Até lá ou até cá .
Um abraço do amigo velho
JOÃO
Rio, 23 de junho de 1917.
Dominguinhos amigo ,
Dominguinhos amigo,
Vi nos jornais a tragédia da Vila Jaguaribe. Só mais tarde soube do
incêndio em tua casa.
A vista disto não irei mais a São Vicente.
Partirei para S. Paulo no dia 20 , num trem especial , com Aguiar
Moreira e voltarei com ele.
Meus negócios em poucas horas ficarão arranjados.
Lembranças e um abraço do amigo velho
João
Rio, 17 de junho de 1918.
Dominguinhos amigo,
Dei o recado a Manuel, que desculpou -se com a inultidão de afazeres,
que lhe não dava tempo nem para abrir as cartas.
48 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
Dominguinhos,
Acabo de receber tua carta de bom e velho amigo.
Tu o conheceste bem, mas não o conheceste bastante, nem seria pos
sível se não o visses durante muitos anos, todos os dias.
Enfim, foi feliz : nunca fêz a ninguém mal, fêz bem a muita gente, tor
nou felizes todos os que de perto o cercaram , escolheu companhia condigna e
os dois se adoravam e não deixaram degredados para este vale de lágrimas.
Do que fez por mim , quanto lhe devo não posso falar. Do que fiz
por ele deu -me testemunho numa carta para o Juazeiro, no rio S. Fran
cisco, escrita do leito de enfermo, em que me dizia : V. é o único verda
deiro que tenho neste mundo. O mesmo disse à mulher, que mo repetiu.
Agradeço o convite que me fazes para morar contigo, mas eu vou
para Pedras Altas a 10 de novembro e lá ficarei enquanto o frio der
licença.
A amnizade nunca perde seus direitos e antecipe meus parabéns pelo
próximo aniversário. Muito mais alegre o tivemos há dois anos ; o do ano
passado não foi triste : esperemos melhores tempos.
Lembranças a Flora, Ekmann , a Laura e ſilegível ] .
Abraça-te o velho amigo
João
Terça- feira , 29 de outubro de 1918.
A DIVERSOS – 1880-1927
23 de julho de 1880 .
Dear Sir 1,
Cabral pede-lhe que, sabendo -o, diga quais os verdadeiros nomes que
se encobrem na lista inclusa .
16 de julho de 1885 .
Aly dear,
My dear,
Escrevo-lhe esta carta para dar-lhe um incômodo. Preciso , para
um trabalho que me pediram , de um relatório do finado Luis Couty ,
CARTAS A DIVERSOS 51
Lino 1 ,
Mas o que sobretudo espero do livro é que seja uma crônica. Pri
meiramente, nós as temos em número tão limitado ! Depois, documento
avulso não dá a vida, nem o movimento, quando a crônica não exista.
Peço-te, pois, amigo, que nas tuas investigações especialmente te apli
ques a crônicas e descrições geográfico-históricas. Na vida de D. Duarte
de Ramos Coelho indicam -se algumas, entre as quais uma sõbre os
holandeses na Bahia, de Tácito, que deve ser Fr. Manuel Calado, autor
dy Valeroso Lucideno, muito dedicado à família de Bragança e seu anti
go vassalo antes da exaltação ao trono.
Peço-te também não esqueças o exemplar de Fr. Vicente do Salva
dor, que Varnhagen afirma ter deparado uma vez na Biblioteca da Aju
da e nunca mais revisto . Quem sabe se lá não estarão os capítulos
que nos faltam !
Teixeira de Melo, que foi passar fora a semana, pedir-te-á cópia
de uma carta do padre Andreoni, escrita em latim , existente ai na
Biblioteca Nacional, relativa à morte do padre Vieira, e escrita uns três
ou quatro dias depois de sua morte. É urgente, e bom , que comeces
logo. Diz Eduardo Prado que em Evora há uma tradução em portu
guês, devida a um padre Fonseca , se bem me lembro . Convém que
também venha logo, porque o volume em honra de Anchieta e Vieira
deve estar pronto em julho.
Adeus ! Estimo tanto que continue bem o que começou sob tão
bons auspícios !
Saudades do teu
CAPISTRANO
mente ; outras, cuja causa não conseguira descobrir, ficaram agora elu
cidadas.
Há um ponto em que não creio que a razão esteja de seu lado :
é quando afirma que a atual Fortaleza está no mesmo local em que a
plantou Martim Soares e que conquistaram os holandeses. Para mim é
fora de dúvida que a Fortaleza antiga era no rio Ceará .
Há de se lembrar que no século passado houve uma luta entre
Fortaleza e Aquirás e que esta foi declarada a vila mais antiga da
província. Não seria portanto para o Aquirás que mudou -se o antigo
estabelecimento de Martim Soares, talvez conseqüência de lá terem feito
colégio os jesuítas ? Estabelecida aí a vila, algumas dessas começaram
ou continuaram a residir na atual Fortaleza, que tinha a vantagem do
pôrto. Começou então a desenvolver-se, a prosperar ; acendeu-se a riva
lidade entre os dois lugares, deu-se enfim alguma coisa que não deixa
de ter suas semelhanças com a Guerra dos Mascates em Pernambuco.
Outra coisa em que também não me parece que a razão esteja do
seu lado : diz que a gente da Bahia foi ao Ceará pelo Cotinguiba. Onde
encontrou esta afirmação ? Do Cotinguiba ao rio S. Francisco a passagem
não me parece fácil, mesmo hoje, quanto mais naquele tempo. Quanto
ao aproveitamento do riacho da Brígida e do rio do Peixe estamos em
perfeita harmonia de opiniões.
Neste mesmo capítulo diz que a gente de Pernambuco foi por Pe
nedo e Pôrto Calvo . Não creio : pelo Pôrto Calvo e por Penedo talvez
ainda hoje não haja caminho para o Ceará, quanto mais naquele tempo.
Insisto com especialidade neste ponto porque ele interessa a um
trabalho que tenho entre mãos e para o qual pode ajudar-me bastante :
é o das estradas antigas.
Já conheço a estrada de Aracati ao Crato e daí pelo rio São Fran
cisco à Bahia. Conheço também a estrada do Crato para Oeiras. Sei
vagamente da estrada de Sobral ; mas o resto ignoro. Pode dar-me
alguns esclarecimentos ? Meu trabalho deve abarcar todo o Brasil : já
conheço as estradas de Maranhão, Piauí, São Paulo, Goiás, Rio Grande
do Sul, Mato Grosso. Como vê, ainda me falta muito : portanto tudo
quanto souber a este respeito é favor comunicar-me.
Um assunto em que tocou ligeiramente no seu trabalho, e que seria
bom que desenvolvesse alguma coisa, é o das sesmarias.
É possível que não tenha estudos e documentos relativos ao assunto .
Diga-nos, pois, o que souber; mas faça-o com brevidade, porque nestes
três anos Araripe vai dar- nos a segunda edição, muito melhorada e au
54 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
Dr.1
Bien à vous,
J. C. DE ABREU
Colônia Alpina, 22 de fevereiro de 1893.
60 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
Dr. ,
J. CAPISTRANO DE ABREU
Colônia Alpina, 8 de março de 1893.
publicação. Caso aí não os haja, pedir - lhe -ia que os mandasse vir com
urgência pelo correio : a casa Laemmert, para estas encomendas, é muito
boa, e se encomendar ao Gustavo que seja expedito, poderemos tê-los em
menos de dois meses .
estude os textos, cada vez acho mais obscura. Gurunas, apiacás, mundu
rucus e maués representam outras migrações não menos obscuras e antigas.
Ao N. do Rio Grande do Norte, acompanhando o litoral até o Amazonas,
os tupis só chegaram depois de descoberto o Brasil. No alto S. Francisco,
pelo menos na margem esquerda, creio que não havia tupis, que só apa
reciam nos confins da Bahia, Piauí e Pernambuco. Os ibirajaras, de que
tantas notícias vagas se encontram , pendo a acreditar que eram os caiapós.
A respeito dos guianas posso garantir com toda segurança que eram
tupis. Em S. Paulo julga-se geralmente o contrário, porque acreditam
numas histórias que Frei Gaspar da Madre de Deus andou inventando, e
que não têm o mínimo fundamento . Se V. S.a ler Hans Staden verá
que ele, que esteve em S. Vicente, e depois prisioneiro dos franceses,
digo, dos tupinambás, ou tamoios, não confunde os guianas com outra
nação.
Infelizmente êle cita, e o mesmo fazem Léry e Thevet, uns carajás,
que evidentemente não são os de Goiás, mas cuja procedência não se
explica. Podiam ser os puris ; Cardim informa que os carajás tinham
vindo, corridos do norte, havia pouco tempo ( 1584 ). Os puris, segundo
me informou alguém que estêve entre eles, possuíam grandes rêdes, em que
dormiam quatro e cinco pessoas. Rêdes semelhantes encontraram os ho
landeses entre os índios de Pernambuco .
breve partirá para nosso Estado, que é o Ceará, que fizesse uma coleção
de conchas de água doce e ele prometeu -me. Não o deixarei esquecer -se.
E sempre às ordens, subscrevo -me com toda consideração.
De V. S.a
adm.or at.° e obr.',
J. CAPISTRANO DE ABREU
Rio, 26 de agosto de 1895.
Urbano ,
Jansen
A Revista do Instituto Histórico de 1866 traz na parte primeira um
longo artigo intitulado Descobrimento de Minas Gerais. Saiu anônimo,
mas não há dúvida quanto ao autor : Diogo Leite Pereira de Vas
concelos 2
A Biblioteca Nacional possui uma cópia ; o último capítulo, a que
o autor se refere e que o Instituto não publicou, provavelmente por faltar
a seu códice, já está hoje impresso na Revista do Arquivo Mineiro.
Pág. 62, diz o autor : " observações com que fixei as memórias que
correm manuscritas dos reais direitos que os soberanos têm percebido da
Capitania".
Isto traz -me à lembrança um Manuscrito encadernado, formato entre
12.° e 8.°, pertencente à coleção Carvalho, impresso no Diário Oficial de
1892, creio que em fevereiro, no tempo em que Vicente de Sousa era
o diretor. Não será este o trabalho a que o autor do Descobrimento de
Minas Gerais se refere ? Trata da história do quinto.
As datas combinam , porque Vasconcelos escreveu o Descobrimento em
1807 ( v. pág. 64), e a história do quinto é aproximadamente deste tempo .
V. pode fàcilmente fazer os cotejos necessários e chegar a conclusão
definitiva.
Escrevi-lhe esta carta da fazenda do Paraíso, às margens do Paraíba.
Vem-se aqui pelo Pôrto Novo do Cunha; mas a fazenda pertence ao Rio
de Janeiro , no município do Carmo, se estou bem informado.
Meus respeitos à ex.ma sr.a
Até breve, abraça - o
J. C. DE ABREU
Paraíso , 27 de maio de 1901.
8 - 1.º
66 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
C.e [ compadre] ,
E diga que é pontual, infalível! Procurei Domício , e não o encon
trei. Fui às 11 horas. Tinha saído às 9. Amanhã, se fôr mais cedo,
talvez tenha dormido em Petrópolis. Estou com o pressentimento de que
irá embora, sem que eu o veja.
E como vai o Senado ?
E quando desce ?
C.
Rio, 5 de maio de 1911 .
entrada antes para o rio das Velhas que para o rio Grande, mais para o
sul que para o norte.
Permita -me algumas observações sõbre outros pontos.
Por que chamam Espinhosa de egresso ? A palavra tem sentido muito
restrito e aplica -se a quem retirou -se de um convento . Não me consta
que este tenha entrado em alguma ordem. Deve ser êle o mesmo mo
rador de Pôrto Seguro que auxiliou Navarro na tradução das rezas para
a língua -geral: não tenho à mão a carta de Nóbrega ou algum compa
nheiro que a isto se refere, porém prometo enviar - lhe a nota , apenas a en
contre. Não creio que jamais fosse ao Peru. A carta de Navarro não
foi mandada ao Padre Nóbrega, porém aos irmãos de além -mar, como se
evidencia das primeiras linhas.
Para verificá -lo reli mais uma vez a carta , e com maior prazer que
nunca .
Creio que nova leitura lhe daria outras indicações e suscitaria
novos problemas. Por exemplo : qual o rio que navegaram ?
Permite ainda uma observação ?
Acho excesso de notas : umas são dispensáveis, porque melhor fica
riam fundidas no texto , outras caberiam melhor em uma história geral,
que em monografia .
Como vê, li - a com todo o cuidado de que é digna sua contribuição
para a história pátria.
Já que está-se ocupando de roteiros, não esqueça o de Antonil : foi
reproduzido na Rev. do Arq. Min .
Aqui fico sempre às suas ordens e pode dispor francamente dos
mínimos préstimos do
Admirador e amigo obrigado,
C. DE ABREU
Rio, 20 de setembro de 1915.
D. Luísa, 145 (Glória ).
Por eles poderás ver o caso das aldeias, que é o que me interessa.
Consulta também o livro de Vaz Amaral [ ? ] .
Bien à toi,
C. A.
30 de junho de 1918.
Sapientíssimo,
Ao chegar encontrei sua carta-bilhete, que me deu muito prazer.
Não vi Kipling nem de longe. Como se interessava por tatu, traduzi
do caxinauá uma história de tatu, esperando saísse a tempo dêle poder
conhecê-la. Se sair algum dia peço - lhe que a traduza e veja meio de
chegar a seu destino : não é longa.
Responder a sua carta não é fácil . A maioria das peças represen
tadas era de origem francesa. O teatro teve certa animação no tempo
de João Caetano, que cultuava o gênero melodramático, e não creio fixasse
no repertório peça nacional.
Uma vez perguntei a José de Alencar porque abandonara o teatro.
Disse-me que por não haver companhia dramática.
Vou ver se lhe arranjo um livro de Carlos Sussekind de Mendonça
sôbre o teatro nacional . Inteligente o autor é : se a obra saiu capaz
( tüchtig, na lingua do avô, não é ? ) Vossa Sapiência o decidirá.
Mandarei o livro que lhe prometi. Leia a carta da autora.
Saudades a todos .
Ergebenst,
JoÃO NINGUÉM
Tugúrio , dia de S. José, 1927.
( Encontrada nos papéis da família ; sem destinatário .)
Carlos amigo ,
Recebi um cartão de Genova e agora a carta de Roma ?. Fábio en
sinou -me o modo de responder - lhe: vou tentá - lo.
1. Carlos Werneck .
2. A carta de Roma referida é de 25/6/1927.
CARTAS A DIVERSOS 69
Pensei que V. fosse primeiro ao Oriente ; acho que fez melhor ficando
na Itália e vendo-a com vagar : multum non multa. De suas impressões eu
tinha certo ressaibo. O Duce é um bicho. Se fôr derrubado logo, não
passará de aventureiro ; se permanecer, pode subir de categoria. Inteligente
e corajoso é : quando se imaginou que mafia e camorra seriam chamadas a
conta ? A Itália tem um ponto de comum com a Alemanha : serem
ambas nações novas, com fôrças para se renovarem .
Uma senhora italiana, muito amiga de Said Ali, resumiu o entusiasmo
do que viu na península dizendo que Mussolini poderia ser assassinado,
mas o assassino nunca será um italiano.
O que diz V. sobre a belicosidade dos cartazes é novidade.
( Incompleta)
Filhinha 1 ,
Patrício ,
Dou -me pressa em responder a sua amável carta de ontem, agora
mesmo recebida.
Não tenho à mão a Revista de 1839 ; o escrito referido há de ser
idêntico ao que saiu completo no tomo de 1851 , idêntico portanto à grande
obra de Gabriel Soares de Sousa.
O autor desta , de 1.º de março de 1587 , dedicou-a a D. Cristóvão de
Moura ; naturalmente deixou -lhe o autógrafo, embarcou para o Brasil, a
correr aventuras, concluídas tràgicamente.
A obra de Gabriel Soares só foi impressa no século XIX, mas foi
citada ainda no século XVI por Pero de Mariz. Dela conhecem -se
cópias várias do século XVII e XVII [ I ] . O original é volumoso, as
cópias demandavam bastante tempo.
Se bem me lembro, afirmei provirem de Pero de Mariz as semelhanças
entre Fr. Vicente e Gabriel. Sua opinião adversa é sustentável, embora
pouco pudesse ensinar a frei Vicente, que conheceu os índios desde o
berço e serviu de missionário na Paraíba.
[ Inacabada e não expedida, encontrada entre os papéis da família. ]
Assis Brasil,
Assis Brasil ,
Já ontem lhe escrevi dando-lhe notícia de sua comissão ; escrevo-lhe,
porém , novamente, para responder a sua carta de 10.
Começo desde logo retirando o oferecimento que fiz de rever as
provas. Venha, venha . Não tenha medo do meio ; não tenha medo de
nada. Há de conservar - se refratário ; há de com a sua presença concorrer
para elevar e purificar.
Vou comunicar a sua vinda provável a Patrocínio. Quer isto dizer
que V. há de fazer uma conferência ; apronte -se, pois, desde logo. Peço -lhe,
porém , um obsequio : escolha o dia 25, que é dia santo e não é domingo.
Nos domingos assisto a umas leituras positivistas a que não posso faltar.
Outras cousas que não posso deixar de lhe pedir. Traga as Chispas,
a coleção dos jornais em que tem colaborado, para a Biblioteca. Traga
os documentos para a Exposição. Apronte-se também para tomar parte
nas conferências de História do Brasil. O Questionário está quase pronto,
e entre as questões algumas existem que V. tratará proficientemente.
Sinto muito, por um lado, que V. venha agora, e não mais tarde, pelo
meio do ano . Poderia então apresentá -lo a minha família e imitar o
procedimento de Valentim para comigo. Enfim , como V. prometeu vir
visitar a Exposição, como espero que tomará parte nas conferências, em
setembro hei de obrigá -lo a me dar tal prazer.
Já não é pouco estarmos juntos todos os dias : trocamos idéias, revi
vemos aquele bom tempo do Rio Claro. Não imagina quanto fiquei gos
tando da pequena cidade. Tenho tido tanta saudade, tanto desejo de tornar !
Espero ansioso por sua poesia sõbre o Turgot. Só V. e Mário
conheço que podem tratar do assunto. Qualquer outro seria necessário que
primeiro estudasse o assunto, e o tempo não deixa.
Procurarei novamente Lombaerts para saber por quanto ele imprimirá
a fôlha sendo o tipo renaissance. É provável que seja mais barato : mais
conveniente, não creio. O elzeyir é um tipo elegante e antique, e não
74 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
Assis Brasil ,
Deixe cair a alma aos pés ... quando soube que Leuzinger, que
eu julgava ser o mais caro de todos, é exatamente o mais barato.
Um meu colega, que com ele falou, diz-me que ele fará a impressão
por 35$ incluindo a brochura. À vista disto, nem é bom pensar nos
outros dois, que, inferiores como artistas, só levam - lhe vantagem em serem
mais careiros .
Por que Leuzinger é tão barateiro ? perguntei ao meu colega. Em
que ganha então ? — No papel, respondeu -me: o papel dêle, que aliás é
bom , é comum : se quiser -se papel especial, a cousa não ficará por menos
de 50.
A vista disto, tendo -lhe submetido as propostas das três melhores
tipografias, fico à espera de sua decisão.
Adeus .
Assis Brasil ,
Semana passada escrevi-lhe duas cartas. Uma sei que não lhe chegou
às mãos, porque Raul Pompéia, que a levara, comunicou -me tê-la perdido.
À outra receio que sucedesse o mesmo, pois até hoje não recebi resposta.
O que lhe dizia nas duas cartas é pouco mais ou menos o seguinte.
O tipo de Leuzinger, escolhido para a República Federal, tem todas
as qualidades menos uma : servir para ela. É muito grande, e feita com
êle a impressão não teria o chic e o fini que V. deseja como artista.
À vista disto, resolvi sustar a impressão até receber resposta sua.
Leuzinger tem muito bom e elegante tipo, excetuando os dois que V. exige.
Se faz questão do elsevier, passemos para Lombaerts, que o tem . Se não ,
fiquemos mesmo no Leuzinger, que lhe imprimiria melhor que qualquer
outro , e, principalmente, com mais brevidade e barateza.
Com a carta trazida pelo Lamonier V. mandou-me amostra do papel
que prefere para os números especiais. Não escolhi, porém , daquele,
76 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
Assis Brasil ,
A sua carta de 7, hoje recebida, aliviou -me de grande pêso. Já
pensava que, como a de 29, a minha última se tivesse desencaminhado, e
hoje mesmo ia enviar-lhe uma registrada.
Desde que o renaissance dos Anais lhe agrada, vou às duas horas
ao Leuzinger. Esta semana espero remeter-lhe as primeiras provas. A
obra será impressa muito ràpidamente, não só porque tal é o costume
da casa, como porque assegurou -me Leuzinger que agora não tem muito
serviço. Os originais aqui existentes podem estar prontos até o fim do
mês, e os outros seguirão ao mesmo passo.
Quanto a dinheiro, parece-me por ora dispensável enviar mais : o que
tem aqui, e que no mesmo dia entreguei ao homem, é o suficiente para
dois terços da despesa total. O último têrço basta que seja entregue ao
terminar a impressão.
w
Assis Brasil ,
Assis Brasil,
Não tenho podido lhe escrever , por muito ocupado. V., por seu
lado, não tem enviado provas, talvez à espera de carta minha. Leuzinger
me disse que já lhe enviou até a página 135, na 6.a e no sábado da
semana passada. Hoje deve mandar-lhe mais, não sei até onde.
Estão tiradas as 3 primeiras folhas ; presumo que a 4.a sê- lo - á hoje.
Hoje mesmo revi a 5.a e 6.a. Revi- as conscienciosamente duas vezes ;
80 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
9 - 1.•
82 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
Meu endereço no Rio é caixa 590 ( Alves & Cia., Gonçalves Dias,
46 ) ; continuo a residir Laranjeiras, 2.
Amigo,
Há hoje três meses exatamente embarcava no Itapaci , com mais
vontade de sair do Rio do que de chegar ao Rio Grande. A terra gaúcha
deu -me o troco : devíamos estar aqui a 31 ; só anteontem , 3, pela ma
drugada, defrontamos o gigante de pedra.
Em casa não encontrei novidade. Minha sogra parece bem disposta,
tanto quanto pode está-lo quem já completou os oitenta e oito. Ainda
não falei com o médico, que me consta achou o estado geral muito
satisfatório .
Assis amigo,
i
Senhora,
Há muitos anos sentia vontade de fazer uma nova edição da História
do Brasil de Fr. Vicente do Salvador, a respeito do qual escrevi a Assis
apenas chegou a Portugal.
Apareceu no fim do ano uma ocasião favorável. Agarrei-a com
unhas e dentes, impondo apenas uma condição, a do trabalho ficar con
cluído em fevereiro . Não ficou, nem ficará em março, nem mesmo em
abril .
Não houve demora da parte da impressora nem da minha. Apenas
no principio pretendia juntar meia dúzia de páginas e creio que juntarei
cem : páginas muito fatigantes, cheias de datas, cheias de citações, que é
preciso verificar a cada prova, a cada momento, a cada passo.
Estou na página 415 , não escaparei das seiscentas. O editor quer
dar-se ao luxo de só imprimir a primeira fôlha quando a última estiver
acabada, a última. Não me desagrada isto ; ao contrário, vou ter a
satisfação, que sempre invejei a Renan , de referir-me no principio a
páginas do meio e do fim do volume.
Assim, pela força das coisas, estabeleceu-se o dilema : Pedras Altas
ou Frei Vicente ? História do Brasil ou veranico de maio ? Quando
90 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
Senhora,
Senhora,
Anteontem , à hora do jantar, Mário telefonou-me sua amável car
tinha de 25 e grande foi minha surpresa recebendo a resposta do que
deixara em Cacequi. Não julgava o correio rio-grandense capaz de tais
áfricas.
92 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
Senhora,
Dr. Pedrinho foi buscar-me na estação e a ela me trouxe no sábado.
Já tem boleeiros.
A primeira pessoa encontrada foi Ptolomeu, que me deu notícia
da surpresa do Epitácio. Talvez hoje saibamos mais alguma cousa em
Cacequi. Do prato à bôca, ... diz um provérbio, que devem meditar
os dois candidatos .
Na parada encontrei Leônidas e Amaro. Fui para casa de Leônidas
e lá pernoitei. Não entrava isto em meu programa, porém foi muito
bom , porque fiquei conhecendo - o melhor e fiquei muito bem impres
CARTAS A ASSIS BRASIL E SENHORA 93
preferível.
Senhora ,
Pelos meus cálculos já acabou com a maçada de Pelotas e está de
volta a Pedras Altas.
Ainda não tomei pé na velha casa , não vi todos os amigos e não
escrevi uma linha de bacairi.
Vi Domício muito ligeiramente ; está bem disposto. Bulhões acha - o
triste. É natural : a família ainda não chegou ; a ausência desfalca as
amizades ; nem todos os amigos procuram os aconchegos oficiais.
Rui é esperado esta semana. O Correio da Manhã declarou - o ontem
vencedor e ele vai levantar a questão da incompatibilidade para a qual
conta com o Supremo Tribunal, asseguram . Quem não pode trapaceia,
diz o provérbio. Afinal vai perdendo o interesse para mim. Só pro
94 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
Senhora,
Comecei há dias uma longa carta que não acho. Vou resumir-me
nesta .
Depois de vinte e seis meses de ausência apareceu -nos Matilde, que
demorou duas semanas. Não teve ainda filho, nem, penso, há ameaço .
O marido tem encontrado trabalho, ela tem aprendido a economizar e
vivem folgados. Aprígio reclamou agora o prêmio de viagem a que
fêz jus, e, obtido o dinheiro e melhorada a situação geral do mundo,
pretende ir a outras terras melhorar seus conhecimentos. Nos dois
anos Matilde ganhou bastante : o casal deixou-me a impressão de con
tentamento e felicidade.
Minha senhora sogra passa sem novidade: não lê mais, ouve pouco,
reza cantos, joga paciência, recita versos ; pode viver ainda muitos anos,
sem sentir a vida como carga nem dar trabalho a outrem. Cecília recon
cilia-se com a vida : tem 27 anos ! Um cunhado foi nomeado agente do
Lloid em S. Francisco . Pretende ir visitá-lo com outra irmã. A excur
Anuncia -se greve geral para domingo ; se ele puder, há de vir tam
bém para a rua : coragem não lhe falta. Pela primeira vez fez cousas
que podem ser desmanchadas e a sensação nova deve ser violenta.
Adeus, Assis !
Adeus, rálgicas! Adeus, nova geração !
É verdade que Lina já come com apetite ?
Abraça e beija as mãos da venerada amiga
Seu muito grato
Cap.
Rio, 7 de agosto de 1919.
Senhora,
Há meses não recebo notícias suas, nem do Assis, nem de Pedras
Altas, senão por jornais e telegramas : incluo as últimas, tiradas do
Jornal do Brasil, para ver como ando em dia.
Muito folguei com as notícias de Cecília, com a ida para o Cassiano :
desejo que se prolongue o mais possível. Para a mobília do chalé en
treguei uma rêde que meu patrício major Luis Sombra mandou do
Maranhão . É de linha de carretel e tem sua filosofia . Atenda bem à
largura ; a posição não é procurando os punhos, mas no meio, pro
curando os bordos e as varandas. Antes de aproveitá-la convém dobrá-la
várias vezes e sentar-se em cima para ir estirando devagar e igualmente
e não ficar pensa . Talvez isto seja ensinar o padre-nosso ao vigário :
desculpe; até pouco tempo não conhecia este tipo de rêdes, vou passando
adiante minha ciência enquanto está fresca.
Estive com Calógeras em Minas e lucrei em voltar com uma idéia
menos confusa de Ouro Prêto. Só andei na linha do centro, longe de
Matilde, que só é acessível pelo ramal de S. Paulo. Em maio irei vê-la.
Calógeras pensa numa excursão ao Rio Grande para o começo do ano.
Se a realizar e fôr convidado, aproveitarei a ocasião. De minha viagem
a Mato Grosso nada posso dizer. A pessoa que prometeu pôr os ba
cairis em Cuiabá escreveu em agosto e depois não deu sinal. É capaz
de só dá-lo quando estiver preparando -me para acompanhar Calógeras.
É a tal lei das compensações : da outra vez deixei de ir a Pedras Altas
para ver Corumbá. Passei quase um mês prêso em casa por uma crise
CARTAS A ASSIS BRASIL E SENHORA 97
Senhora,
Fui para São Paulo fugindo do nilismo, esperar Calógeras. Têrça
feira do Carnaval embarquei para cá, enxotado pelas moscas, pelos mos
quitos e pernilongos. Depois da eleição, a política já não me aborrecia.
Agora a comédia é outra. A derrota não será reconhecida. Tere
mos duplicata presidencial ? No tempo do Prudente escapamos dela,
graças ao assassinato do Marechal Bittencourt.
Ontem estive ligeiramente com Madame Calógeras. Soube que a
partida marcada para amanhã não será adiada. Eu estava pouco disposto
a acompanhá -los, porque isto perturbava outros planos. Como, porém , ela
me informou que os companheiros de excursão se têm excusado, irei.
Partiremos, daqui, dois. Em São Paulo provavelmente se reunirão ou
tros . Chegamos a Cruz Alta, excluindo o ministro, a senhora e o aju
dante de ordens, menos de uma dúzia.
Mandei a Quinquim o itinerário. A distribuição do tempo ignoro
ainda. Que irei à granja não tenho dúvida, nem que seja apenas por
algumas horas. Minha verdadeira viagem será no fim do ano.
Antes de partir procurarei ver o Alípio e dêle colher notícias diretas.
Adeus, Assis !
Adeus, nova geração !
Abraço e beijo as mãos da venerada e querida amiga.
Cap.
Rio, 4 de março .
101
10 - 1.º
98 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
Senhora ,
Vi Democratino.
Muito prazer sentirei se puder ser - lhe útil ou agradável a qualquer
respeito.
Senhora,
Da bernarda nada sofri, nada vi ; ouvi apenas os tiros de Copacabana.
Correu tudo tão depressa que descri dos jornais quando declararam
finda a intentona. Pelo imprevisto do desenlace conservou - se fiel a ma
rinha, suponho, talvez sem razão.
Em suma : para Epitácio a tempestade desfez-se do melhor modo ;
não há perigo que se arme outra.
Para Bernardes a realidade persiste imutável . Nunca pensei hou
vesse tanto e tão profundo ódio contra ele, no exército, na marinha,
no civil .
Estendem o ódio a Raul Soares, o defunto lavado, alcunha que
Assis poderá explicar, pois o conhece : eu só o tenho visto pintado.
Os generais têm negado qualquer participação, menos Silvado e talvez
Clodoaldo, apanhado de armas nas mãos.
Ao contrário, a escola militar declarou -se quase unânimemente com
plicada. Com muita dificuldade apuraram -se uns cinqüenta inocentes.
Se não forem homens de caráter altivo, hão de ter a carreira bem atri
bulada : a pecha de covardes e traidores há de acompanhá -los até o último
alento. Diz-se que os professôres preparam -se para reprová-los. Não
se fará representar Pedras Altas nas festas da Independência ?
Vou fugindo delas.
Agosto será o mês dos congressos. Em alguns faremos papel dem
triste : não quero assistir.
Na próxima semana partirei para São Vicente, acedendo a um con
vite de Jaguaribe. De lá, quando o frio fôr menor, irei a Caldas ... se
Assis me der tempo .
Acabo de receber telegrama de Arrojado, noticiando que escreveu a
Assis convidando- o para percorrermos, os três, de automóvel, os sertões
do nordeste. Da resposta do Assis dependem meus movimentos : o que
ele resolver, peço comunique para a Praia de São Vicente, 82. Assim
terei tempo de resolver.
Matilde foi com o marido ver os parentes do Ceará . Deve chegar
hoje à Bahia , de volta. Espero abraçá -la têrça - feira.
100 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
Adeus, Assis !
Adeus, nova geração !
Abraço e beijo as mãos da grande e venerada amiga.
Ergebenst,
C. DE ABREU
Rio , 29 de junho de 1922.
101
Senhora,
Sexta- feira passada jantei no América e tanto Pedrinho como Alipio
me asseguraram que Assis não viria agora.
Segunda - feira, 14, desembarquei em Santos. Na casa de Jaguaribe
encontrei sua amável cartinha. Mais tarde, quando o Ceará ia levantar
ferro, soube que Assis estava a bordo. Não pude, portanto, vê-lo.
Vim fazer companhia a Jaguaribe. Foi bem sucedido na operação
mas está muito abatido. A casa, com os aumentos sucessivos, ficou
enorme. Não chegamos para ela.
Aqui ficarei, fugido de congressos e centenários, até meados de se
tembro. O amigo já estará mais forte então. É provável que uma irmā
venha fazer-lhe companhia.
Escrevi a Miguel, ontem : vou telegrafar-lhe amanhã.
Do que houver quanto à viagem do Ceará serei informado. É in
certo se o presidente irá. A ida do Rondon parecia certa. E se a
Senhora ,
Estas linhas já irão encontrá-la em Pedras Altas. Está concluída
a jornada luminosa. Não acha alguma semelhança entre ela e a lua de
mel ? Em ambas, todos os dias ele ia aparecendo sob novas faces que
ninguém suspeitaria.
Alguns lugares revistos agora deviam lembrar a Assis os dias em
pregados na propaganda republicana, apenas terminado o curso acadê
mico . Quanta coisa aprendeu depois disto e quantas desaprendeu !
Qual será o resultado legal da campanha, ignoro. Faço justiça ao
bedel verde que, mesmo se ele contasse com o único voto que podia
levar às urnas o chimango, seria incapaz de largar o poder voluntària
mente. Seu voto de qualidade seria o suficiente para o desempate. Isto,
porém, não é o mais importante : o mais importante é saber quantos dos
que votaram no boi prêto não estarão agora arrependidos e envergonhados.
O importante é que, dentro ou fora do palácio, já não é mais
que dantes era .
No tempo de Epitácio provou que era um sujeito medroso, incapaz
de resistir a quem o fitasse de frente. Agora, com o Assis, ficou patente
a nulidade do manipanço. Mesmo se ele tivesse um vislumbre de cons
ciência, de que o julgo incapaz, a gente que ele domina e que o escra
vizou não lhe permitiria de sair do fôsso de sangue e lama.
Adeus, Assis !
Adeus , nova geração !
Abraço e beijo as mãos da venerada e querida amiga.
C. DE A.
Rio, 2 de dezembro de 1922 .
CI
AO BARÃO DO RIO BRANCO 1886-1903
como escreveria ele o nome do Sr. Miola, se era tão fácil descobrir o
embuste, caso houvesse ?
CARTAS AO BARÃO DO RIO BRANCO 103
capítulos. Enfim tenho esperança que ainda hei de poder completar este
e outros trabalhos, principalmente se em alguma febre de economia que
sobrevier, não começarem os cortes pelas Achegas.
Talvez para o ano, comece a Coleção Cronológica do Século XVI,
que principiará pela viagem de Pinzón e acabará com o último ano do
século . Já tenho muitos materiais para o reinado de D. Manuel, que com
as anotações pode dar um volume regular. O que nos faltam são as
indicações ligeiras que há em coleções volumosas e caras, que a Biblioteca
não possui e que eu não posso comprar. Isto, porém, só com o tempo
se irá arranjando e não tenho pretensão a deixar o trabalho perfeito.
Agora para (não ] terminar esta carta sem um pedido : desde que o
Dr. Costa Mota é tão amável e ainda não sabe falar português, não
poderia ele dar um passeio na Vaticana e na Propaganda Fide ? Simples
passeio de reconhecimento do terreno . Neste último estabelecimento, a
julgar pela história da Missão de Fr. Martim de Nantes, deve haver
verdadeiras preciosidades, por exemplo uma descrição do rio S. Francisco
e dos índios que nêle habitavam , feita pelo capuchinho francês, François
de Lucé.
Sem tempo para mais, assino -me.
De V. Exa
Admirador muito obrigado
J. CAPISTRANO DE ABREU
Rio, 23 de fevereiro de 1887 1 .
1. Cópia oferecida pelo Prof. Hélio Viana. Esta carta estava anexa a um
exemplar do Descobrimento do Brasil e seu Desenvolvimento no Século XVI, ofere
cido por Capistrano de Abreu ao Barão do Rio Branco, com a seguinte dedicatória :
“ Ao Ex.mo Sr. Conselheiro Silva Paranhos, a quem tanto deve a história
pátria./ Homenagem de simpatia e admiração./. J. Capistrano de Abreu."
110 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
puder, copiarei por minha parte ; que farei as pesquisas necessárias para
que ele, não tendo de preocupar-se com isto, dê avanço ao que lhe está
incumbido ; que nas repartições que só abrem de dia, tomo a mim as cópias,
exceto quando houver urgência, porque então o nosso Simões as fará, em
condições diversas, naturalmente, porque ele tem um empreguinho no Te
souro , de praticante, se me não engano .
Agora o presidente do Instituto é Joaquim Norberto. Há um dia na
semana em que se reúnem, têrça- feira, se me não engano. Vou verificá-lo
e pedir-lhe a permissão que, espero, não me negará. Em todo caso , farei
o extrato fiel e quase literal do documento, que é permitido sem licença
prévia. V. Ex.a, pois, não terá de esperar até maio.
Ainda não pude verificar onde Varnhagen colheu os esclarecimentos
a respeito do assalto inglês na Bahia. Não figuram na primeira edição.
Provavelmente encontrou os documentos em Simancas, onde deviam estar,
se ele os não tirou , porque hoje cheguei à desoladora convicção de que o
nosso ilustre historiador roubava papéis.
Estimei tanto a notícia da viagem provável de V. Ex.a quanto lastimei
o doloroso motivo que a provoca. É uma cousa terrível éste surto, que
ultimamente tem lavrado e que agora, segundo parece, e receio, vai tomar
maior desenvolvimento com os sugestionistas e hipnóticos.
Como disse no principio, escrevo estas linhas simplesmente para se
guirem no vapor de amanhã. No dia 6, serei mais completo, e mandarei
algumas das cousas que V. Ex.a pede com mais urgência.
Com toda simpatia e consideração,
De V. Ex.a
Adm.ºr e amigo obr.º
J. CAPISTRANO DE ABREU
30 de março de 1887.
J. CAPISTRANO DE ABREU
Rio , 8 de maio de 1887.
Desejo que tenha feito boa viagem, e que no meio de seus livros
esteja tomando suas medidas para dar-nos para o ano a sua tão sequiosa
mente esperada História Naval.
Nossos trabalhos vão com mais ou menos regularidade: Fr. Vicente
estará pronto em parte até o fim do ano, as cartas avulsas dos jesuítas vão
adiantadas, e breve entrarão para o prelo as de Anchieta, ficando assim
esgotado, e felizmente, o ms. da Biblioteca Nacional, que com mais uns
cinco anos ficaria ininteligível.
Incluo esta lista sobre uns autógrafos de Anchieta que há em Anvers,
para mais uma vez V. Ex.a, com a sua incansável bondade, auxiliar-nos.
CARTAS AO BARÃO DO RIO BRANCO 115
O que desejo com urgência é o Buletin da Sociedade, que aqui não tenho
podido arranjar e um fac - simile da assinatura, para ir na capa do volume,
como foi no de Nóbrega. O sermão não tem urgência.
Ainda tenho outro obsequio a pedir-lhe. Não há escritor do século
XVI que mais aprecie do que Fernão Cardim. Quero dar, ainda este ano
se fôr possível, uma edição completa de todos os seus escritos. Falta-me,
porém, um, que é um parecer ou carta que ele escreveu a 1 de janeiro de
1618, e que se acha originàriamente na Academia de História de Madrid.
Como não tenho meio de correspondência para Madrid, peço -lhe o obsequio.
A propósito de Cardim , tenho ainda novo favor a pedir. Quando ele
foi aprisionado para a Inglaterra, em 1601 ou 1603 (não posso verificar
agora, mas está no prólogo dos Índios do Brasil), encontrou - se com um
jesuíta, que prestou-lhe auxilios. Depois, daí a um ano ou dois, fugiu com
umas princesas, que depois entraram para um convento em Lisboa. Não
será possível saber o nome destas princesas ? Já dei a V. Ex.a aqui mesmo
as indicações, mas mandá-las-ei noutro vapor. Este ponto me interessa,
porque desejo completar a biografia do amável escritor.
Li suas correspondências no Jornal, que estão espléndidas.
Com a maior simpatia e consideração,
Am . adm.or e cr . obr.º
J. CAPISTRANO DE ABREU
8 de agosto de 1887.
Já recebi a cópia do ms. do Pôrto, História da Fundação do Colégio
de Pernambuco . Não é menos interessante que as duas cópias que V. Ex.a
nos obteve de Roma , porém o copista é terrível.
Recebi já 100 páginas do ms. de Nápoles, que, segundo Miola, é do
Padre Giacinto Lorejice. Tem cousas interessantes ; mas não posso ainda
emitir opinião fundada a respeito dêle.
já estão tôdas compostas, mas ainda não se publicou uma linha e só poderão
ser impressas para o ano.
Estou tirando cópia de três novidades que devem interessar muito aos
seus estudos : as instruções dadas ao Conde da Tôrre, as que ele ou seu
sucessor deu a Camarão , quando mandou - o a Pernambuco , e as de D.
Manuel Lôbo. Julgo que todos estes documentos lhe são desconhecidos;
o que havia antes de relativo a D. Manuel Lobo era simplesmente o regi
mento do governo do Rio de Janeiro ( No ms. de Nápoles há algumas
informações biográficas sõbre Antônio Teles (da] Silva : era devotissimo,
o que explica sua animosidade contra os herejes holandeses ). Nosso amigo
Vale Cabral na Bahia encontrou preciosidades extraordinárias na Tesou
raria da Fazenda, que Belisário mandou entregar-lhe. A doença não lhe
permitiu examinar tudo, e apenas trouxe 17 volumes, mas neles há cousas
muito importantes. Há dois volumes relativos a Tomé de Sousa, D.
Duarte e Mem de Sá ; uma coleção de regimentos, onde vem a doação a
Barbalho da Capitania de S. Catarina , a doação de outra Capitania ao
Visconde de Asseca no Rio da Prata, umas instruções dadas a Roque da
Costa Barreto, de quem apenas se conhecia o regimento ; um volume da
administração de Diogo Luís de Oliveira e outros de seus sucessores ime
diatos, etc. Ele pretende voltar à Bahia para o mês e naturalmente trará
muito mais. Logo que ele voltar e a coleção estiver mais completa, ſarei
o indice de alguns volumes que digam respeito à guerra holandesa e re
metê - la - ei.
Sõbre Cardim sei que foi aprisionado em fim de setembro de 1601
(Franco, Imag. da Virt. em Évora, I , 725 ) ; que o corsário que o aprisionou
foi Francis Cooke, de Darmouth , provavelmente ( Purchas, Pilgrimages,
IV, p. 1289 ) ; que fugiu em 1602 para Calais, levando quinque illustris
simas puellas, quarum duae erant e Reginae familia. ( Franco, Sinopse,
p. 179 ) . Quem ajudou a fuga foi o Padre Michael Roger, e sobre este
deve haver alguma informação em uma História dos Jesuítas na Inglaterra,
publicada há poucos anos , tendo por autor Folville ? , se me não engano.
Se lhe fôr possível , peço-lhe, pois, que procure éste nome.
Dos folhetos de que manda lista, tenho agora um ou dois, julgo eu.
Tinha mais em uma coleção que comprei do Ottoni, de 30 e tantos volu
mies ; mas dei-a a um amigo, Bulhões Jardim , de Goiás, por causa dos
opúsculos relativos a finanças, que é o que ele especialmente estuda.
Fr. Vicente do Salvador vai ainda muito atrasado, por causa das
21 de maio de 1888.
Ex.mo Sr. Barão do Rio Branco ,
Permita-me que reitere hoje os parabéns que lhe enviei no dia 13,
por ocasião da lei libertadora. O nome oficial de seu grande pai vai ser
dignamente ressuscitado. Muitos parabéns meus e de Cabral .
124 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
J. CAPISTRANO DE ABREU
Eduardo Prado escreveu -me dizendo que procurasse Torres & Cia.
Fui lá, porém eles não tinham ainda recebido a ordem. Irei novamente
nestes dois dias, depois da chegada do vapor do Pacífico . Quanto a Co
lombo, não sei se fui bastante claro na carta em que me referi ao processo.
Quero apenas os quesitos relativos a l'icente Pinzón, a Diego de Lepe e
Mendoza, que são os únicos interessantes para a nossa história . Desejaria
também , entre parênteses, notícias de um ms. relativo ao Brasil , escrito
cerca de 1580 por João Batista Gessi. É citado por Jimenes de la Espada,
em um número da Sociedade de Geografia , publicado poucos anos há. O
que desejo é saber o título dos capítulos, o número das páginas e o para
deiro. Há alguns anos, um filho de Sousa Reis , que era adido em Madrid,
mandou perguntar a Portela se tal ms. era conhecido aqui. Informei a
Portela que não, mas ignoro para que serviu tal informação. Julgo que
para nada .
Tollenare 1 ( Pôrto Seguro, Hist. pág. 1136, n.° 3 ) , francês que assistiu à
revolução de 1817 em Pernambuco.
Já pedi a meu sogro para ver se separa os papéis da contadoria.
Apenas esteja feita a separação, irei tomar as notas, porque o processo
é mais sumário .
A cópia de Sena Pereira já entreguei a Garnier 2, que deve tê-la
mandado com os livros que V. Ex.a encomendou . Na mesma ocasião re
meti uns folhetos que me pareceram úteis a seus estudos e que já devem
ter chegado a Liverpool. A parte de Sena Pereira publicada no Brasil
é muito resumida. Segundo se lê naquela fôlha, a publicação em avulso
fôra antes até a pág. 128 ; mas nem a Bibl. Nacional nem a Fluminense
nada contêm a tal respeito, além das 3 primeiras folhas ou 4.
Na Bibl. Fluminense tive ultimamente ocasião de examinar uma co
leção importantíssima, relativa a Furtado de Mendonça em S. Catarina, a
Böhn e Finck, etc. Uma porção de volumes manuscritos, que pertenceram
à livraria de Castelo Melhor. Julgo eu que, depois de estudadas aquelas
fontes, nada mais restava a elucidar em um período de mais de 20 anos,
até o fim do vice-reinado de D. Luís de Vasconcelos.
Fico à espera das notas de Eduardo Prado sôbre Schetz. Não
sei se já disse a V. Ex.a que é o Esquertes de nossos cronistas, que com
Adôrno foi dos primeiros senhores de engenho em S. Vicente. As cartas
de Anchieta estão entregues a Teixeira de Melo, e deviam sair até o fim
do ano ; provavelmente não sairão, porque antes de tudo desejo pôr fora
os documentos colhidos por Joaquim Caetano, cuja impresão deve começar
em junho. Em julho ou agosto hão de estar prontas as Cartas Avulsas
dos Jesuítas, já impressas, mas não publicadas ainda, à espera das notas
de Cabral.
A narrativa da batalha de 6 de abril de 1641 está sendo copiada
regularmente, mas devagar. Enquanto não estivermos mais familiarizados
com a letra, é necessário mais de uma hora para copiar uma página ; a
narrativa, segundo calculamos, não dará menos de umas 50, na cópia.
Por ocasião de mandá -la, irão as respostas às perguntas formuladas por
V. Ex.a. As outras cópias, mais curtas, irão gradativamente.
Falei-lhe em uma das últimas cartas a respeito da bandeira de Frias
( Pôrto Seguro, pág. 792 ) . As Lettres Édifiantes dão algumas cousas a
tal respeito, no vol. XII. Não tomei nota da página, talvez porque há
mais de uma edição. E fico aqui por agora 1 .
Bien à vous,
CAP . DE ABREU
13 de junho de 1888.
mil o que quer dizer que mais de metade não encontrou saídas.
Consta que pessoa que não possui nada tomou 2 mil contos.
Não sei se pelo fato de Rui ser essencialmente um homem de
livros, o certo é que não inspira a maior confiança a sua gestão fi
nanceira .
Felizmente não entendo destas cousas.
12 1.0
130 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
precisasse, mas com um prazo, o mais curto possível, para escrever a sua
História Naval e a sua História Militar.
Aproveito o papel que resta para lhe pedir um grande favor de
importância capital. Peço-lhe que consiga do Barão de Arinos informação
minuciosa do que há no Vaticano, na Propaganda Fide sõbre o Brasil
antes de 1807. Leio no último número da Révue Historique que se formou
em Roma um ofício internacional de cópias e pesquisas bibliográficas nas
bibliotecas de Roma e do reino, para o uso dos estudos históricos, literários
e científicos. O secretário deste ofício é o Sr. ftalo Palmarini. Como a
êste se há de dirigir o Alves para os trabalhos que lá forem necessários,
desejaria saber se oferece as garantias necessárias. Espero com ansiedade
a resposta do Arinos, porque decidirá se devo ou não adiar minha empresa.
E como o papel não leva a mais, permita-me que pare aqui o amigo agra
decido e admirador fervoroso .
Bien à vous,
J. C. ABREU
Rio , 17 de abril de 1890 .
Mestre e Amigo,
Tenho lido suas Efemérides no Jornal do Brasil e apreciado devida
mente . Pela primeira vez aparece neste gênero trabalho sério e fun
dado nas fontes. Abreu e Lima, Perdigão Malheiro não tinham idéia
clara de crítica histórica. Menos ainda José de Vasconcelos. Teixeira
de Melo fez em grande parte simples compilação ; quando Cabral e eu
quisemos ajudá-lo, já era tarde.
Não sei se suas Efemérides serão publicadas em volume; seria uma
pena se não o fôssem. Há tanta novidade nelas ! Hoje encontrei uma
que não me parece correta. Mem de Sá chegou à Bahia em 1558 — já
nosso Cabral o tinha provado. No volume de Cartas Avulsas dos Jesuitas,,
que ainda não está publicado, mas de que já lhe mandei um exemplar há
dois anos, há uma carta do Padre Antônio Blasques que, graças à cópia
que nos mandou dos dois volumes dos Diversi Avisi, foi pela primeira vez
interpretada direito. Aí se vê que Mem de Sá chegou à Bahia (na )
oitava dos Inocentes, isto é, 4 de janeiro de 1558. De um volume ms.
(cópia feita no princípio dêste século ) , trazido da Bahia pelo Cabral da
Bahia ( sic ) consta a posse de Mem de Sá a 3 de janeiro do mesmo ano.
Esta parte precisa, pois, de ser retificada.
Tenho procurado, mas debalde, quem ficou no governo da Bahia
entre a morte de Mem de Sá e a vinda de Luís de Brito . Seria Muniz
Barreto, alcaide -mor da Bahia ?
Na Coleção Martins veio porção de coisas relativas à Colônia do
Sacramento e capitanias do Sul . Estou tratando de fazer uma nota, para
ver o que convém copiar.
No último volume ou penúlitmo do Inocêncio, vem mencionado o livro
de um Padre Benci, jesuíta que residiu na Bahia, do qual possui a
Biblioteca Nacional diversos sermões livro que trata da escravidão.
Foi impresso em Roma, em 1998, se não me engano. Mandar-lhe-ei depois
notas mais precisas, porque hoje a Biblioteca deve estar fechada . Peço-lhe
que veja se será possível arranjar-me algum volume por lá .
Estou tratando de publicar um volume sõbre os índios, contendo em
1.° lugar os artigos do Dr. Paulo Ehrenreich, que traduzi para o Jornal
do Comércio, e algumas notas e documentos pouco conhecidos. Tomei
a liberdade de lhe enviar umas amostras de fumo legítimo de Goiás.
134 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
Mestre e amigo,
Encontro hoje na Gazeta a seguinte notícia :
( Em impresso)
“ Um missionário protestante de raça negra ou mestiça residiu por
muito tempo entre os ipurinas ou congiti que habitam os afluentes do alto
Purus nas fronteiras do Peru e da Bolívia .
Acha -se neste momento em Inglaterra, onde os materiais coligidos
durante a sua residência nessas afastadas regiões estão sendo cuidadosa
mente estudados .
A lingua dos ipurinas parece ser, segundo as observações de Steinen
e Ehrenreich , a mais importante, ou a mais falada , do grupo de linguas
maipures ou nuaruaques .
O missionário protestante em questão pôde reunir um copioso voca
bulário dessa língua, ainda pouco conhecida.
Breve relataremos os resultados dos trabalhos de investigação que se
estão fazendo. "
Ficar -lhe- ei muito obrigado se me puser a par do que houver, envian
do-me o que fôr publicado.
O livro do von den Steinen sobre os bacairis já está no prelo, na Casa
Leuzinger: a edição brasileira será um novo livro. O material que tenho
colhido é abundantíssimo. No original alemão há 4 lendas apenas, eu
dou agora mais de 30 ; Steinen dispõe de menos de 1.000 frases ; eu creio
ter mais de 6.000 e ainda continuo .
Desejo que faça boa viagem para os Estados Unidos, donde estou
certo trará triunfante nossa causa.
Bien à vous,
J. C. DE ABREU
10 de maio de 1893.
Mestre e amigo ,
Seus triunfos são da pátria e portanto meus. Se, em sua missão,
algum dia lembrou -se de mim, há de ter sentido que estava a seu lado,
quando pugnava por nossos direitos, que depois da vitória dava-lhe uin
abraço apetrado, que agora repito. O objeto desta carta é, como sempre,
incomodá - lo .
Em dezembro pretendo partir para o Amazonas, a estudar duas
línguas de índios : os apiacás no Tocantins, os crixanás no rio Negro.
Os apiacás são o extremo N. E. dos bacairis, cujo extremo S. O.
fica no Paranatinga, cabeceira do Tapajós. Há dois anos mora comigo
um bacairi, cuja língua tenho cuidadosamente estudado. Hoje possuo uma
coleção de textos originais como nenhuma língua do Brasil apresenta. Se
fosse a uma aldeia, no primeiro dia entenderia quase tudo, e creio que,
finda a primeira semana, falaria com desembaraço .
Os crixanás pertencem à mesma família lingüística, que é a caribe,
de que são o extremo S. O. ao norte do Amazonas. Graças a nosso
Eduardo Prado, já possuo o Gênesis e o Evangelho de S. Mateus, na
língua escauoio, falada na Guiana, e, segundo parece, quase idêntica ao
crixaná. Não menos de quatro vêzes encomendei este livro, sem resul
tado. Se não fosse Eduardo ...
Espero até o fim do ano ficar sabendo bastante escauoio, para não
perder tempo na aprendizagem do crixaná.
Mas fiquei ambicioso e pretensioso com o que obtive dos bacairis, e
quero ver se dos crixanás não obtenho só vocabulário frases, mas
tradições históricas e lendas , de modo a fechar ao N. do Amazonas o
círculo que agora, se puder estudar os apiacás, ficará fechado ao sul.
Por isso, e porque tenho certeza de que, mandando-os vir por nossos
livreiros, não poderei obtê-los, peço - lhe o obsequio de me enviar pelo
correio e com a maior brevidade possível :
W. H. Bret Mission Work among the Indian Tribes in the Forests of
Guiana, Londres, Society for Promoting Christian Knowledge ( s. d. ) .
W. H. Bret Indian Tribes of Guiana.
W. H. Bret – Legends and Myths of the Aboriginal Indians of British
Guiana .
Im. Thurm - livro sobre os índios da Guiana, cujo título não conheço .
O preço destes livros satisfarei aqui aos seus correspondentes, que
julgo serem ainda os srs. Sousa & Irmão .
136 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
Mestre e amigo ,
Acabo de receber um dos volumes, sobre a Guiana Inglêsa, que teve
a bondade de enviar-me. Os outros, comunica -me seu correspondente,
estão esgotados, mas vão ser reimpressos. Muito obrigado.
Passei uma noite inteira lendo sua memória sôbre os limites com
a Argentina, e, francamente, excedeu minha expectativa. É pena que,
como me disse Domício, a pressa obrigasse -o a omitir muita cousa já escrita.
Falei com Rodrigo Otávio para ser enviado um exemplar ao Dr. Sophus
Ruge, em Dresde, que é a primeira autoridade sobre questões de História
geográfica e Geografia histórica. Rodrigo neste mesmo instante assegu
ra -me que o Ministro do Exterior o fará.
Será um meio de estabelecer relações com Sophus Ruge, cuja obra
sôbre a época dos descobrimentos geográficos, já traduzida em italiano,
tomo a liberdade de recomendar-lhe muito especialmente.
Consente que termine esta carta pedindo -lhe mais um obsequio ? 0
Sr. Max Fleiuss, moço estudioso e inteligente, deseja fazer parte da
comissão de limites com a França, de que o meu ilustre mestre e amigo
será o chefe. Há por aqui toda a boa vontade em atendê-lo : uma palavra
sua será o suficiente para fazer pender a balança a favor dele. Creio
que já outros amigos lhe terão escrito a favor dêle. Faço - o por minha
vez, certo de que não me arrependerei.
CARTAS AO BARÃO DO RIO BRANCO 137
mesma pessoa . Mas acredita V. ? Passei meses, talvez anos, sem fazer
tal verificação. Uma vez estava eu na Biblioteca, lendo não sei o quê,
quando lembrei -me da verificação a fazer. Levantei-me, fui ao Cabral,
que estava escrevendo na mesa de que agora lhe dirijo esta carta e disse
lhe : V. vai ficar furioso . - Por quê ? Porque afinal vou descobrir
quem é o nosso Antonil. Neste caso vou ficar é alegre.
Da mesa do Cabral fui à estante em que estava a Bibliothèque des
Écrivains de la Compagnie de Jésus de Backer, abri o vol . VII , que
contém o índice geral , e remeteu m
- e para o vol. VI, p. 14 .
Abri-o, e, apenas li as primeiras linhas, corri para a mesa do Cabral
Cabral! Cabral! achei! E, se é capaz , imagine o prazer com que
lemos :
CARTAS А GUILHERME STUDART 145
Não preciso dizer que foi um dia de delírio. Jantamos juntos, toma
mos cerveja juntos , conversamos até meia-noite e separamo -nos à contre
cocur. Que bom tempo aquele, em que a descoberta de um anônimo
bastava para coroar de rosas um dia.
Vimos logo que, de João Antônio Andreoni , era anagrama ou cousa
que o valha André João Antonil ; mas uma cousa nos causava espécie :
que significava o L final ? Foi ainda no Backer que achamos a resposta :
Andreoni era de Luca, na Toscana ; L significa luquensis.
Cabral queria que eu escrevesse um artigo sôbre o assunto, mas eu
nunca o fiz. Em 86 , porém , publicando um inédito de Anchieta, escrevo
no prólogo, pág. XII , escrevi [ sic ] para fixar data : André João
Antonil, ou , para dizer o verdadeiro nome, João Antônio Andreoni, por
que Antonil era pseudônimo. Comuniquei, entretanto , desde logo a des
coberta às pessoas a quem poderia interessar, principalmente a um amigo
meu que possuía a primeira edição raríssima! e que ele está com
prometido a me deixar por testamento . Depois tive a felicidade de con
correr para que a Biblioteca obtivesse um exemplar, também . Há, pois,
aqui no Rio , 2 exemplares da primeira edição. A segunda, feita aqui em
1837, não é comum , mas encontra -se uma vez por outra ; ainda há dois
anos comprei um exemplar para dar de presente a Eduardo Prado.
Para aproveitar o que sobra do papel, dir-lhe-ei que até hoje Teixeira
de Melo não recebeu a cópia que por intermédio seu e V. pelo dêle man
dou Lino de Assunção. Estará irremediavelmente perdida ?
Soube hoje que aqui na Biblioteca receberam um catálogo de seus
manuscritos ; infelizmente só amanhã poderei vê-lo, porque o empregado
que tem a seu cargo esta secção só vem à noite. Depois de vê-lo, talvez
The possa enviar alguns documentos que V. não conhece e que possuímos.
Não se esqueça de mandar-mo.
13 1. "
146 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
(
Estou aqui em Santa Rita, na fazenda de um parente de meus
filhos, desde 14 de janeiro. Antes passara mês e meio na Capital, que
só agora fiquei conhecendo, porque das outras vezes passei sempre de
' corrida .
Como vai você ? Como vão seus filhinhos ? Beije os pobres òrfão
zinhos. E adeus.
Abrace o amigo velho,
CAPISTRANO
S. Rita de Passa - Quatro, 20 de março de 1899.
Meu endereço no Rio continua Laranjeiras, 2. ou Livraria Alves,
Ouvidor, 136 .
Caro Guilherme,
Fr. Vicente do Salvador ; tem pronta a edição dos Diálogos das Grandezas
do Brasil, que sairá nestes dois meses ; Os índios do Brasil, de Fernão
Cardim ( 1881 ? ). Publicou a Armada de D. Nuno Mamel, ( 1880 ? ) ;
O Descobrimento do Brasil e seu Desenvolvimento no Século XVI, tesë
de concurso, de que há duas folhas de rosto diferentes, uma coin
nome dos concorrentes no começo e as teses no fim , outra sem nada disto,
oferecida aos amigos da Biblioteca Nacional; a edição tôda foi de 300
exemplares. O Descobrimento do Brasil pelos Portuguêses, 1900 ; A Pro
pósito da Colônia do Sacramento, tiragem à parte, de cem exemplares.
No Livro do Centenário foi encarregado de tratar do descobrimento
do Brasil, povoamento do solo, organização política e administrativa, evo
lução social. Escreveu a primeira parte ; mas não está disposto a escrever
o resto, porque não lhe pagaram . Teni uma coleção de textos na lingua
bacairi , e um vocabulario caxinauá, muito deficiente, que não vale a
pena citar .
Não quis fazer parte da Academia Brasileira, e é avesso a qualquer
sociedade, por já achar demais a humana. Por exceção única pertence
ao Instituto, do qual pretende demitir -se em tempo , se não morrer reperz
tinamente. Escreveu prólogos aos livros de Rocha Lima, ao dos Índios
do Brasil de Fernão Cardim, ao de Joffily sobre a Paraiba. O de
Cardim saiu anônimo.
Trabalha numa História do Brasil, de que o livro sobre o descobri
mento dos portugueses Rio , 1900 contém as primeiras páginas;
se, como é possível, a obra chegar ao fim , não passará de 400 a 500.
Dela foram publicados sob o título Revistas Históricas, no Jornal do Co
mércio de 1899, os capítulos relativos ao povoamento do sertão ( 2 ou
3 artigos ).
Meu Guilherme,
Amigo Guilherme,
Sua carta de fins de maio, que estou respondendo de cor, cru
zou- se com outra minha, da mesma data aproximadamente. Pelas dúvi
das, foi registrada.
Tardei em responder para dar resposta cabal.
CARTAS A GUILHERME STUDART 155
Caro Guilherme,
tempo copia para Eduardo Prado : hão de achá -lo fàcilmente. É mesmo
possível que Inocêncio o indique. E V. deixou sem resposta meu pedido
de concorrer com as notas que puder para a nova edição de Varnhagen !
Repito-o e insisto. Suas notas sairão em seu nome. Estou às voltas
com os donatários. O que V. tiver antes disto sairá no fim do volume,
com as notas de Rio Branco, que espero obter ; as outras sairão embaixo
da página, junto com as minhas.
Outro dia estive examinando na Biblioteca Nacional uma caixa
quase toda ocupada com documentos relativos a Manuel do Nascimento
de Castro e Silva, seguramente mais de cem . Só de Alencar, na presi
dência de 1836/1837, há umas trinta cartas. Infelizmente eduquei meu
espírito, desinteressei-me de história contemporânea. Agora é tarde :
Inês é morta .
Caro Guilherme,
Recebi há alguns dias, com umas páginas do futuro número da
Revista, algumas linhas suas, dizendo que estava devendo respostas a
cartas suas.
Deve ser engano. Ou então o correio é o culpado.
Juntamente com esta vai para o correio um pacote, contendo três
exemplares do livro de Kirchhoff, que acabo de traduzir.
Peço - lhe o obsequio de mandar ao Tomé Mota e ao Tomás Pom
peu os exemplares que lhes são destinados.
Sempre o velho amigo,
Cap.
Rio , 7 de agosto de 1902 .
14 - 1.0
162 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
Dou-lhe a agradável notícia que espero pôr para fora até o fim
do ano o 1.º volume de Varnhagen. Tem -me dado um trabalhão ; ele é
muito mais descuidado e inexato do que pensava a princípio : basta ver a
cambulhada que fêz de Francisco Caldeira e Alexandre de Moura. Tôda
a expedição do Maranhão precisa ser escrita de novo : eu tinha pensado em
lhe pedir uns documentos inéditos que V. possuía sobre ela, mas agora
é tarde .
Pretendo acompanhar cada volume do Varnhagen ( serão três, o 1.º
acaba na conquista do Maranhão ) de uma introdução de cem páginas,
fazendo a síntese do período correspondente. Se levar isto ao cabo , fica
pronto o livro a que reduzi minhas ambições da História do Brasil, um
volume de formato de um romance francês .
Caro Guilherme,
CAP.
( 1903?]
deu-me apenas dez dias ! Consultei a obra em ms., mas ainda não acabei
a leitura do impresso, que dá mais de 500 páginas! Imagina que par de
botas vai sair ! Já te falei no senador Manuel Barata, que tanto se inte
ressa pela história do Pará. Pede-te o livro de Severim de Faria e o
Catálogo, que não estão aqui à venda. Queria até passar-te um telegrama,
e não descansou enquanto não lhe emprestei meus exemplares.
Faço ponto, esperando que esta carta, escrita no desassombro da
amizade, seja lida com os mesmos sentimentos, e que expunjas de tua
coleção o único senão que se lhe pode notar.
E abraça o amigo velho, sempre amigo,
CAP.
Rio , 20 de abril de 1904.
Domício da Gama, a meu pedido, mandou tirar uma cópia para a Biblioteca
Nacional. Se existirem em Roma as páginas de Yves d'Evreux que man
dei pedir a Bruno Chaves, teremos completo o histórico deste primeiro
episódio de nosso fundador.
Domício mandou também examinar a correspondência do Duque
Monteleon em Simancas, para ver se há qualquer referência à prisão e à
soltura em França .
Na Biblioteca do Eduardo Prado, que pude visitar ràpidamente,
existe um depoimento de Martim Soares dando-se com a idade de cin
qüenta e um anos ; mandar-te- ei cópia.
Há também outro de Camarão de que se infere que nasceu em
1601. Acertou portanto Pereira da Costa ; eu já tinha aliás publicado o
fato, em qualquer artigo de imprensa.
É pena que Eduardo não tenha escrito a história de Manuel de
Morais. A personagem, relativamente insignificante, evoluiu num quadro
incomparável. O processo tem bastantes notícias sobre um dos meus pre
diletos, o autor do Valeroso Lucideno.
Minha edição de Varnhagen está praticamente anotada até Mem de
Sá : espero dar o primeiro volume até fim do ano, ou janeiro. Qualquer
dêstes dias enviarei os capítulos relativos aos três primeiros governadores.
Estou ansioso por chegar ao terreno sólido em que começam tuas inves
tigações e teus documentos. O primeiro volume tive de fazê-lo exclusiva
mente eu : para o segundo conto com o Barata, e tenho um exemplar do Rio
Branco muito anotado, da História Geral e da História das Lutas. Conto
muito contigo !
Poderias mandar com urgência cópia da carta de Jerônimo de Albu
querque contando a luta com os franceses ? Poderia entrar no volume
dos Anais com o auto da arribada de M. Soares a S. Domingos, o rela
tório de Alexandre de Moura e os 25 docs, concomitantes, o depoimento
dos franceses prisioneiros, a relação de Manuel de Sousa, as sessões do
Conselho de Portugal e Estado sobre as tréguas de Albuquerque e Moreno :
é preciso pressa, porque o volume deve sair em dezembro. No outro
vapor irá a cópia da carta de Alexandre de Albuquerque. Vê se publicas
a lista das terras concedidas no Rio Grande do Norte .
Com muitas saudades do velho amigo,
CAP .
12 de novembro de 1904.
CARTAS A GUILHERME STUDART 169
Caro Guilherme,
Caro Guilherme,
Caro Guilherme,
Caro Guilherme ,
Indo hoje à Casa Colombo entregaram -me tua Resenha. Muito obri
gado. Já a li .
Causou -me grande prazer, mais de um prazer ; o primeiro, o maior,
já sabes : é estares bom dos olhos e poderes continuar na tua faina incan
sável. Causou -me também prazer a abundância de material, digo, de no
tícias que vais semeando com uma prodigalidade de nababo.
E se te disser também que me causou inveja ? O mapa de Jerônimo
Paz resolveria para mim algumas questões obscuras.
CARTAS A GUILHERME STUDART 177
15 - 1.•
178 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
Caro Guilherme,
Desejo-te boas saídas, melhores entradas, ótimo ano. Volte intacta a
visão e possas continuar indefesso teu labor são os meus votos.
Acabo de pingar o último ponto do meu esboço. Custou ! Deu tre
zentas páginas o periodo anterior a D. João 6.0. Se me perguntares se
estou satisfeito com o que fiz, dir-te-ei francamente : não ! Imaginava
outra cousa e não pude realizá-la, parte por culpa minha, parte por
culpa das circunstâncias. Acreditei muito na extensão da vida e na
brevidade da arte, e fui punido. Quando, ainda no Ceará, concebi- a, a
obra tinha outras dimensões. Cada ano levou consigo um lance ou um
andar. A continuar mais tempo, ficaria reduzida a uma cabana de pes
cador. Mesmo agora acho - lhe uns ares de tapera.
Agora tenho de passar ao século XIX. Conheço - o pouco e mal.
Creio não entrará mais no livro de Vieira Souto, porque não pode esperar,
já esperou demais. Isto aliás me é indiferente : o importante é escrever a
cousa .
Guilherme,
Caro Guilherme,
Tens razão, caro Guilherme, devia ter -te escrito mais vezes e há mais
tempo .
Um dos motivos do meu silêncio chega a ser ridículo ; não tinha
papel em casa ; na semana passada muni-me deste gênero, que provou não
ser de primeira necessidade.
Outro motivo : a justificação de Diogo Botelho ainda não está completa
e queria mandar-te o extrato da parte relativa ao Ceará . Por ora não é
muito : a ata de junta em que se decidiu a expedição, o regimento dado
a Pero Coelho, uma sentença sõbre indios do Jaguaribe, uma alusão a
Soromenho, de que já te dei notícia.
A justificação consta de duas partes : na primeira trata dos serviços
prestados em Pernambuco durante a assistência de pouco mais de um ano,
a segunda da assistência mais prolongada na Bahia. Em suma ficou
aquém de minha expectativa.
Outro motivo ainda do meu silêncio : esperava que me mandasses o
encantado documento sobre Rio Grande do Norte e suas sesmarias, como
prometeste. Quando Manuel Cícero andou pela Europa contratou com
Eduardo de Castro e Almeida o catálogo dos documentos relativos ao
Brasil existentes na Biblioteca Nacional de Lisboa. Devem ser remetidos
seis mil verbetes, cada ano , e calcula-se que o trabalho levará dez .
Já chegaram os primeiros três mil, que tratam da Bahia . Há muita
cousa importante, por exemplo, uma descrição dos sertões da Bahia e
Pernambuco, feita em 1698, antes da revolução produzida pelas minas. Já
mandei pedir cópia. Espero aprender muito nele, embora nunca tenha
encontrado até hoje um documento que me satisfaça por completo.
Folguei muito com a Ánua de Luís da Fonseca e espero que a publiques
sein grande demora .
CARTAS A GUILHERME STUDART 181
Caro Guilherme,
Guilherme amigo,
Cheguei a 16 de novembro. Contava com as cópias pedidas a João
Lúcio, com tanto maior certeza quanto me dizia estarem quase concluídas.
Até agora nada chegou : extravio do correio ? implicâncias da censura ?
efeitos de lista negra ou de qualquer outra côr ?
Referiam - se todas a Garcia e Fernão Dias Pais, e à Guerra dos
Emboabas. Para ganhar tempo mergulhei na Revista do Arquivo Mineiro.
Conheci José Pedro ; assistimos à inauguração de um trecho da Leopoldina,
encontramo - nos e conversamos largamente em Ouro Preto, da única vez
em que fui à defunta Vila- Rica. Sua perda foi irreparável. Augusto de
Lima lhe era intelectualmente superior, mas não tinha o fogo sagrado ou
deixou - o apagar depressa. Em setembro jurava -me em Belo Horizonte
que de bom grado trocaria a cadeira de deputado pela volta a seu antigo
cargo. Forsan ... Junto um documento relativo a Morais Navarro,
que talvez não conheças e deve ser posterior a todos os que vais publicar
( É do tempo do Veiga : hoje a Revista está suspensa ).
Dos três paulistas que andaram por aí era o de menos valor. Quando
alcançaremos notícias precisas de Matias Cardoso ? Quando sairemos do
vago a respeito do Doutor Jorge Velho ? Li a Revista do Rio Grande do
Norte. Lira só pode ter mais umas consultas do Conselho Ultramarino,
copiadas para ele na Biblioteca Nacional, quando geria a pasta do Interior.
As consultas vêm desacompanhadas de documentos : só adquirirão verda
deiro valor com os que tens no prelo.
Pedi cópia a João Lúcio dos documentos relativos ao almoxarifado
de Pernambuco, guardados na Coleção Pombalina. Não os vejo citados
em tuas obras, prova evidente de sua pouca valia : em todo caso, pelo
menos servirão para o que Derby chamava a geologia da lama, que às
vezes guarda surpresas.
184 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
Caro Guilherme,
Guilherme amigo ,
gado este teu velho amigo, que chamou para ajudá-lo o Rod. Garcia, do
Instituto Historico daqui, o Gentil Moura, de S. Paulo.
Comecei meus estudos por Minas Gerais ; Gentil já deve ter con
cluído o de S. Paulo em 1720 ; Garcia está trabalhando na antiga Capi
tania de Pernambuco, de Carinhanha e Parnaíba.
Sabes melhor que ninguém como a cousa é difícil, como sai im
perfeita, como o segundo que vier pode melhorá-la consideravelmente,
( com ] metade do trabalho. Pouco importa.
Não poderás reunir em volume o que consta sôbre os índios do
Ceará, para o Congresso dos Americanistas, em junho ?
O Instituto daqui pôs-se de fora : não é motivo para fazeres o
mesmo.
Guilherme amigo,
Pouco depois de ter escrito minha última carta, recebi o 4.º volu
me dos Documentos. Não o esperava ; o correio, ultimamente, tem feito
tudo comigo !
Agradeço -te mais esta prova de bondade e espero o 5.0 volume
antes das festas do ano próximo, a que pretendo não estar presente.
Estão sendo paginadas as provas do Inquisição. Não darão menos
de 300 páginas, sem a introdução, que será breve, e o índice alfabético,
no qual incorporarei as notas.
Os processos seriam um livro popular se não fosse a obscenidade de
ce : tos depoimentos, que bradam por latim , latim, mais latim.
Novidades históricas tenho encontrado algumas : o nome do avó e
da avó, a idade do pai de frei Vicente ; o nome do pai e mãe de Fernão
Ca dim, fatos relativos aos Ávilas, aos Adornos, etc.
Mais uma prova tive de que o caso de Bolès não passou como Simão
de Vasconcelos narrou ; declara Luís da Grã que ele tinha sido mandado
para a Índia, exatamente como se afirma na Informação que publiquei.
CARTAS A GUILHERME STUDART 187
Guilherme amigo,
Estou em grande falta contigo. Recebi as folhas do teu quarto
volume e não agradeci. Nem as li ainda.
Consegui que viessem de Mato Grosso, por solicitação do Calogeras
e intervenção do Rondon , dois indios bacairis para completar um traba
1ho começado em 92.
Guilherme amigo,
Sei que fazes anos agora em janeiro. O dia escapou -me. Pouco
importa. Aí vai o abraço, dado com a mesma cordialidade de 1863,
quando nos conhecemos no saudoso Ateneu.
Espero, para a semana, ficar livre das Confissões da Bahia, que
já conheces. Mandar - te - ei um exemplar completo da obra sa va
sans dire e uma separata do prólogo.
Espero na outra semana partir para São Vicente, onde ficarei um
mês, tomando uns banhos, com Jaguaribe, banhos pitorescos, mais de
areia que de água do mar.
Chamamo - los banhos de perus .
Até ...
Bien à toi,
Cap.
Rio , véspera do Fico, um século depois.
A JOSÉ VERÍSSIMO 1893-1914
entregou nas vésperas de minha partida, mas não encontro aqui ; 3.° :
provas do capítulo sobre os ungulados, publicado no Jornal do Comércio,
de que ainda não vi nem as primeiras provas, e que deveria entrar nas
que recebi hoje, logo depois da pág . 96. Conseguidas as coisas, peço -lhe
que as remeta ao Alves . Se forem postas aí no correio sábado, poderei
recebê -las na 2.a feira. Desculpe as maçadas.
Bien à vous,
J. C. DE ABREU
Escrevo -lhe uma carta ofic al e esta particular, cuja resposta lhe
peço com urgência. Tenho-me dado bem aqui na serra, e preciso para
minha saúde e para meus estudos ficar até fins de março . Poderia pedir
uma licença, porque a última e única que requeri foi em 1884 ; mas
estou encontrando duas dificuldades, cada qual mais ridícula : a primeira
é falta de médico, que me passe atestado ; a segunda, falta de estam
pilha para fazer requerimento. Pergunto -lhe, pois, se com a carta ofi
cial que junto, pode considerar minhas faltas como justificadas, e chamar
um substituto por uns 20 dias, que bem poderia ser o Sílvio, que precisa
bastante ? Faltam tão poucos dias para se abrir as aulas que lhe peço
me responda para meu governo.
Bien à vous,
J. C. DE ABREU
uns 20 seres fantásticos de que von den Steinen nem teve notícia e
tenho a história de Keri e Kame, que é como que a Gênesis deles , muito
desenvolvida, quase completa. Creio que ficará esta sendo a tribo se
não melhor estudada, pelo menos a melhor documentada do Brasil. Há
muita novidade de alcance geral. Nosso amigo Dr. Goeldi terminou
desde janeiro o volume sõbre as aves, que ficou com 450 páginas in folio .
Está -se preparando agora para passar aos reptis e anfíbios. Todas as
noites sai de lampião, com o primo, atrás das pererecas, que se têm visto
zonzas . Na próxima semana, segundo carta que tive do bibliotecário, po
derá entrar para o prelo o livro sôbre os bacairis .
E até a volta .
Bien à vous,
J. C. DE ABREU
17 de abril de 1909.
dificuldade, logo que chegar ao Rio. Aqui há tempo para tudo, até
para filosofar, e penso como a morte do Bittencourt esclareceu uma situa
ção e a do Pena só veio complicar outra. Lendo os jornais de ontem
tive bem nítida a visão de uma tripeça : Nilo, Rui, B [arbosa ] Lima! Na
Enciclopédia Espanhola, em publicação, de que o Moura, na Rua da
Quitanda, é agente, V. deve encontrar dados biográficos sobre Altamira.
Acabo de sair do banho, por isso a letra vai tremida. Respeitos à ex.me
família.
Bien à vous,
C. DE ABREU
casa comercial holandesa, que negociou em Lisboa até fins do século XVI .
Pelo indice vi que contém muita cousa sôbre o Brasil . O livro do
Gama Barros, que já está pràticamente lido, deu -me alguma cousa para
o segundo capítulo, em que posso ser mais preciso. Lendo - o, suscitaram
se idéias que serão aproveitadas no terceiro, creio que com vantagem ,
porque não trouxe um exemplar do meu trabalho ; pelo menos a expo
sição será mais lógica e a transição da Africa para o Brasil mais gra
dual. Se colher do livro holandês, terei feito até as guerras flamengas.
Desde que V. se mostrou tão disposto a ser incomodado, lá vai obra. Ve
ja se Tasso Fragoso obtém na Biblioteca do Exército uma história do
Uruguai, creio de Bola ou Bala. Se fôr possível vir para cá, entregue
no Briguiet para me mandar com outras cousas. No Briguiet devo ter
encomendas chegadas depois do dia 10. Se houver um livro sobre frases
vernáculas do inglês, peço-lhe que mande dois exemplares para a Rua
D. Luísa . Se houver, outro, alemão, 8.º grande, sõbre absolutismo, Luis
XIV, etc. , ele que remeta. Os discursos de Rui e Barbosa ( Lima ) lem
braram-me que nos últimos cantos da Eneida fala-se de um rei, Turno
ou Mesêncio, que amarrava pessoas vivas a cadáveres. Veja se encontra
isto no Odorico Mendes e se tiver ocasião mande-o ao Nuno de Andrade
ou ao Laje , caso tenha aplicação. Se estava com a cabeça regulando,
o que escrevi sõbre Altamira foi que veio no Avon e V. agite a Acade
mia para que o mande saudar a bordo e não seja tido por passageiro de
3.a classe. Sõbre o D. João VI, minha impressão condensa-se em uma
palavra : é um livro inferior ; achou meios de escrever cem páginas sem
a abertura dos portos, o mais importante de todos os atos do reinado, ser
mencionada. E como conta a revolução de 17 ! Nabuco, Aranha e Al
fredo de Carvalho têm razão : é um usurpador e estragador de assuntos.
Mas não faz mal : o livro será elogiado, vendido ; lido, duvido ; o autor
avultará e veremos o que já o indiscreto Xavier de Carvalho anunciou
em uma correspondência de Paris : será o sucessor de Rio Branco. Te
remos assim Nilo II . Com os diabos ! Ainda uma vez Nilo . Nem
mais uma palavra. Respeitos a ex.ma família .
Bien à vous,
C. DE ABREU
mente perdido, porque não adianto, perdido porque, quando volto, em vez
de achar os indios melhor dispostos, tenho, ao contrário, de novamente
fazer vapor para a máquina pôr-se novamente em movimento.
Respeitos à senhora e senhoritas.
Bien à vous,
C. DE A.
Mário,
Mário,
Mário,
rito tão superior e luminoso, com cuja privança podia ter adiantado anos,
fico triste. Fraco consólo é saber que se Abril tiver gosto por estudos
congêneres, não será condenado à aprendizagem de cabra-cega, de que não
me foi dado escapar .
Já começou a ler as Reminiscences de Carlyle, editadas por Froude ?
Não perca tempo ; inclua-as na sua hora de inglês, e o proveito será
duplo lingüístico, porque é um escritor de certa linhagem , e psicológico,
pedagógico, ou o que melhor nome tenha e V. achará.
Meus respeitos à ex.ma família.
Tem visto Brandão ? Nestes dias vou escrever-lhe.
Sempre,
CAP .
Paraíso, 17 de agosto de 1901.
Mário,
prefiro a história da China, anunciada por 8s., que espero ele não
cobrará a 2 $.
Já pegou em Carlyle ? Estes dias não o tenho lido ; mas a primeira
folga será para ele.
Saiu do
Que sucedeu a José Veríssimo ? Saiu Jornal ? O ano passado,
do Jornal?
quando Eduardo Prado chegou da Europa, Rodrigues disse : estão os srs.
Nabuco e Aranha em Londres a se entusiasmar pelos artigos de José Ve
ríssimo e a dizer dēles maravilhas com o Oliveira Lima. Ele não vale o
que eu pago .
Nunca contei isto ao Veríssimo, porque quanto mais velho fico, tanto
mais difícil acho saber onde a intriga parte com a amizade.
Recomende-me à sr.*, D. Georgina, Leo pai, mãe e filhos.
Sempre
Cap.
Paraíso , 28 de agosto de 1901.
Mário,
Fui ontem a Porto Novo, e num bilhete -postal respondi brevemente
a sua carta. Hoje posso ser mais prolixo.
Sinto muito seus incômodos físicos. Se você fosse um rapaz extra
vagante, o remédio simplíssimo consistiria em deixar-se de excessos ; infe
lizmente V. é um rapaz de juízo, e o remédio é o de Schweger, que tantos
anos vitoriosamente defendeu Bismarck contra a tesoura da Parca : fora
com o ramerrão ! É mais difícil .
V. dividiu o dia em certas talhadas : uma talhada para inglês, outra
para latim , outra para grego, sem falar na secretaria unspeakable. Tudo
isto está errado. Seu organismo, amigo, protesta e insurge -se, e é ele que
tem razão. Spencer, que tinha diante de si um mundo a criar, ficou
reduzido a trabalhar menos de dez horas por semana ; sujeitou -se à con
tingência, realizou uma obra que, digam o que disserem, é uma grande
obra, e ainda está vivo com 81 anos, com capacidade de trabalho talvez
maior agora do que na força da idade.
Por que não há de V. fazer como Spencer ? Considerar as talhadas
como função sua e não V. como função das talhadas ? Seus filhos seriam
uma boa ocupação: a secretaria seria outra, desde que V. não a conside
rasse como um açougue, porque V. trabalharia com prazer , isto é, com
acréscimo de vitalidade. Do meio de vida a gente só deve lastimar- se
quando está resolvido a jogá -lo fora imediatamente e procurar outro .
Lastimar -se e continuar pode ser uma forma mais ou menos embuçada de
cobardia , mas é sempre cobardia . Queixamo-nos da vida; entretanto ,
Spinosa passou a sua a polir vidros, e entretanto , da modesta oficina do
judeu luso-holandês saíram idéias que ainda correm mundo , e correrão
sempre , sujeitas embora aos caprichos e às limitações do gênero homo,
sempre obrigado a expor um lado hoje, amanhã outro, do peixe de que
se sustenta, expor um lado hoje, outro amanhã do peixe de que se alimenta
ao fogo da crítica na grelha da História.
Creio que há asneira nisto, mas passemos adiante.
CARTAS A MÁRIO DE ALENCAR 209
Não acho feliz a sua idéia do formato 32.º. Com o nosso papel , o
nosso tipo, a nossa brochagem sairia um monstrengo. E qual a razão da
preferência ? Poder -se andar com o livro no bolso : Não atenua os erros
contra a estética, não o tornaria de aspecto menos rebarbativo . É um
sonho de poeta conseguir vendas de dez mil exemplares. Creio que
Laemmert conquista este algarismo para suas folhinhas. Aliás para os
seus silabários ; as agências portuguêsas dêle se aproximam ; mas tudo
isto são fatos solteiros e extraordinários; que não podem servir de regra,
é evidente ; que não se dariam no seu caso, fàcilmente se demonstra, porque
V. não dispunha de toda uma organização comercial espalhada pelo Brasil
inteiro, e sem esta condição prévia, ficaria tolhido desde os primeiros
passos ; mesmo com ela, é duvidoso o resultado final, com a crise moral
e econômica vigente nos últimos vinte anos. Seus cunhados foram ca
balmente corretos, viram o negócio mais clara e nitidamente que V. Foi
muito bom que V. não recorresse ao Brandão ; é uma criatura encantadora,
mas de uma volubilidade que ninguém imagina. Uma vez, conversando
sôbre Henrique Chaves, eu disse que gostava muito dele, há muitos anos.
Eu também , disse Brandão, é uma criatura que não tem defeito. Pas
sados tempos, disse-me êle : é como V. diz mesmo, Chaves não tem defeito.
Destas inversões, que estranhava muito a principio, quando o conhecia
menos, lembro -me uma enfiada de casos. Se V. falasse sõbre o assunto,
primeiro o [ sic ] que ele se transportasse ao estado de espírito em que
com toda a efusão e sinceridade lhe fez o oferecimento, V. estaria arrepen
dido de ter - lhe falado .
V. precisa de deixar seu pai de lado ; o que ele podia dar-lhe de bom
já deu ; maior convivência do que V. tem tido com o espírito dêle, agora
só pode lhe fazer mal; paralisaria seu desenvolvimento, condenaria V. ao
triste papel de epígono. Seu pai deu -lhe um exemplo bem claro . O velho
Alencar em política representou um papel que nunca será devidamente
apreciado, porque seu pai, que podia fazê -lo , não teve tempo para tanto .
Apesar de tudo, seu pai, quando começou a carreira política, procurou
abrir caminho por outro rumo .
E seu pai deixou -lhe um aviso. Nas horas de pensamento louco, en
[ que ] as idéias atiram-se às cabriolas pelo vácuo, tenho cismado que seu
pai previu um filho como V., sacrificando ao amor filial energias que
depois lhe faltarão para a evolução própria, e quis deixar - lhe um conselho,
17 -- 1.•
210 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
Caro Mário,
Nesta crise, não quis ser só pai, tenho querido ser psicólogo ; em
nossa longa conversação sondei-lhe bem a alma, depois meditei bem sobre
tudo, deixando de parte o sentimento e convenci-me de que sua resolução
é a mais acertada. Grande consolo, não é ? para quem perde um ente
caro saber a causa mortis.
Considero -me uma ave qualquer que desde quase vinte anos outra
cousa não faz senão perder penas; as novas não substituem as antigas, e o
vôo faz -se cada vez mais rasteiro, e lá um dia virá, sobre todos desejado,
em que cesse a faculdade de voar.
Eis o meu caso, querido Mário.
Não sou pessimista, não sou otimista, sou um conformista, quem
sabe ? um satisfeito, mas hoje gosto tanto de não ser obstrusivo ! Se não
fôsse Matilde, creio que não moraria no Rio, e iria travar alhures rela
ções banais, que são as mais seguras, pois substituem -se.
214 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
pelo Sá, um ou dois dias depois, ele disse : abra mão do Campista ; escolha
entre Rio Branco e Rui 1 ( tudo isto é til, que falta no u ) . Pena ne
gou-se. Contemporâneamente, João Penido, a quem Pena tratara sempre
com a maior distinção desde menino, por causa do pai, disse a Pena que
Minas de modo algum queria Campista. “ É possível !" disse, espantado.
"Pois reúna a deputação mineira em meu nome, consulie-os com toda
a liberdade ; se forem contrários ao meu candidato, eu sou mineiro antes
de tudo, Joãozinho.” Por qualquer circunstância tal reunião não se deu .
Estou repetindo história contada pelo Gabaglia.
Aparece agora Hermes. Fui muito amigo, desde a monarquia, do
sogro dêle . Com ele nunca falei, nem mesmo o conheço. Se vi-lo de
perto , creio, o reconhecerei, porque tenho visto muitos retratos. Não sinto
por ele simpatia. A candidatura Hermes foi levantada pela oposição no
Amazonas, no Ceará e na Bahia, talvez em outros Estados : basta percorrer
os telegramas do Jornal do Comércio, para verificá-lo, antes de maio.
Não queria ser candidato antes da viagem à Europa, tão pouco
depois: creio mesmo que isto disse claramente em um banquete. Entre
tanto seus amigos não desanimaram . Soube por Calógeras que se tinha
conseguido uma concessão : na festa de seu aniversário, se o orador
não aludisse à sua candidatura, ele não faria declaração de que não era
candidato. Creio que as cousas passaram assim ; o orador indiscreto não
se meteu em especificações.
Duas ou três tardes depois, sai da Bib. Nac. onde trabalhara, descia a
rua 7 de Set ., quando, quase em frente à Tr. do Ouvidor, encontrei Gui
marães Passos. Sabes da novidade ? - Não. – Hermes pediu demis
são de ministro da guerra. — Por quê ? – 0 ... aqui uma palavrada...
do Pena quis que ele fizesse uma declaração por escrito de que não é
candidato à presidência. Hermes atirou -lhe com a pasta.
Não atirou tal ; a cena entre os dois não devia ter sido violenta, aliás
Pena não insistiria para que ele voltasse, nem ele podia ter voltado.
Afirmar o contrário é estigmatizar Pena como covarde e Hermes como
caradura. Quem lucra com esta mentira e com os xingamentos ?
O movimento anticampista lavrava forte nas montanhas altivas. O
congresso mineiro ia-se reunir, e seu primeiro ato seriam duas moções
Mário,
Serve esta carta de veículo ao abraço que lhe não posso dar pes
soalmente .
Tenho pensado em ir amanhã para Petrópolis em vez de segunda
feira. Opõe-se a isto uma porção de dificuldades, algumas até vulga
res ; mas o caso é que não poderei ir ; se não fosse certo embaraço, só
partiria daqui a 17 para o aniversário de Honorina.
Meu trabalho pouco adianta ; quase todos os textos estão ou devem
estar compostos, mas a revisão pouco avança , porque as novas provas
saem tão erradas como as primeiras ; quanto à tradução , à medida que
meus estudos caminham , procuro torná-la mais exata e mais rigorosa ,
e modifico-a constantemente. Ao mesmo tempo que a impressão caminha,
vou colhendo novos textos. O capítulo 1.9, Fraseologia, do Vicente, está
completo ; bem como o 2.º, Vária, de Tuxunim . Para o terceiro , em que
colaboraram os dois, Etnográfica , tenho a esperança de obter mais alguma
cousa : lendas creio que tenho umas quinze, e pode ser que neste inter
valo apareçam ainda outras ; não há três dias, Tuxunim contou -me uma
das mais interessantes. O último capítulo, Metafísica, é que sairá muito
pobre ; diz Tuxunim que Vicente não conta certas cousas com medo
das almas de lá . Ainda há crentes ...
E agora V. pode ficar certo que outra língua não me pegará ; só se
fôr o bacairi, para não ficar de todo perdido o material que recolhi .
Na próxima semana aí estarei , e minha demora será de uns dez dias.
Desejo-lhe feliz êxito com a estada em Cambuquira ; não vá, porém ,
sem consultar médico ; as águas têm muita força e cumpre não facilitar.
Reli a carta que lhe escrevi há uns dias ; achei-a desconexa, mas,
como ainda hoje representa minhas idéias, junto-a. Rasgue-a depois
de lida .
Saudades a todos .
Bien à vous ,
C.
Paraíso , 28 de janeiro de 1910.
apresentá -los-á, até o fim do ano, que não houve esbanjamentos nem
despesas ilegais, e V. considera-o cínico, porque as murmurações de aldeia
dizem o contrário, fixam os contos e talvez os vinténs por que se rea
lizou a grande mercancia !
No dia 6, aniversário do Werneck, estarei no Rio ; espero ficar lá
definitivamente depois da Semana Santa. Mesmo porque Calógeras pre
cisa de mim , para ajudá-lo na revisão das provas de um trabalho em que
está empenhado.
Saudades e saudações a todos.
C.
Paraíso, 2 de março de 1910.
pre me comove : como Goethe, eu também não terei o livro lido por
aqueles que mais quisera.
E além disto a questão terebrante : o povo brasileiro é um povo
novo ou um povo decrépito ? E os fatos idealizados pelo tempo valem
mais que os passados atualmente ?
Sôbre política nada lhe direi. Parece-me, porém , que V. generaliza
por demais, e exagera sem discernimento.
As atrocidades da Ilha das Cobras são infandas ; mas que nome
merece a impassibilidade do público, depois de conhecê -las ? A imprensa,
que ou
ou se cala pudicamente, ou explora com todo o despejo aquelas
misérias ? Fique certo que o Hermes ( ou Palerma) não abre era nova .
Continuo a preferi-lo ao Rui. Sá teve uma felicidade única. Um tele
grama veio da Europa, dirigido a Laffond ; Vanewen surripiou -o, deci
frou - o como muito bem quis ; Seabra, na sua imbecilidade, considerou - o
argumento irrespondível; por isso apresentou-o, e por isso vão defron
tando mais um fantasma impalpável, porém uma entidade concreta . Sá
pôde sair vitorioso. Como há de estar arrependido Seabra de sua imbe
cilidade criminosa !
Se tivesse tempo e espaço , contava -lhe o papel de Miguel Lisboa nesta
emergência. V. veria que nem tudo está perdido.
Se V. continuar na Tijuca, dia de seus anos, lá irei.
Saudades ! Saudades.
C.
Rio, 18 de janeiro de 1911 .
Mário,
Acabo de receber sua carta .
Já ontem escrevi a Antenor, perguntando se ele e Oliveira poderiam
facilitar-me a condução no dia 30. Se a resposta fór afirmativa, irei
no bonde em que eles têm de vir para baixo.
Desejo também levar Matilde.
Mendonça, que examinou - a, vai para dois meses, achou-a muito mais
depauperada, deu - lhe umas pastilhas para despertar o apetite, e recomendou
exercícios e banhos de mar .
Estes não começaram porque Abril teve escrúpulos em levá-la ao
High Life . Disse -me, porém, Werneck que as famílias de Botafogo fre
CARTAS A MÁRIO DE ALENCAR 227
Ontem recebi provas até a pág. 259 : espero na próxima semana dar
o resto das histórias - ao todo umas cinqüenta, algumas repetidas. As
repetições não têm por fim engrossar o volume : quando não contêm
variantes, tanto mais curiosas, porque os dois rapazes são primos e filhos
da mesma aldeia, apresentam fatos lingüísticos novos.
Depois virão notícias, algumas preciosas, cenas da vida real, etc.:
umas cinqüenta páginas. Para concluir, tenho de me ocupar do voca
bulário, cuja primeira redação já está passada a máquina ; preciso, porém ,
de revê-lo cuidadosamente e de inserir palavras novas, apanhadas nos
textos : sem estes não a colheria, porque, dando o têrmo brasileiro, éles
respondem , e sinceramente, que não conhecem o equivalente. Calculo que
darei mais de três mil palavras . Veremos.
Para sobremesa reservo a gramática : apenas a conheço empirica
mente ; depois do vocabulário, atirar-me-ei a ela com toda a energia : se
tiver acabado tudo em junho, posso dizer que durante dois anos não
fiz outra cousa. Represento bem o caso do amigo que foi deixar outro
a bordo, lá descuidou-se e teve de ir para onde não queria, sem roupa,
e o que pior é, sem dinheiro.
Vem -me a idéia um dito de João Brígido sobre seu parente Meton .
228 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
Mário ,
Acabo de ler que vai -se abrir a inscrição do concurso de segunda en
trância para os empregados do Tesouro .
Já escrevi a Adriano que se inscrevesse e preparasse deveras.
vença-o e consiga que Mário dê- lhe algumas explicações.
Recebi ontem uma carta do Sombra, dizendo que nos trará novo
indio. Em tal caso irei buscá - lo e demorarei mais tempo aqui, de modo
a acabar o trabalho.
Também estou estudando as guerras platinas, para ver se de uma
feita arranco éste bicho do pé.
Pretendo partir sábado, 1 de agosto, digo, 31 de julho, e aí estar
segunda-feira , 2 de agosto . No Ceará dizem que o dia é aziago.
Lembranças e saudades a todos.
Bien à vous,
C.
Paraíso , 20 de junho ( 1911 ? ] .
CARTAS A MÁRIO DE ALENCAR 229
Seu conto deixei que D. Adélia lesse primeiro : já acabou , vou começar.
Vou começar também para a semana a reimpressão de meu livro
sobre os caxinauás : as matrizes encomendadas para as linotipos já
chegaram .
Comecei no Jornal do Natal um resunio do livro : o segundo artigo
já revisto e composto esperei que saísse domingo, segunda, ou hoje, têrça :
não sei quando virá. O terceiro está quase acabado ; o último, o mais
difícil, vai bem encaminhado e posso confiar -me à mera ação da gravi
dade para chegar ao fim .
Ficar-lhe-ia muito obrigado se V. me arranjasse um dos últimos
números da Quaterly Review , no E. S. Lib. Quando sobe ? Espero ir
jantar antes com V.
Veja como anda minha cabeça. O número da Q. R. é o que traz
um artigo de Salomon Reinach sôbre mitologia.
Bien à vous,
C.
2 de janeiro de 1912.
Vá por este meio o abraço que não lhe posso levar pessoalmente,
como o ano passado.
Que seja muito feliz, veja satisfeitas suas aspirações é o meu grande,
verdadeiro desejo.
Se vier à cidade, peço -lhe mandar mais volumes dos Anais a Leu
zinger para serem rebrochados.
Recomendações e saudades à ex.ma família.
Até breve.
Bien à vous,
C.
Rio, 30 de janeiro de 1912.
Mário,
a doze horas por dia, revejo o que estava feito, agora com olhos mais
acostumados ao escuro , e não rejeito matéria nova . E continuo a esperar
firme. Leuzinger tem sido admirável, a linotipia opera milagres.
Mandei o último dos meus artigos do Jornal, sem escrever, juntando
apenas o endereço à assinatura, a um padre austríaco, grande notabilidade,
especialista do grupo pano, a que os caxinauás pertencem . O padre es
creveu-me uma longa carta, dizendo que seu trabalho ia ser editado nas
Memórias da Academia de Viena, pediu -me mandasse o vocabulário e a
gramática para publicar juntamente com as outras : neste caso espera
ria mais algumas semanas .
Tenho enviado provas do vocabulário, que mandara compor para
facilitar a revisão e a inclusão de novos vocábulos : já foi até letra K : 0
resto porei no correio na próxima semana.
Esta noite assentei -me para começar a gramática, veio a insônia,
resultado : fiz quase toda a gramática de uma vez, uma gramática feita
de cor, sem exemplo, mas contendo tudo o que há de essencial. Hoje
espero terminar. Está claro que no livro a cousa sairá com outro de
senvolvimento, mas não se trata mais de erguer o prédio, sim de divisões
internas e mobília.
Na semana começada amanhã, espero adiantar tanto o trabalho que
possa fazer jus a uma folga. Assim, pretendo entre 14 e 31 ir fazer-lhe
uma visita.
Meus respeitos à sra., D. Georgiana, Mário e Clarisse.
Cafunés nos meninos em que a idade permitir.
Bien à vous,
C.
Caro Mário,
Li muito interrompido o que tinha de ser, e minha impressão final
foi boa. Quando tiver uma folga, relê-lo-ei com suas Poesias, e serei
mais preciso.
Notei certo excesso nas picardias da madrasta à enteada : com a
Mário amigo,
Parabéns e abraços pelo dia de hoje. Viva bastante para que seus
filhos, hoje objeto de preocupações, sejam -lhe motivo de contentamento
e felicidade.
Vão aí umas folhas de meu caxinauá : veja se falta alguma, ou ao
contrário há duplicata. Para acabar faltam cerca de 150 páginas: espero
alforriar -me no próximo fevereiro .
Respeitos à senhora ; cafunés na meninada.
Bien à 10145,
C.
Rio, 30 de janeiro de 1913 .
Caro Mário ,
Saí do Rio um dia antes do que esperava ; por isso não lhe comuni
quei que partia para Poços de Caldas.
Aqui veio ter a carta de Augusto com as duas folhas já conferidas.
O livro ficou no Rio, e foi o melhor, porque aqui não preciso dele. Já
escrevi a Augusto agradecendo : vamos ver se o correio não faz das suas.
Contristou -me sua carta . Pensei que depois dos dois choques ter
ríveis do ano passado, V. voltaria a ser o que foi . Agora há um remédio
que V. não experimentou ainda, que me conste : sugestão e hipnotismo.
Por que não consulta Afrânio e Juliano ? Sendo seu mal puramente
subjetivo, o medicamento já está indicado. Aqui o médico permitiu -me
que tomasse dois banhos diários : já estou no décimo.
A fonte mais freqüentada é a de Pedro Botelho; à do Macaco, mais
afastada, quase ninguém vai : nas duas vezes que nela banhei-me, senti
me muito mais a gosto.
Minha demora será de poucos dias . Como tenho passe para toda a
linha Mogiana, é possível que chegue a Goiás . Espero carta do Bulhões,
a quem consultei .
Trouxe uns livros de Mitre para estudar e ver se serei capaz de
navegar D. João VI rio abaixo. Estou aqui no Hotel do Oeste, mas
não vale a pena escrever -me, porque talvez sua carta já não me ache.
Respeitos aos seus .
Bien à vous,
C.
Poços de Caldas, 13 de fevereiro de 1914.
CARTAS A MÁRIO DE ALENCAR 235
de bonde elétrico, senti-me tão orgulhoso como em não ser de todo leigo
nessa lingua para que não faltam gramáticas, dicionários nem mestres.
Nunca o alemão foi para mim mais que um meio de transporte mais
rápido; na atual guerra não invejo os que citam sòmente os inimigos;
audietur altera pars, aprendi desde muito môço ; não vejo motivo para lan
çar carga ao mar. Sõbre minhas simpatias só converso com S. Ali : ele lhe
dirá se sou incondicional, se amo mais a Alemanha do que a minha cons
ciência . V. transforma -se em mestre- escola pretensioso ... Tem graça !
Felizmente tive alunos, nunca tive discípulos e nunca os cobicei.
Na Suíça, li algures, é proibido hoje nas escolas públicas introduzir a
história de Wilhelm Tell, depois da crítica histórica ter demonstrado sua ina
nidade. Porque, tendo estudado o depoimento de Tiradentes e a sentença
da alçada, sou obrigado a repetir a versão corrente e a colocá -lo no Pan
teon ? Nunca escrevi sõbre éle ; nos Capítulos, dada a escala, não entrou
porque não cabia : tenho emitido minha opinião em conversa : é tão fácil
derrubar o que não chega a ser granito. Que mal já veio dela ?
Para concluir.
Quando Diderot foi às margens do Neva, agradecer a excelsa pro
tetora que lhe comprara a biblioteca e mais de uma vez o socorrera
generosamente, disse - lhe uma vez Catarina II : o Sr. talvez tenha razão,
mas o Sr. escreve tudo isto em fôlhas de papel, eu teria de escrevê- lo em
fôlha humana.
Digo eu : artigos defendendo ou atacando os beligerantes são exercí
cios de estilo, árias de bravura, logomaquias: a realidade são os milhões
de turcos, sérvios, russos, alemães, franceses, inglêses, belgas, que diària
mente tombam aos milheiros, certos da justiça de sua causa , etc. Isto
quis dizer, mas a língua não me ajudou : paciência.
Bien à vous,
C.
Respeitos à sr.a, lembranças aos seus.
19 - 1. •
242 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
Mário amigo,
Mário amigo,
Mário amigo,
Pretendia ir almoçar com você em companhia de Alberto Faria que
fiquei conhecendo da última vez que estive em S. Paulo e apreciando
muito .
Não foi possível, porque estava de viagem marcada para Morro Azul,
fazenda de Francisco Sá , em companhia de Cecilia e Abril, e pretendia
fazer umas verificações miúdas sobre um artigo relativo a S. Paulo, que
me ocupa desde o princípio do ano e ainda não quer me largar.
Se V. ainda não está comprometido, recomendo a seus sufrágios
Aloísio de Castro, em quem reconheço mais de um traço de semelhança
com V.
Mário amigo
Acabo de receber sua carta, e respondo em poucas palavras antes de
partir para uma missa de defunto.
Por que, antes de partir de uma vez , não vem ao Rio e não
consulta a Austegésilo [ sic ] e Miguel Couto ?
Por que não segue o sistema de consagrar as férias só ao animal ?
CARTAS A MÁRIO DE ALENCAR 247
Mário amigo,
Indo hoje à Biblioteca da Câmara, soube com grande prazer que
V. ainda está em Paquetá.
Muito bem !
Hei de lhe mostrar um dia a biografia de Herbert Spencer.
Teve épocas de só poder trabalhar três horas por semana ; e passou
dos 80 , e deixa quantos volumes.
Tenho estado escrevendo um artigo sôbre cousas de S. Paulo. Desde
o princípio do ano labuto com ele ; só agora vejo bem o fim .
Quando V. voltar, falaremos nisto.
E quando volta ? O mais tarde possível, é o que desejo.
Respeitos à sr.a, lembranças à petizada.
Bien à vous,
C.
Rio, 24 de março de 1917.
248 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
Mário amigo,
Terminei a documentação do meu artigo ; espero escrevê - lo na Seinana
Santa. Avise para a Revista do Brasil. Dei-lhe o título geral Paulistica
porque são uns cinco ou seis, e tratam todos de S. Paulo, os que tenho em
vista . Como se trata de uma moeda, vou ver se obtenho uma fotografia
na Biblioteca para ilustrar o texto .
Desejaria também ver as provas, se fosse possível.
E usam separata ? Na Alemanha é costume geral dar umas vinte e
cinco por conta do editor ; se o autor quer mais, paga o papel.
Desejava mandar, no vapor que têrça-feira parte para os Estados
Unidos, ao velho e sincero amigo do Brasil, Dr. Branner, um artigo, que
saiu na Revista, sôbre o dialeto caipira.
O número não há mais no Briguiet. Poderia ceder-me o seu, en
quanto vem de S. Paulo o exemplar que vou encomendar ?
Agora que libertei-me da moeda de S. Vicente, passo a ocupar -me de
Estêvão Ribeiro Baião Parente, paulista que andou conquistando o sertão
baiano na penúltima década no século XVII. Pouco se sabe a seu res
peito ; o que tenho apurado não é muito, mas em todo o caso adianta a
questão. E depois virão Fernão Dias Pais, Matias Cardoso de Almeida,
Morais Navarro e, quem sabe ? o próprio Domingos Jorge Velho, que por
ora resiste a todas as pesquisas antes da Campanha dos Palmares. O
Basílio aborda - o no último número da Revista do Brasil; antes não esca
para a Studart e a Pereira da Costa .
Pelo papel verá que estou escrevendo da agência, para não demorar.
Segunda -feira irei à Câmara ver se V. trouxe a Revista para o Branner.
Bien à vous,
CAP .
Rio, 31 de março de 1917.
Mário amigo,
Recebi sua carta que me lembrou outras duas bem dolorosas : uma
quando a mãe morreu e V. estava na Tijuca, outra quando Honorina en
trou para o convento. Recebi também cartão de D. Chiquita, telegramas
de Clarisse e Harold .
CARTAS A MÁRIO DE ALENCAR 249
Mário amigo,
Recebi sua segunda carta . Muito obrigado. Dentro de uma hora
estarei a bordo, rumo de Pedras Altas. Escreverei de lá.
Adeus , Baby !
Adeus, nova geração.
Rio, 10 de novembro de 1918.
Marido de Matilde : Dr. Aprígio Nogueira.
Machado, Viação Sul-Mineira .
Telefone de Cecília : Berenguer, César, S. Clemente, 460 , av., casa 6.
Mário amigo,
1.º do ano, 1.º de janeiro. Neste mês faz V. anos e o fim desta
carta é antecipar -lhe os parabéns, na esperança que chegue a tempo .
250 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
Mário amigo,
Acaba de chegar sua carta de 8, e por ela vejo que recebeu a minha
do princípio do ano.
Alegram -me as notícias da saúde de Jorge e da sua. Lembre - se de
Spencer, que fez tudo quanto planejou, tendo semanas em que apenas
podia trabalhar algumas horas , e chegou aos oitenta e tantos.
De sua colaboração da Noite tinha lido notícia, a do Jornal do Brasil
é novidade. Fêz bem em aceitá-los : os compromissos inadiáveis são um
bem, porque, fazendo de ossos resistentes, equilibram o organismo e re
partem melhor o tempo. Não lastime o adiamento das novelas : repense
e repense nelas de modo que, quando se sentar para escrevê-las, escorra a
linfa cristalina. Nenhum de seus artigos li ; ainda não vi V. depois da
partida: mesmo o Jornal do Comércio, que assinei, vem com irregu
laridade. () correio do Rio Grande, pelo menos em Pedras Altas, aonde
não permitem agência, pode contar- se entre as maravilhas do Estado.
Parece que daqui para lá os extravios são menores que de lá para cá .
CARTAS A MÁRIO DE ALENCAR 251
Por aí pode ver como ando bem informado quanto ao que se passa no
mundo.
Sei apenas que a gente do Rui se empenha agora em desmoralizar e
despedir Domício. Rui é Moloque. Seja - o a seu gosto ; gênio nunca será :
a mim só lembra uma cobaia prolífera e multipara.
De Augusto ainda não tive notícia. Espero chegar a tempo de
abraçá-lo.
Pretendo partir daqui a 29 e tomar vapor no Rio Grande, dia de
mentiras .
Respeitos à senhora.
Adeus, nova geração !
Bien à vous,
Cap.
Pedras Altas, equinócio de 1919.
Mário amigo,
Um acesso de reumatismo, sobrevindo 2.a feira, não me priva de
ler e até escrever deitado, mas prende-me à rêde.
Envio agora a nota à viúva Bertino.
Se fôr possível desde hoje, mande todos os convites da Academia ao
Dr. Eugen Vann, City Bank.
É um intelectual, professor da Stanford University, que me foi reco
mendado pelo Branner.
Bien à vous,
C.
Rio, 13 de novembro de 1919.
Mário amigo,
Cheguei a 18, comecei as águas a 19, pretendo partir a 11 de abril
para visitar Matilde no Machado , depois demandar a combra protetora do
Gigante de Pedra, a 15 ou 16.
Bebo da Fonte Viotti , a mais fraca, e por isso mesmo a mais eficaz.
Para saber do efeito produzido, precisaria saber o que tenho. Vim lavar
o fígado para atacar o reumatismo em suas bases. Sinto que o reuma
MÁRIO DE ALENCAR
1
1
1
CARTAS A MÁRIO DE ALENCAR 253
Mário amigo,
Mário amigo,
Aí vai a cópia da carta do Nunes. Peço-lhe entregue ao Tuxunimo
Nyrop e o Pidel para mandar ao Said . Há hoje 47 anos que vi seu pai
pela primeira vez em Maranguape !
C.
Dia em que todos os diabos andam soltos, 1921.
Mário amigo,
Parti do Rio a 23, no dia seguinte cheguei a Santos: Quinta- feira
subi a serra, fiquei com Martim Francisco em São Bernardo. Anteontem
fui almoçar em S. Paulo.
Hoje é aniversário da senhora do Martim : dentro em pouco devem
chegar hóspedes.
Amanhã descerei de automóvel com Paulo Prado. Com Jaguaribe,
que faz anos a 2 de novembro, ficarei até a outra terça-feira ; conto estar
aí a 9.
Diga a Adriano que reclame do Mota uns cadernos em branco, como
o que entreguei a Pirilo para este fazer as cópias : é conveniência que
todas as cópias sejam do mesmo formato, para mais fàcilmente se car
tonarem .
Mário amigo,
com Arn. Azev. presidente da Câmara : por que não lembra o Pedro II
de preferência para sede da barulheira ?
A casa de Jaguaribe é praia de São Vicente, 82.
Respeitos à senhora e prole.
Bien à vous,
C.
Rio . 29 de janeiro .
Mário amigo,
Recebi o número da Revista da Academia e li com avidez seu pare
cer. Suas opiniões estão muito bem fundamentadas. Algumas das res
postas ao Duque são particularmente felizes. Devo dizer que este não
estava tão ruim como eu pensava.
Estive com Alcino e prometi visitá-lo antes de retirar -me. Pretendo
voltar para o Rio no princípio do mês. Se Calógeras fôr mesmo para o
Rio Grande, aí me juntarei à comitiva .
V. encarregue Jorge de procurar nas Memórias da Academia de Ciên
cias de Lisboa um artigo de Fr. Francisco, digo, do Marquês de Resende
sôbre Frei Francisco de S. Luís : está nos últimos dez volumes. Nêle
encontra-se uma carta de Carneiro de Campos, escrita do Rio de Janeiro,
em fins de 1821 : eu gostaria que ele a copiasse e remetesse a Roberto
Haddock Lobo no Auto Club São Paulo . Conviria mandá - la
registrada .
Até breve.
Bien à vous,
C.
Praia de S. Vicente, 82 – Santos.
17 de fevereiro de 1922 .
CARTAS A MÁRIO DE ALENCAR 257
Mário amigo,
Aí vai este livro , seleta, gramática, dicionário – tudo alemão .
Tolle et lege.
C.
2.a f.a, 22 de maio de 1922.
101
Mário amigo ,
Por Adriano deixei- lhe dois recados que repito :
1.° : dizer a Augusto Pinto que do índice do Marquês de Pombal
mande compor apenas o título de cada capítulo : assim determinou o autor.
2.° : Moacir, que quase diàriamente vai ao Jornal do Comércio , peça
as provas paginadas do meu artigo, e entregue no Briguiet ao Ladário,
para, registadas, remetê-las para a praia de S. Vicente, 82, casa do Ja
guaribe.
Por meu jeito ficarei aqui até o equinócio.
Diga a Pirilo que, quando fôr tempo, vá ao Colombo receber o
dinheiro .
Saudades.
Bien à vous,
C.
S. Vicente, 14 de agosto de 1922.
101
Mário amigo,
Escrevi-lhe semana passada pedindo :
1.° : dissesse a Pinto que, por indicação do autor, mandasse compor
apenas o título dos capítulos para o índice do Marquês de Pombal de Lúcio
de Azevedo ;
2.0 : dissesse a Primitivo Moacir reclamasse umas provas minhas no
jornal e as entregasse a Briguiet para mas remeter ;
3.0 : comunicasse a Pirilo que na Casa Colombo existe dinheiro para
o pagamento do mês corrente.
Desejo muito que a carta chegasse a seu destino.
20 - 1.º
258 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
Mário amigo ,
Mário amigo,
Mário amigo,
Saudades,
AB
3 de maio de 1924 .
Mário amigo,
Acabo de ler a notícia da morte inesperada de Alberto de Faria, em
Paquetá.
Dou-lhe sentidos pêsames pelo triste sucesso , e peço -lhe transmita -os a
Leo e senhora.
Escrevo - lhe de Prata, estação de águas na linha Mogiana, perto de
Caldas. Vim a convite de Jaguaribe a esta Vichy paulista. Devemos vol
tar depois de 20. Tenho um critério seguro para saber se a cura me fará
bem ou não. Há dias pesei 75.700 gr.; se levar alguns quilos a menos, é
sinal de que não perdi o tempo.
Pretendo passar em S. Vicente o mês de outubro, e estar aí em
começo de novembro.
260 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
[ Fôlha sôlta ]
Já seguiu para o Jornal o 2.º e último artigo do prólogo dos Diálogos
das Grandezas do Brasil. Logo que sair, mande-me um Jornal com ele,
para eu corrigi-lo. O primeiro artigo leve à Imprensa Nacional, para ser
composto no mesmo tipo da introdução a Frei Vicente.
Lembrei -me que V. conhece o reitor de Friburgo – Fr. Domenico
De Meis. Em carta registrada mande o recibo, avisando - o que o faz
porque eu estou ausente do Rio, a meu pedido que os livros foram
entregues aí, etc.
Que pena Portela não mandá -los pelo comissário ! Não compreendeu
que eu , salvando 200 $, tinha verdadeiro prazer em gastar 3 $ com o co
missário !
Mande-me um exemplar do artigo sobre Eduardo Prado. Quero
corrigi-lo para mandar para S. Paulo .
A DOMÍCIO DA GAMA 1900-1919
1
3.a feira – 4 de dezembro ( 1900]
Domício amigo ,
V. chega , eu parto . Recordo -me com veemência de nosso idílio de
1900, com o nosso convívio quase diário, e as duas velhinhas, desigual
mente caras , mas tão boas, tão santas ambas.
V. encontra a situação muito melhor que um mês antes; não temos
de mandar soldados, felizmente.
Em diplomacia somos associados, não somos aliados ; temos de formar
ao lado dos Estados Unidos, entregar nosso voto a Wilson.
Não creio na amizade dos Estados Unidos, filho espúrio de Salvador
de Mendonça, criado e chocado pelo Barão, pelo Nabuco , por V. , talvez
por Assis Brasil, que já tem a visão menos turva.
O que vocês querem é colocar o Brasil relativamente aos Estados
Unidos na relação de Portugal para com a Inglaterra .
Imagino e desejo anibições menos modestas.
O manual do Itamarati deve ser a Ilusão Americana. Tem um ?
Deve ter, mas é o livro de um homem .
Ficarei em Pedras Altas até Páscoa ou S. João, conforme circunstân
cias que só em parte dependem de mim .
Até a volta .
Cap .
Santos, 11 de novembro de 1916.
Domício amigo,
Espero brevemente notícias suas pelo Oscar Clark, que não pode
tardar.
Também você as terá minhas pelo Paulo Prado, se fôr, como pre
tende, para a Europa, via Estados Unidos, para conversar com V. Um
jornal de ontem dá cousa certa sua entrada no próximo gabinete. Se
fôr para bem de todos e felicidade geral da nação, não hesite. Do meu
ponto de vista, sua presença me dará prazer e felicidade.
Nilo já preparou a saída. Modesto foi escolhido senador e reconhe
cido depois de uma campanha terrível da imprensa, em que a nossa velha
Gazeta não escolheu anos, para guardar -lhe a cadeira curul.
Nosso Bulhões rodou . Escrevi -lhe e não me respondeu : ele não
esperava esta sorte. Parece que foram executores S. Paulo e Minas.
Azevedo vingou - se nele do voto do Natal no Supremo Tribunal. Não
sei que vai fazer, se será nomeado ou aceitará o lugar no Tribunal de
Contas. Antes da depuração, organizava -se uma companhia de que seria
presidente. Ignoro se mudaram de opinião, desde que não é senador.
Caso semelhante aguardava Calógeras, porém foi mais feliz, e volta
à Câmara, embora não por seu antigo distrito. Anda muito ocupado
com a história do reconhecimento de Independência e passa os dias em
Itamarati. Talvez V. possa trazer-lhe alguns subsídios dai.
Vou agora pedir-lhe um livro, muito contra minha vontade, só porque,
apesar de encomendado, não pude obtê- lo.
A Princeton University está publicando uma edição fac -similar das
cartas de Am . Vespucci. Vi-os no Instituto. Briguiet, apesar do bom
correspondente que possui aí, não me arranjou. Ignoro por quê. A edição
deve ser grande.
264 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
Domício amigo,
Escrevi-lhe há alguns dias, transmitindo pedidos. Ontem chegou sua
carta de 12, vinda de Bagé. Antes dera-me noticias vagas o Arrojado.
Minha carta de Santos parece não foi bem compreendida. Continha
uma tese ; acredito tanto na amizade dos Estados Unidos pelo Brasil como
na da Inglaterra por Portugal. Faltam às duas nações latinas certas qua
lidades que se impõem ao respeito e à estima dos anglo - saxões. Têm
ambas um fundo de fraqueza, que as faz antes patrocinadas, que aliadas.
Agora a hipótese : no momento atual nossa atitude só pode ser formar
ao lado de Wilson. Parece que não será difícil . Das eleições, apesar de
enfraquecido, apesar de seu manifesto desastrado, não provirão dissabores,
desde que a paz för ditada, como queriam os botafogos de lá, julgando
pedir a lua, e parece vai ser. Seu decálogo 4/10, aliás antes russo que
wilsoniano, foi perfilhado pelo Poincaré, será farisaicamente aceito ; na
realidade ninguém o quer. Em tudo nosso papel deve ser o de carneiro de
batalhão. Isto será fácil, porque não temos para nos representar o pri
meiro dos brasileiros, tolhido na sua veleidade de mostrar, num sumário
como ainda não houve outro igual, que é o maior dos contemporâneos,
se não o maior dos filhos de Eva . O homem atingiu ao niilismo absoluto :
ninguém o tolera a seu lado.
Desagradou -me conseguirmos três delegados, mais uma prova do pa
trocínio dos Estados Unidos. Só os ingênuos ignoram que a grandeza
dos planētas não lhes comunica luz própria.
Achei graça na rabadilha conduzida pelo Epitácio. Temos o sebas
tianismo do encilhamento embaixada de ouro , missão médica, exames
por decreto, etc. Conheço pouco Epitácio : parece-me um pouco obstrusivo :
escrevi a Calógeras que em caso de dissidência corresse ao telégrafo.
CARTAS A DOMÍCIO DA GAMA 265
Domício amigo,
1. Trata -se da obra de Antônio José Rodrigues Chaves, cuja primeira edição
é de 1822 ( Rio de Janeiro ) e a 2.a, reproduzida na Rev. do Inst. Hist. e Geog. do
R. G. do Sul de 1922.
268 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
Domício amigo,
A ocasião é calva. Nunca me senti melhor do que agora , lembrando
me que depois do jantar poderia acompanhá -lo aſo] Itamarati, em vez
de voltar de automóvel com Augusto.
Acho que o procedimento do Epitácio com V. não foi de gentleman ;
êle há de reconhecê-lo, de excogitar qualquer motivo que a ele não deixe
mal, e há de encontrá-lo ; será o coice depois da queda.
Se V. estivesse só, a solução seria simples : poderia, por exemplo,
tomar o Idaho e ir gozar uma licença em S. Francisco ou Honolulu.
Mas há a tragédia doméstica ; e lembre -se do conselho incomparável de
Azeredo a Floriano : é preciso dar uma solução imprevista à questão.
Parece -me que V. deve ir hoje à Academia e assentar hoje mesmo
no que pretende fazer, de modo a começar agosto desanuviado.
Lembra -se do caso do Tesouro ? Passou -se em 1900, creio . V.
procurou um dos figurões, que pôs-se em movimento, apenas V. começou.
V. acompanhou - o alguns passos e depois, estacando, disse : assim, até
onde vamos ?
Pretendo jantar hoje com Bulhões.
Ando de laringite ; hoje vou procurar médico : não sei que regime
me imporá.
CARTAS A DOMÍCIO DA GAMA 269
Minha filha casada passou aqui duas semanas ; não a via desde o
casamento maio de 1917 ; não tem ainda degredados para este vale
de lágrimas, e progrediu moralmente durante o biênio . A partida, do
mingo passado, assanhou -me as saudades e fiquei e continuo aborrecido
de tudo e de todos.
Bien à vous,
CAP.
Rio, dia de S. Inácio de Loiola.
A PAULO BRANDÃO 1904-1912
Amigo Paulo,
Recebi sua carta e os 50 $.
Quanta maçada ! Fico-lhe muito obrigado por esta vez , e não me
despeço de ocupá -lo ainda outras.
O mais interessante é que estava impaciente por ir ao Rio e não
pude ir. Antes do dinheiro chegou o reumatismo, fraco é verdade, mas
quem sabe se ficaria no começo ?
Há aqui uma planta chamada cinco - fôlhas, com a qual dizem que
reumatismo não pode. Atirei -me a ela com entusiasmo, e na dúvida
juntei-lhe um pouco de iodureto . Creio que o mal está atalhado. Pre
tendo dormir segunda- feira em Petrópolis. Terça- feira irei ao escritório.
Meu abraço ao querido Brandão.
E V. continue a querer bem ao
amigo velho
C. DE ABREU
Paraíso . 20 de novembro de 1904.
Amigo Paulo ,
Recebi uma carta de Abril, dizendo que, por estar doente, não poderá
êste mês ir ao Tesouro .
Por isto junto uma procuração para V. este mês e ainda o seguinte
poder receber meus vencimentos.
Do dinheiro peço que entregue 36$ ao caixa da casa Laemmert,
que lhe entregará um recibo da Germânia ; 50 $ mande -me pelo correio
em notas de 10 $ ; o resto mande entregar a Abril. Creio que se paga
amanhã , sexta - feira .
Desculpe estas maçadas com um abraço do
amigo velho
Cap.
Paraíso, 4 de novembro .
No endereço basta por : Porto Novo do Cunha.
Amigo Paulo,
Vou agora a Pôrto Novo, ver se V. mandou sábado o dinheiro
que lhe pedi .
Se não tiver mandado, é um grande transtorno, porque preciso de ir
ao Rio esta semana , e a soma de que disponho não chega para a
passagem .
Recebi uma carta de Abril, anteontem , dizendo que já está bom, e
que a avó e o senhorio estão -se queixando de demora. Por que ele não
deixou a doença para depois do dia 5 ?
Escrevi-lhe que procurasse V. , porque, se a firma ainda não esti
vesse reconhecida, V. entregaria a procuração e ele poderia receber
com a dêle, que ainda não foi revogada.
Veja V. como a doença de Abril e do Evaristo perturbou a vida
de um cidadão ! sem falar nas maçadas em que V. está metido.
Veja se Cunha fez o meu trabalho ! Levo agora o resto . Já estou
farto de língua de índio . Desde junho não faço outra cousa : é tempo de
terminar
Um abraço ao querido Brandão , e outro a V.
do amigo velho,
C.
Paraíso , 15 de novembro de 1909.
272 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
Amigo Paulo,
Recebi com muito prazer a notícia da terminação de seu curso . Muito
me satisfez a nota brilhante com que o concluiu .
Não será possível adiar o grau para 4 de janeiro ? Só a 3 posso
sair daqui.
Sôbre seu negócio falei ao amigo Brandão da penúltima ou ante
penúltima vez que estive no Rio. Quando Fr. João morreu , escrevi-lhe,
fazendo considerações filosóficas, e tratei de seu caso com muita nitidez,
talvez excessiva . Que ele recebeu a carta, sei ; “ estou com V. até aqui”,
disse -me; mas não tivemos ocasião de abordar o assunto. Já isto mostra
que minha intervenção tem sido ineficaz até agora .
Não me descuidarei, mas quer um conselho ? D. Mariquinha é mãe ;
recorra a ela .
Não sei bem se foi ontem, é hoje ou será amanhã o seu aniversário.
Seja como fôr, aí vai, com o abraço do amigo, o desejo de que todas
as felicidades lhe domem a existência. Tanto mais preciosa lhe deve ser
agora, quanto a partilha a companheira querida, aquela dentre as mulhe
res que V. achou cheia de graça.
Apresente-lhe meus respeitos, que depois irei levar pessoalmente
logo que fôr possível.
E mais um abraço do amigo velho
C. DE ABREU
Rio, 25 de janeiro de 1911 .
CARTAS A PAULO BRANDÃO 273
Paulo amigo ,
O dia 28, aniversário de Bulhões, vamos passar na Gávea, como
Brandão já sabe.
Junto 10 $ para V. inandar a Emilio e me comprar de moringas.
Outro dia, quando estivemos lá, só se podia beber água na bica.
Desculpe -me a maçada.
Respeitos a D. Alta, e fosquinhas à gentil Paula .
Um abraço do amigo velho,
C. DE A.
Rio , 19 de setembro de 1912.
21 -- 1.º
A AFONSO TAUNAY 1904-1927
Afonso amigo ,
Afonso ainigo ,
Como está você sabido ! Sabe de minha vida mais do que eu mes
mo ! Fala-me da minha viagem a S. Paulo como de cousa assentada.
Não está de todo marcada. É mesmo provável que não se realize. An
do muito pesadão.
Não acredito no seu encontro com Olaus Magnus 1. Isto é invenção
sua , para ver se desembucho alguma cousa que dê repasto à sua inco
mensurável curiosidade. Não, meu amigo ! estão verdes os roxos, ma
duros cachos ...
Se eu fôr, só me decidirei depois do dia 15, ou mesmo 20, porque
não posso ficar fora de casa tanto tempo. Quero passar o aniversário
de D. Zé em S. Bernardo e depois irei a S. Vicente para o dia de anos
de Domingos.
Isto já lhe servirá de referência. Vá ver-me em casa de Martim,
se é que não receia, pela sua fé, a companhia de um velho ateu e de
um velho agnóstico.
Martim me chama, mas creio que não poderei demorar em sua casa
mais de dois dias, no máximo três. Por aí se governe você, pois para
o castigar de sua indiscreta curiosidade, não o prevenirei de minha passa
gem pelas paulistanas terras. Mas tudo isto é muito hipotético ...
Em todo o caso você conhece os meus hábitos e assuntará ... Só
lhe perdôo o intrometimento em atenção às intenções, que são puras ...
Respeitos à sua sr.a.
Bien à vous,
CAP.
( s. d . ]
Afonso amigo,
Bravos ! Trabalha - se ! Heu mihi ! Nada tenho adiantado . Ando
cansado e só tenho lido, aliás, bastante. Estou esperando umas cousas de
Portugal que me parecem boas.
Já ouvira falar do casamento do ... Mais que provavelmente encer
ra-se uma carreira promissora. Neste nosso país só conheço, como já
lhe disse várias vezes, duas exceções à regra dos resultados dos casamentos
ricos : Zacarias de Góis e seu pai .
1. Olavo Ekman.
276 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
[ s. d . ]
Afonso amigo,
Afonso amigo,
Pelo que me parece, deve você andar ou muito atarefado ou muito
preguiçoso. Já lhe escrevi há uns 10 dias e até agora nada recebi
em resposta .
Espero que este silêncio, augusto e prolongado, não seja causado por
moléstia, nem por desgostos . Seu gênio era antigamente nienos comuni
CARTAS A AFONSO TAUNAY 277
cativo, apesar de você pretender o contrário. Não o negue, que até ouvi
de seu pai isto mesmo, a saber : que você não tinha a sua expansividade.
Talvez a dêle fosse demasiada, sobretudo para um homem político .
É a sua mais brasileira, influenciada pelo gênio da gente de sua mãe,
filha de mineiros soturnos, que pouco freqüentava o Rio .
Disserarn -me, contudo, que seu avó era dado, embora reservado e
circunspecto. Discreto e distinto, dizia-me José Fernandes Moreira, que
muito lhe freqüentou, como você sabe, a casa de Vassouras. Era até
meio aparentado com vocês ; creio genro do seu tio, o Visconde do
Araxá, não ?
Se você se encontrar com Derby, diga-lhe que breve lhe escreverei,
estou lendo umas cousas para responder melhor ao que me perguntou .
Recebi carta de Branner, que andou em viagem.
Como se chamava o seu tio que morreu menino, de febre amarela,
quando morava com o Leopoldo ? Era Francisco ou Afonso ? Achei- o
muito simpático e inteligente, um dia em que o vi no Pedro II a fazer
exames . Ontem dêle me lembrei, vendo o Leopoldo num bonde.
Bien à vous,
C.
( s. d .]
Afonso amigo,
Redevolvo -lhe, já lidos, os artigos sõbre Pedro Taques. Todos mui
to interessantes, um verdadeiro feixe de novidades.
Alguns reparos :
Para notas o meio parêntese é mais elegante. No texto, além do
meio parêntese, conviria usar de tipo menor no alto : as guaritas são re
barbativas. Cuidado com as notas : tendo de levantar e abaixar os olhos,
tem-se a impressão de estar cochilando. Melhor seria reunir no fim
de cada capítulo, mas sem chamadas. Assim : para tal fato cita-se o
documento. Outras seria melhor incorporar no texto.
Chamo a sua atenção para o estilo : há certos hipérbatons desgracio
sos ; algumas vezes reunindo dois períodos em um, o estilo fica mais
terso .
Já me desobriguei como pude com o nosso amigo Rangel. A obra
vai -se vendendo regularmente.
Estou pensando em reler as Atas de Santo André e S. Paulo para
escrever a 2.a Paulistica : Sob as Ordenações Manuelinas. Irei, porém,
um pouco adiante de 1603, porque pretendo aproveitar uns inéditos sõbre
Dom Francisco de Sousa e assim chegarei até sua morte.
Respeitos à sr.a.
Bien à vous,
C.
Rio, 13 de junho de 1914.
Afonso amigo,
Afonso anrigo,
Recebi sua carta e ontem seu romance ; fico à espera para quando
puder lê -lo, o que não será já. O diabo da moeda complica -se cada
vez mais e calculei mal, julgando liquidado o caso no fim do mês.
Estive com Fazenda sábado . Pela manhã mandara-lhe um volume ad
quirido na 'biblioteca do Eduardo para ser-lhe oferecido. Começara a
leitura e conversamos sobre o caso. Quinta- feira tivera grande crise, mas
estava de todo aliviado e Godói mostrava -se esperançado.
Domingo, Souto Maior achou-o bem disposto. A crise fatal sobre
veio às 10 horas ; à 1 estava liquidado ! Compareci ao entêrro ; pouca
gente, por absoluta falta de carros ; tive de ir adiante, de bonde, para
esperar o féretro no cemitério ; os discursos de Ramiz, Bilac Sobrinho,
e Alberto de Carvalho, ouvidos, deixaram muito boa impressão.
Ainda não dei conta da moeda, e já embetesguei pelos paulistas
contratados pelo governo baiano para guerrear o gentio bárbaro. Estou
animado, porque pude apurar mais cousas do que pensava. Encontrei
a patente de Matias Cardoso , a de João Amaro e de Morais Navarro. A
propósito : Azevedo Marques ainda viu o inventário de Matias Cardoso .
Ainda existe?: É acessível ?
280 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
Afonso amigo,
Afonso amigo,
Se ainda não tem copista, recomendo - lhe Cassius Berlinck, inteli
gente, instruido, fidedigno, empregado da Bib. Nac. Poderia dar conta
da grande parte da coleção de Angelis relativa às bandeiras paulistas.
Angelis , capanga jornalista de Rosas, locupletou - se de raridades na Ar
gentina e vendeu-as ao Brasil.
Não sei se Cassius poderá tomar a si a empreitada. Tão pouco sei
em que condições faria . Não lhe toquei no assunto. As cópias aqui não
podem ser tão baratas como nos lugares onde há constantes pedidos.
Lembra -se do estalajadeiro holandês que cobrou caro uns ovos servidos
a não sei que Jorge da Inglaterra ? Senhor, ovos há na Holanda, há até
muito ; reis até muitos ; reis são raros (deixo esta linha como saiu da
pena para V. ver como a afasia ou a agrafia vem perto ).
Não vejo com bons olhos a idéia de duas linhas. Em Pernambuco
um ladrão exigiu de um passageiro ou transeunte, na ponte da Boa Vista,
a bölsa ou a vida, e quando este apresentou-lhe os únicos tostões que
possuía, caiu-lhe em cima aos sopapos, bradando raivoso : " Miserável,
por esta miséria expões um pai de família à perdição ?!”
A parte sõbre os chiquitos poderia ser anotada pelo Ministro da
Bolívia ; dizem -no erudito e dedicado a estudos históricos.
Respeitos à ex.ma sr.a.
Bien à vous,
C. DE ABREU
Rio , 15 de maio de 1917.
Afonso amigo,
que já tem ; lembre -se que para o ano V. terá de entrar com o outro
número. Uma nota em forma de carta a V. dirigida sobre o tal rotei
ro não me custaria ; mas o escrito sobre os chiquitos exigiria um bom
mapa da Bolivia, que não tenho ; por isso lembrei o nome de Carrasco,
que dizem competente.
Interrompi o artigo sobre a Marquesa, para fazer notas e correções
ao livro de uma pessoa a quem desejo ser agradável : em um dia farei
o resto : o interessante será se ela não ficar satisfeita, como é provável ;
hoje poderei terminar.
Assim o artigo não poderia sair ao mesmo tempo que o livro fósse
despachado da alfândega. Já fiz Bhering distribuir ontem exemplares
pelas redações dos jornais.
Quem é A ... ? Li os três artigos; faltou-me o primeiro, que seria
o mais interessante, porque fere logo a nota. O tal sujeito não passa
de um cretino industriado. E é mau caráter : para dizer que S ... A ...
aproveitou-se de idéias suas e maltratou-o, substituiu no artigo de Ve
ríssimo, que transcreve, o trecho em que éste notava a prioridade de
nosso patrício e meu amigo muito querido, por uma linha de reticências.
Se conhece A. , peça-lhe que continue, mas lembre-se que o bicho tem
mais cabeça que a hidra de Lerna.
Meus respeitos à ex.ma sr.a.
Bien à vous,
C.
Rio, 2 de junho de 1917.
Afonso amigo,
Escrevi-lhe ontem sôbre Fr. Salá, que deve partir hoje para S.
Paulo e aí demorar -se três dias no Seminário da Luz. V. pode tirar
proveito dêle. Indague se em Uberaba, onde vai ficar, existe o vol. da
R. do Inst. Hist. ( um que é o terceiro) com a monografia de Paulo
Ribeiro sobre as nações gentilicas do Maranhão. Arranje-lhe o volu
me do Congresso dos Americanistas, um que é o de Londres com um
copioso vocabulário , feito por João Feliciano, da língua xavante ou
xerente ; se ele tiver capacidade para estabelecer um confronto sobre
o caiapó e o xavante ou xerente , prestará bom serviço.
Terá V. meios de obter um vocabulário dos xavantes do Paraná e
S. Paulo ? É uma lingua que tende a desaparecer e é preciso andar de
284 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
Afonso amigo ,
Ainda não sei quando poderei partir. Ando fazendo uma leitura
e vendo cousas que me prendem por aqui. Como vai Taques ? Não re
cebi a continuação dos seus artigos. Ouça-me : nada de alusões literá
rias ! Nem mesmo as corriqueiras : o que uma geração conhece é muitas
vêzes totalmente ignorado pela seguinte. Compreendo as saudades do
seu amigo Cardoso interrompendo -se uma colaboração agradável como
era a sua. Quanto senti a falta de Vale Cabral! Logo que me decidir
a partir, avisarei.
Bien à vous,
Cap.
[ s. d. Deve ser esta carta de meados de 1917. )
Afonso amigo,
Recebi os artigos do xará e li-os imediatamente. Muito interessan
tes , muito instrutivos.
Não tenho estado doente, mas sinto a cabeça vazia ou entorpecida
de tal modo que repugna-me qualquer coisa que não seja a leitura. Espe
rava em fins de mês passado escrever a segunda Paulistica mas não passei
CARTAS A AFONSO TAUNAY 285
das primeiras linhas. Quero ver se faço uma ligeira ( nota ] sôbre Goeldi
de quem fui amigo, e traduzi os Mamíferos e Aves.
Está a cidade em greve. Às alturas em que moro não chega o
burburinho ; se a polícia capitular, nunca mais teremos paz ; é preciso
que ao menos consiga que as greves dora em diante tenham o curso
normal do Velho Mundo. Já fui absolutamente spencerista ; tenho muda
do de idéias, mas ainda fico muito longe do socialismo, principalmente
do que procuram implantar entre nós.
Respeitos à ex.ma sr.a.
Bien à vous,
C.
Rio, 25 de julho de 1917.
Afonso amigo,
Só hoje foi-me possível ler os artigos que ultimamente recebi. Muito
interessantes e instrutivos todos. Fazem parte da monografia sobre
Taques ?
Continuo hoje estas linhas, começadas a três ou quatro dias. Junto
umas notas a êsmo.
Epidemias : melhor ocasião para vacinares há que esta : Vacina,
vaca, Jenner : não há anacronismo ? Será variolizar-se ?
Rispidez e gravidade : o Governador de São Paulo tinha o trata
mento de Sua Ilustrissima ? Só conheço este tratamento dado aos bis
pos.
Pronomes na segunda pessoa do plural: cf. Manuel da Fonseca ,
Vida de Belchior, onde se lê que os paulistas tratavam assim aos servido
res por desprezo. A candura dos lares não está em contradição com
o que se le alhures ?
Festas de Igreja : no Ceará diz-se Corpo de Deus.
Tratado de Methuen parece mito. Conforme uma monografia ale
mã não havia então indústria em Portugal. Jean de Bonnefon ! Para
que obrigar um Afonso do futuro a quebrar a cabeça a inquirir quem
foi tal nulidade ? Quanto menos alusões depararem os pósteros tanto
mais agradecidos ficarão ao trabalho poupado .
A vida em começos do século XVIII : se V. encontrar em alguma
livraria o livro de Bucher, traduzido com o título aproximado de Estu
dos Históricos e Econômicos, leia um capítulo em que caracteriza a econo
286 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
Afonso amigo,
Sinto muito que tantas pessoas caras tenham estado adoentadas ; de
sejo -lhes rápido e completo restabelecimento .
Recebi os dois volumes do Registro Geral de S. Paulo e fico - lhe
muito obrigado .
CARTAS A AFONSO TAUNAY 287
Afonso amigo,
Desejo que já tenham cessado os motivos de inquietação devidos ao
estado de sua boa mãe .
Continuo a braços com Fr. Vicente . Segunda-feira entreguei os
dois primeiros livros com os respectivos prolegômenos; no decurso da se
mana o terceiro ; o quarto e o quinto estarão concluídos em Natal?
288 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
Ainda não posso responder, porque só agora vou inventariá -los com
cuidado .
O meu plano é simples; indicação das lacunas, apuração das fontes
em que bebeu o franciscano , apontamento dos documentos contemporâ
neos e das monografias ; umas sessenta páginas, sem contar a introdução
geral fundada no que saiu nos Anais da Biblioteca Nacional, porém mais
rápida e mais precisa .
Não lhe será muito fácil obter os Anales de la Biblioteca Nacional
de Buenos Aires porque, parece, esgotaram -se apenas impressos.
Ainda não pude obter o décimo ; não sei se já há undécimo.
Encontrei ontem uma notícia de certo interesse para você. Em fe
vereiro de 1583, houve uma justificação ou o que melhor nome mereça,
sôbre as naus inglêsas entradas em Santos : nela aparece como testemunha
Brás Cubas, que declara ter setenta e seis anos pouco mais ou menos .
Teria nascido, portanto, em 1507 pouco mais ou menos ?
Talvez escreva nos prolegômenos do segundo livro de Fr. Vicente
algumas linhas sobre a sesmaria concedida a Brás Cubas, comparando -a
com a de Duarte Lemos. A julgar por minhas impressões, que amanhã
apurarei, representam um tipo que não medrou no Brasil, ao regime de
terras .
A propósito ; disse -me Pedro Lessa que Teixeira de Abreu, aí emi
grado, escreveu um livrinho excelente sõbre enfiteuse.
Aqui não existe. Será possível arranjá-lo ai, terra de juristas?
Ainda outra maçada. Disseram -me que na Revista Argentina de Ciên
cias Políticas, em número anterior a setembro , há notícia de um livro sobre
a civilização argentina, em que se fazem largas referências a meus Ca
pítulos.
Haverá tal revista, ai , de modo que possa encomendá - la sem precisão ?
Ontem falei com o Gentil sobre o mapa espanhol que estamos impa
cientes por conhecer. Devo receber cópia de um manuscrito citado pelo
Padre Pastells .
Como desapareceu de todo o nome de Biaça dado àquelas regiões até
Laguna, pelo menos ? Biaça terá algo de comum com piacaba ?
Chegaria até aquelas bandas tal palavra ?
Respeitos às senhoras.
Bien à vous,
C. DE A.
Rio, 29 de novembro de 1917.
CARTAS A AFONSO TAUNAY 289
Afonso amigo,
Boas saídas, melhores entradas.
Li os dois artigos sobre Taques, que devolvo. Por que rush e placer ?
Será tão indigente a língua que para coisas brasileiras precisa de palavras
peregrinas ?
Tenho dúvida quanto ao duplo provincialato de Estanislau de Campos.
Numa lista, muito deficiente, das primeiras que me deu o Padre Pablo
Hernandez, o novo editor de Charlevoix, não me lembra ter lido éste nome.
Tenho também dúvidas se saberia francês. Parece que ele leu Valmont
ou autor semelhante, traduzido em português.
Sobre os estudos dos jesuítas é possível que V. encontre no colégio
daí a Formação Intelectual do Jesuita de Francisco Rodrigues, cuja leitura
é instrutiva e poderia servir, tratando dos pátios ; é obra de 1917.
Do Fr. Vicente já li as segundas provas dos prolegômenos ao primeiro
livro, as primeiras ao segundo, já remeti os originais dos prolegômenos ao
terceiro. Vou começar agora os do quarto, que não são ( ilegível ] do
quinto. Se acabar esta semana os do quarto, tirarei de cima de mim um
grande pèso, poderei ir com José de Mendonça passar uns dias em Cabo
Frio, concluir a impressão em fevereiro e disparar em março para o Rio
Grande, à espera do veranico de maio .
Da biblioteca Eduardo Prado o governo paulista adquiriu alguns
volumes, segundo me consta. Para o Arquivo ? Para a Biblioteca ? Para
o Museu ? Desejaria saber quais foram e para que repartição.
Acabo de receber um volume do Inst . do Ceará com muitos documentos
sôbre Morais Navarro . Se houvesse cousa semelhante sobre Matias Cardoso !
Ontem procurou -me, por indicação de Branner, o Sr. Eugênio Vernon
( ?) , comerciante, muito a par da História do Brasil. É môço, deve demo
rar bastante tempo a serviço de um banco , pensa na possibilidade de es
crever uma história da abolição no Brasil.
Já chegou aí o 3.0 vol. de Pastells ? Por aqui não, apesar dos lem
bretes constantes no Briguiet. Também o 10.º vol. dos An. de la Bibl. de
B. Aires ainda não o consegui; parece esgotou -se, apenas impresso.
Respeitos às senhoras. Até fevereiro , talvez,
Bien à vous,
Rio, 7 de janeiro de 1918 .
22 - 1.•
290 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
Afonso amigo,
Concluo hoje, 22 .
Junto as três listas para V. as entregar ao editor. Continuo no tra
balho do bacairi .
Afonso amigo,
Vai este cartão registrado para ter certeza de que lhe chegou às mãos.
As notas que tomei no Livro 2.º do Brasil, na biblioteca de Eduardo
Prado, saíram muito incompletas. Desejaria completá -las, e como não
posso ir a S. Paulo, acudiu-me a idéia que vou expor :
Pode V. mandar oficialmente o ms. ao Instituto Histórico durante
uma semana para que eu possa melhor consultá-lo ? Se o fizer, ficar-lhe -ei
muito grato : se não puder nem estranharei, nem ficarei zangado. Nem
quero resposta fundamentando o não : basta o silêncio.
292 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
Afonso amigo,
Com grande aborrecimento encontrei perdida no meio da papelada
uma carta escrita há dias. Deixei- a selada ; pensei que a tivessem pôsto
no correio e até estranhara seu silêncio. Mando - a sem abri-la .
Recebi todo o livro quarto, paginado, que alcançava pág. 415. Hoje
acabarei a parte dos prolegômenos do quinto, que trata da empresa do
Maranhão e Pará. O resto deve ficar concluído esta semana sem grande
atropelo, salvo caso de força maior.
Está aqui o editor. Disse que a impressão se fará depressa, por
isso não a comecei. Não fiquei aborrecido com isto, senão porque atra
palha a viagem ao Rio Grande, que fica perdida, ou antes adiada para o
fim do ano . Ainda não será desta vez que verei o veranico de maio.
Só pretendo começar a impressão depois de 15 de abril, quando tornar
à Paulicéia. À vista disto, estou pensando em ir passar ai uma quinzena
para acompanhar o trabalho de perto. Se isto decidir, escreverei em tempo
para você tomar cômodo.
Recebi carta de João Lúcio com a notícia de que já pusera no correio
a cópia da escrituração de um ano do engenho de Sergipe do Conde,
para eu julgar do importância e do volume da cousa . Ainda não me
chegou às mãos. Teriam os submarinos intervindo ?
Antes de Antônio, que poderá ser seguido de Varnhagen, pensei em
um volume de 400 páginas com documentos sõbre o sertão. O editor aceita
o plano no qual vou trabalhar, na volta de São Paulo , se lá fôr.
Não tenho preconceito de inédito. Entrarão a carta de Navarro e a
de Veiga subindo o Tocantins; talvez informe-nos a [ sic] Memórias de
Cândido Mendes: Entrarão uns dois ou três documentos impressos na
Revista de São Paulo e na coleção de Siudart e no Inst. Hist.; verei o
que posso aproveitar na Bibl . Nac. Quatrocentas páginas é muito pouco ;
tratarei de escolher as peças de modo a abraçar o Brasil inteiro , dando
non multa sed nultum .
CARTAS A AFONSO TAUNAY 293
Afonso amigo,
Não recebi a fotografia e melhor foi que não viesse.
Tão apagada, para que serviria ?
Faça uma experiência : em qualquer botica encontra-se tintura de
noz-de-galha : um pincel molhado nela, passado por cima da escrita, aviva
a tinta sem estragar o papel. Experimente primeiro em qualquer pape
lucho sem importância.
Já comecei a receber papéis de Mem de Sá – o testamento , que
pouco adianta, e creio que é apenas o primeiro ; o inventário dos bens
possuídos no Rio, onde fez contrato de meação com Antônio de Mariz.
Aqui aparecem nomes paulistas como o de Eobano e outros.
Os prolegômenos do quinto e último livro estão virtualmente concluí
dos ; já estariam de fato se houvesse urgência. O editor me disse que
só voltaria a São Paulo lá para 5 e só então iria tratar da impressão.
Temos muito tempo. Quem corre cansa, quem anda alcança.
Respeitos às senhoras. Saudades ao Zaú .
Bien à vous,
C. A.
Afonso amigo,
Obrigado pelos dois volumes do Registo ontem recebidos. E a Re
vista do Museu como vai ?
O Frei Vicente caminha, caminha, com as demoras inseparáveis dos
rabinhos. Se o Instituto e a Biblioteca estivessem abertos hoje, apenas
restariam o índice, que depende da numeração das páginas do livro V, e
a introdução, que sairá pequena.
Minha ida a S. Paulo foi adiada sine die.
Respeito às senhoras: cafunés e muchochos para a prole.
Bien à vous,
C.
Rio , dia da Ascensão, 1918.
Afonso amigo,
Escrevo -lhe a correr, para comunicar que parto depois de amanhã, 20 .
Infelizmente não poderemos encontrar- nos desta vez. Tenho neces
sidade de voltar sem demora. Talvez esteja, S. João, na Paulicéia, mas
S. Pedro me verá aqui na muito histórica e leal. Não irei a Santos.
Escrevi a Álvaro de Sá, médico, Conselheiro Nebias, 56 ; para lá
V. poderá dirigir qualquer carta ; escrevi para tomar m
- e cômodo na Luz.
Peço mande os dois volumes de jesuítas o mais depressa possível.
Depois de fazer o que preciso, devolverei. Como sabe, tenho de preparar
o volume de que me incumbiu Afrânio Peixoto, e não quero perder tempo ,
para em novembro estar a caminho de Pedras Altas.
Respeitos à senhora.
Bien à 1'015,
C.
Rio, 18 de junho de 1918.
CARTAS A AFONSO TAUNAY 295
Afonso amigo ,
Cheguei a 20, instalei-me no Hotel Fracaroli, o mais cômodo para
quem demora pouco .
Estive com Weiszflog. Amanhã devo ter as provas da introdução,
que devolverei do Rio. Depois só falta o índice alfabético em que tratarei
de andar depressa .
Já lhe falei na coleção Eduardo Prado.
Paulo achou o caminho de Damasco na História do Brasil. Anteontem
mostrou -me um artigo seu, muito interessado pelo bom Fernão Cardim , que
não conhecia .
Vou muito triste por não vê-lo, mas voltarei em outubro, para demorar.
Peço-lhe mande para o Rio as três cartas dos jesuítas ; preciso de extrair
cópias para ficar em dia com Afrânio .
Respeitos à sr.a.
Bien à vous ,
Cap.
S. Paulo, 23 de junho de 1918.
Afonso amigo,
Recebi os primeiros artigos sobre Bösche e li-os . Muito interessantes.
Em tom muito diferente do seu escrevi alguma cousa no Jornal do Comér
cio. Não sei há quantos anos. Deve ter sido no governo do Pena porque
me servi de um exemplar de Alfredo de Carvalho, que por aqui andava
naquele tempo . Restituí-lhe bastante pesaroso por não ter esperança de
arranjar outra. Felizmente a nova tradução vem minorá-lo.
A satisfação de uma necessidade natural de Pedro I diante da tropa
seria caso de imperatória impudicícia. Sua necessidade se traduziu por
forma líquida ; antecipou com solenidade o mirrado mann Kempiss ( es
crevo fonèticamente ) de Belmiro de Almeida.
O que conta sõbre Schaeffer nas ilhas Sandwich é novidade
para mim. Se não estou enganado, fêz qualquer publicação sobre o Brasil,
naturalmente antes do descalabro .
Nunca o li .
Bösche, viajante, deve ser o autor de um dicionário português-alemão
que prestou bons serviços e saiu muito aumentado depois da República.
Agora tomou -lhe o lugar o de Michaëlis, mulherzinha que mesmo em por
tuguês brave l'honnêteté. Julgo -a solteirona. É irmã da Carolina Michaë
lis de Vasconcelos cujos trabalhos sobre a lingua e a literatura portuguêsa
revelam grande critério e saber.
Procurou -me há dias Madame... sua conhecida. Creio que deseja
uma carta minha abonando -lhe um trabalho. Para descalçar a bota, vou
examinar a parte relativa ao Brasil e mandar-lhe-ei sem demora a nota
que me parece emendável.
Estou reunindo material para a introdução do Claude d'Abbeville;
pretendo fazê-la curta, mesmo porque é preciso que Paulo a leve e a
viagem déle tanto pode ser demorada como vir de súbito .
O livro presta-se a um estudo sobre as migrações dos tupis de
Pernambuco ao Maranhão, mas acho -as tão obscuras que não desejo
meter a mão na cumbuca .
CARTAS A AFONSO TAUNAY 297
Afonso amigo,
Afonso amigo,
Melhor notícia não podia você dar do que a da existência do Claude
d'Abbeville na biblioteca do Eduardo .
Não por mim : comecei e acabarei no regime do bacalhau do César
Marques .
A grande vantagem é que agora o fac - simile não encontrará mais
embaraço .
Que D. Luís, governador geral, é apenas primo e não filho de D.
Francisco não pode haver dúvida. Você verá no próximo Frei Vicente.
Respeitos às senhoras.
Bien à vous ,
C. DE A.
26 de agosto de 1918.
Afonso amigo ,
Uma carta que registrei para Assis Brasil na agência da Lapa, sábado,
2 do corrente , só ontem foi recebida. Embarquei domingo 10 e de cartas
jornais posso dizer o mesmo que alguém a respeito da sorte grande: uma
coisa que espalham que era para os outros.
Na lista das pessoas a quem devem ser entregues exemplares de Frei
Vicente em S. Paulo, peço por seu intermédio aos editores sejam incluídos
os Drs. Galeno e Brás de Revoredo. Trabalho nos textos bacairis. Devo
acabar hoje ou amanhã a transcrição das ( ilegível ] definições ; em geral
estavam traduzidas e não oferecem dificuldades.
O mesmo não fiz aos mitos e não sei como darei conta dēles . Dis
ponho de tempo e não fugirei sem ver de quê .
Respeitos às sr.as
Bien à vous,
Cap.
Pedras Altas , 25 de novembro de 1918.
CARTAS A AFONSO TAUNAY 299
Afonso amigo ,
Um telegrama de Paulo adiou sine die a excursão a S. Martinho.
Mesmo sem o adiamento eu não iria, porque turvavam-se os céus hipocrá
ticos . Combinei com o Briguiet um atlas histórico do Brasil. Chamei
Afonso amigo ,
De Pedras Altas man -lhe dois outros cartões que ficaram sem
resposta . Considero -os extraviados, mas não devem ter sido porque
Weiszflog recebeu os dêle. Aqui cheguei a 4, mas ainda nada fiz.
Vou ler agora o primeiro volume da História do Padre Vieira de
que João Lúcio me foi mandando as provas. Sem o apêndice, que consta
de documentos e ainda não chegou, termina o vol. 366 com a retirada defi
nitiva do Maranhão para a Europa.
A redação do segundo volume ficará concluída em outubro. A parte
mais curiosa deve ser o processo da Inquisição desflorado por João Fran
cisco Lisboa e agora esgotado.
Recebi e agradeço novamente o número da Revista. Está bem feito
e dissipou meus receios. Apenas lamento que não saísse completo o tra
balho do frade . A revisão do léxico de seu pai é oportuna, mas não
viria melhor no fim.
Não li ainda o trabalho de Childe, deve estar bem feito, pois me
dizem ser de grande competência. Mas seria mais urgente ?
Vamos ver agora o que fará Frei Salá.
O caiapó, no fundo, deve ser a mesma língua dos caingangues e
dois trabalhos podem esclarecer -se. Afinal são os ubirajaras, tão falados,
que Alencar considerava tupis típicos. Com os novos elementos talvez se
possa decidir se os aimorés pertencem ao grupo jé. Não me parece.
Agora chamo tôda a atenção para um ponto que talvez em pouco
tempo seja insolúvel . Há em São Paulo e no Paraná uns xavantes in
teiramente diversos dos do Tocantins. As poucas palavras conhecidas re
velam certa semelhança com os guaicurus. Os xavantes atualmente já são
poucos e em breve desaparecerão [ ilegivel ] em massa.
AFONSO TAUNAY
1
CARTAS A AFONSO TAUNAY 301
Desde que cheguei nada fiz. Vou ver se leio o livro do Padre
Teschauer para reconciliar-me com o bacairi.
Respeito às sr.as
Bien à vous,
C. DE A.
Domingo de Páscoa 19.
O livro de R. Pombo recebi mas não li. Seu artigo não conheço.
Mandando algumas coisas para João Lúcio, incluí seus artigos sobre
Xeria .
Se V. fôr capaz de sacrificio, aconselharia um : deite fora a retórica,
reduza o volume ao rigorosamente significativo e ajunte como apêndice
ao Frei Gaspar os seus estudos sobre São Paulo no século XVI .
Recebi ontem um telegrama de Belo Horizonte convidando -me a con
tribuir com alguma cousa para o Congresso de Geografia. A estas horas !
Lembrei-me de estudar a estrada da praia mas duvido que o tempo chegue
para reunir os materiais.
Respeito às sr.as
Bien à vous,
C.
Quero ver se parto para aſ em fins de outubro, mas está tudo subordi
nado ao encargo da livraria .
Respeitos às sr.as.
Bien à vous,
C.
Rio, 18 de setembro de 1919.
Afonso amigo,
O reumatismo pegou -me a 10 de novembro. Ia soltar -me a 29 quando
um copo de leite em jejum, o mais daninho e letal conhecido desde que
mamíferos pastam , quase levou -me a outro mundo.
Recebi e agradeço a fotografia do mapa. Fiquei triste, os letreiros
não fazem parte dêle, são talvez mais importantes que o traçado. Como
aproveitá - los? Que motivo de ordem sagrada ou profana, burguesa ou
bolchevística aconselhou uma redução de tal ordem ? Num começo de ca
tálogo de mss. da Bib. Nacional de Lisboa encontro duas novidades que
podem interessar-lhe : primeira, a cópia não chegará mais a tempo, trata -se
de uma carta de Frei Gaspar da Madre de Deus sõbre a história eclesiás
tica do Rio de Janeiro ; a 2.a é um livro contendo as ordens régias
existentes na Secretaria do Governo de São Paulo, a partir de 1702 até ...
De outra vez darei informação mais completa.
Para mostrar que não morri é o bastante.
Respeito às sr.as
Bien à vous,
C.
Rio, 4 de dezembro de 1919.
Afonso amigo,
Afonso amigo,
Recebi as provas do seu trabalho. Ainda não comecei a ieitura para
não ler de interrompido com outros.
O cacoete já é mais alguma cousa :
Afonso amigo ,
A nova geração consta de suas filhas e de seus filhos. Digo -lhes
adeus, conformando m
- e com o preceito de certo prêto que, tendo um ôlho,
fingia de rei em uma terra de cegos.
Acostumai -vos a ser invocados.
Você seria muito gentil se remetesse o último número da Revisto do
Museu e os que viessem depois ao
Dr. Th . Koch-Grünberg.
Stuttgard, Hegel Platz, 1 , Alemanha.
É autor de várias obras de valor sõbre etnografia, particularmente do
Amazonas. Acabo de receber dois volumes de uma que constará de cinco .
Pròximamente irei a Caxambu lavar o fígacio e os rins, como me aconse
lha o médico amigo. Prende-me apenas a revisão das provas de um
catálogo
Respeitos às senhoras.
Adeus, nova geração !
Bien à vous,
CAP.
Rio , 17 de fevereiro de 1920.
23 --- 1 .
306 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
Afonso amigo,
Adeus em minha terra não tem significação agoureira que V. lhe
empresta. Escrevendo : adeus nova geração ! não digo mais do que :
Salve, Afonsinhas e Afonsinhos ! acostumai-vos a ser invocados, ó Tau
nayzinhos !
Ocupo -me agora com o catálogo da livraria de meu finado amigo
Francisco Ramos Paz. Não descrevi os livros, não os avaliei, não os
reparti em classes, embora indicasse as que me pareceram mais simples,
revejo apenas as provas e serei o responsável de tudo ! Haverá em toda
a superfície do planeta um rei mais constitucional ?
Obrigado pela remessa da Revista a Koch -Grünberg em Stuttgard.
Respeitos às sr.as
Adeus, nova geração !
Bien d vous,
CAP.
27 de fevereiro de 1920 ,
Afonso amigo,
Dei uma rápida busca na Bib. Nac. e não achei a carta do holandês ;
fica para mais tarde. Parece que o documento inédito que lhe mandaram
é a resposta de que Garcia remeteu cópia. Por uma conversa com o
Souto Maior, penso que este adianı iu muito ao que se sabia sôbre o
renegado paulista e não haverá muito a acrescentar.
Comecei a leitura de seu livro, encontrei nas primeiras páginas Brasil
mandado corrigir por um modo que não quero reproduzir, senti a picada,
suspendi a leitura. Levo -o agora para Caxambu e irei ao fim e lhe
escreverei. Consola-me não ser justo o nome de mestre, trazido por suas
cartas.
Vejo ligeiramente seu trabalho da Rev. Trim . ao qual só mais tarde
prestarei a devida atenção, porque não cabe na mala.
Gentil encontrou no mosteiro o testamento da mulher de Céspedes, o
inventário do velho Salvador, um título de dívida, contraída na Bahia
pelo governador do Paraguai e outras cousinhas mais. O arquivo do
mosteiro de S. Bento possui algumas preciosidades, e Gentil, a quem
o abade trata generosamente, vai -as desencavando.
CARTAS A AFONSO TAUNAY 307
Afonso amigo ,
Lendo os trechos do Diário, lembrei-me que V. poderia , se a possui,
publicar a correspondência com o Azevedo Castro ; seria muito interessante.
Quem um português, colaborador do Correio Paulista, que deu no
Instituto daí um artigo sobre Caramuru , fundado sõbre documentos por
tuguêses? Foi publicado ? Que novidade contém ?
Continuo faiscando em Minas, mas os últimos dias pouco tenho feito.
Hoje Calógeras deve marcar o dia da partida para Caxambu.
Se ainda demorar, partirei na quarta - feira de cinzas.
Respeitos às senhoras.
Adeus, nova geração ! ( nova geração é a prole ) .
Bien à vous ,
C.
Rio, ano da morte de J. A. Maranhão, 1920.
Afonso amigo,
Num artigo de seu pai, impresso na Gazeta, lembra-me ter lido
que da gente vinda a Caxambu sem consultar médicos, alguns morriam de
repente. Se o mesmo me suceder, não poderei queixar-me da falta de
aviso.
Desde 19 comecei o uso das águas Dom Pedro pela manhã ,
D. Leopoldina à tarde. Viotti aconselha que se comece pelas de seu nome,
mais fracas e por isso mesmo mais eficazes. Submeti-me sem protesto.
Hoje devo vê-lo. Hei de interrogá -lo sobre as tais mortes repentinas.
Trouxe muito poucos livros ; fiquei aborrecido de entre eles não encon
trar o seu ; já o reclamei duas vezes, e espero que a última dê resultado.
308 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
[ s. d .]
Afonso amigo,
Não quis escrever-lhe sem antes ter lido seu discurso . Li-o com
o maior prazer e, encantado, continuei, quando cheguei à parte dos accesits,
flores e menções honrosas. Caiu-me a alma aos pés, suspendi a leitura e
apagaram - se umas observações que pretendia apresentar.
Continuo no trabalho sobre o povoamento de Minas Gerais, mas o
resultado não corresponde ao esforço. Quando quis tirar a soma do que
cclhera sôbre o Sêrro, admirei -me da pouquidade da colheita.
Devia passar a Sabará, mas convenci -me que seria preferível atacar
a comarca do rio das Mortes, mais difícil e, por sua posição entre a de
Sabará e Vila Rica, muito mais importante.
Deveria passar mais tarde à Bahia, porém resolvi liquidar antes o
caso de Santa Catarina e Rio Grande do Sul . Documentos novos não
faltam , mas qual será o espólio ?
310 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
Afonso amigo,
Acabo de receber e muito agradeço o último número da Revista.
Já lhe passara os olhos, não sei bem se na Câmara, se no Instituto.
Duas impressões senti : muito grosso, muito grosso, muito grosso. Acho
a ventripotência tão [ ilegível ] no indivíduo como no livro. Além disto tive
uma decepção por não ver continuado o trabalho lingüístico. Na mesma
ocasião vi algumas das deliciosas manifestações de Ihering e a lista dos
manuscritos valencianos.
Minha excursão a Vassouras foi adiada talvez para setembro. Já
mandei ao Bradenburger sua lista das inirabilia urbis para ele tê-la em
vista quando me cornaquear.
Passei algumas horas bem agradáveis e proveitosas com Teodoro
Sampaio, estudando mapas e roteiros da Bahia : é extraordinário !
Há três dias chegou meu velho amigo Studart. Não o encontrei
ontem em casa . Espero ser mais feliz hoje. Vem descansar e bem
Vi ontem dois artigos meus, escritos sobre o povoamento de
merece - o .
São Paulo e publicados na Notícia em 1895. No espólio do Paz encon
trei outros de 1899, impressos no Jornal do Comércio. Tudo bastante
atrasado e exigindo sérias modificações para ser posto em dia. Aproveito o
oferecimento do Fernando Gabaglia para reeditá-los nos Anais do Pedro
II . Corrigirei alguns erros do texto e em algumas notas exporei o que
penso vinte anos depois. Comecei a receber as cópias relativas à família
Pais, uma exposição de serviços apresentada pela viúva, outra por Garcia.
CARTAS A AFONSO TAUNAY 31
Afonso amigo,
Se o ateniense sou eu, é que sou ático e le frappé c'est moi. Não
confundamos. Incluo um cartão do Dr. Schuller. Está em Viena, como
verá V. Pode, portanto, encarregar-se da cópia dos documentos rela
tivos à Independência. Dos documentos alemães pode mandar, além
das cópias, os originais.
Não sei se lhe disse que encontrei três artigos meus sõbre o povoa
mento do Brasil, publicados em 99 no Jornal do Comércio, que estou
preparando para a reimpressão. Quisera juntar-lhe dois sõbre o povoa
mento de S. Paulo, dados primeiro na História ; não há meios de desco
bri-los.
Quem é o Dr. Silveira Brasil, cuja História que é a luz por sua
morte ? [ ? ] Diz A. Sintra que é riquíssimo e votou a vida a esta
obra.
Afonso amigo,
A 14 dirigi-lhe um telegrama, pedindo com urgência o endereço de
Schuller, contido num cartão que em tempo remeti, lembrando a con
veniência de aproveitar-lhe os serviços para cópias em Viena.
O telegrama era para atender a um pedido de Tobias Monteiro , foi
passado por um irmão dêste, que declarou ter o recibo.
A resposta ainda não chegou ; tive de servir -me de um endereço
existente no Instituto Histórico, que me parece incompleto.
Estou fazendo uma cousa que sempre me repugnou .
No espólio do Paz encontrei diversos artigos meus, de alguns dos
quais não me lembrava mais.
Fernando Gabaglia ofereceu m
- e a hospedagem do Anuário do Colé
gio Pedro II, prometendo -me um certo número de separatas. O ofere
cimento tentou-me, mandei copiar alguns artigos a muito custo descobertos
e posso oferecer-lhe um indice quase definitivo.
Caminha e a sua carta, do Jornal do Comércio de 1908 ; Gandavo,
da Notícia de não sei quando ; Rocha Pita, da Gazeta de 1880 ; Varnha
gen, do Jornal de 1878, logo que aqui se espalhou a notícia do falecimento,
e da Gazeta de 1882, quando se inaugurou o monumento do Ipanema.
Juntarei também dois artigos sobre o povoamento de S. Paulo, da
Notícia, de 95, três sõbre o povoamento do Brasil de 1897, talvez um
da Gazeta de 1880, que juraria nunca ter escrito e vou ver se é aprovei
tável.
Já recebi tôda a papelada de Fernão Dias, contendo um comunicado
dêle, já de volta da expedição e muitos poucos dias antes da morte, uma
petição de serviços, redigida pelo Padre João Leite, uma exposição de
serviços de Garcia Pais, uma carta de D. Rodrigo.
Para mim o importante é que D. Rodrigo seguiu o itinerário de Fer
não Dias e, como aquele partiu da Atobaia , este deve ter feito o mesmo.
Na próxima semana deve começar a vir o dossier da Guerra dos
Emboabas. Conforme o conteúdo, escreverei ou não alguma coisa, se
merecer, talvez para incluir na tal coleção.
Espero caiba tudo em umas cento e cinqüenta páginas.
Meu princípio é este : corrigir os erros, pôr os fatos em dia, deixar
intactas as idéias, corrigindo -as em notas, se me parecerem erradas.
Uma conversa com Gentil deu-me que pensar ; contesta ele que o Tieté
fosse caminho das bandeiras, antes das que levaram a Mato Grosso .
CARTAS A AFONSO TAUNAY 313
Não sei se ele tem razão ; acho que não terá, mas prová-lo parece
difícil porque ponho em dúvida o que sempre acreditei implicitamente ;
pega -me desprevenido.
Continuo disposto a partir para Caxambu em agosto, mas a demora
de minha filha, que devia chegar de 8 a 10 de julho e ainda não deu
sinal de vida, me atrapalha bastante.
Em outubro pretendo ir a S. Paulo : partindo pelo noturno de 22,
pararei uma semana com Martim Francisco e depois descerei para os
banhos de mar em S. Vicente, com que Jaguaribe me está acenando.
Respeito às senhoras .
Adeus, nova geração .
Bien à vous,
C.
Domingo, 25 de julho de 1920.
Afonso amigo,
Esperava a chegada dos documentos sobre a Guerra dos Emboabas
para lhe escrever. Ainda não os recebi e creio que haja qualquer extra
vio. Seria o primeiro.
Os papéis de Fernão Dias são interessantes mas não trazem grandes
modificações ao que se sabia : apura-se a data exata da partida, a sua
idade de 67 anos no começo da empresa e, portanto, a morte aos 74 ;
levou consigo porcos e galinhas e pelo menos um cavalo que montava, etc.
A estrada ou antes o caminho de Garcia Pais se esclarece melhor.
Chegado num certo ponto mudou-se para a Penha daqui, e atacou ao
mesmo tempo do lado de cá pelo rio Pilar, e do Paraíba para a divi
sória das águas .
O caminho de Proença, preconizado pelo Basilio, que já figurara
nos meus Capítulos, foi feito porque Garcia, alegando a idade, não quis
tomá-lo a si .
Um ponto ainda não consegui deslindar. O caminho de Pais, a prin
cipio, chamou -se apenas Caminho Novo ; depois da obra de Proença este
ficou conhecido pelo nome de Caminho de Inhó -mirim e outro pelo de
Couto . Não apurei quem fósse tal Couto.
Ontem ficou ultimado o negócio da livraria do Paz. Não irá a leilão :
Arnaldo Guinle apresentou a proposta de 75 contos pagos em janeiro e
recebendo os juros até lá. Naturalmente Guinle marcou esta época por
que é a dos dividendos.
314 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
Afonso amigo,
Tivemos chuva e reis da Bélgica e Congo. A chuva parece entrar
em férias ; sem grande alvorôço. Os reis continuam não muito satisfei
tos . Não encontraram o Brasil de seus sonhos. Queriam ver mata , ser
tão, indios ; encontraram engrossadores, toma -larguras e mendigos de co
mendas . Defendem -se, condecorando chauffeurs e abreviando uma se
mana a camisola-de- fôrça. Pensei em traduzir-lhe no melhor flamengo
a Prisão de Tasso do velho Magalhães e mandar como lenitivo.
Comecei a receber os papéis dos Emboabas; os chegados esclarecem
apenas a primeira parte ; os que faltam não me parece que lancem grande
luz sobre a missão de Antônio de Albuquerque.
A biblioteca de Fr. Ramos Paz passou às mãos de Arnaldo Guinle
por 75 contos. Escrevi no suplemento do Catálogo uma pequena nota,
de que talvez consiga avulsos. Se conseguir, mandar-lhe-ei alguns, para
V. distribuir com os amigos.
Minha ida aproxima - se. Pretendo partir no primeiro noturno de 22
de outubro, tomar o Hotel Fracarolli [ ? ] , passar uns três dias na Pauli
céia, uma semana com o Martim Francisco, estar em S. Vicente no dia
dos finados, aniversário de Jaguaribe. Com ele a demora será melhor.
Tenho estado com Fidelino de Figueiredo, expressa recomendações
de Lúcio de Azevedo. É môço trinta e dois anos simpático, sim
ples. Amanhã Ramiz pronunciará o dignus est intrare no docto corpore
do Instituto. Depois começará as conferências no Instituto, na Biblio
teca Nacional, no Gabinete Português. Irá também a São Paulo.
316 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
Afonso amigo,
Afonso amigo,
Nos jornais li a noticia de sua excursão presidencial e da inaugura
ção do Caminho do Perequé.
Pouco tenho saido. Fui duas vezes a Santos comprar coisas de
que precisava. Cheguei de bonde até a ponta da praia. Vi um trecho
da Praia Grande : em Intanhaém estive da outra vez. Segunda-feira
almoçamos com o Conceição ; se o tempo consentir, visitaremos Bertioga
no próximo domingo. Quando vem ? Avise com antecedência , para
evitar desencontros.
Aqui fêz grande calor um dia, os mais tenho achado bem toleráveis.
Com as moscas e mosquitos não me tenho dado tão bem. Todas as
manhãs caio no mar com Jaguaribe e, como não nos atiramos a arrojos
CARTAS A AFONSO TAUNAY 317
Afonso amigo,
Leu V. o Wilhelm . Meister algum dia ? Nêle terá achado umas
quadrinhas terriveis de harpista, e no último verso : tôda culpa ou pecado
ou
cousa que valha ( Schuld em alemão ) se expia neste mundo.
V. pecou cacografando o nome de nossa terra : não o fêz impune
mente , como vou mostrar.
Diz V. que a 2.a edição de Frei Gaspar deve - se a Varnhagen.
Ela saiu justamente com o Diário de Pero Lopes. Procure a Revista do
Instituto de 1861 e verá que Varnhagem se queixa de não lhe teren
comunicado as falhas de imprensa e por isso a segunda edição do
Diário saiu inferior à primeira. Que tem isto com as Memórias ? per
guntará V. Respondo : procure à pág. 139 de sua edição e lerá : . " O
roteiro de Pero Lopes de Sousa que vai em seguimento destas Memó
rias assinado M. 0. ” Não será a sigla de Machado de Oliveira ?
Pág. 8 [ilegível] da cópia do Peixoto : " sendo chamado pelo povo para
aclamarem rei...” e na página seguinte, em confronto : “ para o aclama
rem rei” . Será a mesma cousa ? Diz Renan Renard : Il faut savoir l'art
de soliciter doucement les textes. Usando desta liberdade, vejo con
firmado um palpite meu : proclamada a independência de Portugal , que
riam uns seguir unidos aos Habsburgs e na Rev. do Inst. V. verá o receio
existente na Bahia de que Salvador Correia, casado com uma espanhola,
cumulado de mercês pela corte de Madrid, seguisse -lhe o partido. Pal
pita-me que em S. Paulo Amador Bueno não foi aclamado rei, e sim o
aclamador de Dom João IV .
318 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
Afonso amigo,
Eu desejaria bem saber que é o mexeriqueiro que lhe manda notí
cias falsas e fantasiosas de minhas passadas, presentes e futuras.
CARTAS A AFONSO TAUNAY 319
Afonso amigo,
Afonso amigo,
Escrevo - lhe às pressas.
Afonso amigo ,
Na fazenda das Três Barras desembocam o Piabanha e o Paraibu
na .
E o Paraíba segue, pedregoso e espumante, para as lezírias ferazes
em que a esfinge de seus entusiasmos tem em uma pata Jocasta, isto é,
o incesto, para o vencedor, e na outra a deglutição antropofágica, para
o derrotado.
Aqui mandou em outro tempo Sousa Ramos, Barão das Três Barras,
Visconde ou não sei quê, de Jaguari. Hoje manda o patrício e o amigo
Moura Brasil que me hospeda.
Trouxe os dois bacairis arranjados pelo Rondon e vim todo cheio
de quo non ascendam ? Cheguei véspera de S. João e ouso dizer não
pode imaginar -se fiasco maior. Um dos índios era o ideal, foi o com
panheiro de Steinen nas explorações e o mestre nos estudos lingüísticos .
Vinha animado das melhores intenções. Com poucos dias apareceu a
gripe, e os índios tornaram-se imprestáveis, intratáveis, insociáveis, in
suportáveis !
Pela beiçola genuína e pela dentuça estirada do ... juro que podia
dizer mais vezes e com maior veemência o famoso O que fizeste.
Cab ral ? das tra diç ões pau lis tas .
Mas, como contra os céus não valem mãos, adoeci também por sim
patia. Véspera de São Pedro dizem que delirei ; era uma intoxicação
gástrica !
Felizmente não estava aqui o velho Moura e nem ninguém da fa
mília e não houve por cima do próprio o incômodo alheio . Agora estou
bom , apenas muito derreado, sarando a capadura.
Que os bacairis afinal dêem de si, que não, ficarei até a próxima
semana, 14 ou 15, o mais tardar.
Neste ponto perguntará V.: este homem tomou tôda a carta para
mazelas e macacoas ?
Não, Afonso amigo : tenho a dar o verdadeiro motivo da epístola.
24 - 1.º
322 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
3-27-21
Afonso amigo ,
Afonso amigo,
Ontem quebrei o jejum no trem, lendo o Correio Paulistano, comprado
na véspera em Três Corações. A mina dos inventários e testamentos é
inesgotável. Quem já escreveu sobre eles, cujo nome você cita e ignoro ?
Encontrei clã e planalto paulista, prova de que V. já leu o livro de Oliveira
Viana . A mesma leitura atribuo a palavra clā, inserta num artigo de A.
Leão Veloso, do Correio da Manhã. Em Cruzeiro comprei o Correio
de ontem e li o artigo de Hermelino de Leão ; ao chegar em casa recebi,
com sua carta, o seu revide, sem o qual não poderia entender o debate.
Estarei equivocado e não veio em Rapôso com Diogo Flores ? Teremos
perpetrado o debate sobre Veloso como o de João Ramalho ?
324 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
Amigo Afonso ,
Recebi os artigos de Alcântara Machado ; os esgotados verei no Ins
tituto ou no Jornal, agora que tenho as datas. A lista dos proceres da
Independência parece completa ; lembraria o Jequitinhonha, que parece ter
feito muito na Bahia, Gervásio Pires Ferreira Drumond ? Não sei : pare
ce-me sujeito a correção.
A tal história de escrituras em branco de Pedro II sobre que Martim
Francisco faz tanto finca -pé dá-me a impressão de cancã.
Os índios ainda não vieram : na expectativa, nada tenho feito, nem
mesmo correção de provas da Inquisição .
Respeitos à senhora.
Adeus, nova geração !
Bien à vous.
C.
Afonso amigo,
Afonso amigo,
Incluo o extrato de Sommervogel; não achei à mão Backer ; o último
bibliógrafo dispensa o anterior.
Dos livros de Andreoni só conhecia diretamente a Sinagoga de que
dá o titulo português com o número de páginas; das outras fala por
informação ; a primeira descrição da Cultura e Opulência deve ser a de
José Carlos Rodrigues.
Nos livros de Andreoni enumera -se um De Rebus Brasiliae. Que
virá a ser ? Pablo Hernandez, jesuíta de grande erudição no relativo à
América do Sul, que duas vezes estêve trabalhando aqui, nada soube in
formar. Acaba de morrer em Roma, segundo me informaram em Santo
Inácio , e nada me comunicou .
CARTAS А AFONSO TAUNAY 327
Afonso amigo ,
Sim, recebi os livros, recebi o artigo sôbre Elísio de Carvalho, a quem
vão fazer uma manifestação, segundo consta ; recebi a nota sõbre Andreo
ni, que devolverei emendada.
Estão a partir os bacairis. Desejaria que V. os visse ; vão ficar um
dia em São Paulo com o Capitão Noronha, que os trouxe e levará. Fica
rei um dia em São Paulo, tratando de passagens, bagagens, etc. Tomarei
o Hotel Fracarolli. Gostaria bem que V. visse os índios, mostrasse o
Museu . Dê seu endereço para eu telegrafar -lhe.
Até 23 de outubro .
Respeitos à senhora. Adeus, nova geração !
Bien à vous,
C. A.
Rio, 11 de agosto de 1921.
Afonso amigo,
O vol . 19 dos Anais da Bibl. Nac. traz um escrito de Andreoni sõbre
Vieira. Creio será o mesmo impresso no vol. dos Sermões. Não o averi
güei porque V. terá aí os elementos.
328 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
Afonso amigo,
Senti a morte do Vicente , embora fosse a melhor solução para o
seu estado. Quanto podia ter feito ! Pelo que V. diz, não poderei aprn
veitar o livro de Oliveira Lima .
Não sei se lhe contei que pediram -ine, do Estado de São Paulo, que
garatujasse uma página sobre a Independência, no número especial a
publicar- se em setembro.
Não pretendia tocar no assunto porque minha participação não faria
falta é um verdadeiro curée do qual faltará carne, não urubus. Além
disto não sinto entusiasmo pelo Grito do Ipiranga.
Achei, porém , extravagante a idéia do Estado e estou assuntando,
como dizem na Bahia.
Respeitos à senhora.
Adeus, nova geração !
Bien à vous ,
c.
Rio, 26 de abril ( 1922 ).
Afonso amigo ,
Obrigado pelas informações.
Haverá meio de obter, ao menos por empréstimo, os artigos do Re
sende ? Na Secretari?, đo Exterior trabalha -se a valer. Serão impressos
talvez cinco volumes, dos quais o da Inglaterra orçará por mil páginas e o
de Portugal será fino, porque entre o Grito do Ipiranga e o reconhecimento
da Independência não houve por assim dizer negociações diplomáticas.
Na Biblioteca Nacional far- se- á alguma coisa.
Cícero está fora, em comissão. Aurélio luta com a falta de tempo e
de auxiliares. Em todo caso, penso que o volume sõbre o Rio sairá
até setembro ; ajudo um pouco .
Disseram -me que o Arquivo Público dará à luz um volume que está
sendo preparado pelo diretor.
Que fazem na Bahia ?
330 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
Respeitos à senhora.
Adeus, nova geração !
C.
Rio, solsticio, 22/10.
Afonso amigo,
Afonso amigo,
Afonso amigo ,
O documento é exatamente o de que V. mandou extrato.
Peço-lhe agora um cópia completa e datilografada que V. terá a bon
dade de mandar a Santa Rosa no Pará .
Estou pegado com os documentos para a coleção de Afrânio. Ficarei
em Cristóvão Jaques. O Diário de Pero Lopes tocará ao Eugênio de
Castro, um oficial de marinha, distinto, trabalhador , que pode dar cousa
boa .
Um volume sobre os donatários deixarei ao Garcia, cabendo -me a
parte de cireneu preguiçoso ou malandro .
332 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
Afonso amigo,
Afonso amigo ,
Extraviou-se a carta que lhe escrevi sõbre indios. Dizia em resumo :
guaiana, miramomim , gualaxo , no meu entender, é o mesmo grupo .
Junto-lhe os gualaxos, de que os parentes do alto Rio Doce guardam
0 nome . Afirma Borges de Barros que gualaxos existiam na Bahia :
escreva-lhe .
Este grupo ocupava a maior parte da costa, com inserções de carijos,
ou guaranis, de tupiniquins, que pelo sertão se comunicavam com os de
goitacases . Penetrava muito
Ilhéus e Pôrto-Seguro, de tupinambás, de goitacases.
pelo Espírito Santo, informa Pero Rodrigues.
Quais são hoje seus representantes ? Talvez os puris: não conheço
o caso .
Afonso amigo,
A correr.
Afonso amigo,
Casualmente, por alguém da Livraria Científica, soube que V. calcava
esta boa terra onde nasceu , mas onde eu tenho morado mais que você.
Ainda poderia encontrá-lo ? Ninguém sabia dizer-me. Quanto tempo
demoraria ? Horas apenas. Não seria melhor que eu nada soubesse do
meteoro ou meteorito ?
Já lhe devo ter dito, mas repito ; o telefone 3269 B. M., em casa
de meu cunhado, fronteira à minha, pode receber qualquer recado mar
cando encontro na cidade .
cidade mineira, de que ouvi falar com alguma nitidez. Junto hoje exem
plares de meu prólogo às Confissões do Santo Oficio. V. me fará o
obsequio de distribuir os que levam endereço .
Feliz, feliz ano, de fio a pavio, de pupa a prua.
Respeitos à sr.a. Adeus, nova geração !
Bien à vous,
C.
Afonso amigo ,
Recebi a cópia, que muito agradeço. Creio que a de Santa Rosa deve
V. diretamente remeter para o Pará.
Estou tratando da mudança, não sei ainda para onde. Pedi a Souto
Maior procurasse um cômodo para nós dois. Ainda não achou .
Paulo Prado, que ontem embarcou para aí, donde não tornará a
voltar, porque o Conselheiro passará todo o inverno na baixitude, fêz-me
uma pergunta a que V. está obrigado a responder : quando a palavra
bandeira tomou o sentido histórico hoje tão conhecido ? Quando tornou - se
corrente o termo bandeirantes ?
Trabalho na revisão das provas das Denunciações da Bahia. O texto
pode ficar impresso até o fim do mês. Vou ver o que notarei no prólogo
obrigatório.
Respeitos à sr.a. Adeus, nova geração !
Ergebenst,
C.
Rio, 7 de junho de 1923.
dtonso amigo,
Rondon chegou e não trouxe o bacairi, que só virá com o genro
Amarante, no fim do ano , ou mais provavelmente em janeiro. É um
contratempo : desde setembro o xinguano saiu de sua terra. Chegando
aqui, ficará impaciente para voltar, como sucedeu ao que veio da vez
passada, e não poderei colher todo o proveito.
336 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
Afonso amigo,
de 1852, que não se encontra nas novas edições. Garcia ficou com a
Capitania de Pernambuco, de Carinhanha a Paraíba ; ainda está atrasado.
Entre os papéis do meu amigo Ramos Paz encontrei três artigos meus,
impressos no Jornal do Comércio de 99, sobre o povoamento do Brasil.
Estão naturalmente muito antiquados, pois 21 anos não passam debalde.
Apesar disto vou reimprimi-los no Anuário, ou cousa que valha, no
Colégio de Pedro II , acompanhando -os de uma nota em que exponha
as notificações em meu modo de pensar.
Creio que depois destes publiquei na Noticia dois artigos sobre o
povoamento de São Paulo. Vou procurá -los, ou antes, pedir a alguém
que os procure, porque sou incapaz destas pesquisas, e publicarei ao mesmo
tempo. Percorrendo o vol. 19.0 ( calendário juliano ) da Revista, encontrei
a págs. 143 e seguintes um escrito de Machado de Oliveira sobre o
arquivo da Câmara Municipal de São Vicente.
Não me lembrava de tê-lo lido. Depois verifiquei que não figurava
no indice o volume. No terceiro vol. dos Anais do Museu Paulista
seria bom reproduzi- lo.
Para facilitar citações:
Desde muito aboli a numeração romana para indicar volumes ; no
Varnhagen recorri a tipo mais grosso, o que já é melhor ; o mais simples
é acrescentar o n.º cardinal, como faz Lúcio de Azevedo e tenho feito.
De Lúcio de Azevedo recebi ontem a Critica dos Lusíadas de José
Agostinho de Macedo, que lhe encomendara. Comecei a leitura pelo ex .
da Bibl. Nac., há muitos anos, e não continuei. Agora irá tudo, já
estou no fim do 2.º canto . Tem razão o provérbio. Imitando a frase
admirável “ Feijó, semi-majestade, semi-abdicou”, tenho vontade de es
crever : “ Camões, semi-homero, bidormitou”.
Saudades ! Saudades !
C.
Rio, dia da Conceição ( 1923 ).
Afonso amigo,
Afonso amigo,
Afonso amigo,
Pretendo partir no próximo domingo pela Costeira para Santos.
Pensei na possibilidade de publicar na sua Revista os meus textos.
A obra é de tamanho da dos caxinauás, mas há conveniência em
dividi-la em três partes . A primeira pode ir já para o prelo e posso
levar os originais.
Tipos especiais : ö , n, %, n, ñ, a'. Fica mais chic imprimir - se tudo
de bacairi em itálico .
Respeitos à senhora.
Adeus, nova geração !
Ergebenst ,
C. A.
Rio, 9 de agosto de 1924.
Afonso ainigo ,
Afonso amigo,
Parece haver páginas de mais quanto aos espanhóis. Isso não chega
a
ser impressão. A leitura será vagarosa ; quando discordar de algo,
escreverei.
Já estão na tipografia os originais bacairis. Preciso andar depressa,
porque em setembro parte Rondon para Mato Grosso e quero que leve.
o indio.
Escrevi uma carta a Jaguaribe. Espero a resposta para decidir de
minha viagem para S. Vicente.
Respeitos às sr.as
Adeus, nova geração !
Ergebenst,
C.
Afonso amigo ,
Esta é a segunda carta que lhe escrevo. A outra extraviou-se no
meio da papelada; procurá -la levaria mais tempo.
Contava encontrar no meu exemplar de l'arnhagen as indicações
sôbre Veloso. Não estavam ali. A Vida do Padre Vieira de J. Lúcio
de Azevedo e as folhas das Cartas do padre, que ele está reeditando,
Said Ali levou para Petrópolis. Vou pedir-lhe informações.
Hoje ou amanhã há quarenta e quatro anos que Jaguaribe levou -me
pela primeira vez. Dos amigos do tempo restam éle, Bulhões, Assis
Brasil .
Estou tratando da separata. Aborrecida e difícil cousa .
Não se bota remendo novo em pano velho.
Respeitos à senhora .
Adeus, nova geração !
Ergebenst,
C.
Gigante de Pedra, oitava de Santa Luzia, 1924.
Afonso amigo,
Só agora estou terminando a correção das provas para a separata
dos Caminhos. Modifiquei muita cousa ; pelo menos os erros da Amé
rica escoimei.
CARTAS A AFONSO TAUNAY 343
Afonso amigo,
Afonso amigo ,
Camuflado, bem camuflado, chegou o 2.º volume das Bandeiras.
Enquanto não descasquei o invólucro , perdi-me em cogitações por este
mundo a fora.
Abraçando-o cordialmente pelo feito, espero o que há a fazer.
O bordão dos jesuítas para pouco prestará daqui por diante. · Se as
atas, os inventários e repertórios não ajudarem, chegaremos aos sujeitos
sem predicado.
344 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
Afonso amigo,
Afonso amigo,
No dia 30 pretendo almoçar com D. Zél que faz anos . Como des
cerei no mesmo dia, gostaria que nos encontrássemos, nem que fosse de
passagem ,
Imprevista doença a de Haddock Lobo?! Quem tal diria ? Es
cepção da República.
Afonso amigo,
Afonso amigo,
Sempre me pareceu mal empregado o tempo gasto com Cândido de
Figueiredo e seu Dicionário.
A separatal não me mudou o sentir, ao contrário asanhou - o .
Não me parecia direito que você, como diretor de Museu, cercado
de enciclopédias, monografias e especialistas, atirasse com tais armas
de precisão contra um c ... tintas.
Mais de um arrepio causou-me o horroroso vocábulo túpico. Quem
o construiu ? O Imperador ? Varnhagen ? Fernandes Pinheiro ? Er
nesto Ferreira França na Crestomatia ? Acho - o horrível . Como se pro
nuncia : grave ou esdrúxulo ?
Estou lendo o livro de Alberto de Faria sobre Mauá. No terço
já percorrido acho-o de incontestável valor. É talvez um pouco dantesco
isto é, abrasador. Há uma discussão muito ( ilegivel ] de palavras do
Visconde.
Afonso amigo,
Afonso amigo,
Respeitos à sr.
Bien à vous,
Cap.
[s. d.)
Afonso amigo,
Afonso amigo,
Afonso amigo,
Voltou você ao vômito ! Que pena ! Nem compreendo como insista
em gastar tanto e tão precioso tempo a discutir com o homem do chino.
Infeliz mania !
Basta ! Já V. lembrou os casos do florianista, da sirema, do guaxupé,
do aeroplano e quejandas asnices. Para que mais ?
Tantaene animis !
Convença-se de que matou e enterrou o sujeito e, assim , recuperando
a saúde mental, cuide de assuntos sérios.
350 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
Joanico,
Ocupei-me hoje com as provas da prata ( sic ). Não estou satisfeito ;
nem aproveitaste o material que te mandei, nem corrigiste certos erros
apontados.
Fiquei buridanado. Não sou o atuor, e o burro albarda -se à vontade
do dono. Chegando a certo ponto , perdi a paciência e emendei. Creio
que ainda emendarei mais. Mesmo assim, podia ficar melhor.
Li as provas do Jornal, que já estavam, aliás, bem corretas.
Houve um ponto em que pus na afirmativa o que o original tinha
na negativa ; pus tolerante, em vez de intolerante, lembrado, em vez de
esquecido.
Ainda não vi o capítulo anterior às Conclusões Gerais, tratando .
segundo penso, dos combustíveis.
Creio que conviria pôr a resposta a Osório, como apêndice, modifi
cando - a ligeiramente.
Não tenho visto Bulhões. Creio que não fará negócio com a Re
finadora — muito bom para o Banco, quando estiver autônomo – pensava
éle há dois meses ; além disso tem compromisso anterior com Álvaro de
Oliveira.
Esta semana, lá para 5.a ou 6.a, pretendo ir para S. Ana.
Vou jantar com Bobói na ilha. Trata do indice analítico. Para
dispensar a declaração do volume, estabelece uma notação qualquer, por
exemplo, os números relativos ao segundo, sempre grifados.
352 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
Xara ,
Acabo de receber tua carta com a transcrição do Vaude Claye. Muito
obrigado. Vou agora compará -la com o original.
Li ontem no Jornal tua resposta. Está muito boa : poderia talvez
ser mais clara num certo ponto que já não me lembro. Quem quer
que a reviu, fê-lo com consciência. Ainda responderá o Osório ? Creio
que agora poderás te desinteressar da questão.
Pelo que me consta, ele dá-se como o agravado, e isto num li
vro ... Parece que ainda torna. Deixá - lo .
Entreguei a prata [ sic ] na Imprensa. Vou ver como está : é o que
estorva a conclusão . Por que não deixaste o malfadado Rodrigo de
Castelo Branco para o fim ?
Desci hoje definitivamente da Tijuca. Amanhã espero ficar livre
de uma vez . Pretendo ir para Sant'Ana na 5.a feira.
Adeus, Sinhoca !
CAP.
Rio , 10 de abril de 1905 .
Joanico,
Sá, que amanhã de madrugada vai à cidade, leva as conclusões finais.
Só hoje vi que eram segundas provas; por isso, e só por isso, não as
despachei antes.
Acabo de ter a prova no Varnhagen que D. Luís de Sousa esteve
em Pernambuco, antes de seguir para a Bahia. Não sei como me
escapou esta notícia . Também, aquilo é um matagal que até eu , vaqueano
velho de tais devesas, mais de uma vez fico areado. Sá leva uma nota
para ver se ainda é possível encaixá-la, modificando a que lá estava .
Tens razão em não fazeres o apêndice. Bastará uma nota pouco
mais ou menos neste sentido : O presente trabalho começou a ser
composto na Imprensa Nacional a ... do ano passado e já estava todo
escrito e apenas foi ligeiramente modificado na revisão das provas. As
páginas publicadas no Jornal do Comércio deram azo a respostas pouco
pertinentes ao assunto, do atual diretor da Estrada de Ferro Central.
Quem quiser acompanhar esta discussão recorra aos n.os... Aqui
cheguei no dia 13, e tenho passado uns dias deliciosos. Sexta-feira, 21 ,
pretendo seguir para Volta Redonda, fazenda do Dr. Peixoto, onde fi
carei até domingo.
A próxima semana passarei ainda no Rio : depois é possível vá
à fazenda do Virgilio assistir dois ou três dias.
26 – 1.0
354 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
Xará ,
Vai esta às carreiras, escrita da casa da Adelaide, numa rápida esca
pada da Tijuca.
A escritura deve ser assinada amanhã. A dona vai mandar pro
ceder a uma limpa geral, de modo a ficar tudo preparado lá para o dia.
8. Os pedidos chovem , mas ela já declarou que não pode decidir de
nada, enquanto não tiver tua resposta. Bobói não precisa de se apres
sar muito, porque diz ela que só depois dos consertos poderá se formar
uma idéia exata do conjunto.
Não tenho estado com o Bulhões, mas creio que não descansa. Cus
tódio disse-me hoje que o Pente Fino aderiu decisivamente e está traba
CARTAS A J. B. PANDJÁ CALÓGERAS 355
Xará,
Desci ontem a Pôrto Novo passar um telegrama de felicitações a
Sinhoca. Chegando à estação da estrada, tive a notícia da morte do
Pena. A curiosidade apossou - se de mim e ... Vão, pois, com toda
cordialidade, todos os meus bons desejos, e para não incorrer outra vez,
reserva uma quota para o dia 19, para não incorrer outra vez [ sic] na
pecha de pouco zeloso.
Morreu Pena, e mostrou bem que não era o acomodatício que denun
ciaram na Câmara e no Senado. Engoliu os casos de Goiás, a candida
tura do Davi, a candidatura do Hermes, mas não as digeriu . Fosse o
sem - vergonha que sabes, e teria ganho alguns quilos. Causa lástima
que o apaixonassem tanto cousas em que não tinha que ver e deixasse à
matroca aquilo para que fora eleito, mas foi um presidente respeitável ,
nomeou bons juízes e não considerou o pôsto como aposentadoria. Se
356 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
Xara .
Xara,
Não sei se na lufa-lufa em que revoluteias poderás ir segunda- feira
ao primeiro andar da Imprensa Nacional procurar Xavier Pires, dizer-lhe
que prepare minhas provas até quarta-feira, pô-las neste dia registradas
no correio, cedo, à hora de poderem chegar aqui na quinta -feira. Assim
terei quinta, sexta, sábado, domingo para corrigi-las, poderei sair daqui
2.2, 3, e 3.a, 4, almoçar contigo, se ainda estiveres por esses bairros ou
não emigrares para as Flôres.
Li discurso do Sá. Muito bom, esplêndido. Creio que ele tinha
preparado outra cousa, mas o temporal, a retórica de Castro Pinto ( foi
realmente muito cacete ? ) aconselharam - lhe proceder diferente. Mostrou
se assim homem de verdadeiro espírito.
E o Jornal, que não desarma ? E a Fôlha do Dia de ontem ? E o
Nuno com o Rui ? Se no Brasil houvesse propaganda, os artigos do
País deviam ser colecionados e distribuidos. O discurso de Bulhões, pro
358 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
Não recebi as provas que vim de propósito buscar. Ou não teria chegado lá
minha carta ?
Saudações,
C. A.
Porto Novo, 30 de dezembro de 1909 .
Xara,
Saindo sábado daí , combinei com Pires que mandaria entregar as
provas na Livraria Briguiet, donde me seriam remetidas pelo correio. Até
agora nada recebi . Peço-te que, depois de amanhã, segunda -feira, pas
ses na Imprensa, para apressar. Não creio que a demora seja do Bri
guiet .
Se os tipos especiais estivessem prontos, meu trabalho estaria adian
tado, pois quase todos os textos estão compostos ; na falta dêles, as se
gundas e terceiras provas saem tão sujas como as primeiras.
Tenho colhido mais textos, umas trezentas frases mais, devidas a
Tuxunim , principalmente. Acaba este de dizer que Vicente sabe his
tórias de almas, e outras cousas . Não as conta com mêdo. Qual o
meio de acoroçoá-lo ?
Vi a nomeação do Frontin .
Lembrou -me a segunda frase de Waldstein, ao princípio.
Depois refleti sobre a némesis.
Del Vecchio foi demitido porque protestou timidamente. Frontin
está movendo processo pelo mesmo motivo , e reclama o que lhe não
pagaram das obras do pôrto.
Em suma, como nos teatros da baixa classe, os figurantes entram
por uma porta, passam correndo pelo palco, e tornam a entrar pela mes
ma porta, para fingir multidão.
CARTAS A J. B. PANDIÁ CALÓGERAS 359
Xará,
Em companhia das Notas, Bulhões teria também mandado o Koster
e o relatório de 1859 ?
Vou escrever - lhe.
Ele já falou ao Rio Branco e ao rio sujo sôbre o Pan -americano, e
encontrou toda a boa vontade. Faço questão de que vas ao Chile, para
poderes recitar com maior convicção o verso de Castro Alves sobre os
pequenos e os Andes.
Relativamente à moeda colonial pouco me lembra. Ao tempo dos
Filipes, abriu-se o comércio com o Prata e afluiu a prata dos peruleiros:
Fr. Vicente o diz, e Pyrard de Lavalle, que estêve na Bahia cerca de 1610,
o confirma.
Li em Simão de Vasconcelos que com dinheiro de São Vicente se
faziam umas moedas chamadas vicentinas. Nunca mais encontrei este
trecho, marcado no meu exemplar da Crônica, que se perdeu com a morte
de Cabral. Mandarei, porém , à Sinhoca a Crônica ; ela a lerá certamente
com prazer e achará a pepita.
Em Rocha Pita acha -se uma descrição precisa da lei de Gresham.
Como ficou com os papéis do tio, instalador, ou cousa que o valha, de
algumas casas de moeda, pode ser que através de sua obstusidade pala
vrosa haja filtrado algum raio. Ou Júlio Meili já o terá apurado ?
Um dos últimos números da Revista do Instituto publicou a corres
pondência de Câmara Coutinho com algumas referências à nova lei sobre
moeda : escreve à Fazenda.
Eu tive cópia de uma carta do mesmo sobre assunto análogo. Se
achar, reservar -te - ei.
360 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
Xará,
Xará,
Xara ,
Prenes mon ours ! de acordo ; mas em História não pode ser esquecida
a perspectiva.
Dizer que X. S. V. destruiu o gâchis lucenesco não é exato : deve-se
atribuí- lo à reação que trouxe a resignação do Deodoro, e varreu o ditador
e sua obra .
Tenho dúvida se sua carta atualmente considerou ciclone crescendo
de tempête. Talvez fosse melhor vents e depois tempête, orage.
Pretendo não descer hoje à planície. Creio que não há provas urgen
tes, a que minha revisão seja necessária.
Respeitos a Sinhoca .
Um abraço no Boboi, de que andava saudoso .
САР..
24. Viva S. João ! 1910.
364 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
Xará,
Li com toda atenção a carta de Fr. Serafim. Frade não é gente.
Condeno - o e protesto envidar todos os meios legais para dar execução à
sentença , condeno-o ao diabo que o carregue.
Ia-te escrever para dar a grata notícia de que amanhã ou depois
acabarei a cópia de todos os mitos recolhidos, em número de quarenta
e um ou quarenta e dois. Alguns há repetidos ; espero recolher ainda
outros durante a impressão e composição ; assim não ficarei longe de
cinqüenta.
Consegui finalmente apanhar o tipo sintático da lingua, um verdadeiro
ôvo de Colombo, e agora aparece-me em toda a sua unidade através de
todas as peculiaridades. Aos vaivéns da rêde, parece-me tudo simples e
harmônico. Não vá Said Ali , que também está estudando e a quem
consultei , deitar-me água na fervura.. Agora só me falta abordar os
sufixos, para ver se penetro na formação das palavras.
Pensei, e ia começar um artigo sobre Bulhões, mas está no ministério,
ficará para outra vez, se a idéia voltar.
Não estou satisfeito, nem quieto com o câmbio , tal como entrevejo
através do Jornal. Creio que o nosso amigo foi um pouco adiante, e
sacrificou um pouco à teoria . É a eterna questão : até que ponto uma
pessoa pode nos outros realizar as próprias idéias ? Ou, adaptando uma
imagem da grande Catarina, é licito escrever leis em pele alheia ?
A leitura de hoje me animou um pouco : talvez Bulhões não tenha
perdido o leme. No fundo ele só empurra o câmbio para cima de 18,
para afixá-lo em 17. Contanto que deixe as contas líquidas ao sucessor.
Para mim líquido é que ele não será ministro de Hermes. A adesão da
Bahia, negociada pelo Rosa e Silva, dará este resultado.
Sábado pretendo dar um pulo por aí , um verdadeiro pulo, pois em
meados do mês terei de ir ao aniversário de D. Olga e de Adriano, e ficar
para o de Said Ali. Já então a gramática deve estar pronta ; não pretendo
consagrar-lhe mais de una quinzena ; basia o melhor de ano e meio
passado às tontas, à sua procura.
Há notícias de Boboi ? e dos Albanas ?
Adeus, Sinhoca !
Saudades,
Cap.
Paraíso, 28 de setembro de 1910.
J. B. PANDIÁ CALÓGERAS
$
1
i
CARTAS A J. B. PANDIÁ CALÓGERAS 365
Xará,
Li na Fôlha do Dia a estralada da Bahia .
Seabra está furioso, e agora mais que nunca é impossível que te
perdoe ter conseguido que não fosses a Buenos Aires.
E ele não foi eleito deputado pelo próprio distrito e pela mesma
qualificação que agora procura anular ?
Daqui de longe parece-me que sai ganhando de tudo só Rosa e Silva.
Seabra vai mostrar a Hermes que Bulhões traiu-o, aventando a can
didatura do Nilo, depois da convenção ter escolhido candidato.
Pretendo partir 6.a feira, passar uma semana.
Adeus , Sinhoca !
Cap.
Paraíso, 9 de outubro de 1910.
Xará,
Lendo as notícias de Manaus, passou -me pelos olhos um cavalo árabe
ou quase, Bulhões a pé, P. Fino em exercícios de alta escala. Bittencourt
representou bem o seu papel. Nem tudo está perdido quando resta
La voix qui crie malheur! la bouche qui dit non !
É verdade que podes apontar o caso de Macaé. E agora ? Há três
soluções possíveis: não falo na solução direita, porque, sendo-a, ipso facto
fica excluída.
A : Há a solução mato-grossense : matar Bittencourt : talvez já o
tenham feito .
B : Há a solução amazonense : comprar o herói, que irá para a
Europa roer a cobreira ; nos jornais de ontem já se insinua isto.
C : Há a solução nilótica : Bittencourt será reposto, por que o
espanta -leão com o colega da marinha, etc., cometeram plus qu'un crime,
une faute, mas será deposto imediatamente, porque o Congresso declarou
vago o cargo. Se nada disso acontecer, terá Rosa e Silva mais uma alpon
dra para a ponte que está construindo, aliado à Bahia e, se não tomarem
a tempo as precauções, a S. Paulo.
Ouvi com indiferença a proclamação da república em Portugal,
porque não acredito em feitiçaria, nem em catálise sociológica . A resis
tência dos monarquistas encheu -me, depois, de inveja, quando lembrei-me
da epidemia que aqui grassou em 89 ; a camada político-burocrática é tão
366 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
ruim lá como cá, mas as camadas intermédias, creio mesmo que as infimas
camadas, são superiores.
O andaço anticlerical enojou -me como uma velharia perniciosa, mas
agora vou mudando de idéia.
Apresento -lhe o Sr. Luís Rocha, por quem muito me interesso. Ima
gine que veio me desencavar no Paraíso !
É preciso fazer honra ao nome e ao lugar.
Estêve empregado no serviço da defesa agrícola, mas, extintos os
gafanhotos, dispensaram -lhe os serviços.
Agora pretende um lugar de continuo na Câmara. Com as suas rela
ções com o Sabino, creio que V. poderá ser-lhe útil ; peço-lhe que o seja.
Estarei por ai no começo do mês. Hoje comecei a gramática, de cor,
deixando os exemplos para mais tarde.
E saudades do amigo velho
C. DE ABREU
Paraiso, 26 de outubro de 1910.
Xara,
A tirada final podia ser mais tópica. Das expansões socialistas não
erat hic locus. Melhor seria insistir na analogia com a escravidão, mos
trar como se repete estùpidamente a história antiga para afinal atingir ao
mesmo resultado : o que se faz hoje reproduz o tráfego clandestino, o bill
Aberdeen ; a Caixa de Conversão foi a segunda lei de 28 de setembro.
Saraiva, Cotegipe ; Bulhões foi Dantas, etc. ( Cada vez me convenço
que a dispensa de Bulhões podia ser prejudicial ao Brasil; para ele foi
uma salvação ) .
Já estarão acabados os distúrbios a esta hora ? Eu não daria estado
de sítio, porque afinal o outorgado seria o Seabra. E que fosse Hermes ?
É a história de Mil e uma Noites noutra direção : o gênio vaporizado,
depois de desencantado consentiu em tornar-se novamente vapor para
mostrar que cabia na garrafa e dissipar as dúvidas do pescador; a reali
dade apresentará casos iguais ?
Estou profundamente cansado e aborrecido com a tal língua dos
caxinauás. Creio que muito breve a saturação chegará ao ponto de me
bestializar. Para me distrair, meto -me na lexicografia. Pretendo sair
daqui a 31 .
Adeus, Sinhoca
CAP .
Paraíso, 12 de dezembro de 1910.
Xará,
Xará,
27 - 1.0
370 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
Xara,
No dia 31 chegou um telegrama de Paris a Laffon , assinado pouco
mais ou menos Fra , falando em um milhão e empregando a palavra
CARTAS A J. B. PANDIÁ CALÓGERAS 371
Xara ,
Não sei onde está tua carta, por isso tenho ido adiando a resposta.
Interessou -me muito o que dizes sõbre a arte colonial em Minas Ge
rais. Conheces bem as manifestações de Ouro Preto, estudaste agora as
de Caethé ( escrevo assim por causa do correio ) , podes revisitar as de
Sabará. Tens assunto interessantíssimo para um artigo, principalmente se
colocares no meio o Aleijadinho, sobre o qual bastante há escrito, porém
muito pouco dito. Ou o Aleijadinho já pertence a outra corrente ?
Outro dia encontrei Ramalho Ortigão e disse que estavas escrevendo
sôbre a Caixa de Conversão. Recebeu a notícia com certa frieza ; pare
ce-lhe que o momento oportuno era quando se discutia na Câmara, aonde
1. Por equívoco Capistrano datou esta carta de 1910. Calógeras anotou - a como
recebida a 7/2/11 .
CARTAS A J. B. PANDIÁ CALÓGERAS 373
Desde 2 de janeiro ainda não arredei pé. ( ) calor não é estas cousas
que dizem ; como cearense , além disso, não poderia queixar -me, decente
mente queixar-me; queixo -me de outra cousa , da ausência dos amigos em
vilegiatura.
Quando chegas ? Como pouco saio , a falta é menos intolerável, mas
existe .
Adeus, Sinhoca !
Teu
C.
Rio, 26 de fevereiro de 1911 .
Xará ,
Recebi tua carta de ontem . Ainda bem que aproximas -te. Breve nos
encontraremos. Pretendo partir sábado de Judas. Domingo irei à tua casa.
Trouxe Matilde para iniciá - la na equitação. Já anda bastante, sem
receios nem nervos. Creio que em sua ignorância considera -se já grande
amazona .
1. Hermes da Fonseca.
376 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
Xará ,
Xará ,
Xara,
Acabo de escrever um bilhete ao Felisberto, lamentando ter-te metido
na alhada de provas. Há compostas as suficientes para completar uma
fôlha, pelo menos até 448 ; nem isto o moveu.
Agora que li o que está impresso e vejo como emendas, feitas três,
quatro, cinco vezes, foram desprezadas, digo : desgraçado de quem se mete
a publicar um trabalho sôbre línguas indígenas na América do Sul, ou pelo
menos no Brasil, ou pelo menos na Imprensa Nacional . Sôbre um pro
cedimento racional : o do cidadão que, para fazer salada de pepinos,
mandou lavá -los diversas vezes e depois jogar fora por intragáveis .
378 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
Xará,
Diz-se que, na retirada do Seabra, que deve ser pelo menos até 27,
será chamado, para o Ministério da Viação, Sebastião de Lacerda.
Diz-se que Sebastião de Lacerda tomará para secretário Mário Belo,
muito amigo teu . Neste caso Adriano deseja muito ser chamado para
auxiliar de gabinete : ele está na Diretoria do Expediente, e não gosta.
Como sabes , virou trabalhador.
Por aqui duas novidades únicas são a carta de Rêgo Barros, digo
de Dantas Barreto ao Rêgo Barros. Publicou - a o Diário de Notícias,
transcreveu - a o Correio da Noite, dizem que também o da Manhã. Lès
te-a ? Estão dizendo que não é autêntica : juro -te que o é mais que a lei
escrita por Deus em tábuas de pedra.
Outra novidade: a descrição do bombardeio, publicada há três ou
quatro dias no País, na segunda ou terceira página : não deixes de ler.
Gordon estava na Bahia uma semana antes e assistiu a tudo. O
forte de S. Marcelo não foi nada, o de Barbalho sim . Se o vento estivesse
de feição, metade da cidade iria pelos ares .
Não sei se estás satisfeito com a campanha eleitoral de Minas. Creio
que o plano aqui é deixar que poucas eleições venham liquidas: assim em
vez de moderadores da situação, os mineiros baixarão a contestantes. Com
certeza o plano será bem sucedido.
Hoje saiu o último artigo do Jornal: vou tratar agora do folheto.
Entreguei os originais ao Leuzinger, os primeiros, bem entendido. Se
êle me ajudar, forcejarei por ter a obra tóda pronta em abril; esta semana
farei a gramática provisória que irá no principio ; no fim, em apêndice,
virá o que tiver apurado de mais : a grande dificuldade são as orações
incidentes.
CARTAS A J. B. PANDIÁ CALÓGERAS 379
Assim não sairei daqui antes de abril, a menos que o livro não
esteja acabado.
Adeus, Sinhoca !
Bien à toi ,
C.
Xará ,
No Cairo ? em Malta ? em Nazaré ? no Egito ?
Escrevo-te para Caeté, mas não sei se a carta chegaria mais depressa
remetida para o pólo do Norte, to the cares of Dr. Cook .
Não compreendo este silêncio emperrado, só comparável ao do menino
malcriado de uma história de Tuxunim : por sinal que o menino foi trans
formado em peruinho do campo, por castigo.
Tua eleição me confunde. Ponho de parte os dois elementos pertur
badores, Irineu e Campolina, e não compreendo o resto .
Parece que de teus colegas cada qual acumulou em si o maior nú
mero de votos possível; mas parece também que certos lugares aonde as
simpatias eram gerais por ti , esfriaram . Não sei de nada ; não recebo
jornais de Minas, e as apurações parciais são falhas.
Continuo hoje, 19, esta carta começada a 17 .
Estive em Petrópolis, e conversei longamente com Bulhões.
Êle nada entende : está às tontas. Disse -me que estás em Ouro
Prêto : mando para lá o endereço.
Disseram -me não foi Bulhões que Lauro e Riva querem botar
Mena para fora , mas isto não será possível, pois os generais resolveram
apoiar Mena até contra o Hermes .
Disseram que Hermes foge déle.
Disseram mais que Sotero voltou para a Bahia por força de Calmon.
Talvez fosse por fôrça da etimologia : sabes bem que quer dizer
Soterópolis.
Fui à casa do Sá duas vezes apenas: não tenho voltado porque deve
estar um pandemônio, com tanta gente .
380 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
Sei que ele não está satisfeito, que D. Olga espera criança em abril,
e por isso ele não vai para Ponte Alta.
Adeus, Sinhoca !
Bien à toi,
C.
Rio, 19 de fevereiro de 1912.
Xará,
As notícias de tua carta diferem pouco do que imaginei, mas o colo
rido é outro ; contentou-me muito a impressão final ; em vez de abatido
sentes-te mais forte : ainda bem .
Convém que desde já penses na próxima eleição. Irineu , ao que
corre, optará por aqui. Podes e deves influir sôbre a apresentação do
futuro candidato, se não, sairá salada.
Não sei , e haverá quem saiba ? o que se projeta quanto ao reconhe
cimento de poderes. Estão líquidas as eleições de Minas, S. Paulo e Rio
Grande do Sul, salvo a questão do sexto nos dois últimos estados. Pente
Fino pareceu permitir a entrada de Moacir, apenas. Em S. Paulo os
rodolfistas aspiram a mais do sexto.
Considero líquidas as eleições de Pernambuco : os rosistas limitando - se
à apresentação de candidatos pelo sexto, lavraram sua abdicação.
Em Petrópolis disseram Azevedo e Vitorino que seria contra todos
os princípios aprovar as eleições de Bahia e Ceará . Terão força para
levar a sua por diante ? Acioli considera - se vitorioso ; a anulação é -lhe
antipática ; espera o reconhecimento dos seus suspeito : ninguém me
disse .
Contra Goiás a Herma está furiosa : nos outros estados não tem
intervindo, neste intervirá ! O genro do Urbano foi demitido; um cunhado
do Bulhões, médico do Exército, removido para Mato Grosso ; uma carta
de Bulhões, escrita a conselho do Rivadavia, considerou a terceira luva de
desafio atirada a ela ; a inelegibilidade do Artur será apresentada como ca
valo de batalha ; Olegário há de entrar, seja como fôr : tudo está suspeito,
e induzo.
A posição de Urbano é difícil : quer largar a presidência, e isto equi
vale a entregar o poder aos inimigos ; Bulhões acha a solução desastrada,
mas não se anima a combatê - la , porque receia algum conflito armado e
sabe que Urbano não se encolherá e será sacrificado.
CARTAS A J. B. PANDIÁ CALÓGERAS 381
Xará,
Quanto mais penso em teu discurso, tanto mais difícil acho concilia-13
com o pouco que sei de relações exteriores .
O bill Aberdeen , a Questão Christie podem não provar muito, mas
as convenções consulares ? Creio que só quantitativamente diferem das
capitulações que a Turquia trata de abolir.
Disse -me Félix que a comissão é contrária à tua emenda sõbre Rio
Branco .
Xara,
Xará ,
Recebi tua carta ; não vou hoje a tua casa, como pretendia, por estar
com uma pontinha de reumatismo.
Branner está no Hotel Internacional em Santa Teresa. Deseja fa
lar-te ; telegrafa-lhe ou telefona-lhe, combinando o encontro. Parte a 16 ;
como quer deixar acabado o original da 2.a edição da Geologia, pouco sai,
Até um desses dias.
Adeus, Sinhoca !
CAP.
Xara,
C.
Rio, 14 de julho de 1913.
Xará,
Xara,
Xará ,
Indo dar a lição do costume, notou nas pupilas uma alacridade, uma
simpatia, uma benevolência extraordinárias. Padre, não tem alguma pre
tensão ? perguntaram . — Quem sou eu para pretender qualquer cousa ?
desfez- se em desculpas, em humildade, em modéstia ... as protetoras in
sistiram tanto, tanto, que ele aprumou - se, e com a morgue de lord que
tem nas veias o sangue de um companheiro de Guilherme, o Conquistador,
disse às Princesas : Já que Vossas Altezas tanto insistem, tenho uma
pretensão modesta e com seu auxílio conto ser bem sucedido : Quero
ser cardeal patriarca de Lisboa.
Pensando que Bernardo, Antônio Carlos e outros mais são candidatos
a cônegos, digo, ministros, lembrei-me que o cargo de diretor geral da
exposição seria o patriarcado de Lisboa para ti.
Errei o bote : é o caso de repetir a frase de João Brígido, quando
Meton operou seus mamilos hemorroidários e o paciente morreu : Quem
mandou Meton meter-se a oculista ?
Deves um grande favor a Irineu que te operou o abcesso prestes a
rebentar. Lembra -me, porém , que no tempo de Prudente a situação era
mais grave, o objeto mais digno, tu mais môço e entretanto mais calmo...
28 1.º
386 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
Xara,
Xará,
De Poços de Caldas escrevi-te, dando noticias. De lá sai domingo
para Ribeirão Preto ; 2.a dormi na Franca, ontem cheguei aqui.
Na estrada de ferro goiana devia encontrar passes e recomendações
de Teixeira Soares, dadas a pedido do Bulhões. Dirigi-me depois do
almoço à estação e nada encontrei. Pensas que foi decepção ? Foi
alegrão ! Desde a noite de Franca, não encontrando amigos nem conhe
cidos, arrastando -me em nuvens de poeira pelos chapadões tumulares,
tenho sentido uma depressão difusa, uma tristeza aborrecida : não iria
estuar-se éste desconforto pelas terras goianas ?
Mas para não se dizer que cheguei a Araguari e não vi Goiás,
Posso sair às 6 horas, atravessar o Paranaíba, almo
consultei o horário .
çar em Goiandira e estar de volta às 3 horas da tarde. É o que pretendo
fazer amanhã.
Xara,
Xará,
Peço -te mandes pelo portador o livro sobre a monarquia na América,
e também , se aí está, o 4.° vol . da Hist. de la Mar. Fr.
Adeus, Sinhoca !
C.
Rio , 19 de maio de 1914.
Xará ,
Xara,
Xará,
Cheguei hoje em paz, com o atraso de hora e meia, o que é muito
conveniente, pois não se encontram mais as casas fechadas.
Depois de amanhã sigo para Ribeirão Preto : agradece a Raul, que
não se esqueceu de meu pedido : acabo de receber o passe. Para Campos
do-Jordão só partiremos na volta : lá para o dia 6 ou 7.
Estive ontem na B. Nac. vendo os últimos verbetes recebidos, que
se referem ao Rio e anexos. Muito interessantes : sobre a mineração do
Iguape e redondezas, grande material. O célebre ofício de Sebastião de
Castro Caldas é catalogado simplesmente, donde concluo que é curto e
não contém informações importantes. A data não combina com a de
Varnhagen quanto ao mês ; creio, porém , que não chegou a ver o do
cumento e cita-o na fé do Teixeira Coelho. Sobre a mineração das gerais
nada veio, provavelmente virá na continuação, pois o catálogo chega
apenas a 1699. Verdadeiras revelações sobre a colônia do Sacramento,
entre elas uma longa carta de D. Manuel Lobo, datada quatro dias antes
de morrer . Notícias geográficas de diversos pontos do litoral.
Fala com o Cícero, a ver se dá a precedência a éste sõbre o quarto
volume da Bahia. Lembrei-lhe que certos documentos, apenas enume
rados, ele poderia mandar vir a cópia completa : ficaria o volume mais
grosso que os precedentes, mas não seria grande o inconveniente.
Não sei quando voltarei : trouxe muito poucos livros — Bryce, Cal
derón, Ingegneros [sic, por Ingenieros ] sôbre a revolução sociológica
argentina, Fortoul sõbre sociologia venezuelana, Ayarraguaray. Pretendo
lê-los todos antes de ir, antes de 24, aniversário de minha senhora sogra.
Adeus, Sinhoca !
C.
Xará,
Xará ,
Sei que estás desapropriado por utilidade pública ; não tenho pre
tensões contra um tempo que alienaste.
As informações da Secretaria sôbre Felício Brandão Júnior são me
diatas, indiretas, quase apriorísticas. Por que não completá -las pelas do
coletor da Circunscrição, com quem serviu ?
Durante larga convivência com Felicinho conheci- o sempre cumpridor
de seus deveres . Se as informações do coletor ou coletores provassem
o contrário, teremos um caso autêntico de arfama = cheval.
Sempre
C.
8 de junho de 1915 .
apareceu por aqueles lados. É fácil verificá -lo, pois sua presença seria
confirmada por um têrmo.
Rio, 9 de junho de 1915 .
Xará,
Xará,
Xara,
O dia de hoje é raro . Não quero que passe sem marcá-lo com
um pedido. Encarrega Luís Adolfo de velar pelo nosso bom nome nos
selos. Já de França, Itália e Argentina começam a exportar Brasil com
a cangalha quebrada.
Recebi de Boboi uma carta interessante. Sabe que desfrutas de
mauvaise presse. Quer saber o motivo. Comecei a resposta, mas sus
pendi, porque o correio rio-grandense é fantástico. Para a semana, Ali
pio, do América Hotel, levá-la-á para pôr na caixa dai.
A temperatura, salvo dois ou três dias em mês e meio, tem estado
admirável : não é estio, porém princípio de outono. Para o equinócio
começarei a mover-me. Um sobrinho de Assis, filho do finado Barto
lomeu, de quem fui muito amigo, prometeu mostrar-me Pôrto Alegre,
aonde reside, sem que eu tenha de conhecer a gente. A promessa sedu
ziu-me ; farei a visita, que não entrava nos meus planos. Em princípio
de abril estarei no Rio. Muito gostaria, se te achasse livre do automa
tismo psicológico .
Adeus, Sinhoca !
Sempre
C.
P. A., 29 de fevereiro de 1916.
398 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
Xará,
O correio daqui é inverossimil : aproveito a partida de Alipio, para
encarregá -lo de pôr esta carta numa caixa urbana.
Li com muito prazer a notícia do Congresso Financeiro em Buenos
Aires. Há de ir, não podes deixar de ir. Romperás assim o círculo
de automatismo em que labutas. Num bilhetinho que me escreveu, parti
cipando a partida para Goiás, Bulhões reflete a mesma impressão, dizen
do que continuas atordoado : que é isto senão automatismo psicológico ?
No Prata verás que um pouco de azeite não perturba o maquinismo,
guinchos e solavancos e atritos só julgam indispensáveis os maqui
nisias verdes.
Alipio leva procuração para receber meus vencimentos atrasados.
Fi-las com o maior cuidado, conformando -me com um modelo que Bran
dão me deu em tempo. Quem sabe se será suficiente ?
Vejo que os louros de Miltiades continuam a perturbar os Temis.
tocles. Diz um telegrama que o Jornal aponta como modelo o caso de
Portugal apoderando -se de vapores alemães, sem carga, sem maquinistas,
sem marinheiros, para, a três milhas da terra, ir entregá-los aos inglêses.
Se eu duvidar que no Brasil façam o mesmo...
Na próxima semana irei a Porto Alegre : espero chegar aí em pri
cípio de abril : até então.
Adeus, Sinhoca !
Bien à toi,
C.
P. Alias, 13 de março de 1916.
Xara,
Acabava de ler uma transcrição do Correio da Manhã afirmando tua
hostilidade ao Exército quando recebi teu telegrama. Obrigado. Non
omnis moriar.
Chamou-me a S. Paulo especialmente o desejo de estudar um ma
nuscrito de Eduardo Prado , intitulado Livro 2.º do Brasil. Salvo um
ou outro avulso, é uma coleção de cartas régias dirigidas a D. Luis de
Sousa, de 1617 a 1621. Resistem ao confronto com tua prosa quotidiana
no Diário Oficial. Fixam alguns pontos minúsculos. Há regimentos
400 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
Xara ,
29 - 1.
402 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
Xara,
Xará ,
Alfredo Pinto contou com muito segredo na Jacuí que o Jornal pre
para um movimento para atirar -te do ministério e a Miguel da diretoria.
Hoje encontrei um amigo de Miguel, muito aborrecido com a demora
deste, que, parece, de Bagé ainda tornou a Porto Alegre. A conspiração
continua ; talvez com sua ação ele pudesse continuar.
Botelho nada teme. No empréstimo do Banco houve qualquer irre
gularidade que o põe sobranceiro ao governo, que não sairia limpo da água
suja.
A Ceciliano pedira 40 contos e depois do cheque não passou do
cumento. De acórdo com ele trabalhara Müller de Reis ? Há quem o
afirme : neste caso prognostico para breve uma boa e espontânea e gene
ralizada greve.
CARTAS A J. B. PANDIÁ CALÓGERAS 403
Tal a situação como a antevejo . Não achas que seria oportuna uma
solução imprevista ?
Adeus, Sinhoca !
Bien à toi ,
C.
Xará ,
Xará ,
Ministro,
1.9 : O Campo das Garças fica entre o rio Verde e a margem direita
do rio das Velhas; não me parece satisfazer qualquer destas condições o
homônimo do Curvelo ;
2.0 : Entre a Bahia e o Serro houve relações diretas desde os pri
meiros tempos ; devia haver uma estrada mais a este, que esgarraria em
ponto a determinar;
3.° : Tronqueira devia ficar adiante da barra do Una, no Paraguaçu,
porque antes não havia passagem , segundo um relatório publicado na
R. I. H. 5, cujo autor não posso agora verificar.
CARTAS A J. B. PANDIÁ CALÓGERAS 405
4.0 : D. Brás diz que a Tábua, fazenda de Manuel Nunes, ficava nos
confins de Minas e Bahia . Isto confirma Teixeira Coelho, 350 , narrando
que do Sêrro foi contra ela uma expedição, cujos excessos teve ordem de
sindicar o juiz-de- fora de São Romão. No Atlas Briguiet H. de Melo
encontro Tábua à esquerda do rio das Velhas, que não satisfaz. Em um
mapa antigo da B. N. encontro Tábua, no Pardo, af. do Paraúna. Não
seria antes este o antro de Manuel Nunes Viana, em que o filho continuou ?
Adeus, Sinhoca !
C.
Xará,
Um pouco de ciprianismo.
Tome conta das provas do padre, enquanto desaperto para a esquerda.
Mande -as diretamente.
Aceite o convite : vá aos exercícios de Santo Inácio em setembro.
Faça ato de presença amanhã, aniversário da morte do seu querido
imigo 1 .
Seu todo bacairi.
30 de junho. ( 1921]
Xara ,
Xará,
Xará ,
ogni speranza. Por este começo pode antecipar -se o que será Bernardes.
Não estranho nada ; lembro -me das palavras do velho Thiers, quando
queriam botá - lo abaixo : il n'y aura plus de danger et la tâche sera pro
portionnée à leur courage et à leur capacité.
Espero estar aí pelo equinócio.
Adeus, Sinhoca !
Ergebenst,
C.
São Vicente, M. de Sul, 1922.
101
Xará,
Li com o maior cuidado sua carta .
Não há dúvida : da crônica poderiam ser tiradas as conseqüências que
V. aponta .
E com a mesma lógica poderiam tirar -se contrárias.
Ainda me lembro da surpresa sentida ao ler em Comte o truísmo de
que, sendo as ciências seis, podiam ser combinadas de 720 maneiras.
Monsieur Jourdan não ficou mais assombrado com seus quarenta anos de
prosa inconsciente.
Na idéia da crônica eu via sobretudo uma demonstração de que V.
não podia ser amordaçado por defunto lavado ou sujo (Hermenegildo será
destes ? ) .
Adeus, Sinhoca !
Ergebenst,
C.
15 de fevereiro de 1923.
CII
Xara,
Xará amigo,
Tenho passado em casa do Djalma para colher notícias frescas. Vol.
tarei ainda hoje : embarco amanhã.
Deixei no José alguns livros, entre os quais um Bulário, dois sobre
o tráfego dos espanhóis antes do Assiento, três de história oriental.
Penso no assunto e vejo-o carregado :
Navegação a vapor — começo da estrada de ferro.
Xara,
Hoje soube que Mogói não seguiu viagem e anda à minha procura.
Como não temos mais negócios e não quero vê- lo , retiro-me da cidade.
J. CAPISTRANO DE ABREU
Rio, 5.a feira, 9 de abril de 1925.
Xará ,
Devemos partir amanhã para a Prata, aonde será nossa maior demora .
São Paulo estaria muito agradável, se aqui encontrasse os amigos
do costume.
Estive com Martim : é o mesmo vulcão ativo e inextinguível. Se o
que ele diz é verdade, as cousas andam piores que no Rio. Procurei
chamar - lhe a atenção para outros assuntos e para o caso da Revista do
Supremo Tribunal. Será impossível achar solução legal ? Isto equiva
leria à falência da República e de todos os seus poderes.
Felizmente o crime é de ação pública : as pessoas que podem promover
a justiça andam por milhões.
Ontem, 29, foi quando o Príncipe Regente começou a santificar-se e
não a 7 de setembro, como Rangel pretende.
Tenho pensado no D. João VI, desde o tratado do Brasil em que não
pôde tomar parte, nos tratados que assinou em seguida, nos milhões que
pagou para obter a neutralidade, nas embaixadas de Lannes e Junot, nas
discussões que precederam o regifúgio, nas deliberações havidas no Rio
depois da revolução do Pôrto, e não me reputo infeliz por ter o queixo
duro .
Junto em cartão -postal com meu endereço. Geyes dirá onde convém
mais apresentá-lo, se na esquina da Rua de S. João, se na Rua Direita.
Adeus, Sinhoca !
Se ainda chegar a tempo, incluo um abraço para Silva.
E mando saudades a todos.
CA.
Cheguei ontem.
Devo permanecer em São Vicente durante o mês de outubro. Aonde
será o encontro : aqui ou lá ?
Respeitos à ex.ma.
C.
Xará amigo,
A melhor resposta à lembrança de Xató seria um não redondo.
Ando tão afastado de história e de jornais, particularmente do Jornal!
Há dois meses perdi-o de vista ; nem em Santos nem em São Vicente o
encontro à venda .
Tentemos, porém , uma aventura .
412 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
Xará,
Xará,
Xará amigo,
Se palavra de rei não torna atrás, espero vê-lo aqui na próxima
semana . Por poucos dias : pretendo partir para S. Lourenço a 19, de lá
visitar Matilde; só por fins de maio estarei aqui efetivo .
Sua conferência paulista é segredo mais impenetrável que os da
Esfinge e seu descendente Nilo. Xató tabuou - a no Jornal ; num suelto
de outra folha percebi o escândalo provocado pelo cotejo entre a valori
zação do café e as obras do Nordeste. Hoje fui com Moacir ao escritório
do Estado para ver se encontrávamos o número encantado que trouxe ou
deve ter trazido o verbo . Não o encontramos.
O primeiro volume do Tobias, que abarca a dissolução da Constituinte,
está concluído. Parece que Briguiet vai editá-lo. Ele pretende partir em
junho, para trabalhar com Bobói e Rangel em Eu. A obra é inédita,
deixa resolvidos muitos problemas. Acho-a fraca na parte narrativa.
Adeus, Sinhoca ! Abraço e beijo as mãos da saudosa amiga.
Idein , eadem, idem.
JoÃC NINGUÉM
Gigante de Pedra , 6 de abril de 1926 .
CARTAS A J. B. PANDIA CALÓGERAS 415
Xará amigo,
Escrevo-lhe do quarto aonde às 11 horas da noite deixou de existir
o bom Jaguaribe.
Ao chegar, achei - o bem disposto, estêve alegre no aniversário, que
reuniu toda a família , dias depois começou a tossir, era a bronco-pneumo
nia que se manifestava. A ela sucumbiu.
As relações de nossas famílias datam de quase cem anos. Eles são
de Icó, nós de Sobral : Maranguape nos reuniu. Jaguaribe podia deixar
uma fortuna enorme. Não a deixará, mas os dois filhos estão bem
encaminhados. Deixa uma chusma de maus livros . Uma vez disse-lhe :
vamos escolher dentre seus livros um , vamos revê -lo, consolidá -lo , será
sua mensagern . V. tem razão de se inquietar com suas provas.
Houve para isso dois motivos. O leitor comum nunca deixa de ler
o primeiro e o último capítulo. Li este com cuidados, mas não verifiquei
certas cousas. Segundo : uma operação diatérmica queimou-me por tal
modo que não posso escrever sentado. Estou melhor. Alvaro diz que
posso voltar para o Rio, mas só irei depois da missa de sétimo dia.
Acabo de ler sua entrevista sôbre a anistia. Acho - a acadêmica .
Você devia considerar em primeiro lugar se é estável , em outros têrmos :
se é possível obrigar o exército a bater-se pela legalidade.
Depois disto vem a parte prática, isto é, aplicada, de modo que não
seja uma recompensa nem um castigo.
Não sei que grego inventou a anistia : era um gênio e foi um benfeitor.
Admiro também os inventores da prescrição e do mandado.
Adeus, Sinhoca !
Ergebenst,
JOÃO NINGUÉM
São Paulo, 15/16 de novembro de 1926 .
Xara ,
Xara,
Xará,
30 1.•
A ARROJADO LISBOA 1911-1924
Caro Miguel,
Muita curiosidade sinto de conhecer o que se trama contra o Sá.
Mas não irei amanhã à Inspetoria. Preciso de passar alguns dias só .
Ontem só sai para evitar um encontro que nunca me agradou e agora
me exacerba.
Estou deixando que o incêndio lavre com toda a fôrça, para não ter
depois de encoivarar. Creio que o escândalo levantado à roda do nosso
amigo é uma diversão para os horrores da Ilha das Cobras. E conseguirão
com certeza. O termômetro da dignidade poucos graus vai acima de
zero ; mas abaixo a graduação não tem fim .
Falaste com Bulhões ? Escrevi -lhe, não sei se terá recebido a carta.
CAP.
Rio, 13 de janeiro de 1911 .
CARTAS A ARROJADO LISBOA 419
Miguel,
Soube ontem alguma cousa de sólido a respeito do Sá sólido no
sentido de ser bem informada a pessoa com quem falei. Houve um tele
grama da Europa , mandado não sei por quem a quem .
Vanerven, diretor do Telégrafo, e hoje inimigo rancoroso do Sá,
comunicou - o a Seabra. Será o mesmo do Jornal ? Ignoro : em todo caso
parece certo que o Jornal, da Europa nada recebeu de seu correspondente;
e a recusa de apresentar o autógrafo é pelo menos suspeita.
Outro escândalo preparado : na minuta do contrato baiano, lê-se que
foi lavrado à vista da certidão do Tesouro de ter sido feito o depósito de
200 contos . Entretanto prova -se por documento que a entrada foi poste
rior à assinatura.
Peço-te que com Bulhões e o cunhado dês um corte à meada do
Navarro.
Ando aborrecido da rua, só me sinto bem em casa, donde saio apenas
para evitar certos encontros desagradáveis em casa de minha sogra.
O livro viria bem , agora , a propósito, coma diversão ; pois o caxinauá
está -me entediando e preciso de me interessar por uma cousa qualquer.
CAP.
Rio, 13 de janeiro de 1911 .
Miguel,
Peço indagues de teu cunhado quem é o autor do Vocabulário Piro
- se é um volume grande, ou pequeno, como de Allemani sôbre a lingua
de sipibo bolsillo .
Procurei-te há dois dias. Visage de bois ?
Tens um dia certo para ficar em Petrópolis ? Assim pouparia o tra
balho da ascensão.
Respeitos à Madame.
C.
Rio, 4 de fevereiro de 1911 .
Caro Miguel,
Li no Jornal a notícia da não -demissão do Pinto.
Tem-me dado que pensar. Será o começo da traição anunciada pelo
José Carlos ? Será o primeiro toque, antes da investida do Piquet ?
420 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
Depois lembrei-me que bem poderia ter sido feito de acordo contigo,
fiquei mais consolado. Neste caso será antes um obstáculo que Piquet
teria de arredar.
Tenho, passado bem . A temperatura se conservou agradável até
5.a ; 6.2 houve um pouco de calor e trovoadas à distância ; ontem choveu,
hoje está nublado e frio. Sentiu-se com isto Matilde, que assim não pôde
fazer seu exercício de equitação. Vai bem encaminhada. Desta vez os
nervos deixaram -na sossegada. O sangue cearense afirmou-se.
Não pude, como desejava, procurar teu cunhado no domingo. Quando
é a partida ? Desejo algumas informações. E como vai para Viena,
preciso de falar com Manuel Cícero , para ver se o encarrega de obter
cópia da correspondência do Barão de Mareshall, diplomata austríaco que
aqui estêve muitos anos com o rei e com o primeiro imperador. Segundo
Varnhagen , é documento capital para a história do tempo.
Pretendo partir sábado e, se tomar a Leopoldina, pernoitarei em Pe
trópolis, e descerei no trem de 7 72 : assim nosso próximo encontro será
no Rio .
Dirijo-te esta carta para a repartição. Se puderes, manda pedir
provas na Imprensa Nacional, e manda- as no envelope em que vierem, mas
não fechadas , para aqui.
Respeitos à Madame.
Teu,
C.
Paraiso , 9 de abril de 1911 .
Miguel,
Soube por uma carta de Abril que chegaste no mesmo dia de minha
partida.
Não podia te esperar, porque Vicente, o indio que está nos Bombeiros,
queria assistir à festa de Santana, a 30, e a maior licença concedida foi
de um mês.
Estou trabalhando na revisão dos textos impressos e na correção do
vocabulário. Duvido que leve tudo terminado.
Tenho curiosidade de saber as cousas da Bahia, conquanto não possam
diferir muito do que me disse quem lá não estêve, mas dispõe de bons
meios de informação: recepção, se não entusiasta, cordial e unânime do
Hermes, reserva da maioria quanto ao Aperiatur. Este, repito, devia ser
CARTAS A ARROJADO LISBOA 421
Caro Miguel ,
Tive uma surpresa das mais agradáveis, lendo agora que chegaste,
ontem, no inglês. Tendo saído do Ceará a 4, chegado a Natal a 6, imagi
nava que demorarias mais uns cinco ou seis dias.
Meu prazer é diminuído pelo reumatismo que me prende a casa :
um reumatismozinho manso, que só dói quando me movo, e está localizado
no pé esquerdo, mas suficiente para imobilizar-me.
Quando tiver habeas-corpus, aparecerei.
Desejo que tenhas feito boa viagem, achado bem encaminhadas as
cousas, de modo a ter confiança no êxito de teus planos, e adiantado o
Inagnum opus.
Respeitos à Madame.
Teu,
CAP.
Rio, 13 de novembro de 1911 .
Miguel,
O homem está pronto a seguir ao primeiro aceno.
É preciso que dês instruções minuciosas : o número de animais, e
se queres cavalos ou burros ; se nos arreios encomendados em S. Paulo
entram cangalhas e cabrestos e caçuas ou jacás ; se convém preparar a
carne logo em Juazeiro ; creio que café, sal, feijão, farinha, melhor iriam
daqui do que comprados lá, e em todo caso isto não é da conta dele.
Nunca te julgues incapaz de roubar : roubei -te uma faca de marfim
para cortar papel: entreguei-a ao Aires, que a mandará pelo primeiro
portador.
422 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
Vim agora da Agricultura, onde fui procurar Derby. Diz ele que
precisa de uma conferência longa, não sei sobre quê. Marquei o encontro
para amanhã ao almoço, no Hotel dos Estrangeiros.
Bien à toi,
Que tenhas feito ótima viagem com a ex.ma família é o meu desejo.
Que tenhas encontrado meio simpático e te sintas bem , é o meu
desejo e a minha esperança.
Por aqui, a única novidade já conheces pelo telégrafo.
Pente Fino sujeitou H. a injeções de cantárida durante cinco dias,
em sua fazenda da Boavista, depois despachou -lhe dois ministros como
apalpadeiras, para usar a expressão das fidalgas portuguêsas do tempo de
D. Carlos, e o homem teve coragem , e o detestado Mena lá se foi.
Ainda desta vez nada te mando ; não é só a impenetrabilidade da
matéria que me estorva, é também a dificuldade da questão : repetir
Ehrenreich, quando tem havido não poucas cousas depois, é desagradável ;
incorporar as novidades, aqui , é impossível. Tenho de ficar em posição
média, isto é, falsa.
No próximo vapor irá cópia de meu artigo sobre os bacairis, que
Valfrido receberá hoje. Mandarei então o que puder.
O livro que te encomendei é :
J. Amich , Compendio Histórico de los Trabajos, Fatigas, Sudores
y Muertes que los Ministros de la Seráfica Religión han padecido por
la Conversión de las Almas de los Gentiles, en las Montañas de los Andes,
Paris , 1854.
Não deve ser raro ; a questão é encontrar o nome do editor. Na Bib.
Nat., para onde vão todos os livros impressos em França, no Dufossé ou
Chadenat, terás informação.
CARTAS A ARROJADO LISBOA 423
Meu trabalho caminha rápido, espero ainda terminá -lo com o mês,
porém , às vezes, desanimo : durante mais de três horas não revi hoje
mais de quatro páginas.
Meus respeitos à ex.ma família .
Bien à toi ,
C.
Rio, 2 de abril de 1912.
Caro Miguel ,
Caro Miguel ,
Os apedidos do Jornal de hoje trazem uma transcrição da folha
mineira, dizendo que fizeste operações vantajosas para as Docas da Bahia .
Podes adivinhar de onde partiu a pedrada.
CARTAS A ARROJADO LISBOA 425
Senti muito tua resolução, tanto mais quanto, dias antes, ontem [ ?]
Elói assegurou -me achar- se tudo sanado.
Consta-me que prestou um bom serviço : arredou a candidatura de
Piquet, mais uma levantada bem sabes por quem .
De teu telegrama concluo que só voltarás depois de ir ao Egito, isto
é, em novembro.
Meu trabalho caminha : amanhã darei os originais do penúltimo capi
tulo. Vou agora rever e acrescentar o vocabulário : espero acabar dentro
de poucos dias .
A gramática me esmorece, e ainda não me animei a arrostá-la, mas
tomei contra ela as necessárias precauções: há de caber no leito procústeo
de trinta e duas páginas : em começo de outubro tenciono ir ao Paraíso,
aonde ficarei até chegares.
Respeitos à Madame.
Teu,
C.
Rio, 20 de agosto de 1912.
Caro Miguel,
Caro Miguel,
O livro chegou no prazo marcado e fico-te muito agradecido.
Não chegou a carta anunciada, o que deveras sinto. Desde que
saiste, tens sido verdadeiro Shylock quanto a notícias.
Pas de nouvelles, bonnes nouvelles só é verdade quanto a saúdes.
Quanto à obra que ias publicar, é falso : do teu silêncio só posso tirar
conclusões trisies.
Umas referências feitas no Jornal, quando se tratou da tua demissão,
mostram-se tão vagas que por elas não se pode fazer obra.
Vi há poucos dias Waring pela primeira vez . O trabalho dele não
está findo. Leuzinger disse que não podia começar, antes de acabar uma
encomenda do Ministério da Guerra, de grande urgência. Além disso,
tratando - se apenas de setenta e tantas páginas, em pouco daria conta.
Semana passada recebo uma nota de Valfrido dizendo que o homem
estava ansioso pelos originais. Mandei-o no dia seguinte, dizendo ao
mesmo tempo que, se quisesse confiá - lo a outro, não se incomodasse,
porque não me incomodava. Com tua saída perdera o gôsto.
Novo bilhete. Como já começara, devia acabar, mesmo porque a tra
dução estava magnífica. Mandasse o que estava feito. Com tua saída,
a amizade à minha pessoa era a mesma, na Inspetoria.
Respondi mandando o que tinha feito. Como deixara em branco
alguns têrmos, cuja significação não perguntara a Derby, não pusera as
notas de citações, não fizera a revisão final, e os originais não podiam
ir assim para a tipografia, e ficava provada a sua existência, pedi-lhe
devolvesse - os quando lhe parecesse .
É o estado da correspondência.
428 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
Como creio outra carta não te alcançará mais, farei uma encomenda :
descobre-me o último porrete para ácido úrico. Ainda semana passada
o reumatismo no pé prendeu-me em casa . Creio que na próxima se
localizará no joelho.
Meu livro vai indo : para a semana, talvez mesmo esta, irão os últimos
originais.
Estão chamando para almoçar.
Respeitos à ex.ma.
Bien à toi,
Cap.
Rio, 17 de setembro de 1912.
Caro Miguel,
Ainda serás encontrado ? Parece que partirás para o fim do mês,
no mesmo vapor que Rodrigues: não estarás por aqui antes de mcado de
dezembro .
Conversei ontem com meu parente, que acompanhou a comissão de
Osvaldo Cruz .
Sairam de Petrolina, foram a S. Raimundo Nonato, estiveram em
Paranaguá. A água da lagoa é imprestável para a bebida. Havia uma
cacimba miserável, em que encher um pote exigia horas: ele fez uma
grande escavação, aprofundou -a, e deixou água em abundância. Entraram
em Goiás pelo Duro, foram a Amaro Leite, saíram na capital, donde
chegaram a Anhangüera.
Os burros foram comprados em Queimados, barato, trinta e tantos
burros por 7 contos, que resistiram a toda a viagem e ainda foram
vendidos em Goiás por 2 contos. Em Goiás contrataram uma tropa.
No princípio, ainda dêste lado do S. Francisco, houve um ligeiro
atrito com Belisário Pena, que chegou a dispensar-lhe os serviços. Neiva
ponderou que não podiam fazer isto, porque Jerônimo ia por parte da
inspetoria. Daí por diante puseram-no à margem, tomaram um capataz,
a quem tudo confiaram , até pegá-lo em ladroeira. Depois disto entre
garam -lhe a direção, e tudo correu pacificamente até o fim .
Da excursão veio grande material. Mataram muitas caças e a cata
gem cuidadosa revelou numerosos parasitas. No Piauí encontraram uma
água venenosa, conhecida como tal, tanto que está cercada : vieram gar
rafas para ser estudadas.
ARROJADO LISBOA
+
|
CARTAS A ARROJADO LISBOA 429
Caro Miguel,
Miguel ,
Encontrei-me ontem com Pires do Rio, e ficou de combinar um
almoço. Ontem, porém , não desceste, e como só tenho o tempo disponi
vel até sábado, é provável que não nos encontremos antes da partida.
Vou com Calógeras. A viagem está combinada de modo a chegar
mos de volta no dia 29. Quem sabe lá ?
E quando é a tão falada excursão de Minas, até além -Pirapora ?
Se fôr no princípio do mês, sou candidato. Não tenho pressa em par
tir para o Rio Grande do Sul, aonde, segundo dizem, o melhor tempo
é o veranico de maio.
Tenho dois pedidos, que repito : um é o de meu cunhado Joaquim
de Castro Fonseca ; o outro é de Luís A. de Portela.
Não os esqueças.
Respeitos à ex.ma família .
Bien à toi,
C.
Rio, 18 de março de 1915.
Miguel,
Miguel,
Resolvi partir para o Rio Grande, fazer a Assis Brasil a viagem
prometida em 80 , há mais de trinta e cinco anos. Já encomendei passa
gem no Itapaci, que parte a 5 e chega a Pelotas a 14. Irei tocando nos
portos intermediários, fazendo école buissonnière, como verdadeiro estu
dante cábula. Levo passagem de ida e volta ; vou portanto habilitado a
demorar, se me aprouver, ou vir no primeiro vapor, se a música não
me agradar.
Será possível arranjar com Teixeira Soares um passe para as estra
das em que ele manda ? Gostaria, se pudesse, ver mais do estado do
que Rio Grande, Pelotas, Pedras Altas e Bagé. O passe poderia ser
para o 1.º semestre, porque antes de julho aqui estarei com certeza .
CARTAS A ARROJADO LISBOA 433
Miguel,
Parti a 5 e ainda vou navegando. Não me queixo; passo em terra
melhor que no mar, mas não enjôo, não me aborreço e não tenho
pressa de chegar.
Das vilas e cidades que passamos, apenas visitei Santos, Itaguaí, Des
têrro ; das outras contentei-me com avistar o renque de casas que acom
panham a praia.
Não sei se encontrarei, depois de amanhã, em Pedras Altas, o passe
que te pedi. Bulhões, não encontrando Soares, arranjou uma carta de
Oliveira Castro, tratando -me por Conselheiro, e pedindo-me concedesse
passagem de Pelotas para Pedras Altas : tem graça ; deixei-a em casa.
Minha passagem é válida por três meses e pode ser revalidada. Meu
desejo é demorar o mais possível, sobretudo se o passe chegar e puder
viajar pelo Estado .
Desembarcando em Desterro comprei um jornal e li a demissão
de Enes de Sousa. Calógeras é homem de coragem.
Respeitos à senhora.
Um abraço do amigo,
C.
Bordo do Itapaci, 13 de janeiro de 1916.
Miguel amigo,
Desde segunda- feira, 28, estou no Rio Novo, fazenda próxima de
Paraíba, aonde vim descansar alguns dias em casa de um amigo. Amanhã
pretendo dormir em Petrópolis, e 6.a chegar ao Rio.
Aqui apenas penetra o Correio da Manhã , e não todos os dias. Do
número de domingo, último recebido, concluo que não produziu grande
efeito o relatório da Comissão. Será efeito de leitura ligeira ? haverá
ainda outro relatório ?
31 - 1.0
434 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
Pensando sobre teu caso : entendo que a tudo deves preferir a confec
ção de teu relatório : disseste-me que podias ultimá - lo em poucos dias :
houve tempo de sobra. Em seguida, apenas chegar Silva Freire, exige
as informações oficiais e publica -as sem demora. Parte em seguida para
Belo Horizonte : se Delfim te der alguma prova especial de apreço, conso
lidará tua posição. Rio Grande pode esperar.
Já pensaste no Carlos José Veríssimo ? Abril pede para lembrar- te
Diocleciano Fernando dos Santos, candidato, digo, pretendente a escritu
rário, que foi dispensado de telegrafista por falta de verba e está pre
parado a entrar em concurso , caso haja , no antigo feudo do Antunes.
Respeitos à senhora.
Teu ,
C.
Rio Novo, 5 de setembro de 1916.
Caro Miguel,
Caro Miguel,
Foi para mim surpresa dolorosa o telegrama da morte da tua
boa mãe.
Julgava-a apenas doente dos olhos.
Peço-te aceites minhas sinceras condolências com tuas irmãs e o
querido Maneco.
Bien à toi,
C.
S. Paulo, 20 de outubro de 1916.
Miguel,
Pus ontem as provas registradas no Correio. Algumas emendas vi
sam apenas provocar- te a dar expressão mais clara às idéias. No prin
cípio há um trecho que me pareceu deslocado ; no fim acho melhor que
comeces as conclusões em página nova. Apresentei um título ligeiramente
diferente. Estando teu nome na fôlha de rosto, não precisa voltar como
assinatura .
Jaguaribe vai escrever-te sobre a venda das terras. Lembrei - lhe o
nome de Maneco, menos ocupado, e que poderá fazer muito para se al
cançar uma boa solução.
Tenho ainda esta semana para estudar. Para depois de amanhã
está marcada uma excursão a Itanhaém , mas receio que não se realize,
porque a chuva está começando e pode durar até lá.
436 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
Miguel,
Vou pôr as provas no correio.
Pág. 11 : o primeiro período é de conserto difícil. O segundo pode
ria ser eliminado. Talvez o melhor fosse suprimir as doze linhas, se dai
não resultasse hiato .
Miguel ,
Amanhã pretendo tomar o noturno para Ribeirão Preto, aonde vou
visitar um aparentado. Segunda -feira devo estar de volta. No dia 16
espero chegar ao Rio. Poderá tua inspeção caber nestes limites ? Dese
jaria muito .
Todo o tempo passado aqui consagrei a S. Paulo. Agora preciso
de ver outras cousas .
Respeitos à senhora, saudades a Maneco.
Bien à toi,
Cap .
S. Paulo , 9 de novembro de 1916.
A sobrinha do Jaguaribe voltou no dia 6.
Miguel,
A princesa alemã teve um acesso de hilaridade, ouvindo a história de
uma família que morrera à fome. Que gente tôla ! disse, às gargalhadas ;
pois há cousa mais fácil que comer ?
O caso vem a propósito da promessa feita a Jerônimo de manjá -lo
2.a feira, 18 do corrente : 2.a feira, 18 de dezembro ! 18 ! 18 !
Até para o Natal , talvez.
Miguel,
Roeste -me a corda ? Hoje, quando julgava Jerônimo velho em Mi
nas, soube que ainda não adiantara do amanhã ,
438 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
Miguel amigo,
Teu silêncio trazia -me inquieto ; receava que qualquer cousa de mi
nha carta te houvesse desagradado.
Sobre os motivos de tua saída interroguei Calogeras. Respondeu que
ultimamente não conversara contigo e não estava bem a par dos porme
nores . Ontem Chiquito me afirmou o contrário. Não é à toa que mi
nistro começa por minus; eu felizmente sou magister. Sinhoca disse-me
anteontem que bem podias ter esperado alguns dias.
Quando correu a notícia da nomeação de Aguiar, a primeira mani
festação que tive foi um abraço efusivo de Antunes, meu discípulo há
quarenta anos. Achei isto humano e, além do contentamento, nada notei
de odioso ou triunfante.
Fui à Central procurar Batista para falar sôbre meu parente e, sem
esperar, deparei com Aguiar. Abracei - o, dei-lhe os parabéns. Você tam
bém ? disse -me: Lulu tem dúvidas se o caso é para tanto . Quis levar -me
para Petrópolis para dormir no fresco e jantarmos juntos. Escusei-me;
nestes primeiros tempos prefiro não estar nem contigo nem com ele.
Calógeras e Chiquito falam na reação que estão fazendo contra ti . Ainda
ontem Chiquito referiu -se ao balanço a que se vai proceder. Protestei :
o balanço é a melhor garantia para ambos. Sabes como os jornais espe
culam e intrigam . Teus atos mais inocentes, contra tuas intenções, eram
apresentados como bofetadas a Frontin . Tens ainda de apresentar rela
tório ; agora é preciso amortecer as côres e não demorar muito.
Se para tua demissão concorreu a multa do Zozimo, dá-se um caso
interessante. Calogeras quer resgatar as Sabinas e, para a operação,
Zozimo é peca essencial, e mostrou -se irredutível. Calógeras apelou para
Frontin , que lhe disse ter contra ele grandes queixas, por tua causa,
CARTAS A ARROJADO LISBOA 439
Miguel,
Contava subir hoje e ficar em Petrópolis até 2.a feira . Tive de adiar
para 20 : sábado, 21 , é feriado.
Tenho rondado o Briguiet, à tua espera, para colher noticias de
S. Paulo . Se, agora que desces quase diáriamente, escolhesses escritório ...
As fundações para a pulverização seriam mesmo transferidas para
lugar mais conveniente ? e a geologia não indicará isto ?
Já respondeste ao despacho do Lira sobre o montepio ? Deves sa
limitar -te ao Jornal, única tabuleta que todo o mundo lê ; podias antes
ter pago o ABC, que seria um defensor como não tiveste.
Não me faltou desejo de assistir à conferência do P. do Rio, mas
dependia de convite. Não senti ; de sua longa peregrinação veio com a
descoberta de que Júlio de Castilho e Borges de Medeiros são grandes
homens. Não preciso de sair de minha rêde para conhecer como isto
é falso .
Talvez conclua amanhã o meu encantado artigo.
C.
Sexta- feira da paixão, 1917.
Sabia que estavas na cidade, mas como não me telefonaste nem por
outro modo o deste a conhecer, não te procurei.
Jequitinhonha foi uma vez ao teatro com uma mulher, que não a
Viscondessa . - Ex.mo Sr. Visconde cumprimentou - o um toma-lar
gura qualquer. – Sr. malcriado, não vê que estou incógnito [ ? ]
O portador leva uma rede para entregares nas Pedras Altas.
CAPISTRANO
Rio, 19 de março de 1917.
Miguel
Se tivesses encomendado, não poderias achar melhor auxiliar que
meu cunhado : inteligente, instruido, bem preparado na especialidade de
CARTAS A ARROJADO LISBOA 441
Miguel,
Ontem de Pedras Altas saí no mesmo dia e na mesma hora em que
lá chegara a primeira vez, três anos antes. Vim a Bagé saber noticias
de meu procurador, que não há meio de me escrever e mandar dinheiro,
e passar-lhe nova procuração para o ano corrente. Como se traia do
Caminha da Casa Colombo, amigo velho e honrado, éste silencio só pode
explicar -se por moléstia ou diabrura do correio. Um telegrama com res
posta paga, que vou transmitir, esclarecerá o mistério.
A morte de Werneck produziu -me grande tristeza. Com ele e a
família passei três verões na Tijuca e sei quanto valia. Uma carta do
filho, recebida pouco antes, apenas dizia que ele ficara mais abatido do
que poderia imaginá- lo quem apenas o tivesse visto uma vez depois do
ataque .
E lá se foi o Sr. Francisco de Paula. A política não tem entranhas.
Impediu -lhe a única saída digna : renunciar a tempo. Quem virá agora ?
Apostaria pelo Chico Sales. Tuas simpatias vão antes para o Nilo : as
minhas não : sou pouco amante de lama e de crocodilos . Venha quem
vier. Não poderá endireitar nem entortar para sempre o Brasil .
Nos textos bacairis tenho trabalhado constante : estão copiadas umas
trezentas e quarenta páginas, faltam umas dez ou vinte. Na volta para
P. A. entrarei pela gramática, para abordar certas questões importantes,
442 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
nunca estudadas até hoje, que espero resolver. Pegarei depois no voca
bulário, que apresentará forçosamente grandes lacunas. No cometimento
destino -te um papel importante, de que falaremos quando nos encon
trarmos.
Miguel amigo,
Armando Fernandes, cunhado de Tuxunim , trabalhava na fundição
de Hime & Cia ., Rua do Senado.
Foi dispensado por falta de servico : deseja empregar- se no Engenho
de Dentro ou alhures.
Peco te interesses pelo caso.
C.
Miguel amigo,
Há oito anos, pouco mais ou menos por este tempo, nos Campos
do - Jordão, recebia tua carta explicando o ministério do Wenceslau . Im
pressionava -me sobretudo a entrada de Calógeras. Soube que foi um
remédio de última hora, uma operação heróica para evitar o colapso.
Agora no de Bernardes o papel do Sá é o contrário de tudo isto.
Foi chamado com antecedência a Belo Horizonte, lá esteve não sei quan
tos dias, naturalmente discutiu , calculou , combinou . O resultado é o
monstrengo que está rompendo o sono das águas. Se seus conselhos
foram seguidos, ele entrou numa decomposição cerebral lastimosa. Se
suas palavras forem desatendidas, ele entra de rôjo por uma porta muito
baixa .
Um de seus propósitos era desarmar a política mineira contra Caló
geras . Triste cálculo . Pensar naturalmente em invocar as circunstâncias
atenuantes e trazer o filho pródigo à casa paterna defesa análoga à
dos rábulas que invocam a turbação dos sentidos para os clientes. O que
êle devia era mostrar aquela gente a atitude miserável que assumira
com o nosso amigo e obrigá -la a pedir perdão de joelhos, batendo nos
peitos.
Quando vejo Sá ao lado de Pacheco, revejo aquêle triste janeiro de
Hermes e Saraiva , que tão tristes impressões nos causou . Pensei que
Epitácio deixasse Calógeras em Roma.
Acho mais provável preferir Azevedo Marques, Pedro de Toledo,
o 2.º. Para Epitácio ninguém tem valor próprio. Uma pessoa só vale
pela escolha que ele faz : Midas, transforma em ouro quanto toca ; rei
de França, com o simples contato cura de écrouelles.
No meio de tudo isto consola que Bernardes tenha sido votado, reco
nhecido e tenha chegado ao Rio . Significa pelo menos que no Brasil
pode fazer-se revolução com espada ; com bainha, não e não. E nosso
444 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
Miguel amigo,
Não sei se nosso pobre Maneco ainda não nutria esperanças de res
tabelecimento e formava planos de futuro. Talvez a vida já lhe fosse
carga dolorosa ; mas quem sabe quanto se perdeu de bondade, de talento,
de ciência, não pode deixar de sentir dolorosamente a perda irreparável.
Um parente, sem que eu lhe pedisse, meteu - se a arrumar meus
papéis e jogou fora tudo quanto no seu analfabetismo quase completo
pareceu - lhe papel velho.
Não posso, portanto, fazer nada para o nosso Calógeras. Posso,
porém , auxiliar na revisão das provas. Se quiseres mandar datilografar
os originais e remetê-los, lê - los-ei com cuidado e devolverei sem demora .
Adeus, D. Hermínia ! abraço e beijo as mãos da venerada amiga.
Adeus, nova geração !
Ergebenst,
C.
São Vicente, 17 de agosto de 1923.
Miguel amigo,
Vim para São Vicente muito mais cedo do que costumo e do que
desejava.
O motivo foi o bacairi trazido pelo Amarante , a meu pedido. Acos
tumado à vida do campo , o indio dá -se mal na cidade. Aqui tem a pou
cos passos o mar, aonde se banlia à vontade. Há muito onde andar. Ma
triculou-se numa aula noturna de São Vicente e está fazendo progresso.
CARTAS A ARROJADO LISBOA 445
Miguel,
Manda pelo portador a Sentença de Berna e o 1.0 vol. ( enc. fran
cesa) da 1.2 Exposição do Rio Branco. Quero aproveitar os dois dias
em que as bibliotecas não trabalham , para adiantar o serviço.
Por que não mandas as provas da conferência ?
Consta que vais a Minas. Quando ?
C.
Rio, 22 de junho.
Rache, racha ou não racha ?
Miguel amigo,
Cheguei domingo a S. Paulo, e como Jaguaribe só parte para Cam
pos-do-Jordão no fim da semana, vim dar um pulo a Ribeirão Preto.
Cheguei ontem , volto depois de amanhã.
446 CORRESPONDÊNCIA DE CAPISTRANO DE ABREU
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