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Disciplina Trabalho de Conclusão de Curso (Estudo de Caso)

Professor Dr. Leandro Morilhas

PARTE I –TEACHING NOTES

Título do Caso

Sinopse do caso;
Hospital X vem sendo constantemente pressionado pelas operadoras
para uma prática mais eficiente, diminuindo custos evitáveis e introduzindo
indicadores assistenciais que tornem os processos mais transparentes. Em
paralelo há uma pressão financeira para aumentar o giro de leito, priorizando
casos agudos e cirúrgicos de rápida resolução.
Neste contexto, a presença cada vez maior de pacientes oncológicos,
em particular aqueles já sem propostas terapêuticas, tem sido encarada
como um problema crescente, pois ao mesmo tempo em que aumenta o
tempo de permanência médio do hospital exige um cuidado muito específico
e profissionais altamente especializados.
Tentando obter uma solução criativa que beneficie todas as partes
foram convocadas diferentes lideranças, sendo sugerido a criação de uma
unidade satélite nos moldes de um Hospice focada nos pacientes em
cuidados paliativos, que poderia atender ao hospital e até mesmo servir
como um novo modelo de negocio que atenderia uma demanda crescente de
mercado. No entanto esta solução implicaria em um elevado investimento,
com razoável risco a ser considerado.
Com esse cenário desafiador como pano de fundo, a alta cúpula do
hospital deve decidir entre abrir o Hospice ou investir em outras soluções
menos arriscadas (embora de eficácia duvidosa), como terceirização do
serviço paliativo ou dedicação de uma ala a um serviço próprio de cuidados
paliativos.

Objetivos de aprendizagem;

Entendimento de como o Sistema de Saúde vem evoluindo e quais as


tendências para os próximos anos, e ainda que tipos de pressões os gestores de
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saúde devem sofrer na tentativa de atender aos desejos das diferentes partes.
Compreender a realidade de um hospital de grande volume e a dificuldade
com a desospitalização e a alocação correta de recursos.
Analisar o novo modelo de negócios proposto, entender suas premissas e
os resultados projetados e avaliar o custo beneficio da implantação
Discutir sobre alternativas ao sistema proposto, como contornar os desafios
e como fundamentar a sua decisão sobre o caminho a seguir.

Material de apoio (indicação de vídeos, artigos, livros, e demais materiais didáticos)

Questões de abertura (opening questions).

1. Qual a principal dificuldade enfrentada pelo Hospital Queen Elizabeth


hoje em dia?
2. Qual a tendência da pirâmide populacional mundial para os próximos
anos e o qual a sua relação com o crescimento na demanda por
profissionais de Cuidados Paliativos?
3. Quais opções se apresentaram como alternativas à construção dos
Hospice? Quais vantagens e desvantagens de cada uma?
4. Quais classes de profissionais foram envolvidas na construção dos
argumentos para a tomada de decisão?
5. Que decisão você tomaria? Quais motivos lhe embasaram e quais os
riscos envolvidos?
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1. Quem são as fontes onde podemos obter mais informações a respeito


do caso?

Nome Setor ou Telefone E-mail


departamento que
atua
Elen Oliveira Diretora executiva
Cristiane Coordenadora do
Zambrota serviço de CP
Armando Cortezi Gerente
Financeiro
Bruna Adeodato Representante da
Associação de
pacientes
paliativos
Paula Tornado Representante
das operadoras
de saúde
Marcelo Diretor Médico
Buscacio
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TITULO DO TRABALHO
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CAPITULO 1
Descrição do hospital, descrição do problema e das pressões sofridas.
Introdução de personagens

CAPITULO 2
Descrição do sistema de saúde, perfil populacional, crise econômica,
crescimento da MBV e cuidados paliativos

CAPITULO 3
Detalhamento da proposta de construção de hospice. Dados financeiros,
ganho de valor, explicar como as diferentes partes podem se beneficiar.

CAPITULO 4
Contrapontos, enfatizar os desafios que a solução proposta enfrentará,
mostrar visões opostas

CAPITULO 5
Conclusão final e questionamento de qual decisão será tomada
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CAPÍTULO 1

1. Apresentando o hospital e seus desafios

O Hospital Queen Elizabeth é um dos maiores hospitais da América


Latina, uma instituição referência em assistência, ensino e pesquisa, que há
440 anos está a serviço da saúde da população.
Referência de uma cidade com quase 7 milhões de habitantes, no estado
com o segundo maior PIB do país, possui 600 leitos, 27 salas cirúrgicas
sendo 5 destas ambulatoriais, e atende aos públicos adulto e pediátrico.
A instituição é mantida através de um sistema de gestão misto. Ao
mesmo tempo em que atende pacientes particulares e é conveniada às
principais operadoras de saúde do estado, possui parceria firmada com a
Secretaria de Saúde, dedicando parte de sua capacidade ao atendimento de
pacientes provenientes do SUS (Sistema Único de Saúde).
Este hospital é referência de urgências e emergências do município, e
além da demanda espontânea em seu Pronto Socorro, recebe pacientes
regulados via SAMU (Serviço de Atendimento Médico de Urgência) e corpo
de bombeiros.
O Pronto socorro conta com 54 leitos de internação, porém devido a alta
demanda habitualmente permanece com 120 pacientes distribuídos nos
pontos de cuidado e em macas nos seus corredores.
Dos pacientes atendidos no hospital, 85% dão entrada pelo serviço de
Urgência e Emergência e somente 15% têm acesso ao hospital de forma
eletiva. A demanda para realização de cirurgias eletivas é elevada, porém,
devido a indisponibilidade de leitos, o tempo de espera até o procedimento é
prolongado, gerando longas esperas nas filas dos ambulatórios.
O atendimento ambulatorial conta com 54 diferentes especialidades que
atendem 24 mil atendimentos por mês em 130 consultórios.
O Hospital recebe verba estadual e pactua metas em seu contrato a
serem atingidas, que englobam cirurgias de alta e média complexidade. A
demanda via sistema urgência/emergência superlota o hospital, impactando
no cumprimento do contrato.
A unidade passou pela implantação de projetos LEAN e PROADI-SUS
(Programa de Apoio ao Desenvolvimento Institucional do SUS), nas
Unidades de Pronto Socorro, Internação e Centro Cirúrgico. Porém, devido
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ao aumento da demanda após a pandemia, mesmo estas estratégias se


mostraram insuficientes. A utilização de uma das ferramentas que seria a
ativação dos leitos do Plano de Capacidade Plena (PCP: estratégia de
contingência ativada quando ocorre superlotação do pronto socorro, criando
leitos extras na enfermaria) tem sido acionada de forma diária, o que acaba
comprometendo sua efetividade.
Segundo Elen Oliveira, diretora executiva da unidade: “É um hospital
bastante tradicional na região, já passamos por diversas transformações e
melhorias, e hoje conseguimos manter um fluxo bastante otimizado em
termos de eficiência operacional. No entanto, o volume crescente, a
dificuldade de acesso a outras estruturas de cuidado básico e avançado e a
mudança no perfil epidemiológico populacional têm pressionado bastante
nossa unidade, tornando o equilíbrio entre o suprimento da alta demanda e a
preservação da qualidade assistencial um desafio cada vez mais difícil de
ser superado”.
Ainda de acordo com a diretora: “Temos notado, principalmente após a
pandemia, uma mudança progressiva no perfil de pacientes que chegam até
nós, seja via SUS ou rede privada. A restrição de acesso fez com que
recebamos hoje pessoas com doenças menos controladas, bem como
diagnosticadas tardiamente, ou que interromperam tratamento, levando a
uma maior prevalência de doentes crônicos na unidade e a uma maior
dificuldade operacional em manter os tempos de permanência dentro das
taxas desejáveis”. Alguns dados foram compartilhados por ela para melhor
ilustrar o perfil da unidade, encontrando-se disponíveis na tabela 1 do anexo.
De maneira similar posiciona-se o diretor médico da unidade, Marcelo
Buscacio: “Diante do cenário complexo que vivemos, apresentamos um
modelo operacional funcionante com uma eficiência bastante razoável. No
entanto, não há como negar que o sistema passa por um momento
desafiador, pressionando toda a equipe, que se sente cada vez mais
sobrecarregada com as dificuldades de manter o atendimento o mais
individualizado possível, enquanto recebe pressões crescentes de todas as
partes: pacientes, familiares, operadoras, direção, equipe de qualidade e
outras. Também é inegável que a tendência atual não é de melhora no curto
prazo, pelo contrario, devemos ainda passar por um longo processo de
sufocamento com a demanda populacional crescendo e o cenário
econômico de saúde tendo sua sustentabilidade posta a prova nos próximos
anos.”
Dados no mundo inteiro mostram que suas preocupações não são
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descabidas.

CAPITULO 2

1. Do avanço ao colapso

O século XX foi um período de profunda transformação para a


sociedade global. No campo da saúde, em particular, os avanços foram
extraordinários. Vimos o surgimento dos antibióticos, popularizamos a
vacinação em massa, desvendamos o código genético humano,
desenvolvemos inúmeros aparelhos que ajudaram a diagnosticar e tratar
patologias que nem sabíamos existir. Além disso, nesse mesmo período a
tecnologia nos ajudou a aumentar exponencialmente o número de pessoas
com acesso a saneamento básico e educação, ao mesmo tempo em que
reduzimos em escala semelhante a desigualdade social e a fome na imensa
maioria dos países do mundo.
Como consequência de todo esse progresso assistimos uma grande
mudança na pirâmide etária mundial. Hoje em dia não há sequer um país no
mundo que não esteja experimentando um aumento tanto no tamanho como
na proporção de indivíduos acima de 60 anos. Segundo a ONU
(Organização das Nações Unidas), já em 2030 1 em cada 6 pessoas no
mundo terá 60 anos ou mais (em alguns países como o Japão essa faixa
etária já corresponde a 30% da população total nos dias de hoje). Em
números absolutos, o número de pessoas com mais de 60 anos deve dobrar
até 2050, chegando a 2,1 bilhões, enquanto que a população acima de 80
anos chegará a 426 milhões (a evolução da expectativa de vida mundial
segundo projeções da ONU pode ser vista na figura 1). E, apesar deste
envelhecimento ter começado a ser observado em países desenvolvidos,
hoje a mudança é muito mais acelerada nos países de média e baixa renda,
como o Brasil1.
O número de brasileiros idosos de 60 anos ou mais era de 2,6 milhões
em 1950 (4,9% do total), passou para 29,9 milhões em 2020 (14% do total) e
deve alcançar 72,4 milhões em 2100 (40% do total populacional). O número
de brasileiros idosos de 80 anos ou mais era de 153 mil em 1950 (0,3% do
total), passou para 4,2 milhões em 2020 (2% do total) e deve alcançar 28,2
milhões em 2100 (15,6% do total populacional)2. 
1
https://www.un.org/en/global-issues/ageing, acessado em 23/05/2023
2
https://educa.ibge.gov.br/jovens/conheca-o-brasil/populacao/18318-piramide-etaria.html, acessado em
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A pirâmide etária brasileira passa por enorme transformação (Figuras


2 e 3). Na maior parte do século passado a pirâmide tinha uma base larga e
um topo muito estreito. No final do século XX e no início XXI a base da
pirâmide se estreitou e houve um alargamento do meio da pirâmide. Isto
quer dizer que existe atualmente uma grande proporção de pessoas em
idade ativa e o Brasil vive o período conhecido como bônus demográfico,
que é um momento em que a demografia tende a fortalecer a economia. O
encorpamento do topo da pirâmide e o fim definitivo do bônus demográfico
vai ocorrer, principalmente, na segunda metade do atual século.
Toda essa transformação gerará grandes impactos nos campos
social, econômico e, principalmente, no sistema de saúde, que passará por
um enorme desafio para se sustentar diante de um público de característica
demográfica bem diferente daquela presente no inicio a meio do século XX,
quando os modelos assistenciais que ainda pautam nossa sociedade foram
desenhados e implementados.
É fácil ver o tamanho do desafio que temos pela frente. A tecnologia
oferece cada vez mais possibilidades de exames e tratamentos, que
precisam ser ofertados por um sistema de saúde cada vez mais
pressionado, que tenta equilibrar os interesses de prestadores, operadoras,
médicos e pacientes baseado em um modelo muito distante da realidade
econômica e social atual.
E o impacto econômico em nosso sistema, que até a pandemia era
muito discutido mas ainda não levado muito a sério, já começa a aparecer
de forma mais clara e pressionar as diferentes partes interessadas a rever
seus modelos. A figura 4 mostra como as operadoras de saúde, que vinham
conseguindo manter um fluxo de caixa crescente em 2018 e 2019, tiveram
lucros recordes em 2020 com a disseminação do COVID-19 e as medidas
de contenção adotadas, que reduziram muito a sinistralidade. No entanto a
pandemia serviu como gatilho para que fossem evidenciadas as falhas do
sistema, que não suportou a pressão econômica gerada pela demanda
reprimida ao fim do lockdown, a crise econômica que se sucedeu e a
superlotação hospitalar. O resultado foi uma queda importante do resultado
em 2021 e um prejuízo histórico das operadoras de saúde em 2022, com um
déficit de 3,4 bilhões de reais3.
Paula Tornado, representante local de uma das principais operadoras
de saúde do país discorre: “É verdade que muitas operadoras poderiam ter
23/05/2023
3
https://agenciabrasil.ebc.com.br/saude/noticia/2022-12/ans-saude-suplementar-registra-resultado-negativo-
de-r-25-bilhoes, acessado em 23/05/2023
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se preparado melhor para o período pós pandemia, já que era previsto um


aumento da sinistralidade uma vez que houve significativo progresso em
demandas reprimidas. No entanto, a situação é muito mais complexa e a
pandemia serviu apenas como gatilho para expor e acelerar um colapso que
há muito tempo se anuncia e que é consequência direta da maneira como
organizamos o sistema de saúde em quase todos os países do mundo”.

2. Buscando novos modelos

Com a pressão forçada pela busca de sustentabilidade, ganha mais


força a discussão antiga sobre a busca de modelos baseados em valor e do
cuidado centrado no paciente, assim como o aumento de eficiência dos
sistemas hospitalar e ambulatorial para que cada indivíduo receba o cuidado
na medida certa e no local certo.
Buscando áreas de oportunidade, fica claro a chance que temos nas
especialidades oncológicas. O envelhecimento populacional e a progressão
tecnológica já citados fazem com que o investimento nessa área seja
crescente, com cada vez mais pessoas sendo submetidas a novos
tratamentos quimioterápicos, radioterápicos, imunoterápicos e, em um
futuro não muito distante, genético (a terapia conhecida como CAR-T Cell, a
primeira terapia de fato gênica contra o câncer foi aprovada pela ANVISA
em 2022). A consequência dessa realidade é sim um benefício enorme em
saúde populacional, no entanto também aumentam as preocupações sobre
o custo benefício de determinadas intervenções e quão transparente estão
as relações entre médicos, indústrias farmacêuticas e pacientes, dada a
enorme e crescente quantidade tratamentos disponíveis, nem sempre com
benefícios e indicações claros.
Justamente neste ponto surge a importância e a justificativa para o
observado crescimento dos serviços de cuidados paliativos em nosso país.

3. O avanço dos cuidados paliativos

O movimento do cuidado paliativo moderno se inicia com a atuação de


Dame Cicely Saunders na Inglaterra na década de 60, com a fundação do
St. Christopher´s Hospice, o primeiro serviço a oferecer cuidado integral ao
paciente, desde o controle de sintomas, alívio da dor e do sofrimento
psicológico.  Até hoje, o St. Christopher´s é reconhecido como um dos
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principais serviços no mundo em Cuidados Paliativos e Medicina Paliativa.

O movimento paliativista tem crescido enormemente, neste início de


século, no mundo todo. Na Inglaterra, em 2005, havia 1.700 hospices, com
220 unidades de internação para adultos, 33 unidades pediátricas e 358
serviços de atendimento domiciliar. Estes serviços todos ajudaram cerca de
250 mil pacientes entre 2003 e 2004. Na Inglaterra, pacientes têm acesso
gratuito a Cuidados Paliativos, cujos serviços são custeados pelo governo
ou por doações.
Nos Estados Unidos, o movimento cresceu de um grupo de voluntários que
se dedicava a pacientes que morriam isolados para uma parte importante do
sistema de saúde. Em 2005, mais de 1,2 milhão de pessoas e suas famílias
receberam tratamento paliativo.
No Brasil, iniciativas isoladas e discussões a respeito dos Cuidados
Paliativos são encontradas desde os anos 70. Contudo, foi nos anos 90 que
começaram a aparecer os primeiros serviços organizados, ainda de forma
experimental. A primeira tentativa de congregação dos paliativistas
aconteceu com a fundação da Associação Brasileira de Cuidados Paliativos
– ABCP pela psicóloga Ana Geórgia de Melo, em 1997.
Contudo, com a fundação da Academia Nacional de Cuidados
Paliativos (ANCP), em 2005, os Cuidados Paliativos no Brasil deram um
salto institucional enorme. Com a ANCP, avançou a regularização
profissional do paliativista brasileiro, estabeleceu-se critérios de qualidade
para os serviços de Cuidados Paliativos, realizou-se definições precisas do
que é e o que não é Cuidados Paliativos e levou-se a discussão para o
Ministério da Saúde, Ministério da Educação, Conselho Federal de Medicina
– CFM e Associação Médica Brasileira – AMB. Participando ativamente da
Câmera Técnica sobre Terminalidade da Vida e Cuidados Paliativos do
CFM, a ANCP ajudou a elaborar duas resoluções importantes que regulam a
atividade médica relacionada a esta prática.
Em 2009, pela primeira vez na história da medicina no Brasil, o
Conselho Federal de Medicina incluiu, em seu novo Código de ética Médica,
os Cuidados Paliativos como princípio fundamental.
No Brasil, as atividades relacionadas a Cuidados Paliativos ainda
precisam ser regularizadas na forma de lei. Ainda imperam no Brasil um
enorme desconhecimento e muito preconceito relacionado aos Cuidados
Paliativos, principalmente entre os médicos, profissionais de saúde, gestores
hospitalares e poder judiciário. Ainda se confunde atendimento paliativo com
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eutanásia e há um enorme preconceito com relação ao uso de opióides,


como a morfina, para o alívio da dor.
Ainda são poucos os serviços de Cuidados Paliativos no Brasil. Menor
ainda é o número daqueles que oferecem atenção baseada em critérios
científicos e de qualidade.  A grande maioria dos serviços ainda requer a
implantação de modelos padronizados de atendimento que garantam a
eficácia e a qualidade.
Há uma lacuna na formação de médicos e profissionais de saúde em
Cuidados Paliativos, essencial para o atendimento adequado, devido à
ausência de residência médica e a pouca oferta de cursos de especialização
e de pós-graduação de qualidade. Ainda hoje, no Brasil, a graduação em
medicina não ensina ao médico como lidar com o paciente em fase terminal,
como reconhecer os sintomas e como administrar esta situação de maneira
humanizada e ativa, o que vem mudando no último ano, graças à uma nova
diretriz do MEC (Ministério da Educação e Cultura) de 2022 que exige a
presença do ensino em Cuidados Paliativos na graduação de medicina.
A ANCP prevê que, nos próximos anos, essa situação deverá mudar
rapidamente. Haverá uma demanda por serviços de Cuidados Paliativos e
por profissionais especializados com a regularização profissional,
promulgação de leis, a necessidade dos Hospitais em ter uma equipe de
Cuidados Paliativos para receber uma acreditação internacional como a
Joint Commission International, a quebra de resistências e maior exposição
do trabalho para o grande público por meio de filmes e novelas. A ANCP e
seus parceiros lutam para que isso de fato se torne realidade. A
regularização legal e das profissões, por exemplo, permitirá que os planos
de saúde incluam Cuidados Paliativos em suas coberturas. Está provado
que Cuidados Paliativos diminuem os custos dos serviços de saúde e
trazem enormes benefícios aos pacientes e seus familiares.
A conscientização da população brasileira sobre os Cuidados
Paliativos é essencial para que o sistema de saúde brasileiro mude sua
abordagem aos pacientes portadores de doenças que ameaçam a
continuidade de suas vidas. Cuidados Paliativos são uma necessidade de
saúde pública. São uma necessidade humanitária.
Pela segunda edição do Atlas dos Cuidados Paliativos no Brasil,
atualizado em 2019, o país conta com 191 serviços de cuidados paliativos
(o que reflete um aumento de 7,9% em comparação a 2018), tendo sua
maior concentração na região Sudeste (figura 5 e 6) e um crescimento
acelerado de surgimento dessas unidades de cuidado a partir de 2012
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(figura 7)4. Esse aumento de quase 8% merece comemoração, mas é


insuficiente para colocar o país no grupo de nações com melhor nível de
cobertura em Cuidados Paliativos. O mais recente mapeamento mundial
aponta que o país deixou a categoria 3A, caracterizada pelo oferecimento de
Cuidados Paliativos de maneira isolada, com financiamento fortemente
dependente de doações, disponibilidade limitada de morfina e um pequeno
número de serviços comparado ao tamanho da população. O Brasil agora
ocupa o nível 3b, que engloba países como Gâmbia, Albânia, Bulgária,
Colômbia e Panamá. (Figura 8). Nesse patamar, a prestação de Cuidados
Paliativos é generalizada, há fontes de financiamento, maior disponibilidade
de morfina, centros de treinamento e mais serviços à disposição da
população, mas ainda não se tem a integração encontrada nas categorias
4a e 4b. Nesses níveis, nos quais estão países como Argentina, Chile e
Áustria (4a) e Canadá, Estados Unidos e Japão (4b), os serviços de
Cuidados Paliativos estão integrados aos sistemas de saúde, profissionais
da saúde têm consciência sobre a área, a sociedade é engajada na temática
e há menor dificuldade no acesso à morfina e a outras medicações para
alívio da dor.
Apesar desse movimento crescente, a carência de leitos para
cuidados paliativos é expressiva e crítica no país. Para toda região sudeste,
há disponibilidade de 458 leitos exclusivos para CP, enquanto na região
Norte estes são ainda mais escassos: apenas 23. Como referência, a
Associação Européia de Cuidados Paliativos recomenda 2 serviços
especializados de Cuidados Paliativos para cada 100.000 habitantes (uma
equipe de assistência domiciliar e uma equipe de assistência hospitalar).
Além disso, Brasil encontra-se bastante atrasado quando comparado
ao restante do mundo no que tange a implementação e prática de Cuidados
Paliativos. A revista The Economist avaliou a qualidade de morte em 80
países. Para isto avaliou disponibilidade de acesso a opioides, existência de
políticas públicas de saúde específicas de cuidados paliativos e acesso a
cuidados paliativos nos serviços de saúde. O Brasil ficou no 42º lugar, uma
classificação pior do que Chile (27º), Costa Rica (29º), Panamá (31º),
Argentina (32º), Uruguai (39º), África do Sul (34º), Uganda (35º), Mongólia
(28º) ou Malásia (38º).
Segundo Bruna Adeodato, representante da associação local de
pacientes paliativos, “Já passou da hora de abrirmos os olhos para a

4
https://api-wordpress.paliativo.org.br/wp-content/uploads/2020/05/ATLAS_2019_final_compressed.pdf,
acessado em 23/05/2023
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realidade dos pacientes que necessitam de cuidados paliativos, que sofrem


com a falta de um tratamento humano e transparente na grande maioria dos
centros. Hospitais ainda hoje tendem a ser lugares frios e pouco
acolhedores, e a verdade é que muitos médicos simplesmente não
entendem a complexidade que é o manejo dos pacientes em fim de vida.
Verdade que nos últimos anos temos observado um certo despertar sobre o
tema por parte do governo, muito por conta das pressões que exercemos,
mas ainda estamos muito distantes de um cenário minimamente aceitável”.
Esse discurso ganha força quando observamos estudos que mostram
o número de pessoas que necessitam de Cuidados Paliativos atualmente e
a projeção futura com um aumento progressivo e significativo, conforme
ilustrada pela figura 9, retirada de um artigo britânico5.

CAPÍTULO 3

1. Criando um fluxo alternativo para o paciente em CP

Em busca de soluções que fossem ao mesmo tempo eficientes do ponto


de vista de qualidade assistencial e sustentáveis economicamente, o
hospital solicitou a equipe de negócios que criasse um modelo de negócios
para testar a viabilidade da construção de uma unidade satélite nos moldes
Hospice visando o atendimento da população em cuidados paliativos.
Primeiramente foi necessário estabelecer junto a coordenadora Cristiane
Zambrota como funcionaria e o modelo, qual seria o perfil de pacientes
atendidos e como se daria a referência destes pacientes para a unidade.
O foco será atender os pacientes nas últimas semanas a poucos meses
de vida, com prognóstico bem estabelecido e plano de cuidados com
suporte não invasivo exclusivo bem definido. A triagem desses pacientes
ocorre com avaliação de equipe multidisciplinar (médico, enfermeiro e
psicólogo), incluindo entrevista com familiares ou representantes legais,

5
S. N. Etkind1, A. E. Bone1, B. Gomes, N. Lovell, C. J. Evans, I. J. Higginson and F. E. M. Murtagh. How
many people will need palliative care in 2040? Past trends, future projections and implications for services.
BMC Medicine (2017) 15:102
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garantindo alinhamento da expectativa do cuidado e entendimento de todos


os envolvidos quanto à proposta terapêutica.
Caso o paciente se enquadre no perfil, sua transferência ocorre para a
unidade, onde recebe cuidados focados em alívio de sofrimento de todas as
dimensões, física, emocional, espiritual e social, com abordagem regular e
individualizada pela equipe multidisciplinar. Dentre as estratégias possíveis,
encontram-se propostas de terapia de dignidade, técnicas de meditação,
musicoterapia, acupuntura, participação constante dos familiares no cuidado
(se assim desejado), suporte espiritual direcionado, entre outros. Essas
ações se estendem durante toda permanência do paciente no hospice,
incluindo abordagem de acolhimento ao familiar enlutado após o falecimento
(Figura 5).
Além disso, há um programa de avaliação precoce do paciente paliativo
no hospice, para consultas ambulatoriais multidisciplinares ou estadias
diárias prolongadas na unidade (day hospice), onde este é recebido para
atividades direcionadas a sua fase de doença, ainda com funcionalidade
preservada, contribuindo para maior tolerância de tratamentos modificadores
de doença com controle agressivo de potenciais sintomas físicos e
elaboração de consciência prognóstica. Segunde Cristiane, “quanto antes o
paciente em tratamento paliativo for exposto à possibilidade de discussão
sobre seu prognóstico em ambiente seguro e acolhedor, maior será a sua
chance de definir como ele deseja ser cuidado no final da vida, tendo seus
valores respeitados do início ao fim de sua jornada frente à uma doença
incurável”.
O hospice conta ainda com um amplo programa de educação em
Cuidados Paliativos, com treinamentos estruturados para aperfeiçoamento
da equipe do hospital na identificação precoce e assertiva do paciente
paliativo, além do seu manejo básico em fase mais precoce das doenças,
contribuindo para a correta alocação de recursos em ambiente hospitalar e
facilitando o processo de comunicação entre pacientes e equipes.

2. Modelagem econômica de um Hospice satélite

Com o fluxo bem estabelecido, teve inicio a modelagem econômica. O


perfil da unidade, muito mais baseado em cuidados com estilo “low tech,
high touch”, trouxe o custo/paciente/dia para valores próximos R$200, muito
abaixo da realidade do hospital hoje em dia, que supera R$1000. Gastos
com mão de obra são a principal fonte de custo, sendo seguidos pelas
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despesas com alimentação.


Os gastos com o investimento inicial e capital de giro, no entanto, serão
significativos e ficarão em torno nos R$5.000.000,00, conforme demonstrado
na tabela 2.
Para construção do retorno projetado, foram adotados preceitos
conservadores, com uma diária global de R$1400,00 cobrada para as
operadoras, que costumam pagar ao hospital valores médios próximos a
R$2000,00 em pacientes internados em apartamento. Já o serviço de day
care, representará uma cobrança de R$500,00 por sessão, o que implica um
custo repassado de R$4.000,00 / mês para um esquema de 2 sessões por
semana.
A taxa de ocupação também foi calculada de forma mais cautelosa,
projetando uma ocupação máxima de 80% atingida ao fim do primeiro ano,
conforme mostra a tabela 3. É esperado que a taxa real de ocupação seja
maior, levando-se em consideração a atual sobrecarga do hospital e a já
existente demanda de pacientes no perfil da nova unidade, porém optou-se,
como mencionado em adotar uma postura mais conservadora para evitar
erros de supervalorização que poderiam inviabilizar o projeto no futuro.
O retorno estimado do investimento se dará após pouco mais de 2 anos,
com um VPL próximo a R$9.000.000 e uma TIR 3,85% ao mês, conforme
tabela 4.
Segundo Armando Cortezi, gerente financeiro, o retorno esperado é
interessante, no entanto é importante lembrar que a pressão financeira
dentro do hospital já é grande, devendo ser muito bem avaliado se vale a
pena um custo adicional nesse momento visando um retorno, caso
concretizado, apenas no longo prazo. Segundo o próprio: “Ainda que se
considere o projeto viável, torna-se necessário entender como seria feito
este financiamento e os eventuais riscos caso as coisas não saiam como
planejado, pois vivemos um momento de economia e política altamente
instáveis no país, além de curva de juros e inflação extremamente
elevadas”.

3. Custo de oportunidade

Devido a grande pressão financeira enfrentada atualmente pelo


hospital, a diretora executiva Elen Oliveira solicitou à Cristiane Zambrota um
estudo sobre o custo evitável trazido pela adequada alocação de recursos
oriunda de um bom planejamento de cuidado pelo serviço de paliação. Entre
as possíveis métricas associadas a tratamentos menos invasivos e limitação
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de suporte artificial de vida na terminalidade, optou-se por estimar o saving


associado às diárias evitadas em UTI (Unidade de Terapia Intensiva), que
corresponde ao número de pacientes que deixam de ser internados em
unidades fechadas por conta de estabelecimento de diretivas antecipadas
de vontade com suporte não invasivo exclusivo x tempo médio de
permanência em UTI x (Valor da diária em UTI – valor da diária na unidade
de desfecho). Em um ano observou-se um saving mensal médio de
R$155.000,00 e um saving global de R$1.490.677,96. Importante ressaltar
que tal medida considerou apenas as diárias evitadas em UTI, não
demonstrando outras modalidades de economia como o uso racional de
antibióticos, redução do uso de dispositivos externos e dieta artificial ou via
de acesso alternativas a via venosa.

4. Implementação de MBV

Tão importante quanto o ganho econômico do projeto é o ganho


assistencial. Cristiane Zambrota faz questão de pontuar: “Já temos um
serviço de cuidados paliativos no hospital. A grande questão é que nos
encontramos sobrecarregados e temos dificuldade de implementar a
assistência adequada dentro de uma estrutura terciária com um cuidado
muitas vezes fragmentado e de difícil comunicação entre equipes. Não basta
o projeto oferecer ganho financeiro, é preciso oferecer as ferramentas para
uma assistência adequada e saber como medir esta assistência para
demonstrar os ganhos”.
Segundo Paula Tornado a diária global por si só não significa
necessariamente que o paciente está recebendo um cuidado de qualidade.
Ela também frisa a necessidade de estabelecer indicadores claros e
transparentes: “As operadoras estão muito pressionadas financeiramente, é
verdade. E nessas situações de crise a desconfiança entre as partes
aumenta expressivamente. Para que um novo modelo possa ser aceito é
necessário não somente que ele prometa economia, mas que tenha
indicadores claros e que os riscos da operação sejam compartilhados de
forma transparente”.
Pensando nesses desafios a equipe do hospital vem validando
indicadores assistenciais na área de cuidados paliativos e monta uma
estratégia de remuneração variável de acordo com o desempenho atingido,
tornando assim o negócio sustentável para o sistema como um todo e
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atrativo para as operadoras. Existe a ideia de em um segundo momento


desenvolver inclusive uma plataforma acessível para governo, pacientes e
operadora onde os indicadores serão disponibilizados de forma transparente
e em tempo real.

CAPÍTULO 4

1. Desafios do projeto

Como explicitado anteriormente, o projeto possui inúmeros desafios.


Todos no hospital entendem que existe um risco razoável associado e que o
retorno não será imediato, nem do ponto de vista assistencial e muito menos
do financeiro. No entanto, também é consenso o sentimento de que o
hospital de fato necessita de mudanças, uma vez que a pressão enfrentada
é cada vez maior e o sistema atual não é sustentável.
Há o entendimento de que ideias novas como a de construir uma
unidade satélite para o recebimento de um grupo específico de pacientes
tendem a encontrar muita resistência. Para tentar tornar a decisão mais
embasada a equipe fez uma matriz SWOT, disponível no anexo (figura 6). A
dificuldade de construção de um modelo novo com certeza é grande, porém
o hospital já conta com uma equipe assistencial de qualidade e possui
bastante assessoria do corpo administrativo.
Um dos grandes pontos de discussão tem sido o montante necessário
para investimento. Armando Cortezi diz: “Entendo a necessidade de
criarmos soluções que aliviem o caixa e melhorem o giro do hospital, no
entanto um investimento nesse momento torna-se um alto risco para a
instituição. Acho que seria interessante pensar em alternativas menos
dispendiosas neste momento, ou buscar grupos de investidores dispostos a
financiar o projeto”.
Marcelo Buscacio no entanto argumenta: “Já possuímos uma excelente
equipe de cuidados paliativos própria, e ainda sim o que observamos é que
a demanda supera nossa capacidade de assistência e esse grupo de
pacientes acaba ficando preso em uma estrutura muito pesada que não é a
adequada para eles. Por outro lado o prejuízo ao giro de leitos impacta
diretamente o resultado financeiro, ratificando que esses pacientes não
estão no local adequado. Orquestrar um investimento externo em uma
instituição que atende aos sistemas público e privado não é simples, e existe
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uma alta chance do grupo de investidores em questão possuir interesses


divergentes dos nossos”.

2. Alternativas à construção

Com o objetivo de coletar o máximo de informações e juntar pessoas


com diferentes pontos de vista, foi realizada uma reunião de lideranças no
hospital, onde se seguiu um extenso debate sobre prós e contras da
implementação do Hospice, assim como alternativas viáveis.
O gerente financeiro Armando Cortezi começa com a palavra:
“De acordo com as premissas estabelecidas, gostaria de mais uma
vez lembrar que o projeto em questão exige um investimento inicial que,
embora não seja grande quando comparado a outras estruturas de saúde do
País, impactará a já combalida situação financeira de nossa Unidade. Caso
realmente seja optado por prosseguir, será desafiador montar um plano de
geração de recursos que não envolva aporte de um investidor externo e ao
mesmo tempo não gere escassez com prejuízo ao atendimento em outras
áreas. Após o início de funcionamento do Hospice, faz realmente sentido
pensar em um retorno até mais rápido do que o projetado, dada a demanda
reprimida que já possuímos, mas também devemos levar em conta que todo
projeto novo possui eventos não previstos, e com certeza surgirão despesas
extras que poderão ou não afetar a sua sustentabilidade. Seja como for, é
fundamental que o Hospice seja de fato auto subsidiado, não dependendo
de recursos desviados de nosso Hospital para sua manutenção. Neste ponto
ainda, é importante lembrar o risco de uma eventual parceria público-privada
em um sistema tão jovem e frágil. Infelizmente as políticas governamentais
em nosso país não são estáveis, o que torna os recursos menos previsíveis,
adicionando um risco significativo à operação. Já no mundo privado,
hospices podem enfrentar dificuldades na definição dos modelos de
pagamento, especialmente em sistemas de saúde nos quais predominam os
pagamentos por procedimentos ou internações. O cuidado paliativo envolve
uma abordagem mais holística, focada na qualidade de vida e no conforto do
paciente, e nem sempre esses modelos tradicionais de pagamento são
adequados para cobrir os custos associados.”
O diretor médico Marcelo Buscacio responde prontamente:
“A questão financeira realmente é uma preocupação que não deve ser
subestimada, mas caso o cenário atual se perpetue enxergo perdas tanto
institucionais quanto populacionais se acentuando no médio/logo prazo. Concordo
que o investimento inicial terá seu impacto, mas talvez haja formas de provisionar
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recursos de maneira organizada, minimizando o impacto em outras áreas. E,


embora na minha opinião não seja a melhor alternativa, a captação através de
investidores externos pode ser feita de forma que proteja os interesses da nossa
Instituição através de ferramentas contratuais. Quanto a parceria com o sistema
público, também podemos estudar o melhor modelo para minimizar os impactos de
uma eventual ruptura de pagamentos, ou podemos até mesmo optar por incluir o
SUS em um segundo momento, com o projeto mais maduro. Seria interessante
ouvir agora o que Paula Tornado tem a dizer sobre o que tange as operadoras de
saúde.”
Paula se manifesta:
“Não creio que o modelo de pagamento em si seja um entrave para nós. As
operadoras há muito pressionam para que modelos alternativos ao fee for service
sejam implementados, e concordo que essa pode ser uma boa oportunidade para
testar uma remuneração atrelada a qualidade do serviço prestado, desde que
consigamos estabelecer critérios claros e transparentes, o que pode ser um
desafio. Também é do nosso interesse diminuir o gasto ineficaz com pacientes,
mas vemos o cuidado paliativo como a ponta do iceberg. Devo ser sincera e
afirmar que, caso haja disponibilidade de leitos, devemos ter uma pressão grande
por parte das operadoras para desospitalizar pacientes com internações sociais,
que são um problema muito antigo e de difícil resolução. Talvez seja interessante
já contar com isso e destinar parte do leitos a esses pacientes como forma de
aumentar a atratividade do projeto para as operadoras.”
A representante comunitária Bruna Adeodato no entanto pontua:
“Entendo a pressão que o sistema como um todo, e em particular as
operadoras de saúde sofrem, no entanto se já possuímos uma demanda reprimida,
como podemos pensar em reservar leitos para internações sociais? Esta solução
pode desviar o projeto de seu objetivo principal em um momento em que é
necessário estabelecer fluxos e indicadores padronizados para que seja possível a
consolidação do Hospice. Acho muito importante não desviar do foco principal
neste início para que no futuro, com o modelo já posto a prova, possamos aí sim
expandir para outras populações e quem sabe criar soluções que possam se
aplicar a todo o sistema. Quanto ao investimento financeiro, mais uma vez entendo
a dificuldade da decisão, mas gostaria de frisar que este projeto seria muito bem
visto pela comunidade oncológica local, o que certamente seria uma vantagem
competitiva muito interessante para o Hospital.”
Na tentativa de compreender todos os cenários possíveis, a diretora Elen
Oliveira solicita que a chefe da equipe de cuidados paliativos Cristiane Zambrota
apresente as alternativas a construção que poderiam suprir a demanda.
Cristiane então discorre:
“Como alternativas à implementação de um hospice, tanto o home care
(cuidados domiciliares) quanto a criação de uma unidade exclusiva de cuidados
paliativos dentro do hospital podem ser alternativas viáveis. O primeiro envolve a
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prestação de cuidados de saúde no próprio ambiente doméstico do paciente,


permitindo que receba cuidados paliativos no conforto de sua casa, cercado por
sua família. Os profissionais de saúde, incluindo médicos, enfermeiros, terapeutas
e assistentes sociais, visitam o paciente regularmente para fornecer tratamento,
gerenciar sintomas, oferecer suporte emocional e orientar a família em cuidados
básicos. O home care pode ser uma alternativa mais econômica e adequada para
alguns pacientes, além de oferecer uma maior sensação de familiaridade e
controle. No entanto, no regime domiciliar na grande maioria das vezes há
limitação de recursos (seja humano ou tecnológico), o que dificulta bastante uma
assistência adequada nos casos mais complexos. Além disso, a carga emocional
em cima dos familiares aumenta consideravelmente, e são poucas as famílias que
conseguem manter a opção de permanecer em casa quando a doença chega em
seus estágios finais.
Já a criação de uma unidade de cuidados paliativos intrahospitalar pode ser
uma opção adequada quando o paciente necessita de uma atenção mais
especializada ou quando o cuidado em casa não é viável. Neste cenário teríamos
leitos reservados a receber apenas pacientes que se adequassem aos nossos
critérios para admissão, tornando o cuidado direcionado e facilitando a criação de
protocolos e indicadores. Por outro lado, manter uma unidade de cuidados
paliativos no hospital com o estado de superlotação de ocupação de leitos que nos
encontramos pode não apenas não resolver a questão da desospitalaização como
piorar ainda mais o problema, tendo em vista que recursos como espaço físico,
equipamentos, suprimentos e profissionais de saúde seriam cedidos pela Unidade.
A pressão pela utilização dos leitos destinado a pacientes paliativos para outros
fins com certeza seria grande neste cenário.”
Diante de tantas argumentações, a diretora Elen Oliveira toma a palavra.
“Antes de tomar qualquer decisão, gostaria de ressaltar como é importante a
presença de tantas partes interessadas e com diferentes pontos de vista aqui.
Todos os pontos colocados foram muito bem embasados e tenho certeza de que
seria possível defender qualquer uma das alternativas escolhidas. Mas cabe a mim
como diretora executiva a análise criteriosa de todos os cenários possíveis e a
tomada da decisão que pode ser mais vantajosa não somente para nosso hospital,
mas para o sistema como um todo, principalmente os pacientes. Vamos nos
aprofundar mais nas alternativas propostas, estudar melhor os números projetados
e talvez construir parcerias externas quem possam ajudar a pavimentação desse
caminho, seja qual for a rota escolhida. Obrigada a todos e tenho certeza de que
essa será apenas a primeira de muitas reuniões que deveremos fazer para a
discussão deste assunto.”

CAPÍTULO 5
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1. Conclusão e reflexões

Os problemas enfrentados pelo Hospital Queen Elizabeth refletem a


realidade atual de muitas instituições de saúde em nosso país. Lidar com as
pressões externas e internas ao mesmo tempo em que se luta para manter o
foco na assistência talvez seja o maior desafio de um gestor que atua nessa
área, e a tendência nos próximos anos infelizmente é que este desafio só
aumente.
É espero que ocorram mudanças importantes no cenário mundial, e a
esperança é que essa transição seja comandada não somente por pressões
financeiras, mas por profissionais de saúde que possuam habilidade e
conhecimento técnico para lidar com diferentes stakeholders e manter o centro
do cuidado sempre nos pacientes. Novos modelos de remuneração, medicina
baseada em valor, triple aim, são conceitos já antigos, que foram aperfeiçoados
ao longo dos anos mas que ainda não são sentidos no dia a dia da vasta
maioria das instituições de saúde do nosso país. Tornar a medicina do futuro
uma realidade não baseada apenas em tecnologias novas, mas em novos
sistemas não será tarefa fácil e a discussão em cima de uma como os cuidados
paliativos ilustra bem a complexidade do cenário a nossa frente.
Conseguirá o Hospital Queen Elizabeth propor um modelo que de fato
agregue valor para o sistema como um todo e ainda sim seja sustentável
financeiramente? Qual decisão você tomaria?

ANEXOS

Tabela 1

Custo paciente/dia na internação R$ 1050,00


Giro leito 4,5
Índice de intervalo de Substituição 0,91
Saída hospitalar longa permanência 105
Percentual leitos ocupados LP 15,5%
Taxa de ocupação hospitalar 92%
Tempo médio de permanência 6,2
TMP eletivo 2,4
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TMP urgência 9,1


Taxa de mortalidade geral 6,42%
Taxa mortalidade institucional 5,10%

Tabela 2

INVESTIMENTO TANGÍVEL TOTAL


Construção Civil R$ 3.053.580,00
Móveis R$ 268.600,00
Equipamentos R$ 113.040,00
Outros R$ 156.015,57
Total Tangível R$ 3.591.235,57
Total Intangível R$ 165.000,00
Capital de Giro R$ 1.419.297,00
TOTAL INVESTIMENTOS R$ 5.175.532,57

Tabela 3
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Tabela 4

Tempo de Retorno (Payback): 27 : meses  


Taxa Interna de Retorno (IRR): 3,85% : ao mês ao ano: 57,38%
Investimento Total: R$ 5.175.532 Capital de Giro: R$ 1.419.297
VPL (NPV) para 10 anos: R$ 8.880.744 Pto. Equilíbrio: R$ 912.000

Figura 1: Porcentagem da população acima de 60 anos atual e projetada té o fim do século


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Figura 2: Pirâmide populacional brasileira nos Censos 2012 e 2021


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Figura 3: Perfil da pirâmide populacional brasileira em 1950, 1985 e 2020


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Figura 4: Resultado líquido das operadoras de saúde por trimestre, nos anos 2018, 2019, 2020, 2021
e 2022
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Figura 5: Quantidade serviços de Cuidados Paliativos no Brasil, por estado

Figura 6: Quantidade serviços de Cuidados Paliativos no Brasil, por região


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Figura 7: Serviços criados por ano a partir de 2012.

Figura 8: Classificação do brasil nos Cuidados Paliativos


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Figura 9: Estimativa do número de pessoas que precisarão de Cuidados Paliativos ao morrer na


Ingraterra e País de Gales, estratificado por idade, até 2040
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Figura 10

 
PREDOMINÂNCIA
SWOT
COLABORA DESAFIA
PONTOS FORTES PONTOS A DESENVOLVER
Equipe experiente e com muita assessoria Oferecer autonomia sem perder qualidade
INTERNO

Localização Situação financeira ruim


Abertura com parceiros e operadoras Coordenação dos diferentes modelos de negócio
Demanda interna já existente Não virar unidade de longa permanência
AMBIENTE

   
OPORTUNIDADES AMEAÇAS
Ausência de concorrência direta Escassez de regulamentaão específica
EXTERNO

Alta demanda de serviços paliativos Barreira cultural social


Envelhecimento da população Sistema baseado ainda em incentivar a produção
Insustentabilidade do Sistema de Saúde Pressao de operadoras de saúde
  Despertar governamental e social  
   

Figura 5
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