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Brendan "Cathbad" Myers

Texto original: http://wildideas. net/cathbad/ exnemeton/ letter05. html

Tradução: Bellovesos

A Queda da Ordem dos Druidas

Um Trabalho de Ficção Inspirada (se você acredita nesse tipo de


coisa)

Honrados companheiros,

É com tristeza e pesar sobre mim que vos conto a história do fim da
grande Ordem dos Druidas. Não foi pela mão de estrangeiros que
caímos, mas por nossa própria cegueira. Começo meu conto em Emain
Macha, onde Naoise e seus irmãos Ardan e Ainnle estavam abrindo
caminho para casa e Deirdre com eles.

Conchobar, que amava Deirdre mais do que ela o amava, veio a mim e
disse: "Vai, grande Druida, aonde os filhos de Uisna estão fazendo
uma matança entre os meus guardas e uma ruína de minha fortaleza e
realiza um encantamento sobre eles, pois, ao menos que sejam
impedidos, eles destruirão os homens do Ulster para sempre. E eu te
darei a palavra de um verdadeiro herói: de mim não sofrerão nenhum
dano, mas deixa que somente comigo façam acordo." Assim, eu fui e
trouxe meu conhecimento e artes para espalhar sobre eles e pus a
semelhança de um mar escuro ao redor deles, com grandes ondas que se
lhes opunham. E desse modo ficaram os Filhos de Uisna, desamparados
e nadando contra a terra, embora os homens do Ulster não se
aproximassem deles até que deixassem cair suas espadas. E, quando
suas espadas caíram, Conchobar apoderou-se deles e ordenou que
fossem mortos. Com a própria espada de Naoise, aquela que lhe fora
dada por Manannan, o filho de Lir, foram eles decapitados de um só
golpe.

Naquele dia, Conchobar, o filho de Nessa, traiu sua confiança para


comigo e para com os homens do Ulster. Quando os homens do Ramo
Vermelho vieram a saber de sua traição, houve luta no campo de Emain
Macha e o forte foi incendiado e muitos grandes guerreiros deixaram
o serviço do Rei para colocarem-se sob as ordens de Maeve de
Cruachan. Eu compreendi que meu lugar não era mais ao lado do Rei e
que chegara para mim o momento de retornar para as profundas
florestas verdes, onde eu havia feito um lar quando jovem.

E eu comuniquei aos Druidas da Irlanda que os filhos de Uisna


estavam mortos e de que forma isso acontecera. Pensando que os
druidas da Colina de Uisna desejariam saber de que forma eu estava
envolvido com isso, contei meu relato aos historiadores e guardiães
do bosque. Ao terminar minha narrativa, deixei o salão, pois eu não
mais confiava em reis mortais para darem julgamentos
verdadeiros. "E, se bons julgamentos é o que buscais", disse-lhes eu
ao sair, " procurai-os nas pedras cinzentas e nas altas árvores e
nas nuvens brancas e no grande mar caudaloso, pois jamais os
encontrareis no coração dos reis."

Alguns de meus estudantes de Emain Macha vieram comigo para Uisna e


conversamos longamente no topo da colina ao descer o sol para o
oeste e as nuvens vermelhas seguirem-no ali. E é o que eles estavam
dizendo, que talvez eu tivesse sido muito apressado em deixar Emain,
pois os reis não podem mover mão nem pé sem seus Druidas para lhes
dizerem se isso é bom ou ruim. "Conchobar não precisa mais de um
pai", eu lhes disse, "se ele tiver de causar a morte de seus
próprios primos, pois não há crime maior que matar alguém de sua
própria família." Porém, um de meus estudantes disse outra vez: "Não
abandones as esperanças por todos os guerreiros e reis, pois ainda
pode vir um outro que mantenha perto de seu coração a sabedoria
druídica que Conchobar esqueceu." E eu concordei com isso, embora
não o quisesse. "Mas não voltarei às cortes reais outra vez até que
um tal rei seja encontrado. E um tal rei", eu disse, "saberia que
estranho modo de ganhar o amor de uma mulher é matar todos os outros
pretendentes! " E rimos como crianças nas feiras e dançamos até que a
divisão de mestre e aprendiz desapareceu como o hálito no vento e
tudo que restou foram fadas dançando sob a lua, numa terra de
Druidas, com uma música de Druidas!

E a noite virou dia e o inverno, verão e o tempo passou. E eu fiz


uma cabana para mim mesmo e para minha querida Nessa com meu
conhecimento e arte e isso perto de um lago. E diariamente eu
saudava o sol e nunca foi ele tão tépido para mim em Emain Macha
como foi ao lado do lago e isso foi um milagre para mim, pois,
embora fosse o mesmo sol sobre mim na corte e na floresta, sua voz
era muito mais clara para mim ao lado do meu lago, meu ramo de
macieira em minha mão e sem sapatos entre mim e a terra. E Conchobar
me chamava para ouvir meu conselho sobre alguma questão de
importância para ele, pois eu estava comprometido com a Terra antes
de qualquer compromisso com a tribo. "E volta a tua corte real", eu
lhe disse toda vez, "pois é aonde pertences. E o gamo e o grou e o
salmão e a raposa e o lobo cinzento que são minha tribo agora. E é
uma surpresa para mim que tua tribo permita que permaneças rei,
depois do que fizeste aos filhos de Uisna!" E Conchobar então partia
e mais e mais comprido ficava o tempo entre suas visitas a mim.

E meu amigo Olc Aiche, o Druida, veio a mim certa vez para contar-me
a história de sua filha Achtán. Ela concebeu uma criança e Art,
filho de Conn, era o pai da criança. Olc Aiche cantou com seus
lábios e surgiu esta profecia: "Virá, sem dúvida, um filho
respeitoso; por isso, chamar-se-á Cormac." Assim, entrei na bruma na
beira do lago naquela noite aos primeiros raios do sol sobre a terra
e os Homens de Dea, que estavam esperando por mim ali me disseram
que um filho nasceria e seria um grande rei de toda a Irlanda e suas
boas graças estariam com eles.

Instruí Olc Aiche a ir aonde Cormac estava por nascer e preparar sua
arte para lançar proteções sobre ele. Isso ele fez com cinco faixas
de proteção de sua forja contra homicídio, afogamento, fogo,
feitiçaria e lobos. Feito isso, uma festa foi preparada para honrar
o rei recém nascido.

Peguei meu bastão druídico e disfarcei-me sob a forma de uma loba a


fim de poder chegar à fortaleza onde as festividades estavam
ocorrendo. E, na noite, vi Achtán dirigir-se ao campo e cair
adormecida, pois havia festejado muito, como os jovens fazem tão
comumente. Fiquei aborrecido com seu pouco juízo e grande bebedeira
e, por isso, levei comigo o menino Cormac e coloquei-o sob minha
própria proteção.

Pensando que Cormac precisava de uma casa melhor do que eu podia


dar, pois eu já não era jovem como são jovens os da tribo de Danu,
deixei-o correr com os lobos até onde ele foi apanhado por Luigne
Fer Trí, um caçador dos Fianna em quem eu confiava, e o levou para
sua casa, onde ele passou o ano. Mas ele foi encontrado por Achtán
ao fim, e ela o levou par o norte, para Fiachnae Cassan, pai adotivo
de Art, filho de Conn. Quando ela cruzou a montanha à meia-noite,
coloquei a forma do lobo sobre os caçadores e sobre mim mesmo para
retomar a criança à força. Pois, como eu estava pensando, a floresta
e a mata seriam melhores pais para Cormac do que os bardos e
cavaleiros da corte real. No entanto, os Cavaleiros do Outro Mundo
saíram de seus montes, com a forma de ovelhas selvagens sobre si
mesmos, para protegê-lo. E na casa de Fiachnae Cassan ele esteve por
trinta anos.

Foi num dia afortunado que Cormac tomou seu caminho para Temhair a
fim de reclamar sua herança de direito. No mesmo dia, Mac Con
proferiu um falso julgamento, dizendo que os carneiros de uma mulher
deveriam ser penalizados por comerem a horta da rainha. Mas Cormac
deu um julgamento verdadeiro, trocando uma tosa pela outra e a lã
dos carneiros foi tosquiada em troca da horta da rainha. Ao ouvir
essa notícia, pensei que talvez houvesse um pouco da sabedoria dos
Druidas com ele e esse Cormac seria o rei que traria às cortes reais
a honra que Conchobar havia perdido. Então fui à colina de Teamhair
e a forma de um estranho estava sobre mim por meio de minhas artes
druídicas e lhe fiz perguntas para que eu pudesse conhecer seu
pensamento. Eu lhe disse: "Ó Cormac, neto de Conn, desejo saber como
devo comportar-me entre os sábios e os tolos, entre os amigos e os
estranhos, entre os jovens e os velhos, entre os inocentes e os
perversos."

"Não é difícil de dizer", falou Cormac.


Não sejas muito sábio, nem muito tolo,
Não sejas muito convencido, nem muito acanhado,
Não sejas muito altivo, nem muito humilde,
Não sejas muito falador, nem muito calado,
Não sejas muito severo, nem muito frágil.
Se fores muito sábio, esperar-se-á demais de ti.
Se fores muito tolo, serás logrado.
Se fores muito convencido, pensarão que és irritante.
Se fores muito humilde, pensarão que não tens honra.
Se fores muito falador, não te darão atenção.
Se fores muito calado, não serás estimado.
Se fores muito rígido, será quebrado.
Se fores muito frágil, seras esmagado."

Soube então, em meu coração, que a sabedoria dos Druidas estava com
ele. Contei-o a meus amigos que haviam me acompanhado em meu refúgio
na floresta. E foi isto o que disseram, que estavam satisfeitos em
ter outra vez no trono um rei sábio. Talvez eu imaginasse que ele
havia aprendido sabedoria enquanto na floresta com os caçadores e
comigo.Mas, se o fiz, não demorou muito para afastar-me dessa
idéia.

Em breve, Cormac impôs um duplo tributo de gado à província do


Munster e, quando não foram capazes de pagá-lo, ele invadiu o
Munster com seu séqüito de druidas da corte e soldados. Pelo vento
enviei um aviso a Mogh Ruith, o velho druida cego que deixara sua
corte real, como eu deixara a minha havia muitos anos, e se mudara
para junto das águas e da floresta. Embora Mogh Ruith fosse cego
neste mundo, ele via claramente em vários outros mundos, e, quando a
batalha foi combinada, ele foi rápido em aceitar o desafio. Eu não
iria juntar-me ao seu combate naquele dia, pois tinha envelhecido
desde os dias em Emain Macha, mas minha visão foi capaz de mostrar-
me a batalha. Mogh Ruith e os Druidas fizeram grandes poemas uns
contra os outros e muito heroísmo foi visto e muitos foram perdidos
em ambos os lados. Cithraud, o Druida do Grande Rei, secou todos os
rios do Munster, mas Mogh Ruith fez com que uma torrente de água
irrompesse das margens, prendendo os falsos Druidas e libertando os
Druidas verdadeiros. E, no fim, foi Mogh Ruith quem pronunciou os
poemas mais fortes, pois ele falava da terra. Cithraud falou de
penas e sinos, de mantos e broches e estava tão coberto pelos
ornamentos e decoração dos Druidas que seus passos eram pesados
sobre o solo. E, embora ele cantasse como um sino de prata, Mogh
Ruith estrondeava como um rochedo cinzento. Eu o vi subir no pilar
de fumaça do fogo de seu relato mágico e manifestar seu derradeiro
encantamento de combate:

"Formo-e-cumpro um encanto oral,


Seu poder de nuvens, uma forma
De chuva de fogo sobre um homem.
Seja bom o ferimento.
Seja incitada a turba a afogar-se estremecendo,
Afogar-se nas correntezas
A força de cada guerreiro.
Que haja um poder supremo de poemas.
Ò homem muito vil, permaneças em fuga para sempre.
Dos triunfos dos exércitos,
Uma benção acima de todas sobre o Grande Eoghan.
Mogh Corg está repelido, necessariamente subjugado, derrubado.
Que seja um dito proverbial, a soberania espalhar-se-á ,
Formo-e-cumpro um encanto oral!"

Ó Druidas do futuro, escutai este aviso meu. Foi pela traição que
deixei meu lugar ao lado do meu rei, mas foi por minha decisão que
permaneci afastado. Foi por não perder de vista a terra, nem quebrar
minha relação com ela que vivi para testemunhar esses eventos,
quando ocorreram. E mais eu vi do que isso, pois, ao chegarem os
sacerdotes do deus chamado Cristo a nossa ilha sagrada, Lonchru e
Lucet Mael estavam tão profundamente enterrados em política que
perderam sua conexão com terra e, assim, não puderam defender-se e
foram sobrepujados.

Ó Druidas do futuro, escutai este aviso meu. Há aqueles que vestem o


nome de Druida como um manto, e há aqueles que bebem o nome de
Druida como água. Se quiserdes ser Druidas, não tenteis viver como
vivemos. Não tenteis enxergar como enxergamos. Sede como sois. Fazei
como fizemos. A Névoa de Manannan pode transportar- vos, ma pode
também vos confundir Sede sempre vigilantes da terra e de todos os
mistérios nela e Danu vos acolherá em sua tribo.

Ó Druidas do futuro, escutai este aviso meu. Não percais a terra,


pois então vós mesmos estareis perdidos.

Cathbad Escrevendo do Bosque,


e na estação de Lughnasad do ano 1999

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